domingo, 13 de novembro de 2016

OS ALEMÃES ESTÃO DEIXANDO EM MASSA A ALEMANHA

- Mais de 1.5 milhão de alemães, muitos deles altamente qualificados, deixaram a Alemanha na década passada. — Die Welt.


- A Alemanha está diante de uma escalada de crimes cometidos por migrantes, incluindo uma epidemia de estupros e ataques sexuais. A migração em massa também está acelerando a islamização da Alemanha. Muitos alemães parecem estar perdendo a esperança em relação à futura direção que o país irá seguir.

- "Nós, refugiados... não queremos viver no mesmo país que vocês. Vocês podem, e eu acho que deveriam deixar a Alemanha. E por favor, levem a Saxônia e a Alternativa para a Alemanha (AfD) com vocês... Por que vocês não vão para outro país? Nós estamos cheios de vocês!" — Aras Bacho, migrante sírio de 18 anos de idade, no jornal Der Freitag, outubro de 2016.

- Uma corretora de imóveis em uma cidade perto do Lago Balaton, um destino turístico muito procurado no oeste da Hungria, contou que 80% dos alemães que estão mudando para lá culpam a crise migratória como o principal motivo que os incentiva a deixarem a Alemanha.

- "Eu acredito que não há lugar para o Islã na Alemanha. Eu considero o Islã uma entidade estrangeira que trouxe mais problemas do que benefícios ao Ocidente. Na minha opinião, muitos seguidores desta religião são mal-educados, exigentes e desprezam a Alemanha." — Um cidadão alemão que emigrou da Alemanha, em uma "Carta Aberta ao Governo Alemão."

- "Eu acredito que a imigração está causando mudanças importantes e irreversíveis na sociedade alemã. Estou furioso que isso esteja acontecendo sem a aprovação direta dos cidadãos alemães... Eu acredito que é uma vergonha que os judeus da Alemanha devam, de novo, ter medo de serem judeus." — Um cidadão alemão que emigrou da Alemanha, em uma "Carta Aberta ao Governo Alemão."
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Um número cada vez maior de alemães está abandonando os bairros nos quais residiram a vida inteira enquanto outros estão deixando a Alemanha para sempre à medida que a imigração em massa vem transformando regiões do país radicalmente, a ponto de ficarem irreconhecíveis.

Dados da agência de estatísticas alemã Destatis, mostram que 138.000 alemães deixaram a Alemanha em 2015. A expectativa é que mais emigrem em 2016. Em um artigo sobre a fuga de cérebros intitulado "O talento alemão está deixando em massa o país", o jornal Die Weltreportou que mais de 1.5 milhão de alemães, muitos deles altamente qualificados, deixaram a Alemanha na década passada.

As estatísticas não dizem o porquê dos alemães estarem emigrando, mas segundo rumores muitos estão acordando para o verdadeiro custo — financeiro, social e cultural — da decisão da Chanceler Angela Merkel de permitir a entrada no país de mais de um milhão de migrantes, em sua maioria muçulmanos, em 2015. A expectativa é a de que pelo menos 300.000 migrantes cheguem à Alemanha em 2016, de acordo com Frank-Jürgen Weise, chefe do departamento de migração do país, BAMF.

A migração em massa tem — entre os inúmeros problemas que o país está enfrentando — contribuído para a crescente sensação de insegurança na Alemanha, que está diante de uma escalada de crimes cometidos por migrantes, incluindo a epidemia de estupros e ataques sexuais. A migração em massa também está acelerando a islamização da Alemanha. Muitos alemães parecem estar perdendo a esperança em relação à futura direção que o país irá seguir.
No auge da crise migratória em outubro de 2015, cerca de 800 cidadãos se aglomeraram na câmara municipal em Kassel/Lohfelden para protestar contra uma decisão unilateral do governo local de erguer abrigos para migrantes na cidade. O Presidente de Kassel, Walter Lübcke, respondeu àqueles que não concordam com a política de portas abertas para a imigração do governo que eles são "livres para deixarem a Alemanha assim que o desejarem".

Esta resposta ecoou em um audacioso ensaio publicado em outubro de 2016 pelo jornal Der Freitag, (também publicado pela Huffington Post Deutschland, que posteriormente excluiu o post). No artigo, Aras Bacho, imigrante sírio de 18 anos de idade sugeriu aos alemães que estão furiosos com a crise migratória que deixem a Alemanha. Ele ressaltou:


"Nós, refugiados... estamos fartos dos cidadãos furiosos (Wutbürger). Eles insultam e incitam como loucos... Sempre há esses incitamentos de desempregados racistas (Wutbürgern), que passam o tempo todo na Internet esperando até que apareça um artigo sobre refugiados. Depois começam a pipocar os vergonhosos comentários...

"Olá, vocês furiosos cidadãos desempregados (Wutbürger) na Internet. Como está a educação de vocês? Por quanto mais tempo vocês vão continuar distorcendo a verdade? Vocês não sabem que estão espalhando mentiras todo santo dia? O que vocês fariam se estivessem na pele deles? Bem, vocês teriam fugido!

"Nós, refugiados... não queremos viver no mesmo país que vocês. Vocês podem, e eu acho que deveriam deixar a Alemanha. E por favor, levem a Saxônia e a Alternativa para a Alemanha (AfD) com vocês.

"A Alemanha não serve para vocês, por que você moram aqui? Por que vocês não vão para outro país? Se este é o seu país, prezados cidadãos furiosos (Wutbürger), então se comportem civilizadamente. Caso contrário, vocês podem simplesmente fugir da Alemanha e procurar um novo lar. Vão para os Estados Unidos, para Donald Trump, ele vai amar muito vocês. Nós estamos cheios de vocês!"

Em maio de 2016 a revista semanal Focus, relatou que os alemães estão se mudando para a Hungria. Uma corretora de imóveis em uma cidade perto do Lago Balaton, um destino turístico muito procurado no oeste da Hungria, contou que 80% dos alemães que estão mudando para lá culpam a crise migratória como o principal motivo que os incentiva a deixarem a Alemanha.

Um cidadão alemão, que emigrou da Alemanha recentemente e que pediu para não ser identificado escreveu uma "Carta Aberta ao Governo Alemão". O documento, que foi publicado no site Politically Incorrect, afirma:

"Há poucos meses eu emigrei da Alemanha. Minha decisão não foi tomada por motivos financeiros e sim, principalmente, devido à minha insatisfação com a atual situação política e social em minha terra natal. Em outras palavras, acredito que eu e especialmente meus filhos terão uma vida melhor em outro lugar. Melhorpara mim neste contexto significa, acima de tudo, uma vida em que eu possa desfrutar da liberdade, autodeterminação e salários dignos, no que diz respeito à tributação.

