sexta-feira, 21 de março de 2014

EU SOU O DO POSTE

Agora que a poeira baixou, posso voltar ao assunto. Se visse aquele rapaz amarrado no poste com uma tranca de bicicleta, provavelmente eu o ajudaria. Daria a ele um pouco de água e ficaríamos conversando em voz baixa até a chegada da polícia. Qual o seu nome, rapaz? Quantos anos tem? Por que estava assaltando? Acredita em Deus? Ouviu falar em Jesus Cristo? Já olhou para o mar? Talvez rezássemos.


E não faria nada disso porque sou bonzinho. Sei que não passo de um pecador miserável. Conversaria com o rapaz só porque não consigo agir de outra maneira; porque meu pai me ensinou assim. Não posso ver ninguém sofrendo sem me lembrar de algo que aconteceu há muito tempo.

O Cristianismo existe para defendermos as vítimas, os fracos, os pobres, os solitários, os perdidos, os injustiçados. Por isso mesmo, foi igualmente vergonhoso o linchamento moral que se seguiu ao episódio do rapaz amarrado com a tranca da bicicleta. Para vingar o acontecimento, a militância eletrônica decidiu amarrar uma jornalista ao poste ideológico e violentá-la sem dó. A nenhum desses supostos indignados ocorreu que as pessoas podem ter amarrado o adolescente ao poste porque estavam com medo dele; porque não aguentavam mais ser assaltadas; porque ele é perigoso com as mãos livres.

Cristianismo não é coitadismo. Não se trata de criar uma legião de inimputáveis, isentos de qualquer responsabilidade e livres para reincidir no mal. Cristo diz: “Ame seus inimigos”. Mas nunca disse: “Não tenha inimigos”. Quem ama o bem deve odiar o mal com todas as forças.

Engana-se quem acha que a atitude cristã se encerra com o perdão; o perdão é só o começo. Ao pecador, não cabe apenas arrepender-se, mas também realizar uma completa mudança de vida, renegando e expiando todo o mal antes cometido. “Vai e não peques mais.”

Hoje em dia o filho pródigo volta a dilapidar os bens do pai; a mulher adúltera insiste em pecar de novo na primeira esquina; e os mensaleiros presos querem continuar mandando na gente. É dever de todo cristão perdoar aquele que erra não duas, mas 490 vezes. O problema é que os pecadores modernos apreciam a parte do perdão, mas rejeitam a parte da expiação.

O rapaz preso no poste voltou a cometer assaltos uma semana depois do episódio. Quando vieram prendê-lo, ele disse: “Eu sou o do poste! Eu sou o do poste!” Lembrei-me do mensaleiro que, ao ser preso na Itália, evocou o nome do irmão e de um companheiro petista mortos: “Eu sou o Celso! Eu sou o Celso!” No Brasil, hoje estamos todos amarrados àquele poste. E o nome do poste é mentira.
Por: Paulo Briguet é jornalista e edita o blog Com o Perdão da Palavra. 
Do site: http://www.midiasemmascara.org/

quinta-feira, 20 de março de 2014

A MOBILIZAÇÃO PARA A TERCEIRA GUERRA MUNDIAL

Os russos acreditam que o balanço do poder mudou a seu favor, e portanto podem agir impunemente.


“O intolerante e ciumento olho do Kremlin no final das contas pode apenas distinguir entre vassalos e inimigos. Se um país não desejar ser este, deve se reconciliar e tornar-se aquele”.
George F. Kennan
Comecei esta série de comentários dia 20 de janeiro com o artigo “Previsões para a Terceira Guerra Mundial”. Naquele primeiro texto, eu relatei como um conhecido grupo de astrólogos, xamãs e parapsicólogos russos previram o início da Terceira Guerra Mundial para março de 2014. E aqui estamos próximos ao início de uma séria crise que pode facilmente escalar para uma guerra mundial. Um leitor do meu blog recentemente observou: “Ou essa coisa escapou do controle de Moscou ou Moscou tem planos muito maiores no horizonte”.

Sim, as coisas escaparam do controle russo e planos maiores estão no horizonte. Isso é óbvio na invasão militar russa na Criméia. A esta altura, por que o Kremlin deveria se preocupar com uma demonstração aberta de violência contra os povos inocentes? O balanço militar já pendeu a favor da Rússia, porquanto a China está se preparando para a guerra contra o Japão no extremo oriente. Além disso, nossa prontidão militar [N.T.: dos EUA, país do autor] não está como deveria. (v. O fim do domínio militar americano: Hagel anuncia profundos cortes orçamentários para a defesa, incluindo aeronaves, navios, tropas e armas)
A América tem lutado uma guerra contra o terrorismo nos últimos doze anos. Ficamos distraídos e sem rumo. Nossa política militar passou longe de se preparar contra um grande adversário e, sendo assim, não estamos prontos. Além disso, que país europeu está preparado para enfrentar a Rússia? Apenas a Ucrânia está se preparando para lutar, e ela está em um patamar militar desesperadamente inferior.

O famoso desertor da KGB, Anatoliy Golitsyn, alertou para a estratégia de longo prazo de Moscou em 1984: “A dialética dessa ofensiva consiste em uma mudança calculada da velha e desacreditada prática soviética para um novo e ‘liberalizado’ modelo, com uma fachada social-democrata, com o objetivo de realizar a estratégia dos planejadores comunistas de estabelecer uma ‘Europa Unida’. No início, eles apresentariam uma variação da “democratização” checoslovaca de 1968. Numa fase posterior, mudarão para uma variação da encampação da Checoslováquia em 1948.” [in New Lies for Old. Em português Novas Mentiras no Lugar das Velhas: A Estratégia Comunista de Dissimulação e Desinformação].

Parece que estamos próximos dessa fase posterior. Os estrategistas em Moscou sabem que a revolta na Ucrânia deve ser colocada abaixo, independentemente do que venha a pensar o mundo. Os russos acreditam que o balanço do poder mudou a seu favor, e portanto podem agir impunemente. Evidentemente eles estão temerosos de que haja um “grande deslindar” da estratégia deles se eles não pegarem pesado com Kiev. Além da propaganda russa, aqueles que dizem que o Ocidente está por trás da liberdade ucraniana não conhecem o Ocidente e não conhecem a Ucrânia. O pior nessa incompreensão é que ela traz consigo um menosprezo à coragem e à articulação política dos patriotas ucranianos. Os melhores dentre eles sabem que não pode haver plena liberdade na Ucrânia sem haver liberdade na Rússia.

A verdadeira luta então é política. A verdadeira luta é pelo coração da Rússia. Os criminosos que governam a Rússia sobreviveram cometendo assassinatos. Eles perderão o poder apenas quando o povo russo estiver totalmente acordado. Aleksandr Solzhenitsyn disse uma vez que o caminho do assassinato é o caminho da mentira. Agora, então, estamos vendo os assassinos trabalhando e estamos a observar um desfile de mentiras. Veja com atenção se a mídia ocidental irá associar a causa patriótica ucraniana ao antissemitismo. Essa também é a retórica de um país que está se preparando para esmagar a Ucrânia.

E sim, o perigo de guerra é crescente. De acordo com oficiais ucranianos, as tropas russas já ocuparam a Crimeia. A manchete da Fox News diz: Ucrânia acusa Rússia de ‘invasão militar’ após homens armados tomarem aeroportos. Embora oficiais russos neguem ou mesmo se recusem a comentar quando questionados sobre a invasão, o Ministro do Interior ucraniano Arsen Avakov declarou publicamente: “Só posso descrever isso como uma invasão militar de ocupação”. De acordo com a CNN, a Ucrânia mobiliza tropas após a ‘declaração de guerra’ da Rússia: “Kiev mobilizou tropas e convocou os militares da reserva em uma rápida escalada da crise que suscitou o temor de um conflito”.

Enquanto isso, a 20ª e a 48ª divisões do exército russo se preparam para invadir o leste ucraniano. Ao mesmo tempo, o Secretário de Estado John Kerry viajou para Kiev e afirmou que potências estrangeiras estão considerando sanções econômicas à Rússia. “Todas elas”, disse Kerry. “Cada uma delas está preparada para tomar medidas extremas para isolar a Rússia no que diz respeito a essa invasão. Elas estão preparadas para levar as sanções a cabo e estão preparadas para isolar a Rússia economicamente”, completou.

Não nos apressemos, contudo. Há de se considerar as muitas cartas a serem jogadas pela Rússia: as tropas americanas dependem da Rússia para manter sua linha de suprimentos no Afeganistão. A Alemanha depende do gás natural russo para aquecimento no inverno. Sanções podem não ser uma solução prática. E também há a China no front. Em janeiro, o vice-Ministro da Defesa russo Pavel Popov alertou que uma guerra no Pacífico envolvendo EUA, Japão e China estava “a algumas semanas de distância”.

Não se pode descartar uma ofensiva maciça e coordenada pela Rússia e pela China, ou uma escalada de ‘terrorismo cinza’[1] com um ataque nuclear em Nova York. Qualquer movimento nesse aspecto é digno de mencionar. É difícil dizer exatamente qual será a jogada.

Terminarei com uma citação de Golitsyn: “Daqui a não muito tempo, os estrategistas comunistas podem ficar persuadidos de que a balança pendeu irreversivelmente a seu favor. Nesse caso, eles podem decidir pela ‘reconciliação’ sino-soviética. A estratégia da tesoura daria lugar à estratégia ‘de um só punho fechado’. Nesse ponto, a mudança na balança político-militar seria evidente para todos.”

 N.T.: O ‘terrorismo cinza’, conforme apontado pelo próprio Nyquist em outra ocasião, é uma tática descrita pelo desertor do serviço de inteligência militar soviético russo (GRU), Viktor Suvorov, no 15º capítulo do livroSpetsnaz: A história secreta por trás da força especial russa. Nessa tática, leva-se a cabo “uma série de operações terroristas de pequeno e grande porte com o propósito de, antes de a ação militar começar, enfraquecer a moral inimiga criando uma atmosfera de suspeita, medo e incerteza, além de desviar a atenção do exército e da polícia inimiga para um vasto e variado número de alvos”. De acordo com Suvorov: “O principal método aplicado nesse estágio é o ‘terrorismo cinza’”. Trata-se de um tipo de terrorismo que é levado a cabo “em nome de grupos extremistas já existentes e não necessariamente conectados à União Soviética ou em nome de organizações fictícias”. POR JEFFREY NYQUIST http://www.jrnyquist.com/

Tradução: Leonildo Trombela Junior Do Site: http://www.midiasemmascara.org/


COMO A LEGISLAÇÃO TRABALHISTA CAUSA DESEMPREGO


Para os brasileiros, ainda não "caiu a ficha" de que o mundo está em uma corrida desenvolvimentista no qual o trabalho é visto como um fator de produção estratégico.


O que trago na figura acima é um aviso postado por um dos maiores supermercados de Belém, que avisa não ser mais possível deslocar funcionários do estabelecimento para carregarem as compras de seus clientes até suas residências, devido a quê? À legislação trabalhista!

Stálin foi um entusiasmado promotor dos direitos trabalhistas. Claro, não na União Soviética, mas fora dela, à maneira como hoje os direitos dos trabalhadores são inexistentes em Cuba, Coréia do Norte, Vietnã, Camboja e China. 

O atroz ditador soviético jamais pensou no bem-estar dos trabalhadores dos países democráticos, especialmente dos Estados Unidos e Europa, mas via nisso uma estratégia para desestabilizar a economia de seus rivais.

Estamos agora em 2014, e temos visto o quanto sua mente voltada para o mal era eficaz! A Europa vive em crise permanente, os Estados Unidos transformaram-se no maior exportador de empregos do planeta, e o Brasil, solo fértil para tudo quanto é doutrina que não preste, é uma galinha enlouquecida pela gripe aviária que corre pelo galinheiro batendo as asas e cacarejando anunciando ser um falcão. 

