terça-feira, 26 de novembro de 2013

NEM DE ESQUERDA, NEM DE DIREITA


“Mas vocês não são de esquerda, nem de direita!”

Essa observação, feita após um discurso meu, foi apropriada e rara. Rara porque quase nunca ouço tal observação; e apropriada por demonstrar um entendimento correto.

A maioria de nós parece estar sempre tentando encontrar simplificações – generalizações práticas – que ajudem nossa linguagem. Elas substituem as definições longas e complexas. Ainda assim, devemos ter cuidado para que tais simplificações não se transformem em um engodo semântico e não passem a prestar um desserviço a quem as use. Temo que esse seja o caso em relação aos termos “esquerda” e “direita” quando usados por libertários, os quais, espero demonstrar, não são nem de esquerda, nem de direita, segundo o uso atual desses termos.

Tanto “esquerda” quanto “direita” são termos que descrevem posições autoritárias e a liberdade não tem um relacionamento horizontal com o autoritarismo. A relação do liberalismo com o autoritarismo é vertical. Ele está acima da sujeira dos homens que escravizam homens. Mas voltemos ao começo.

Houve um tempo em que “direita” e “esquerda” eram designações apropriadas e pertinentes em relação a diferenças ideológicas. “Os primeiros esquerdistas eram um grupo de deputados recentemente eleitos para a Assembléia Nacional Constituinte no começo da Revolução Francesa em 1789. Foram rotulados “de esquerda” porque, por acaso, se sentavam do lado esquerdo da assembléia francesa.”

“Os legisladores que se sentavam do lado direito ficaram conhecidos como o Partido da Direita, ou direitistas. Os direitistas ou “reacionários” se colocavam a favor de um governo nacional altamente centralizado, de leis especiais e privilégios para sindicatos e vários outros grupos e classes, do monopólio econômico do governo em várias áreas, e da manutenção do controle governamental sobre os preços, a produção e a distribuição.” ¹

Os esquerdistas eram, na prática, ideologicamente similares àqueles que hoje identificamos como “libertários”. Os direitistas eram seus oponentes ideológicos: estatistas, intervencionistas – em suma, autoritários. “Esquerda” e “direita” na França, durante os anos de 1789-90, tinham rigidez semântica e alto grau de precisão.

Mas o termo “esquerdista” foi logo apropriado pelos autoritários jacobinos e passaram a significar o contrário de sua definição anterior. “Esquerdista” se transformou em descrição dos igualitaristas e passou a ser associado com o socialismo marxista: comunismo, socialismo, fabianismo.

E os “direitistas”? Onde se encaixavam depois da inversão semântica do termo “esquerdista”? Moscou tirou partido disso: qualquer idéia que não fosse comunista ou socialista era decretada e propagandeada como “fascista”. É por isso que qualquer ideologia que não seja comunista (de esquerda) é agora rotulada fascista (de direita).

Vamos dar uma olhada na definição de fascismo no dicionário Webster’s: “Qualquer programa que pretenda estabelecer um regime nacional centralizado e autocrático, com políticas fortemente nacionalistas, exercendo controle governamental sobre a indústria, o comércio e as finanças, censura rígida e supressão da oposição por meio da força.”

Qual seria, na verdade, a diferença entre o comunismo e o fascismo? Ambos são formas de estatismo, autoritarismo. A única diferença entre o comunismo de Stálin e o fascismo de Mussolini é um detalhe insignificante na estrutura organizacional. Mas um é de “esquerda” e outro é de “direita”.

Onde ficam os libertários no mundo de palavras criado por Moscou? O libertário está, na realidade, em oposição ao comunismo. Ainda assim, se o libertário emprega os termos “esquerda” e “direita”, estará caindo na armadilha semântica de ser um “direitista” (fascista), por não ser um “esquerdista” (comunista). Esse é um cemitério semântico para os libertários, um jogo de palavras que nega sua existência. Se aqueles que têm relações com Moscou insistirão nessa tecla, há várias razões para um libertário fugir dela.

Uma desvantagem importante do uso por parte dos libertários da terminologia direita-esquerda é a grande oportunidade para se aplicar a “teoria do meio termo”. Há vinte séculos aceita-se no ocidente a teoria aristotélica de que a posição mais razoável é aquela exatamente entre dois extremos, politicamente conhecida hoje em dia como a posição “no meio do caminho”. Agora, se os libertários usam os termos “esquerda” e “direita”, eles se declaram de extrema-direita, por estarem extremamente distantes, em suas convicções, do comunismo. Mas a palavra “direita” tem sido, com sucesso, identificada com o fascismo. Logo, cada vez mais pessoas são levadas a acreditar que a melhor posição é em algum ponto entre o comunismo e o fascismo, sendo ambos nada mais que autoritarismo.

Porém, a “teoria do meio termo” não pode ser aplicada com eficiência indiscriminadamente. Por exemplo, há certa lógica quando, ao termos de decidir entre não comermos absolutamente nada ou a gula, escolhermos o meio termo entre os dois extremos como a melhor posição. Mas, por outro lado, não há lógica nenhuma em escolhermos o meio do caminho ao decidirmos se devemos roubar mil dólares ou nada. O meio termo recomendaria roubarmos 500 dólares. Assim, o meio termo não teria mais lógica quando aplicado ao comunismo e ao fascismo (dois nomes para a mesma coisa) do que quando aplicado ao roubo de duas quantias.

O libertário não pode ter nenhuma relação com “direita” ou “esquerda” porque rejeita qualquer tipo de autoritarismo – o uso de força policial para controlar a vida criativa do homem. Para ele, comunismo, fascismo, nazismo, fabianismo, o estado de bem-estar social – enfim, todos os igualitarismos – se encaixam na definitiva, e talvez cínica, descrição de Platão, séculos antes destes sistemas coercitivos serem desenvolvidos:

“O maior de todos os princípios é que ninguém, homem ou mulher, esteja sem um líder. Nem deve o espírito de alguém ser habituado a deixá-lo fazer qualquer coisa por sua própria iniciativa, nem por zelo, nem mesmo por prazer. Mas tanto na guerra quanto na paz, a seu líder ele deve direcionar seus olhos e segui-lo fielmente. E mesmo nos assuntos menores ele deve se proteger sob alguma liderança. Por exemplo, ele deve se levantar, ou se mover, ou se lavar, ou se alimentar… somente se tiver recebido ordens para tal… Em poucas palavras, ele deve ensinar sua alma, através do hábito, a nunca sonhar agir independentemente, e, na verdade, a se tornar incapaz disso.”

Os libertários rejeitam esse princípio e assim, não se colocam nem à direita, nem à esquerda dos autoritários. Eles, como os espíritos humanos que libertariam, ascendem – estão acima – sobre a degradação. Sua posição, se fôssemos usar analogias direcionais, seria acima – como um vapor que se separa do esterco e sobe a uma atmosfera saúdavel. Se a idéia de extremismo for aplicada a um libertário, que seja baseada no quão extremas são suas posições ao se opor às crenças autoritárias.

Estabeleçamos os conceitos de emergir, de libertar – o qual é o próprio significado do liberalismo – e o significado da teoria do meio termo se tornará inaplicável, já que não pode haver meio do caminho entre o zero e o infinito. E é absurdo sugerir que exista.

Que termo simples os libertários deveriam aplicar para se distinguirem da definição moscovita dos “esquerdistas” e dos “direitistas”? Não consegui até agora inventar nenhum, mas até que eu consiga, devo me contentar em dizer “sou libertário”, e estar disposto a explicar a definição do termo a qualquer pessoa que procure significados ao invés de rótulos.

1. Dean Russell, The First Leftist (Irvington-on-Hudson, N.Y.: Foundation for Economic Education, 1951), p. 3.

* Publicado originalmente em 04/01/2008.

SOBRE O AUTOR
Por: Leonard Read  fundador da Foundation for Economic Education (FEE) e autor de vinte e sete livros e inúmeros ensaios. Ele foi um dos principais responsáveis pelo avivamento liberal no pós-guerra.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

HÁ 90 ANOS: O FIM DA HIPERINFLAÇÃO NA ALEMANHA

No dia 15 de novembro de 1923, medidas decisivas foram adotadas para acabar com o pesadelo da hiperinflação na República de Weimar: o Reichsbank, o banco central alemão, simplesmente parou de monetizar a dívida do governo, e um novo meio de troca, orentenmark, começou a ser emitido paralelamente ao papiermark (que, como diz o nome, era uma moeda de papel sem absolutamente nenhum lastro em ouro). 

Estas medidas foram bem-sucedidas em acabar com a hiperinflação, mas o poder de compra dopapiermark já estava totalmente arruinado. Para entender como e por que tudo isso aconteceu, é necessário analisar tudo o que ocorreu imediatamente antes da eclosão da Primeira Guerra Mundial.

Foi em 1871 que o marco se tornou a moeda oficial do Império Alemão (Deutsches Reich). Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, a conversibilidade do reichsmark em ouro foi suspensa no dia 4 de agosto de 1914. Sendo assim, o reichsmark, que até então era lastreado em ouro (e que, por isso, também era chamado degoldmark), se transformou no papiermark, uma moeda de papel puramente fiduciária, sem nenhum lastro. Inicialmente, o Reich financiou suas despesas de guerra majoritariamente por meio do endividamento. A dívida pública total subiu de 5,2 bilhões de papiermark em 1914 para 105,3 bilhões em 1918.

Em 1914, a quantidade de papiermark em circulação era de 5,9 bilhões; já em 1918, era de 32,9 bilhões. De agosto de 1914 a novembro de 1918, os preços no atacado subiram 115%, o que significa que o poder de compra do papiermark caiu mais de 50%. Neste mesmo período, a taxa de câmbio do papiermark se depreciou 84% em relação ao dólar americano.

