sexta-feira, 7 de junho de 2013

A ALTA DAS BOLSAS INTERNACIONAIS: RECUPERAÇÃO OU BOLHA?

O Japão virou novamente notícia na semana passada. Desta vez, pela espetacular queda de mais de 7% do índice Nikkei em um único dia. Ainda que expressiva, é praticamente um leve soluço quando observamos a alta de mais de 70% nos últimos 12 meses.

E não é somente a Bolsa nipônica que traça uma trajetória de alta; investidores ao redor do globo vêm testemunhando uma forte subida no preço das ações como há muito tempo não se via.

Em Hong Kong, o índice Hang Seng ainda está longe de voltar ao patamar de 2007, mas está perto de seu maior nível desde o estouro da crise financeira, e apresenta uma alta de 21% no último ano. Ainda na Ásia, o principal índice do mercado bursátil da Índia está prestes a superar o pico histórico de 2007. Na Oceania, o índice S&P ASX, que engloba as ações de empresas australianas, já bateu os 5.000 pontos, o topo máximo dos últimos quatro anos e uma alta de quase 25% em 12 meses.











Fonte: Bloomberg






Bolsa do Japão 

Fonte: Tradingeconomics.com

Enquanto isso, na Europa, o índice DAX, da Alemanha, atingiu a máxima histórica ao superar os 8.500 pontos no dia 22 de maio (veja o gráfico abaixo). Isso representa uma alta de mais de 30% no acumulado dos últimos 12 meses. Nada mal para um país que pouco tem crescido e segue altamente exposto aos países problemáticos da União Europeia.





Fonte: Tradingeconomics.com





E o que dizer do Reino Unido? Os bretões encontram-se em meio uma forte crise, sua economia está estagnada e Estado, quebrado; ainda assim, o FTSE 100 não para de subir. Caso persista a tendência de alta, é possível testemunharmos a maior cotação de sua história, superando o nível de 6.930 pontos alcançados em dezembro de 1999.

Nem mesmo o índice da Bolsa francesa fica para trás; ainda que esteja longe de seu pico histórico, seus ganhos nos últimos 12 meses se aproximam dos 30%. A mesma análise podemos aplicar à Bolsa espanhola, em que o IBEX 35 permanece distante do auge da bolha de 2007, mas ainda assim experimenta uma alta de mais de 30% no último ano. Da mesma forma, as Bolsas austríaca e holandesa estão próximas dos 30% de ganhos anuais.

Na Escandinávia, tanto a Bolsa da Suécia quanto a da Noruega e a da Dinamarca estão bem próximas de bater o nível de 2007. Com relação ao último ano, todas registram altas superiores a 20%.

Antes de partirmos para o outro lado do Atlântico, não podemos deixar de destacar o mercado bursátil suíço. Desde maio de 2012, o índice SMI persegue uma trajetória ascendente que parece não ter fim, registrando aproximadamente 40% de crescimento. Não tardará muito para que o recorde histórico de 2007 seja quebrado.







Fonte: Bloomberg





Falando em quebra de recordes, é na América onde as Bolsas recompensam os investidores que apostaram nesse mercado nos últimos meses. Já é notório o mais alto patamar de toda a história de ambos os índices Dow Jones e S&P 500. A Bolsa da Nasdaq, entretanto, ainda não chegou lá, mas trilha o mesmo caminho, superando a marca de 20% de ganho anual e atingindo a maior cotação desde o estouro da bolha da internet, em 2000. Enquanto isso, com a exceção da Argentina, a América Latina parece ser o patinho feio das Bolsas globais no último ano.











Fonte: Bloomberg

Em face da realidade dos mercados de ações internacional, poderíamos concluir que estamos diante de uma forte recuperação econômica ou seria apenas mais um episódio de bolha especulativa inflada pelos bancos centrais?

Com parco crescimento econômico no mundo desenvolvido, elevados índices de desemprego e finanças públicas em desequilíbrio, resta claro que a alta das ações é fortemente influenciada pelas políticas monetárias expansionistas dos principais bancos centrais ao redor do mundo.

O grande experimento dos Ph.D.s no comando dos bancos centrais de países desenvolvidos tem inflado os ativos financeiros nos quatro cantos do planeta. E ainda que as commodities estejam em baixa, outros ativos reais também têm sofrido forte influência da elevada liquidez global, como é o caso do mercado imobiliário em diversos países da Europa (Suíça e países escandinavos), Canadá, Austrália e, até certo ponto, o próprio mercado americano.

Nesse ínterim, os índices (e as expectativas) de inflação de preços ao consumidor não acendem a luz vermelha. Pelo contrário, tranquilizam os banqueiros centrais de que suas políticas extraordinárias não têm repercussões negativas neste momento, nem em um longo horizonte de tempo. Qualquer semelhança com a "grande moderação" da década passada não é mera coincidência. Não é preciso lembrar o resultado não intencionado que o excesso de liquidez teve em um passado nada distante.

E quando esse grande experimento vai cessar? Difícil dizer. O Federal Reserve dá sinais altamente ambíguos. Ao passo que suas compras de Treasurys e ativos imobiliários seguem intactas – expandindo o balanço do Fed em cerca de US$ 40 bi a cada mês –, o FOMC alerta que elas podem diminuir, ou até mesmo aumentar, em um futuro próximo. Quando? Dependerá dos dados macroeconômicos.

Na Europa, o Banco Central Europeu tem, surpreendentemente, reduzido seu balanço. Mas esse não é o caso do Banco da Inglaterra, muito menos do Banco Nacional da Suíça (BNS). Este, por sinal, tem levado a cabo uma das maiores expansões monetárias do mundo desenvolvido. Historicamente tido como benchmark de retidão monetária, o BNS duplicou o seu balanço nos últimos dois anos a fim de sustentar o piso de 1,20 franco para cada euro. E como se não fosse suficiente, seu presidente, Thomas Jordan, tem dito à imprensa que tal piso pode até ser elevado.

Para completar a festa, o Banco do Japão parece estar realmente determinado a levar sua nova política, Abenomics, até as últimas consequências. Em síntese, os banqueiros centrais devem continuar inflando os ativos financeiros ao redor do globo.

Como o investidor deve navegar nessa tormenta é tarefa extremamente complexa. Ainda que se possa especular e registrar ganhos espetaculares na Bolsa no curto prazo, é preciso cautela. O tombo é sempre mais rápido que a escalada.

Artigo originalmente publicado em O Ponto Base

Fernando Ulrich formado em administração de empresas pela PUC-RS, concluiu em julho de 2010 o programa de mestrado em economia austríaca comandado por Jesús Huerta de Soto em Madri, Espanha. Atualmente trabalha no mercado financeiro. É colunista do site O Ponto Base.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

LIBERTÁRIOS, MAQUIAVEL E O PODER DO ESTADO

À medida que o movimento libertário e as ideias associadas a ele vão ganhando maior proeminência ao redor do mundo, o surgimento de ataques, calúnias e caricaturas passa a ser inevitável. Libertários, dizem nossos críticos, são antissociais e preferem o isolamento à interação com terceiros. São gananciosos e indiferentes para com os pobres. São ingênuos quanto a terroristas e inimigos externos, e se recusam a apoiar invasões de "países perigosos" (e a subsequente chacina de populações inocentes).

Estas caricaturas e concepções errôneas podem ser refutadas pela simples definição do próprio conceito de libertarianismo. Todo o ideal libertário se baseia em um princípio moral fundamental: a não-agressão de inocentes. Ninguém deve iniciar força física contra um inocente. Muito radical.

É óbvio que, não apenas não há nada de antissocial nesta ideia, como também ela representa a própria negaçãode tudo o que é antissocial, pois a interação pacífica é justamente o cerne de uma sociedade civilizada.

À primeira vista, praticamente ninguém pode se opor ao princípio da não-agressão. São poucas as pessoas que abertamente defendem atos de agressão contra pessoas pacíficas e inocentes. A diferença é que os libertários são francos e eloquentes quanto a isso, e aplicam este princípio em todas as esferas da vida, para todas as pessoas. Nossa visão vai muito além de meramente sugerir que o estado não pode incorrer em violações grosseiras das leis morais. Nós afirmamos que o estado não pode efetuar nenhum ato que seria proibido a qualquer indivíduo. Não há meio termo para as normas morais: ou elas existem ou não existem.