Por que é proibido? Vá lá saber. O fato é que perdem o supermercado, pois entregar as compras nas casas dos clientes funcionava como uma eficiente medida para conquistar fidelidade; perdem os clientes, especialmente os idosos e os que não possuem automóvel; perdem os funcionários que efetuavam as compras, pelas gorjetas que vão minguar; e perdem os desempregados, porque o supermercado, tendo seus funcionários mantidos no estabelecimento, não necessitará de outros para substituí-los enquanto estavam fora, realizando as entregas. 

Oportunamente, vocês sabem por quê os shopping centers abrem às 10h00min e não às 08h0min? Porque são dois os turnos de trabalho: de 10h00min às16h00min, e de 16h00min às 22h00min. Então, algo que poderia render mais vendas, mais salários e maior bem estar à população - abrir duas horas mais cedo - o que poderia ser resolvido meramente com o acerto de mútuo acordo entre empregadores e empregados - é impossibilitado pela CLT, um verdadeiro e intransponível muro das proibições.

Para os brasileiros, ainda não "caiu a ficha" de que o mundo está em uma corrida desenvolvimentista no qual o trabalho é visto como um fator de produção estratégico. Em visitas que fiz a outros países, como Coréia do Sul e Taiwan, pude contemplar os cidadãos intensamente envolvidos com o trabalho e o estudo pra valer (e não ficar aprendendo luta de classes e viadagem, como acontece aqui...). 

A legislação trabalhista brasileira causa desemprego, castra as oportunidades de negócios e provoca uma diminuição da qualidade de vida dos cidadãos. Todo mundo sai perdendo. 

Por:  KLAUBER CRISTOFEN PIRES  Do site: ://libertatum.blogspot.com.br/


quarta-feira, 19 de março de 2014

A ECONOMIA DA HIENA

De que se ri o animalzinho? - pergunta o cidadão, na velha piada, ao saber da parcimônia sexual e das preferências gastronômicas da hiena. A mesma perplexidade é inevitável diante da aparente alegria de tantos analistas ao conhecer os números da economia nacional em 2013. O miserável aumento de 2,3% do produto interno bruto (PIB) foi descrito como surpreendente. O crescimento de 0,7% no trimestre final quase foi celebrado como o início de uma era de expansão chinesa. Dois argumentos foram usados para justificar a comemoração. Projetado para um ano, aquele resultado trimestral equivale a 2,8%, lembrou o ministro da Fazenda, Guido Mantega. O outro argumento, um pouco mais complicado, aponta o esperado efeito de carry over, ou carregamento. Se a expansão econômica for nula nos primeiros três meses deste ano, será pelo menos mantido o patamar alcançado no trimestre anterior. Daí a necessidade, segundo os mais entusiasmados, de uma revisão das projeções para 2014. Na semana passada, a mediana das projeções coletadas para o boletim Focus, do Banco Central (BC), havia ficado em 1,87%.


Essa alegria é mais preocupante que os números ainda muito ruins das contas nacionais. Com um pouco de juízo e medidas certas pode-se fazer a produção crescer muito mais que nos últimos três anos, quando a média ficou em vergonhosos 2%. Mas o problema se complica sensivelmente quando as pessoas começam a encarar como normal um desempenho pífio, muito abaixo das possibilidades do País, e a festejar pequenas melhoras.

Quem aceita esse padrão de normalidade passa a raciocinar dentro dos limites da política econômica em vigor nos últimos anos. Passa a falar a linguagem do ministro da Fazenda e a aceitar como razoáveis seus critérios de avaliação. Uma coisa é destacar, por seu efeito estatístico, a expansão de 6,3% do investimento em capital fixo. Outra, muito diferente, é apontar esse número como algo extraordinário. Só se entusiasma quem esquece dois fatos bem conhecidos e, de toda forma, indicados com clareza nas contas publicadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nem um estrangeiro se enganaria ao ver esses números.

Em primeiro lugar, o investimento 6,3% maior que o de 2012 ocorreu depois de uma queda de 4%, detalhe aparentemente esquecido ou negligenciado por muita gente. Em termos de volume, ficou pouco acima, portanto, do registrado em 2011. Em outras palavras, a formação bruta de capital fixo ficou praticamente estagnada ao longo de dois anos.

Em segundo lugar, a taxa de investimento passou de 18,2% do PIB em 2012 para 18,4% em 2013, muito inferior aos padrões dos emergentes e ainda abaixo do pico de 19,5%, registrado em 2010. O nível de 24%, já alcançado por alguns sul-americanos, será atingido até 2020, prometeu o animado ministro da Fazenda.

A estagnação da indústria está refletida tanto no crescimento do setor, 1,3%, quanto nas contas externas. As exportações de bens e serviços aumentaram 2,5%, em termos reais, enquanto as importações cresceram 8,4%. A piora das contas externas já era conhecida. O déficit em conta corrente passou de US$ 54,25 bilhões em 2012 (2,41% do PIB) para US$ 81,37 bilhões em 2013 (3,66% do PIB). A deterioração do balanço de pagamentos é explicável principalmente pela erosão da conta de mercadorias. Essa conta continua em mau estado.

Entre o começo do ano e a terceira semana de fevereiro o País acumulou um déficit comercial de US$ 6,75 bilhões. As vendas ao exterior, US$ 26,91 bilhões, foram 3,7% menores que as de um ano antes, pela média diária, e as importações, US$ 33,65 bilhões, 0,6% maiores, pelo mesmo critério.

Mais uma vez, em 2014 o saldo comercial dependerá do amplo superávit obtido com as commodities, principalmente do agronegócio. A julgar pelos dados até agora conhecidos, dificilmente a indústria será muito mais competitiva, nos próximos meses, do que tem sido nos últimos cinco ou seis anos. As importações começaram a crescer mais velozmente que as exportações antes da crise de 2008. O problema, na época, já era o enfraquecimento da indústria diante dos concorrentes estrangeiros. Afinal, o famigerado custo Brasil já estava na pauta desde muitos anos e nada se havia feito para torná-lo mais suportável. Enquanto a discussão se prolongava sem resultado, o problema se tornava mais grave e a economia nacional ficava menos eficiente e menos capaz de produzir de forma competitiva.

O mau uso do dinheiro público, o desajuste fiscal e a inflação elevada são componentes desse quadro de baixa produtividade, mas há pouco estímulo para o governo cuidar seriamente de qualquer desses problemas. Há oposição à alta dos juros, apesar da inflação resistente e ainda muito elevada. Até a meta fiscal anunciada há poucos dias foi criticada, como se o governo estivesse empenhado, com sua modesta exibição de austeridade, em matar o crescimento.

Há alguns anos o economista Mohamed El-Erian, então um dos chefões do Pimco, um dos maiores fundos de investimento, criou, juntamente com seu colega Bill Gross, a expressão "novo normal", para descrever o padrão observado desde o começo da crise: crescimento baixo, desemprego alto e juros próximos de zero no mundo rico. No Brasil, a reação de muitos analistas aos números pífios de 2013 parece indicar a consolidação de uma nova normalidade econômica. Mas, neste caso, o crescimento baixo é combinado com inflação alta e resistente e contas públicas precárias. Junta-se a isso uma baixíssima disposição para cuidar de problemas bem conhecidos, mas nunca atacados para valer. Nesse quadro, incentivos parciais e de pouco efeito para o crescimento acabam valendo mais que mudanças de grande alcance. Reformas para tornar a economia mais eficiente são complicadas e tomam tempo. Para que esperar? Nesse novo normal, menos e menos pessoas, a cada dia, acharão estranha a satisfação da hiena.
Por: ROLF KUNTZ - Plublicado em O Estado de S.Paulo





FORA DO ARMÁRIO

Como num conto de Machado de Assis, "O Cônego ou Metafísica do Estilo" (leiam), substantivo e adjetivo –que Machado batiza de "Sílvio" e "Sílvia"– já haviam se enlaçado na minha cachola e deveriam estar agora na tela e no papel. Classificavam Gilberto Carvalho de agente sabotador do governo Dilma a serviço de Lula. Sílvio e Sílvia sabem que a presidente detesta Carvalho, no que é correspondida. Terão de esperar. Algo mais urgente se alevantou: Luís Roberto Barroso, a esfinge sem segredos do STF.


Não me lembro de nada tão grotesco no tribunal. O ministro decidiu ser o Catão da política, exacerbando a retórica moralista para cobrar uma reforma que barateie as campanhas eleitorais, lamentar a inércia dos políticos, afirmar que o idealismo se converteu em argentarismo, fustigar o "abominável espetáculo de hipocrisia" em que "todos apontam o dedo contra todos, mas mantêm "seus cadáveres no armário"... Pego carona na metáfora. Barroso saiu do armário e disse o que pensa sobre o mensalão: apenas "recursos não contabilizados" de campanha, como disse Delúbio Soares. Apesar do complexo de Schopenhauer, ele é só um Delúbio com toga, glacê e fricotes retóricos.

A fala ignora a essência golpista do mensalão. O que o foragido Henrique Pizzolato, por exemplo, tem a ver com custo de campanha? Parte do dinheiro que comprava partidos e políticos era público. Como numa peça de Gil Vicente, o ministro acusou Todo Mundo para não punir Ninguém. Nome do espetáculo: "A Farsa de Barroso". E a peroração assombrosa foi condizente com a sordidez do prólogo.

Um das coisas exóticas que já fiz na vida foi ter lido o livro "O Novo Direito Constitucional Brasileiro", de Barroso. Ele nos conta, entre ligeirezas, que era tal a sua ignorância da ritualística do processo penal que teve de indagar a um repórter desta Folha o que deveria fazer com o alvará de soltura do terrorista Cesare Battisti. Eu teria respondido.

Apelando a um procedimento descabido no julgamento de embargos infringentes –a Preliminar de Mérito–, o ministro resolveu pegar carona numa conta extravagante de Teori Zavascki –fruto de uma disciplina em voga chamada "direito criativo"–, e refazer a dosimetria, o que lhe era vedado nesta fase do processo, para declarar a prescrição da pena por quadrilha. A escolha era tão esdrúxula que, para que triunfasse, os ministros que antes absolveram teriam de condenar, mas com mansidão, para que, então, se declarasse a prescrição. Impossível, como sabe qualquer estudante no nível "massinha 1" de direito.

Com qual propósito? Barroso queria livrar a cara da turma, mas sem ficar com a pecha de salva-mensaleiro. Deve ter sido uma das maiores batatadas da história da corte. Flagrado, teve de refazer o seu voto e admitir, desenxabido, que estava inocentando todo mundo do crime de quadrilha.

Ainda que a ignorância fosse culposa, a argumentação foi tecnicamente dolosa. Segundo disse, na primeira votação, seus pares usaram a dosimetria para evitar a prescrição e agravar o regime inicial de cumprimento das penas. Essa é a posição oficial do PT, expressa em vários documentos. Joaquim Barbosa indagou se seu voto já estava pronto antes de se tornar ministro. Barroso havia ofendido o tribunal primeiro. Nota: Natan Donadon foi condenado por crime de quadrilha no desvio de R$ 8,4 milhões da Assembleia de Rondônia. Um bando que atua em escala nacional e que desviou R$ 73,8 milhões só do Fundo Visanet foi absolvido. Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli condenaram Donadon, mas absolveram os mensaleiros. Padre Vieira escreveu que o roubar pouco faz os piratas; o roubar muito, os Alexandres Magnos.

Ao ler o livro de Barroso, a gente entende que, para ele, a pressão de minorias organizadas, desde que "progressistas" –isto é, de esquerda–, tem mais valor do que a letra da lei. Os nossos bolivarianos estão saindo do armário.

