sábado, 11 de maio de 2013

DIREITA & ESQUERDA

Hoje vou começar com espinhos — com uma dualidade que define o nosso mundo. Qual é o ponto central da oposição entre esquerda e direita — esse dualismo que levou tanta gente (de um lado e do outro) para a prisão, para a tortura, para o exílio, o abandono, a rejeição e a morte? Qual é o rumo desses lados?


Penso que a pior resposta cairia na decisão de ancora-los num fundamentalismo: numa oposição com conteúdo definitivo. Uma sendo correta e a outra errada já que sabemos que direita e esquerda admitem segmentações infinitas, pois toda esquerda tem uma esquerda mais a esquerda; do mesmo modo que toda direita também tem a sua direita extremadamente direitista. No plano religioso somos ainda dominados pelo sagrado (situado à "direita" do Pai); mas no plano político ninguém — pelo menos no Brasil — é de "direita". Como ninguém é rico ou poderoso.

Deus e o Diabo seriam os avatares dessa dualidade? Mas as dualidades não tendem a sumir quando delas nos aproximamos? Ademais, não seriam os dualismos, como sugere um antigo texto de Lévi-Strauss, modos de encobrir hierarquias porque um equilíbrio perfeito jamais existe, e a dualidade mistifica com perfeição as múltiplas diferenças entre grupos e pessoas, juntando tudo de um lado ou do outro ?

O ministro presidente do STF, Joaquim Barbosa — depois de fazer um diagnóstico impecável de nossa hierarquia e do nosso personalismo que realizam a indexação de pessoas, tirando-as da universalidade da lei; essas dimensões centrais do meu trabalho de interpretação do Brasil — disse que os principais jornais do país se alinhavam para a direita. Joaquim Barbosa seria meu candidato definitivo à presidência da república e estou certo que ele venceria no primeiro turno mas ao exprimir tal opinião eu acho, com devida vênia, que ele perdeu de vista o contexto sócio-político do Brasil.

Os jornais estão a "direita" porque todo o governo (e, com ele quase todo o Estado brasileiro) está englobado numa "esquerda" de receitas estatizantes que recobre o dualismo político inaugurado com a Revolução Francesa. A razão para o Estado figurar como o nosso personagem político mais importante e decisivo, revela um fato importante. A crença segundo a qual a nossa sociedade malformada, mestiça e doente (destinada, como diziam Gobineau e Agassiz, a extinção pelas enfermidades da miscigenação) teria que ser corrigida por um "poder público" centralizador, autoritário, aristocrático que varreria seus costumes primitivos, híbridos, intoleráveis e atrasados.

A "esquerda" sempre teve como central a ideia de que somente um "estado forte", poderia endireitar as taras, como dizia Azevedo Amaral, da sociedade brasileira. Essas depravações — carnaval, comida, sensualidade, dança, preguiça, musica popular... — de origem. Taras que um Estado devidamente "tomado" por pessoas bem preparadas (a honestidade não vinha ao caso porque não se tratava de uma questão de "moral", mas de "política") iria mudar por meio de decretos .

Não é por acaso que a esquerda tem sofrido de estadofilia, estadomania e estadolatria. Dai a sua alergia a tudo o que chega da sociedade e dos seus cidadãos. Coisas tenebrosas como meritocracia, lucro, ambição, mercado, competição e eficiência. Tudo o que afirma um viés não determinista do mundo.

Vivemos, graças a Procuradoria Geral da República e ao STF, um momento especial porque a "esquerda" foi posta à prova e, ato continuo, foi implacavelmente desnudada. Posta à prova definitiva do poder, ela revelou-se incapaz de honrar com os papeis sociais cabíveis na administração publica e de dizer não aos seus projetos mais autoritários. O resultado tem sido uma reação no sentido de modificação por decreto de mecanismos que buscam arrolhar a imprensa, o judiciário e o ministério público. O ideal, eis o vejo como reação, seria uma aristocratização total dos eleitos, tornando-os em seres inimputáveis. Seria isso algo de esquerda ou de direita?

Uma das forças da democracia é, como viu Tocqueville, a educação continua do seu estilo de vida. A próprio divisão de poderes demanda empatia e não antipatia entre eles. Do mesmo modo, a democracia leva a uma visão para além do econômico, do político, do religioso e do jurídico. É justamente o esforço de uma visão de conjunto que obriga as sociedades abertas a se redefinirem continuamente por meio do bom-senso que Joaquim Barbosa tem de sobra.

Ora, isso é o justo oposto de quem deseja que esquerda e direita sejam termos balizadores finais quando o que o momento demanda é que esse poderoso dualismo seja como as nossas mãos. Esses maravilhosos órgãos que nos tornam humanos e que podem ser usadas de modo diverso porque, como sabem os liberais, ambas tem um uso alternado e são importantes na nossa vida pessoal e coletiva. Por: Roberto Damatta O Globo

sexta-feira, 10 de maio de 2013

GUANTÁNAMO, E O NOME DA TRAIÇÃO

“É ineficiente, fere nossa posição internacional, reduz a cooperação com nossos aliados nos esforços de contraterrorismo, é uma ferramenta de recrutamento para extremistas e precisa ser fechada”, explicou Barack Obama, para concluir no ponto certo: “É contrária àquilo que somos”. O presidente americano referia-se à prisão de Guantánamo, onde cerca de cem dos 166 detentos prosseguem uma greve de fome deflagrada por alguns deles mais de dois meses atrás. Ele não disse, claro, mas Guantánamo também é o nome da traição: o signo de um compromisso de princípios desonrado pelo próprio Obama.


A promessa de fechar a prisão offshore foi proclamada solenemente na primeira campanha presidencial, em 2008. No segundo mês de seu mandato original, Obama assinou uma ordem executiva para fechá-la, mas enfrentou feroz resistência bipartidária no Congresso. Os parlamentares cortaram os fundos necessários à transferência de prisioneiros e adotaram diversas medidas destinadas a evitar que fossem enviados a qualquer outro lugar. O presidente tinha as alternativas de vetar as decisões parlamentares ou de utilizar prerrogativas do Executivo para circundá-las, mas preferiu inclinar-se. Agora, quando assegura uma vez mais que Guantánamo “é contrária àquilo que somos”, ele precisa invocar a história e a Constituição para ocultar um consenso político que, vergonhosamente, interliga seu governo ao de George W. Bush.

Bush, seu vice-presidente Dick Cheney e seu secretário da Defesa Donald Rumsfeld ergueram a prisão ilegal no curso de uma “guerra ao terror” que também borrou as assinaturas de sucessivos presidentes americanos nas leis internacionais contra a tortura. Obama prometeu restaurar o princípio que separa a civilização da barbárie e, efetivamente, proscreveu os métodos desumanos de interrogatório aplicados nos anos sombrios de seu predecessor. Hoje, contudo, duas dezenas de prisioneiros de Guantánamo são submetidos a técnicas de alimentação forçada que violam seus direitos individuais e, para todos os efeitos, equivalem a tortura. Na expressão “aquilo que somos” está contida uma aspiração à eternidade. Entretanto, as nações mudam e mesmo os princípios mais sagrados estão sujeitos ao inclemente desgaste causado pela traição continuada.

Guantánamo é a síntese da barbárie judicial engendrada pela “guerra ao terror”. Concluídas as investigações, nenhuma acusação pesa sobre 86 dos detentos. Muitos deles deveriam ter sido soltos há anos, mas permanecem encarcerados pois, sob alegações de “segurança nacional, o Congresso proibiu tanto sua liberação em solo americano quanto o repatriamento para os países de origem. Os demais, por decisão parlamentar, não podem ser processados por tribunais civis mas também não são julgados pelas “comissões militares” inventadas nos tempos de Rumsfeld, cujos trabalhos foram interrompidos quando seus procedimentos se revelaram insanavelmente ilegais. A greve de fome dos prisioneiros esquecidos, essas relíquias humanas dos anos de fúria, representa, objetivamente, um gesto de defesa das liberdades individuais e do império da lei. “Aquilo que somos”: nesse momento, os rostos barbados dos detentos islâmicos de Guantánamo formam uma imagem exata dos princípios inscritos nos textos fundadores dos EUA.

Os valores fundamentais, “aquilo que somos”, não deveriam ser pesados no prato da balança dos interesses utilitários. Mas Obama tem razão em sublinhar a “ineficiência” de Guantánamo, especialmente contra o pano de fundo do atentado terrorista em Boston. Dzokhar Tsarnaev invocou o Afeganistão e o Iraque como motivações para a carnificina planejada pelos dois irmãos. Terroristas sempre terão pretextos para explodir pessoas inocentes. No limite, o vocabulário dos extremistas não exige mais que palavras como “imperialismo”, “capitalismo” ou “judeus”. Entretanto, nada se compara à força persuasiva da verdade: as imagens dos detentos de Guantánamo, essas provas emaciadas de um poder que não reconhece o limite da lei, são uma “ferramenta de recrutamento” mais eficiente que qualquer discurso produzido na fábrica de ódio do jihadismo.

Guantánamo “fere nossa posição internacional”. É isso, e mais: Guantánamo fere a luta pelos direitos humanos e pelas liberdades civis no mundo inteiro. Seguindo uma triste tradição do governo Lula, Dilma Rousseff mencionou o nome da prisão offshore na sua visita a Cuba, no início de 2012, como pretexto para silenciar sobre a morte de um preso político em greve de fome na ilha dos ditadores amigos. O nome funciona como uma senha mágica, um toque de reunião para os “companheiros de viagem” dos tiranos. Ele constava do dossiê infame preparado pela Embaixada de Cuba no Brasil contra Yoani Sánchez e foi repetido como um mantra pelos que tentaram cobrir sua voz com gritos insultuosos. Ele emerge ritualmente nos discursos dos chefes chavistas que ameaçam trancafiar opositores e fechar órgãos de imprensa.