A nova República de Weimar enfrentou desafios econômicos e políticos magnânimos. Em 1920, a produção industrial havia despencado para apenas 61% do nível alcançado em 1913, e em 1923 caiu ainda mais, para 54%. Os terrenos perdidos após a promulgação do Tratado de Versalhes haviam enfraquecido consideravelmente a capacidade produtiva do Reich: o Império perdera aproximadamente 13% de suas terras e, em decorrência disso, aproximadamente 10% da população alemã viva agora fora das fronteiras. Adicionalmente, a Alemanha tinha de fazer vários pagamentos indenizatórios para os países vencedores da Primeira Guerra. Ainda mais importante, no entanto, foi o fato de que os novos e inexperientes governos democráticos da Alemanha queriam atender ao máximo possível os desejos de seus eleitores. Dado que as receitas tributárias eram insuficientes para financiar estas despesas, o Reichsbank teve de recorrer à impressora de dinheiro.

De abril de 1920 a março de 1921, a proporção de receitas tributárias em relação aos gastos totais do governo era de apenas 37%. Após isso, a situação melhorou um pouco, de modo que, em junho de 1922, os impostos chegaram a cobrir 75% dos gastos totais. Mas então a situação voltou a deteriorar. E de maneira pavorosa. Já no final de 1922, a Alemanha foi acusada de atrasar seus pagamentos indenizatórios. Para reforçar suas reivindicações, tropas belgas e francesas invadiram e ocuparam o Vale do Ruhr, o coração industrial do Reich, em janeiro de 1923. O governo alemão, então sob o comando do chanceler Wilhelm Kuno, conclamou os trabalhadores do Vale do Ruhr a resistir a toda e qualquer ordem dos invasores, prometendo que o Reich continuaria pagando seus salários. Para manter todo esse arranjo, o Reichsbank começou a imprimir ainda mais dinheiro para financiar os gastos do governo (em termos técnicos, o Reichsbank estava "monetizando as dívidas do governo"). O intuito era utilizar o dinheiro recém-criado para compensar a queda da arrecadação tributária e pagar os salários, as transferências sociais e os subsídios. 

De maio de 1923 em diante, a quantidade de papiermark começou a ficar fora de controle. Subiu de 8,610 bilhões em maio para 17,340 bilhões em abril, para 669,703 bilhões em agosto até alcançar 400 quintilhões (ou seja, 400 seguido de 18 zeros) em novembro de 1923. Os preços no atacado dispararam para níveis astronômicos, aumentando 18.000.000.000.000% (dezoito trilhões por cento) desde o final de 1919 até novembro de 1923. Para se ter uma noção deste valor, com a quantidade nominal de dinheiro necessária para se comprar um ovo em novembro de 1923 era possível comprar 500 bilhões de ovos em 1918, ao final da Primeira Guerra. Apenas em novembro de 1923, o preço do dólar em termos de papiermark subido 8,9 trilhão por cento. Em suma, o papiermark havia afundado e não comprava nem poeira.

Com o colapso da moeda, o desemprego disparou. Desde o final da Primeira Guerra, o desemprego havia se mantido em níveis consideravelmente baixos, uma vez que os governos de Weimar mantiveram a economia artificialmente aditivada por meio de vigorosos déficits e impressão de dinheiro. Ao final de 1919, a taxa de desemprego estava em 2,9%; em 1920, em 4,1%; em 1921, em 1,6%; e em 1922, em 2,8%. Com o colapso do papiermark, no entanto, a taxa de desemprego chegou a 19,1% em outubro, a 23,4% em novembro e a 28,2% em dezembro de 1923. A hiperinflação empobreceu a esmagadora maioria da população alemã, especialmente a classe média. As pessoas passaram a sofrer com a escassez de alimentos e com a falta de proteção contra o frio. O extremismo político passou a ficar em evidência e se tornou plenamente aceitável.



Alemães indo comprar pão em 1923

Para acabar com a bagunça monetária, o problema central a ser resolvido era o próprio Reichsbank. O mandato de seu presidente, Rudolf E. A. Havenstein, era vitalício, e o cidadão era literalmente irrefreável: sob o comando de Havenstein, o Reichsbank emitia quantias cada vez maiores de papiermark para manter o Reich financeiramente solvente. E então, no dia 15 de novembro de 1923, o Reichsbank foi obrigado (1) a interromper a impressão de dinheiro e a monetização da dívida do governo, e (2) a começar a emitir uma nova moeda, o rentenmark Foi decidido que, dali em diante, um trilhão de papiermark seria igual a um rentenmark. 

No dia 20 de novembro de 1923, Havenstein morreu repentinamente em decorrência de um ataque cardíaco. Naquele mesmo dia, Hjalmar Schacht, que viria a se tornar presidente do Reichsbank em dezembro, tomou medidas e estabilizou o papiermark em relação ao dólar: o Reichsbank, por meio de intervenções no mercado de câmbio, fez com que 4,2 trilhões de papiermark se tornassem igual a um dólar. E dado que um trilhão de papiermark era igual a um rentenmark, a taxa de câmbio passou a ser de 4,2 rentenmark por dólar. Esta era exatamente a taxa de câmbio vigente entre o reichsmark e o dólar antes da Primeira Guerra Mundial. O "milagre do rentenmark" marcou o fim da hiperinflação.

Como foi possível que um desastre monetário desta magnitude ocorresse em uma sociedade tão civilizada e avançada, levando à total destruição da moeda? Várias explicações já foram apresentadas. Por exemplo, já foi argumentado que os pagamentos de indenização, os crônicos déficits no balanço de pagamentos, e até mesmo a depreciação do papiermark no mercado de câmbio foram as reais causas do colapso da moeda alemã. Entretanto, essas explicações não são nada convincentes. Como explicou o grande economista alemão Hans F. Sennholz:

Todos os marcos foram impressos por alemães e emitidos por um banco central gerenciado por alemães em um governo puramente alemão. Eram partidos políticos alemães — tais como os Socialistas, o Partido Católico de Centro, e os Democratas, formando várias coalizões governamentais — os responsáveis exclusivos pelas políticas que conduziam. Mas é claro que admitir a responsabilidade por qualquer calamidade não é algo que se deve esperar de qualquer partido político.

De fato, a hiperinflação alemã foi produto dos próprios alemães; foi resultado da deliberada decisão política de se aumentar a quantidade de dinheiro na economia sem nenhuma limitação.

Quais são as lições a serem aprendidas com a hiperinflação alemã? A primeira lição é que até mesmo um banco central politicamente independente não é garantia de proteção confiável contra a destruição da moeda de papel. O Reichsbank havia se tornado politicamente independente ainda no início de 1922 — a mando das forças aliadas e em troca de um adiamento temporário nos pagamentos de indenização. Ainda assim, a cúpula do Reichsbank optou por hiperinflacionar a moeda. Vendo que o Reich estava cada vez mais dependente da impressão de dinheiro do Reichsbank para se manter solvente, a cúpula do Reichsbank optou por fornecer quantias ilimitadas de dinheiro ao governo. É claro que o apetite dos políticos de Weimar por este dinheiro fácil acabou se mostrando ilimitado.

A segunda lição é que um papel-moeda fiduciário não dura para sempre. Hjalmar Schacht, em sua biografia lançada em 1953, observou que: "A introdução do rentenmark só foi possível porque o governo e o banco central prometeram que a cédula de papel seria conversível em ouro sempre que o portador assim exigisse. Garantir a possibilidade de ser conversível em ouro deve ser o compromisso de todos os emissores de dinheiro de papel".

As palavras de Schacht contêm uma constatação econômica primordial: papel-moeda que não é lastreado por uma commodity é apenas um dinheiro político e, como tal, é um elemento que gera perturbações em um sistema de livre mercado. Os representantes da Escola Austríaca de Economia apontaram este fato ainda no século XIX.

Dinheiro de papel, produzido "do nada" e injetado na economia por meio do crédito bancário, não apenas é cronicamente inflacionário, como também gera ciclos econômicos, investimentos errados e insustentáveis, e endividamento excessivo da população. Tão logo governo e população começam a sofrer as consequências de seu alto endividamento, o crédito bancário se reduz e a economia entra em recessão. Ato contínuo, a criação de mais dinheiro passa a ser vista como uma solução política fácil e tentadora demais para ser evitada. Este é o caminho politicamente mais palatável para se tentar fugir dos problemas que foram criados justamente pela criação de dinheiro via expansão do crédito. 

Olhando para o mundo atual — no qual várias economias vêm há décadas usado papel-moeda produzido via expansão do crédito (endividamento) e no qual o endividamento está atingindo níveis incontornáveis —, os desafios correntes são, de certa forma, muito similares àqueles observados na República de Weimar há 90 anos. Tanto agora quanto naquela época, uma reforma do sistema monetário se faz urgente; e quanto mais cedo o desafio da reforma monetária for encarado, menores serão os custos deste reajuste.


[1] Ver em H. James, "Die Reichbank 1876 bis 1945," in: Fünfzig Jahre Deutsche Mark, Notenbank und Währung in Deutschland seit 1948, Deutsche Bundesbank, ed. (München: Verlag C. H. Beck, 1998), pp. 29 – 89, esp. pp. 46 – 54; C. Bresciani-Turroni, The Economics of Inflation, A Study of Currency Depreciation in Post-War Germany (Northampton: John Dickens & Co., 1968 [1931]); também F.D. Graham, Exchange, Prices, And Production in Hyper-Inflation: Germany, 1920 — 1923 (New York: Russell & Russell, 1967 [1930]).

[2] Para mais detalhes ver Bresciani-Turroni, Economics of Inflation, chap. IX, pp. 334–358.

[3] H. Schacht, 76 Jahre meines Lebens (Kindler und Schiermeyer Verlag, Bad Wörishofen, 1953), pp. 207-208.