Ficam para outra coluna os apelos de Sílvia e Sílvio.
Por: Reinaldo Azevedo Publicado na Folha de SP

terça-feira, 18 de março de 2014

SOCIOLOGIA DO ATEÍSMO

Semanas atrás, escrevi nesta coluna ("Quem Herdará a Terra?") sobre uma disciplina chamada demografia das religiões. A tese do autor em questão, Eric Kaufmann, é que os seculares têm muitas ideias, mas têm poucos filhos, e por isso em breve o Ocidente perderá em muito seu perfil secular.

Mesmo aqueles seculares que adotam a teoria da seleção natural de Darwin como visão de mundo, adotam-na apenas na teoria, porque na prática não o fazem: seleção natural, no limite, é reprodução; quem não reproduz desaparece. E as mulheres seculares são inférteis por conta dos valores individualistas que carregam.

Recebi muitos e-mails (não imaginei que esse assunto seria um blockbuster) e alguns me chamaram a atenção para um fato interessante: os ateus (que não são a mesma coisa que os seculares, porque posso crer numa inteligência organizadora do universo e não crer que ela seja Jesus ou similar, e viver sem referência a qualquer código religioso) creem firmemente que dominarão o mundo por meio da educação, das ciências e da tecnologia. Podem estar bem errados.

O ateísmo vem muitas vezes acompanhado de uma crença num processo histórico inexorável em direção ao ateísmo universal, uma vez dadas "educação e cultura" para todos. Esquece, esta querida tribo, que as pessoas, sim, fazem escolhas baseadas em modos distintos de valorar a vida e seus sucessos, e que, sim, muitas comunidades religiosas usam ciência e tecnologias da informação ao seu favor e com grande habilidade.

Antes de tudo, é importante reconhecer que a sociologia do ateísmo, sim, pode nos fazer crer, em alguma medida, que há uma relação entre alta formação cultural, boa educação universitária e "ateísmo orgânico", aquele tipo de ateísmo a que você chega por meio da escolha livre -e não porque algum regime totalitário (como o de Cuba) ou pais autoritários proíbem você de crer em Deus ou similar.

Mas o tema transcende essa teoria e é por demais importante para ser pego nas redes de "pregações" disso ou daquilo, pelo menos para quem acredita que a sociedade secular deve ser cuidada, mas não iludida com seus próprios fantasmas de sucesso no futuro.

Vejamos alguns dados dos pesquisadores Norris, Inglehart, Davie, Greeley, Bondenson e Peterson. Peguemos países estatisticamente apontados como possuidores de alta percentagem de ateus orgânicos da Europa ocidental:

Suécia: em 1999, 85% se diziam ateus; em 2001, 69%; em 2003, 74%; em 2004, 64%. De 1999 até 2004 há uma variação para baixo dos ateus assumidos.

Dinamarca: em 2000, 80% se diziam ateus; em 2003, 43%, e em 2004, 48%. Ainda que tenha havido um pequeno crescimento entre 2003 e 2004, a queda entre 2000 e 2004 é evidente.

Noruega: em 2000, 72% se diziam ateus; em 2003, entre 54% e 41%; em 2004, 31%. Também queda.

Finlândia: em 2000, 60% se diziam ateus; em 2001, 41%; em 2004, 28%. Também vemos uma redução dos ateus assumidos.

Entretanto, sabemos que pesquisas nem sempre são precisas e que seus métodos variam e, portanto, seus resultados podem não ser tão autoevidentes.

Esses países têm visto um número crescente de grupos cristãos fundamentalistas, mas o importante é entender que esse crescimento se dá, diferentemente do caso dos EUA, ainda sob grande discrição. Sem ruídos, mas com determinação.

O caso dos luteranos laestadianos finlandeses (comunidade luterana fundamentalista na vila de Larsmö) é de chamar a atenção.

A relação entre a fertilidade de suas mulheres e a das finlandesas seculares é a seguinte, respectivamente: 1940, dois bebês contra um; 1960, três bebês contra um; 1980, quatro bebês contra um. Em 1985, a taxa de fertilidade de cada grupo era 5,47 para as fundamentalistas e 1,45 para as seculares.

A maioria das instâncias de razão pública (tribunais, universidades, escolas, mídia) é, ainda, tomada por seculares. Isso nos faz pensar que o mundo é "nossa bolha".

Veja que, no Brasil, nem o poderoso movimento gay conseguiu derrubar o pastor Feliciano. O "lifestyle" individualista secular é autocentrado e dado a "causas do Face", e por isso não tem defesa contra mulheres férteis e homens determinados.
Por: Luiz Felipe Pondé Publicado na Folha de SP

segunda-feira, 17 de março de 2014

SOCIALISMO É BARBÁRIE

Se eu pregar que todos que discordam de mim devem morrer ou ficarem trancados em casa com medo, eu sou um genocida que usa o nome da política como desculpa para genocídio. No século 20, a maioria dos assassinos em massa fez isso.


O Brasil, sim, precisa de política. Não se resolve o drama que estamos vivendo com polícia apenas. Mas me desespera ver que estamos na pré-história discutindo ideias do "século passado". Tem gente que ainda relaciona "socialismo e liberdade", como se a experiência histórica não provasse o contrário. Parece papo das assembleias da PUC do passado, manipuladoras e autoritárias, como sempre.

O ditador socialista Maduro está espancando gente contra o socialismo nas ruas da Venezuela. Ele pode? Alguns setores do pensamento político brasileiro são mesmo atrasados, e querem que pensemos que a esquerda representa a liberdade. Mentira.

A maioria de nós, pelo menos quem é responsável pelo seu sustento e da sua família, não concorda com o socialismo autoritário que a "nova" esquerda atual quer impor ao país. A esquerda é totalitária. Quer nos convencer que não, mas mente. Basta ver como reage ao encontrar gente inteligente que não tem medo dela.

Ninguém precisa da esquerda para fazer uma sociedade ser menos terrível, basta que os políticos sejam menos corruptos (os da esquerda quase todos foram e são), que técnicos competentes cuidem da gestão pública e que a economia seja deixada em paz, porque nós somos a economia, cada vez que saímos de casa para gerar nosso sustento.

Ela, a esquerda, constrói para si a imagem de "humanista", de superioridade moral, e de que quem discorda dela o faz porque é mau. Ela está em pânico porque estava acostumada a dominar o debate público tido como "inteligente" e agora está sendo obrigada a conviver com gente tão preparada quanto ela (ou mais), que leu tanto quanto ela, que escreve tanto quanto ela, que conhece seus cacoetes intelectuais, e sua história assassina e autoritária.

Professores pautados por esta mentira filosófica chamada socialismo mentem para os alunos sobre história e perseguem colegas, fechando o mercado de trabalho, se definindo como os arautos da justiça, do bem e do belo.

A esquerda nunca entendeu de gente real, mas facilmente ganha os mais fragilizados com seu discurso mentiroso e sedutor, afirmando que, sim, a vida pode ser garantida e que, sim, a sobrevivência virá facilmente se você crer em seus ideólogos defensores da "violência criadora".

Ela sempre foi especialista em tornar as pessoas dependentes, ressentidas, iludidas e incapazes de cuidar da sua própria vida. Ela ama a preguiça, a inveja e a censura.

Recomendo a leitura do best-seller mundial, recém publicado no Brasil pela editora Agir, "O Livro Politicamente Incorreto da Esquerda e do Socialismo", escrito pelo professor Kevin D. Williamson, do King's College, de Nova York. Esta pérola que desmente todas as "virtudes" que muita gente atrasada ou mal-intencionada no Brasil está tentando nos fazer acreditar mostra detalhes de como o socialismo impregnou sociedades como a americana, degradou o meio ambiente, é militarista (Fidel, Chávez, Maduro), e não deu certo nem na Suécia. O socialismo é um "truque" de gente mau-caráter.

As pessoas, sim, estão insatisfeitas com o modo como a vida pública no Brasil tem sido maltratada. Mas isso não faz delas seguidores de intelectuais e artistas chiques da zona oeste de São Paulo ou da zona sul do Rio de Janeiro.

A tragédia política no Brasil está inclusive no fato de que inexistem opções partidárias que não sejam fisiológicas ou autoritárias do espectro socialista. Nas próximas eleições teremos poucas esperanças contra a desilusão geral do país.

E grande parte da intelligentsia que deveria dar essas opções está cooptada pela falácia socialista, levando o país à beira de uma virada para a pré-história política, fingindo que são vanguarda política. O socialismo é tão pré-histórico quanto a escravatura.

Mas a esquerda não detém mais o monopólio do pensamento público no Brasil. Não temos mais medo dela. Por: Luiz Felipe Pondé Publicado na Folha de SP

domingo, 16 de março de 2014

HOBBES NAS RUAS

Dias atrás, o Brasil se chocou com cenas de violência nas ruas. Pessoas comuns batendo em supostos (ou comprovados) bandidos. Policiais tendo que protegê-los da fúria da gente comum.

De um lado, uma jornalista faz comentários arriscados na TV, do outro, setores da intelligentsia pedem providências do Ministério Público contra a jornalista, botando ainda mais lenha na fogueira da atmosfera de ódio e ressentimento que toma conta, lentamente, da alta, média e baixa culturas nacionais.

Não se pode defender o espancamento na rua, mesmo sendo bandido. Só o Estado detém o monopólio legítimo da violência. Mas é esta mesma intelligentsia (tribunais, universidades, mídia, escolas, ONGs) que vem sistematicamente erodindo esse monopólio legítimo da violência que pertence à polícia. Claro que os erros desta precisam ser sanados, mas a sociedade não faz nada para melhorar o tratamento institucional dado à polícia, e sem ela, sim, a gente comum vai espancar supostos (ou comprovados) bandidos na rua. E vai piorar.

O espancamento de supostos (ou comprovados) bandidos na rua é parte do fenômeno de massa que os inteligentinhos chamam de "jornadas de junho", num esforço de reviver a ejaculação precoce que foi o Maio de 68 na França, aquela revolução de mimados.

Lembremos que quando as manifestações do ano passado atingiram o nível de massa, os inteligentinhos começaram a gritar dizendo que o movimento (deles!) tinha sido sequestrado por setores "conservadores" da sociedade. Para eles, "conservador" é todo mundo que não os obedece e não os teme, mesmo que seja apenas para parar a Paulista.

Se no ano passado vimos uma inesperada crise na representação política, agora assistimos a um crescente rompimento do contrato social. E quem está na rua é o homem descrito pelo intelectual honesto que foi Hobbes, e não o pseudo-homem dos "delírios do caminhante solitário" e vaidoso Rousseau.

Já falei algumas vezes nesta coluna do que podemos chamar de psicologia da gente comum. Esta gente que a intelligentsia, na verdade, despreza, apesar de posar de defensora da gente comum. Digamos a verdade. Nossa contradição aparece quando, por exemplo, algumas pessoas começam a gritar contra gente mal-educada e sem compostura frequentando aeroportos, e os "defensores dos menos privilegiados" saem ao ataque da burguesia chocadinha reclamona.

Infelizmente, a intelligentsia não percebe que tanto a burguesia chocadinha quanto os mais pobres fazem parte da mesma categoria de gente comum. Perdemos, nós da intelligentsia, a capacidade de enxergar essa gente comum, porque vivemos em nossa "casinha" correndo atrás da produtividade inócua da Sua Excelência Capes ou delirando com seres humanos que não existem.

E qual é a psicologia de gente comum? Gente comum é duramente meritocrática: quem não trabalha é vagabundo. Não quer ser assaltada quando vai para o trabalho ou para casa (e se for, quer ver o ladrão se ferrar feio!), quer também casa própria, metrô e ônibus que andem, comprar um carro logo que for possível, hospital sem muita fila, comer pizza no domingo, transar por cinco minutos quando não estiver muito estressada, ir para praia, ganhar cada vez mais, ir ao cinema mais perto de casa, ir ao salão de beleza, ver os filhos crescerem, tomar cerveja, e se der, ler alguma coisa além de ver TV.