Exatamente por isso não podemos defender o sequestro estatal apenas porque o governo rotula esta prática de "alistamento militar obrigatório". Não podemos defender o encarceramento de pessoas que ingeriram as substâncias erradas apenas porque o governo rotula esta prática de "guerra contra as drogas". Não podemos defender o roubo e a espoliação apenas porque o governo rotula esta prática de "tributação". Não podemos defender homicídios em massa só porque o governo rotula esta prática de "política externa". Não podemos defender privilégios para grandes empresas só porque o governo rotula esta prática de "políticas de proteção à indústria". Não podemos defender a destruição do poder de compra da moeda só porque o estado rotula esta prática de "política monetária". Não podemos defender restrições à liberdade de empreendimento só porque o governo rotula esta prática de "regulamentação". E não podemos defender o parasitismo só porque o governo rotula esta prática de "políticas de bem-estar social".

Murray Rothbard, que era Ph.D. pela Universidade de Columbia, NY, dizia que você pode descobrir qual é a posição libertária a respeito de qualquer questão ao simplesmente imaginar uma quadrilha de criminosos efetuando a ação analisada.

Em outras palavras, o libertarianismo pega certos critérios morais e políticos que são defendidos por todas as pessoas decentes, e simplesmente os aplica de forma consistente e inflexível.

Por exemplo, as pessoas se opõem a monopólios porque temem o aumento de preços, a redução na qualidade dos produtos e serviços, e toda a centralização de poder decorrentes deste arranjo. O libertário apenas aplica esta preocupação em relação a monopólios ao próprio estado. Afinal, empresas privadas operando no mercado — um arranjo que supostamente devemos temer — não podem simplesmente sair cobrando o quanto quiserem por bens e serviços. Os consumidores podem simplesmente trocar de ofertante, ou deixar de usar um determinado produto e passar a usar um substituto mais próximo. Da mesma maneira, empresas não podem reduzir a qualidade de seus produtos sem perder consumidores, os quais poderão encontrar concorrentes ofertando bens e serviços mais satisfatórios.

Já o estado pode, por definição, cobrar do público o quanto ele quiser pelos "serviços" que ele oferta. Os cidadãos — os súditos do estado — têm de aceitar qualquer nível de qualidade que o estado se digne a ofertar. E jamais pode existir, por definição, qualquer concorrente ao estado, uma vez que o estado é definido como o detentor do monopólio da compulsão e da coerção em seu território.

Com suas guerras, seus genocídios, suas atrocidades totalitárias e toda a miséria criada por suas políticas intervencionistas, o estado já demonstrou ser, de longe, a mais letal instituição da história. Seus crimes menores incluem todo o seu endividamento, cujo pagamento dos juros ele impôs à população; as burocracias que se auto-perpetuam e se alimentam da fatia produtiva da população; e todo o desperdício de recursos escassos — os quais poderiam ter sido utilizados para melhorar o padrão de vida da população por meio da formação de capital — em obras e projetos arbitrários e de motivação política.

No entanto, o estado, apesar de todos os seus fracassos, consistentemente usufrui aquele benefício da dúvida que ninguém concederia a pessoas e empresas no setor privado. Por exemplo, a educação estatal produziu resultados que, na mais complacente das hipóteses, podem ser classificados de deploráveis, não obstante o crescente volume de dinheiro direcionado para este setor. Houvesse o setor privado gerado um desastre semelhante, a gritaria e as denúncias contra "os empresários ricos que estão tornando nossas crianças ignorantes" jamais acabariam. Porém, quando é o setor público quem gera resultados medonhos, tudo o que ouvimos é o silêncio. E o silêncio só é interrompido pelas demandas de que os pagadores de impostos deem ainda mais dinheiro e recursos para o estado. Se uma empresa privada fracassa, ela vai à falência. Se o estado fracassa, ele pede (e ganha) mais dinheiro.

Se uma empresa privada comete um erro grave, o mundo vem abaixo. Investigações aprofundadas, reportagens histéricas da mídia e indignações públicas parecem não ter fim. Já quando o estado faz lambança, não há absolutamente nenhum interesse na história, e quase ninguém ouve nada a respeito.

Da mesma forma, quando os tribunais estatais obrigam pessoas inocentes a ter de tolerar atrasos intermináveis e a arcar com gastos infindáveis, não há investigações, não há denúncias e não há apelos por justiça. Quando os ricos e famosos são obviamente favorecidos pelo sistema, as pessoas resignadamente aceitam o fato como corriqueiro, uma inevitabilidade. Enquanto isso, empresas de arbitragem privada, rápidas e eficientes, prosperam na surdina, silenciosamente preenchendo o vazio criado pelo péssimo sistema estatal — e dificilmente alguém nota ou se importa, muito menos aprecia estas melhoras geradas em nosso bem-estar.

Quando o estado fracassa abjetamente em cumprir com a mais mínima qualidade aceitável algum serviço que ele se propôs a fazer — como a segurança —, as pessoas veem isso como algo rotineiro. Se pessoas morrem em decorrência da falta de segurança — inclusive na área de infraestrutura — gerada pelo estado, são apenas coisas da vida. Mas quando uma empresa privada oferece um serviço que deixa a desejar, todos os tipos de impropérios e ameaças judiciais são proferidos por seus desapontados clientes.

No fundo, esta assombrosa diferença entre os padrões morais e éticos exigidos do estado e do setor privado tem suas raízes não apenas nos homens que compõem o aparato estatal, mas também naqueles que lhes dão sustentação intelectual e ideológica.

Os moralistas romanos da antiguidade, e os humanistas da Renascença que vieram depois, preconizavam abertamente que os governantes tinham de possuir um arranjo especial de virtudes morais. Tais virtudes eram, acima de tudo, as quatro virtudes cardinais (cardinal vem do latim e significa "essencial"; logo, todas as outras virtudes dependiam destas quatro): coragem, justiça, temperança e sabedoria. Embora todos os homens fossem exortados a cultivar estas virtudes, os príncipes, em particular, deveriam ir além e apresentar outras mais, como nobreza e generosidade. Estes temas foram desenvolvidos por Cícero em seu ensaio De Officiis e por Sêneca em seus ensaios Sobre a Clemência e Sobre Benefícios.

Os humanistas anteciparam a tese que futuramente viria a ser defendida por Maquiavel: a de que tem de haver uma divisão entre, de um lado, a moralidade e, do outro, qualquer postura e atitude que seja conveniente para o príncipe. Os humanistas responderam a esta tese alertando que, mesmo que a perversidade principesca não fosse punida em vida, a punição divina na próxima vida seria certa e cruel.

O que fez com que Maquiavel se destacasse tão incisivamente foi o seu radical rompimento com esta visão tradicional das obrigações morais do príncipe. Como afirmou Quentin Skinner, o grande estudioso de Maquiavel, "É só quando analisamos detidamente O Príncipe que descobrimos como estes tradicionais aspectos da moralidade humanista foram violentamente subvertidos".

O príncipe, diz Maquiavel, tem sempre de "estar preparado para agir imoralmente sempre que for necessário". E "para manter seu poder", ele — não apenas algumas vezes, mas sim frequentemente — será obrigado a "agir traiçoeiramente, cruelmente e impiedosamente".

Dado que a maioria das pessoas jamais irá interagir pessoalmente com o príncipe, Maquiavel forneceu o seguinte conselho ao governante: "Todo mundo vê aquilo que você aparenta ser", mas "poucos sabem diretamente quem você realmente é". "Um habilidoso enganador", continuou Maquiavel, "sempre encontrará uma multidão de pessoas que se deixarão ser enganadas". 

Já dá para imaginar que tipo de pessoa o príncipe será.

A visão de Maquiavel frequentemente é resumida como "os fins justificam os meios". Embora tal destilação não capture todos os aspectos do pensamento de Maquiavel, é fato que esta concisa descrição irrita os professores de teoria política. Ademais, se o fim em questão é a preservação do poder do príncipe, então "os fins justificam os meios" não é uma caracterização injusta do conselho de Maquiavel.

E é exatamente a este princípio que o estado e seus ideólogos recorrem para justificar seu não cumprimento de todas aquelas práticas que as pessoas decentes consideram morais e boas. Friedrich Hayek certa vez escreveu que,



Na ética individualista, o princípio de que o fim justifica os meios é considerado a negação de toda a moral. Na ética coletivista, ele se torna a regra suprema; não há literalmente nada que o coletivista coerente não deva estar pronto para fazer, desde que contribua para o "bem da comunidade", porque o "bem da comunidade" é para ele o único critério que justifica a ação. A ética coletivista não conhece outros limites que não os da conveniência — a adequação do ato particular ao objetivo que se tem em vista.