Por: Thorsten Polleit  economista-chefe da empresa Degussa, especializada em metais precisos, e co-fundador da firma de investimentos Polleit & Riechert Investment Management LLP. Ele é professor honorário da Frankfurt School of Finance & Management.

"BREAKING BAD"

A série "Breaking Bad" chegou ao fim. Enquanto o cinema americano encareta sob a bota da censura politicamente correta, na qual homens cada vez mais falam fino como mulherzinhas e as mulheres brincam de meninas superpoderosas, a TV arrisca aquilo que o cinema se tornou incapaz de fazer: falar a sério sobre o cotidiano.

Uma sutil herança de obras como "O Médico e o Monstro", de Robert Louis Stevenson, se faz sentir em "Breaking Bad": o homem "bonzinho" é um derrotado. Seu lado mau é essencial para sua virilidade, mesmo espiritual. Sabendo que parte do mundo hoje é composto por gente mimada, vale salientar que ao dizer isso não estou a cultivar o mal como coisa chique. O assunto é mais sério do que pensa nossa vã inteligência infantilizada. 

Ecos da terrível hipótese de Nelson Rodrigues sobre os maridos também se fazem sentir em "Breaking Bad". Nelson dizia que a mulher quer um nada como marido. Segundo Nelson, nenhuma das grandes qualidades que fazem de um homem um grande homem servem num bom marido. 

O professor Walter White é um homem aniquilado. A maioria de nós é, e no aniversário merece, quando muito, que a mulher bata uma punheta como presente --ainda que prestando mais atenção a alguma oferta da internet. 

Um homem um pouco mais bem-sucedido talvez ganhasse um boquete. Trata-se de uma cena homérica da série, mas que indica bem o grau de investimento do casal no sexo (ele tampouco está muito interessado no "presente de pobre"). 

Espremido entre uma carreira que marca seu fracasso (era um promissor gênio da química quando jovem e virou um medíocre professor de "high school" e um funcionário humilhado de um lava-rápido), um salário miserável, um filho portador de necessidades especiais e uma mulher grávida que enche o saco dele para pintar o quarto, Walter é um homem sem qualquer futuro. 

Passa suas noites insone, mergulhado no pânico de todo "loser": o dinheiro vai dar? Vou aguentar muito tempo sendo capacho? Minha mulher também me faz de capacho? Vou conseguir comer minha mulher quando ela quiser? Meu cunhado é mais macho do que eu? Por que eu dei errado e meus colegas de faculdade se deram bem? Serei eu um merda? No que eu errei? Por que estou aqui com esse carro medíocre? E essas férias CVC? Eis o dia a dia de um homem comum. 

Ser capacho é a virtude máxima de um "loser" que é bom pai e bom marido. Se a emancipação feminina era só dizer que ela queria trabalhar fora e gozar, a do homem é mais complexa porque aparentemente passa por elementos mais destrutivos do que a feminina. 

Um homem que se sente preso na condição de bom pai e bom marido pode chegar à conclusão de que só se libertará quando puser em risco exatamente as virtudes que o estão matando: ganhar dinheiro seguro ainda que pouco, ser provedor, engolir sapo no trabalho, abrir mãos dos seus sonhos em nome de uma casa própria, investir na ideia de que algum dia sua mulher Bovary e seus filhos chorarão em seu enterro, louvando-o. Um homem de classe média aniquilado só experimenta um pouco de respeito (quando muito) quando fica silencioso como um cadáver. 

Nosso químico descobre que tem câncer terminal de pulmão (e, como puro que sempre foi, nunca fumou) e "desperta". Esta é a expressão que ele usa quando fala com seu sócio sobre a razão de um "loser" como ele de 50 anos decidir entrar para o crime fazendo droga. 

E não só. Passa a comer sua mulher com gosto (e em situações inesperadas) e ela fica mais feliz. Pele bonita, olhos brilhantes, cabelos sedosos, mais generosa no dia a dia, como toda mulher bem comida. 

Dito nos termos banais de hoje: "recupera sua autoestima" quando descobre que vai morrer e entra para o crime para ganhar dinheiro. Nosso herói sente que pela primeira vez está vivo, justamente quando sabe que, de certa forma, já está morto. 

O mal como componente libertador é uma questão assustadora, mas perigosamente real. Um mundo que goza em defender alfaces terá cada vez mais homens medíocres que para poderem meter em sua s mulheres precisarão ter câncer no pulmão sem nunca ter fumado. 

Por: Luiz Felipe Pondé Folha de SP

domingo, 24 de novembro de 2013

ARMADILHA PARA NEGROS

ARMADILHA PARA NEGROS (I) * 


Ainda há pouco, os movimentos negros brasileiros reivindicavam a eliminação do item cor nos documentos de identidade. Com a malsinada lei de cotas que hoje assola o ensino superior, os negros insistem em declarar a cor na inscrição no vestibular. Estes mesmos movimentos negros sempre consideraram que qualquer critério supostamente científico para determinar a cor de alguém é racista. Quem então é negro para efeitos legais? No caso da lei estadual no Rio e do projeto de lei federal, o critério é o da auto-declaração. Pardo ou negro é quem se considera pardo ou negro, mesmo que branco seja. Ora, neste país em que impera a chamada lei de Gérson, não poucos brancos se declararam negros no último vestibular da UERJ, a primeira universidade pública brasileira a estabelecer o sistema de cotas. Grita dos líderes negros: vamos determinar cientificamente quem é branco e quem é negro e processar os brancos que se declaram negros. Ou seja, as palavras de ordem da afrodescendentada são mais cambiantes que as nuvens. Mas mudam num só sentido, na direção de obter vantagens para os negros, não só dispensando méritos como também passando por cima dos eventuais méritos de quem se declara branco. 

O atual presidente da República está longe de ser o primeiro apedeuta a assumir o poder neste país. Câmara e Senado estão repletos de analfabetos jurídicos, que nada entendem da confecção de leis nem sabem sequer distinguir lei maior de lei menor. Embalados por palavras de ordem estúpidas, em geral oriundas dos Estados Unidos, criam leis irresponsáveis, com a tranqüilidade de quem não precisa prestar contas a ninguém. É o caso da lei de cotas. Só agora, após o vestibular da UERJ e de uma enxurrada de ações judiciais, argutos analistas descobriram que a famigerada lei fere o artigo 5º da Constituição: "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza." 

Não bastasse esta tremenda mancada jurídica, que daqui para frente só servirá para entupir ainda mais os já entupidos tribunais — gerando grandes lucros aos advogados, os reais beneficiados pela lei de cotas — o presidente da República, mal assumiu o poder, sancionou lei que obriga a inclusão da temática História e Cultura Afro-brasileira no currículo oficial da rede de ensino Fundamental e Médio. As aulas abordarão desde a história da África e dos africanos até a luta dos negros no Brasil. A medida é de um racismo evidente. E por que não a História de Portugal e a luta dos portugueses no Brasil? Ou a história da Itália e as lutas dos italianos? Ou a história do Japão e a luta dos japoneses? O Brasil é um cadinho de culturas e a contribuição africana a seu desenvolvimento está longe de ser a única ou a mais importante. O estudo da história afro-brasileira tem no entanto suas complicações.

Para os próceres do movimento negro, não basta historiar a cultura afro-brasileira. É preciso embelezá-la. É o que se deduz da proibição do livro Banzo, Tronco e Senzala, de Elzi Nascimento e Elzita Melo Quinta, na rede pública do Distrito Federal por ordem do governador Joaquim Roriz, em acatamento ao pedido do senador petista Paulo Paim. Um garoto teria ficado impressionado com as informações contidas no livro dizendo que os "negros perdiam a condição humana assim que eram aprisionados na África para se tornarem simples mercadoria à disposição dos brancos" e que aprisionar os negros não era difícil. "Principalmente, depois que os traficantes passaram a contar com o auxílio de negros traidores que prendiam elementos de sua própria raça em troca de fumo, cachaça, pólvora e armas." 

"Qual é a auto-estima de uma criança negra quando recebe um livro que diz que, se seu povo um dia foi escravo, os culpados foram os negros, e não os europeus da época, mercadores de escravos?" — pergunta Paim. O deputado parece ignorar — ou propositadamente omite — o fato de que a escravidão não é invenção dos europeus. Ela já está na Bíblia e em momento algum é condenada pelos profetas ou patriarcas. Nem mesmo Paulo, reformador do Livro Antigo, a condena. 

Foi norma na Grécia antes de a Europa existir. Séculos antes de o primeiro navio negreiro europeu aportar no continente africano, ela lá já existia, sem a interferência do Ocidente. O presidente do Senegal, Abdoulaye Wade, que o diga. Comentando as reivindicações dos movimentos negros, identificou-se como descendente de uma rica família de senhores de escravos e perguntou se alguém iria pedir-lhe indenização. Ainda bem que não o fez em jornais do Distrito Federal, ou seria censurado pelo governador Joaquim Roriz. 

Que os chefes tribais negros facilitavam a tarefa dos negreiros, vendendo escravos de outras tribos, isto tampouco é ignorado. Vendiam e continuam vendendo até hoje, em pleno século XXI. Na Mauritânia, Sudão e Gana, no Benin, Burkina Fasso, Mali e Niger, a escravidão ainda persiste como nos tempos dos navios negreiros. Ano passado, a GNT mostrava brancos europeus comprando escravos no Sudão. Não que fossem negreiros. Eram representantes de Ongs européias, que compravam negros para libertá-los. O propósito pode ser nobre. Mas toda procura gera oferta e os dólares dos ongueiros só serviram para estimular o tráfico de escravos. Esta é a história da África. E se algum autor relega a escravidão para tempos passados, o livro está desatualizado. 