"Entretanto eu não quero fechar as portas e apenas ir embora discretamente. Eu gostaria, por meio desta, explicar de uma forma construtiva porque eu decidi deixar a Alemanha.

1. "Eu acredito que não há lugar para o Islã na Alemanha. Eu considero o Islã uma entidade estrangeira que trouxe mais problemas do que benefícios ao Ocidente. Na minha opinião muitos seguidores desta religião são mal-educados, exigentes e desprezam a Alemanha. Em vez de darem um basta à islamização na Alemanha (e ao consequente fim da nossa cultura e liberdade), a maioria dos políticos, ao que tudo indica, está mais preocupada em ser reeleita e, consequentemente prefere ignorar ou minimizar o problema do Islã.

2. "Eu acredito que as ruas alemãs são menos seguras do que deveriam ser, dadas as nossas oportunidades tecnológicas, legais e financeiras.

3. "Eu acredito que a UE tem uma deficiência democrática que limita a minha influência como cidadão democrático.

4. "Eu acredito que a imigração está causando mudanças importantes e irreversíveis na sociedade alemã. Estou furioso que isso esteja acontecendo sem a aprovação direta dos cidadãos alemães, mas mesmo assim está sendo imposta por vocês aos cidadãos alemães e à próxima geração.

5. "Eu acredito que a mídia alemã está desistindo cada vez mais da sua neutralidade e que a liberdade de expressão neste país só existe de forma limitada.

6. "Eu acredito que na Alemanha os preguiçosos estão sendo bajulados enquanto os trabalhadores estão sendo punidos.

7. "Eu acredito que é uma vergonha que os judeus da Alemanha devam, de novo, ter medo de serem judeus."

Muitos alemães têm notado a tendência de uma integração inversa, na qual se espera que as famílias alemãs se adaptem aos costumes e hábitos sociais dos migrantes, e não o contrário.

Em 14 de outubro, o jornal Tageszeitung de Munique publicou uma carta profundamente emotiva e sincera de uma mulher chamada "Anna", mãe de dois filhos, que escreveu sobre a sua decisão de mudar com a família para fora da cidade porque os migrantes estavam tornando sua vida insuportável. Na carta, dirigida ao prefeito de Munique Dieter Reiter, ela assinala:

"Hoje eu quero escrever-lhe uma espécie de carta de despedida (Abschiedsbrief) explicando porque eu juntamente com a minha família estamos deixando a cidade, mesmo que, provavelmente, ninguém se incomode.

"Eu tenho 35 anos de idade, moro aqui com meus dois filhos ainda pequenos e meu marido em uma luxuosa casa geminada com garagem. Portanto, poder-se-ia dizer que estamos muito bem segundo os padrões de Munique ... Moramos em uma casa muito confortável com muito espaço ao lado de um parque com muito verde. Então por que uma família como a nossa iria resolver mudar de cidade? ....

"Suponho que seus filhos não fazem uso de espaços públicos, que eles não usam transporte público e que não frequentam escolas públicas em "áreas problemáticas". Também imagino que vocês e outros políticos raramente, se é que algum dia deram uma volta por aqui.

"Continuando, em uma manhã de segunda-feira eu participei de um pequeno café da manhã para mulheres do bairro patrocinado pela Cidade de Munique. No café da manhã eu me encontrei com 6 ou 8 mães, algumas vieram com seus filhos. Todas usavam véus e nenhuma falava alemão. Os organizadores do evento rapidamente me informaram que provavelmente eu iria ter dificuldade em me integrar (ipsis litteris!!!). Devo salientar que sou alemã. Falo alemão fluente... e não uso véu. De modo que dei um breve sorriso e disse que gostaria de tentar me integrar. Infelizmente, pelo fato de que foi pedido a todas que trouxessem algo para beliscar, eu trouxe um sanduíche de salame e presunto para o café da manhã, . Então é claro que assim eu tinha ainda menos chance de me integrar.

"Não foi possível falar alemão com ninguém no café da manhã das mulheres, que na verdade foi organizado com o intuito de promover a integração, mas ninguém estava interessado nisso. Os organizadores não insistiram que se falasse alemão e as mulheres, que pareciam fazer parte de um grupo árabe/turco, simplesmente queriam usar o recinto.

"Então perguntei acerca do brunch familiar... Fui avisada que o brunch seria realizado em recintos separados. Homens em um recinto e mulheres em outro. No começo pensei que se tratava de uma piada de mau gosto. Infelizmente, não era...

"De modo que a minha impressão em relação a esses eventos para promover a integração é lastimável. Não há nenhum tipo de interação!!! Como é possível a cidade de Munique tolerar uma coisa dessas? Na minha opinião, todo o conceito desses eventos para promover a integração deve ser questionado... Fui informada que não posso incluir carne de porco na lancheira do meu filho!!! Olá?! Nós estamos aqui na Alemanha! ....

"Resumindo, eu acho que a situação faz com que eu sinta que nós somos realmente indesejados aqui. Que a nossa família realmente não se enquadra aqui. Às vezes meu marido diz que ele tem a sensação de que agora somos a maior minoria sem nenhum lobby. Para cada grupo há uma instituição, um local, um interesse público, mas para nós, um casal heterossexual, casado, com dois filhos, não desempregado, nem deficiente nem islâmico, para pessoas como nós não há mais nenhum interesse.

"Quando eu disse na escola do meu filho que estávamos pensando em sair da cidade e as razões que nos levaram a isso, fui veementemente atacada pela direção da escola. Por causa de pessoas como nós, disseram eles, é que a integração não funciona, precisamente porque nós tiramos nossos filhos. Pelo menos duas mães se exasperaram de maneira ofensiva. A direção da escola me tachou de "xenófoba".

"É exatamente por esta razão que pessoas como eu perderam a paciência e resolveram votar para outros partidos políticos... Sendo bem franca, visitei cerca de 50% dos países do mundo, tenho mais amigos estrangeiros que alemães e não tenho absolutamente nenhum preconceito ou aversão a pessoas por conta de sua origem. Vi muitas coisas mundo afora e sei que a forma com que a integração está sendo conduzida aqui fará com que outros também cheguem a este tipo de conclusão: ou mandamos nossos filhos para escolas particulares, jardins de infância ou mudamos para outras comunidades. Bem, então, até logo!!!"

Por: Soeren Kern é colaborador sênior do Gatestone Institute sediado em Nova Iorque. Ele também é colaborador sênior do European Politics do Grupo de Estudios Estratégicos / Strategic Studies Group sediado em Madri. Siga-o no Facebook e no Twitter. 25 de Outubro de 2016
Tradução: Joseph Skilnik Do site:https://pt.gatestoneinstitute.org

sábado, 12 de novembro de 2016

Como Aproveitar Seu Ensino Superior ao Máximo

PARANOIA COM O ESTADO DO CORPO SÓ VAI PIORAR COM O PROGRESSO DA CIÊNCIA

Mark Zuckerberg, o rei do Facebook, pretende investir US$ 3 bilhões para curar todas as doenças existentes na Terra.