E, digamos: pagam impostos e tem todo o direito de viver assim (menos de bater em gente na rua). Mas vão bater em supostos (ou comprovados) ladrões cada vez mais porque estão sentindo que a sociedade não está nem aí para eles.

Quando a chamada classe D alcançar os níveis do consumo da classe C, vão querer a mesma coisa. Uma vida pautada por rotinas de trabalho, escola, lazer, consumo e férias. E quem ficar no caminho vai apanhar. Esta é única "consciência social" que existe.

Quando essa massa de gente que está de saco cheio de ser pisada no trem, de pagar imposto e não poder andar com seu carro nas ruas, de ver sua filha com medo, agir, o homem de Hobbes fará sua "revolução". A vida será doída, violenta e breve. Por: Luiz Felipe Pondé Publicado na Folha de SP

QUEM HERDARÁ A TERRA?

A sociedade secular moderna está condenada. E por quê? Por uma razão muito simples: as mulheres seculares (sem prática religiosa cotidiana) não querem ter filhos. Quando têm, têm um ou dois no máximo.

A emancipação feminina tornou as mulheres inférteis por escolha. Estranho? Nem tanto, vejamos.

Quem herdará a Terra? Os religiosos fundamentalistas cristãos, judeus e muçulmanos. Suas mulheres têm muitos filhos, e as nossas não. Para as nossas mulheres, filhos só depois dos 35, depois da pós, com maternagem terceirizada caríssima. O individualismo moderno nos deixou a todos estéreis e histéricos.

Não, não estou criticando a vida secular nem defendendo a vida religiosa radical. Parafraseando o dito popular, "não é política, imbecil, é demografia".

Nós, seculares, que em grande parte temos simpatia pela teoria evolucionista, esquecemos que seleção natural é demografia. Podemos ter muitas ideias de como o mundo deve ser, mas os fundamentalistas têm mais bebês. E quem decide no final das contas é a população de bebês. Mulheres férteis implicam civilização poderosa.

Essa é a hipótese do livro escrito pelo canadense Eric Kaufmann, professor de política da Universidade de Londres. Claro que os "progressistas" o criticam e acusam a ideia de ser propaganda fundamentalista –como é comum em nosso mundo em que a inteligência cedeu lugar às políticas da difamação.

As suspeitas de que riquezas e conforto (causas culturais e econômicas, e não biológicas) diminuem a fertilidade feminina estão presentes desde a Grécia e Roma (Cícero já falava disso). Adam Smith, no século 18, chamava a atenção para o fato de que o "luxo e a moda" tornam o sexo frágil desinteressado na maternidade.

Já por volta do ano 300 da Era Cristã, os cristãos somavam 6 milhões, enquanto no ano 40 eles eram uns poucos hereges coitados. Logo conquistaram o Império Romano. E não só por conta das mulheres romanas serem vaidosas, ricas e interessadas em sexo, mas não em filhos (exatamente como as nossas). Os homens pagãos eram mais violentos e menos atentos a mulheres e filhos enquanto os cristãos eram do tipo família.

O fator fertilidade não é o único, claro, mas é um fator que em nossos debates inteligentinhos não tem sido levado em conta com a devida reverência.

Enquanto as mulheres seculares hoje têm cerca de 0,5 filho por mulher pronta para maternidade (a partir dos 15 anos), as religiosas (no caso aqui específico de grupos como evangélicos fundamentalistas, amish, menonitas, huteritas e judeus haredi ou ortodoxos) variam de 2,1 a 2,4.

No caso do Estado de Israel, por exemplo, a cada três crianças matriculadas no jardim da infância, uma é haredi. Depois do Holocausto, os haredi eram uma população quase insignificante. Em países do leste do mundo, como Japão, Coreia do Sul, Cingapura, Austrália e Nova Zelândia, o quadro é muito próximo do Ocidente moderno.

A medicina, o saneamento, a tecnologia e Estados mais organizados diminuíram a mortalidade tanto das parturientes quanto das crianças. O efeito imediato foi o crescimento populacional na geração dos "baby boomers". Mas, já no final dos anos 60, as mulheres americanas, canadenses e europeias ocidentais começavam e declinar em fertilidade.

Por quê? A causa são os "valores" seculares. Nós investimos na vida aqui e agora e na realização de desejos imediatos. E, para piorar, as universidades ficam publicando pesquisas dizendo que casais sem filhos são mais felizes. Além de não termos filhos, ainda fazemos passeatas para matá-los no ventre das mães com ares de "direitos humanos".

Família cansa, filho dá trabalho, custa caro, dura muito. Os seculares escolhem não ter filhos, os religiosos escolhem tê-los.

Mas não é só a fertilidade que coloca os religiosos em vantagem. Os grupos mais fechados detêm uma alta retenção da sua prole: colégios comunitários, shoppings, redes sociais, colônias de férias, casamentos endógenos, calendários festivos, baladinhas de Jesus (ou similares). Sempre juntos.

Enfim, a pílula vai destruir a civilização que a criou. Risadas? Por: Luiz Felipe Pondé Publicado na Folha de SP

sábado, 15 de março de 2014

O DECLÍNIO DO OCIDENTE

1. Existem ALGUMAS regras na política internacional. Mas a primeira de todas é que as grandes potências não agem apenas de acordo com os seus interesses. Também é importante antecipar a forma como os outros reagem a eles.


Meses atrás, escrevi nesta Folha que Barack Obama tinha cometido um erro brutal com o "dossiê" sírio ao afirmar que Bashar al-Assad não poderia cruzar certas "linhas vermelhas" ("Baratinhas tontas", 10/9/2013). Quando se fazem ultimatos desses, é bom que o autor esteja disposto a agir se a outra parte não respeita a ameaça.

Bashar al-Assad foi o único que agiu, cruzando as "linhas vermelhas", ou seja, usando armamento químico contra o seu povo. E que fez Obama?

Para além do vexame internacional de não ter feito nada, contou ainda com a crítica de Vladimir Putin (em artigo no "New York Times" de uma hipocrisia humanista arrepiante) e com a intermediação russa para que o carniceiro de Damasco entregasse uma lista com todo o seu arsenal químico –uma farsa que só otários são capazes de engolir.

Sabemos agora que a principal consequência do "flop" de Obama na Síria emigrou para a Ucrânia.

Os fatos são conhecidos: por pressão russa, o anterior presidente ucraniano, Viktor Yanukovich, não assinou um acordo com a União Europeia. O caso foi visto na Ucrânia como uma rendição a Moscou –que pagou o gesto com a promessa de um cheque generoso e a redução do preço do gás- e como uma dolorosa despedida a qualquer hipótese de Kiev virar para Ocidente.

No momento em que escrevo (domingo), e sabendo que a situação muda a cada minuto, o país ameaça quebrar em duas metades: a primeira, pró-ocidental, com um governo interino em Kiev que recusa a pata do urso moscovita; a segunda, sobretudo concentrada na região da Crimeia, onde já existem tropas russas "informais" nos lugares-chave (edifícios de governo, televisões, aeroporto etc.).

E paira sobre todo o caos a decisão unânime da Câmara Alta da Rússia de autorizar a invasão do país. Nada disso deveria espantar. No "Wall Street Journal", o antigo presidente da Geórgia, Mikheil Saakashvili, resumiu em uma única palavra a estratégia preferida do Kremlin: "balcanizar". No caso, balcanizar as antigas repúblicas da URSS –uma forma de as enfraquecer e de as manter sob a órbita de Moscou. Isso aconteceu na Geórgia, claro, quando a Rússia marchou sobre a Ossétia do Sul e a Abkhazia em 2008.

Perante essa estratégia, qual a resposta de Obama? Não passa pela cabeça de ninguém um confronto militar em larga escala. Até porque a situação na Ucrânia é mais propícia a uma guerra civil do que a um conflito internacional.

Mas é de bradar aos céus que a Casa Branca tenha um presidente que se limita a proclamações vagas ("haverá custos") ou ameaças patéticas (não participar na reunião do G8, por exemplo) quando a atitude só poderia ser uma: fazer da Rússia um pária internacional, que não respeita os acordos que assina (como o "memorando de Budapeste", onde a integridade territorial da Ucrânia era sacrossanta), e por isso merece sanções diplomáticas, políticas e econômicas pesadas.

Que Obama não tenha sido claro na hora decisiva só mostra como a sua eleição é um sintoma trágico do declínio ocidental.

2. E por falar em declínio ocidental: parece que o Google perdeu uma ação para manter on-line o filme "Intolerância dos Muçulmanos", um vídeo onde Maomé é tratado de forma desrespeitosa.

Não assisti ao vídeo porque o meu tempo é precioso e lixo não é a minha praia. Mas se a sentença vai fazer doutrina, espero que católicos, protestantes, mórmons, testemunhas de Jeová, judeus, hindus, brâmanes, budistas, confucionistas, taoístas, cientologistas, druidas e qualquer outra seita "religiosa" ou "espiritual" (como a seita ateia) possa conhecer igual tratamento na proibição de qualquer livro, filme, pintura, música ou programa de TV capaz de ferir a sensibilidade do crente.

Se isso implicar um mundo de silêncio radical, tudo bem. Desde que o silêncio não seja ofensivo para satânicos ou ocultistas, que normalmente gostam de algum barulho à mistura. Por: João Pereira Coutinho Publicado na Folha de SP

quinta-feira, 13 de março de 2014

OS ESCRAVOS

Não é preciso assistir a "12 Anos de Escravidão" para saber que a prática foi uma das maiores vergonhas da humanidade. Mas é preciso corrigir o tempo do verbo. Foi?


Melhor escrever a frase no presente. A escravidão ainda é uma das maiores vergonhas da humanidade. E o fato de o Ocidente não ocupar mais o topo da lista como responsável pelo crime não deve ser motivo para esquecermos ou escondermos a ignomínia.

Anos atrás, lembro-me de um livro aterrador de Benjamin Skinner que ficou gravado nos meus neurônios. Intitulava-se "A Crime So Monstrous" (um crime tão monstruoso) e Skinner ocupava-se da escravidão moderna para chegar a conclusão aterradora: existem hoje mais escravos do que em qualquer outra época da história humana.

Skinner não falava apenas de novas formas de escravidão, como o tráfico de mulheres na Europa ou nos Estados Unidos. A escravidão que ele denunciava com dureza era a velha escravidão clássica —a exploração braçal e brutal de milhares ou milhões de seres humanos trabalhando em plantações ou pedreiras ao som do chicote.

Na Índia, eram 10 milhões. Na África, eram outros tantos —prisioneiros de guerra, por exemplo, forçados a trabalho maquinal sob vigilância apertada do inimigo. Muitos eram crianças.

O próprio Skinner, em "experiência de campo" (digamos assim), comprovava algumas das suas teses. Segundo ele, era possível viajar de Nova York a Port-au-Prince (Haiti) e, por apenas 50 dólares, comprar um escravo de 12 anos. Em cinco horas de viagem, eis a diferença entre a civilização e a barbárie. Cinquenta dólares.

Pois bem: o livro de Skinner tem novos desenvolvimentos com o maior estudo jamais feito sobre a escravidão atual. Promovido pela Associação Walk Free, oGlobal Slavery Index, é um belo retrato da nossa miséria contemporânea.

Em termos relativos, a Mauritânia continua no topo da lista: com uma população que não chega aos 4 milhões, o país terá entre 140 mil a 160 mil escravos. O Haiti vem a seguir, sobretudo com a escravidão infantil. Em 10 milhões de haitianos, 200 mil não conhecem a palavra "liberdade".

O Paquistão sobe a parada e, sobretudo nas zonas fronteiriças com o Afeganistão, é provável encontrar qualquer coisa como 2 milhões de escravos.