A nova lei assinada pelo presidente da República acrescenta ao calendário escolar o dia da morte de Zumbi (20 de novembro) como o Dia Nacional da Consciência Negra. Esta ambição patrioteira de ter heróis, típica de países subdesenvolvidos, levou políticos negros a elegeram Zumbi como herói da raça. Ora, o herói negro também era proprietário de escravos. Como é que ficamos? Irão as autoridades censurar qualquer livro que ateste esta condição de escravagista de Zumbi? 

Ao defender os sistemas de cotas na universidade, os negros caíram em uma tosca armadilha. Podem hoje ter facilidades na obtenção de um diploma. Mas quem, amanhã, irá contratar os serviços de profissional que entrou na universidade pela porta dos fundos? Ao exigir a inclusão da história africana nos currículos, caíram em armadilha mais sofisticada. A história da África é a história das guerras tribais e da escravidão, da lapidação por adultério, da mutilação física como punição e da mutilação sexual como costume. Democracia, direitos humanos, liberdade de imprensa, emancipação da mulher, são instituições desconhecidas no continente. Seis mil meninas têm o clitóris extirpado, diariamente, em vinte países do Oriente Médio e da África. Por barbeiros locais ou parteiras, com instrumentos não-esterilizados. 

A África, até hoje, está mais para Idi Amin Dada do que para Mozart. Mais para Bokassa que para Einstein. Estudar sua história, seja a passada, seja a presente, não leva criança alguma a nenhuma auto-estima. 

Jamais tivemos leis Jim Crow— Em crônica passada, comentei o sistema de cotas para negros na universidade e o estudo obrigatório da História africana nas escolas brasileiras. O artigo rendeu uma saraivada de mensagens, em geral iradas, nas quais invariavelmente sou acusado de racista. “A doença do racismo é uma invenção européia” – escreve um dos leitores – “Você não pode infetar uma pessoa com a doença sem esperar ficar doente. Seu artigo mostra a doença que você ainda tem”. Tantas foram as objeções, que responder a todas é impossível. Atenho-me então a comentar os pontos mais recorrentes, como racismo, sistema de cotas, escravidão e história da África. Deixo de lado minha surpresa ao tomar conhecimento de que os hutus e tutsis que se cortam aos pedaços em Ruanda estão contaminados por uma invenção européia. 

Comecemos por meu suposto racismo. Nasci no Rio Grande do Sul, Estado que, por sua forte colonização européia, tem a fama de ser o Estado mais racista do Brasil. Apesar de ser constituído por uma expressiva maioria branca, foi o primeiro Estado do país a eleger um governador negro, Alceu Collares. Ora, nem a Bahia, Estado majoritariamente negro, teve um governador negro. Collares não só foi governador, como também prefeito de Porto Alegre, capital também majoritariamente branca. Antes de ser prefeito da capital gaúcha, foi prefeito de Bagé, cidade da fronteira oeste do Rio Grande do Sul, onde os brancos constituem maioria esmagadora. Desde minha infância, de meus estudos primários aos universitários, convivi afavelmente com negros. Em meus anos de Porto Alegre, por noites a fio participei da mesa de Lupicínio Rodrigues, no bar da Adelaide, e por ele sempre nutri admiração. Lupicínio –que compôs os mais belas letras de samba do Brasil – era universalmente querido pelos gaúchos. Hoje, noto que tive entre os negros bons amigos. E por que hoje? Porque na época nem notava que eram negros. Com o acirramento recente da luta racial, passamos a conviver com pessoas que insistem em se definir como negras, quando nem cogitávamos de que o fossem. 

Entre os mails recebidos, sou acusado de defender a tese de que no Brasil não existe racismo. De certa forma, a defendo. Algum racismo existe entre nós, ou humanos não seríamos. Mas jamais ao nível dos EUA ou países europeus. O negro, quando rico ou bem-sucedido, é estimado e mesmo invejado no Brasil. Milhões de brancos brasileiros se sentiriam sumamente honrados sendo fotografados junto a um Pelé. O rechaço existe em relação ao negro pobre ou miserável. Neste caso, o fator de distanciamento não é a negritude do negro, mas sua miséria. Exceto padres católicos e assistentes sociais, ninguém gosta de miséria. Nem negro gosta de negro pobre. 

Nunca tivemos, no Brasil, leis proibindo a negros qualquer direito. As chamadas leis Jim Crow, declaradas inconstitucionais pela Suprema Corte americana em 1954, constituíram a partir de 1880 a base legal da discriminação contra negros nos Estados do Sul, proibindo até mesmo um estudante passar um livro escolar a outro que não fosse da mesma raça. No Alabama, nenhum hospital podia contratar uma enfermeira branca se nele estivesse sendo tratado um negro. As estações de ônibus tinham de ter salas de espera e guichês de bilhetes separados para cada raça. Os ônibus tinham assentos também separados. E os restaurantes deveriam providenciar separações de pelo menos sete pés de altura para negros e brancos. 

No Arizona, eram nulos casamento de qualquer pessoa de sangue caucasiano com outras de sangue negro, mongol, malaio ou hindu. Na Florida, proibia-se o casamento de brancos com negros, mesmo descendentes de quarta geração. Neste mesmo Estado, quando um negro compartilhasse por uma noite o mesmo quarto que uma mulher branca, ambos seriam punidos com prisão que não deveria exceder 12 meses e multa até 500 dólares. Na Geórgia, cerveja ou vinho tinham de ser vendidos exclusivamente a brancos ou a negros, mas jamais às duas raças no mesmo local. No Mississipi, mesmo as prisões tinham refeitórios e dormitórios separados para prisioneiros de cada raça. No Texas, cabia ao Estado providenciar escolas para crianças brancas e para negras. As leis Jim Crow explicam a mauvaise conscience ianque, que se traduziu na ação afirmativa. 


ARMADILHA PARA NEGROS (II) * 

Racismo negro no Brasil - Brasileiros, desconhecemos este racismo institucionalizado. Negros e brancos casam-se com brancas e negras, bebem e comem nos mesmos restaurantes, estudam e confraternizam nos mesmos bancos escolares. Se há menos negros que brancos na universidade, isto se deve a fatores econômicos, mas jamais legais. O branco pobre – e eles são legião – tem a mesma dificuldade de acesso aos bancos universitários que o negro pobre. O negro rico – e eles também existem – tem a mesma facilidade de acesso que o branco rico. É inteligível o ódio que um negro americano possa sentir por um branco americano. Não há no entanto razão alguma para que este ódio seja exportado ao Brasil. Neste país, do ponto de vista legal, o negro nunca foi discriminado. 

O Brasil costuma importar as piores práticas do Primeiro Mundo, costumo afirmar. No censo de 2.000, quase sete milhões de norte-americanos, pela primeira vez, foram autorizados a identificar-se como integrantes de mais de uma raça. As categorias inter-raciais mais comuns citadas foram branco e negro, branco e asiático, branco e indígena americano ou nativo do Alasca e branco e "alguma outra raça". Os Estados Unidos deixam de lado a onedrope rule, pela qual um cidadão é considerado negro mesmo que tenha uma única gota de sangue negro em sua ascendência, e descobrem o mestiço. 

Enquanto os Estados Unidos reconhecem a multi-racialidade, alguns movimentos negros no Brasil pretenderam que até os mulatos se declarassem negros no último censo. O propósito é óbvio, exercer pressão legislativa. A população negra do Brasil, em 99, era de apenas 5,4%. Com o acréscimo de 39,9% do contingente de mulatos, o Brasil estaria perto de ser definido como um país majoritariamente negro, como aliás é hoje considerado por muitos americanos e europeus. O presidente José Inácio Lula da Silva, em sua já proverbial incultura, caiu nesta armadilha, ao afirmar que o Brasil é a segunda nação negra do mundo. Não é. Negro é minoria ínfima no Brasil. A menos que, como fizeram os EUA, se pretenda negar este espécime híbrido, o mulato. 

Quando os americanos descobrem o mestiço, os ativistas negros brasileiros querem eliminá-lo do panorama nacional. Em uma imitação servil da imprensa ianque, os jornais tupiniquins passam a usar o termo afrodescendente para definir a população que o IBGE classifica como negra ou parda. Mas se um negro é obviamente afrodescendente, o pardo é tanto afro como eurodescendente. A adotar-se a nova nomenclatura, sou forçado a declarar-me eurodescendente. E não vejo nisso nenhum desdouro. 

A palavra racismo, pouco freqüente na imprensa brasileira em décadas passadas, passou a inundar as páginas dos jornais a partir da queda do Muro de Berlim. Apparatchiks saudosos da Guerra Fria, vendo desmoralizadas suas bandeiras de luta de classes, proletariado versus burguesia, trabalho versus capital, trataram logo de encontrar uma nova dicotomia, para lançar irmãos contra irmãos. Existem negros e brancos no Brasil? Maravilha. Vamos então lançá-los em luta fratricida. Criaram-se leis absurdas que, a pretexto de combater o racismo, só servem para estimulá-lo. Hoje, no Brasil, se você insultar um negro, incorre em crime hediondo, com prisão firme e sem direito à fiança. Mas se matar um negro, a lei é mais leniente. Se você for primário, pode responder ao processo em liberdade. Ou seja: se você, em um momento de ira, insultou um negro e quer escapar de uma prisão imediata, só lhe resta uma saída: mate-o. Segundo a lei absurda, assassinato é menos grave que ofensa verbal. 