Obama enuncia perfeitamente os males imensos causados pela prisão de Guantánamo, mas ainda vacila diante do imperativo de fechá-la. Como explicou um editorial da revista The Economist, a chantagem dos “fanfarrões e covardes” que comandaram a política antiterror de Bush consiste em apontar os riscos de liberar os suspeitos de terrorismo encarcerados sem acusação. O mito da bomba-relógio que faz tique-taque é o argumento clássico dos advogados da tortura. A resposta a essa malta de arautos da violação dos direitos humanos deveria ser clara e direta: muito pior que a ameaça hipotética de violência representada por esses indivíduos singulares é a desmoralização dos pilares filosóficos que sustentam as liberdades e os direitos.

Guantánamo é um trunfo dos jihadistas e dos tiranos. Se o presidente americano quer conservar “aquilo que somos”, tem a obrigação de, finalmente, resgatar seu compromisso de campanha. Por: Demétrio Magoli O Globo

A FUNÇÃO SOCIAL E MORAL DOS LUCROS


Lucros são cruciais para um sistema capitalista. A existência de lucros informa se uma determinada empresa está utilizando seus fatores de produção de forma efetiva e eficaz.

Frequentemente vemos e ouvimos pessoas afirmarem que a obtenção de lucros é evidência da ganância e da cobiça do ser humano, e que isso é algo moralmente condenável. Deixando as questões puramente econômicas de lado, a realidade é que a obtenção de lucros não pode, por si só, ser classificada de ganância. O fato de uma determinada empresa ser lucrativa, por si só, não nos diz nada de moralmente relevante. Afinal, lucro é simplesmente o nome que a contabilidade atribui a uma situação em que a receita é maior que os custos. 

Em outras palavras, uma empresa que aufere lucros está simplesmente vivenciando uma situação em que o dinheiro que entra em seu caixa é maior do que o dinheiro que ela gasta para cobrir todos os seus custos, principalmente com materiais, imóveis, mão-de-obra e impostos. 

O contrário de lucro é prejuízo. Uma empresa que esteja perdendo dinheiro — isto é, gastando mais do que recebe — não pode sobreviver por muito tempo. E sua falência significará o desemprego de várias pessoas. Portanto, sob circunstâncias normais, lucros não apenas são uma condição necessária para o sucesso e a continuidade de um empreendimento, como também são moralmente justos, pois garantem a renda e o emprego de várias pessoas.

No entanto, há sim distorções neste arranjo, e tais distorções sempre são criadas pelo governo. Por exemplo, o governo pode conceder privilégios a determinadas empresas, seja por meio de subsídios, seja por meio de protecionismo, seja por meio de agências reguladoras que fecham o mercado e protegem as empresas da concorrência externa. Em todos estes casos, um empreendimento está sendo privilegiado à custa dos consumidores e pagadores de impostos, e seus lucros não são moralmente defensáveis.

Porém, algo deve ser enfatizado: este arranjo protecionista e mercantilista só pode existir e se manter se outras empresas não protegidas pelo governo estiverem apresentando lucros. Em outras palavras, o governo só pode socorrer e ajudar empresas ineficientes — empresas que não apresentariam lucros em situação de concorrência de livre mercado — se outras empresas da economia estiverem auferindo lucros, os quais serão tributados e utilizados para financiar tanto o aparato regulatório quanto os subsídios para as empresas ineficientes. 

Portanto, a sustentação de arranjos protecionistas — algo bastante caro àquelas pessoas contrárias ao livre mercado — depende inteiramente da existência de lucros capitalistas em outros setores da economia.

É óbvio que, quanto mais intenso e volumoso for este arranjo protecionista, mais inquietações ele gerará entre os genuínos empreendedores. Quanto mais privilégios o governo conceder a pessoas e empresas não-lucrativas, mais as pessoas e empresas lucrativas e eficientes começarão a questionar por que afinal estão trabalhando tanto. Simplesmente não é justo trabalhar duro e ver seus proventos serem confiscados para sustentar incapazes. 

Uma empresa não ser lucrativa é sinal de que algo está errado com ela: talvez seus métodos de produção sejam ineficientes, ou suas despesas gerais estejam excessivamente altas, ou seus produtos precisam passar por uma renovação, ou quaisquer outras inúmeras deficiências. Um apoio estatal a esta empresa irá simplesmente suprimir todo e qualquer incentivo para se aprimorar, postergando reformas necessárias para colocar a empresa novamente no caminho da sanidade econômica.

A história é repleta de exemplos de empresas ineficientes e problemáticas que foram socorridas pelo governo. Atualmente, várias grandes empresas são protegidas e privilegiadas pelo governo. Isso representa um triplo golpe contra o público consumidor: ele se torna privado dos benefícios que uma empresa mais eficiente, operando sob livre concorrência, traria para o mercado; ele é obrigado a abrir mão de parte de seu dinheiro, via impostos, para ajudar compulsoriamente as finanças destas empresas ineficientes; e, ainda pior, ele é obrigado a pagar mais caro por produtos de pior qualidade. Afinal, não fosse o protecionismo, os subsídios e a cartelização do mercado implementados pelo governo, haveria mais opções de produtos, tanto importados quanto produzidos no mercado interno pela livre concorrência.

Já em um livre mercado, não obstruído por privilégios e protecionismos estatais, empresas lucrativas são aquelas que descobriram uma maneira de criar e de fornecer produtos e serviços a preços altos o suficiente para cobrir seus custos, mas baixos o suficiente para fazer com que os consumidores os considerem atraentes. Uma empresa lucrativa, em outras palavras, é aquela que prospera criando e entregando bens de valor.

Neste arranjo, lucros e prejuízos são ferramentas que possibilitam entender a saúde de uma empresa. Lucros indicam que os recursos estão sendo utilizados sabiamente por uma empresa; prejuízos sugerem que eles estão sendo alocados de forma ineficaz. Embora lucros e prejuízos não sejam o elemento essencial de uma empresa, eles são indicadores cruciais de quão efetivamente as necessidades e desejos dos consumidores estão sendo atendidos.

Dado que vivemos em um mundo de escassez — o que significa que nada existe em abundância —, os desejos humanos sempre serão maiores do que a oferta de recursos necessários para se atender a todos estes desejos. Isso significa que é extremamente necessário haver na sociedade algo que direcione racionalmente a alocação destes recursos escassos. Algo ou alguém tem de informar se a água será utilizada majoritariamente para ser bebida ou para irrigar lavouras, e se o minério de ferro será utilizado para se fabricar automóveis ou para se produzir tratores. O mesmo raciocínio se aplica a todos os recursos sociais. Mesmo o tempo, que também é um recurso escasso, requer alguma ferramenta que estimule sua alocação sensata.

Uma solução já tentada para esse problema da alocação de recursos escassos foi a de controlar centralizadamente todas as decisões tomadas no mercado, bem como todos os recursos existentes no mercado. Esta é exatamente a estratégia defendida pelo socialismo em suas variadas formas. Como a humanidade aprendeu amargamente, um dos problemas com essa estratégia de alocação de recursos é que ela concentra enormes poderes em poucas mãos. Poder excessivo tende a estimular coisas sórdidas na natureza humana. 

Mas há um outro problema com essa estratégia: o problema do conhecimento. Mesmo que a elite política que eventualmente estivesse no controle da economia fosse moralmente perfeita, ela ainda assim seria incapaz de coletar todas as informações necessárias para alocar de maneira eficaz e racional todos os recursos humanos e materiais. Adicionalmente, há também o problema da impossibilidade do cálculo econômico em uma economia em que os bens de capital não são propriedade privada. Se os meios de produção pertencem exclusivamente ao estado, não há um genuíno mercado entre eles. Se não há um mercado entre eles, é impossível haver a formação de preços legítimos. Se não há preços, é impossível fazer qualquer cálculo de preços. E sem esse cálculo de preços, é impossível haver qualquer racionalidade econômica — o que significa que uma economia planejada é, paradoxalmente, impossível de ser planejada.

Estes três problemas obstruíram e reverteram todas as economias centralmente planejadas da história.

Felizmente, há uma estratégia alternativa para a alocação de recursos escassos: a rede de preços que emerge naturalmente quando compradores e vendedores efetuam trocas voluntárias no mercado. Neste arranjo, as leis da economia entram em cena. Uma redução de preço para um determinado bem sinaliza uma relativa abundância; pessoas podem comprar mais daquele bem. Já um aumento de preço sinaliza uma relativa escassez, obrigando as pessoas a pouparem mais caso queiram adquirir aquele bem. 

Por meio deste sistema, em que os preços dos bens e serviços estão constantemente em fluxo, os consumidores podem equilibrar suas necessidades em relação à disponibilidade dos vários bens e podem saber a qualquer momento qual a quantidade de cada bem que eles podem comprar e utilizar. Já os produtores, por sua vez, podem saber em qual quantidade um bem deve ser produzido e vendido. Os preços nos ajudam a determinar se um bem ou serviço está sendo desperdiçado — e, por isso, não deveria estar sendo produzido —, ou se ele é amplamente desejado — e, por isso, deveria ter sua produção aumentada. 

Por exemplo, quando empreendedores descobriram como prospectar, armazenar, refinar e utilizar petróleo, o produto se tornou mais barato do que o óleo de baleia. Consequentemente, a participação do óleo de baleia no mercado desabou e, com isso, houve menos pressão para se matar baleias em busca de sua gordura.