A Índia, tal como o livro de Benjamin Skinner já anunciava, continua a espantar o mundo em termos absolutos com um número que hoje oscila entre os 13 milhões e os 14 milhões de escravos. Falamos, na grande maioria, de gente que continua a trabalhar uma vida inteira para pagar as chamadas "dívidas transgeracionais" em condições semelhantes às dos escravos do Brasil nas roças.

Conclusões principais do estudo? Pessoalmente, interessam-me duas.

A primeira, segundo o Global Slavery Index, é que a escravidão é residual, para não dizer praticamente inexistente, no Ocidente branco e "imperialista".

De fato, a grande originalidade da Europa não foi a escravidão; foi, pelo contrário, a existência de movimentos abolicionistas que terminaram com ela. A escravidão sempre existiu antes de portugueses ou espanhóis comprarem negros na África rumo ao Novo Mundo. Sempre existiu e, pelos vistos, continua a existir.

Mas é possível retirar uma segunda conclusão: o ruidoso silêncio que a escravidão moderna merece da "intelligentsia" progressista. Quem fala, hoje, dos 30 milhões de escravos que continuam acorrentados na África, na Ásia e até na América Latina?

Quem perde um minuto de tempo com os escravos da Índia, da Nigéria, da Etiópia ou do Congo?

Ninguém. Onde não existe homem branco como capataz, também não existe homem negro como escravo.

O filme de Steve McQueen, "12 Anos de Escravidão", pode relembrar ao mundo algumas vergonhas passadas. Mas confesso que espero pelo dia em que Hollywood também irá filmar as vergonhas presentes: as vidas anônimas dos infelizes da Mauritânia ou do Haiti que, ao contrário do escravo do filme, não têm final feliz. Por: João Pereira Coutinho Publicado na Folha de SP

CORTAR A DIREITO

Viver em sociedades liberais e pluralistas tem o seu encanto. Quem, em juízo perfeito, não gosta de odes apaixonadas a valores como a "liberdade", a "diversidade" e a tolerância?

O problema é que esses valores, normalmente, só funcionam entre pessoas civilizadas, capazes de partilhar um "modo de vida" onde a crueldade e a humilhação não têm lugar.

De que vale sermos tolerantes com os intolerantes? E de que vale respeitar a diversidade quando essa diversidade pode incluir a violência contra mulheres, minorias —e, no geral, contra qualquer criatura branca (ou negra) que não obedece aos mesmos preceitos religiosos?

A revista "Standpoint", editada pelo excelente Daniel Johnson (filho do historiador Paul Johnson), lembrou recentemente alguns números que só podem deixar um cidadão em estado catatónico.

No Quénia, 97% das moças são submetidas à nobre prática da mutilação genital feminina — um procedimento bárbaro que, na maioria dos casos, implica a remoção do clitóris, essa fonte de prazeres demoníacos. Na Somália, o número sobe para 98%. No Egipto, apesar de tudo, o pessoal é mais moderado: 94%.

Perante esses números, o multiculturalista demente dirá que devemos "respeitar" a diferença e "tolerar" certas culturas sem necessariamente as julgar de acordo com os nossos valores "imperialistas" e "eurocêntricos".

Com a devida vénia ao multiculturalista demente, eu ainda não atingi esse estado "zen" em que a mutilação de uma mulher é a expressão legítima de uma cultura diferente da minha. Não respeito nem tolero.

O que não significa que, na melhor tradição neoconservadora, esteja disposto a invadir o Quénia e a Somália para salvar os clitóris da população feminina local. O mundo sempre foi um cortejo de horrores. O reconhecimento desse facto já é um princípio de sanidade.

Mas o que dizer da mutilação genital feminina praticada no Ocidente? Praticada em Inglaterra?

Informa a mesma "Standpoint" que, de acordo com um relatório recentemente apresentado no Parlamento britânico, os casos quase triplicaram em uma década. Passaram de 65 mil para 170 mil.

Claro que a Inglaterra ainda é um Estado de Direito e o crime costuma dar 14 anos de prisão. Pena que ninguém tenha sido julgado ou condenado por ele.

Coisa espantosa: milhares de mulheres foram mutiladas nos últimos anos em Inglaterra. Mas a ignorância e a inoperância policial e judicial não encontraram um único culpado. Será que as mutilações ocorreram por geração espontânea?

A julgar pela forma como o assunto é tratado pela "intelligentsia" inglesa, parece que sim: o raciocínio que se aplica ao Quénia e à Somália também é válido para as mulheres de Londres, Manchester ou Liverpool. Quem somos nós para condenar as tradições dos outros?

Uma pergunta generosa que, no futuro, poderá dar lugar a outra: por gentileza e hospitalidade, não devemos também sujeitar-nos a tais práticas para que os selvagens não se sintam "discriminados" na sua selvajaria?

Pense nisso, leitora: entre o pecado da intolerância e a integridade do clitóris, há momentos em que é preciso cortar a direito. Por: João pereira Coutinho Publicado na Folha de SP

quarta-feira, 12 de março de 2014

"MORTE AOS GAYS!"

"Homossexuais são, no fundo, mercenários. Eles são heterossexuais mas, porque lhes pagam, dizem que são homossexuais." As sentenças do presidente Yoweri Museveni acompanharam a assinatura de uma das mais drásticas leis homofóbicas do mundo, conhecida no país como "lei da Morte aos gays!". Uganda radicalizou, mas está com a maioria: 38 dos 54 países da África criminalizam a homossexualidade. Segundo a narrativa dos dirigentes homofóbicos africanos, a homossexualidade é uma perversão cultural inoculada de fora para dentro na África. Segundo a narrativa de uma corrente de intelectuais "anti-imperialistas", a homofobia é uma perversão política inoculada de fora para dentro na África. As duas narrativas estão erradas –e por um mesmo motivo.


Museveni e seus colegas nos 38 países argumentam que os gays desembarcaram na África junto com os colonizadores europeus –isto é, que a homossexualidade é estranha à "cultura africana". Num paradoxo esclarecedor, agentes evangelizadores americanos que operam na África dizem o mesmo. Com a palavra, Stephen Phelan, da ONG católica Human Life International: "Achamos que é importante estarmos na África porque a investida contra os valores africanos naturais pró-vida e pró-família está vindo dos EUA. Então, nos sentimos na obrigação de ajudá-los a entender a ameaça e a reagir a ela com base em seus próprios valores e culturas."

A postulação de uma "cultura africana" nasceu fora da África, no ventre do pan-africanismo, uma doutrina elaborada por intelectuais americanos e caribenhos no anoitecer do século 19. O pan-africanismo "africanizou-se" no pós-guerra, quando foi adotado por jovens intelectuais africanos que estudavam na Europa e nos EUA. Aqueles intelectuais viriam a liderar os movimentos de independência, convertendo-se em "pais fundadores" das atuais nações africanas. O sonho da unidade política da África esvaiu-se, mas a doutrina pan-africana sobreviveu como discurso legitimador dos novos regimes africanos. Sua pedra-de-toque é a noção de "cultura africana". Ela proporciona às elites dirigentes o álibi de culpar o "estrangeiro" (o colonizador, no passado; os EUA ou a Europa, no presente) pelos males que afligem seus países.

"Cultura africana", assim no singular, é uma noção enraizada no pensamento racial. Os intelectuais "anti-imperialistas" também a adotam, eximindo os dirigentes africanos da responsabilidade pelas leis homofóbicas. Eles argumentam que o homossexualismo era tolerado em certos povos africanos antes da colonização. É uma verdade de escasso significado: os gays não sofreram discriminação em diversas sociedades tradicionais, nos mais diferentes lugares do mundo, ao longo da história. Eles registram, ainda, que as primeiras "leis anti-sodomia" foram introduzidas na África pelos impérios europeus. Contudo, não se atrevem a explicar por que tais leis são restauradas na África muito depois de sua anulação nas antigas metrópoles europeias.

O homossexualismo não é, evidentemente, "anti-africano" –assim como não é "anti-Ocidental". A homofobia não é "anti-africana" –nem, tampouco, "africana". Como os EUA seriam governados se Stephen Phelan ocupasse o lugar de Barack Obama? O que faria nosso Marcos Feliciano se dispusesse de um poder absoluto? A difusão das leis anti-gays na África só pode ser entendida se nos desvencilhamos da tese da "cultura africana", uma ideia patrocinada no Brasil pelos arautos das políticas de raça.

O grito de "Morte aos gays!" é um fruto do poder despótico de elites políticas não cerceadas pelas instituições da democracia, em sociedades traumatizadas por céleres processos de modernização. As campanhas homofóbicas na África são ferramentas de perseguição política e de cristalização de controle social. Essa abominação nada tem de especificamente "africano". Por: Demétrio magnoli Publicado na Folha de SP

terça-feira, 11 de março de 2014

HOBBES NAS RUAS

Dias atrás, o Brasil se chocou com cenas de violência nas ruas. Pessoas comuns batendo em supostos (ou comprovados) bandidos. Policiais tendo que protegê-los da fúria da gente comum.

De um lado, uma jornalista faz comentários arriscados na TV, do outro, setores da intelligentsia pedem providências do Ministério Público contra a jornalista, botando ainda mais lenha na fogueira da atmosfera de ódio e ressentimento que toma conta, lentamente, da alta, média e baixa culturas nacionais.

Não se pode defender o espancamento na rua, mesmo sendo bandido. Só o Estado detém o monopólio legítimo da violência. Mas é esta mesma intelligentsia (tribunais, universidades, mídia, escolas, ONGs) que vem sistematicamente erodindo esse monopólio legítimo da violência que pertence à polícia. Claro que os erros desta precisam ser sanados, mas a sociedade não faz nada para melhorar o tratamento institucional dado à polícia, e sem ela, sim, a gente comum vai espancar supostos (ou comprovados) bandidos na rua. E vai piorar.

O espancamento de supostos (ou comprovados) bandidos na rua é parte do fenômeno de massa que os inteligentinhos chamam de "jornadas de junho", num esforço de reviver a ejaculação precoce que foi o Maio de 68 na França, aquela revolução de mimados.

Lembremos que quando as manifestações do ano passado atingiram o nível de massa, os inteligentinhos começaram a gritar dizendo que o movimento (deles!) tinha sido sequestrado por setores "conservadores" da sociedade. Para eles, "conservador" é todo mundo que não os obedece e não os teme, mesmo que seja apenas para parar a Paulista.

Se no ano passado vimos uma inesperada crise na representação política, agora assistimos a um crescente rompimento do contrato social. E quem está na rua é o homem descrito pelo intelectual honesto que foi Hobbes, e não o pseudo-homem dos "delírios do caminhante solitário" e vaidoso Rousseau.

Já falei algumas vezes nesta coluna do que podemos chamar de psicologia da gente comum. Esta gente que a intelligentsia, na verdade, despreza, apesar de posar de defensora da gente comum. Digamos a verdade. Nossa contradição aparece quando, por exemplo, algumas pessoas começam a gritar contra gente mal-educada e sem compostura frequentando aeroportos, e os "defensores dos menos privilegiados" saem ao ataque da burguesia chocadinha reclamona.

Infelizmente, a intelligentsia não percebe que tanto a burguesia chocadinha quanto os mais pobres fazem parte da mesma categoria de gente comum. Perdemos, nós da intelligentsia, a capacidade de enxergar essa gente comum, porque vivemos em nossa "casinha" correndo atrás da produtividade inócua da Sua Excelência Capes ou delirando com seres humanos que não existem.

E qual é a psicologia de gente comum? Gente comum é duramente meritocrática: quem não trabalha é vagabundo. Não quer ser assaltada quando vai para o trabalho ou para casa (e se for, quer ver o ladrão se ferrar feio!), quer também casa própria, metrô e ônibus que andem, comprar um carro logo que for possível, hospital sem muita fila, comer pizza no domingo, transar por cinco minutos quando não estiver muito estressada, ir para praia, ganhar cada vez mais, ir ao cinema mais perto de casa, ir ao salão de beleza, ver os filhos crescerem, tomar cerveja, e se der, ler alguma coisa além de ver TV.