Vamos às cotas. Em virtude deste hábito nosso de importar do Primeiro Mundo seus piores achados, acabamos instituindo as cotas raciais na universidade. Mais uma dessas tantas leis que fabricam racismo. Como pode um jovem pobre e branco encarar sem animosidade um negro que lhe tomou a vaga na universidade, só porque é negro? Quando o juiz federal Bernard Friedman determinou o fim da política de ação afirmativa da faculdade de Direito da Universidade de Michigan, os americanos começaram a perceber que a política de cotas era uma péssima idéia. Em 1977, a estudante branca Barbara Grutter abriu processo depois de não ter sido aceita pela faculdade de Direito. Para Friedman, levar em consideração a raça dos estudantes como fator para decidir se os aceita ou não é inconstitucional. Segundo o juiz, a política de ação afirmativa da faculdade assemelha-se ao sistema de cotas, que determina que uma certa porcentagem de estudantes pertença a grupos minoritários. Ao ordenar que a faculdade deixe de praticar essa política, escreveu: “Aproximadamente 10% das vagas em cada turma são reservadas para membros de uma raça específica, e essas vagas são retiradas da competição”. 

Em 2002, o programa 60 Minutes entrevistou um professor que mostrava a injustiça do sistema. De 51 estudantes brancos candidatos a um programa da faculdade, apenas um foi aceito. Entre dez candidatos negros, foram aceitos os dez. A universidade adota uma espécie de lei Jim Crow às avessas, aceitando qualquer candidato negro e recusando brancos. Quando os americanos descobrem que a política de afirmação positiva não constituiu uma idéia boa ou justa, autoridades brasileiras aderem a esta política infame. Já existe projeto, aprovado Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara Federal, segundo o qual deverão ser escalados 25% de atores negros ou mulatos em peças de teatro, filmes e programas de televisão. 

Só no teatro, o leitor já pode imaginar as peripécias de um diretor. Se pensa em encenar Ibsen ou Tchekhov, como inserir negros em contextos eslavos ou nórdicos? E se a peça tiver um só personagem? Pelo menos um quarto do monólogo terá de ser feito por um negro? Só mesmo no bestunto de um analfabeto poderia ocorrer esta pérola do politicamente correto. Quando os EUA passam a abandonar o sistema de cotas, deputados brasileiros querem adotá-lo até mesmo no universo do lazer. 

A escravidão na Bíblia - Quando afirmei que negros capturavam negros na África, para vendê-los como escravos aos brancos europeus, não faltou interlocutor que alegasse que, se escravidão existia, é porque na Europa havia uma procura de escravos. Vários leitores jogaram sobre a Europa a pecha da escravidão. Tal atitude intelectual denota falta de leituras históricas. A escravidão é muito anterior à Europa. Ela já existe na Grécia socrática, quando Europa era apenas o nome de uma virgem raptada por Zeus, travestido em touro. Que mais não seja, a escravidão é vista como algo perfeitamente normal no livro que embasa o Ocidente. 

Um leitor cita o Eclesiastes, quando Salomão fala de um homem que domina outro homem para arruiná-lo. Considera que esta declaração é universal, não se aplicando a uma raça, mas a todas as raças. E considera ser intelectualmente irresponsável invocar a Bíblia sem realçar este fato. O leitor esqueceu de ler o Êxodo: 

“Quando comprares um escravo hebreu, seis anos ele servirá; mas no sétimo sairá livre, sem nada pagar. Se veio só, sozinho sairá; se era casado, com ele sairá a esposa. Se o seu senhor lhe der mulher, e esta der à luz filhos e filhas, a mulher e seus filhos serão do senhor, e ele sairá sozinho. Mas se o escravo disser: ‘eu amo a meu senhor, minha mulher e meus filhos, não quero ficar livre’, o seu senhor falo-á aproximar-se de Deus, e o fará encostar-se à porta e às ombreiras e lhe furará a orelha com uma sovela: e ele ficará seu escravo para sempre”. À semelhança de ativistas negros que não gostam de ouvir que chefes tribais africanos vendiam escravos aos brancos europeus, muitos católicos não gostam de ouvir que a Bíblia endossa a escravidão. Mas que se vai fazer? No Livro está escrito: “Se alguém ferir o seu escravo ou a sua serva com uma vara, e o ferido morrer debaixo de sua mão, será punido. Mas, se sobreviver um ou dois, não será punido, porque é dinheiro seu”. 

O Levítico legitima a aquisição de escravos estrangeiros: “Os servos e servas que tiverdes deverão vir das nações que vos circundam; delas podereis adquirir servos e servas. Também podeis adquiri-los dentre os filhos dos hóspedes que habitam entre vós, bem como das suas famílias que vivem conosco e que nasceram na vossa terra: serão vossa propriedade e deixá-los-eis como herança a vossos filhos depois de vós, para que os possuam como propriedade perpétua. Tê-los-eis como escravos; mas sobre os vossos irmãos, os filhos de Israel, pessoa alguma exercerá poder de domínio”. 

Ou seja, não há originalidade alguma no fato de a Europa ter sido escravista. Estava apenas seguindo os ditames do livro que a embasa. A escravidão percorre o Livro de ponta a ponta, só não vê quem não quer ver. Portugal, país bom cristão, não deixaria de dar continuidade à tradição bíblica. Negros brasileiros exigem hoje indenizações milionárias da República, em nome da escravidão passada. Ocorre que o Brasil república não conheceu a instituição da escravatura. A Lei Áurea é de 1888 – coincidentemente da mesma época em que nos EUA vigiam as hediondas leis Jim Crow. A república foi proclamada em 1889. Se os negros querem indenização, a conta deve ser enviada a Portugal. 

Existe hoje trabalho escravo no Brasil? Sim, existe. Mas nenhuma lei o legitima, pelo contrário. É crime e como tal é punido. Seria insensato de nossa parte negar a existência de nossas mazelas, em nome de um enjolivement da história pátria. 

E aqui entramos no ponto que mais protestos provocou em meu artigo, a afirmação de que a história da África é a história das guerras tribais e da escravidão, da lapidação por adultério, da mutilação física como punição e da mutilação sexual como costume. Choveram e-mails citando feitos passados, antigas culturas e houve quem empunhasse o Egito como um dos expoentes da cultura negra. Não bastasse a tese furada de que Atenas era negra, vemos agora o Egito inserido no debate afro. De Dakar, um leitor me envia referências sobre Cheikh Anta Diop, estudioso senegalês que parte da idéia de que o antigo Egito faz parte da África negra. 

Pode ser. Mas tal tese está longe de constituir unanimidade entre historiadores. Mesmo que assim fosse, de nada vale o argumento. Se um dia um hipotético Egito negro teve uma trajetória gloriosa, hoje não mais a tem. Essa trajetória foi em algum momento interrompida, e hoje o Egito vive a hora nada gloriosa do Islã. Que mais não seja, o antigo Egito era escravagista — os hebreus que o digam! — e isto tampouco depõe a favor da África. 

Não faltou quem me acusasse de ser filho ingrato, afinal nossos ancestrais todos teriam surgido em solo africano. O argumento é contraproducente. Se todos de lá descendemos, foi preciso abandonar Mãe África para que o homem evoluísse. Que mais não seja, apegar-se a passados gloriosos de um país para alimentar auto-estima é doença de nacionalistas tacanhos. Pior ainda quando o apego é ao passado de uma etnia: estamos entrando na estreita fímbria que separa orgulho étnico de racismo. Antes de pertencermos a uma ou outra nação, a esta ou aquela etnia, pertencemos à raça humana. 

Sobre Idi Amin Dada e Mozart - Afirmei que estudar a história africana, seja a passada, seja a presente, não leva criança alguma a nenhuma auto-estima. Vejo que magoei muitos leitores. Inúmeros destes, munidos de um computador, enviaram suas mensagens por modem, em velocidade quase instantânea, via Internet. São pessoas alfabetizadas, o que neste nosso mundo já constitui privilégio. Em geral com curso superior, pelo que entendi. Usufruem das atuais facilidades de comunicação e da liberdade de expressão de pensamento nos países onde vivem. São nutridas por informação via satélite e podem acompanhar quase em tempo real os conflitos no planetinha, confortavelmente sentadas frente a um televisor. Certamente são usuárias de jatos e automóveis em seus deslocamentos, comem em bons restaurantes e foram formados em boas universidades. Ou seja, gozam do melhor do Ocidente. 

Isto, caríssimos, não é herança africana. Que a África seja uma terna lembrança de um passado imemorial,vá lá. Hoje, não tem lição nenhuma a dar ao Ocidente. Quando na África existir eleições livres e democracia, noções de direitos humanos, imprensa e liberdade de imprensa, mulheres com os mesmos direitos que os homens, quando na África clitóris não mais sejam mutilados nem mulheres lapidadas, voltamos a conversar. A África trouxe contribuições à humanidade? Viva a África. O que não se pode, sob pena de falsificar a história, é ignorar suas mazelas presentes. 

Olhe para os países africanos... e olhe para os países europeus. Olhe para as cidades esplendorosas do Velho Continente... e para as cidades miseráveis do continente negro. Você jamais encontrará um Mozart ou um Cervantes nas culturas africanas. Mas encontrará às pampas os Idi Amin Dadas e Mobutus Sessos da vida. Na Europa há Estados constituídos. Na África há arremedos de Estado e tribos e guerras tribais. Democracia é flor que viceja na Europa. Não há democracia em países africanos. Por enquanto, repito, a África está mais para Idi Amin Dada que para Mozart. 

Quando alguém me fala da excelência de certas culturas primitivas, costumo lembrar de A Vida de Brian, dos Monty Python. Reunidos os conspiradores judeus, o líder pergunta: que nos trouxeram os romanos? Estradas, responde alguém. Certo. Mas além das estradas, que nos deram? Hospitais, responde outro. É! Mas que mais além das estradas e hospitais? Aquedutos, sugere um terceiro. E assim continua a discussão, até que sai um manifesto: apesar de nos terem trazido estradas, hospitais, aquedutos, escolas, esgotos, romanos go Rome! 

