terça-feira, 23 de julho de 2013

IMPOSTOS : BRASIL É LÍDER MUNDIAL NA COBRANÇA

O Brasil continua sendo o país em que se paga mais impostos, no comparativo mundial. 

 Veja o quadro que circula na Internet, com base em dados do Bando Mundial


Os 10 países onde MENOS se trabalhou em um ano para pagar impostos.

1. Maldivas:........................... 0 horas
2. Emirados Árabes Unidos: 12 horas
3. Bahrein: ............................36 horas
4. Qatar: ...............................36 horas
5. Bahamas: ..........................58 horas
6. Luxemburgo: ....................59 horas
7. Omã: .................................62 horas
8. Suíça: ................................63 horas
9. Irlanda: .............................76 horas
10.Seicheles: ........................76 horas

Os 10 países onde MAIS se trabalhou em um ano para pagar impostos:

1. Brasil: ..................................2.600 horas ( é mais que o dobro do 2º colocado! 
2. Bolívia:................................ 1.080 horas
3. Vietnã:................................... 941 horas
4. Nigéria:.................................. 938 horas
5. Venezuela:............................. 864 horas
6. Bielorrússia: ...........................798 horas
7. Chade: ................................... 732 horas
8. Mauritânia:............................ 696 horas
9. Senegal:................................. 666 horas
10.Ucrânia:................................ 657 horas

Fonte: Banco Mundial (Doing Business 2011)

POR QUE OS CARROS DE HOJE SÃO TODOS IGUAIS


Aquele carro antigo, que havia sido especialmente alugado para a ocasião, esperava pelos noivos para levá-los a uma festa logo após a cerimônia do casamento. Eu estava entre aqueles convidados que se mostravam mais embevecidos pelo carro do que pela festa de casamento em si. Absolutamente maravilhoso.

Era um Studebaker. Até onde sei, era um conversível da linha Commander, de 1940. Tive de ir pesquisar: esta empresa nasceu em 1852 e morreu em 1967, e produziu alguns dos carros mais visualmente fantásticos de sua época. Ela até chegou a produzir um carro elétrico em 1902! Mas os controles de preços adotados pelo governo americano durante a Segunda Guerra Mundial encolheram suas margens de lucro, o que gerou um processo de fusão em toda a indústria automotiva, que acabaria por matar a empresa. 

Mas, naquele sábado à tarde, o carro ainda estava fabuloso, após todos esses anos. Estávamos em um estacionamento a céu aberto repleto de automóveis modelos novos. Mas ninguém dava a mínima para eles. Estávamos todos obcecados com este velho Studebaker. Seu nome havia sido escolhido corretamente: aquele automóvel despertava atenção. O formato fazia dele uma obra de arte. O capô não era nada parecido com o que existe hoje. O interior de couro vermelho era extremamente luxuoso.

Ficamos lá extasiados, em total admiração. Divagamos um pouco sobre como seria o consumo de combustível. Não deveria ser muito maior do que o dos gigantescos utilitários atuais. Ainda assim, concordamos que pagar mais para dirigir algo tão legal valeria a pena.



Studebaker Commander Convertible

No entanto — e eis todo o problema —, isso não é uma opção. Nenhum fabricante está autorizado a fazer um carro igual a esse. Façamos um pequeno retrospecto e pensemos um pouco. Na década de 1930, os telefones eram horrorosos, pesados e nada práticos, e você era um grande sortudo se tivesse um. Ninguém hoje abriria mão de um smartphone em troca de uma daquelas coisas antigas. O mesmo é válido para computadores, televisões, fogões, fornos microondas, sapatos etc. Ninguém quer retroceder no tempo. 



Já com os carros, a situação é distinta. Nossa sensação de nostalgia só faz aumentar, em vez de diminuir. Mas o problema é que nem sequer temos a opção de voltar ao passado. Não mais teremos carros bonitos como os de antigamente. O governo e suas dezenas de milhares de regulamentações específicas para o setor automotivo não permitem. 

No dia anterior ao casamento, estava eu em uma loja de conveniência quando vejo outro carro fabuloso, desta vez um pequeno modelo esportivo. Mesmo eu que não ligo muito para carros fiquei extasiado. Normalmente, não me importo muito com o modelo de carro que dirijo. Mas aquele carro em específico era sensacional demais para não despertar a minha admiração.

Perguntei ao proprietário onde ele havia comprado, que modelo era, quem era o fabricante etc. Aquele carro havia desafiado a minha impressão de que todos os carros atuais são iguais. Ele me disse que ele próprio o havia construído em sua garagem. Ele comprou todo o kit de montagem na Factory Five Racing.

Perguntei: "Você hoje tem de montar seu próprio carro porque nenhum fabricante pode vender algo assim?"

"Correto!", disse ele.

Estas empresas que se especializaram em vender componentes automotivos avulsos são uma forma fantástica de você conseguir respirar em uma era em que o controle governamental sobre o mundo físico é total. Elas são uma maneira legal de driblar as imposições estatais. A lei ainda permite que colecionadores, proprietários de carros antigos e praticantes de hobby possam dirigir estes belos carros. Mas ela não permite que os fabricantes atuais comercializem carros que se pareçam com estes.

Aquele antigo ditado diz que "Se você quer algo bem feito, faça você mesmo." Há apenas um problema com este ditado: em uma economia desenvolvida, ele não deveria ser válido. Deveríamos poder tirar vantagem da divisão do trabalho. Assim como não temos de tecer nossas próprias roupas, não deveríamos ter de construir por conta própria nossos carros. Mas foi justamente a este caminho que as regulações estatais nos levaram.

Você por acaso já parou para pensar por que todos os fabricantes constroem carros visualmente sensacionais — os quais elas chamam de "carros-conceito" —, mas por algum motivo tais carros nunca estão à venda? Sempre fiquei intrigado em relação a isso. Imaginava que era simplesmente porque os carros-conceito eram caros demais para serem fabricados. Mas não é por isso. A questão é que as regulamentações estatais não permitem que eles sejam comercializados.

As coisas não aconteceram todas de uma só vez. As proibições foram graduais e ocorreram ao longo de quatro décadas, sempre em nome da segurança e do ambientalismo. Tudo começou nos EUA, em 1966, com a criação daNational Highway Traffic Safety Administration [agência governamental que faz parte do Departamento de Transportes, cuja missão é "proteger vidas, impedir danos, e reduzir acidentes automotivos"]. Depois surgiuEnvironmental Protection Agency [agência governamental encarregada de "proteger a saúde humana e o ambiente"]. Inevitavelmente, dezenas de outras agências surgiram depois. Todas queriam se apossar de uma fatia do automóvel.

A princípio, cada regulamentação criada parecia fazer algum sentido. Afinal, quem não quer estar mais seguro? Quem não quer consumir menos combustível?

Mas a realidade é que todos esses decretos são impostos sem a mais mínima consideração quanto à realidade dos custos e benefícios. Mais ainda: eles são criados sem qualquer consideração em relação ao seu impacto sobre o design de um carro. E, uma vez que as regulamentações são impostas, elas jamais são revogadas. Elas são mais definitivas do que as normas sobre uma peça de software patenteada.

Agora o fim do jogo já chegou. Por mais que tentem, os próprios fabricantes passam aperto para tentar diferenciar seus carros dos de seus concorrentes. A homogeneização do automóvel já está banalizada. Todos os carros atuais são parecidos. Como já disse, nunca fui muito entusiasta de carros e, exatamente por isso, só comecei a notar esse fenômeno nos últimos 12 meses. E, ainda assim, pensei que estava apenas imaginando coisas. Porém, algumas pessoas brincando com o Photoshop descobriram que, se você apenas trocar a grade frontal dos carros, é possível fazer uma BMW ficar igual a uma Kia e um Hyundai ficar idêntico a um Honda. É tudo um só carro.

Realmente, tem de ter uma explicação para isso. Fui procurar e descobri um vídeo feito pela CNET que enumera cinco motivos para os carros de hoje serem iguais: decretos para que a frente do carro seja mais alta para proteger pedestres, decretos que limitam a altura do carro para economizar combustível e uma traseira grande que contrabalance a frente grande. Essa combinação fez com que tanto o pára-brisa quanto todas as janelas dos carros se tornassem irritantemente pequenas, o que afeta a visibilidade e acaba tornando os carros menosseguros para serem dirigidos. Adicionalmente, o peitoril das janelas ficou mais alto, o que dá a claustrofóbica sensação de se estar dentro de um tanque. Em outras palavras, uma histeria em relação à segurança e ao ambiente destruiu toda a estética dos carros.

Pouco importa que segurança e ecologia criem resultados contraditórios. Quanto menor o consumo de combustível, mais leve e delicado tem de ser o carro e maior é a probabilidade de você morrer em um acidente. As regulamentações que especificam um consumo máximo de combustível certamente já mataram muitas pessoas. Similarmente, como princípio geral, quanto mais seguro for o carro, mais combustível ele irá consumir. Enquanto isso, a própria gasolina vem sendo arruinada em decorrência de todas as misturas etílicas que o governo determina que devem ser acrescentadas, o que reduz a vida útil do motor.