Praticamente todas as pessoas hoje aceitam, ao menos implicitamente, a alegação de que o estado opera em uma dimensão moral paralela, na qual as regras morais tradicionais não são aplicáveis. Outros vão além e afirmam que o estado está acima da moralidade que conhecemos. Mesmo que tais pessoas não utilizem as formulações verbais de Maquiavel, de alguma forma elas creem ser desarrazoado exigir que o estado e seus funcionários se comportem da mesma maneira que o resto de nós. O estado pode se defender e se preservar recorrendo a métodos que nenhuma empresa privada, nenhuma organização, nenhuma família e nenhum indivíduo poderiam utilizar para sua própria preservação. E aceitamos isso como algo normal.

Esta é simplesmente uma formulação mais geral do fenômeno descrito anteriormente, que diz que poucas pessoas se espantam quando o estado incorre em um comportamento que seria considerado uma monstruosidade moral caso fosse efetuado por qualquer indivíduo ou entidade.

Por fim, algumas pessoas poderão discordar e contra-argumentar dizendo que o aparato coercivo do estado é essencial para manter a ordem na sociedade, de modo que não podemos insistir fortemente no purismo libertário ao analisarmos seu comportamento. Afinal, algumas vezes o estado tem de fazer aquilo que ele tem de fazer.

Só que absolutamente todos os "serviços" que estado fornece já foram no passado ofertados de maneira não-coerciva. A questão é que nós simplesmente não somos estimulados a estudar e a aprender esta história, e a estrutura de ensino que involuntariamente adotamos desde os nossos primeiros dias na escola tornou nossa imaginação estreita e tacanha demais para conceber essa possibilidade.

Maquiavel lançou uma revolução em prol do estado. A nossa revolução é contra, mas sempre a favor da paz, da liberdade e da prosperidade.

Lew Rockwell é o presidente do Ludwig von Mises Institute, em Auburn, Alabama, editor do website LewRockwell.com, e autor dos livros Speaking of Liberty e The Left, the Right, and the State


Tradução de Leandro Roque

quarta-feira, 5 de junho de 2013

O ESTADO ASSISTENCIALISTA SUECO ESTÁ EM CHAMAS

Os distúrbios em Estocolmo continuam, noite após noite. A baderna agora já se espalhou para outras cidades da Suécia. A polícia parece estar completamente impotente para lidar com a situação. Grupos de jovens seguem quebrando vitrines de lojas, saqueando e ateando fogo em carros. Um centro cultural foi incendiado na terceira noite de tumulto em Estocolmo. As demonstrações de violência começaram no domingo em um subúrbio predominantemente de imigrantes e, logo, se espalharam para o centro da cidade.

No momento, jovens imigrantes estão nas ruas incendiando carros que pertencem a imigrantes adultos.

Um grupo comunitário chamado Megafonens reclamou de "escolas com estruturas precárias para os imigrantes", "desemprego" e "racismo estrutural", seja lá o que isso signifique.

A seguir, comento uma notícia do jornal britânico The Telegraph:

Ao caminhar pelas ruas do bairro de Husby, na semana passada, era difícil estipular à primeira vista qual era realmente o problema. Construído na década de 1970 como parte do "Million Programme" [um ambicioso programa de habitação implantado pelo Partido Social Democrata Sueco], programa que tinha o objetivo de prover casas a preços acessíveis para todos os habitantes da Suécia, este conjunto habitacional é apenas um entre as dezenas que existem na periferia de Estocolmo e que hoje abrigam populações imigrantes, incluindo um grande número de imigrantes da Somália, da Eritréia, do Afeganistão e do Iraque.

Imigração tende a ser uma coisa boa, mas apenas quando ela atrai pessoas dispostas a trabalhar duro para subir na vida. Já um arranjo que combina imigração livre com estado provedor está propenso ao desastre, pois ele se transforma em um chamariz para parasitas que querem apenas direitos e que se acham credores das benesses dos nativos.

Na Suécia, ao que tudo indica, a imigração livre em conjunto com generosos auxílios estatais concedidos a imigrantes — e uma tolerância que certamente é a maior de todas na Europa — não funcionou como o planejado. Que surpresa...

Duas décadas depois, "a fuga dos brancos" fez com que apenas um em cada cinco apartamentos em Husby fosse ocupado por suecos. E vários dos imigrantes que passaram a ocupar estes apartamentos não parecem compartilhar a visão de que uma nova vida na Suécia é um sonho que se tornou realidade. Na semana passada, a vizinhança irrompeu em revoltas e manifestações violentas, desencadeando uma das mais ferozes convulsões urbanas que a Suécia já vivenciou em décadas, o que gerou um novo debate sobre os sucessos da integração racial.

"Antigamente, a vizinhança era mais sueca e a vida parecia um sonho; hoje, há um número excessivo de estrangeiros, e há toda uma nova geração de imigrantes que cresceu aqui dentro apenas da sua cultura", disse o imigrante Mohammed Abbas, apontando para os jovens encapuzados que vagueiam pelo centro comercial de Husby.

"Ademais, na Suécia, o estado proíbe você de dar palmadas nos seus filhos para discipliná-los, e isso é um problema para pais estrangeiros. As crianças sentem que podem criar todas as confusões que quiserem, e a polícia nem mais tenta prender nenhum deles".

Além das fartas benesses para os imigrantes, o estado sueco assumiu para si a tarefa de como deve ser a educação paterna das crianças. E proibiu a punição de malfeitorias, certamente sob o argumento de que um indivíduo em determinadas condições sociais não pode ser responsabilizado por seus atos. O progressismo está apresentando sua fatura para o país que é tido como o modelo de bem-estar social na Europa.

Os distúrbios irromperem em Husby no fim de semana do dia 18 de maio, após a polícia atirar e matar um homem que brandia uma machete dentro de sua casa. Enfurecidos com aquilo que viram como brutalidade policial, jovens atearam fogo em carros e prédios, e apedrejaram policiais e bombeiros. A polícia foi então forçada a trazer efetivos adicionais de fora de Estocolmo à medida que os problemas foram se difundindo para outros subúrbios dominados por imigrantes e também para outras cidades, como Orebro, no centro da Suécia, onde 25 jovens mascarados atearam fogo a uma escola em uma sexta-feira à noite.

Então eles queimaram uma escola pública. Isso é o equivalente a um sacrilégio na Europa estatista: pior do que queimar uma igreja.

O que provocou isso? Esquerdistas, social-democratas e progressistas em geral têm a resposta na ponta da língua:

Enquanto isso, políticos da esquerda sueca, a qual comandou o país durante a maior parte do período pós-guerra, atribuíram os problemas aos cortes de gastos sociais introduzidos pelo atual primeiro-ministro Frederik Reinfeldt, cujo Partido Moderado prometeu retocar — mas não cortar — o orçamento assistencialista quando foi eleito em 2006.

É isso aí. O real problema da Suécia — o mais assistencialista e tributador país europeu — é que o país precisa de mais tributação, de mais assistencialismo e de mais redistribuição de riqueza. Isso sim vai corrigir tudo.

É fato que acusações de racismo irritam vários suecos, que praticamente não possuem uma história colonizadora, e cuja decisão de aceitar um grande número de imigrantes do Terceiro Mundo a partir da década de 1980 não adveio de nenhuma obrigação política, mas apenas da noção sueca de dever humanitário para com o resto do mundo. Desde o início, o governo procurou evitar a criação de uma classe de "estrangeiros com permissão para trabalhar", algo tipicamente alemão. E o governo evitou isso criando vários direitos para os imigrantes e introduzindo uma pletora de programas que visavam promover a integração racial.

No entanto, não obstante o governo oferecer cursos gratuitos do idioma sueco para todos os imigrantes, guetos povoados exclusivamente por estrangeiros que não falam o idioma surgiram aos montes nos últimos anos.

Que inesperado! Conceda toda uma pletora de direitos e subsídios, e se surpreenda ao constatar que não há nenhum esforço para se adaptar à cultura do país. Será que algum dia o espanto vai terminar?

"Nós somos o país que mais se esforçou para integrar essas pessoas, muito mais do que qualquer outro país europeu; gastamos bilhões em um sistema de bem-estar que foi criado para ajudar imigrantes desempregados e garantir a eles uma boa qualidade de vida", disse Marc Abramsson, líder do Partido Nacional Democrata. "Ainda assim, temos áreas em que existem grupos étnicos que simplesmente não se identificam com a sociedade sueca. Eles veem a polícia e até mesmo as brigadas de incêndio como parte do aparato repressor, e os atacam. Já tentamos de tudo, de tudo mesmo, para melhorar as coisas, mas nada funcionou. Não se trata de racismo; a questão é simplesmente que o multiculturalismo não reconhece como os humanos realmente funcionam".