O lucro também pode ser entendido como um tipo de preço que emite sinais. Auferir lucro indica que uma empresa está realizando suas tarefas de uma maneira que um determinado segmento do público consumidor aprova — não apenas conceitualmente, como em opiniões coletadas por uma pesquisa, mas principalmente por meio da decisão voluntária de abrir mão de seu suado dinheiro em troca dos bens e serviços fornecidos por esta empresa. Já os prejuízos informam aos empreendedores, proprietários e administradores que eles têm de realizar ajustes em seu processo produtivo. Caso contrário, será melhor se dedicar a outros objetivos, desta forma fazendo com que recursos sociais não sejam desperdiçados. 

Desta forma, os sinais emitidos pelos lucros e prejuízos atendem a uma insubstituível função econômica. A lucratividade serve como uma força motivadora, mas também — e ainda mais importante — sinalizam um trabalho bem-feito.

Por último, um adendo moral: as obrigações sociais das empresas não se resumem a fornecer bens e serviços de maneira lucrativa. As empresas têm também de atuar honestamente, honrando seus contratos, servindo aos consumidores com ética e estando sempre atentas às dimensões morais do processo empreendedorial. O sistema de preços não assegura magicamente um comportamento moral. Para dar um exemplo doloroso mas bastante realista, o sistema de preços em uma sociedade depravada pode sinalizar que o mais valioso uso de mulheres jovens oriundas de famílias pobres é transformá-las em prostitutas. A confusão surge quando as pessoas veem tais perversidades e erroneamente concluem que abolir o livre mercado irá magicamente resolver esse problema de alguma forma. Uma pequena reflexão já basta para revelar o erro desta lógica. Adotar uma economia controlada e planejada não revoga a lascívia e o egoísmo do coração humano. Esses vícios, ao contrário, irão prosperar e se tornar ainda mais intensos. A diferença é que agora eles serão alimentados e protegidos por algum braço armado do estado — com o problema adicional de que as famílias mais pobres terão agora ainda menos alternativas econômicas, pois a economia controlada retirou de seu alcance vários empreendimentos moralmente preferíveis.

Embora o sistema de preços em uma economia livre não forneça uma fundação moral para a sociedade, e embora ele também não remova automaticamente as oportunidades para ganhos imorais, ele facilmente supera todas as formas de socialismo no que diz respeito a fornecer opções morais e socialmente beneficentes para se escapar da pobreza.

Por: Robert Sirico é fundador e presidente do Acton Institute. Padre e mestre em teologia, ele também é membro da Mont Pèlerin Society, da Academia Americana de Religião e da Philadelphia Society, além de ser conselheiro do Instituto Cívico de Praga.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

BICHINHOS ASSUSTADOS

No Brasil a vida intelectual superior, mesmo na sua expressão mais tosca, que é o debate ideológico, acabou.

Se fosse preciso alguma prova suplementar daquilo que escrevi em “A animalização da linguagem”, os srs. Nirlando Beirão, Luís Antonio Giron, Paulo Ghiraldelli e mais meia dúzia se apressaram gentilmente a fornecê-la antes mesmo de que o artigo fosse publicado.

Não li ainda o livro do Lobão, O Manifesto do Nada na Terra do Nunca. Mas, por si mesmas, as reações que essas criaturas lhe ofereceram ilustram de maneira exemplar a animalização da linguagem.

A desenvoltura ingênua com que imaginam que basta carimbar um autor como “direitista” para sepultá-lo sob dez toneladas de irrelevância mostra que não usam a linguagem como seres humanos, para representar e analisar o mundo, mas como cães que cheiram os órgãos genitais uns dos outros e, ali reconhecendo instantaneamente o membro do grupo ou o estranho, dão o assunto por encerrado.

Isso é a mais alta atividade cerebral de que são capazes.

Não se trata, sequer, de catalogação ideológica no sentido em que a praticavam os velhos marxistas, a qual exigia ir além das meras aparências partidárias e investigar se a intenção profunda de uma obra ia na direção do realismo – “humanismo”, no sentido de Lukács – ou da negação idealista do processo histórico. Nessa operação, o direitismo ou esquerdismo imediatos já não contavam como provas suficientes de uma identidade ideológica, de modo que reacionários de marca como Aristóteles, Shakespeare, Dostoiévski e Balzac podiam até ser absorvidos no corpus da doutrina marxista como seus antecessores e parceiros.

Uma vez o poeta Bruno Tolentino sugeriu que os “intelectuais de esquerda” – na época ainda existiam alguns – deveriam ler meus livros com esse espírito. Se o fizessem, teriam algumas surpresas e algum ganho. Mas eles todos já morreram. O que sobrou foram os farejadores de genitais, que ao primeiro sinal de uma presença hostil já saem correndo para dar o alarma ao resto da matilha e, feito isso, julgam que cumpriram o mais sublime dos deveres intelectuais.

As categorias interpretativas em que baseiam seus diagnósticos não têm nada a ver com teoria marxista ou com qualquer tipo de pensamento filosófico reconhecível. São estereótipos de histórias em quadrinhos, filmes de aventuras e conversas de botequim. O sr. Giron, por exemplo, cataloga-me “à direita de Átila, o Huno” e sai todo pimpão, congratulando-se do símile originalíssimo. Nada mais significativo da mentalidade de um falante do que a fonte de onde extrai suas figuras de linguagem. Átila, historicamente, foi o líder das massas bárbaras que, por onde passavam, desmantelavam a ordem social imperial. Um revolucionário em toda a linha. No imaginário infantil, porém, ele simboliza apenas o malvadão, donde o sr. Giron, sentindo o cheiro de coisa ruim e espremendo suas cadeias sinápticas até à potência máxima, conclui que deve ter sido um direitista. Dizem que o estilo é o homem. Mas às vezes não chega a ser um homem: é apenas um cãozinho amedrontado.

Quanto aos demais, nada tenho a acrescentar à nota que coloquei no Facebook:

“Estou impressionado com o número de pessoas que atacam o Lobão por ter lido Olavo de Carvalho -- um pecado que elas jamais cometeram e cuja mera possibilidade lhes inspira um horror sacrossanto. No mundo inteiro, quem critica um autor gaba-se de conhecer seus escritos melhor que ninguém. No Brasil, a autoridade de julgá-lo e condená-lo nasce da perfeita e intransigente recusa de ler o que ele escreve. Tento explicar esse fenômeno aos americanos, mas eles acham que estou com gozação.”

A aliança de uma deprimente inferioridade mental com o instinto exacerbado de autodefesa grupal produziu esse resultado: a absoluta impossibilidade de um debate, de um confronto polêmico, mesmo feroz, entre essas pessoas e um intelecto cujo conteúdo lhes escapa e do qual só podem ter notícia, quando muito, pelos insultos com que o grupo o designa de longe, entre zunzuns cavernosos, risos forçados e juramentos de morte que jamais serão cumpridos.

A condição de todo debate, com efeito, é alguma intimidade com a mente do adversário, alguma compreensão das percepções que o levaram à sua visão do mundo. Isso pressupõe a disposição e a coragem de deixar-se permear pela sua influência, confiando na própria força de superá-la depois.

Mas quem sobrou vivo entre os “intelectuais públicos” deste país para absorver e, se possível, superar ou contestar o que ensinei em O Jardim das Aflições, em Aristóteles em Nova Perspectiva, em O Futuro do Pensamento Brasileiro, em A Filosofia e seu Inverso e em nada menos de quarenta mil páginas de aulas e conferências transcritas, sem contar uns quinhentos artigos publicados na mídia desde 1998 e os trezentos e tantos programas de rádio em que traduzi (ou talvez deformei) um pouco do meu pensamento na linguagem do mais acessível esculacho popular?

Pode parecer inacreditável, mas a hipótese de estudar a obra inteira de um autor, mesmo na esperança de demoli-la impiedosamente, já está fora do alcance e da capacidade não só de cada um desses indivíduos, mas até deles todos em conjunto. No Brasil a vida intelectual superior, mesmo na sua expressão mais tosca, que é o debate ideológico, acabou. Se nos testes internacionais nossos estudantes tiram sempre os últimos lugares, não é sem razão: o exemplo vem de cima.

Portanto, o conteúdo da minha obra, ou de qualquer outra que pareça detestável, não interessa mais. Basta a rotulagem superficial, passada de pata em pata entre bichinhos assustados para mantê-los a uma profilática distância de uma influência ameaçadora. Por: Olavo de Carvalho Publicado no Diário do Comércio.



FELIZ DIA DO CAPITAL!

Ao redor de todo o mundo, hoje, celebra-se o dia do trabalhador. Levando-se a conta a contínua e irrefreável expansão dos governos, cujo fardo tributário recai majoritariamente sobre os assalariados, achatando seus rendimentos, a data vem se tornando a cada dia mais emblemática e importante.

No entanto, o objetivo principal da data — ao menos o seu original — é celebrar o trabalhador como sendo o responsável pelo grande padrão de vida desfrutado pelas civilizações ao redor do mundo. Mas este argumento possui várias falhas.

Por 10.000 anos, desde a antiga Suméria até a Revolução Industrial, o trabalho era o segredo da organização econômica. A agricultura era a principal atividade econômica, e se baseava totalmente na mão-de-obra física e no trabalho exaustivo. Um ser humano sem absolutamente nenhuma ferramenta ou maquinário (capital) tinha de furar um buraco no chão com seu próprio dedo e jogar ali dentro uma semente.