Entendo o estudo da história como o estudo do acontecido. Não pode um historiador subtrair fatos só porque tais fatos são desonrosos à história de um povo. Durante todo um século – o passado – os comunistas construíram uma história fictícia para mostrar como paraíso o que em verdade era um inferno aqui na Terra mesmo. Não queiram os ativistas negros repetir esta infâmia. A do século passado ainda nos pesa e está longe de ser extirpada de nossa memória. 

* Abril 2003 Leia também A Trap for Blacks - http://www.brazzil.com/p107apr03.htm

Por: Janer Cristaldo  Publicado originalmente em http://cristaldo.blogspot.com.br/

DIÁRIO DA EUROPA

Ah, a Europa: contada ninguém acredita. Confesso que li e ri com o artigo de J.R. Guzzo na "Veja" sobre o projeto "euroflush". O que é isso? 


Simples: a Comunidade Europeia gastou 100 mil euros para determinar que todas as privadas dos países membros só poderão gastar 5 litros nas descargas geradas em caixas. Nos mictórios, será 1 litro. E nas meias-descargas, 3 litros. 

Isso, para Guzzo, é o retrato de um mundo infantil onde, parafraseando Churchill, nunca tantos dependeram de tão poucos para tanta coisa nas suas vidas. 

Mas existe um lado menos hilariante do "projecto europeu": a forma abusiva como Bruxelas, hoje, detém poderes impensáveis há uns anos para determinar o que os estados-membros podem ou não inscrever nos seus orçamentos. 

Espanha e Itália, aliás, foram recentemente repreendidas por não respeitarem os limites de dívida e de défice nos seus orçamentos para 2014. Curioso: eu julgava que essas matérias eram discutidas primeiro nos respectivos parlamentos nacionais. Depois, e só depois, Bruxelas poderia meter o nariz. 

Engano. Antes dos parlamentos, Bruxelas tem direitos especiais que suplantam a soberania das nações. Donde, para que servem os parlamentos nacionais? 

Não admira que, perante esse cenário, a Frente Nacional de Marine Le Pen e o Partido da Liberdade do holandês Geert Wilders tenham anunciado a intenção de formarem uma "aliança histórica" no Parlamento Europeu depois das eleições europeias de 2014. 

A Frente Nacional e o Partido da Liberdade, escusado será dizer, são dois partidos de extrema-direita com elevada popularidade em França e na Holanda - e que podem mesmo conquistar 1/3 dos lugares. E com um objetivo político claro: "destruir o monstro de Bruxelas" por dentro, avisou o sr. Wilders com a moderação que o caracteriza. 

Vem nos livros: em época de crise e quando a soberania das nações é atropelada por burocratas sem rosto, a Europa sempre foi pródiga em produzir estes monstrinhos. 

2. 

Dizem que o mais difícil em literatura é escrever uma boa cena de sexo. Só em literatura? No cinema é a mesma coisa: como filmar o ato sem cair no clichê sentimental - ou na "grotesquerie" pornográfica? 

Abdellatif Kechiche ensina como no seu "La Vie d'Adèle", Palma de Ouro em Cannes em 2013. Assisti ao filme no Lisbon & Estoril Film Festival e pasmei com a inteligência de Kechiche: através de uma história de amor entre duas mulheres - Adèle e Emma - o diretor não apenas revisita os andamentos clássicos de qualquer história de amor (primeiros encontros, primeiros medos, primeiras experimentações) como oferece duas personagens inteiras que, apesar de mundos sociais distintos, se encontram no mesmo mundo do desejo. 

Semanas atrás, escrevi nesta folha um réquiem ao cinema "mainstream" americano por comparação com as séries de tv "Atrações de feira". Gostaria de acrescentar que o réquiem não se estende ao cinema que a velha Europa ainda oferece de vez em quando. 

3.
Portugal joga amanhã com a Suécia. "Jogo importante?", pergunto eu na tabacaria do bairro onde compro jornais todos os dias. Só para provocar, fazer piada, meter conversa. 

O vendedor olha para mim com cara séria. Faz-se um silêncio sepulcral em volta. "Jogo importante?", responde o vendedor, incrédulo, como se eu tivesse insultado a mulher dele. "É para o Mundial, homem", esclarece ele, com um esgar de profunda e indisfarçável náusea. 

Pois é: parece que amanhã, em Estocolmo, o país saberá se, em 2014, vai estar na Copa do Brasil. Porque não estar é já considerado o maior vexame nacional desde, pelo menos, 1808, ano em que a família real fugiu dos exércitos franceses para o Rio de Janeiro. 

As perspectivas não são totalmente más: depois de vencer por 1 a 0 em Lisboa, Portugal só precisa de não perder em Estocolmo. Mas nem isso convence o delicioso fatalismo dos lusos, que dedicam ao assunto uma gravidade digna de um assunto de Estado. 

Então eu pergunto, meio a sério, meio a brincar, o que seria de Portugal se os portugueses dedicassem aos assuntos de Estado propriamente ditos a mesma exigência fanática que devotam à seleção nacional. Sobretudo quando o país quase faliu em 2009, antes de ser salvo pelo FMI. 

O vendedor, uma vez mais, tem resposta pronta para mim: "O mal da nossa política é não ter lá um Cristiano Ronaldo." 

Falou e disse. 

Por: João Pereira Coutinho Folha de SP

"FASCISMO"

A linguagem política e ideológica vive de lugares-comuns, cuja significação é indefinida. Em agrupamentos nos quais imperam os slogans, o discurso é sempre equívoco. Nos debates jornalísticos e acadêmicos dos últimos dias, um signo retorna com força. Refiro-me ao apelativo "fascismo". Antes, faço uma pequena digressão.

Os slogans importam porque integram as técnicas de poder. Como enuncia uma psicanalista, "toda prática linguística repetitiva veicula uma potência de hipnose que leva o indivíduo rumo a comportamentos sociais ou mentais estereotipados" (Shoshana Felman). A cultura política conhece a fina observação de Thomas Hobbes: na maioria das pessoas "o costume tem um poder tão grande que, se a mente sugere uma palavra inicial, o resto das palavras segue-se pelo hábito, e elas não são mais seguidas pela mente. É o que ocorre entre os mendigos quando rezam seu paternoster.

Eles unem tais termos com os que aprenderam de suas babás, companhias ou professores e não têm imagens ou concepções na mente para responder às palavras que enunciam. Como aprenderam, ensinam a posteridade" (The Elements of Law).

A ética expõe formas de pensamento e de ação que se tornaram automáticas. Uma vez prescrito e interiorizado, certo modo de ser é repetido sem maiores reflexões. Caso a pedagogia se fundamente em valores positivos, a vida pública se beneficia. Se ocorre o contrário e o ensino segue parâmetros corruptos, os indivíduos e associações que os assumem arruínam a sociabilidade. Gritar um lugar-comum entra no rol dos automatismos éticos desprovidos "de imagens ou concepções".

Com o domínio do slogan, um religioso grita "fascismo" sempre que prerrogativas ou privilégios de sua grei são postos em dúvida. Se um conservador enfrenta críticas sobre as tradições a que se apega, logo ergue o grito de "fascismo" contra os oponentes. Quando as esquerdas não conseguem controlar setores opostos aos seus alvos, a palavra que vem aos lábios dos militantes é... fascismo. E assim por diante.

George Orwell, atacado por todas as facções políticas de sua época, tem um instrutivo escrito sobre o tema. Ele inicia com o mais óbvio: "A leitura atenta da imprensa mostra que, praticamente, nenhuma categoria de indivíduos deixou de ser qualificada de fascista". O mais relevante, no meu entender, encontra-se na seguinte tese do autor: "Mesmo os que lançam a palavra 'fascista' para todos os ventos lhe atribuem, no mínimo, um significado emocional. Por 'fascismo' eles entendem, grosso modo, algo cruel, sem escrúpulos, arrogante, obscurantista, antiliberal e contrário à classe operária".

Termina Orwell indicando ser impossível encontrar uma definição do fato que seja aceita por todos. "É impossível definir o fascismo de modo satisfatório sem admitir certas coisas que nem os próprios fascistas, nem os conservadores, nem os socialistas de todas as cores estão dispostos a admitir. Tudo o que podemos fazer, agora, é usar a palavra com certa circunspecção, e não, como se faz geralmente, rebaixá-la ao nível da injúria" (What is Fascism?, 1944).

Pouco antes, os intelectuais da França alertaram os europeus contra o terror fascista. E fizeram um diagnóstico preciso do fenômeno. O fascismo, disseram, "suprime todas as liberdades; retira dos indivíduos toda possibilidade legal de exprimir livremente sua opinião. As liberdades de reunião, de associação são anuladas. Não mais existe liberdade de ensino nem de imprensa. Tais liberdades não são respeitadas por nenhuma ditadura. Mas a fascista se caracteriza por uma técnica aperfeiçoada de opressão, completa, metódica e implacável.

Nos primeiros tempos da ditadura os golpes, os assassinatos, o terror são os principais meios de controle. Mas os meios legais rapidamente se desenvolvem, sempre sancionados, aliás, por uma repressão ignóbil" (O que é o Fascismo?, Manifesto de intelectuais em 1935. O documento original pode ser lido em Gallica.bnf.fr/).

Orwell e os intelectuais franceses, embora empenhados na luta contra o terror fascista, refletiram sobre ele sem cair na repetição automática do nome, à guisa de exorcismo ou injúria. As coisas "que nem os próprios fascistas" e seus adversários admitiriam vieram com o Holocausto, a morte industrializada sob comando de burocratas movidos por slogans. O fascismo, até no seu nome de batismo, é ameaça demasiado terrível e não deve ser admitido na luta política democrática. A banalização do uso atenua a sua essência, dissimula seu advento.