E, digamos: pagam impostos e tem todo o direito de viver assim (menos de bater em gente na rua). Mas vão bater em supostos (ou comprovados) ladrões cada vez mais porque estão sentindo que a sociedade não está nem aí para eles.

Quando a chamada classe D alcançar os níveis do consumo da classe C, vão querer a mesma coisa. Uma vida pautada por rotinas de trabalho, escola, lazer, consumo e férias. E quem ficar no caminho vai apanhar. Esta é única "consciência social" que existe.

Quando essa massa de gente que está de saco cheio de ser pisada no trem, de pagar imposto e não poder andar com seu carro nas ruas, de ver sua filha com medo, agir, o homem de Hobbes fará sua "revolução". A vida será doída, violenta e breve. 
Por: Luiz Felipe Pondé Publicado na Folha de SP

O FUTURO QUE A RÚSSIA NOS PROMETE

O prof. Alexandre Duguin, à testa da elite intelectual russa que hoje molda a política internacional do governo Putin, diz que o grande plano da sua nação é restaurar o sentido hierárquico dos valores espirituais que a modernidade soterrou. Para pessoas de mentalidade religiosa, chocadas com a vulgaridade brutal da vida moderna, a proposta pode soar bem atraente. Só que a realização da idéia passa por duas etapas. Primeiro é preciso destruir o Ocidente, pai de todos os males, mediante uma guerra mundial, fatalmente mais devastadora que as duas anteriores. Depois será instaurado o Império Mundial Eurasiano sob a liderança da Santa Mãe Rússia.

Quanto ao primeiro tópico: a “salvação pela destruição” é um dos chavões mais constantes do discurso revolucionário. A Revolução Francesa prometeu salvar a França pela destruição do Antigo Regime: trouxe-a de queda em queda até à condição de potência de segunda classe. A Revolução Mexicana prometeu salvar o México pela destruição da Igreja Católica: transformou-o num fornecedor de drogas para o mundo e de miseráveis para a assistência social americana. A Revolução Russa prometeu salvar a Rússia pela destruição do capitalismo: transformou-a num cemitério. A Revolução Chinesa prometeu salvar a China pela destruição da cultura burguesa: transformou-a num matadouro. A Revolução Cubana prometeu salvar Cuba pela destruição dos usurpadores imperialistas: transformou-a numa prisão de mendigos. Os positivistas brasileiros prometeram salvar o Brasil mediante a destruição da monarquia: acabaram com a única democracia que havia no continente e jogaram o país numa sucessão de golpes e ditaduras que só acabou em 1988 para dar lugar a uma ditadura modernizada com outro nome.

Agora o prof. Duguin promete salvar o mundo pela destruição do Ocidente. Sinceramente, prefiro não saber o que vem depois. A mentalidade revolucionária, com suas promessas auto-adiáveis, tão prontas a se transformar nas suas contrárias com a cara mais inocente do mundo, é o maior flagelo que já se abateu sobre a humanidade. Suas vítimas, de 1789 até hoje, não estão abaixo de trezentos milhões de pessoas – mais que todas as epidemias, catástrofes naturais e guerras entre nações mataram desde o início dos tempos. A essência do seu discurso, como creio já ter demonstrado, é a inversão do sentido do tempo: inventar um futuro e reinterpretar à luz dele, como se fosse premissa certa e arquiprovada, o presente e o passado. Inverter o processo normal do conhecimento, passando a entender o conhecido pelo desconhecido, o certo pelo duvidoso, o categórico pelo hipotético. É a falsificação estrutural, sistemática, obsediante, hipnótica. O prof. Duguin propõe o Império Eurasiano e reconstrói toda a história do mundo como se fosse a longa preparação para o advento dessa coisa linda. É um revolucionário como outro qualquer. Apenas, imensamente mais pretensioso.

Quanto ao Império Mundial Eurasiano, com um pólo oriental sustentado nos países islâmicos, no Japão e na China, e um pólo ocidental no eixo Paris-Berlim-Moscou, não é de maneira alguma uma idéia nova. Stalin acalentou esse projeto e fez tudo o que podia para realizá-lo, só fracassando porque não conseguiu, em tempo, criar uma frota marítima com as dimensões requeridas para realizá-lo. Ele errou no timing: dizia que os EUA não passariam dos anos 80. Quem não passou foi a URSS.

Como o prof. Duguin adorna o projeto com o apelo aos valores espirituais e religiosos, em lugar do internacionalismo proletário que legitimava as ambições de Stálin, parece lógico admitir que a nova versão do projeto imperial russo é algo como um stalinismo de direita.

Mas a coisa mais óbvia no governo russo é que seus ocupantes são os mesmos que dominavam o país no tempo do comunismo. Substancialmente, é o pessoal da KGB (ou FSB, que a mudança periódica de nomes jamais mudou a natureza dessa instituição). Pior ainda, é a KGB com poder brutalmente ampliado: de um lado, se no regime comunista havia um agente da polícia secreta para cada 400 cidadãos, hoje há um para cada 200, caracterizando a Rússia, inconfundivelmente, como Estado policial; de outro, o rateio das propriedades estatais entre agentes e colaboradores da polícia política, que se transformaram da noite para o dia em “oligarcas” sem perder seus vínculos de submissão à KGB, concede a esta entidade o privilégio de atuar no Ocidente, sob camadas e camadas de disfarces, com uma liberdade de movimentos que seria impensável no tempo de Stalin ou de Kruschev.

Ideologicamente, o eurasismo é diferente do comunismo. Mas ideologia, como definia o próprio Karl Marx, é apenas um “vestido de idéias” a encobrir um esquema de poder. O esquema de poder na Rússia trocou de vestido, mas continua o mesmo – com as mesmas pessoas nos mesmos lugares, exercendo as mesmas funções, com as mesmas ambições totalitárias de sempre.

O Império Eurasiano promete-nos uma guerra mundial e, como resultado dela, uma ditadura global. Alguns de seus adeptos chegam a chamá-lo “o Império do Fim”, uma evocação claramente apocalíptica. Só esquecem de observar que o último império antes do Juízo Final não será outra coisa senão o Império do Anticristo.
Por Olavo de Carvalho. Publicado no Diário do Comércio

segunda-feira, 10 de março de 2014

O GUARDIÃO DE HAVANA

Qual é a motivação do governo de Dilma Rousseff para rebaixar-se à condição de eco dos sucessores de Hugo Chávez? 

Quem escreveu aquele comunicado vergonhoso? “Os Estados Partes do Mercosul (...) rechaçam as ações criminosas dos grupos violentos que querem disseminar a intolerância e o ódio na República Bolivariana da Venezuela”, “expressam sua mais firme rejeição às ameaças de ruptura da ordem democrática” e “confiam plenamente que o governo venezuelano não descansará no esforço para manter a paz e as plenas garantias de todos os cidadãos”. Essas linhas são uma cópia quase literal das declarações do governo da Venezuela. O Brasil só assinou embaixo, produzindo uma das páginas mais sombrias da história de nossa política externa. Qual é a motivação do governo de Dilma Rousseff para rebaixar-se à condição de eco dos sucessores de Hugo Chávez?

Nos tempos de Lula, tínhamos uma política externa com inflacionadas pretensões, guiada pela meta de obter um lugar no Conselho de Segurança da ONU. Falava-se na construção de uma ordem global multipolar, na ruptura da “hegemonia americana” e na reorganização Sul-Sul do comércio mundial. O chanceler Celso Amorim proclamou uma “aliança estratégica” Brasil-China. Uma vertente ultranacionalista personificada por Samuel Pinheiro Guimarães flertou com a ideia de edificação de um arsenal nuclear brasileiro. No auge do desvario, oferecemos uma cobertura à aventura nuclear iraniana. Hoje, nada restou daquela espuma: tornamo-nos, apenas, um aparelho de repetição das frases e dos gestos de Nicolás Maduro.

A política externa lulista era um castelo de areia inspirado por reminiscências do terceiro-mundismo e uma renitente nostalgia do projeto de Brasil-Potência delineado na ditadura militar. O castelo desabou sob o impacto de fracassos em série e do notório desinteresse de Dilma por qualquer coisa que aconteça fora das fronteiras nacionais. Sobrou um caroço duro de compromissos políticos e ideológicos: hoje, o Brasil define seu lugar no sistema internacional em função do imperativo da proteção dos interesses do regime castrista. Eis a chave para decifrar o comunicado do Mercosul.

O destino da “revolução bolivariana” nunca tocou nos feixes nervosos do lulopetismo. Lula assistiu, contrariado, à ascensão de Chávez como liderança concorrente na América Latina e tentou guardar distância dos rompantes antiamericanos do caudilho de Caracas. Mas a Venezuela chavista firmou uma estreita aliança com Havana e o petróleo subsidiado da PDVSA converteu-se na linha vital para a sobrevivência do Estado castrista. É por esse motivo que o Brasil firmou um comunicado no qual a oposição venezuelana aparece sob o rótulo de “grupos criminosos” engajados em promover um golpe de Estado.

Bem antes da segunda candidatura presidencial de Lula, em 1994, um editorial da revista teórica do PT qualificou a Cuba de Fidel Castro como uma ditadura indefensável. Nos anos seguintes, enquanto José Dirceu reinventava o PT como uma azeitada máquina política, Lula fazia uma opção preferencial pela ditadura cubana, rejeitando a oferta de acomodar seu partido no ônibus da social-democracia europeia. Aquelas escolhas marcam a ferro a política externa do lulopetismo. Tilden Santiago, um embaixador brasileiro em Havana, elogiou os fuzilamentos políticos promovidos pelo castrismo em 2003. No Ministério da Justiça, em 2007, Tarso Genro deu a ordem imoral de deportação dos boxeadores cubanos. Três anos depois, Lula identificou os presos políticos cubanos como criminosos comuns. É nessa trajetória que se inscreve o comunicado do Mercosul.

A Venezuela ainda não é uma ditadura, pois conserva a liberdade partidária e um sistema de sucessão baseado em eleições gerais. Contudo, já não é mais uma democracia, pois eliminou-se a independência do Judiciário, restringiu-se a liberdade de imprensa e as Forças Armadas foram submetidas ao catecismo chavista. À beira do colapso econômico, o regime enfrenta uma onda de insatisfação que se espraia da classe média para os pobres. Confrontados com manifestações de protesto, os sucessores de Chávez recorrem a intimidações, prendem sem acusações críveis um líder opositor e soltam a rédea dos “coletivos”, que operam como grupos paramilitares de choque.

O uso da força contra manifestações pacíficas foi respaldada pelo Mercosul, mas crismada como “inaceitável” até mesmo por José Vielma Mora, governador chavista do estado de Tachira, que pediu a libertação de “todos os aprisionados por razões políticas”. Até quando Dilma Rousseff emprestará o nome do Brasil à repressão “bolivariana”?

Cuba é o nome da armadilha. De um lado, sem a vasta transferência de recursos proporcionada pela Venezuela, o poder castrista enfrentaria o espectro do colapso. De outro, o governo brasileiro não dispõe das condições políticas necessárias para assumir o lugar da Venezuela. O Brasil já financia o regime dos Castro por meio de obscuros empréstimos do BNDES e das remessas de divisas associadas ao programa Mais Médicos. Entretanto, mesmo diante de uma oposição prostrada, o lulopetismo não tem como vender à nação a ideia de converter o Brasil no Tesouro de Cuba. Como produto do impasse, nossa política externa foi capturada pela crise da “revolução bolivariana”.