Não sei como é possível levar a sério uma proclamação dessas: acreditar que as maleitas existentes desaparecem por obra e graça de US$ 3 bilhões só faz sentido na cabeça adolescente de um eterno adolescente como Zuckerberg. Mas entendo a ambição dele e a moda em que ele se inspirou.

Semanas atrás, a revista "The Economist" dedicou amplo espaço ao assunto: e se, no futuro próximo, for possível prolongar a vida humana até aos 120 anos (mínimo)?

E se novos tratamentos permitirem substituir órgãos finitos (coração, rins, fígado etc.) por novos exemplares a partir do nosso "armazém" genético?

Enfim, e se a imortalidade estiver ao alcance do engenho humano?

A "The Economist" concede o benefício da dúvida para todas as utopias da ciência e depois alerta para dois problemas, para além dos óbvios (demográficos, econômicos, ambientais etc.).

Em primeiro lugar, só vale a pena viver mais quando se vive bem (os autores clássicos sabiam disso; será preciso lembrar o destino da Sibila de Cumas?).

Por outro lado, os tratamentos anti-envelhecimento teriam que estar disponíveis para todas as bolsas. Caso contrário, haveria um fosso ainda mais intolerável do que aquele que separa pobres e ricos; seria o abismo entre seres mortais e imortais.

Fatalmente, a revista esqueceu um efeito perverso mais imediato: se a morte por "causas naturais" se transformar em artigo raro, que espécie de conduta teria a humanidade para evitar todas as outras fatalidades (crimes, acidentes etc.) que poderiam acabar com uma vida teoricamente infindável?

Hoje, a paranoia com o estado do corpo excede os limites da sanidade. Num mundo de seres (quase) imortais, imagino que essa paranoia hipocondríaca seria tão aguda que só o suicídio seria capaz de nos aliviar.

*

"Nasci adulta e morrerei criança" –assim falava a escritora lusa Agustina Bessa-Luís (que tem o seu "Breviário do Brasil" finalmente editado pela Tinta da China). Essa confissão, no melhor espírito Benjamin Button, começa a fazer sentido quando chego a meio da jornada (escrevo "meio da jornada" com a esperança razoável, ou talvez irrazoável, de ter mais 40 anos pela frente).

Isso é visível nas pequenas rotinas: observo o meu filho (de 15 meses) e compreendo a beleza daquela vida. As dormidas. As comidas. E as tropelias que ele gosta de fazer nos entretantos.

Então olho para mim e concluo que não é apenas ele que é parecido comigo (fisicamente). Eu também sou parecido com ele (espiritualmente). Deplorava um prato de sopa - e agora não consigo viver sem ela. Deplorava a perda de tempo com o sono - e agora não dispenso a minha sesta.

E, em matéria de tropelias, o velho sentimento de culpa que sempre me acompanhava quando havia trabalho para fazer deu lugar a um ócio limpo, lúdico. Infantil.

Mas não é apenas nas dormidas e comidas que me torno mais jovem à medida que envelheço. Ainda me lembro do meu horror ao sol. Adolescente pretensioso, repetia mentalmente as palavras de Paulo Francis ("Intelectual não vai à praia; intelectual bebe") e hibernava durante o Verão.

Quando o Outono chegava, como agora chega ao hemisfério norte, saía da toca e, ao som de Tony Bennett ("Maybe September / I'll Love Again"), recebia as primeiras chuvas como certas tribos primitivas: grato e festivo. Só faltava dançar.

Não mais. Essa alegria está reservada para a Primavera, que agora chega ao hemisfério sul; e atinge o seu apogeu quando há calor e areia e mar.

Não sei que estranhos comportamentos me esperam no futuro. Mas se o leitor irónico está a pensar nas fraldas que as crianças também usam, só posso responder: não excluo nada até lá chegar.

*

Em inícios do século 20, Thomas Hardy (1840 - 1928) escreveu um dos seus poemas mais perturbantes. Intitula-se "God's Funeral" e, como o título indica, é uma marcha fúnebre sobre o enterro de Deus.

Os homens, em perfeita evocação de Feuerbach, falam do "defunto" como uma projecção mental dos medos e frustrações da humanidade. Mas palpita ainda entre alguns dos presentes a nostalgia da crença - os dias que começavam com a oração dos simples e o sentimento de confiança que repousava sobre eles.

No poema, Thomas Hardy junta-se melancolicamente ao cortejo. Não é possível defender o indefensável depois do triunfo do materialismo e do niilismo.

Uma pergunta, porém, resiste ao enterro: se Deus está a sete palmos, que será dos homens que ficam cá em cima? Foram vários os teóricos políticos que se ocuparam questão.

No século 18, Edmund Burke (1729 - 1797) já tinha alertado para as consequências da "descrença": os jacobinos atacavam o cristianismo mas os homens, "animais religiosos" por definição, rapidamente procurariam novos dogmas para preencher o vazio interior. A França do Terror e da Virtude, com o grotesco culto do Ser Supremo, foi a resposta sanguinária ao "enterro de Deus".

De igual forma, Alexis de Tocqueville (1805 - 1959) regressaria ao cemitério no século seguinte: se a "era da igualdade" era imparável, a única forma de impedir que a igualdade degenerasse em tirania era aprender alguma coisa com a religiosidade dos americanos –essa espécie de fortaleza interior mas também comunitária que se opunha aos abusos do poder central.

É nesta linhagem que se situa Raymond Aron (1905 - 1983). Sobretudo o Raymond Aron de "O Ópio dos Intelectuais", um clássico que a 3 Estrelas publicou.

Uma digressão: lembro-me de ler algures que uma das primeiras medidas dos bolcheviques, depois da Revolução de 1917, foi substituir nas casas da plebe russa as figuras do Cristo Pantocrator por retratos de Karl Marx. A história talvez seja apócrifa e, aqui entre nós, convenientemente capilar: entre a barba de um e de outro, venha o camponês e escolha.

Mas o episódio, real ou imaginário, capta o espírito da "religião secular" tal como Aron o apresenta: o "funeral de Deus" não deu lugar ao luto prolongado ou à euforia libertadora.

"As necessidades do coração", para usar uma expressão do próprio Aron, rapidamente levaram os homens, e sobretudo os intelectuais, a procurarem os alicerces consoladores de uma nova religião.

O comunismo (e o nazi-fascismo) cumpriu esse papel ao conceder um sentido e um fim para as almas perdidas da modernidade. O proletariado (ou a raça) seria o novo messias; a "sociedade sem classes" (ou um Reich de mil anos), um novo reino celestial; e os intelectuais, os mesmos que transportaram o caixão de Deus até à última morada, surgiam como os guardiões da nova "fé" –e como os "inquisidores" contra os novos "cismas" e os novos "hereges".