A mudança para o uso de gravetos e outros pedaços de pau foi um exemplo da evolução do capital. E a mudança deste arranjo para o uso de arados de metal representou uma imensa alteração na estrutura de produção, uma alteração totalmente baseada no uso intensivo de capital. O desenvolvimento de uma coleira de cavalo — um pedaço de capital — permitiu um enorme aumento na produtividade da agricultura. Literalmente, toda a mão-de-obra do mundo era incapaz de fazer aumentar a oferta de alimentos; porém, simples aprimoramentos no capital levaram a um substancial crescimento na produção agrícola.

Em um mundo baseado no trabalho, caçar animais era uma atividade precária, dado que animais frequentemente eram mais bem munidos de armas do que os seres humanos. Um ser humano utilizando apenas suas próprias mãos não é páreo para um búfalo; com efeito, um ser humano utilizando apenas a sua inteligência e suas próprias mãos dificilmente conseguirá capturar sequer um pequeno coelho. O desenvolvimento das armadilhas para animais, por exemplo, foi um progresso que permitiu que presas pequenas fossem capturadas com riscos mínimos para o capturador. O uso de lanças representou outro aprimoramento do capital, permitindo que um pequeno grupo de homens exitosamente caçasse grandes animais. E a invenção das armas de fogo permitiu que um homem pudesse matar até mesmo o maior dos animais a uma grande distância.

Em um mundo baseado inteiramente no trabalho, o comércio entre as regiões exigia que os homens levassem semanas, meses ou até mesmo anos para percorrer montanhas e áreas nevadas. No entanto, este trabalho excruciante gerava apenas pequenas quantidades de comércio, dado que os comerciantes — limitados pela própria força física e pela necessidade de carregar comida e conduzir um enorme grupo de animais — eram capazes de transportar segura e eficazmente apenas uma pequena quantidade de bens, frequentemente não mais do que uns 100 kg.

Já em nosso mundo baseado no uso de capital, o comércio é feito por meio de caminhões, aviões e enormes navios com capacidade para várias toneladas. De fato, é muito provável que, neste nosso mundo baseado no capital, ocorra em um só dia um volume de comércio muito maior do que aquele que ocorria em um ano, em uma década ou, possivelmente, até mesmo em um século inteiro antes da Renascença. 

Hoje, usufruímos prazeres e magnificências que eram inimagináveis há até mesmo 200 anos. Dirigimos automóveis, temos luz e inúmeros aparelhos elétricos em nossas casas, produzimos em massa todo e qualquer tipo de antibiótico, temos ar condicionado, viagens aéreas, geladeiras, congeladores, filmes, televisão, videocassetes, aparelhos de DVD, Blu-ray, rádios, toca-discos, CD players, computadores, notebooks, celulares, moradias confortáveis, comidas e roupas abundantes e de qualidade, medicina e odontologia modernas, máquina de lavar e secar, forno de microondas e por aí vai. Livros que antes tinham de ser meticulosamente reproduzidos um de cada vez — com trabalho — hoje são reproduzidos aos milhares tanto por meio de fotocópias e impressoras quanto por meios puramente digitais. Hoje, você pode ler este texto na internet por meio do seu computador, notebook, iPad, iPhone ou simplesmente por meio de papel e impressora. Você escolhe.

Um voo intercontinental de algumas horas substitui semanas de viagem dentro de um navio primitivo — viagem esta que apresentava enormes chances de resultar em tragédia. E mesmo um navio primitivo havia ao menos tornado possível as viagens intercontinentais, algo que era uma impossibilidade em um mundo baseado exclusivamente no trabalho humano. (Imagine ter de nadar todo o Oceano Atlântico!) Uma mensagem que demorava dias para ser transportada por meio de cavalos é hoje instantaneamente entregue via celulares e emails.

O que permitiu esta magnífica criação de riqueza foram investimentos em capital feitos por capitalistas, os quais geraram as mudanças tecnológicas que hoje nos permitem produzir mais com cada vez menos recursos. O trabalho é importante, sem dúvida, mas o que realmente nos faz ricos é o capital e a tecnologia que tornam o trabalho mais produtivo.

E um ótimo exemplo de como esta acumulação de capital favorece principalmente os trabalhadores pode ser observado na própria Revolução Industrial, contrariamente a todos os clichês que você certamente já ouviu sobre aquela época. Durante a Revolução Industrial, os aluguéis cobrados sobre a terra permaneceram praticamente inalterados, o que significa que os ganhos da industrialização não foram absorvidos pelos proprietários de terra. As taxas de juros permaneceram praticamente inalteradas, o que significa que os ganhos da industrialização não foram absorvidos pelos capitalistas. Já os salários — principalmente da mão-de-obra de baixa qualidade — explodiram. Tudo em decorrência da acumulação de capital.

Somos realmente abençoados de viver nesta era. A expansão do capital nos permitiu chegar a um nível de conforto jamais sonhado até mesmo por monarcas e imperadores de alguns séculos atrás. É hora de repensar este incorretamente rotulado dia do trabalhador e prestar o devido reconhecimento e homenagem àquilo que realmente torna a nossa vida mais fácil e prazerosa: o capital.

Logo, feliz dia do capital!

Scott Kjar é professor de economia da Univesidade de Dallas.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

CANUDOS E OS NOVOS TERRITÓRIOS LULISTAS

Canudos resiste. A pequena cidade fundada por Antonio Conselheiro no nordeste da Bahia em 1893 e destruída quatro anos depois continua abandonada pelo poder público. Reconstruída no início do século 20, após o retorno de parte da população conselheirista, a cidade manteve-se isolada até a visita de Getúlio Vargas, em outubro de 1940, e a decisão governamental de construir um açude, obras que terminaram em 1969, obrigando a população a se transferir para o povoado de Cocorobó. Hoje o município tem uma ampla área territorial (2.985 quilômetros quadrados) e uma população de 13.760 pessoas. É paradigmático para tentarmos entender os resultados da eleição presidencial e a grande vitória obtida por Luiz Inácio Lula da Silva na região Nordeste.


A Bahia tem um dos piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH): está em 22º lugar, entre os 27 Estados. A cidade melhor classificada é a capital, Salvador: ocupa o 475º lugar entre os municípios brasileiros. A região de Canudos é a mais pobre do Estado. Isolada pelas péssimas estradas, sem um eficaz sistema de telefonia (celular não tem sinal na área) e assolada pela seca (o índice pluviométrico do município é um dos mais baixos do estado), os canudenses sobrevivem no limite da pobreza. O poder público federal está ausente: há somente uma agência do Banco do Brasil (e que funciona apenas das 9h às 12h).

O Produto Interno Bruto (PIB) é de pouco mais de R$ 32 milhões. O número de pessoas com registro na carteira profissional não chega a 200 (não há condições para pagar o salário mínimo e muito menos os encargos sociais). No município não há nenhum trator e o principal meio de transporte são as motos (quase 300).

A cidade depende do Fundo de Participação dos Municípios (recebe cerca de R$ 3,5 milhões), pois a receita de impostos é mínima: de IPTU foi arrecadado apenas R$ 8 mil. Há dois hospitais, cada um controlado por um dos coronéis da cidade. Ambos atendem pelo SUS. Em um ano ocorreram 13.563 internações, a média de uma por habitante (segundo dados do IBGE), apesar ter apenas 62 leitos, o que dá uma média de 218 internações por leito (a cidade tem 13 médicos, parte não reside no município).

Canudos vive de uma agricultura de baixíssima produtividade, uma pecuária baseada na criação de bode e do pequeno comércio. Apesar do açude de Cocorobó, com capacidade para armazenar 245 milhões de metros cúbicos de água, metade da cidade não recebe em suas casas o precioso líquido.

Grande parte das águas estão salinizadas e o pequeno distrito irrigado (com a presença de 150 famílias) está em péssimas condições, com a canalização arruinada, fazendo com que a renda média de cada família gire em torno de um salário mínimo mensal, segundo dados do pesquisador Luiz Paulo Neiva da Universidade do Estado da Bahia.

Mesmo com a melhoria dos índices de escolaridade, a maior parte dos jovens não tem emprego fixo. Quando trabalham, vivem de bicos. Não há indústria, atividade agrícola ou comercial que gerem empregos em quantidade suficiente para absorver a força de trabalho. O lazer é inexistente, a gravidez precoce ocorre em escala considerável e a única “diversão” são os bares. Só na principal rua, a avenida Juscelino Kubitschek, em três quarteirões há uma dúzia de bares. O alcoolismo atinge parte da população, assim como o consumo de drogas.

Foi nesta espécie de microcosmos do sertão nordestino que Lula obteve uma folgada vitória no primeiro turno, com 68,4% dos votos, e no segundo ampliou ainda mais a votação, obtendo 78,06%. Alckmin conseguiu 27,3% no primeiro turno e caiu no segundo para 21,94%. Para o governo estadual, o candidato petista, Jaques Wagner, obteve a maioria absoluta dos votos: 54,7%, em grande parte produto da “onda Lula”.

As eleições romperam o domínio dos dois políticos que apresam a cidade, um do PFL, o atual prefeito (Vavá), e o outro do PSDB, ex-prefeito (Zito), que se alternam no poder desde a emancipação do município, em 1985. Na eleição presidencial tinham o mesmo candidato, Geraldo Alckmin, e foram derrotados. Mas o que chama a atenção é o número de eleitores da cidade: 10.655, isto com uma população de 13.760 pessoas, muito acima da média nacional.
O que reforça a necessidade de um recadastramento eleitoral, principalmente se for correta a informação do ministro Carlos Veloso, ex-presidente do TSE, de que no Brasil há 10 milhões de títulos fantasmas (ver Folha de S.Paulo de 16 de setembro de 2006).