“A Venezuela não é a Ucrânia”, disse a primeira-dama Cilia Flores, desvelando mais um temor que uma certeza. A profundidade da crise não escapou à percepção de Heinz Dieterich, o sociólogo que cunhou a expressão “socialismo do século 21” e serviu durante anos como conselheiro ideológico de Chávez. Dieterich conclamou “uma facção” do chavismo a articular “uma aposta democrática de salvação nacional” que se coagularia num governo de coalizão com os oposicionistas moderados reunidos em torno de Henrique Capriles. Qualquer saída política pacífica exigirá um esforço de mediação internacional. O Brasil só poderá ajudar se o governo conseguir separar o interesse nacional dos interesses da ditadura castrista. Por: DEMÉTRIO MAGNOLI
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domingo, 9 de março de 2014

GOLPE À BRASILEIRA

Às vésperas dos 50 anos do golpe militar torna-se necessário um resgate da História para entendermos o presente. Em 1964 o Brasil era um país politicamente repartido. Dividido e paralisado. Crise econômica, greves, ameaça de golpe militar, marasmo administrativo. O clima de radicalização era agravado por velhos adversários da democracia. A direita brasileira tinha uma relação de incompatibilidade com as urnas. Não conseguia conviver com uma democracia de massas num momento de profundas transformações. Temerosa do novo, buscava um antigo recurso: arrastar as Forças Armadas para o centro da luta política, dentro da velha tradição inaugurada pela República, que já havia nascido com um golpe de Estado.


A esquerda comunista não ficava atrás. Sempre estivera nas vizinhanças dos quartéis, como em 1935, quando tentou depor Getúlio Vargas por meio de uma quartelada. Depois de 1945, buscou incessantemente o apoio dos militares, alcunhando alguns de “generais e almirantes do povo”. Ser “do povo” era comungar com a política do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e estar pronto para atender ao chamado do partido numa eventual aventura golpista. As células clandestinas do PCB nas Forças Armadas eram apresentadas como uma demonstração de força política.

À esquerda do PCB havia os adeptos da guerrilha. O Partido Comunista do Brasil (PCdoB) era um deles. Queria iniciar a luta armada e enviou, em março de 1964, o primeiro grupo de guerrilheiros para treinar na Academia Militar de Pequim. As Ligas Camponesas, que desejavam a reforma agrária “na lei ou na marra”, organizaram campos de treinamento no País em 1962 – com militantes presos foram encontrados documentos que vinculavam a guerrilha a Cuba. Já os adeptos de Leonel Brizola julgavam que tinham ampla base militar entre soldados, marinheiros, cabos e sargentos.

Assim, numa conjuntura radicalizada, esperava-se do presidente um ponto de equilíbrio político. Ledo engano. João Goulart articulava sua permanência na Presidência e necessitava emendar a Constituição. Sinalizava que tinha apoio nos quartéis para, se necessário, impor pela força a reeleição (que era proibida). Organizou um “dispositivo militar” que “cortaria a cabeça” da direita. Insistia em que não podia governar com um Congresso Nacional conservador, apesar de o seu partido, o PTB, ter a maior bancada na Câmara dos Deputados após o retorno do presidencialismo e não ter encaminhado à Casa os projetos de lei para tornar viáveis as reformas de base.

Veio 1964. E de novo foram construídas interpretações para uso político, mas distantes da História. A associação do regime militar brasileiro com as ditaduras do Cone Sul (Argentina, Uruguai, Chile e Paraguai) foi a principal delas. Nada mais falso. O autoritarismo aqui faz parte de uma tradição antidemocrática solidamente enraizada e que nasceu com o Positivismo, no final do Império. O desprezo pela democracia rondou o nosso país durante cem anos de República. Tanto os setores conservadores como os chamados progressistas transformaram a democracia num obstáculo à solução dos graves problemas nacionais, especialmente nos momentos de crise política. Como se a ampla discussão dos problemas fosse um entrave à ação.

O regime militar brasileiro não foi uma ditadura de 21 anos. Não é possível chamar de ditadura o período 1964-1968 – até o Ato Institucional n.º 5 (AI-5) -, com toda a movimentação político-cultural que havia no País. Muito menos os anos 1979-1985, com a aprovação da Lei de Anistia e as eleições diretas para os governos estaduais em 1982. Que ditadura no mundo foi assim?

Nos últimos anos se consolidou a versão de que os militantes da luta armada combateram a ditadura em defesa da liberdade. E que os militares teriam voltado para os quartéis graças às suas heroicas ações. Num país sem memória, é muito fácil reescrever a História.

A luta armada não passou de ações isoladas de assaltos a bancos, sequestros, ataques a instalações militares e só. Apoio popular? Nenhum. Argumenta-se que não havia outro meio de resistir à ditadura a não ser pela força. Mais um grave equívoco: muitos desses grupos existiam antes de 1964 e outros foram criados pouco depois, quando ainda havia espaço democrático. Ou seja, a opção pela luta armada, o desprezo pela luta política e pela participação no sistema político, e a simpatia pelo foquismo guevarista antecederam o AI-5, quando, de fato, houve o fechamento do regime. O terrorismo desses pequenos grupos deu munição (sem trocadilho) para o terrorismo de Estado e acabou sendo usado pela extrema direita como pretexto para justificar o injustificável: a barbárie repressiva.

A luta pela democracia foi travada politicamente pelos movimentos populares, pela defesa da anistia, no movimento estudantil e nos sindicatos. Teve em setores da Igreja Católica importantes aliados, assim como entre os intelectuais, que protestavam contra a censura. E o MDB, este nada fez? E os seus militantes e parlamentares que foram perseguidos? E os cassados?

Os militantes da luta armada construíram um discurso eficaz. Quem os questiona é tachado de adepto da ditadura. Assim, ficam protegidos de qualquer crítica e evitam o que tanto temem: o debate, a divergência, a pluralidade, enfim, a democracia. Mais: transformam a discussão política em questão pessoal, como se a discordância fosse uma espécie de desqualificação dos sofrimentos da prisão. Não há relação entre uma coisa e outra: criticar a luta armada não legitima o terrorismo de Estado. Temos de refutar as versões falaciosas. Romper o círculo de ferro construído, ainda em 1964, pelos adversários da democracia, tanto à esquerda como à direita. Não podemos ser reféns, historicamente falando, daqueles que transformaram o antagonista em inimigo; o espaço da política, em espaço de guerra.
*Marco Antonio Villa é historiador, autor do livro ‘Ditadura à Brasileira’ (Ed. Leya). O Estado de S. Paulo Do site: http://www.marcovilla.com.br/


FASCISMO, RÚSSIA E UCRÂNICA

Putin quer a Ucrânia em sua União Eurasiana, o que quer dizer que a Ucrânia tem de ser autoritária, e isto significa que a Maidan deve ser destruída.


O eurasianismo não é somente a fonte ideológica da União Eurasiana, é também o credo de muitas pessoas na administração Putin.

N.T.: Este artigo será publicado na edição de 20 de Março de 2014 da The New York Review referente ao atual conflito na Ucrânia. A exposição do cenário político e cultural desse conflito feita pelo autor é importante no entendimento do cenário latino-americano atual e, particularmente, no conflito que hoje ocorre na Venezuela, como pode ser visto pela leitura dos debates entre o professor Olavo de Carvalho e o teórico russo Aleksandr Dugin.

Os estudantes foram os primeiros a protestar contra o regime do presidente Viktor Yanukovych na Maidan, a praça central de Kiev, novembro passado. Esses eram os ucranianos que mais tinham a perder, os jovens que sem dúvidas se vêem como europeus e que desejam ter uma vida e uma pátria ucraniana européia. Muitos deles eram alinhados politicamente à esquerda, alguns deles radicalmente à esquerda. Após anos de negociações e meses de promessas, o seu governo, sob a administração do presidente Yanukovych, no último momento deixou de assinar um importante acordo com a União Européia. 

Quando a polícia de choque entrou em cena e reprimiu os estudantes novembro passado, um novo grupo, dos veteranos do Afeganistão, foi para a Maidan. Esses homens de meia idade, soldados da reserva e oficiais do Exército Vermelho, muitos deles carregando as cicatrizes dos ferimentos em campo de batalha, foi para a Maidan, como eles diziam, para proteger “seus filhos”. Eles não se referiam diretamente aos seus filhos e filhas: eles se referiam ao melhor da juventude, o orgulho e o futuro do país. Depois dos veteranos do Afeganistão vieram muitos outros, dezenas de milhares seguidos por centenas de milhares, agora nem tanto a favor da Europa mas em defesa da decência. 

O que quer dizer ir para a Maidan? A praça está localizada perto de alguns dos maiores prédios do governo e é agora um local tradicional para protestar. É importante ressaltar que a palavra maidan existe em ucraniano mas não em russo, e que mesmo as pessoas que falam russo usam essa palavra devido ao seu significado especial. Na sua origem, é a palavra arábica para "praça", um espaço público. Porém, maidan hoje quer dizer em ucraniano o mesmo que a palavra grega agora: não simplesmente um mercado público onde as pessoas podem se encontrar, mas um local onde as pessoas se encontram deliberadamente, precisamente para deliberar, para conversar e para criar uma sociedade política. Durante os protestos a palavra maidan veio a se referir ao ato público da política em si. Assim, por exemplo, as pessoas que usam seus carros para organizar a atenção pública e proteger os outros protestantes são chamados automaidan. 

Os protestantes representam todos os grupos de cidadãos ucranianos: Os que falam russo e os que falam ucraniano (mesmo que a maior parte dos ucranianos sejam bilíngues), pessoas das cidades e do campo, as pessoas de todas as regiões do país, os membros de todos os partidos políticos, os jovens e os idosos, os cristãos, os muçulmanos e os judeus. Todas das maiores vertentes do cristianismo estão representadas por fiéis e a maior parte delas pelo clero. Os Tártaros da Criméia marcharam em número impressionante e as lideranças judaicas fizeram questão de apoiar o movimento. A diversidade da Maidan impressiona: o grupo que monitora os hospitais para que o regime não possa sequestrar os feridos é organizado por jovens feministas. Um telefone de emergência que os protestantes ligam quando necessitam de ajuda é mantido por ativistas LGBT.

Em 16 de janeiro, o governo ucraniano, encabeçado pelo presidente Yanukovych, tentou colocar um fim na sociedade civil ucraniana. Uma série de leis passadas as pressas e sem seguir os procedimentos normais restringiram a liberdade de expressão e de comício, e removeram os poucos entraves que restavam a autoridade do executivo. Isso foi feito com o intento de levar a Ucrânia a uma ditadura e tornar todos os participantes na Maidan, que naquela altura provavelmente já somavam alguns poucos milhões, criminosos. O resultado foi que os protestos, até então pacíficos, se tornaram violentos. Yanukovych perdeu o apoio mesmo na sua base política no sudeste, próxima da fronteira com a Rússia. 

Após semanas respondendo pacificamente as prisões e as agressões da polícia de choque, muitos ucranianos concluíram que tinham chegado ao limite. Uma parte dos protestantes, longe de serem a maioria dos alinhados à direita e à direita extrema, decidiram entrar em confronto com a polícia. Entre eles estavam membros do partido de extrema direita Svoboda e um novo conglomerado de nacionalistas que se intitulam Setor Direito (Pravyi Sektor). Jovens, alguns de grupos da direita e outros não, tentaram tomar a força os espaços públicos disputados pela polícia de choque. Jovens judeus formaram seu próprio grupo de combate, ou sotnia, para lutar contra as autoridades. 

Mesmo tendo Yanukovych revogado a maior parte das leis ditatoriais, a violência ilegal do regime, que havia começado em novembro continuou em fevereiro. Membros da oposição foram alvejados e assassinados, ou molhados pelos carros de água usados para dispersar manifestações em temperaturas abaixo de zero para que morressem de hipotermia. Outros foram torturados e deixados para morrer no mato. 