No Brasil, em vésperas de eleição decisiva para todos nós (em todos os matizes ideológicos), ensaiemos a forma e o conteúdo democráticos. Não existem, numa sociedade civilizada, inimigos políticos a serem perseguidos ou injuriados, mas seres que refletem e divergem quanto aos fins e aos meios na edificação do bem comum.

Ao falar do fascismo no prefácio do amaríssimo Animal Farm, o mesmo Orwell proclama: "Se a liberdade tem algum sentido, ela significa o direito de dizer ao povo o que ele não quer ouvir". Assim opera o pensamento político. O uso da propaganda para exterminar inimigos é a via reta para os fascismos. Os povos dominados por aqueles movimentos e partidos só ouviram os seus mestres. As sociedades desfeitas pelas injúrias foram tragadas pelas palavras imprudentes ou por slogans gastos nas batalhas pelo poder.

O fascismo não admite distinções entre esquerda e direita, pois exige obediência absoluta às palavras de ordem do partido único. Quem perde a liberdade de enunciar "o que o povo não quer ouvir" é visto como besta-fera a ser perseguida. Fantasmas invocados costumam atender às preces dos aprendizes de feiticeiro, trazendo pesadelos coletivos.

Circunspeção diante da palavra e da coisa!

Por: Roberto Romano Publicado em O Estado de S. Paulo

sábado, 23 de novembro de 2013

JUSTIÇA? ONDE?

Parte da nação se regozija, neste fim de semana, com a prisão de dez dos condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no processo do mensalão, decretada em data emblemática, a da proclamação da República. De uns tempos para cá, a palavrinha república andou ganhando prestígio. Foram os petistas que a trouxeram à baila, enchendo a boca com expressões como “valores republicanos”.

Como se valores republicanos quisesse dizer alguma coisa. Até 1991, tivemos a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, ditadura que durou três quartos de século. Ainda temos, sob o tacão da Partido Comunista, a República Popular da China. Isso sem falar na República Democrática Popular da Coréia, que vem sendo governada por “ presidentes” da mesma família desde sua fundação em 1948.

Parte da nação se regozija, dizia. Pois há outra parte que não. A nação está dividida desde 1964, quando os comunistas tentaram reeditar a intentona de Prestes, com apoio da URSS, China e Cuba. Há quem pense que os militares foram os vencedores da luta contra a guerrilha. Nada disso. Os vencedores foram os derrotados. 

Derrotadas na luta armada, as esquerdas venceram a luta política. Tanto que uma guerrilheira é hoje a presidente do Brasil.

Foram derrotados os comunistas? O que vemos são seus líderes em prosa e verso cantados, na literatura e no ensino nacionais, ostentando aura de heróis, dando nomes a salas, ruas e rodovias e gozando de gordas aposentadorias. Os militares, que se pretendem vencedores, foram jogados à famosa lata de lixo da História e relegados ao papel de vilões.

Enquanto o Exército não tinha verba sequer para pagar o rancho de recrutas e sua Força Aérea desfilava a pé, aos vitoriosos de 64 Fernando Henrique Cardoso conferiu honras, glória e gordas aposentadorias.

Nada mais natural, pois, que os quadrilheiros tenham se entregue à polícia brandindo punhos e a auréola dos justos, jogados ao cárcere pelas elites do país. O Supremo Tribunal Federal foi relegado, pelos “heróis”, à condição de um monumento à iniqüidade. Nada de espantar em uma nação que venera como heróis celerados como Che Guevara, Marighella e Lamarca.

As prisões tiveram ampla repercussão na imprensa internacional. Segundo The Economist, “não haverá mais jabuticabas jurídicas para os mensaleiros”, depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou protelatórios os recursos da maioria dos réus que entraram com segundos embargos durante a sessão da última quarta-feira. Para o The New York Times, “problemas burocráticos” atrasaram o envio dos condenados no processo para a prisão, e, no Brasil, “é raro políticos brasileiros de alto-escalão condenados por crimes cumprirem pena na prisão”. Para o Washington Post, as prisões dos condenados dispersam especulações de que os envolvidos no esquema encontrariam brechas jurídicas para fugir de suas penas. Já a BBC classificou o mensalão como o “maior caso de corrupção” do Brasil e destacou o ato do ex-presidente do PT José Genoino que, ao se entregar à Polícia Federal ontem, ergueu seu punho e gritou “viva o PT”. 

Glória ao país que decidiu pôr atrás das grades a cúpula do partido que hoje detém o poder. Restam algumas perguntinhas. Os líderes da negociata, seus autores intelectuais, foram condenados a penas significativas, mas no fundo simbólicas. Alguns ficaram alguns aninhos no cárcere, a maioria em regime de prisão aberta. Só quatro cumpriram a pena em regime fechado. 

Quanto aos operadores, mandaletes de fim de linha, todo o rigor da lei. O empresário Marcos Valério, o principal operador do esquema de compra de votos no Congresso Nacional, foi condenado a 40 anos, quatro meses e seis dias de prisão a ser cumprida no regime fechado em presídio de segurança máxima. Os seis dias denotam a preocupação dos ministros em medir com precisão microscópica a justeza da pena. Mas nem tudo é tragédia na vida do mais castigado pelo STF. 40 anos, em verdade, são pouco menos de sete anos.

Qui prodest? A pergunta é velha mas se impõe. A quem beneficiou a compra de votos? Il capo di tutti i capi está livre como um passarinho e ainda ousa se pronunciar cinicamente, em apoio aos condenados: “estamos juntos”. Domínio de fato só vai até Zé Dirceu. Daí não passa. Lula sabe disso. “Quando a gente começa a mentir, não pára mais" - disse o presidente, em admirável confissão de autoconhecimento. A bicicleta precisa continuar andando. Não são bandoleiros os condenados. Mas heróis injustiçados pela suprema corte.

Zé Dirceu alega inocência e seus relevantes serviços prestados à nação. Por que então saiu voando de seu cargo. Não foi nenhum político de oposição que ordenou "Sai rápido daí, Zé!". Foi Roberto Jefferson, presidente de partido aliado do PT. Sua ordem não admitiu tergiversações. Não passaram 48 horas e o Zé se esvanecia como fumaça ao vento. Bastaram quatro palavrinhas para demitir a Eminência Parda do governo. É óbvio que atrás das quatro palavrinhas havia uma mensagem cifrada, cujo sentido, a nós, pobres mortais, não foi dado entender. Só o presidente e seu todo-poderoso ministro o captaram. E o captaram rapidinho.

Por quatro vezes, os congressistas rejeitaram a taxação dos aposentados e pensionistas, por considerá-la afrontosa a princípios jurídicos como o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Mas a carne é fraca. Na quinta vez, o Congresso não resistiu e inclusive obteve do mandalete gaúcho instalado no STF a autorização definitiva para implantar a taxação da velharada indefesa.

Considera-se que pelo menos uma centena de deputados foram comprados. É um punhado considerável de prostitutas, capaz de virar qualquer votação. Esses deputados não cometeram crime algum? Permanecerão impunes posando de vestais no Congresso? Da centena de implicados, 25 foram condenados e dez foram em cana. E a turma toda dos vendidos?

Resta outra pergunta mais grave, que fiz há oito anos: voto comprado vale? Venalidade pode criar legislação? Pode derrubar cláusulas pétreas e extinguir direitos adquiridos? Se cassados estes deputados, não seria o caso de cassar também seus votos passados?

Dez réus passarão alguns meses no cárcere, em celas isoladas e com a segurança necessária para continuar “trabalhando”. O país continuará sendo regido pelas leis que promulgaram a soldo do governo. 

É a isso que a imprensa chama fazer justiça?


Por: Janer Cristaldo Do site http://cristaldo.blogspot.com.br/

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

YANKEES, DONT"T GO HOME


Os marines estão chegando

Natural que em um desastre natural como este tufão nas Filipinas, a intervenção humanitária americana seja imediata. Os EUA têm uma história de afinidade no país (inclusive de colonização) e uma tradição de assistência global nestas circunstâncias que é compatível com seus recursos militares e logísticos. Os marines desembarcaram nas Filipinas e navios, inclusive um porta-aviões, aportaram para a missão de assistência. Aviões americanos despejam suprimentos e não bombas. E no solo, bandeiras americanas não são queimadas e não se escutam os gritos deyankees, go home. Por que ocorreria isto? Na quarta-feira, aviões militares americanos puderam distribuir 25 toneladas de biscoitos para sobreviventes famintos na devastada cidade de Tacloban.

Sem dúvida que esta assistência de emergência americana gera boa vontade e pontos políticos em países afligidos, pobres e ricos, mais ou menos hostis aos EUA. Apenas para ficar nas vizinhanças das Filipinas, foi assim no tsunami que atingiu a Indonésia em 2004 e no terremoto no Japão em 2011. E este empenho dos EUA acontece em meio a pressões por cortes orçamentários do Pentágono e pendores isolacionistas mesmo em casos de ajuda humanitária ou de um SOS.

De novo, não podemos ser ingênuos ou sentimentais. A corrida para ajudar tem impacto estratégico. Basta ver que no Japão houve a suavização da retórica contra as bases americanas no país. Afinal, este aparato foi crucial para ajudar depois do desastre em Fukushima. Nas Filipinas, em 1991, os americanos abandonaram uma imensa base naval na esteira de uma ferrenha mobilização nacionalista e a assistência agora no tufão deve reforçar o ímpeto para a presença militar dos EUA no país, em particular no combate a insurgentes islâmicos.