Eu sempre soube que o comunismo, o fascismo ou o nazismo eram "heresias" contra a dignidade básica do ser humano. Depois de ler Raymond Aron, a palavra "heresia" ganhou contornos ainda mais precisos, mais literais –e mais letais.
Por: Paulo Pereia Coutinho  Do site: http://www1.folha.uol.com.br/

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

GLOBALIZAÇÃO X GLOBALISMO

A CIVILIZAÇAO SÓ EXISTE PELA RECUSA DA TRANSPARÊNCIA TOTALITÁRIA


Li há tempos que já existem banheiros transparentes na via pública. Não brinco. Seria na Ásia? Na China? Talvez, talvez. Mas o meu ponto é outro: qual é o problema de termos um vaso sanitário para uso (nosso) e contemplação (dos outros)?

Os moralistas dirão: é falta de pudor. Ou, melhor ainda, é uma redução da nossa humanidade ao estado mais animalesco. Concordo. Mas os moralistas não entendem que vivemos na "sociedade da transparência"?

Uso essa expressão porque ela é o título de um ensaio –mais um, primoroso– do filósofo Byung-Chul Han. E, a páginas tantas, o professor Han cita Jean-Jacques Rousseau (quem mais?). Escrevia Rousseau as palavras que se seguem: "Só um mandamento da moral pode suplantar todos os outros, a saber, este: nunca faças nem digas seja o que for que o mundo inteiro não possa escutar."
Binho Barreto/Binho Barreto/Editoria de Arte/Folhapress 

E conclui o genebrino, em antecipação do banheiro transparente: "Eu, pelo meu lado, sempre considerei como sendo o mais digno de apreço de entre os homens esse romano cujo desejo era que a sua casa estivesse construída de maneira a poder ver-se tudo o que nela se passava."

As palavras de Rousseau fazem parte do seu particular programa filosófico: uma crítica radical às mentiras da "civilização" –e uma apologia da vida "autêntica" que existiria no estado da natureza.

Sim, eu sei: Rousseau nunca defendeu um regresso à selva. Mas as suas propostas transportam ainda o aroma selvático de um tempo em que o homem não precisava de "artifícios" (como portas opacas ou papel higiênico, imagino eu) para conhecer a felicidade pura.

Como relembra Byung-Chul Han, Rousseau tinha uma preferência por cidades pequenas, onde "cada um está sempre sob os olhos do público, o censor nato dos costumes dos outros" e onde "a polícia exerce uma vigilância fácil sobre todos".

Arrepiado, leitor? Não esteja. Se o banheiro transparente ainda é um exclusivo asiático, o Ocidente já cultiva há muito os seus próprios banheiros transparentes. Basta olhar para as "redes sociais", onde a maioria gosta de expor a intimidade com a mesma naturalidade com que um animal defeca no mato.

A esse respeito, recordo sempre um amigo que me dizia ter cortado relações com um cunhado porque ele publicara as fotos do filho bebê no Facebook. Fotos do bebê vestido, despido; brincando, dormindo, tomando banho; não sei se havia um penico no portfólio, mas você entende a ideia. O meu amigo considerava o gesto aberrante; o familiar discordava e, mais, nem percebia onde estava o erro.

O nosso mundo é o mundo sonhado por Rousseau. "A polícia exerce uma vigilância oficial sobre todos?" Afirmativo. Vivemos em democracia. Mas o Estado, pelos usos e abusos da tecnologia, sabe mais sobre os cidadãos do que em qualquer outra era histórica. Sabe quanto você ganha ou gasta; com quem vive, com quem fala; para onde viaja, onde fica; e, nas matérias mais íntimas, não é preciso uma polícia política. O cidadão revela voluntariamente o que sobra da sua existência.

Imagino um ex-agente da Pide portuguesa ou da KGB soviética a suspirar de nostalgia: "Tivemos tanto trabalho com vigilâncias, grampos, torturas –e agora tudo isso é grátis!"

Mas não é apenas o Estado que vive dentro do nosso banheiro transparente. "Cada um está sempre sob os olhos do público, o censor nato dos costumes dos outros"?

Afirmativo novamente. Como escreve Byung-Chul Han, a "sociedade da transparência" consegue a proeza de nos transformar em seres vigiados e vigilantes ao mesmo tempo. Não apenas por uma autoridade externa –um Big Brother clássico. Mas porque esse Big Brother, agora, somos nós.

"E qual é o problema?", pergunta o leitor que gosta de publicar fotos dos filhos no Facebook.

O problema é que a nossa civilização só existe pela recusa da transparência totalitária. "A arte é a natureza do homem", dizia Burke.

Traduzindo: aquilo que nos separa dos animais é o artifício, as convenções, até as repressões. É desse artifício que brota a arte, o conhecimento, a sedução, a paz possível.

E é também por causa dessa "cortina" que nos podemos retirar do mundo para dar descanso à vida: a vida que pensa, sente, imagina, planifica.

Rousseau escrevia que o luxo da civilização corrompia o homem.

A "sociedade da transparência" considera que a civilização já é um luxo. O futuro dos banheiros transparentes não terá nem civilização, nem luxo, nem homens.
Por: Joao Pereia Coutinho  Do site: http://www1.folha.uol.com.br/

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

PESSOAS IGNORANTES EM POLÍTICA DEVEM TER DIREITO DE VOTAR?

Vamos ser honestos? A democracia não é o melhor regime político. Você sabe disso. As maiorias, muitas vezes, elegem governos incompetentes, mentirosos, corruptos. Até autoritários. Devemos conceder o direito de voto a quem não tem inteligência suficiente para escolhas responsáveis?


O cientista político Jason Brennan defende que não. O livro, que provocou polêmica nos Estados Unidos, intitula-se "Against Democracy" ("contra a democracia"). Não é um panfleto populista contra o populismo circunstancial de Donald Trump. É um estudo acadêmico com toneladas de bibliografia científica.

Tese do dr. Brennan: em todas as pesquisas disponíveis, os eleitores americanos são comprovadamente ignorantes sobre os assuntos da República. Desconhecem coisas básicas, como identificar qual dos partidos controla o Congresso. Para usar a terminologia de Brennan, a maioria dos eleitores se divide em "hobbits" e "hooligans".
Binho Barreto/Editoria de Arte/Folhapress 

Os "hobbits" são apáticos, apedeutas, raramente votam –e, quando votam, votam com a cabeça vazia.

Os "hooligans" são o contrário: fanáticos, como os torcedores do futebol, defendendo os seus "clubes" de uma forma irracional, ou seja, tribal. É possível perguntar a um "hooligan" democrata se ele concorda com uma política de Bush e antecipar a resposta. (É contra, claro.)