Durante as duas primeiras semanas de fevereiro, o regime de Yanukovich buscou restaurar algumas das leis ditatoriais por decretos, atalhos burocráticos e novas legislações. Em 18 de fevereiro, um debate parlamentar que estava anunciado para tratar de uma reforma constitucional foi cancelado. Ao invés desse debate, o governo colocou milhares de policiais do batalhão de choque contra os manifestantes de Kiev. Centenas de pessoas foram feridas por balas de borracha, gás lacrimogêneo e cassetetes. Dezenas foram mortas. 

* * *
O futuro desse movimento de protestos será decidido pelos ucranianos. Ainda assim, os protestos haviam começado na esperança de que a Ucrânia pudesse entrar para a União Européia, uma aspiração que para muitos ucranianos representa algo como uma combinação de estado de direito, ausência do medo, fim da corrupção, estado de bem estar social e livre mercado sem a intimidação dos sindicatos controlados pelo presidente. 

O curso dos protestos foi muito influenciado pela presença de um projeto rival para a Ucrânia, apoiado por Moscou e chamado de União Eurasiana. Trata-se de uma união internacional política e comercial que ainda não existe mas que deve passar a existir em janeiro de 2015. A União Eurasiana, ao contrário da União Européia, não está baseada nos princípios da igualdade e da democracia nos seus países membros, nem no estado de direito, nem nos direitos humanos.

Ao contrário, é uma organização hierárquica, que por sua natureza parece improvável que admita qualquer membro que seja democrático, com estado de direito e direitos humanos. Qualquer democracia na União Eurasiana seria uma ameaça ao poder de Putin na Rússia. Putin quer a Ucrânia em sua União Eurasiana, o que quer dizer que a Ucrânia tem de ser autoritária, e isto significa que a Maidan deve ser destruída.

As leis ditatoriais de 16 de janeiro eram obviamente baseadas nos modelos russos, e foram propostas por legisladores ucranianos com laços fortes com Moscou. Essas leis parecem ter sido a condição imposta pela Rússia para o apoio financeiro ao regime de Yanukovych. Antes de serem anunciadas, Putin ofereceu a Ucrânia um grande empréstimo e prometeu reduzir o preço do gás natural Russo. Todavia, em janeiro o resultado não foi o alinhamento à Rússia. As pessoas da Maidan se defenderam, e os protestos continuaram. Onde isso tudo vai levar ninguém pode adivinhar; somente o Kremlin expressa certeza em relação ao que tudo isso significa.

Os protestos na Maidan, nos foi dito diversas vezes pela propaganda russa e pelos amigos do Kremlin na Ucrânia, significavam o retorno do nacional-socialismo à Europa. O ministro de relações exteriores russo palestrou aos alemães em Munique sobre o apoio dos protestantes a pessoas que saúdam Hitler. Naturalmente, é importante que se esteja atento à extrema direita na política e história ucraniana. Essa ala política ainda é uma presença séria nos dias de hoje, ainda que menos importante que a extrema direita na França, na Áustria ou na Holanda. Ainda assim, é o regime ucraniano, não seus opositores, que está retomando o anti-semitismo, instruindo sua polícia de choque de que a oposição é liderada por judeus. Em outras palavras, o governo ucraniano está dizendo para seus policiais que o oponente é judeu e dizendo para nós que o oponente é nazista. 

O mais estranho em relação às aspirações de Moscou é a ideologia política dos seus teóricos. A União Eurasiana é a inimiga da União Européia, não só na estratégia mas também na ideologia. A União Européia se baseia em uma lição histórica: de que as guerras do século XX se basearam em idéias falsas e perigosas, o nacional-socialismo e o stalinismo, que devem ser rejeitadas e de fato superadas em um sistema que garanta livres mercados, livre fluxo de pessoas e estado de bem estar social. O Eurasianismo, ao contrário, se apresenta com seus defensores como o oposto da democracia liberal. 

A ideologia eurasiana pinta uma lição totalmente diferente do século XX. Fundada por volta de 2001 pelo cientista político russo Aleksandr Dugin, ela propõe a realização do nacional-bolchevismo. Ao invés de rejeitar ideologias totalitárias, o eurasianismo chama os políticos do século XXI a buscar o que é útil tanto no fascismo como no stalinismo. O principal trabalho de Dugin, Os Fundamentos da Geopolítica, publicado em 1997, segue de perto as idéias de Carl Schmitt, o líder dos teóricos nazistas. O eurasianismo não é somente a fonte ideológica da União Eurasiana, é também o credo de muitas pessoas na administração Putin e a força motriz de um movimento bastante ativo da juventude russa de extrema direita. Por anos Dugin defendeu abertamente a divisão e colonização da Ucrânia. 

O homem de referência para as políticas eurasianas e ucranianas no Kremlin é Sergei Glazyev, um economista que, como Dugin, tende a combinar nacionalismo radical com nostalgia pelo bolchevismo. Ele foi membro do Partido Comunista e deputado comunista no parlamento russo antes de se tornar um dos fundadores do partido de extrema direita chamado Rodina, ou Terra-mãe. Em 2005, alguns de seus deputados assinaram uma petição ao procurador geral russo pedindo que todas as organizações judaicas fossem banidas da Rússia. 

Mais tarde, naquele mesmo ano, o Rodina foi proibido de participar das futuras eleições depois de reclamações de que suas propagandas incitavam o ódio racial. A mais notória dessas propagandas mostrava pessoas negras comendo melancias e jogando as cascas no chão, para então chamar os russos para a limpeza de suas cidades. O livro de Glazyev Genocídio: Rússia e a Nova Ordem Mundial defende que as forças sinistras da “nova ordem mundial” conspiraram contra a Rússia nos anos 90 para impor políticas econômicas que levaram ao “genocídio”. Esse livro foi publicado em inglês pela revista de Lyndon LaRoucheExecutive Intelligence Review com prefácio de LaRouche. Hoje, a Executive Intelligence Review ecoa a propaganda do Kremlin, disseminando em língua inglesa que os protestantes ucranianos queriam um golpe de estado nazista e que iniciaram uma guerra civil.

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A campanha populista na mídia pela União Eurasiana está agora nas mãos de Dmitry Kiselyov, o anfitrião do mais importante talk show da Rússia e, desde dezembro, também diretor da estatal de mídia russa designada a formar a opinião pública da nação. Mais conhecido por dizer que os gays que morrem em acidentes de carro devem ter seus corações cortados de seus corpos e incinerados, Kiselyov levou a campanha de Putin contra os direitos dos homossexuais e a transformou em uma arma contra a integração européia. Assim, quando o então ministro de relações exteriores alemão, que é gay, visitou Kiev em dezembro e se encontrou com Vitali Klitschko, o político campeão dos pesos-pesados e opositor ucraniano, Kiselyov diminuiu Klitschko como um ícone gay. De acordo com o ministro de relações exteriores russo, a exploração das políticas sexuais deve se tornar agora uma arma na luta contra a “decadência" que representa União Européia. 

Seguindo a mesma estratégia, o governo de Yanukovych alegou, falsamente, que o preço das relações mais próximas com a União Européia era o reconhecimento do casamento gay na Ucrânia. Kiselyov é bem aberto em relação a estratégia da mídia russa sobre a Maidan: “aplicar a tecnologia política correta”, e "levá-la ao ponto de super-aquecimento”, para então trazer para a “lente de aumento da televisão e da internet”.

Por qual motivo pessoas com tais visões pensam que podem chamar aos outros de fascistas? E por qual motivo ninguém na esquerda ocidental os leva a sério? Uma linha de raciocínio parece ser a seguinte: os russos ganharam a Segunda Guerra Mundial e por isso se pode ter certeza que eles reconhecem nazistas. Muita coisa está errada nisso. A Segunda Guerra Mundial, no front oriental, foi travada basicamente no que na época eram chamadas de Ucrânia Soviética e de Bielorrússia Soviética, não na Rússia Soviética. 5% da Rússia estava ocupada pelos alemães; toda a Ucrânia estava ocupada pelos alemães. Exceto pelos judeus, os quais sofreram de longe o pior, as principais vítimas das políticas nazistas não foram os russos, mas os ucranianos e os bielorrussos. Não existia nenhum exército russo lutando na Segunda Guerra Mundial, mas sim o Exército Vermelho Soviético. Os seus soldados eram de maneira desproporcional de origem ucraniana, já que o Exército Vermelho teve muitas perdas na Ucrânia e recrutou soldados entre população local. O grupo do exército que libertou Auschwitz era chamado de Primeira Frente Ucraniana.

A outra fonte da suposta legitimidade moral da Eurásia parece ser a seguinte: uma vez que os representantes do regime de Putin só de maneira seletiva se distanciam do stalinismo, eles são, portanto, herdeiros confiáveis da história soviética, e devem ser vistos como opositores automáticos aos nazistas e, dessa forma, confiáveis a se opor a extrema direita. 

Mais uma vez, muita coisa está errada nisso. A Segunda Guerra Mundial começou com uma aliança entre Hitler e Stalin em 1939. Terminou com a União Soviética expulsando os sobreviventes judeus pela sua fronteira para a Polônia. Após a fundação do Estado de Israel, Stalin começou a associar os judeus soviéticos com uma conspiração do mundo capitalista e iniciou uma campanha de prisões, deportações e assassinatos de líderes escritores judeus. Quando Stalin morreu em 1953, ele estava preparando uma campanha ainda maior contra os judeus. 

Após a morte de Stalin, o comunismo ganhou cada vez mais uma coloração étnica, com pessoas que queriam reviver suas glórias afirmando que o problema do stalinismo fora que esse havia sido estragado por judeus. A purificação étnica do legado comunista é precisamente a lógica do nacional-bolchevismo, que é a fundação ideológica do Eurasianismo hoje. Putin é um admirador do filósofo Ivan Ilin, que queria que a Rússia fosse uma ditadura nacionalista.

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O que quer dizer quando o lobo aponta aos outros e grita: “lobo!”? Obviamente, propagandistas em Moscou e Kiev nos tomam por idiotas - o que, pelos indícios, é um tanto justificável. 

De maneira mais sutil, o que essa campanha faz é tentar reduzir a tensão social em um país complexo a uma batalha de símbolos do passado. A Ucrânia não é o teatro para a propaganda histórica de outros nem um quebra-cabeça no qual peças possam ser removidas. É um grande país europeu no qual os cidadãos possuem importantes laços culturais e econômicos tanto com a União Européia quanto com a Rússia. Para definir seu próprio caminho, a Ucrânia necessita de debate público normal, da restituição da democracia parlamentar e de relações funcionais com todos os seus vizinhos. A Ucrânia está repleta de pessoas sofisticadas e ambiciosas. Caso as pessoas no Ocidente fiquem presas a questão de serem eles predominantemente nazistas ou não, então os ocidentais irão perder de vista as questões centrais da presente crise.

De fato, os ucranianos estão em uma luta tanto contra a concentração de riqueza quanto contra a concentração de poder armado nas mãos de Viktor Yanukovych e seus aliados mais próximos. Os protestos podem ser vistos como um belo exemplo de coragem para americanos tanto na esquerda quanto na direita. Os ucranianos estão fazendo sacrifícios reais na esperança de se juntarem a União Européia. Pode haver algo a ser aprendido nisso tudo entre os eurocéticos em Londres ou em qualquer outro lugar? Esse é um diálogo que não está ocorrendo.

A história do Holocausto é parte do nosso próprio discurso público, do nosso agora, da nossa maidan. A atual tentativa russa de manipular a memória do Holocausto é tão gritante e cínica que aqueles que são idiotas o suficiente para cair nela vão um dia ter de se perguntar como, e a serviço do que, foram coniventes. Se o fascismo se fantasia com o manto do anti-fascismo, a memória do Holocausto em si será alterada. Será mais difícil no futuro se referir ao Holocausto quando em defesa de qualquer causa nobre, seja ela particularmente a história judaica ou a história dos direitos humanos em geral.

POR TIMOTHY SNYDER Tradução: Fernando de Souza Do site: http://www.midiasemmascara.org/