Além de benesses, de direitos copiosos e da ausência de contrapartidas por parte dos beneficiados, estimule também uma integração forçada. Adicione a esta integração forçada uma boa dose de redistribuição de renda e de estímulo ao parasitismo. 

No final, quando nada sair como o planejado e os beneficiados se sentirem excluídos pelo aparato opressor, faça como os suecos e se pergunte: "Mas cadê a gratidão?".

Ainda assim, membros das gerações mais jovens de Husby afirmam ser desarrazoado os suecos esperarem que eles sejam eternamente "gratos" por aceitá-los em seu país, mesmo levando-se em conta a pavorosa situação de seus países de origem.

Entre estes está o jovem Rami al Khamisi, de 25 anos, cuja família fugiu do Iraque de Saddam Hussein em 1994, passando clandestinamente primeiro pela Turquia e depois pela Rússia, e então cruzando o báltico em um barco de pesca comandado por um contrabandista de gente. "Eu tinha seis anos e o barco estava lotado, com umas 60 pessoas", disse ele. "Um idoso morreu durante a jornada, e eles o jogaram ao mar porque seu corpo estava fedendo muito".

Mas esta, diz ele, é a sua única memória real das privações de sua vida anterior. Por isso, ele considera ser muito difícil demonstrar a mesma gratidão que seus pais ainda demonstram para o país que os acolheu. "Meus pais sempre tentam fazer comparações com Bagdá ou com a Somália para mostrar como aqui tudo é melhor", disse ele. "Mas nós, que somos da geração mais nova de imigrantes, só conhecemos realmente apenas a Suécia, e por isso só podemos comparar a nossa situação com esta que nos rodeia".

E então eles saem incendiando carros em sua própria vizinhança.

Tudo isso é a inveja em ação. Trata-se de um ressentimento contra todos os sinais visíveis de sucesso. É algo que não pode ser apaziguado com esmolas e outros tipos de assistencialismo. Assistencialismo não gera riqueza, mas gera parasitismo e dependência. E parasitismo e dependência geram ainda mais ressentimento contra aqueles que realmente trabalham e são bem de vida.

O próprio fato de que os progressistas defensores do estado assistencialista quererem apaziguar a situação oferecendo mais assistencialismo gera apenas mais ressentimento. O fato de os suecos genuínos terem dinheiro para oferecer como forma de pacificar os baderneiros enfurece ainda mais os baderneiros.

Em toda a Europa, os europeus não mais estão se reproduzindo às taxas mínimas de reposição. O futuro da Europa está nos guetos de imigrantes, os quais são atraídos pelos generosos benefícios concedidos pelo estado. Uma grande ideia.

Gary North , ex-membro adjunto do Mises Institute, é o autor de vários livros sobre economia, ética e história. Visite seuwebsite.

terça-feira, 4 de junho de 2013

BEIJAR A CRUZ

Já passou da hora de o governo do PT beijar a cruz. Afinal, muito do que ele renegou no passado e criticou no governo do PSDB passou a ser o pão nosso de cada dia da atual administração. A começar pelos leilões de concessão para os aeroportos e para a remodelação de umas poucas estradas. No início procurava mostrar as diferenças entre "nós" e "eles", em seu habitual maniqueísmo. "Nossos leilões", diziam, "visam a obter a menor tarifa para os pedágios". Ou, então, afirmavam, "nossos leilões mantêm a Infraero na administração dos aeroportos". Dessas "inovações" resultou que as empresas vencedoras nem sempre foram as melhores ou não fizeram as obras prometidas. Pouco a pouco estão sendo obrigados a voltar à racionalidade, como terão de fazer no caso dos leilões para a construção de estradas de ferro, cuja proposta inicial assustou muita gente, principalmente os contribuintes. Neles troca-se a vantagem de a privatização desonerar o Tesouro pela obsessão "generosa" de atrair investimentos privados com o pagamento antecipado pelo governo da carga a ser transportada no futuro...


Ainda que renitente em rever acusações feitas no passado (alguns insistem em repeti-las), a morosidade no avanço das obras de infraestrutura acabará por levar o governo petista a deixar de tentar descobrir a pólvora. Já perdemos anos e anos por miopia ideológica. O PT não conseguiu ver que os governos do PSDB simplesmente ajustaram a máquina pública e as políticas econômicas à realidade contemporânea, que é a da economia globalizada. Tomaram a nuvem por Juno e atacaram a modernização que fizemos como se fosse motivada por ideologias neoliberais e não pela necessidade de engajar o Brasil no mundo da internet e das redes, das cadeias produtivas globais e de uma relação renovada entre os recursos estatais e o capital privado.

Sem coragem para fazer autocrítica, o petismo foi pouco a pouco assumindo o programa do PSDB, e agora os críticos do mais variado espectro cobram deste o suposto fato de não ter propostas para o Brasil... Entretanto, a versão modernizadora do PT é "envergonhada". Fazem malfeito, como quem não está gostando, o que o PSDB fez e faria bem feito, se estivesse no comando.

Agora chegou a vez dos portos. Alberto Tamer – e presto homenagem a quem faleceu deixando um legado de lucidez em suas colunas semanais –, na última crônica que fez no Estado de S. Paulo: "Foi Fernando Henrique Cardoso que abriu os portos", recordava o esforço, ainda no governo Itamar Franco, quando Alberto Goldman era ministro dos Transportes, para dinamizar a administração portuária, abrin­do-a à cooperação com o setor privado, pela Lei 8.630 de 1993. Caro custou tornar viável aquela primeira abertura quando eu assumi a Presidência. Foi graças aos esforços do contra-almirante José Ribamar Miranda Dias, com o Programa Integrado de Modernização Portuária, que se conseguiu avançar.

Chegou a hora para novos passos adiante, até porque o Decreto 6.620 do governo Lula aumentou a confusão na matéria, determinando que os terminais privados só embarcassem "carga própria". Modernizar é o que está tentando fazer com atraso o governo Dilma Rousseff. Mas, aos trancos e barrancos, sem negociar direito com as partes interessadas, trabalhadores e investidores, sem criar boas regras de controle público nem assumir claramente que está privatizando para aumentar a eficiência e diminuir as barreiras burocráticas. Corre-se o risco de repetir o que já está acontecendo nos aeroportos e estradas: atrasos, obras malfeitas e mais caras etc. No futuro ainda dirão que a culpa foi "da privatização"... Isso sem falar do triste episódio das votações confusas, tisnadas de suspeição e de resultado final incerto no caso da última Lei dos Portos.

A demora em perceber que o Brasil estava e está desafiado a dar saltos para acompanhar o ritmo das transformações globais tem sido um empecilho monumental para as administrações petistas. No caso do petróleo foram cinco anos de paralisação dos leilões. Quanto à energia em geral, a súbita sacralização do pré-sal (e correspondentemente a transformação da Petrobras em executora geral dos projetos) levou ao descaso no apoio à energia renovável, de biomassa (como o etanol da cana-de-açúcar) e eólica. Mais ainda, não houve preocupação alguma com programas de poupança no uso da energia. Enfim, parecem ter assumido que, já que temos um mar de petróleo no pré-sal, para que olhar para alternativas?

Ocorre, entretanto, que a economia norte-americana parece estar saindo da crise iniciada em 2007/8 com uma revolução tecnológica (de discutíveis efeitos ambientais, é certo) que barateará o custo da extração dos hidrocarburetos e colocará novos desafios ao Brasil. A incapacidade de visão estratégica, derivada da mesma nuvem ideológica a que me referi, acrescida de um ufanismo mal colocado, dificulta redefinir rumos e atacar com precisão os gargalos que atam nossas potencialidades econômicas ao passado. Não é diferente do que ocorre com a indústria manufatureira, quando, em vez de perceber que a questão é o de reengajar nossa produção nas cadeias produtivas globais e fazer as reformas que permitam isso, faz-se um política de benefícios esporádicos, ora diminuindo impostos para alguns setores, ora dando subsídios ocultos a outros, quando não culpando o desalinhamento da taxa de câmbio ou os juros altos (os quais tiveram sua dose de culpa) pela falta de competitividade de nossos produtos.