Estas regulamentações são as responsáveis pelo desaparecimento da perua e pelo subsequente domínio do mercado por veículos enormes que podem ser classificados como caminhonetes, os quais são regulados por um padrão distinto. É isso mesmo: regulamentações criadas para reduzir o consumo de combustível geraram o efeito exatamente oposto ao estimular as pessoas a abandonar os carros e ir para os utilitários — que era exatamente o que os grandes fabricantes queriam. Não é de se estranhar que as críticas mais contundentes às regulamentações que estipulam valores máximos para consumo de combustível não sejam feitas pela indústria automotiva, mas sim pelos usuários.

É verdade que ninguém tinha a intenção de acabar com a diversidade, a funcionalidade e a beleza dos carros. Mas isso foi exatamente o que aconteceu. E é isso o que acontece sempre que as elites políticas e burocráticas impõem sobre os cidadãos o seu próprio sistema de valores, desconsiderando totalmente os valores subjetivos dos produtores e dos consumidores. Eles são os mestres e nós somos os escravos, e cabe a nós aceitarmos nosso fardo resignadamente.

Considere a questão a respeito dos pedestres. Quantas vidas realmente já foram salvas por uma frente mais elevada? Ninguém sabe. Mas a própria regulamentação parece excluir a possibilidade de que motoristas e pedestres possam resolver seus problemas por conta própria, sem uma intervenção regulatória. Em outras palavras, estamos sendo tratados como crianças. Aliás, pior ainda. Estamos sendo tratados como se simplesmente não possuíssemos cérebro.

A situação é muito séria. Trinta anos atrás, os futuristas imaginavam que os carros do futuro seriam belos e estonteantes, e dariam imenso prazer ao serem dirigidos. Considere, por exemplo, este Triumph, que era tido como o "carro do futuro". Este futuro foi totalmente destruído. Os reguladores o transformaram no carro do passado, um sonho frustrado que teve de morrer para abrir espaço para estas coisas esquisitas e homogeneizadas que temos a permissão de comprar atualmente.

Houve uma época em que os ocidentais se orgulhavam de seus carros e zombavam implacavelmente os carros horríveis que eram produzidos sob um sistema socialista, como, por exemplo, na Alemanha Oriental. O Trabant já entrou para a história como um dos piores carros já produzidos. Porém, analisando em retrospecto, o fato é que você não apenas conseguia ver algo através das janelas, como também a intenção ao menos parecia ser a de colocar os interesses do motorista acima dos interesses da Mãe Natureza e dos não-motoristas. Parece que os planejadores centrais socialistas tinham um pouco mais de bom senso do que os burocratas reguladores da atualidade.

No final, se o objetivo é proteger os pedestres e a Terra, então o transporte coletivo e as bicicletas são o futuro. E todos nós sabemos que é exatamente isso que eles querem. Ano passado, por exemplo, o governo Obama — e é dos EUA que saem todas essas regulamentações idiotas — anunciou novos padrões de consumo de combustível a serem obedecidos até 2025, padrões estes aos quais nenhum carro atual movido exclusivamente a gasolina é capaz de se enquadrar. Tais padrões irão elevar acentuadamente o preço dos carros e forçar a criação de um mundo em que os carros são todos elétricos ou híbridos recarregados na tomada. (Quem quiser ler todos os arrepiantes detalhes, veja aqui.)

Todos nós corretamente condenamos pacotes de socorro destinados a bancos e empresas, bem como arranjos corporativistas que mesclam interesses privados com interesses do governo. Também condenamos veementemente todo e qualquer tipo de auxílio estatal a empresas falidas. Porém, eis aqui uma verdade: se os barões da indústria automotiva e os sindicatos que as dominam não possuíssem conexões políticas, a abolição do automóvel provavelmente já seria um fato consumado. Por enquanto, o automóvel ainda é permitido. Mas os governos não permitem que ele se desenvolva, que ele assuma o formato que os consumidores desejam e que ele funcione como um verdadeiro bem econômico.

O automóvel foi a base da segunda revolução industrial. Burocratas usurpadores estão retirando o automóvel do nosso futuro. Houve uma época em que sonhávamos com carros voadores. Os reguladores de hoje conseguiram a façanha de nos fazer sonhar apenas com a volta dos dias gloriosos de décadas passadas. Isso é simplesmente patético.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

INDEPENDÊNCIA DE BRASÍLIA OU MORTE


"Viveram pouco para morrer bem
Morreram jovens para viver sempre."

Este verso encontra-se na base do Obelisco do Parque do Ibirapuera, o maior monumento de São Paulo, construído em homenagem à Revolução de 9 de julho de 1932. Ele é um mausoléu onde estão os restos mortais dos estudantes Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo — o MMDC — e de mais 713 combatentes que morreram durante os conflitos. Mas o monumento não é grande o suficiente, pois junto com estes homens, morreu o espírito de liberdade de todas as gerações posteriores: o poder de um governo central nunca mais foi enfrentado.

Um dos objetivos dos revolucionários era a proclamação de uma nova Constituição para o Brasil, que devolvesse ao estado de São Paulo poderes usurpados pela ditadura de Getúlio Vargas — por isso ela também é chamada de Revolução Constitucionalista. Mas entre os líderes do movimento havia os separatistas, lutando pela independência total de São Paulo.

O separatismo, que sempre foi muito forte por toda a história de São Paulo, foi representado durante a Revolução de 1932 por escritores como Mario de Andrade, que declarou que naquele momento "faria tudo, daria tudo para São Paulo se separar do Brasil", e Monteiro Lobato, que afirmou que o constitucionalismo era apenas um disfarce para o separatismo:



Após a vitória de São Paulo, na campanha ora empenhada, se faz mister que seus dirigentes não se deixem embalar pelas ideias sentimentais de brasilidade, irmandade e outras sonoridades.[...] Ou São Paulo desarma a União e arma-se a si próprio, de modo a dirigir doravante a política nacional a seu talento e em seu proveito, ou separa-se.[...] Trata-se de uma guerra de independência disfarçada em guerra constitucionalista.

De fato, a história de São Paulo é repleta de levantes por mais autonomia, o primeiro deles ocorrendo em 1641, quando o fazendeiro Amador Bueno foi aclamado Rei de São Paulo, que pretendia se tornar independente da Coroa Portuguesa. Os motivos dos separatistas podiam não ser os mais nobres, mas a causa separatista é sempre bem vinda, e o proeminente historiador inglês Robert Southey (1774 – 1843) chegou a declarar que "se a aclamação (separação) tivesse ocorrido, os paulistas seriam o povo mais formidável das Américas." 

Depois deste, muitos outros conflitos ocorreram, nem todos de cunho separatista, desde a Revolução Liberal de 1842, até a Greve Geral Anarquista de 1917, mostrando uma tradição paulista de não aceitar passivamente os desmandos do poder central. E esta não é uma característica exclusiva de São Paulo, pois ocorreram muitas revoltas separatistas em diversos outros estados, como a Inconfidência Mineira, a Revolução Farroupilha, a Guerra do Contestado, a Conjuração Baiana, a Sabinada, a Confederação do Equador, a Revolução Pernambucana, a Revolução Praieira e muitas outras. De todos os movimentos, apenas dois obtiveram sucesso em sua secessão: o Grito do Ipiranga, que marcou a Independência do Brasil de Portugal, e a Guerra da Cisplatina, que separou o Uruguai do Brasil.

Por estes dois exemplos, podemos ver que secessão não é nenhuma panaceia. O Brasil continua sob quase todos os aspectos pior do que Portugal, e o Uruguai não é nenhuma Suíça — mas podemos imaginar como o Uruguai estaria se, além de todos os seus problemas, ainda tivesse de ajudar a sustentar Brasília; e se o todo o Brasil tivesse de, além de sustentar Brasília, ainda pagar impostos para Lisboa.

Gary North apontou em controverso artigo publicado neste site na semana passada que a Revolução Americana que separou os Estados Unidos da Grã Bretanha prejudicou em muito a liberdade, pois quando os EUA eram parte do império, recaia sobre os colonos um imposto de apenas 1% e eles gozavam de um dos ambientes de maior liberdade do mundo. Porém, já no eclodir da Revolução, os revolucionários inflacionaram a moeda, impuseram um controle de preços e, após a Revolução, a carga tributária havia triplicado — e nunca mais parou de subir.

Enquanto os revolucionários americanos destruíram o sistema monetário imprimindo desenfreadamente o Continental, os revolucionários paulistas de 9 de julho criaram uma moeda própria lastreada em ouro, o que deu indícios de que a consolidação da secessão iria dar início a uma região autônoma muito mais livre.

Conquanto as secessões de Brasil e Estados Unidos não tenham representado por si sós avanços na liberdade, elas careceram de um elemento específico que consiste na maior vantagem do separatismo: ambas formaram estados de proporções continentais. Em uma espetacular palestra sobre as vantagens de estados pequenos e os perigos da centralização, Hans-Hermann Hoppe explica que estados pequenos devem necessariamente adotar políticas de livre mercado. Países como Andorra e Liechtenstein não iriam sobreviver se impusessem protecionismo, ao passo que um país com as dimensões dos EUA consegue produzir praticamente tudo internamente e, embora fosse empobrecer demasiadamente, poderia suportar enormes barreiras de importações. Países pequenos também tendem a adotar menos regulamentações e impostos mais baixos, pois competem com outros estados pelos seus súditos, e as pessoas simplesmente se mudam de vizinhança (estado) caso este se torne opressor. Logo, a esperança para a liberdade seria um mundo formado por milhares de Andorras, Mônacos, Liechtensteins, Hong Kongs, Cingapuras etc.