E depois, quando o pesquisador comunica ao "hooligan" que a referida política, afinal, é de Obama, o "hooligan" muda de opinião; ou afasta-se; ou indigna-se. Como dizia T. S. Eliot sobre Henry James, a cabeça de um "hooligan" é tão dura que nenhuma ideia é capaz de violá-la.

O eleitor ideal, para Brennan, é um "vulcan": alguém que pensa cientificamente sobre os assuntos. Mas os "vulcans" são artigo raro. Em democracia, somos obrigados a suportar as escolhas de "hobbits" e "hooligans".

Felizmente, Jason Brennan tem uma solução: se as pessoas precisam de uma licença para dirigir, o mesmo deveria acontecer para votar. "Epistocracia", eis a proposta. O governo dos conhecedores. Antes de votar, é preciso provar.

Existem vários modelos de epistocracia. Dois exemplos: todos teriam direito a um voto e depois, com a progressão acadêmica, haveria votos extra; ou, em alternativa, só haveria votos para quem tivesse boa nota em exame de política. Faz sentido?

Não, leitor, não faz. Seria possível escrever várias páginas de jornal a desconstruir o livro de Jason Brennan. Por falta de espaço, concentro-me na sua falha básica: Brennan, um cientista político, não compreende a natureza da política.

Como um bom racionalista, Brennan acredita que os fatos políticos são neutros; consequentemente, as escolhas do eleitor podem ser "científicas".

Acontece que nunca são: a política, ao contrário da matemática ou da geometria, lida com a complexidade e a imperfeição da vida humana.

Um "exame" de política, por exemplo, dependeria sempre das preferências políticas dos examinadores –nas perguntas e na correção das respostas. Brennan até pode defender perguntas "factuais" para respostas "factuais". Mas a simples escolha de certos temas (mais economia) em prejuízo de outros (menos história) já é uma escolha política.

Além disso, acreditar que diplomas acadêmicos conferem a alguém um poder especial em política é desconhecer o papel que os "intelectuais" tiveram nos horrores do século 20.

Ou, para não irmos tão longe, é ignorar o estado de fanatismo ideológico que as universidades, hoje, produzem e promovem.

Por último, não contesto que a maioria desconhece informação política relevante. Mas as pessoas não precisam de um Ph.D. para votarem. Basta que vivam em sociedade. Que sintam na pele o estado dos serviços públicos. O dinheiro que sobra (ou não sobra) no final do mês. A segurança que sentem (ou não sentem) nos seus bairros, nas suas cidades, nos seus países. E etc. etc.

Como lembrava o filósofo Michael Oakeshott, não se combatem ditadores com a balança comercial. Tradução: a política não depende apenas de um conhecimento técnico; é preciso um conhecimento prático, tradicional, vivencial. O conhecimento que só a experiência garante.

A democracia pode não ser o regime ideal para seres humanos ideais. Infelizmente, eu não conheço seres humanos ideais. No dia em que Jason Brennan me mostrar onde eles vivem, eu prometo jogar a democracia no lixo.
Por: Joao Pereira Coutinho  Do site: http://www1.folha.uol.com.br/

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

CIVILIZAÇÃO ENTROU EM DECLÍNIO QUANDO SE ABOLIRAM OS DUELOS PÚBLICOS


Foi paixão à primeira vista. Falo de Nassim Nicholas Taleb, um dos maiores pensadores vivos. Finalmente, aqui estava alguém capaz de enfrentar a "ovelha negra" (ou, nas palavras do próprio, o "cisne negro") do otimismo racionalista.

Sim, podemos elaborar as mais perfeitas teorias sobre o mundo. Mas existe uma margem de "contingência" que escapa à razão humana –e, em muitos casos, determina o que somos e não somos.

Esta verdade, que era pacífica para os autores greco-latinos, deixou de o ser para o "autismo pós-iluminista ingênuo e pseudocientífico", como afirma Taleb. Resultado? Somos como Procusto, a figura mitológica que sequestrava os viajantes e tentava que eles encaixassem perfeitamente na sua cama. Os viajantes mais altos tinham as pernas cortadas. Os mais baixos eram esticados.
Editoria de Arte/Folhapress 

A obsessão de Procusto simboliza a nossa obsessão em adaptar a realidade aos nossos conceitos –e não ao contrário.

E se falo de Procusto é porque ele surge no título do livro de aforismos de Taleb, "The Bed of Procrustes" (a cama de Procusto). Porque Taleb, para além de tratados filosóficos sublimes como "Antifrágil", é também um aforista que podemos comparar aos melhores (La Bruyère, Pascal, Cioran etc.). Escolho dez aforismos –os meus dez, como quem se olha no espelho para conversar com uma alma gêmea.

Escreve Taleb: "Nunca se ganha uma discussão até começarem a atacar a nossa pessoa".

Comentário: Quando os meus críticos usam argumentos racionais, eu deprimo e medito onde falhei. Quando me insultam, sorrio com prazer e saboreio a vitória.

Escreve Taleb: "Pergunto-me se um inimigo ressentido ficaria com ciúmes se descobrisse que eu odiava outra pessoa".

Comentário: Não deixa de ser um mistério que a literatura seja pródiga em paixões não correspondidas –mas não em ódios não correspondidos.

Escreve Taleb: "Algumas pessoas só têm graça quando tentam ser sérias".

Comentário: Gosto de fazer análise política porque o material nunca desilude.

Escreve Taleb: "As pessoas concentram-se nos bons modelos; mas é mais eficaz encontrar antimodelos –pessoas com quem não nos queremos parecer quando crescermos".

Comentário: Uma educação civilizada não se faz por adição –mas por subtração.

Escreve Taleb: "Os homens destroem-se uns aos outros durante a guerra; e a si mesmos em tempo de paz".

Comentário: O instinto pela sobrevivência é um caso de psicologia invertida: quanto mais o mundo conspira para nos matar, mais intensamente desejamos viver. A estatística suporta a psicologia.

Escreve Taleb: "Nunca liberte ninguém de uma ilusão se não conseguir substituí-la por outra ilusão. (Mas não se esforce demasiado; a ilusão substituta nem precisa de ser mais convincente do que a inicial)".

Comentário: Todos conhecemos radicais de esquerda que se converteram à direita (o inverso é mais raro). "Conversão", aqui, é a palavra: há espíritos que não suportam a orfandade da religião ideológica.

Escreve Taleb: "Quando batemos fisicamente em alguém, fazemos exercício físico e descarregamos a tensão; quando o insultamos verbalmente na internet, só nos prejudicamos a nós próprios".

Comentário: A civilização entrou em declínio quando as sociedades aboliram os duelos públicos.

Escreve Taleb: "Para Sêneca, o sábio estoico devia abandonar os esforços públicos quando fosse ignorado ou quando o Estado fosse irremediavelmente corrupto. É mais sábio esperar pela autodestruição".