E vale lembrar que muitos outros países também estão dando uma mão. Por exemplo, equipes médicas da Bélgica, Noruega e Israel estão em ação. Em contraste ao vigor assistencialista dos EUA e demais países, existe o minimalismo chinês. Tudo bem, os chineses ainda são pobres, mas gostam de bravatear a segunda colocação no ranking de economias mundiais e seu impulso para o status de superpotência. Pequim, no entanto, se limitou a oferecer US$ 100 mil de ajuda às Filipinas. Em parte, é vingança pela posição mais desafiadora dos bem mais pobres e mais fracos filipinos para encararem os chineses em disputas por águas territoriais (atualização: na quinta-feira, os chineses anunciaram o incremento da ajuda).

Aliás, naquela região existe um clamor por proteção americana contra o tufão geopolítico chinês.
Por: Caio Blinder



quinta-feira, 21 de novembro de 2013

SÍMBOLOS

Há muitos simbolismos nesse processo do mensalão, que vão se revelando no transcorrer do caso, mas nenhum deles é assumido, apenas sutilmente insinuado. Quando o então procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza apresentou sua denúncia, eram 40 os acusados. Viu-se no número redondo a intenção de relacionar o caso com a história de Ali Babá e os 40 ladrões e, mais que isso, de insinuar que o então presidente Lula não estava indiciado por questões políticas.


No decorrer do processo, petistas tentaram impedir que a mídia se referisse ao caso como “mensalão”, mas o máximo que conseguiram foi que o noticiário oficial, tanto do Governo quanto do Supremo Tribunal Federal passasse a se referir ao caso como a Ação Penal 470.
Agora, ao serem expedidas as primeiras ordens de prisão, atribui-se ao ministro Joaquim Barbosa a intenção de marcar a comemoração da Proclamação da República com as prisões de José Dirceu e companhia. Seria nada além de uma jogada de marketing de Barbosa, já se preparando, quem sabe, para uma futura carreira política.

Mesmo que a intenção tenha sido a de marcar a “refundação” da República brasileira, nada a criticar no presidente do Supremo Tribunal Federal, pois nenhum trâmite legal foi atropelado para que a coincidência se desse.

O criticável será se nos próximos meses o relator do mensalão sair do STF para se candidatar, pois, como todos os magistrados, ele tem um prazo mais largo para se filiar a um partido político. Será inevitável que todos os seus passos como relator do mensalão, e mesmo suas indignações cívicas, sejam confundidas com ações políticas, o que nublaria suas decisões. Mais simbolismos a serem decifrados.

Quando Barbosa apareceu com nada de novo sobre o mensalão na quinta-feira, houve uma espécie de decepção, e logo críticas foram feitas a ele, que prometera divulgar a lista dos presos naquela sessão. Houve até quem desconfiasse de que alguma coisa acontecia nos bastidores, mas o que realmente aconteceu é que Joaquim Barbosa trabalhou até de madrugada, e ontem no feriado, para poder expedir as ordens de prisão sem cometer erros técnicos que as invalidassem.

Não ter expedido as ordens de prisão imediatamente após a sessão de quarta-feira foi, aliás, uma demonstração de que Barbosa, e o STF que preside, não estavam ávidos por uma vingança.

A própria presidente Dilma veio em socorro indireto a Barbosa na mensagem que enviou pelo twitter para saudar a Proclamação da República. Ela afirmou que a origem da palavra República “nos ensina muito”, vem do latim e significa ‘coisa pública’. Sendo assim ser a presidente da República significa “zelar e proteger a ‘coisa pública’, cuidar do bem comum, prevenir e combater a corrupção”.

Nada mais adequado, portanto, para comemorar a República do que colocar na cadeia os condenados por tentar desmoralizar suas instituições, superdimensionando o poder do Executivo pela submissão do Legislativo através da compra de apoio político.

Nessa nossa República democrática, surge agora a figura dos “presos políticos”, sejam os componentes dos Black blocs, sejam os mensaleiros que assim querem ser identificados. Assim como não existe Caixa 2 com dinheiro público, como definiu o STF, não há presos políticos em uma democracia.

José Genoino provavelmente não reconhece a existência de presos políticos em Cuba, ou não manteria seu apoio ao regime ditatorial cubano. Mas se considera um “preso político” na democracia dirigida por seu partido há 11 anos.

Além de insistir na teoria da conspiração de que houve uma “operação midiática inédita na história do Brasil” para condená-lo, Genoino acusou ontem o julgamento do Supremo de ter sido “marcado por injustiças e desrespeito às regras do estado democrático de direito”.

Esse processo “de exceção” teria ocorrido num Supremo Tribunal Federal (STF) de um regime democrático, cuja maioria dos ministros foi nomeada pelo ex-presidente Lula e pela presidente Dilma, ambos do PT, partido que José Genoino presidia quando o mensalão aconteceu. Durma-se com um barulho desses.

Por: Merval Pereira

CRIANDO HISTORIA

Vivemos em uma cultura que permite que vigaristas exerçam sua enganação impiedosa sobre pessoas desinformadas, confiantes e bem intencionadas.

O mundo se torna suscetível a mentiras quando fica mais enamorado com prazeres e distrações do que com o estudo sério dos fatos.

As artimanhas têm existido desde sempre, mas agora a mentira atingiu novos patamares. Mesmo os mais indecentes prevaricadores dos séculos passados não tomaram a iniciativa de alterar a história do povo judeu, sua ligação com a Terra Santa, ou sua fidelidade à cidade de Jerusalém.

Tudo isso mudou quando Yasser Arafat, o falecido líder palestino, instituiu uma estratégia de criar uma nova "verdade". Sua primeira asserção foi vista como digna de riso: Jesus, disse ele, foi, de fato, um palestino que lutava pela liberdade, batalhando contra os romanos da mesma forma que Arafat e sua laia estavam lutando contra os judeus "ilegais" que ocupam a chamada terra árabe de Israel.

Sua declaração bizarra de reivindicação anterior e do roubo praticado por Israel começaram uma nova tendência sobre como trazer uma solução final para a presença judaica no Oriente Médio. Assim como o propagandista nazista Joseph Goebbels, Arafat astuciosamente plantou mentiras que finalmente produziram uma farta colheita de "fatos" fictícios. Essas mentiras mascaradas como verdades não apenas têm subvertido a história verdadeira, mas têm vagarosamente criminalizado o Estado de Israel.

O plano de Arafat, na verdade, não tinha nada a ver com os fatos. Tudo dizia respeito a mudar as percepções. Considerando que pouquíssimas pessoas no Ocidente sabem a verdadeira história do Oriente Médio, a fantasia poderia muito bem passar por fato e, a seu devido tempo, mudar inteiramente o jogo.

Mudar as percepções sobre ele mesmo e sobre os palestinos foi algo que Arafat provou saber fazer extremamente bem. Sendo um dos maiores terroristas do mundo, ele orquestrou atividades terroristas contra Israel a partir de todas as partes do mundo, inclusive o seqüestro do navio de cruzeiro Achille Lauro, no dia 7 de outubro de 1985. Para o horror de todos, os palestinos subiram a bordo do navio e mataram o passageiro judeu Leon Klinghoffer, que estava sentado indefeso em sua cadeira de rodas. Depois, eles lançaram o seu corpo ao mar. Menos de dez anos mais tarde, Arafat ganhava o Prêmio Nobel da Paz.

Assombrosamente, o absurdo se tornou a norma em muitos círculos; e é a base lógica para se desalojar os israelenses e reconfigurar o Estado judeu em um feudo palestino. Quem teria acreditado que viria o dia em que a argumentação de que o povo judeu nunca existiu como presença no Oriente Médio seria tomada seriamente? Ou de que não havia nenhuma evidência física de que os templos judeus existiram no monte Moriá em Jerusalém?

Quem teria imaginado que alguém acreditaria que os judeus refugiados, que chegaram ao país depois da Segunda Guerra Mundial, eram invasores fugindo de um Holocausto que nunca existiu? E quem teria sonhado em defender a noção de que o povo judeu tramou a idéia do Holocausto para ludibriar o mundo e angariar simpatias para si mesmo?

Vivemos em uma cultura que permite que vigaristas exerçam sua enganação impiedosa sobre pessoas desinformadas, confiantes e bem intencionadas. Anualmente, fraudes e promessas mesquinhas de enormes recompensas enganam milhões e roubam deles suas economias ganhas a duro custo. Todavia, nenhum charlatão pode se igualar ao que tem sido praticado pelos inimigos de Israel. Eles odeiam o Estado judeu e farão qualquer coisa para causar sua destruição.

O sucesso deles é o resultado direto do fracasso da sociedade em propagar os fatos e em confrontar as mentiras com a inatacável verdade. O padrão que precisamos seguir está exposto em Deuteronômio 6.6-7:

"Que todas estas palavras que hoje lhe ordeno estejam em seu coração. Ensine-as com persistência a seus filhos. Converse sobre elas quando estiver sentado em casa, quando estiver andando pelo caminho, quando se deitar e quando se levantar".

O antídoto para o erro é a verdade. E não existe campo de batalha na terra que esteja mais em risco. O mundo se torna suscetível a mentiras quando fica mais enamorado com prazeres e distrações do que com o estudo sério dos fatos.

Por esta razão, estamos tentando colocar as coisas em ordem -- bíblica e historicamente -- a fim de ajudar a esclarecer a verdade sobre Israel.

Um dos motivos pelos quais decidimos divulgar esses fatos é o volume de perguntas feitas a nós por pessoas que estão buscando a verdade. Existe uma fome por informação e validação bíblica do que tem sido ensinado através de milênios, porque tantos estão agora distorcendo a história com a esperança de destruir, não apenas um país, mas a fé sobre a qual repousa nossa esperança.

Jesus disse que a verdade nos libertará (João 8.32). A verdade também nos manterá livres.

Elwood McQuaid é editor-consultor de The Friends of Israel - www.foi.org
Publicado na revista Notícias de Israel – www.Beth-Shalom.com.br
Tradução: Ingo Haake