Além dos políticos que controlam territórios gigantescos e se tornam multibilionários por conta disso, acho que um mundo com estas configurações seria uma desvantagem apenas para entidades desportivas e seus campeonatos mundiais entre países. Para a FIFA, por exemplo, organizar uma Copa do Mundo entre dezenas ou centenas de milhares de micro-países seria talvez inviável e nada atrativo. No entanto, poderia levar um pouco mais de "justiça", já que faria mais sentido o Uruguai enfrentar a seleção do Rio Grande do Sul, ou a Espanha enfrentar a seleção de Minas Gerais, do que o enorme Brasil. Mas a própria Espanha possui fortes movimentos separatistas, e quando sua seleção foi campeã do mundo, diversas bandeiras das regiões que lutam por independência entraram em campo na comemoração, erguidas pelos jogadores das específicas localidades. Nacionalistas catalães, galegos e bascos ignoram a seleção espanhola.

Mas por que falar de futebol no meio de um texto sobre revoluções separatistas? Não está desviando demais do assunto? Na verdade, não. O Brasil não passa de uma abstração e o futebol, que antes era considerado um estrangeirismo, é um dos elementos que compõem a identidade nacional, a qual era inexistente antes de 1930, como nos mostra o historiador revisionista libertário Leandro Narloch em seu best seller Guia politicamente incorreto da história do Brasil. O samba, a feijoada, a capoeira, o futebol, o mulato etc. foram artificialmente elevados a itens de uma cultura brasileira. E para quê? Para ajudarem a fortalecer um governo altamente centralizado, já que o que segura esta enorme entidade política unida é tão somente a opinião popular. E se as pessoas das diferentes e longínquas regiões não se identificarem culturalmente umas com as outras, a união não tem como se manter. Destruir diferenças regionais através do multiculturalismo também ajuda a manter um poder central no comando de um grande território.

É realmente surpreendente o fato de os brasileiros dos diferentes estados concordarem com a união e o comando central de Brasília. Apesar de todo autoritarismo do governo federal, é certo que alguns estados levam suas vantagens neste arranjo político, como mostra o redistributivismo entre os estados; mas e quanto aos brasileiros dos estados que só obtêm desvantagens, como eles aturam isto? O que aconteceu com o espírito revolucionário que foi tão presente na história? Por que continuam sendo súditos de um presidente que sequer escolheram? Este mapa mostra que a pessoa que ocupa a presidência atualmente foi a vitoriosa nas eleições em apenas parte dos estados.



Eleições já são uma grande farsa que não legitimam a autoridade de ninguém, e mesmo um vitorioso com 90% dos votos sequer foi o escolhido pelos que votaram no outro candidato e pelos que nem votaram. Mas um mapa com esta coloração já não é motivo suficiente para se separar a parte azul da vermelha, cada uma ficando com seu presidente? Este vídeo mostra como a atual presidente é extremamente rejeitada mesmo no Rio de Janeiro, estado em que ela foi a vitoriosa com 60% dos votos:

E, logicamente, o mais sensato seria que cada um dos estados tivesse como seu presidente o respectivo governador eleito; e, prosseguindo com a lógica secessionista, ela só iria encontrar limites no indivíduo, como notou Ludwig von Mises. Mas se alcançássemos um território formado por milhares de cidades-estados como vislumbrado por Hoppe, um ambiente propício para a liberdade e o consequente progresso e enriquecimento geral iria vigorar.

A revolta contra o poder que foi revelada durante a recente onda de protestos parece estar generalizada, e o sentimento separatista esboça um ressurgimento. O professor Antony Mueller traçou um paralelo da atual presidente como uma espécie de Maria Antonieta, ao comparar os gastos extravagantes das duas cortes. Apenas para citar um exemplo, a rainha atual levou uma comitiva para Roma para a posse do novo Papa que ocupou 52 quartos num hotel de luxo, tudo pago pelos trabalhadores brasileiros que são obrigados a força da bala a sustentar essa opulência. Quanto mais tempo o povo terá que suportar tudo isso até que um governador proclame a independência de seu estado? Sustentar Brasília pra quê?

 Uma das motivações dos separatistas foi continuar com a prática de escravizar índios, proibida pela Bula Papal de 1640, que excomungava todos que escravizassem índios (o que fez com que os paulistas expulsassem os jesuítas de São Paulo). E, além disso, a Coroa Portuguesa possuía interesses comerciais no tráfico negreiro. Mas os separatistas também objetivavam a manutenção do livre comércio com o Paraguai, também ameaçado pela Coroa Portuguesa.

Por: Fernando Chiocca  um intelectual anti-intelectual, praxeologista e conselheiro do Instituto Ludwig von Mises Brasil.

COMO A DÍVIDA DO GOVERNO AFETA AS GERAÇÕES FUTURAS


Paul Krugman e outros defensores do aumento dos gastos governamentais alegaram recentemente que comparar a dívida do governo à dívida de um indivíduo ou de uma empresa é errado. Ao contrário dos moralistas, que não querem aumentar as dívidas a serem pagas pelas gerações futuras, Krugman e seus aliados alegam que a dívida governamental per se não representa nenhum fardo para as gerações futuras como um todo. Afinal, nossos descendentes irão "dever para eles próprios" — ao menos se desconsiderarmos a dívida externa, é claro.

Sendo assim, quaisquer impostos que forem aumentados ou criados para pagar o serviço desta dívida (juros e amortizações) irão simplesmente fluir para os bolsos daqueles cidadãos que estiverem de posse dos títulos da dívida. Com isso, Krugman argumenta que a "dívida nacional" não é apenas um passivo, mas também um ativo. Quanto maior a dívida, portanto, mais rico o país.

Um argumento que já seria o bastante para encerrar esta discussão é o fato de que, quanto maior a dívida, maiores os gastos do governo apenas com os juros desta dívida. E maiores ainda serão os gastos para amortizar os títulos vincendos. Isto faria com que uma enorme fatia dos impostos arrecadados fosse utilizada apenas para pagar encargos da dívida. Tal situação equivaleria a uma maciça transferência de renda de pagadores de impostos para portadores de títulos. Alguns iriam ganhar, outros iriam perder. Como sempre disse Murray Rothbard, a frase "nós devemos a nós mesmos" possui profundas implicações: tudo depende de se você faz parte do "nós" ou do "nós mesmos".

Mas há outros problemas também. Um deles é que tal ponto de vista krugmaniano ignora o fato de que déficits do governo retiram recursos do setor produtivo, desviando-os para ineficientes gastos estatais. Quando o governo incorre em déficits e emite títulos para financiar estes déficits, tais títulos são comprados por empresas ou por indivíduos que, caso contrário, poderiam estar aplicando seu capital em investimentos produtivos. Desta forma, déficits governamentais retiram recursos de investimentos privados e os desviam para gastos escolhidos de acordo com politicagem. Déficits, portanto, fazem com que as gerações futuras tenham à sua disposição uma menor oferta de tratores, escavadeiras, máquinas, ferramentas e outros equipamentos, reduzindo assim sua capacidade de produzir mais bens. Consequentemente, estas futuras gerações estarão potencialmente mais pobres.

Além deste efeito negativo sobre o investimento físico em bens de capital, o economista James Buchanan demonstrou que existe uma rota completamente independente por meio da qual os atuais déficits orçamentários de um governo podem empobrecer as gerações futuras. Uma vez que entendemos que "a nação" é composta por diferentes indivíduos que surgem em vários pontos distintos do espaço e do tempo, que vivem durante períodos de tempo variáveis e não homogêneos, e então morrem, dizer que "nós devemos para nós mesmos" é uma completa falácia.

Repetindo, Buchanan aponta para um efeito que vai muito além do fato de que os déficits governamentais de hoje tendem a reduzir o investimento privado. Mesmo se supuséssemos que todo o déficit governamental atual fosse pago por meio de uma redução no consumo privado — de modo que estaríamos deixando para as futuras gerações o mesmo estoque de bens de capital —, ainda assim nossos descendentes (como um todo) estariam em pior situação (relativamente mais pobres, ou menos ricos do que poderiam) em decorrência desta política de déficits.

Para entender como isto funciona, imagine que o governo atual — isto é, no ano de 2013 — anuncie que irá gastar $100 bilhões dando uma festa de arromba. Tudo o mais constante, as pessoas vivas em 2013 irão adorar este surto maciço de consumo. No entanto, se o governo impusesse tributos sobre as pessoas em 2013 para pagar por esta festa, elas certamente iriam se revoltar. E nenhum governo quer isso. Muito mais confortável é apenas emitir títulos da dívida, que serão voluntariamente comprados por algumas pessoas no presente, e jogar o fardo do pagamento dos juros e do principal para as gerações futuras.

Mais especificamente, suponha que o governo, em vez de elevar impostos, emita títulos que irão vencer daqui a cem anos, e os quais serão vendidos agora àquelas pessoas que oferecerem os melhores preços de compra. Supondo que os investidores confiem no governo e que a taxa de juros nominal de longo prazo seja acordada em 4,7%, o governo irá então emitir uma nota oficial com a seguinte declaração: "No ano de 2113, o governo irá fazer uma contagem de quantos pagadores de impostos existem no país. Ato contínuo, o governo irá tributar cada um destes x cidadãos com um imposto per capita de $10 trilhões/x. Esta receita tributária de $10 trilhões assim coletada será entregue a todas as pessoas que porventura estejam de posse deste pedaço de papel naquele momento."