As dificuldades crescentes do governo em ver mais longe e administrar corretamente o dia a dia para ajustar a economia à nova fase do desenvolvimento capitalista global (como o PSDB fez na década de 90) indicam que é tarde para beijar a cruz, até porque o petismo não parece arrependido. Melhor mudar os oficiantes nas eleições de 2014. Por: Fernando Henrique Cardoso O Globo

segunda-feira, 3 de junho de 2013

EUROPA ATRAVESSA O RUBICÃO

Os governos europeus estão aceitando a flexibilização das metas de austeridade acordadas no Tratado de Maastrich. Até a Alemanha, suposto bastião da austeridade fiscal, tem concordado com essa medida. O ministro das Finanças, Wolfgang Schauble, ao menos quer condicionar tal afrouxamento às reformas trabalhistas, mas entende que esse é o caminho, até porque o modelo americano, mais liberal, levaria a uma revolução na Europa, segundo ele.

Pode ser que sim. Afinal, décadas de “welfare state” produzem o nefasto costume de esperar sempre mais benesses estatais. Privilégios são fáceis de garantir, basta uma canetada do governo; mas são difíceis de cumprir no longo prazo, pois como sabia Margaret Thatcher, o socialismo dura até durar o dinheiro dos outros. E nesse modelo, com incentivos inadequados para a produção de riquezas, invariavelmente o dinheiro desaparece, foge para locais mais amigáveis aos negócios.

As regras do Tratado de Maastrich serviam como camisa de força para governos perdulários, algo freqüente na Europa. Mas, com uma visão míope voltada apenas para o curto prazo, as autoridades pretendem ignorar tais amarras e usar os gastos públicos para alavancar o crescimento econômico. Falsa dicotomia: o governo não produz riqueza; ele apenas tira do setor privado e transfere para o setor público, que quase sempre gasta mal, seguindo critérios políticos em vez de econômicos, e muitas vezes com desvios corruptos pela ausência do escrutínio dos donos desses recursos.

Logo, acreditar que a gastança estatal produz crescimento é ignorar as leis econômicas e da natureza humana, além da experiência histórica. Ao rasgar as regras de Maastrich, os países da zona do euro podem estar cruzando seu Rubicão, um caminho sem volta. É mais fácil tirar o gênio da garrafa do que recolocá-lo lá dentro. Os keynesianos sempre lembram as medidas anticíclicas quando é para expandir o governo, nunca para retraí-lo. Mas a conta precisa ser paga, inexoravelmente.

Com impostos absurdamente elevados, inúmeros privilégios para o setor público, déficits fiscais fora de controle, endividamento público extremamente elevado, e leis trabalhistas engessadas, a Europa vive uma espécie de esclerose econômica. Não é à toa que o desemprego, especialmente dos mais jovens inexperientes, está em patamares preocupantes. O tecido social fica esgarçado. É um terreno fértil para aventureiros de plantão, para populistas e demagogos que vendem soluções mágicas – e desastrosas.

A Europa tem um legado fantástico para o mundo, e sérias manchas no currículo também, como o fascismo, o nazismo e o comunismo. Espero que a região consiga atravessar essa crise e sobreviver, sem uma decadência muito acentuada. Para adicionar insulto à injúria, há o grave problema da islamização crescente, alimentada pelo multiculturalismo que segrega em vez de assimilar esses imigrantes.

O modelo de estado de bem-estar social precisa ser drasticamente revisto. Os europeus precisam abandonar a visão de que o estado é um ente abstrato, que obtém seus recursos de Marte e distribui benesses de forma altruísta. Nada mais falso. O caminho necessário é doloroso, mas fundamental para salvar a região. A austeridade não é o inimigo; é um remédio amargo, mas crucial. A Europa precisa de mais setor privado e menos estado. Espero que não seja tarde demais para dar essa guinada. Por: Rodrigo Constantino

NADA É TÃO RUIM QUE POSSA FICAR PIOR

Todos os especialistas sobem que temos um precário modelo de tributação do consumo - possivelmente o mais complexo do mundo. Nele, têm especial destaque as distorções provocadas pela guerra fiscal do ICMS, que decorre de combinação de fatores que vão desde a renúncia do governo federal à indispensável tarefa de coordenação de um imposto de vocação nacional até o fracasso das políticas de desenvolvimento regional, daí passando à obsolescência das sanções às entidades que concedem benefícios em desacordo com as regras estabelecidas pela Lei Complementar n.° 24, de 1975.


Ao exacerbar-se, a guerra fiscal gerou um confronto aberto entre os que não admitem a competição fiscal lícita e os que proclamam a necessidade de concessão de benefícios fiscais, sem nenhuma restrição. As intervenções do Judiciário, invariavelmente declarando a inconstitucionalidade da guerra fiscal, foram sempre respondidas com mudanças formais na lei impugnada, preservados os meios para dar curso às concessões ilícitas. Para reverter esse quadro, o governo federal apresentou vários projetos.

A guerra dos portos, inacreditáveis benefícios à importação, foi enfrentada pela Resolução n.° 13, do Senado. Essa via, contudo, afrontou o preceito, constitucional que remete à lei complementar (art. 155, § 2º, inciso XII, g) o disciplinamento de concessões e revogações de benefícios âmbito do ICMS. Ademais, o recurso à resolução representou flagrante desvio de finalidade da competência do Senado, pois a fixação das alíquotas interestaduais do ICMS pretende tão somente procede à partilha horizontal de rendas.

Ao reduzir para 4% as alíquotas das operações interestaduais subsequentes à importação de mercadorias, a resolução admitiu casuísticas exceções, à exemplo das mercadorias com conteúdo local superior à 40%, as sem similar nacional, as destinadas às indústrias de automação, informática e TV digital, as importadas pela Zona Franca de Manaus e o gás natural importado. A indeterminação dos conceitos e as extravagâncias dos requisitos estão promovendo um festival de liminares, sem falar das acumulações de créditos de dificílima liquidez.

Para os demais casos de guerra fiscal, foram propostas medidas que incluem um projeto de lei complementar (PLC) abrindo exceções ao requisito da unanimidade, a "uniformização" das alíquotas interestaduais do ICMS e a criação de fundos para compensar perdas dos entes federativos.

O PLC pretende sustar, até 31/12, a exigência da unanimidade nas decisões dos secretários da Fazenda, reduzindo o quorum para 3/5, para permitir a convalidação de benefícios concedidos ilegalmente, desconhecendo completamente a vedação constitucional de a União conceder isenções de tributos estaduais (art. 151, inciso III) e o requisito de aprovação por lei estadual específica que regule exclusivamente a matéria (art. 150, § 6.°). A regra, de resto, inviabilizará investimentos futuros, que não lograrão concorrer com empreendimentos incentivados.

O projeto de resolução visando a "uniformizar" as alíquotas interestaduais, em relação à matéria, é o mais complexo modelo já concebido pela mente humana. Afora o longo processo de redução das alíquotas, o projeto é pródigo em exceções: Zona Franca de Manaus, áreas de livre comércio, gás natural, transporte aéreo, produtos agropecuários, situações alcançadas pela malsinada Resolução n.° 13 e mercadorias sujeitas a um enigmático "processo produtivo básico" a ser aprovado pela União (sic). Assim, as duas alíquotas atuais se converterão em várias, a pretexto de "uniformização"!

Isso posto, a guerra fiscal continuará, por ausência de sanções legais, a tributação ficará mais complexa e mais créditos se acumularão. Ao contribuinte restará pagar uma conta superior a R$ 400 bilhões a serem destinados aos fundos compensatórios nos próximos 20 anos. A despeito das evidências, sou cético quanto à possibilidade de elaborar-se algo pior.

Por: Everaldo Maciel O Estado de S Paulo

domingo, 2 de junho de 2013

A INTERVENÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA É INEVITÁVEL?

Considerando-se a ideologia dominante em nossa época, e todos os incentivos que existem dentro da moderna governança democrática, a intervençãodo estado na economia (e em todas as áreas da nossa vida), embora não seja algo inevitável, é altamente provável. E isso é de se lamentar.

Neste pequeno ensaio, o termo 'intervenção estatal' se refere a atosarbitrários do governo para interferir na economia de mercado. Tais atos intervencionistas violam as regras gerais de funcionamento da interação social, regras estas que foram acordadas ao se estabelecer o arcabouço da governança. A boa sociedade é aquela cujo arcabouço da governança permite aos indivíduos auferirem os ganhos da cooperação social sob a divisão do trabalho e, consequentemente, vivenciarem os benefícios do progresso material, da liberdade individual e da paz — uma sociedade formada por indivíduos livres e responsáveis, que participam de uma economia de mercado baseada no sistema de lucros e prejuízos, que têm a oportunidade de prosperar dentro dela, e que atuam voluntariamente em comunidades voltadas para a caridade para os mais desvalidos.