É difícil encontrar alguém que não seja beneficiado pelo Bolsa Família. Se em maio eram 1.673 famílias inscritas no programa, em cinco meses, às vésperas da eleição, este número saltou para 2.246: “Não temos emprego. Tenho três filhos. Meu marido só agora arranjou um trabalho. Preferia estar trabalhando. Bolsa Família é bom mas preferia um emprego”, diz Maria José Varjão, 29 anos, estudando o segundo ano do ensino médio. Em 1998 votou em FHC, em 2002 em José Serra, já em 2006 escolheu Lula. Participava dos programas sociais do governo anterior. Dos seis irmãos, três migraram, dois para São Paulo e um para Salvador. Graças a um deles construiu uma casa com o dinheiro que manda mensalmente. Mora ao lado da casa da mãe, aposentada, e que acabou se transformando em arrimo da família. “É o único dinheiro garantido que tem lá em casa.

Meus outros dois irmãos não tem trabalho fixo e quando conseguem algo é provisório: aqui ninguém é registrado”, diz ela. A professora Maria Cláudia Jesus da Silva, 26 anos, nasceu em Canudos. É solteira. Tem nove irmãos. Cinco migraram para Juazeiro, Petrolina e Salvador. Migraram “porque aqui não tem trabalho”. O pai também recebe aposentadoria: “Sem ela não sobrevivemos”.

Uma tia está inscrita no Bolsa Família: tem nove filhos. A professora discorda do programa. Diz que “é um dinheiro fácil”, “não precisa suar”, diz que muitos que recebem não trabalham por vadiagem. Votou em FHC em 1998, mudou para Lula em 2002 e neste ano votou novamente nele.

O padre Lívio, da Igreja Católica, um italiano que está há vários anos em Canudos, considera que o governo Lula pouco fez pela região. Reclama que faltam investimentos. A presença do Estado manifesta-se através do programa Bolsa Família. Tem esperança de que algo pode melhorar. A ação da igreja é muito importante organizando a população na construção de cisternas, apoiando programas de saúde preventiva e no incentivo à agricultura familiar. Na semana anterior ao segundo turno, no sábado à noite teve até carreata. Com fogos.

Claro que pró-Lula. Ninguém dizia que iria votar em Alckmin. E não é exagero. A imagem que os canudenses têm do candidato opositor é de alguém muito distante do cotidiano do sertão. Muitos disseram nem sequer entender o que ele fala, outros que só o conheceram agora, na eleição. Dizem que Lula foi o único presidente “que olhou para nós”. Reconhecem que falta emprego, falam da corrupção (“todo mundo rouba, mas ninguém provou que Lula é ladrão”), estabelecem identidade com a sua história (“Ele sabe o que é seca, o que é sofrimento”) e relacionam Alckmin com ACM.

O semi-árido nordestino virou um território lulista. Sem estabelecer um diálogo político com os milhões que sobrevivem na região, a oposição sofrerá outra grande derrota na próxima eleição. Como disse uma canudense: “Sei que o Lula não vai ser candidato em 2010. Votarei em quem ele mandar”. Folha de SP

MARCO ANTONIO VILLA é professor de história no departamento de ciências sociais da Universidade Federal de São Carlos

terça-feira, 7 de maio de 2013

AS BOAS INTENÇÕES DO A.A.


O livro As boas intenções, do escritor espanhol Max Aub, ilustra de forma sarcástica como medidas repletas de bons sentimentos podem acarretar efeitos catastróficos, inclusive na vida daqueles que tais ações mais visavam a ajudar.


Trata-se da história de Agustín Alfaro (A.A.), “o que normalmente se chama um bom rapaz”, nas palavras do autor. O livro retrata uma série de acontecimentos trágicos que vão ocorrendo à medida que Agustín tenta proteger sua mãe do sofrimento.


Tudo começa quando surge na casa da família uma moça chamada Remedios, que alega ser mãe de um filho de Agustín. O problema é que o rebento não era de Agustín, e sim de seu pai, que usara o nome do filho com a amante.


No afã de poupar sua querida mãe de tamanho sofrimento, uma vez que ela considerava o marido um homem exemplar, Agustín acaba aceitando a farsa. O que se segue é uma verdadeira comédia de enganos que, naturalmente, acaba por desgraçar ainda mais a vida de sua mãe, sem falar das demais pessoas envolvidas, começando pelo próprio Agustín.


Pessoas repletas de boas intenções, mas desfalcadas na razão, podem se proteger das desgraças do mundo criando a ilusão de que basta a boa vontade para acabar com o mal. Lembrei dessa história quando vi as declarações de outro Augustin, o secretário do Tesouro Nacional, sobre o superávit primário. Para Arno Augustin (A.A.), a meta fiscal não é tão importante e deve ficar à mercê do comportamento da economia.


Em outras palavras, o governo não deve poupar para abater o endividamento público, e sim mirar no crescimento econômico. Claro que ninguém ousaria duvidar das boas intenções do secretário A.A., que não poderia ser acusado de interesse eleitoreiro de curto prazo. Suas intenções são puras, as melhores possíveis. Caso contrário a presidenta Dilma jamais o escolheria para cargo tão importante.


Mas é que, faltando-lhe conhecimento econômico, suas lindas intenções vão levar a uma comédia de enganos, no final altamente prejudicial aos mais pobres, que ele certamente quer ajudar. São pessoas assim, como o A.A. do livro e o nosso A.A., que reforçam a máxima de que o inferno está cheio de boas intenções...
Por: Rodrigo Constantino



segunda-feira, 6 de maio de 2013

AUTORIDADES

Basta você questionar de leve algum item do Credo ginasiano, e as reações indignadas mostram o escândalo, o horror que você despertou nas almas virgens, jamais tocadas antes pelas dúvidas que, em outros países, pululam por toda parte e alimentam discussões sem fim.


Quanto mais tempo fico nos EUA, mais nítida se torna, aos meus olhos, uma diferença crucial entre o Brasil de hoje e as nações civilizadas: é a completa ausência, no nosso país, de qualquer debate científico ou filosófico, pelo menos audível em público, ou mesmo de qualquer consciência, entre as classes alfabetizadas, de que esses debates existem em algum lugar do planeta. Só esse fenômeno, por si, já basta para mostrar que algo aí deu muito errado, que a vida dos brasileiros está indo numa direção francamente regressiva, incompatível com o estado da nossa economia e com a pretensão nacional de representar algum papel significativo no cenário do mundo.

Nos EUA e na Europa, não há idéia, não há doutrina, não há crença estabelecida, por mais oficial e majoritária que seja, que não sofra contestações e desafios o tempo todo, que não se veja obrigada a buscar argumentos cada vez mais elaborados para defender um prestígio que assim não arrisca jamais congelar-se em ídolo tribal, em tabu sacrossanto.

Qualquer professor universitário ou intelectual público que, desafiado, se feche em copas e fuja à discussão sob o pretexto de que suas crenças são lindas demais para rebaixar-se a um confronto com a idéia adversária, cai imediatamente para o segundo escalão, quando não se torna objeto de chacota. Os próprios correligionários do prof. Richard Dawkins arrancaram-lhe o couro quando ele, afetando inatingível superioridade olímpica, se esquivou a um debate com o filósofo William Lane Craig.

Nem mesmo a classe jornalística, tão burra e presunçosa em Nova York como em toda parte, confunde o consenso escolar – aquele corpo de teorias e crenças que o apoio majoritário consagrou como aptas para ser transmitidas às crianças – com a vida nas altas esferas intelectuais onde tudo, mesmo o aparentemente óbvio, pode e deve ser desafiado, contestado, forçado a buscar novos e cada vez mais sólidos fundamentos.

No Brasil só existe o consenso escolar. Ele impera sobre as cabeças dos intelectuais com a mesmaautoridade indiscutível com que se impõe, nas salas de aula, aos trêmulos e indefesos corações infantis.

Basta você questionar de leve algum item do Credo ginasiano, e as reações indignadas mostram o escândalo, o horror que você despertou nas almas virgens, jamais tocadas antes pelas dúvidas que, em outros países, pululam por toda parte e alimentam discussões sem fim.

Especialmente os ídolos da ciência popular, Newton, Galileu, Darwin ou Einstein, adquiriram no Brasil o estatuto de divindades intocáveis, e não só entre meninos de ginásio, mas entre professores universitários, cientistas e formadores de opinião. Critique um desses habitantes do Olimpo, e o tom das respostas lhe mostrará, por a + b, que neste país até mesmo banalidades arqui-sabidas dos historiadores por toda parte são novidades escandalosas e provas incontestáveis de que você é um louco.

Quando mencionei, por exemplo, as conseqüências nefastas que o mecanicismo newtoniano espalhou na cultura européia – fato que já é de domínio público pelo menos desde o século XIX –, só não me xingaram a mãe porque não acreditavam que alguém capaz de atentar contra a memória do autor dos Princípios Matemáticos da Filosofia Natural pudesse jamais ter tido mãe.

Quando escrevi que o próprio Charles Darwin fôra o inventor do design inteligente hoje tão abominado pelos evolucionistas – coisa que não pode ser ignorada por ninguém que tenha lido algo mais que as orelhas de A Origem das Espécies --, fui imediatamente rotulado como fanático religioso indigno de ocupar um espaço na mídia.

Quando expliquei que sem o conhecimento do simbolismo astrológico é impossível compreender direito as concepções cosmológicas de Sto. Tomás de Aquino ou a estética das catedrais góticas – o que é a obviedade das obviedades para quem haja estudado o assunto --, passei a ser chamado pejorativamente de “astrólogo” pelos srs. Rodrigo Constantino e Janer Cristaldo, que, como ninguém ignora, são autoridades insignes em História medieval. 