O valor de $10 trilhões nada mais é do que $100 bilhões com juros de 4,7% ao ano durante cem anos. Neste exemplo, a dívida será quitada — juros e principal — de uma só vez em 2113. Ou seja, o governo em 2013 irá levantar, via emissão de dívida, $100 bilhões — o valor presente descontado do pagamento de $10 trilhões que só irá ocorrer daqui a cem anos — e com isso pagar por sua festança.

Neste cenário, um leigo estaria correto em dizer que a atual geração fez a sua farra e jogou toda a conta para os infelizes cidadãos de 2113. Os pagadores de impostos em 2113 terão de entregar $10 trilhões para alguns de seus concidadãos. No entanto, esta observação ainda não encerra por completo a análise.

O motivo é que aquelas pessoas que em 2113 estiverem em posse dos títulos da dívida, e que portanto estarão recebendo os $10 trilhões, não irão receber este dinheiro de graça. Ao contrário, tais pessoas compraram estes títulos alguns anos atrás e pagaram por eles o valor presente descontado de $10 trilhões. Portanto, quando fazemos a contabilidade corretamente, entendemos que, além de os pagadores de impostos em 2113 serem claramente prejudicados (afinal, terão de pagar $10 trilhões em impostos), esta sua perda não se traduz em um ganho idêntico para os portadores dos títulos. É por isso que esta geração como um todo estará mais pobre em decorrência da festança que as pessoas de 2013 deram.

Esta conclusão crítica merece ser enfatizada. Considere um indivíduo que está de posse de um dos títulos da dívida (cujo valor de face é de $1.000) em 2113. Talvez esta pessoa tenha comprado este título de outra pessoa no ano anterior (em 2112) por $955. Ao receber os $1.000, ela estará auferindo juros de 4,7%. Os $1.000 que ele receber em 2113 não irão constituir um ganho líquido para esta pessoa, pois a maior fatia destes $1.000 — isto é, os $955 — será apenas a devolução do principal que ele pagou no ano anterior. 

O real benefício para esta pessoa em toda esta operação seria ele receber uma taxa de juros mais alta do que a que ele receberia caso emprestasse seus $955 para o setor privado. Portanto, esta pessoa poderia considerar que toda esta operação de tributar-e-distribuir em 2113 lhe valeu, por exemplo, apenas $5.

É a este benefício líquido de $5 (aproximadamente) para o portador do título que os $1.000 em impostos coletados deve ser contrastado. Em outras palavras, o pagador de impostos individual (responsável por um décimo-bilionésimo da fatura de $10 trilhões) ficará com $1.000 a menos, ao passo que o portador do título para quem o dinheiro é transferido irá ganhar apenas $5. 

Agora, se nos concentrarmos em um outro portador de título — por exemplo, alguém que tenha comprado o título no ano de 2085 —, então seu ganho seria maior do que $5, pois ele auferiu taxas de juros acima das de mercado por um período mais longo. Ainda assim, a única maneira de uma perda de $1.000 para um pagador de impostos ser identicamente contrabalançada por um ganho de $1.000 para um portador de título seria se este portador houvesse adquirido o título gratuitamente. Isto poderia acontecer com crianças que herdam títulos de seus pais. Mas é só. Qualquer outra pessoa que utilize dinheiro próprio para adquirir uma fatia daquele enorme título de $10 trilhões não irá obter ganhos idênticos às perdas dos pagadores de impostos. Seu ganho será muito menor. Logo, o grupo "pessoas vivas em 2113" estará coletivamente mais pobre em decorrência deste esquema.

Por outro lado, consideremos a geração original, aquele que deu a festança. Sim, houve investidores em 2013 que tiveram de reduzir seus gastos em um total de $100 bilhões em decorrência de terem comprado os títulos emitidos pelo governo. Porém, à medida que o tempo foi passando, eles poderiam ter vendido seus títulos (um ativo financeiro) para investidores mais jovens, e utilizar os fundos assim conseguidos para financiar suas aposentadorias. Assim, os investidores de 2013, se considerarmos sua renda vitalícia, de fato não perderam nada com este negócio, o qual foi totalmente voluntário para eles.

Para resumir: em 2013, várias pessoas vivas ganharam e ninguém perdeu, ao passo que, em 2113, as pessoas vivas sofreram perdas que sobrepujaram os ganhos totais. E isto é verdade mesmo se considerando que, em 2113, "as pessoas deviam $10 trilhões para elas mesmas".

Déficits orçamentários nada mais são do que um enorme esquema de roubo que ocorre ao longo do tempo por meio do mercado financeiro e de títulos. Déficits orçamentários permitem que os cidadãos de hoje financiem benesses governamentais jogando a conta para gerações futuras, as quais não têm nenhum poder de influência nas decisões políticas atuais.

Por: Robert P. Murphy  Ph.D em economia pela New York University, economista do Institute for Energy Research, um scholar adjunto do Mises Institute, membro docente da Mises University e autor do livro The Politically Incorrect Guide to Capitalism, além dos guias de estudo para as obras Ação Humana e Man, Economy, and State with Power and Market. É também dono do blog Free Advice.

domingo, 21 de julho de 2013

SEM LUZ NO CAMINHO

A deposição do presidente Mohamed Mursi pelo exército egípcio foi o sinal, para muitos, de que as aspirações libertárias da praça Tahrir, em 2010, foram definitivamente enterradas. Afinal, Mursi tinha sido eleito, ainda que por margem mínima, no primeiro pleito democrático da história do país. Teria a primavera árabe acabado aí?


Tom Friedman, o excelente colunista do New York Times , perguntou-se recentemente se a deposição do presidente filiado à Irmandade Muçulmana, não seria o começo de um refluxo do Islã político. Outros sinais seriam os protestos da juventude urbana de Istanbul contra o partido islamista no poder, a eleição do moderado Hassan Rouhani no Irã, a evolução da Tunísia para uma constituição moderada e a primeira eleição livre na Líbia que viu a derrota dos candidatos fundamentalistas. Mesmo assim,Friedman foi cauteloso evitando concluir que a onda passou. Eu tenho aqui as minhas dúvidas.

Aquilo que veio a ser conhecido como a primavera árabe suscitou, sem a menor dúvida, uma enorme esperança de quebra do padrão generalizado de autoritarismo e corrupção dos governantes árabes. A derrubada e posterior enxovalhamento dos ditadores Mubarak, no Egito, e Ben Ali, na Tunísia, ecoaram em todo o mundo árabe como um toque de clarim, anunciando uma nova era de liberdade. Daí a prever que todos os autocratas teriam o mesmo fim era um passo apenas. Sucede porém que isso não ocorreu. Mesmo no caso de Tunísia, Líbia e Iêmen, onde os tiranos foram expulsos, as esperanças de um transição democrática viram-se frustradas. Cada país árabe está passando por um processo próprio, as várias ditaduras foram, por vezes, capazes de contrapor às massas uma força militar considerável, ainda que estrangeira, como foi o caso no Bahrein. O erro dos otimistas consistiu em achar que a primavera seria uniformemente florida.

Dizia-me um amigo turco, na época, que em seu país a democracia só se enraizara décadas depois do fim do Império Otomano e de toda sorte de oscilações políticas. Claramente, muita água vai passar sob as pontes do Nilo antes que os países árabes cheguem, como a nossa própria América Latina, a ser um espaço quase uniformemente democrático. As ditaduras salgaram a terra, impediram a criação de partidos e instituições democráticas, fomentando o surgimento dos ovos de serpente do radicalismo de todo tipo.

Em recente artigo, Francis Fukuyama notou que, sempre que ela surgiu, uma classe média moderna tem causado fermentação política, mas muito raramente conseguiu, por si mesma, provocar mudanças políticas duradouras . Trata-se de outro prisma interessante para buscar compreender as convulsões do mundo islâmico. As sociedades muçulmanas do Oriente Médio estão conseguindo gradualmente romper o fatalismo da desigualdade social , mas há enormes diferenças entre a Turquia moderna e os palestinos de Gaza ou Ramalá, entre a Síria brutalizada e o Marrocos, e assim por diante. Fukuyama não descobriu a chave mestra para entender o impasse árabe.

Outra discussão importante trata da relação entre fundamentalismo religioso e democracia na região. No Egito, que é o mais importante país árabe, a eleição do líder da Irmandade Muçulmana foi um teste importante: este fato político seria capaz de fortalecer a democracia, com a cooptação de um partido forjado na clandestinidade por oitenta anos e dotado de uma filosofia operacional conspiratória? A resposta foi negativa.

Chegando ao poder, a Irmandade radicalizou, fechando-se em copas, e mostrou-se incapaz de governar para o bem comum, o que levou a imensas manifestações contra Mohamed Mursi e enfim à decisão do Exército de intervir mais uma vez na política egípcia. Isso, naturalmente, não quer dizer que a Tunísia ou a Jordânia não possam apresentar melhores experiências de pragmatismo e flexibilidade política. Mas o episódio egípcio poderá levar os fundamentalistas a concluir que a democracia é apenas uma armadilha contra eles, com a conclusão, para eles lógica, de que é necessário ter uma conduta ainda mais combativa.