Comentário: O que é válido para os Estados também é válido para as pessoas. A violência da inação é a forma mais elegante de vingança.

Escreve Taleb: "Um dos problemas das redes sociais é que está a tornar-se cada vez mais difícil para os outros queixarem-se de nós nas nossas costas".

Comentário: "Gosto que me critiquem na cara", dizem pessoas sem maneiras ou imaginação. Prefiro não saber nem estar presente para não estragar a liberdade criativa de ninguém.

Escreve Taleb: "Existem homens que se rodeiam de mulheres (e procuram riqueza) para ostentação; outros fazem-no maioritariamente para consumo; raramente são os mesmos".

Comentário: Nunca tive particular apetência por mulheres-troféu. Sempre parti do pressuposto, provavelmente errado, de que eu próprio já era o troféu.
Por: Joao Pereira Coutinho  Do site: http://www1.folha.uol.com.br/

terça-feira, 8 de novembro de 2016

FRANÇA: A BOMBA-RELÓGIO DA ISLAMIZAÇÃO

O último grupo, definido como "Ultras", representa 28% dos entrevistados caracterizados como os de perfil mais autoritário. Eles afirmam preferir viver longe dos valores republicanos. Para eles, os valores islâmicos e a lei islâmica, ou seja, a sharia vem em primeiro lugar, antes mesmo da lei consuetudinária da República. Eles aprovam a poligamia e o uso da niqabe e da burca. 

"Estes 28% abraçam o Islã na sua versão mais retrógrada, que se tornou para eles uma espécie de identidade. O Islã é o esteio da sua revolta e essa revolta está incorporada em um Islã de ruptura, teorias da conspiração e antissemitismo" de acordo com Hamid el Karoui durante uma entrevista concedida ao Journal du Dimanche. 

Mais importante ainda é que estes 28% se encontram predominantemente entre os jovens (50% estão abaixo dos 25 anos de idade). Em outras palavras, um em cada dois jovens franceses muçulmanos é um salafista do tipo mais radical, ainda que não esteja filiado a uma mesquita. 

É inacreditável que as únicas ferramentas a nossa disposição são as inadequadas pesquisas de opinião. Sem conhecimento, nenhuma ação política — ou qualquer outra ação — será possível. É uma situação que beneficia, incomensuravelmente, os agressivos políticos islamistas. 

Cegueira deliberada é a mãe da guerra civil que está por vir − a não ser que o povo francês opte por sucumbir ao Islã sem esboçar nenhuma reação. 

Recentemente foram publicados na França dois estudos importantes sobre os muçulmanos franceses. O primeiro, com o título otimista: "É Possível um Islã Francês", foi publicado sob os auspícios do Institut Montaigne, um instituto francês, independente, interdisciplinar de estudos francês.

O segundo estudo, intitulado: "Trabalho, Empresa e Questão Religiosa", é a quarta análise conjunta que ocorre anualmente entre o Randstad Institute (uma empresa de recrutamento) e o Observatório da Experiência Religiosa no Trabalho Observatoire du fait religieux en entreprise, OFRE), uma empresa de pesquisa.

Os dois estudos preenchem uma enorme lacuna na esfera da demografia religiosa e étnica e foram amplamente divulgados na mídia. A França é um país que conta com bons demógrafos, estudiosos, professores e institutos de pesquisa, contudo, a coleta de dados oficiais ou estatísticas com base na raça, origem ou religião é proibida por lei.

A população da França é de 66,6 milhões de habitantes, de acordo com um relatório datado de 1º de janeiro de 2016 do Instituto Nacional de Estatística (Insee). No entanto, os questionários do censo proíbem qualquer pergunta sobre raça, origem ou religião. De modo que na França é impossível saber quantos muçulmanos, negros, brancos, católicos, árabes, judeus, etc. vivem no país.

A proibição está calcada em um antigo e saudável princípio que tem como objetivo evitar qualquer tipo de discriminação em um país onde a "assimilação" é o preceito. A assimilação, no estilo francês, significa que qualquer estrangeiro que queira viver no país deve seguir o código comportamental da população local e casar com um autóctone o mais rápido possível. Este modelo de assimilação funcionou perfeitamente para os descendentes de espanhóis, portugueses ou poloneses. Mas com os árabes e muçulmanos, não.

Agora, no entanto, apesar de todas as boas intenções, o preceito que proíbe a coleta de dados que possa levar à discriminação, se tornou um problema de segurança nacional.

Quando um grupo de pessoas, sem papas na língua, que agem com base na religião ou etnia, começam a combater de forma violenta os fundamentos da sociedade em que você vive, é necessário − na realidade urgente - saber que religiões e etnias são essas e quantas pessoas elas representam.

Consequentemente os dois estudos em questão não se baseiam em dados do censo e sim em pesquisas de opinião. O estudo realizado pelo Institut Montaigne, por exemplo, assinala que os muçulmanos representam 5,6% da população metropolitana da França, mais precisamente 3 milhões. No entanto, Michèle Tribalat, demógrafa, especializada em problemas de imigração, realçou que a marca dos 5 milhões já tinha sido ultrapassada por volta de 2014. O Pew Research Center estima que em meados de 2010 a população muçulmana da França era de 4,7 milhões. Outros estudiosos, como Azouz Begag, ex-ministro da igualdade (deixou o governo em 2007) estima que o número de muçulmanos na França gira em torno de 15 milhões.
Estudo do Institut Montaigne: A Secessão dos Muçulmanos Franceses

O estudo realizado pelo Institut Montaigne, divulgado em 18 de setembro, baseia-se em uma pesquisa conduzida pelo Ifop (Instituto Francês de Opinião Pública), que entrevistou 1.029 muçulmanos. O autor do estudo é o consultor Hakim el Karoui, ex-assessor do então primeiro-ministro Jean-Pierre Raffarin (de 2002 a 2005).

Foram destacados três principais perfis muçulmanos:

No topo encontra-se o assim chamado perfil "secular" (46%). Os indivíduos que se encaixam neste perfil afirmaram ser "totalmente seculares, mesmo quando a religião ocupa um lugar importante em suas vidas". Embora afirmem serem seculares, muitos pertencem ao grupo que é a favor do uso da hijab por todas as mulheres muçulmanas (58% dos homens e 70% das mulheres). Eles também se sobrepõem ao grupo (60%) que apoia o uso da hijab na escola, embora a hijab esteja proibida nas escolas desde 2004. Muitos destes "seculares" tambémpertencem a 70% dos muçulmanos que "sempre" consomem carne halal (somente 6% nunca a consomem). De acordo com o estudo, usar a hijab e comer somente carne halal são considerados, pelos próprios muçulmanos, "traços" significativos da identidade muçulmana.