A distância, em suma, entre o que se discute desses assuntos na Europa e nos EUA e o que se sabe a respeito no Brasil já se ampliou de tal modo, que ter algum conhecimento nessas áreas se tornou realmente perigoso: a ignorância completa e radical é hoje a única fonte de credibilidade, o único depósito de premissas onde o opinador pode buscar argumentos com a certeza de que soarão razoáveis ante uma platéia ainda mais ignorante que ele.

Tendo violado essa regra, tornei-me o único comentarista brasileiro de mídia ao qual incumbe, sempre e sistematicamente, o ônus da prova -- com o detalhe de que, quando termino de provar tudo direitinho, os fulanos mudam de assunto e encontram outro motivo qualquer para continuar achando ruim. Às vezes chegam, nisso, a requintes de imbecilidade jamais alcançados antes no universo. Indignados de que, num artigo aliás excelente sobre Otto Maria Carpeaux, o prof. Maurício Tuffani citasse de passagem o meu nome, alguns leitores ofereceram a singela sugestão de que eu fosse excluído para sempre de toda mídia. O autor do artigo, então, com a maior paciência, explicou que no caso isso não era possível, por ter sido eu mesmo o editor de um dos livros de Carpeaux ali mencionados. Com toda a evidência, os remetentes prescindiam de ter lido o livro para decidir quem podia ou não podia ser citado num comentário a respeito. Era o argumentum ad ignorantiam elevado às alturas de um mandamento divino: quanto menos você sabe, maior a sua autoridade na matéria.
Por: Olavo de Carvalho  Publicado no Diário do Comércio.

sábado, 4 de maio de 2013

TACHADO DE LOUCO, AGRICULTOR DE SC 'REVOLUCIONOU' PLANTIO NO BRASIL


Nasci em Rio do Sul (SC), em 1937. Sou filho de alemães. Minha mãe era enfermeira, enviada ao país pela Cruz Vermelha. Meu pai, um imigrante que fugiu da crise de 1929.

Quando tinha um ano, fomos morar na Alemanha para minha mãe tratar uma doença no coração. A ideia era logo voltar ao Brasil. Mas, quando acabou o tratamento, a Segunda Guerra Mundial havia começado. Fomos impedidos de deixar o país.


Em 1945, meu pai foi convocado pelo exército alemão e enviado à Rússia. Foi capturado e feito prisioneiro. Com minha mãe e quatro irmãos, fomos morar em Dresden, com meus avós maternos.

Na noite de 13 de fevereiro houve um grande bombardeio aéreo dos aliados a Dresden. A cidade inteira foi incendiada. Ficamos no porão de uma casa. Éramos 15. O calor chegava a 80ºC por causa do fogo na parte externa. Sobrevivemos porque senhoras jogavam água sobre a gente.

Quando saí, vi esqueletos queimados sobre o asfalto.

Meu pai foi libertado da Rússia em 1948, pesando 44 quilos. Minha mãe morreu em 1958 e meu pai decidiu que era o momento de buscar prosperidade no Brasil. Abandonei a faculdade de engenharia hidráulica no primeiro ano e chegamos em 1960.

Em Rolândia (PR), comprou um sítio, que chamou de Rhenânia, região da Alemanha onde vivíamos.
Sergio Ranalli/Folhapress 
O agricultor Herbert Bartz em solo com palha, característica do sistema de plantio direto


O café era o produto principal do norte paranaense. O sítio tinha 5.000 pés. Colhemos e erradicamos os cafezais. Percebemos que não nos adaptaríamos ao trabalho braçal que o café exigia.

Passamos a criar porcos e a plantar milho, arroz e trigo. Em 1964, comprei o primeiro saco de semente de soja.

Mas a prosperidade não chegava. Havia geadas e doenças como a febre aftosa.

Meu pai desanimou. Insisti em viver da terra. Em 1966 ele arrendou o sítio para mim. Investi em máquinas, arrendei terras dos vizinhos e passei a trabalhar mais ainda.

Porém as grandes perdas com a erosão me aborreciam muito. A prática era preparar o solo, deixando-o nu para fazer o plantio, e a cada chuva a terra era levada para os rios.

Numa noite de outubro de 1971, constatei que ou essa situação mudava ou não daria mais. Uma grande chuva estava se formando. Sempre que isso acontecia eu não conseguia dormir. Levantei e fui olhar a lavoura.

Foi uma tromba-d'água. Vi a água levando a terra e sementes recém-plantadas.

No Brasil, não havia solução para a erosão. Tinha que ver fora do país.

Na Alemanha não encontrei nada. Na Inglaterra vi agricultores que colhiam trigo e deixavam a palha no chão, mas a queimavam para plantar a safra seguinte, por causa dos maquinários que tinham. Não gostei.

Nos EUA, visitei o produtor Harry Young, que já plantava no sistema de plantio direto havia dez anos.

Vizinhos dele plantavam no chão coberto com palha. Fiquei eufórico, convencido de que ali estava a solução para o meu problema.

Encomendei uma semeadora própria para plantio direto. A máquina chegou ao Brasil em outubro de 1972.

LOUCO

Quando me viram plantando soja sobre a palha do trigo, os vizinhos me chamaram de louco. Até agrônomos e institutos de pesquisa se posicionaram contra mim. Chegaram a atear fogo à palha que deixei sobre o solo.

Surpreendentemente fui bem, com quase 30 sacas por hectare. Parte da safra chegou a ser embargada pela PF, pois um agrônomo denunciou que a soja era ilegal.

Em 1973, o preço do diesel disparou com a crise do petróleo. Passaram a se interessar pelo que fazia, porque o plantio direto economiza combustível, pois não é preciso fazer o preparo do solo.

Foram aparecendo herbicidas que matavam só as invasoras e máquinas mais eficientes para cortar a palha e fazer o plantio. Em 1977, já colhia 50 sacas por hectare. E o solo ficava mais fértil.

Aos poucos, colegas foram aderindo ao sistema.

Tenho certeza de que é possível, com o plantio direto, recuperar áreas degradadas. Não destruímos mais a terra, conseguimos construi-la.

Vão me homenagear com título de doutor. Eu que nem tenho diploma universitário. Sinto-me honrado e feliz. Por: WILHAN SANTIN


COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM LONDRINA Folha de SP

MARXISMO: A MÁQUINA ASSASSINA

Com a queda da União Soviética e dos governos comunistas do Leste Europeu, muitas pessoas passaram a crer que o marxismo, a religião do comunismo, está morto. Ledo engano. O marxismo está vivo e vigoroso ainda em muitos países, como Coréia do Norte, Cuba, Vietnã, Laos, em vários países africanos e, principalmente, na mente de muitos líderes políticos da América do Sul. 

No entanto, de extrema importância para o futuro da humanidade é o fato de que o comunismo ainda segue poluindo o pensamento e as ideias de uma vasta multidão de acadêmicos e intelectuais do Ocidente.

De todas as religiões, seculares ou não, o marxismo é de longe a mais sangrenta — muito mais sangrenta do que a Inquisição Católica, do que as várias cruzadas e do que a Guerra dos Trinta Anos entre católicos e protestantes. Na prática, o marxismo foi sinônimo de terrorismo sanguinário, de expurgos seguidos de morte, de campos de prisioneiros e de trabalhos forçados, de deportações, de inanição dantesca, de execuções extrajudiciais, de julgamentos "teatrais", e de genocídio e assassinatos em massa.

No total, os regimes marxistas assassinaram aproximadamente 110 milhões de pessoas de 1917 a 1987. Para se ter uma perspectiva deste número de vidas humanas exterminadas, vale observar que todas as guerras domésticas e estrangeiras durante o século XX mataram aproximadamente 35 milhões de pessoas. Ou seja, quando marxistas controlam estados, o marxismo é mais letal do que todas as guerras do século XX combinadas, inclusive a Primeira e a Segunda Guerra Mundial e as Guerras da Coréia e do Vietnã.

E o que o marxismo, o maior de todos os experimentos sociais humanos, realizou para seus cidadãos pobres à custa deste sangrento número de vidas humanas? Nada de positivo. Ele deixou em seu rastro apenas desastres econômicos, ambientais, sociais e culturais.

O Khmer Vermelho — comunistas cambojanos que governaram o Camboja por quatro anos — fornece algumas constatações quanto ao motivo de os marxistas acreditarem ser necessário e moralmente correto massacrar vários de seus semelhantes. O marxismo deles estava em conjunção com o poder absoluto. Eles acreditavam, sem nenhuma hesitação, que eles e apenas eles sabiam a verdade; que eles de fato construiriam a plena felicidade humana e o mais completo bem-estar social; e que, para alcançar essa utopia, eles tinham impiedosamente de demolir a velha ordem feudal ou capitalista, bem como a cultura budista, para então reconstruir uma sociedade totalmente comunista. 

Nada deveria se interpor a esta realização humanitária. O governo — o Partido Comunista — estava acima das leis. Todas as outras instituições, normas culturais, tradições e sentimentos eram descartáveis.

Os marxistas viam a construção dessa utopia como uma guerra contra a pobreza, contra a exploração, contra o imperialismo e contra a desigualdade — e, como em uma guerra real, não-combatentes também sofreriam baixas. Haveria um necessariamente alto número de perdas humanas entre os inimigos: o clero, a burguesia, os capitalistas, os "sabotadores", os intelectuais, os contra-revolucionários, os direitistas, os tiranos, os ricos e os proprietários de terras. Assim como em uma guerra, milhões poderiam morrer, mas essas mortes seriam justificadas pelos fins, como na derrota de Hitler na Segunda Guerra Mundial. Para os marxistas no governo, o objetivo de uma utopia comunista era suficiente para justificar todas as mortes.