Não há um único farol a iluminar o caminho. Com todas as nuances de cada país árabe, nenhum deles conseguiu despontar como a prova de que a democracia pode vingar, nem sequer que haja um exemplo, um único exemplo, de que os povos árabes podem finalmente esperar gozar de liberdade e de melhores horizontes sociais. Por isso, é necessário concluir, pelo menos provisoriamente, que a primavera árabe não conduziu ao verão. 
Por: Luiz Felipe Lampreia  O Globo

sexta-feira, 19 de julho de 2013

A MENSAGEM DA 'SEGUNDA TAHRIR'

O Exército é a espinha dorsal do Estado egípcio. Os oficiais do grupo de Gamal Abdel Nasser derrubaram a monarquia, em 1952, consolidando a independência, e governaram o país durante seis décadas, moldando uma elite dirigente. A revolução em curso no Egito é obscurecida, distorcida e desviada pelas interferências do Exército, que procura estabelecer-se como uma espécie de Poder Moderador numa democracia limitada. Mesmo assim, não é correto descrever a derrubada de Mohamed Mursi como um golpe militar. O presidente islâmico caiu sob o impacto de um levante popular que representa, de muitas formas, a continuidade do levante da Praça Tahrir de 2011 contra a ditadura de Hosni Mubarak.


Nomes têm importância. O golpe militar antimonárquico de Nasser foi batizado com o nome de Revolução Nacional. Mursi não era um ditador, mas um presidente eleito em meio à turbulenta transição revolucionária. A Irmandade Muçulmana classifica a sua remoção, por ordem do general Abdel Fatah al-Sisi, como um golpe de Estado. As multidões incontáveis de egípcios que fizeram a “segunda Tahrir” têm opinião bem diferente.

“Sisi seguia a vontade do povo”, disse um manifestante ao repórter do jornal “Guardian”, sintetizando uma narrativa possível sobre a nova revolução no núcleo político do mundo árabe. O cenário é mais complexo do que isso, como atesta a vasta adesão às manifestações convocadas pela Irmandade Muçulmana para exigir a restauração de Mursi. Contudo, atrás da óbvia divisão política entre os egípcios, evidencia-se que a Primavera Árabe não se encerrou pela substituição de tiranias militares por tiranias religiosas. Pelo contrário, e para surpresa de tantos comentaristas ocidentais, ela prossegue desafiando o fundamentalismo islâmico.

Fundada em 1928, a Irmandade Muçulmana é uma instituição tão importante quanto o Exército na sociedade egípcia. Ao longo das décadas de autoritarismo militar, ela foi proscrita e perseguida, mas deitou raízes na mesquita, na universidade, em amplos setores das classes médias e, sobretudo, entre os pobres. A Irmandade é, além disso, a nascente principal do moderno fundamentalismo islâmico em todo o mundo árabe, inspirando organizações similares que operam na Tunísia, na Argélia, na Síria e na Palestina. De uma de suas costelas, nasceu na década de 1960 a corrente radical que, na estufa ideológica da Arábia Saudita, geraria o jihadismo contemporâneo. Depois daquela cisão, a organização egípcia renunciou à violência e, convencendo-se de que o tempo era seu aliado, decidiu percorrer o longo caminho da persuasão.

A aposta na moderação rendeu frutos após o levante contra Mubarak. A Irmandade aderiu tardia e relutantemente à “primeira Tahrir”, mas se beneficiou da desorganização das correntes laicas, tanto as liberais quanto as socialistas, na hora das eleições. Na moldura de um sistema eleitoral confuso, arranjado às pressas, a revolução popular caiu no colo da única organização política implantada em todo o país. A maioria dos eleitores não votou pela instalação de um Estado islâmico, algo ausente da plataforma eleitoral da Irmandade. O governo de Mursi, contudo, interpretou erradamente a mensagem das urnas — e o próprio sentido da democracia.

Mursi fracassou porque se recusou a enfrentar a ala tradicionalista de seu movimento e a erguer pontes na direção das correntes laicas. A Irmandade imaginou a democracia do voto como uma ferramenta para a reinvenção da sociedade egípcia segundo as linhas de sua própria doutrina. A “segunda Tahrir” esclareceu as coisas: a diversidade política e cultural do Egito não cabe na caixa apertada do fundamentalismo islâmico. A nova revolução egípcia, precipitada pela onda de manifestações antifundamentalistas da Praça Taksim, na Turquia, assinala a reversão de uma tendência. O Islã político encontra-se, agora, na defensiva.

Não é apenas o futuro do Egito que está na balança. A “segunda Tahrir” acendeu um facho intenso de luz sobre a questão da compatibilidade histórica entre o Islã e a democracia. Se a Irmandade extrair a lição completa da dura derrota, terá a oportunidade de reformar-se a si mesma, desistindo de esconder seus erros atrás de fantasmagóricas conspirações ocidentais, abandonando os resquícios da linguagem da jihad e aprendendo as virtudes da separação entre política e religião. Nessa hipótese benigna, a Primavera Árabe realizaria as esperanças que suscitou e o mundo árabe encontraria um caminho para escapar ao círculo de ferro da intolerância e do fanatismo.

Nem tudo, porém, depende da Irmandade. A prisão de Mursi, as perseguições contra outros líderes islâmicos e o massacre de manifestantes que pediam a restauração do presidente deposto são nítidas provocações da cúpula militar. Na direção oposta à dos chefes militares da Tunísia, a cúpula do Exército egípcio não admite a hipótese da retirada para os quartéis. O antigo poder almeja empurrar a Irmandade para a clandestinidade e, mais além, para a via desastrosa do terrorismo. Nessa hipótese, um inverno melancólico congelaria a Primavera Árabe.

“Transitar do fascismo religioso para o fascismo militar não é algo que mereça celebração”, disse Mariam Kollos, uma ativista de direitos humanos que participou ativamente dos levantes contra Mubarak e Mursi. O termo “fascismo” pode não ser apropriado, mas o que vale é o sentido da sentença. A “segunda Tahrir” revela tanto a vitalidade da revolução democrática no Egito quanto o fracasso dos profetas que condenaram de antemão a Primavera Árabe como uma queda no precipício do fundamentalismo islâmico. Em pouco mais de dois anos, os egípcios derrubaram uma ditadura militar e um governo eleito que pretendia aprisionar as liberdades no calabouço da ortodoxia religiosa. Depois disso, a tese do “choque de civilizações” deveria ser recolhida ao museu das relíquias ideológicas.
Por: Demétrio Magnoli O Globo

quinta-feira, 18 de julho de 2013

DOIS MALES

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, como dizia um conhecido conterrâneo meu. Ainda me lembro, com duas lágrimas nostálgicas, dos protestos contra Mubarak no Egito. Quem não se lembra?


O ditador, depois de três décadas de mando, era acossado nas ruas por milhares, milhões de manifestantes. E não houve jornalista ocidental com credenciais progressistas em dia que não tenha escrito os seus poemas em homenagem à praça Tahrir.

Eis a cabeça do progressista típico: Mubarak = Mau; Protestos = Bons; Irmandade Muçulmana = Melhor que Mubarak.

Aqui, uma pessoa alfabetizada sentia uma leve tontura intelectual. Mubarak não era flor que se cheirasse -um ditador é um ditador é um ditador.

Mas os progressistas conheciam mesmo a Irmandade Muçulmana, esse brilhante grupo fundado por Hassan al Banna em finais da década de 1920 que representa tudo aquilo que a inteligência progressista abomina?

Dito de outra forma: os jornalistas que toleravam a irmandade conheciam as posições do clube sobre as relações entre o Estado e a religião, os direitos das mulheres, dos gays, das minorias religiosas, e etc. etc.?

Conheciam os atentados terroristas promovidos pelos seus líderes ou cometidos em seu nome (o palestino Hamas é apenas o melhor exemplo)?

E estariam dispostos a trocar um Egito autocrático por um Egito submetido aos preceitos da sharia (lei islâmica) sem pensar duas vezes?

Perguntas sem sentido. Retorno ao pensamento circular do progressista circular: se Mubarak era mau e os protestos eram bons, a irmandade só poderia ser melhor que Mubarak.

Pena que os egípcios não sejam tão generosos com Mohammed Mursi, agora deposto. Conta a revista "Economist" que 94% da população considera os militares a instituição mais respeitável do país.

A mesma revista informa que o número de manifestantes que tomou novamente as ruas do Egito contra o faraó deposto oscila entre os 10 milhões e os 14 milhões (o país terá 81 milhões). Motivos para tanto ruído e fúria?

Todos e mais alguns. A incompetência do governo Mursi. A corrupção. A venalidade. A insegurança. A fome. A falta de energia. A violência contra minorias religiosas e étnicas. Os crimes contra mulheres -não, não temos espaço nesta Folha. E que dizem os progressistas de ontem sobre as manifestações de hoje?

Estranhamente, não vi os poetas da praça Tahrir com novos sonetos sobre os descontentamentos dos egípcios.

Aliás, a julgar pelos textos publicados, parece que o golpe militar contra Mursi aconteceu por capricho -e não pela ruína política, econômica e social a que ele conduziu o país.

Sem falar da ruína moral: uma das suas nomeações políticas mais notáveis foi indicar Adel al-Khayat para governador da turística cidade de Luxor. Quem é al-Khayat? Digamos apenas que é alguém que entende de turismo. Ou, mais especificamente, de como rebentar com turistas. Em 1997, na mesma cidade de Luxor, foram 58 estrangeiros e 4 nativos em atentado de grupo islamita a que al-Khayat pertence.

Moral da história?

Sim, o presidente Mursi foi eleito democraticamente -uma importante diferença em relação ao seu antecessor.