O segundo grupo de muçulmanos, "Grupo Orgulho Islâmico", representa um quarto (25%) dos aproximadamente 1.000 entrevistados. Eles se definem acima de tudo como muçulmanos e reivindicam o direito de praticar sua religião (reduzida principalmente à hijab e alimentos halal) em público. No entanto, eles rejeitam a niqabe e a poligamia. Eles dizem respeitar o secularismo e as leis da República, mas a maioria diz não aceitar a proibição da hijab nas escolas.

O último grupo, definido como "Ultras", representa 28% dos entrevistados caracterizados como os de perfil mais autoritário. Eles afirmam preferir viver longe dos valores republicanos. Para eles, os valores islâmicos e a lei islâmica, ou seja, a sharia, vem em primeiro lugar, antes mesmo da lei consuetudinária da República. Eles aprovam a poligamia e o uso da niqabe e da burca.

"Estes 28% abraçam o Islã na sua versão mais retrógrada, que se tornou para eles uma espécie de identidade. O Islã é o esteio da sua revolta e essa revolta está incorporada em um Islã de ruptura, teorias da conspiração e antissemitismo" de acordo com Hamid el Karoui durante uma entrevista concedida ao Journal du Dimanche.

Hamid el Karoui, falando sobre as opiniões dos muçulmanos franceses em uma entrevista concedida ao Journal du Dimanche ressaltou: "estes 28% aderem ao Islã na sua versão mais retrógrada, que se tornou para eles uma espécie de identidade. O Islã é o esteio da sua revolta e essa revolta está incorporada em um Islã de ruptura, teorias da conspiração e antissemitismo." 

Mais importante ainda é que estes 28% se encontram predominantemente entre os jovens (50% estão abaixo dos 25 anos de idade). Em outras palavras, um em cada dois jovens franceses muçulmanos é um salafista do tipo mais radical, ainda que não esteja filiado a uma mesquita.

A pergunta é: quantos eles serão em cinco anos, dez anos, vinte anos? É importante perguntar porque as pesquisas sempre apontam para um determinado momento, o momento congelado de uma situação. Quando podemos observar que as restrições do véu e dos alimentos halal são impostas a toda a família pelos "big brothers", temos que nos conscientizar que há um processo em andamento, um processo de separação devido à re-islamização de toda a comunidade muçulmana pelos jovens.

A jornalista e autora Elisabeth Schemla assinalou no Le Figaro: para que se possa entender o significado da re-islamização é necessário que haja uma definição do islamismo. A definição mais precisa é dada por um de seus defensores mais fervorosos, o Conselheiro de Estado Thierry Tuot, um dos três juízes escolhidos neste verão para determinar a proibição ou não do uso do burquíni na praia (...). O islamismo, salienta ele, é a "declaração pública de um comportamento social apresentado como uma exigência divina que invade o cenário público e político." Em face desta definição, o relatório de Al Karoui mostra que o islamismo está inexoravelmente se espalhando.
O Islã em Atividade, o Islamismo em Movimento

Esta bomba-relógio está andando silenciosamente... funcionando.

Uma pesquisa de opinião, conduzida entre os meses de abril e junho de 2016 pelo Randstad Institute e pelo Observatory of the Religious Experience at Work (OFRE) Observatório da Experiência Religiosa no Trabalho, que entrevistou 1.405 executivos de diferentes empresas, revelou que de cada três executivos dois (65%) responderam que o "comportamento religioso" é uma manifestação normal no local de trabalho − um salto de 50% se comparado com 2015.

O professor Lyonel Honoré, diretor da OFRE e autor do estudo, reconhece de maneira discreta que "em 95% dos casos", o "comportamento religioso no trabalho está relacionado aos muçulmanos".

Para que se possa entender melhor a importância deste "Islã visível" presente nos escritórios e fábricas francesas nos dias de hoje, temos que levar em conta que, tradicionalmente, o local de trabalho era considerado espaço neutro. A lei não proíbe nenhum tipo de manifestação religiosa ou política no local de trabalho, mas segundo a praxe, tanto empregados quanto empregadores consideravam fundamental a discrição de todos no exercício de sua liberdade religiosa.

O estudo do Ranstad de 2016 mostra que a tradição acabou. Símbolos religiosos proliferam no local de trabalho e 95% dos símbolos visíveis são islâmicos. Expressões explícitas e símbolos do cristianismo e do judaísmo também estão presentes no local de trabalho, sem dúvida, mas são insignificantes se comparados com os do Islã.

O levantamento leva em consideração dois tipos de manifestações das convicções religiosas: 
Práticas pessoais, como por exemplo: direito de faltar ao trabalho nos feriados religiosos, horários de trabalho flexíveis, direito de rezar durante os intervalos do trabalho e direito de usar símbolos religiosos. 
Distúrbios durante o horário de trabalho ou quebra das normas, como a recusa dos homens de trabalharem com uma mulher ou obedecer ordens de uma executiva, recusa de trabalhar com pessoas que não são da mesma religião, recusa de executar tarefas específicas e proselitismo durante o horário de trabalho. 

"Em 2016", segundo o estudo, "o uso de símbolos religiosos (hijab) se transformou na expressão máxima da fé religiosa (21% dos casos, comparado com 17% em 2015 e 10% em 2014). Pedidos para se ausentar do trabalho por conta de feriados religiosos (18%) continua estável mas já ocupa o segundo lugar."

No item "perturbações no trabalho", este estudo politicamente correto observa que os conflitos entre empregados e empregadores por motivos religiosos são poucos: um "evento minoritário", "apenas" 9% dos distúrbios religiosos ocorridos em 2016. Mas apesar disso o número de conflitos aumentou cerca de 50%, se comparado aos 6% em 2015. Os conflitos também triplicaram desde 2014 (3%) e quase quintuplicaram desde 2013 (2%).

Eric Manca, advogado do escritório de advocacia August & Debouzy, especializado em legislação trabalhista, que participava de uma entrevista coletiva, assinalou que quando um conflito é em sua essência religioso e se transforma em litígio, "é invariavelmente um problema relacionado ao Islã. Cristãos e judeus nunca recorrem ao tribunal contra o seu empregador por motivos religiosos". Quando islamistas processam seus empregadores, a jurisprudência mostra que a acusação sempre se baseia em "racismo" e "discriminação" − acusações que, acima de tudo, só podem fazer com os empregadores lamentem tê-los contratado.