A ironia é que, na prática, mesmo após décadas de controle total, o marxismo não apenas não melhorou a situação do cidadão comum, como tornou as condições de vida piores do que antes da revolução. Não é por acaso que as maiores fomes do mundo aconteceram dentro da União Soviética (aproximadamente 5 milhões de mortos entre 1921-23 e 7 milhões de 1932-33, inclusive 2 milhões fora da Ucrânia) e da China (aproximadamente 30 milhões de mortos em 1959-61). No total, no século XX, quase 55 milhões de pessoas morreram em vários surtos de inanição e epidemias provocadas por marxistas — dentre estas, mais de 10 milhões foram intencionalmente esfaimadas até a morte, e o resto morreu como consequência não-premeditada da coletivização e das políticas agrícolas marxistas.

O que é espantoso é que esse histórico fúnebre do marxismo não envolve milhares ou mesmo centenas de milhares, mas milhões de mortes. Tal cifra é praticamente incompreensível — é como se a população inteira do Leste Europeu fosse aniquilada. O fato de que mais 35 milhões de pessoas fugiram de países marxistas como refugiados representa um inquestionável voto contra as pretensões da utopia marxista. [Tal número equivale a todo mundo fugindo do estado de São Paulo, esvaziando-o de todos os seres humanos.]

Há uma lição supremamente importante para a vida humana e para o bem-estar da humanidade que deve ser aprendida com este horrendo sacrifício oferecido no altar de uma ideologia: ninguém jamais deve usufruir de poderes ilimitados.

Quanto mais poder um governo usufrui para impor as convicções de uma elite ideológica ou religiosa, ou para decretar os caprichos de um ditador, maior a probabilidade de que vidas humanas sejam sacrificadas e que o bem-estar de toda a humanidade seja destruído. À medida que o poder do governo vai se tornando cada vez mais irrestrito e alcança todos os cantos da sociedade e de sua cultura, maior a probabilidade de que esse poder exterminará seus próprios cidadãos.

À medida que uma elite governante adquire o poder de fazer tudo o que quiser, seja para satisfazer suas próprias vontades pessoais ou, como é o caso dos marxistas de hoje, para implantar aquilo que acredita ser certo e verdadeiro, ela poderá impor seus desejos sem se importar com os custos em vidas humanas. O poder é a condição necessária para os assassinatos em massa. Quando uma elite obtém autoridade plena, várias causas e condições poderão se combinar para produzir o genocídio, o terrorismo, os massacres ou quaisquer assassinatos que os membros dessa elite sintam serem necessários. No entanto, o que tem de estar claro é que é o poder — irrestrito, ilimitado e desenfreado — o verdadeiro assassino.

Nossos acadêmicos e intelectuais marxistas da atualidade usufruem um passe livre. Eles não devem explicações a ninguém e não são questionados por sua defesa de uma ideologia homicida. Eles gozam de um certo respeito porque estão continuamente falando sobre melhorar as condições de vida dos pobres e dos trabalhadores, suas pretensões utópicas. Porém, sempre que adquiriu poder, o marxismo fracassou miserável e horrendamente, assim como o fascismo. Portanto, em vez de serem tratados com respeito e tolerância, marxistas deveriam ser tratados como indivíduos que desejam criar uma pestilência mortal sobre todos nós.

Da próxima vez que você se deparar com marxistas ou com seus quase equivalentes, os fanáticos esquerdistas, pergunte como eles conseguem justificar o assassinato dos mais de cento e dez milhões de seres humanos que sua fé absolutista provocou, bem como o sofrimento que o marxismo criou para as outras centenas de milhões de pessoas que conseguiram escapar e sobreviver.

Por: R.J. Rummel , professor emérito de ciência política e finalista de Prêmio Nobel da Paz, é o mais aclamado especialista mundial em democídio, termo que ele cunhou para se referir a assassinatos cometidos por governos. Escreveu o livro Death by Government, leitura obrigatória para qualquer pessoa que queira se inteirar das atrocidades cometidas por governos. Ao todo, Rummel já publicou 29 livros e recebeu numerosas condecorações por sua pesquisa.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

PROFECIAS DO DIABO

O socialismo é substantivamente a unificação do poder político com o poder econômico, dissolvendo uma das principais garantias da liberdade na sociedade capitalista e anunciando a formação de uma superclasse governante onipotente e praticamente indestrutível.


Uma vida repleta de ocupações não tem permitido dar às minhas idéias a exposição escrita toda arrumadinha que algumas delas merecem. Espalho-as, de maneira fragmentária e anárquica, em artigos, aulas e conferências, na vaga esperança de que, após a minha morte, alguma alma caridosa junte as peças e as monte em equipamentos mais utilizáveis pelo grande público.

Uma delas é a do poder imanente dos significados embutidos nos símbolos históricos. Ela diz, resumidamente, o seguinte: A história é feita das livres escolhas e decisões humanas, mas, quando os homens se deixam guiar por idéias e símbolos cujo integral significado lhes escapa no momento, esse significado invisível acaba por se manifestar à plena luz do dia sob a forma de fatalidades históricas incontroláveis. Mesmo depois do fato consumado ainda existe alguma dificuldade em perceber que já estavam enunciadas na formulação originária. Essa dificuldade emana do hábito moderno do pensamento metonímico, que concebe as propostas de ação tão somente por uma parte das suas qualidades autoproclamadas, sem sondar o sentido substantivo da ação planejada, e portanto, sem atinar com suas conseqüências inevitáveis.

Na história sacra e profética, esses desenvolvimentos anunciam-se previamente de maneira nítida. O Antigo Testamento prevê com clareza o destino tormentoso dos judeus, e o Novo anuncia a autodecomposição da Igreja, que hoje, diante dos nossos olhos, enche de temor as almas dos crentes atônitos. Na história profana, os símbolos vêm encobertos por densas camadas de confusão metonímica. A progressiva manifestação do seu significado simula, no quadro histórico maior, a evolução de uma neurose desde um trauma de infância longamente esquecido. Assim como Hegel falava de uma “astúcia da Razão”, que conduzia os homens sem que eles o percebessem, pode-se perfeitamente falar de uma “astúcia do inconsciente”, em que os símbolos carregados de esperança guiam a humanidade em direção a catástrofes e sofrimentos.

Um exemplo é o projeto socialista, que se apresenta como “socialização dos meios de produção” em nome de uma “sociedade sem classes”. Por trás desses slogans, o socialismo é substantivamente a unificação do poder político com o poder econômico, dissolvendo uma das principais garantias da liberdade na sociedade capitalista e anunciando a formação de uma superclasse governante onipotente e praticamente indestrutível.

A profecia embutida não é discernível somente na formulação das teorias e propostas, mas também nos símbolos que as condensam para a imaginação popular. De algum modo, a letra do hino da Internacional comunista, composta em 1871 por Eugène Pottier e posta em música em 1888 por Pierre De Geyter, a qual, até hoje, fascina a mente das multidões militantes com a imagem da bela sociedade igualitária, já contém, na sua primeira estrofe, o anúncio da debacle apocalíptica que veio a constituir a história do comunismo. Mesmo depois da queda da URSS, no entanto, essa profecia continua tão mal compreendida que muitos tentam ainda realizá-la por meios novos, mais inventivos e mais desnorteantes, enganando-se a si mesmos com uma feroz devoção ainda mais intensa e louca do que aquela que guiou os pioneiros da ditadura soviética.

Ao conclamar ao grande empreendimento da revolução socialista os “danados da terra” e os “condenados da fome” (“les damnés de la terre, les forçats de la faim”), o poema já insinua que quem os convoca à ação é, hegelianamente, “a Razão”, a deusa inspiradora de 1789. No entanto, de onde vem a voz dessa divindade? “La raison tonne en son cratère”: a Razão faz-se ouvir como o ronco temível de um trovão que, paradoxalmente, não vem dos céus, mas das profundezas de uma cratera. Ela é aí concebida, com toda a evidência, não como um ideal superior que acena aos homens desde uma altura divina, mas como uma força ctonica, subterrânea, infernal. Há uma lógica dentro dela, mas é a lógica da astúcia demoníaca, aquela mesma com que Satanás surpreende o poeta no Inferno de Dante: “Tu non pensavi che’io loico fossi”: “Não imaginavas que eu também fosse lógico”. A inevitabilidade interna do processo que inspira e dirige a ação das massas acaba indo, de fato, numa direção imprevista e catastrófica, mas nem por isso menos encadeada, com rigor implacável, a uma premissa obscura e mal compreendida. Nem mesmo a geração de comunistas que foi levada ao desespero e até ao suicídio pela revelação dos crimes soviéticos em 1956 chegou a atinar, retroativamente, com a lógica trágica imanente ao ideal socialista. Todos explicaram o desastre como fruto acidental de traições e desvios, sem notar que com isso desmentiam no ato a sua própria teoria da necessidade histórica, na qual o acaso e os caprichos individuais contam para muito pouco, ou quase nada.

O verso seguinte é ainda mais eloqüente: “C’est l’éruption de la fin”. O fim emerge do ventre de um vulcão. Fim do quê? O verso não diz. A recepção metonímica aceita, sem exame, que é o fim das injustiças. Mas, com toda evidência, a expressão “o fim”, desacompanhada de um genitivo explícito, anuncia somente morte e destruição. E as palavras que vêm em seguida ressoam com um tom ainda mais sinistro: “Du passé faisons table rase”: apagar o passado, falsificar a história em nome de um apelo estimulante, tal tem sido, de fato, uma das principais ocupações da historiografia oficial esquerdista, induzindo as massas a entregar-se entusiasticamente à busca de um propósito cuja raiz desconhecem e cujos frutos, por isso, sempre hão de surpreendê-las com o sabor amargo de um enigma diabólico.
Por: Olavo de Carvalho  Publicado no Diário do Comércio.

quarta-feira, 1 de maio de 2013

O QUE O CAPITALISMO NÃO É


Foi Karl Marx quem cunhou o depreciativo termo "capitalista" para identificar um sistema econômico que havia recebido de Adam Smith uma expressão mais descritiva e bonita: "sistema de liberdade natural". A origem negativa do termo é um dos motivos pelos quais a discussão sobre o capitalismo necessita de um esclarecimento. Seja para atacá-lo ou defendê-lo, é importante entendermos primeiro o que o capitalismo não significa.