Mas será que a legitimidade democrática absolve qualquer governante das suas derivas antidemocráticas? Sobretudo quando entre essas derivas está o golpe constitucional de novembro de 2012, através do qual Mursi pretendia governar autocraticamente como Mubarak antes dele?

Ponto de ordem: não se trata aqui de defender o golpe militar. Trata-se, pelo contrário, de defender o direito a não se defender ninguém: nem Mursi, nem os militares, nem sequer Mubarak.

Porque sem instituições democráticas fortes -tradução: separação de poderes; judiciário independente; liberdade de expressão; respeito pela iniciativa privada; e etc. etc.- qualquer orgasmo democrático com o Egito atual corre o risco de ser apenas ejaculação precoce.

Ao contrário do que pensam as cabeças infantis, a política não é uma luta permanente entre o bem e o mal. Às vezes, é uma luta entre dois males igualmente perversos.

E, nestas matérias, recordo sempre a sagaz observação de Kissinger sobre a guerra Irã x Iraque: "É uma pena que não possam perder os dois." 
Por: João Pereira Coutinho Folha de SP

quarta-feira, 17 de julho de 2013

SINDICATOS NÃO PODEM BENEFICIAR OS TRABALHADORES EM GERAL


Social-democratas, progressistas e toda a esquerda em geral acreditam firmemente, e erroneamente, que sindicatos são capazes de aprimorar o padrão de vida dos assalariados de todo o sistema econômico. E acreditam que eles conseguem fazer isso por meio da imposição de aumentos salariais ou de reduções na jornada de trabalho sem concomitantes reduções salariais. Ao pensarem assim, esses grupos ideológicos cometem a falácia de pressupor que, dado que ganhar mais dinheiro é obviamente um objetivo inteligente para um assalariado buscar, então se todos os assalariados conjuntamente reivindicarem o mesmo para si, tal imposição será igualmente benéfica para todos conjuntamente.

Os proponentes destas ideias se mostram totalmente ignorantes do fato de que aumentos salariais impostos por sindicatos reduzem a quantidade de mão-de-obra demandada e consequentemente geram desemprego tanto para os não-sindicalizados quanto para aqueles trabalhadores cuja habilidade e produtividade geram menos valor do que o novo piso salarial imposto. Mais ainda: menor emprego significa menor produção, e menor produção significa menor oferta de bens e serviços, o que significa preços mais altos. Para coroar tudo, haverá um aumento nos gastos sociais para se conceder benefícios aos desempregados, o que pode levar a um aumento futuro da carga tributária.

A única maneira de se aumentar os salários sem que isso gere um aumento no desemprego é aumentando a quantidade de dinheiro na economia, o que consequentemente tende a elevar o volume de gastos em todo o sistema econômico. Porém, tal fenômeno, assim como o descrito no parágrafo anterior, também levará a um aumento nos preços, e consequentemente não irá aprimorar o padrão de vida dos assalariados.

Expressando estes pontos na tradicional terminologia de oferta e demanda, a única maneira de os salários nominais subirem é havendo uma menor oferta de mão-de-obra — o que significa menos pessoas empregadas — ou havendo mais demanda por mão-de-obra, o que também significa que está havendo uma maior demanda por bens de consumo e, consequentemente, que os preços dos bens de consumo estão mais altos. Logo, por mais surpreendente que isso possa parecer, podemos concluir que salários maiores — sejam eles obtidos por meio de uma menor oferta de mão-de-obra ou por uma maior demanda por mão-de-obra decorrente de um aumento da quantidade de dinheiro na economia — simplesmente não podem aumentar o padrão de vida do assalariado médio. 

Temos de concluir, portanto, que se realmente desejam aumentar o padrão de vida do assalariado médio, os sindicatos estão completamente equivocados em ter como objetivo exigir aumentos salariais. No entanto, este é exatamente o seu supremo objetivo, não havendo nenhum outro objetivo comparável à grandiosidade deste.

Sim, é possível haver um aumento na demanda por mão-de-obra que leve a aumentos salariais e que, ao mesmo tempo, não gere aumento na demanda por bens de consumo e nem aumento de preços. Mas isso só poderia ocorrer caso fosse resultado de um aumento na poupança. E o que permitiria isso seria uma grande redução nos gastos do governo feita em simultâneo a uma equivalente redução de impostos, dentre eles o imposto de renda de pessoa jurídica, o imposto de renda de pessoa física, o imposto sobre ganhos de capital e todos os outros impostos que incidem sobre a receita e o lucro das empresas. Dado que impostos são pagos com fundos que poderiam ser poupados e utilizados em investimento, tal redução de impostos permitirá que tais fundos sejam agora efetivamente poupados e investidos. Essa poupança adicional poderia, consequentemente, ser em grande parte utilizada para pagar os aumentos salariais.

Por conseguinte, os assalariados poderiam aumentar correspondentemente seus gastos em consumo. E isso não representaria um aumento geral do gasto em consumo porque estaria sendo financiado por uma equivalente — aliás, mais do que equivalente — redução nos gastos do governo. Ou seja, o governo reduziu seus gastos para que os trabalhadores pudessem aumentar os próprios. Assim, embora os salários dos trabalhadores tenham aumentado, não houve nada que tornasse possível a elevação generalizada dos preços. 

No entanto, desnecessário dizer que tais reduções de impostos são um anátema absoluto para os sindicatos e seus defensores.

Nunca é demais ressaltar que o que de fato aumenta o padrão de vida dos assalariados é o aumento na produtividade da mão-de-obra — isto é, um aumento na quantidade de bens produzidos por unidade de mão-de-obra. Este aumento de produtividade serve para aumentar a oferta de bens em relação à quantidade de mão-de-obra disponível. E tal aumento na oferta de bens em relação à mão-de-obra leva a uma redução dos preços dos bens em relação aos salários pagos. Caso a quantidade de dinheiro na economia fosse constante ou aumentasse muito pouco, os preços cairiam ao mesmo tempo em que os salários permaneceriam inalterados. Havendo um aumento mais substancial da quantidade de dinheiro na economia, seria possível que os preços permanecessem inalterados ao mesmo tempo em que os salários subissem. Seria possível também que tanto preços e salários aumentassem, mas com os preços subindo menos que os salários. A questão é que, se estiver havendo um aumento contínuo da produtividade, de modo que a quantidade de bens esteja sempre aumentando em relação à quantidade de mão-de-obra disponível, estará havendo um aumento no padrão de vida dos assalariados.

É essencial entender que a base para um aumento da produtividade da mão-de-obra está na quantidade de investimento feito na produção de bens de capital. E investimentos em bens de capital são estimulados por reduções nos gastos do governo acompanhadas por uma equivalente redução naqueles impostos que são pagos com fundos que, uma vez liberados deste encargo, poderão ser substancialmente poupados e investidos em bens de capital.

O problema é que os sindicatos e seus defensores ideológicos são totalmente alheios a estes fatos econômicos. Acima de tudo, eles são ignorantes quanto ao fato de que o padrão de vida dos assalariados não advém necessariamente de um aumento salarial mas sim de uma queda de preços dos bens de consumo e dos serviços. Como explicado acima, a queda nos preços não precisa ser em termos nominais ou absolutos. Basta apenas que seja uma queda relativa, isto é, que os preços aumentem menos que os salários — ou, colocando de outra forma, que os preços ao menos sejam menores do que seriam caso o único fator atuante fosse um aumento na quantidade de dinheiro e do volume de gastos na economia.

Quando finalmente se entende que o real aumento do padrão de vida dos assalariados advém da redução relativa de preços e não do aumento nominal dos salários, não é difícil chegar à conclusão de que os sindicatos não apenas são totalmente ignorantes em relação a como elevar o padrão de vida dos assalariados em geral, mas também atuam diretamente contra os interesses dos assalariados em geral. Em vez de agirem de modo a facilitar investimentos em bens de capital, o que aumentaria a produtividade (logo, os salários) e a oferta de bens de consumo, e consequentemente reduziria os preços relativos destes bens, os sindicatos defendem medidas que necessariamente obstruem esses investimentos, como impostos, encargos sociais e trabalhistas, e maiores gastos com salários.

Sindicatos podem aumentar o padrão de vida de pequenos grupos de trabalhadores, mas apenas ao adquirirem privilégios monopolísticos que limitam o número de trabalhadores que podem ser empregados em uma determinada linha de trabalho ou ao gerarem ou manterem uma necessidade artificial pelos serviços de trabalhadores de determinadas áreas. Porém, nestes casos, os sindicatos estão reduzindo o padrão de vida de outros trabalhadores. Os trabalhadores que forem impedidos de trabalhar em áreas dominadas por sindicatos terão de encontrar empregos em outros setores, nos quais o acréscimo de sua mão-de-obra servirá apenas para reduzir ainda mais os salários. Se houver leis de salário mínimo que proíbam uma redução salarial, então estes trabalhadores desalojados acabarão simplesmente desempregados ou tomando os empregos de outros trabalhadores menos qualificados, os quais ficarão desempregados.

À luz de tudo isso, é possível entendermos como a produtividade da mão-de-obra ao longo dos últimos 225 anos aumentou em uma escala de vários múltiplos, e com um comparavelmente enorme efeito positivo sobre os salários reais (a quantidade de horas de trabalho necessária para se adquirir bens e serviços corriqueiros vem caindo continuamente) e sobre o padrão de vida geral, e sem nenhum efeito negativo sobre a taxa de desemprego. Com efeito, o número total de assalariados empregados também aumentou enormemente, em linha com o aumento populacional possibilitado pelo aumento na produtividade da mão-de-obra e o consequente aumento no padrão de vida.