A grande expansão do comércio e da tecnologia ocorrida nos séculos XX e XXI produziu um nível de riqueza material que permitiu que o custo da intervenção governamental fosse contrabalançado e permanecesse em grande medida oculto para muitos observadores. Esta possibilidade não é um fenômeno novo. Adam Smith já havia demonstrado que a busca pelo interesse próprio em uma economia de mercado é tão poderoso, que é capaz de superar "uma centena de obstruções impertinentes que as insensatas leis humanas frequentemente colocam no caminho". 

É importante enfatizar que o grande progresso material ocorrido nos últimos 100 anos não se deu por causa da expansão da intervenção estatal na economia, mas sim apesar destas intervenções. E o ponto da virada ocorrerá quando o número de 'obstruções impertinentes' aumentar de centenas para milhares, fazendo com que a economia de mercado não mais consiga ocultar os custos da insensatez das leis humanas.

Tal insensatez é simplesmente uma consequência de ideias e interesses. Sendo assim, é necessário primeiramente abordarmos as ideias que clamam por intervenções estatais para, em seguida, abordarmos o ambiente institucional que cria os incentivos para esse processo de criação de políticas.

Mario Rizzo recentemente listou três grandes ameaças ao argumento em prol de um mercado desobstruído e livre de intervenções governamentais: (1) ambientalismo fanático, (2) o ressurgimento do keynesianismo, e (3) a economia comportamental. Mas estas são apenas as mais recentes manifestações de argumentos que tentam arduamente solapar os princípios do laissez-faire. À medida que tais argumentos forem ganhando força, a probabilidade de intervenções estatais na economia também irá aumentar. A tarefa do economista comprometido com os princípios da liberdade é reduzir esta probabilidade.

No século XX, o crescimento dos governos tanto em termos de escala (gastos em porcentagem do PIB) quanto de escopo (aumento das atribuições do estado) foi astronômico. No século XXI, este crescimento se acelerou ainda mais à medida que as democracias ocidentais tiveram de lidar com a percepção de tensões geradas pela globalização e pelo aumento da disparidade de renda entre o Ocidente e o Oriente. No entanto, como vem demonstrando tão claramente a situação fiscal dos países ocidentais ao longo dos últimos anos, a escala e o escopo dos governos atuais é insustentável.

Os gastos governamentais em porcentagem do PIB nas democracias ocidentais subiram de aproximadamente 12,7% em 1913 para 47,7% em 2009. E os gastos cresceram ainda mais desde 2009 em decorrência do esforço de se estimular a demanda agregada após a crise financeira global. Os governos gastam porque as economias estão fracas, e as economias continuam fracas porque o gasto governamental — que retira recursos das mãos de investidores, empreendedores e trabalhadores produtivos, e os redireciona na forma de subsídios para grandes empresas e grupos de interesse e na forma de salários para uma insaciável e gigantesca burocracia, garantindo assim a boa vida de empresários ineficientes, de políticos e de burocratas improdutivos que regulam toda a economia — inibe o investimento privado. 

Trata-se de um ciclo vicioso que tem de ser rompido por meio de uma reavaliação da função e do escopo do governo em uma sociedade formada por indivíduos livres e responsáveis. A tarefa política e intelectual mais importante de nossa era não é a de tentar privar completamente o estado de recursos, mas sim a de construir o argumento intelectual que resulte na total retirada de atribuições ao estado.

A sociedade pode, com efeito, criar o arcabouço propício e efetuar os atos de caridade que façam com que as ações do estado se tornem desnecessárias. Mas antes disso é necessário demonstrar que os argumentos que justificam o estado não são tão incontestáveis quanto se imagina, e que tanto a oferta quanto a demanda por ações do estado possuem suas fontes em outro lugar.

Intuições morais e a demanda moral da ordem econômica

Um dos grandes desafios para uma economia de livre mercado é a crença de que as discrepâncias de renda e riqueza decorrem de ganhos imorais que são destrutivos para a ordem social. Dado que conflitos de classe tendem a descambar em conflitos reais — uma vez que os oprimidos se rebelam contra a injustiça —, uma demanda por igualdade de tratamento (uma política que não se caracterize nem pela discriminação e nem pelo controle) se transforma em uma demanda por igualdade de recursos, sendo que essa transição de um para o outro ocorre sem muito raciocínio lógico.

Esta alegação de injustiça está profundamente enraizada em nosso passado evolucionário. Como observou James Buchanan, a grande contribuição dos economistas clássicos foi a demonstração de que a autonomia, a prosperidade e a paz poderiam ser simultaneamente alcançadas por uma economia de mercado baseada na propriedade privada. Mas foi justamente no auge da confirmação empírica desta constatação, que a economia de mercado baseada na propriedade privada passou a ser criticada como sendo uma forma ilegítima de organização social por causa das injustiças que ela permitia. O desenvolvimento da teoria da produtividade marginal dos salários não impediu o alastramento da crença moral de que o capitalismo era injusto. A lógica fria da ciência econômica entrou em conflito com as emoções ardentes da injustiça moral.

Por que existe esta tensão? A ciência econômica é uma disciplina científica que oferece conjecturas sobre como o mundo funciona, ao passo que a teoria moral fornece juízos e sugere como o mundo deve ser. Mas e se nossas intuições morais estiverem em conflito com as demandas institucionais que devem ser atendidas para que os indivíduos possam prosperar? Hayek postulou que esta tensão entre nossas intuições morais e as demandas morais da ordem econômica era um produto de nosso passado evolucionário. Culturalmente, os seres humanos foram condicionados por normas sociais que eram apropriadas a um pequeno grupo que vivia conjuntamente. Porém, com a divisão do trabalho, com a especialização e com o comércio, as normas de ordem íntima tiveram de dar lugar a normas mais apropriadas para as interações com terceiros anônimos.

Nosso dilema não é como garantir uma justa divisão de uma quantidade fixa de renda, mas sim o de decidir quais regras são apropriadas para governar nossas vidas de modo a permitir que estranhos vivam bem em sociedade ao perceberem os ganhos que podem obter por meio das trocas comerciais entre si. A moralidade vigente em um grupo pequeno tem de ser substituída pela moralidade vigente em um grupo grande. Em vez de empatia moral são necessárias regras gerais que sejam uniformemente aplicáveis — regras que governem interações anônimas. Deirdre McCloskey argumenta que esta mudança de paradigmas — o abandono da moralidade dos antigos e a ascensão das virtudes burguesas — resultou no milagre do crescimento econômico moderno, melhorando as vidas de bilhões de pessoas inicialmente na Europa e nos EUA, e depois se alastrando por todo o mundo.

O estado não deve ser requisitado a intervir para abolir injustiças relacionadas às desigualdades de renda que naturalmente surgem em uma genuína economia de livre mercado. No livre mercado, indivíduos auferem lucros ao satisfazer as demandas dos consumires — a perspectiva do lucro não apenas alerta o empreendedor para oportunidades de trocas benéficas, mas também para ganhos oriundos da inovação tecnológica. A concorrência reduz os custos ao mesmo tempo em que estimula o aprimoramento da qualidade dos produtos; sendo assim, as empresas poderão auferir lucros mais altos somente se melhor atenderem as demandas de seus consumidores. Em última instância, são os consumidores que determinam a lucratividade de empreendimentos comerciais ao decidirem se consomem ou se se abstêm de consumir seus produtos. Não há absolutamente nada de injusto nesta distribuição. Sim, Bill Gates possui mais riquezas do que eu, mas somente porque ele soube como melhor atender as demandas de um número bem maior de indivíduos.

Restringido as depredações privadas, criado depredações públicas

A ideia de que é necessário restringir as depredações privadas é utilizada para justificar a própria existência do estado: sem um soberano para definir e impingir direitos de propriedade, a sociedade rapidamente se degeneraria em uma guerra de todos contra todos, e a vida seria sórdida, bestial e curta. Todos estariam em melhor situação se cooperassem uns com os outros. Mas os oportunistas estariam ainda melhores se, em decorrência deste arranjo, eles pudessem confiscar a riqueza criada pela cooperação de todos. Logo, a única maneira de sair deste equilíbrio predatório é estabelecendo uma terceira parte que seja forte e impositiva.

Porém, tais entidades também são capazes de gerar depredações muito maiores e mais perigosas do que os predadores privados. Pesquisas feitas nos últimos 25 anos mostram que comunidades podem coibir a depredação privada criando regras que (a) limitem o acesso, (b) atribuam responsabilidades e imputabilidades, e (c) instituam punições graduais a infratores. Em grupos pequenos, isso é majoritariamente feito por meio da reputação e do ostracismo; já em grupos grandes, nos quais o agente transgressor não é claro, a dissuasão e a punição efetiva têm de ser instituídas sem recorrer a uma entidade governamental, ou pelo menos sem expandir o papel do governo.