O capitalismo não é exclusivamente "capitalista". 

A acumulação de capital é um fato existente em qualquer sociedade, independentemente de sua estrutura política e econômica. Max Weber já dizia em A ética protestante e o espírito do capitalismo que "a ganância pelo ouro é tão antiga quanto a história do homem". E que onde o capitalismo era mais atrasado encontrava-se "o reino universal da absoluta falta de escrúpulos na busca dos próprios interesses por meio do enriquecimento".

No entanto, as pessoas ainda encaram o capitalismo como um ordenamento moral, um modo de vida em que a acumulação de riqueza é o bem superior. Mas a defesa do capitalismo não significa a defesa de um homo economicus cuja única preocupação na vida é ganhar dinheiro. Há muitas coisas mais importantes do que a acumulação de capital, como a família, a religião, a arte e a cultura. E isso realça a importância da economia de mercado.

É verdade que no livre mercado há mais oportunidade para aquele que pretende enriquecer, mas nele o filósofo também tem mais oportunidade de aprender e o artista tem mais oportunidade de se expressar. E é por meio do livre mercado que o filantropo, a pessoa que deseja ajudar o próximo, dispõe de mais recursos para fazer assistência social, e, através do sistema de preços livres, pode utilizar seus recursos de forma mais eficiente.

O capitalismo não é a burocracia internacional. 

As pessoas de esquerda costumam identificar pelo termo "neoliberal" tanto as reformas modernizadoras que diminuem a participação do estado na economia quanto as organizações inter-governamentais como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. Como neoliberalismo e capitalismo são termos intercambiáveis no discurso vulgar, o FMI e o Banco Mundial aparecem como braços operadores do capitalismo internacional. Essa confusão também costuma ser feita por pessoas de direita que, definindo-se por sua oposição sem reservas à esquerda, acabam defendendo instituições burocráticas como se fossem partes integrantes do sistema capitalista.

Nesse caso, a esquerda tem razão em denunciar a arrogância de agências internacionais, que nada mais são do que uma forma de planejamento central de larga escala. Enquanto o liberal entende que a prosperidade depende da utilização do conhecimento e dos incentivos dispersos na sociedade, os burocratas internacionais acreditam que podem comandar o desenvolvimento econômico na Zâmbia ou em Guiné-Bissau de seus escritórios em Washington e Nova York. O resultado não tem sido animador.

O jornalista Andrew Mwenda, de Uganda, continua sem resposta para sua pergunta sobre exemplos históricos de países que tenham realmente prosperado graças à ajuda externa. De 1975 a 2000, o continente africano recebeu em auxílio externo uma média de 24 dólares per capita por ano. Entretanto, o PIB africano per capita diminuiu a uma taxa média anual de 0,59%. Durante o mesmo período, o PIB per capita do sul asiático cresceu a uma média de 2,94%, apesar de ter recebido em auxílio externo uma média de apenas 5 dólares per capita a cada ano. Políticas de abertura de mercado têm um efeito mais positivo do que o planejamento internacional financiado por impostos.

Na verdade, em vez de criar economias de mercado ativas e autônomas, as políticas do Banco Mundial diminuem a dependência dos governos por sua própria população, já que a receita não vem dos tributos extraídos do desenvolvimento econômico doméstico, mas das negociações com outros burocratas. O poder da população é transferido para essas organizações, criando uma cultura de dependência em que a miséria local apenas aumenta o poder de barganha dos governos que recebem auxílio externo. O resultado é a perpetuação da miséria.

O capitalismo não é a política norte-americana. 

Apesar de os Estados Unidos historicamente terem tido um de seus pilares no livre mercado, grandes contribuições para a compreensão do capitalismo foram feitas em outros países. Sem contar que, ultimamente, o governo americano tem feito um ótimo trabalho de difamação do nome do livre mercado. O crescimento nos gastos da atual administração supera o de qualquer outro presidente desde o democrata Lyndon Johnson, criador do programa assistencialista da Great Society.

George W. Bush foi o primeiro presidente americano a assinar um orçamento de mais de 2 trilhões de dólares. E também foi o primeiro presidente americano a assinar um orçamento de mais de 3 trilhões de dólares. Um aumento que inclui gastos significativos na previdência social e saúde pública, além dos gastos bélicos. As recentes aventuras no Oriente Médio também não podem ser consideradas políticas pró-capitalistas. A própria guerra e a permanência no Iraque são um experimento socialista de escala internacional, que já custou mais de 1 trilhão de dólares e cerca de 30 mil vidas.

Liberais defensores do capitalismo não acreditam que nações são violentamente construídas por meio da política, mas que se desenvolvem espontânea e pacificamente. É o socialismo que defende a prosperidade planejada. E o que o governo americano tem feito no Iraque é um planejamento de longo alcance.

O capitalismo não é a defesa irrestrita das grandes corporações. 

Os defensores do livre mercado entendem que os negócios podem tanto servir quanto prejudicar a população em geral. Em um sistema intervencionista, toda empresa que quer aumentar o seu lucro tem duas opções: investir em produtividade, para competir pelos consumidores, ou investir em lobby, para competir pelos favores políticos. A competição para servir à sociedade é capitalismo, a competição para servir ao governo é mercantilismo. São os mercantilistas que defendem legislações protecionistas de corporações contra a competição estrangeira e doméstica. Os liberais defendem um mercado aberto, em que a manutenção de um negócio depende do oferecimento de serviços e produtos que satisfaçam ao consumidor.

O capitalismo não é a perpetuação das elites. 

São os oponentes do capitalismo que, ao defender maior concentração de poder nas mãos de políticos e burocratas, constroem um sistema corrupto e estático, no qual há pouco espaço para a mobilidade social e pouca oportunidade para o desenvolvimento da criatividade humana. Há doses de capitalismo em diferentes sociedades do mundo, mas não há uma sociedade onde a economia seja puramente livre, e nem o Brasil está entre as economias mais livres do mundo.

Na verdade, de acordo com o ranking de liberdade econômica publicado anualmente pelo Fraser Institute, do Canadá, o Brasil encontra-se no 101º lugar entre 168 países examinados, empatado com Paquistão, Etiópia, Bangladesh e Haiti.

No Brasil, há excesso de burocracia para a entrada e a permanência no mercado, uma legislação trabalhista rígida, que empurra os trabalhadores para a informalidade e uma legislação tributária que já foi considerada pelo Fórum Econômico Mundial como a mais complexa de todo o mundo. Os oponentes do livre mercado insistem no controle governamental da economia para resolver os problemas que foram criados pelo próprio governo. Defender o livre mercado é defender a estrutura de um sistema econômico dinâmico em que se estimula a produção de riquezas e se permite a mobilidade social.

O capitalismo não é a defesa do tratamento desigual das pessoas. 

Há diversas formas de tornar as pessoas mais iguais. Os igualitários normalmente não pretendem torná-las mais iguais em conhecimento ou em beleza, mas em recursos, pelo menos em alguns recursos que consideram fundamentais. É bem verdade que o livre mercado não se baseia na igualdade de recursos. Mas isso não significa um tratamento desigual das pessoas. A igualdade liberal, da qual floresce o capitalismo, é a igualdade de direitos, a igualdade perante a lei. Isso significa que as questões de justiça e o uso da sua liberdade no mercado não dependem de quem você é, mas do que você faz.

O capitalismo é um sistema econômico de cooperação mútua, apoiado em uma estrutura de direitos na qual prevalece a igualdade jurídica entre as pessoas. As pessoas no livre mercado não são iguais em "distribuição de renda", mas são iguais em liberdade.

Por fim, capitalismo não é socialismo.

O capitalismo não é uma imposição do governo, nem o mercado é uma ideologia em que a teoria necessariamente precede a prática. O capitalismo é simplesmente o que ocorre quando as pessoas têm liberdade para fazer trocas, apoiadas em direitos de propriedade bem definidos. É o socialismo que necessita da mobilização social para alcançar um objetivo comum entre todas as pessoas. O socialismo precisa da pregação e da concentração de poder na autoridade manipuladora. O socialismo é a politização da vida econômica, é um discurso interminável do Fidel Castro, é a transformação de tudo o que é belo e espontâneo no dirigismo rígido da política.

O livre mercado é apenas o conjunto de ações de agentes humanos livres sobre a alocação de recursos escassos. Se os propósitos desses agentes são morais, a ordem gerada será igualmente moral. E é quando nós conseguimos sinceramente compreender e avaliar o capitalismo que passamos a ter o discernimento para defendê-lo ou atacá-lo.

Diogo Costa é presidente do Instituto Ordem Livre e professor do curso de Relações Internacionais do Ibmec-MG. Trabalhou com pesquisa em políticas públicas para o Cato Institute e para a Atlas Economic Research Foundation em Washington DC. Seus artigos já apareceram em publicações diversas, como O Globo, Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo. Diogo é Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Petrópolis e Mestre em Ciência Política pela Columbia University de Nova York. Seu blog: http://www.capitalismoparaospobres.com