A única contribuição dos sindicatos a esse processo é impedi-lo ou retardá-lo. A cada avanço ocorrido no mundo empreendedorial, os sindicatos tentam combater o aumento da produtividade sempre que isso ameaça reduzir o número de empregos disponíveis para seus membros. Com efeito, eles abertamente se orgulham de "manter pessoas empregadas" quando deveriam era se orgulhar de criar bens e ser produtivos, aparentemente incapazes de compreender que manter empregos exigindo uma mão-de-obra maior do que a necessária para produzir um determinado bem serve apenas para impedir a produção de outros bens, os quais, conjuntamente a esse bem em particular com o qual eles estão preocupados, poderiam aumentar o padrão de vida dos trabalhadores.

Para continuarem existindo, sindicatos necessitam de um "sangue fresco" que possa ser continuamente sugado. Sua mais abundante e fecunda fonte nas últimas décadas tem sido os funcionários públicos, que hoje formam a maioria de seus membros. Ao fazerem vultosas contribuições para a campanha de políticos corruptos, e ao obrigarem seus membros a votarem em massa nestes políticos, os sindicatos dos funcionários públicos podem garantir salários e aposentadorias magnânimas (para não dizer bizarras) para seus membros, tudo financiado pelos pagadores de impostos do setor privado. Em face das iminentes falências governamentais ao redor do mundo, este processo parasitário vem encontrando crescente oposição. A esperança do setor produtivo é que ele esteja hoje próximo de seu fim.


Por: George Reisman é Ph.D e autor de Capitalism: A Treatise on Economics. (Uma réplica em PDF do livro completo pode ser baixada para o disco rígido do leitor se ele simplesmente clicar no título do livro e salvar o arquivo). Ele é professor emérito da economia da Pepperdine University. Seu website: www.capitalism.net. Seu blog georgereismansblog.blogspot.com

Tradução de Leandro Roque

GRAMSCI E A COMUNIZAÇÃO DO BRASIL


Em lugar algum no mundo o pensamento de Gramsci foi tão disciplinadamente aplicado como está sendo no Brasil. Inicialmente, pelo governo FHC, e agora pelo PT, cuja nomenklatura governamental segue com rigor as orientações emanadas dos intelectualóides uspianos que dirigem o Foro de São Paulo e que têm como cartilha os Cadernos do Cárcere, de Gramsci.


Quem não está familiarizado com as ideologias políticas, por certo estará perguntando: Quem foi Gramsci e qual sua relação com o comunismo brasileiro?

Antonio Gramsci (1891-1937), pensador e político foi um dos fundadores do Partido Comunista Italiano em 1921, e o primeiro teórico marxista a defender que a revolução na Europa Ocidental teria que se desviar muito do rumo seguido pelos bolcheviques russos, capitaneados por Vladimir Illitch Ulianov Lênin (1870-1924) e seguido por Iossif Vissirianovitch Djugatchvili Stalin (1879-1953).

Durante sua prisão na Itália em 1926, que se prolongou até 1935, escreveu inúmeros textos sobre o comunismo os quais começaram a ser publicados por partes na década de 30, e integralmente em 1975, sob o título Cadernos do Cárcere. Esta publicação, difundida em vários continentes, passou a ser o catecismo das esquerdas, que viram nela uma forma muito mais potente de realizar o velho sonho de implantar o totalitarismo, sem que fosse necessário o derramamento de sangue, como ocorreu na Rússia, na China, em Cuba, no Leste Europeu, na Coréia do Norte, no Camboja e no Vietnã do Norte, países que se tornaram vítimas da loucura coletiva detonada por ideólogos mentecaptos.

Gramsci professava que a implantação do comunismo não deve se dar pela força, como aconteceu na Rússia, mas de forma pacífica e sorrateira, infiltrando, lenta e gradualmente, a idéia revolucionária. A estratégia é utilizar-se de diplomas legais e de ações políticas que sejam docilmente aceitas pelo povo, entorpecendo consciências e massificando a sociedade com uma propaganda subliminar, imperceptível aos mais incautos que, a priori, representam a grande maioria da população, de modo que, entorpecidos pelo melífluo discurso gramsciano, as consciências já não possam mais perceber o engodo em que estão sendo envolvidas.

A originalidade da tese de Gramsci reside na substituição da noção de “ditadura do proletariado” por “hegemonia do proletariado” e “ocupação de espaços”, cuja classe, por sua vez, deveria ser, ao mesmo tempo, dirigente e dominante. Defendia que toda tomada de poder só pode ser feita com alianças e que o trabalho da classe revolucionária deve ser primeiramente, político e intelectual.

A doutora Marli Nogueira, estudiosa do assunto, nos dá a seguinte explicação sobre a “hegemonia”:

“A hegemonia consiste na criação de uma mentalidade uniforme em torno de determinadas questões, fazendo com que a população acredite ser correta esta ou aquela medida, este ou aquele critério, esta ou aquela ´análise da situação´, de modo que quando o comunismo tiver tomado o poder, já não haja qualquer resistência. Isto deve ser feito, segundo ensina Gramsci, a partir de diretrizes indicadas pelo ´intelectual coletivo´ (o partido), que as dissemina pelos ´intelectuais orgânicos´ (ou formadores de opinião), sendo estes constituídos de intelectualóides de toda sorte, como professores – principalmente universitários (porque o jovem é um caldo de cultura excelente para isso), a mídia (jornalistas também intelectualóides) e o mercado editorial (autores de igual espécie), os quais, então, se encarregam de distribuí-las pela população”.

Quanto à “ocupação de espaços”, pode ser claramente vislumbrada pela nomeação de mais de 20 mil cargos de confiança pelo PT em todo o território brasileiro, cujos detentores desses cargos, militantes congênitos, têm a missão de fazer a acontecer a “hegemonia”.

Retornando a Gramsci e segundo ele, os principais objetivos de luta pela mudança são conquistar, um após outro, todos os instrumentos de difusão ideológica (escolas, universidades, editoras, meios de comunicação social, artistas, sindicatos etc.), uma vez que, os principais confrontos ocorrem na esfera cultural e não nas fábricas, nas ruas ou nos quartéis. O proletariado precisa transformar-se em força cultural e política, dirigente dentro de um sistema de alianças, antes de atrever-se a atacar o poder do Estado-burguês. E o partido deve adaptar sua tática a esses preceitos, sem receio de parecer que não é revolucionário. Isso o povo brasileiro não está percebendo, pois suas mentes já foram entorpecidas pelo governo revolucionário que está no poder.

Desta forma, Gramsci abandonou a generalizada tese marxista de uma crise catastrófica que permitiria, como um relâmpago, uma bem sucedida intervenção de uma vanguarda revolucionária organizada. Ou seja, uma intervenção do Partido. Para ele, nem a mais severa recessão do capitalismo levaria à revolução, como não a induziria nenhuma crise econômica, a menos que, antes, tenha havido uma preparação ideológica. É exatamente isto que está acontecendo no presente momento aqui no Brasil: A preparação ideológica. E está em fase muito adiantada, diga-se de passagem.

Segundo a doutora Marli:

“Uma vez superada a opinião que essa mesma sociedade tinha a respeito de várias questões, atinge-se o que Gramsci denominava ´superação do senso-comum´, que outra coisa não é senão a hegemonia de pensamento. Cada um de nós passa, assim, a ser um ventríloquo a repetir, impensadamente, as opiniões que já vêm prontas do forno ideológico comunista. E quando chegar a hora de dizer ´agora estamos prontos para ter realmente uma ´democracia´ (que, na verdade, nada mais é do que a ditadura do partido), aceitaremos também qualquer medida que nos leve a esse rumo, seja ela a demolição de instituições, seja ela a abolição da propriedade privada, seja ela o fim mesmo da democracia como sempre a entendemos até então, acreditando que será muito normal que essa ´volta à democracia´ se faça por decretos, leis ou reformas constitucionais”.

Lênin sustentava que a revolução deveria começar pela tomada do Estado para, a partir daí, transformar a sociedade. Gramsci inverteu esses termos: a revolução deveria começar pela transformação da sociedade, privando a classe dominante da direção da “sociedade civil” e, só então, atacar o poder do Estado. Sem essa prévia “revolução do espírito”, toda e qualquer vitória comunista seria efêmera.

Para tanto, Gramsci definiu a sociedade como “um complexo sistema de relações ideais e culturais” onde a batalha deveria ser travada no plano das idéias religiosas, filosóficas, científicas, artísticas etc. Por essa razão, a caminhada ao socialismo proposta por Gramsci não passava pelos proletariados de Marx e Lênin e nem pelos camponeses de Mão Tse Tung, e sim pelos intelectuais, pela classe média, pelos estudantes, pela cultura, pela educação e pelo efeito multiplicador dos meios de comunicação social, buscando, por meio de métodos persuasivos, sugestivos ou compulsivos, mudar a mentalidade, desvinculando-a do sistema de valores tradicionais, para implantar os valores da ideologia comunista.
Fidel Castro, com certeza, foi o último dinossauro a adotar os métodos de Lênin. Poder-se-á dizer que Fidel ao lado de Hugo Chávez e Evo Morales são os últimos dos moicanos às avessas considerando que seus discípulos Lula, Kirchner, Vásquez e Zapatero, estão aplicando, com sucesso, as teses do Caderno do Cárcere, de Antônio Gramsci. Chávez, o troglodita venezuelano, optou pelo poder da força bruta e fraudes eleitorais. No Brasil, por via das dúvidas, mantêm-se ativo e de prontidão o MST e a Via Campesina, grupos paramilitares, como salvaguarda, caso tenham que optar pela revolução cruenta que é a estratégia leninista.