Embora os seres humanos historicamente sempre tenham demonstrado uma propensão à violência (estupros, pilhagens e saques), também descobrimos maneiras de superar esta propensão e de constatar os benefícios gerados pela cooperação social pacífica (permuta, escambo e comércio). Os arranjos que satisfazem a nossa propensão à cooperação se tornam ricos e criam pessoas saudáveis e ricas, ao passo que os arranjos que satisfazem nossa propensão à violência submetem seus indivíduos a uma vida de ignorância, pobreza e sordidez.

O estado, na condição de detentor do monopólio geográfico dos meios de coerção, está na vantajosa posição de depredar e violar os direitos humanos de seus cidadãos e de empobrecer a população. Dar poder ao estado para que ele possa restringir as depredações privadas cria a possibilidade de estimular as depredações públicas. Como enfatizou David Hume, ao criarmos instituições governamentais, temos de pressupor que todos os homens são patifes e safados, e que as restrições apropriadas devem ser embutidas no sistema para impedir um comportamento safado mesmo que safados estejam no poder. Uma economia política robusta, similar àquela que os economistas políticos clássicos queriam estabelecer, é uma que possua severas restrições à capacidade predatória do governo, de modo que homens maus, caso cheguem ao poder, sejam incapazes de fazer grandes estragos.

Falhas de mercado se transformam em justificativa para impedir os ajustes do mercado

A teoria das falhas de mercado fornece a justificativa econômica perfeita para a intervenção do governo em uma economia de livre mercado. As quatro básicas 'falhas de mercado' são: (1) monopólio, (2) externalidades, (3) bens públicos, e (4) instabilidade macroeconômica. 

Para os economistas clássicos, o monopólio é um produto da intervenção do estado e não das forças de mercado. Lamentavelmente, essa definição foi suprimida no final do século XIX e início do século XX e deu lugar à teoria de que o monopólio era uma consequência da concorrência capitalista. Não obstante todas as evidências empíricas e todos os desenvolvimentos teóricos comprovando que a definição dos economistas clássicos é a explicação mais coerente para o monopólio, a ideia de que o poder monopolista é consequência do capitalismo desenfreado ainda prevalece.

Os economistas clássicos argumentaram que os bens públicos de fato resultaram em uma demanda por um aumento da intervenção do estado na economia. Estradas e pontes, por exemplo, não seriam ofertadas pela economia de mercado porque os indivíduos iriam se beneficiar delas, mas, devido à sua natureza, podiam se esquivar de pagar por esse benefício. Logo, esse problema do 'carona' impediria que uma empresa pudesse ofertar tal serviço de forma lucrativa. Tal intuição se transformou na teoria pura dos bens públicos. Mas existem soluções tecnológicas para o problema do 'carona' e há numerosos exemplos ao longo da história de barganhas coaseanas que permitiram soluções privadas para bens públicos.

De acordo com a teoria dos efeitos externos, a economia de mercado irá com frequência produzir um excesso de efeitos colaterais ruins — como poluição — e uma escassa quantidade de bens "bons", pois os custos sociais não estão alinhados aos custos privados no processo de decisão. A 'mão invisível' seria incapaz de reconciliar essas diferenças. Mas a principal razão para esse descompasso é a incapacidade do estado de definir, atribuir e impingir direitos de propriedade. A poluição é um bom exemplo: por causa de uma definição obscura e de uma débil proteção dos direitos de propriedade, indivíduos irão gerar um excesso de poluição; no entanto, se fosse possível especificar e deixar claros os direitos, os deveres e as punições, a internalização da externalidade iria reduzir a poluição até seu nível ótimo. A ineficiência de hoje representaria uma oportunidade de lucro amanhã para o empreendedor que soubesse corrigir com eficácia esta ineficiência. A intervenção estatal, por outro lado, obstrui esse processo de descoberta e de ajuste de mercado, e, em vez disso, oferece apenas uma solução política.

As mais significativas alegações para a intervenção estatal na economia atualmente advém do argumento da instabilidade macroeconômica. O mercado livre e desimpedido é instável e propenso a sofrer crises periódicas; isso gera incerteza quanto ao futuro, desemprego e pobreza. Nas economias ocidentais, a Grande Depressãodestruiu a fé de toda uma geração na economia de mercado. A atual crise financeira global novamente está desafiando essa crença. Porém, em ambos os casos, as políticas do governo foram as responsáveis pelas distorções econômicas que levaram à atual crise econômica. A duração e a severidade da recuperação se devem às políticas monetárias e fiscais fracassadas, e às crescentes regulamentações e restrições que inibem o processo de reajuste de mercado.

Problemas de escolha pública, e não de falha de mercado, são a razão do intervencionismo

Mesmo que os contra-argumentos e as evidências em prol da não-intervenção sejam persuasivos, a teoria da escolha pública explica que, por falta de restrições sobre a ação democrática, as demandas levarão inevitavelmente a intervenções na economia. Independentemente de qualquer que seja o argumento intelectual clamando por intervenção estatal, o fato é que o processo político é governado, do lado da demanda, pelo voto dos eleitores e, do lado da oferta, pelo comportamento de quem está em busca destes votos.

Sendo assim, políticos irão priorizar medidas que gerem consequências imediatas e facilmente identificáveis, e irão postergar ou até mesmo ignorar medidas sensatas que gerem consequências apenas no longo prazo, mesmo que estas sejam geradoras de riqueza. E terão os votos da maioria dos eleitores, que querem justamente isso. 

Ademais, o governo, por definição, detém um monopólio geográfico do uso dos meios de coerção. Sendo assim, há um forte incentivo para que lobistas e grupos de interesse capturem essa poderosa entidade para se beneficiarem à custa do restante da população. O governo pode ser, e será, usado por estas pessoas a menos que elas sejam efetivamente impedidas de fazer isso.

Uma política sem discriminação ou domínios

O enigma da atual economia política é descobrir regras definitivas que permitam a formação de uma sociedade criadora de riquezas.

Adam Smith já havia argumentado que os governos, tanto os antigos quanto os atuais, apresentam uma acentuada propensão a praticar incessantemente o truque de incorrer em déficits, acumular dívidas e inflacionar a moeda para monetizar a dívida. Na atual crise do mundo ocidental, este infindável ciclo de déficits, endividamento e desvalorização da moeda se tornou incontrolavelmente evidente. 

Defrontando-nos com estes artifícios fraudulentos, a única maneira de restringir o estado é amarrando as mãos dos prestidigitadores que o comandam. Uma medida que seria efetiva já no curto prazo é a criação de regras para as políticas fiscais e monetárias. Ainda melhor seria retirar responsabilidades do estado. É verdade que não é possível retirar a política fiscal da esfera de ação do estado, mas é perfeitamente possível retirar a política monetária do controle do estado. Não só é possível, como historicamente ela já esteve fora do domínio do estado em vários países durante certos períodos. Logo, alguma combinação entre restrições constitucionais, descentralização fiscal e desestatização da moeda pode servir para reprimir o poder do estado de maneira efetiva.

Sem essas medidas drásticas, a demanda por contínuas e crescentes intervenções do estado na economia, na sociedade e nas questões morais e religiosas será uma constante. É necessário uma rejuvenescida defesa do argumento liberal-clássico em prol de regras que amarrem completamente o governo. Somente assim será possível reduzir a probabilidade de intervenções estatais e desencadear as energias criativas e todo o poder criador de riqueza do livre mercado.

Por: Peter Boettke é professor de economia na George Mason University. Visite seu website: http://www.peter-boettke.com/

sábado, 1 de junho de 2013

OS AMBIENTALISTAS E SUA AGENDA ANTI-HUMANA NOS FAZEM DE IDIOTAS

Os ambientalistas, com a ajuda de políticos e de outras burocracias globalmente poderosas, foram bem-sucedidos em impor sobre todo o globo um conjunto de ideias que já custou dezenas de milhões de vidas humanas.

Peguemos o exemplo mais famoso deste totalitarismo homicida. Em 1962, a famosa bióloga americana Rachel Carson publicou o livro Silent Spring, uma fábula sobre os supostos perigos dos pesticidas. O livro se transformou em um clássico do movimento ambientalista, não obstante se tratasse de uma obra de ficção. O livro exerceu uma influência poderosa sobre vários governos, o que levou à proibição mundial do uso do DDT (Dicloro-Difenil-Tricloroetano, o primeiro pesticida moderno) ainda no início da década de 1970.

Em 1970, pouco antes da proibição do DDT, a Academia Nacional de Ciências dos EUA declarou que o DDT havia salvado mais de 500 milhões de vidas humanas ao longo das últimas três décadas ao erradicar os mosquitos transmissores da malária. Naquele ano, a Academia lançou um relatório no qual dizia: "Se tivéssemos de eleger alguns produtos químicos aos quais a humanidade deve muito, o DDT certamente seria um deles. ... Em pouco mais de duas décadas, o DDT evitou que 500 milhões de seres humanos morressem de malária, algo que sem o DDT seria inevitável".

Antes da proibição do DDT, a malária estava prestes a ser extinta em alguns países.

O DDT foi banido pelos governos no início da década de 1970 não obstante o fato de não ter sido apresentada nenhuma evidência científica comprovando que ele gerasse os efeitos que Carson e o movimento ambientalista alegavam que ele gerava.

Em seu livro Eco-Freaks: Environmentalism is Hazardous to Your Health, John Berlau, pesquisador e diretor do Center for Investors and Entrepreneurs do Competitive Enterprise Institute, escreveu que "Nem um único estudo mostrando o elo entre exposição ao DDT e contaminação humana já foi replicado". Não apenas isso: em um estudo de longo prazo, alguns voluntários comeram 900g de DDT durante um ano e meio; até hoje, mais de vinte anos depois, nenhum deles apresentou nenhum efeito colateral em sua saúde.

O Dr. Henry Miller, membro sênior da Hoover Institution, e Gregory Konko, membro sênior da Competitive Enterprise Institute, escreveram em seu artigo no revista Forbes, "Rachel Carson's Deadly Fantasies", que o banimento do DDT foi responsável pela perda de "dezenas de milhões de vidas humanas, majoritariamente crianças em países pobres e tropicais. Tudo isso em troca da possibilidade de uma pequena melhoria na fertilidade das aves de rapina. Esta continua sendo uma das mais monumentais tragédias humanas do século passado."

Além das mortes de literalmente milhões de pessoas no Terceiro Mundo em decorrência da malária, o banimento do DDT também gerou inúmeras colheitas desastrosas, uma vez que insetos vorazes que eram combatidos pelo DDT puderam se proliferar novamente — e praticamente não há substitutos para o DDT a preços acessíveis nos países pobres. 

Mesmo se as estimativas da Academia Nacional de Ciências em relação às vidas salvas pelo DDT estivessem exageradas por um fator de dois, Rachel Carson e sua cruzada contra o pesticida ainda seriam responsáveis por mais mortes humanas do que a maioria dos piores tiranos da história do mundo.

Não obstante todas as evidências de que o DDT, quando utilizado corretamente, não apresenta nenhuma ameaça para o ambiente, para os animais e para os seres humanos, os ambientalistas extremistas continuam defendendo sua proibição. Só na África, milhões continuam morrendo de malária e de outras doenças. Após a Segunda Guerra Mundial, o DDT salvou milhões de vidas na Índia, no Sudeste Asiático e na América do Sul. Em alguns casos, as mortes por malária caíram para quase zero. Após o banimento do DDT, as mortes por malária e por outras doenças voltaram a disparar. Por que então o banimento não é revogado?

Porque este é justamente o objetivo destes extremistas: controle populacional. Alexander King, co-fundador do Clube de Roma, disse: "Na Guiana, em menos de dois anos, o DDT já havia praticamente aniquilado a malária; porém, isso levou a uma duplicação das taxas de fecundidade. Portanto, meu maior problema com o DDT, olhando em retrospecto, é que ele ajudou a intensificar o problema da explosão demográfica". 

Jeff Hoffman, representante ambientalista, escreveu no site grist.org que "A Malária era, na realidade, uma medida natural de controle populacional, e o DDT gerou uma volumosa explosão populacional em alguns locais onde ele havia erradicado a malária. Basicamente, por que seres humanos devem ter prioridade sobre as outras formas de vida? . . . Não vejo ninguém respeitando os mosquitos aqui nesta seção de comentários." 

O livro de John Berlau cita vários outros exemplos de desprezo dos ambientalistas pela vida humana e de como eles transformaram os políticos em seus idiotas úteis.

A organização mundial da Saúde estima que a malária infecta pelo menos 200 milhões de pessoas, das quais mais de meio milhão morrem anualmente. A maior parte das vítimas da malária são crianças africanas. Pessoas que defendem a proibição do DDT são cúmplices nas mortes de dezenas de milhões de africanos e de asiáticos. O filantropo Bill Gates arrecada dinheiro para milhões de redes contra mosquitos; porém, para manter suas credenciais acadêmicas intactas, a última coisa que ele advogaria seria o uso do DDT. Notavelmente, todos os políticos — principalmente os negros, que deveriam se sensibilizar com seus irmãos africanos — compartilham esta visão.

A morte de Rachel Carson não colocou um fim na insensatez ambientalista. O dr. Paul Ehrlich, biólogo da Universidade de Stanford, em seu best-seller de 1968, The Population Bomb, previu que haveria uma enorme escassez de comida nos EUA e que "já na década de 1970 ... centenas de milhões de pessoas irão morrer de fome neste país". Ehrlich via a Inglaterra em uma situação ainda mais desesperadora, e dizendo que "Se eu fosse um apostador, apostaria uma quantia substancial de dinheiro que a Inglaterra deixará de existir até o ano 2000".

No primeiro Dia da Terra, celebrado em 1970, Ehrlich alertou: "Dentro de dez anos, todas as mais importantes vidas animais nos oceanos estarão extintas. Grandes áreas costeiras terão de ser evacuadas por causa do fedor de peixe morto". Apesar de todo este notável currículo, Ehrlich continua até hoje sendo um dos favoritos da mídia e do mundo acadêmico.

E há ainda as insensatezes previstas pelos governos. Em 1914, o U.S. Bureau of Mines [uma espécie de Ministério das Minas e Energia americano] previu que as reservas de petróleo do país durariam apenas mais 10 anos. Em 1939, o Ministério do Interior americano revisou as estimativas, dizendo agora que o petróleo americano duraria mais 13 anos. Em 1972, um relatório publicado pelo Clube de Roma, Limits to Growth, disse que as reservas de petróleo em todo o mundo totalizavam apenas 550 bilhões de barrias. Com este relatório em mãos, o então presidente Jimmy Carter disse que "Até o final da próxima década, poderemos exaurir todas as reservas de petróleo existentes em todo o mundo". E acrescentou: "Todo o petróleo e todo o gás natural de que dependemos para 75% de nossa energia estão acabando."

Quanto a esta última previsão de Carter, um recente relatório do U.S. Government Accountability Office [braço auditor do Congresso americano] em conjunto com especialistas do setor privado estima que, mesmo que apenas metade do petróleo existente na formação geológica do Green River nos estados de Utah, Wyoming e Colorado seja recuperada, isso já "seria igual a todas as reservas de petróleo que comprovadamente existem no mundo". Trata-se de uma estimativa de 3 trilhões de barris, mais do que a OPEP possui em suas reservas. Mas não se preocupe. Tanto Carter quanto Ehrlich ainda são frequentemente convidados pela mídia para emitir suas opiniões.

Nossa contínua aceitação das manipulações, das mentiras e do terrorismo ambientalistas fez com que governos ao redor do mundo, além de banirem o DDT, implantassem políticas públicas assassinas em nome da "economia de energia" — como, por exemplo, as regulamentações estatais que exigem automóveis com menor consumo de combustível, o que levou a uma redução do tamanho dos carros e a um aumento no número de acidentes que, em outras circunstâncias, não seriam fatais.

Da próxima vez que você vir um ambientalista alertando sobre algum desastre iminente, ou dizendo que estamos prestes a vivenciar a escassez de alguma coisa, pergunte para ele qual foi a última vez que uma previsão ambientalista se mostrou correta. Algumas pessoas estão inclinadas a rotular os ambientalistas de idiotas. Isto é um juízo errôneo. Os ambientalistas foram extremamente bem-sucedidos em impor sua agenda. Somos nós que somos os idiotas por termos ouvido e aceitado tudo passivamente, e por termos permitido que os governos acatassem suas ordens.

Por: Walter Williams é professor honorário de economia da George Mason University e autor de sete livros. Suas colunas semanais são publicadas em mais de 140 jornais americanos.

Tradução de Leandro Roque