Todos os valores que a civilização ocidental construiu ao longo de milênios vêm sendo sistematicamente derrubados, sob o olhar complacente de todos os brasileiros, os quais, por uma inocência pueril, seja pelo resultado de uma proposital fraqueza do ensino, seja por uma ignorância dos reais intentos das esquerdas, nem mesmo se dão conta de que é a sobrevivência da própria sociedade que está sendo destruída.

Perdidos esses valores, não sobra sequer espaço para a indignação que, em outros tempos, brotaria instantaneamente do simples fato de se tomar conhecimento dos últimos acontecimentos envolvendo escancaradas corrupções em todos os níveis do Estado.

O entorpecimento da razão humana, com o conseqüente distanciamento entre governantes e governados, já atingiu um ponto tal que, se não impossibilitou, pelo menos tornou extremamente difícil qualquer tipo de reação por parte do povo. Estando os órgãos responsáveis pela sua defesa – imprensa, associações civis, empresariado, clero, entre outros – totalmente dominados pelo sistema de governo gramsciano que há anos comanda o País, o resultado não poderia ser outro: a absoluta indefensabilidade do povo brasileiro. A este, alternativa não resta senão a de assistir, inerme e inerte, aos abusos e desmandos daqueles que, por dever de ofício, deveriam protegê-lo em todos os sentidos.
A verdade é que os velhos métodos para implantação do socialismo-comunismo foram definitivamente sepultados. Um novo paradigma está sendo adotado, cuja força avassaladora está sendo menosprezada, e o que é pior, nem percebida pelo povo brasileiro.

O Brasil está sendo transformado, pelas esquerdas, num laboratório político do pensamento de Gramsci sob a batuta do aluno aplicado e tutela do Foro de São Paulo.

Por: Por Anatoli Oliynik

terça-feira, 16 de julho de 2013

O PARTIDO DA AVENTURA

Aconteceu algo talvez irreversível: uma desconfiança tornou-se exasperação


Nos anos 1970, na Itália, "il partito dell'avventura" era o golpismo que queria desestabilizar a democracia. De que forma? Insuflando os peitos da classe média com inquietudes e medos abstratos. Uma indignação generalizada (sem alvos muito específicos e circunscritos) e a sensação de insegurança (produzida pelo terror) levariam o povo a recusar o sistema no seu conjunto: a rua exigiria a renúncia do governo, o fechamento do Parlamento e o fim de partidos e sindicatos.

Se esses pedidos se impusessem, temíamos que a porta se abrisse para "aventuras" políticas imprevisíveis e (argumentávamos, baseando-nos na história recente) totalitárias: nostalgias fascistas ou sonhos stalinistas.

No retrospecto, estranho a facilidade com a qual parecíamos menosprezar a perspectiva da "aventura". Certo, as indignações generalizadas geram um futuro incerto, que ninguém sabe no que dará e que talvez dê em algo perigoso. Mas é curioso que a aventura, com sua promessa de mudanças radicais, não nos seduzisse nem um pouco.

Seja como for, estamos, hoje, num momento bom para o partido da aventura. Imagine uma pesquisa nacional que colocasse, em qualquer ordem, por exemplo, as perguntas que seguem.

Primeiro, sobre o Legislativo. Você quer que os nossos representantes parem de usar os aviões da FAB como táxi aéreo? Quer que eles possam ser eleitos só por um mandato? Quer que eles tenham um regime de INSS igual ao de todo mundo? Quer que eles sejam obrigados a recorrer exclusivamente aos serviços públicos de educação e saúde (pela qualidade dos quais, afinal, eles são responsáveis)? Você quer que eles não possam decidir os aumentos de seus próprios salários e mordomias? Enfim, você aceitaria que o Parlamento fosse fechado, e que novas eleições fossem convocadas, em que nenhum representante atual pudesse ser candidato?

Logo, o Executivo. Você acha que os ministérios existem como objetos de barganha política mais do que por necessidade de governo? Quer que o governo corte pela metade seus 39 ministérios? Você gostaria que o governo renunciasse e alguém de reputação ilibada, sem disposição para compromissos e negociatas, tomasse as rédeas do poder?

Não inventei nenhuma dessas perguntas. Cada uma delas está (com muitas outras) em vários e-mails que recebi nas últimas semanas. Talvez uma pesquisa desse tipo seja por si só uma "aventura" perigosa: se a resposta majoritária fosse positiva, a desmoralização da classe política inteira seria brutal.

Não tenho nenhuma simpatia pela ideia de uma figura salvadora providencial --Collor foi eleito com essa imagem, e olhe no que deu.

Por outro lado, desconfio de qualquer ordem estabelecida que tente se manter e se legitimar chantageando-nos com o espantalho de um futuro incerto: aceite a gente e as coisas assim como estão ou prepare-se para o risco da "aventura", ou seja, "depois de nós, o dilúvio". Dizem que sem partidos e sem Parlamento não há democracia; será? Apenas 240 anos atrás, quando a revolução americana inventou a república moderna, o mundo inteiro dizia que sem rei não haveria governo possível.

Numa entrevista publicada na Folha de segunda (8), um sociólogo italiano, Paolo Gerbaudo, citando Gramsci, falou dos "sintomas mórbidos" que aparecem no "interregnum", "quando um sistema de poder está em colapso, mas seu sucessor ainda não se formou". São "fenômenos estranhos, criaturas monstruosas e difíceis de serem decifradas. Hoje, as criaturas estranhas são esses movimentos populares". Um exemplo dessas criaturas? Depois da Primeira Guerra Mundial, as massas italianas e alemãs que se lançaram na "aventura" do fascismo, do nazismo e da Segunda Guerra.

Note-se que nem todos os sintomas mórbidos levam a um desfecho sinistro. Ao longo da história, houve "aventuras" que acabaram bem. Mas entendo o olhar atônito do governo e do Parlamento, pois a questão é saber para quem a aventura em curso acabará bem.

Pode ser que, aos poucos, as manifestações populares se acalmem. Mas talvez algo irreversível tenha acontecido: uma desconfiança, que existia há tempos (se não desde a origem do país), agora se tornou exasperação. E a exasperação é quase sempre um prelúdio. Ao quê? Seria sábio ter medo?

Uma coisa é certa: a responsabilidade pela eventual "aventura" de hoje não é das massas exasperadas, é de quem as encurralou até a exasperação. Por: Contardo Calligaris Folha de SP

ESPIONAGEM E COMPETÊNCIA

Há quem se horrorize com as dimensões da espionagem americana, e há quem, movido pela inveja, finja fazê-lo. É o caso de nossos governantes.


Afinal, o que estamos vivendo é o fim do processo de centralização excessiva do poder que se iniciou no Absolutismo, de que nossos descendentes provavelmente verão a democracia representativa e outras formas de modernidade como um subcapítulo. Como em toda decadência final de um modelo de civilização, o que era convenção social passa a ser imposto à força após perder a aceitação tácita que lhe dava autoridade. É o que ocorreu em Roma sob Juliano; é o que levou à caça às bruxas que tomou conta da Europa após o fim da Idade Média.

A hipertrofia da autoridade estatal central, típica da modernidade que ora finda, levou a fenômenos que seriam considerados absurdos em qualquer outra sociedade, como os documentos de identidade pessoal e de veículos (e o governo precisa autorizar que mudemos a cor de um carro que nos pertence!), a obrigatoriedade geral de declarar ao Estado toda a renda pessoal etc. Saber do que conversamos com os amigos nas redes sociais, por onde passeou nosso telefone celular ou o conteúdo dos nossos e-mails comerciais é uma diferença de grau, não de essência.

Nos EUA, os ativistas pela liberdade de informação estão em polvorosa, e com razão. No Brasil, não há o que fazer; sabemos que estamos sujeitos à violação de nossa privacidade a cada momento e – mais até que os americanos – em tese poderíamos até mesmo ser obliterados pelos robôs assassinos voadores (os drones) com que os EUA atualmente se comprazem em caçar inimigos, reais ou imaginários.

Uma alegria, contudo, nós ainda temos: nosso governo não tem os meios do americano. Se a gangue que ora ocupa o Planalto pudesse, indubitavelmente a vigilância seria ainda mais acirrada. Para nossas autoridades, todavia, é um sonho impossível. Seria mais fácil estabelecer uma colônia petista na Lua que atingir o nível de competência em espionagem de que dispõe o governo americano.

Mais ainda: as patéticas tentativas de aumento de controle do nosso governo só fazem com que perca mais rapidamente o parco poder que ainda lhe resta. A castração da ação independente da Polícia Federal levou-a a tornar público o caso Rosemary, e nada impede que o mesmo fenômeno ocorra em outras instâncias. Os EUA têm a Homeland Security; nós só temos uma presidente que em breve estará falando sozinha. Eles têm robôs assassinos voadores; nós só temos mensaleiros abusando da FAB. Dá pra encarar.
Por: Carlos Ramalhete Gazeta do Povo PR