As raízes dos conflitos apresentados a seguir englobam o proselitismo (6%) e a recusa de executar tarefas (6%) — por exemplo: recusa do entregador entregar bebidas alcoólicas aos clientes, recusa de trabalhar com uma mulher ou sob a direção de uma mulher (5%) e solicitar trabalhar somente com muçulmanos (1%). Casos como os acima citados concentram-se em setores empresariais "como fornecedores de auto-peças, construção civil, tratamento de resíduos, supermercados... e estão localizados nas periferias das grandes cidades".
Conclusões

O modelo francês de assimilação está acabado. Conforme demonstrado, funciona para todos, menos para os muçulmanos franceses e, ao que tudo indica, as escolas públicas não têm mais condições de transmitir os valores republicanos, especialmente aos jovens muçulmanos. De acordo com Hakim el Karoui:


"Os muçulmanos franceses estão vivendo no olho do furacão com diversas crises ao mesmo tempo. A Síria, como não podia deixar de ser, é a que abala o espírito. Mas também a transformação das sociedades árabes, nas quais as mulheres estão assumindo um novo lugar: o número de estudantes do sexo feminino já ultrapassa o do sexo masculino, as meninas estão recebendo mais educação do que seus pais. A religião, em sua versão autoritária, é uma arma reacionária contra o processo de desenvolvimento. E finalmente, há a crise social: no caso dos muçulmanos, em que dois terços dos trabalhadores e empregados são menores de idade, são as primeiras vítimas da desindustrialização".

A islamização está se expandindo por todos os lados. Nos centros urbanos a maioria das mulheres árabes usa véu e nos bairros mais afastados, as burcas e os nicabes são cada vez mais comuns. No local de trabalho, onde o comportamento não religioso era normalmente a regra, os encarregados tentam aprender a lidar com as exigências islâmicas. Em grandes corporações, como a Orange (telecom), um "diretor de diversidade" foi encarregado de gerir as exigências e os conflitos. Nas pequenas empresas, os encarregados estão desnorteados. Conflitos e litígios estão se multiplicando.

O silêncio dos políticos. Apesar da ampla cobertura da mídia em relação a esses dois estudos, um impressionante silêncio foi a única coisa que se ouviu por parte dos políticos. Isto é muito preocupante, uma vez que também fazia parte do estudo realizado pelo Institut Montaigne algumas propostas para a edificação do "Islã da França", como por exemplo pôr um fim ao financiamento estrangeiro de mesquitas e a formação local de líderes civis e religiosos. Outras ideias, como lecionar árabe em escolas seculares "para evitar que os pais mandem seus filhos para escolas islâmicas" é muito estranho, porque isso iria perpetuar a estratégia fracassada de integrar o islamismo através das instituições. Jovens franceses muçulmanos, mesmo aqueles que nasceram na França, têm dificuldade em falar e escrever francês adequadamente. É por isso que eles precisam, antes da mais nada, falar e escrever francês corretamente.

Os dois estudos, embora sejam apenas um começo, são incrivelmente insatisfatórios. Políticos, jornalistas e todo cidadão precisa saber mais sobre o Islã, seus princípios e seus objetivos no país. É inacreditável que as únicas ferramentas a nossa disposição são as inadequadas pesquisas de opinião. Sem conhecimento, nenhuma ação política — ou qualquer outra ação — será possível. É uma situação que beneficia incomensuravelmente os agressivos políticos islamistas.

Sem mais conhecimento, a negação da islamização e a imobilidade em abordá-la fará com que ela avance. Cegueira deliberada é a mãe da guerra civil que está por vir − a não ser que o povo e os políticos optem por sucumbir ao Islã sem esboçar nenhuma reação.

Por: Yves Mamou, radicado na França, trabalhou por duas décadas como jornalista para o Le Monde. 13 de Outubro de 2016
Tradução: Joseph Skilnik Do site: https://pt.gatestoneinstitute.org
















segunda-feira, 7 de novembro de 2016

QUANTO MAIS O "ESTADO EMPREENDEDOR" FRACASSA , MAIS ADEPTOS ELE GANHA


Apesar de todos os exemplos práticos em contrário, quando iremos aprender?

Com a estrepitosa implosão de todos os recentes experimentos socialistas (Venezuela) e intervencionistas (Brasil e Argentina) na América Latina, restou apenas uma única bandeira a ser empunhada com algum vigor pela esquerda: o estado empreendedor.

O estado empreendedor seria aquele que faz parcerias com — e concede subsídios para — empresas e, com isso, se torna capaz de criar bens e serviços para a população.

Atualmente, a condutora intelectual deste movimento é a professora Mariana Mazzucato. Nascida em Roma a 16 de junho de 1968, mudou-se com os pais, quando ainda tinha 4 anos, para os EUA, país em que viveu quase toda a sua vida até o ano 2000. Atualmente, a doutora Mazzucato leciona "Economia da Inovação" na Universidade de Sussex, no Reino Unido.

Junto a Thomas Piketty e Paul Krugman, pode-se dizer que Mazzucato também já adquiriu um lugar cativo entre os "economistas estrelas" que defendem políticas governamentais intervencionistas, não importa o quanto estas já tenham se revelado desastrosas.

Mas, contrariamente a Piketty e Krugman, que fazem apenas repetir chavões e lugares-comuns, o argumento da professora Mazzucato é, convenhamos, um tanto provocador e original. Segundo suas pesquisas, o setor privado não deveria se queixar dos altos impostos que tem de pagar, e nem das travas regulatórias às quais tem de obedecer. Em vez de reclamar, as empresas e os consumidores deveriam, isso sim, agradecer ao governo, pois impostos e regulamentações são os principais impulsionadores da inovação e do crescimento.

Em seu livro O Estado Empreendedor, a autora se compromete a "demonstrar que o Estado não é um ente burocrático lento e pesado, mas sim a organização mais empreendedora do mercado, a qual assume os investimentos de maior risco."

Por este ponto de vista, quando o estado gasta o dinheiro dos pagadores de impostos com Pesquisa e Desenvolvimento, ele alcança descobertas científicas que o setor privado utilizará para fabricar novos produtos e serviços. Talvez sua frase mais provocadora seja a de que "sem o estado, o Google não existiria".

Mazzucato aplica a mesma lógica ao iPhone e a várias outras inovações que utilizamos no dia a dia, as quais, segundo ela, só existem por causa do estado, a quem deveríamos ser gratos por financiar pesquisas visando a descobertas — ao contrário dos empreendedores privados, que só pensam no lucro.

Esse raciocínio de Mazzucato pode até soar convincente à primeira vista, mas a pergunta inevitável é: não seria ele decorrente de uma análise apressada — para não dizer mal feita — em relação à sequência correta dos acontecimentos?

Para começar, a economista em momento algum se pergunta como o estado conseguiu o dinheiro para financiar pesquisas. Dado que o governo se financia ou por meio de impostos que confisca do setor privado ou por meio de endividamento (títulos públicos que vende ao setor privado), não estaríamos perante uma situação completamente oposta à apresentada por Mazzucato?

Pode ser que o Google só tenha surgido após todos os investimentos estatais feitos pela National Science Foundation (NSF — agência governamental americana que promove pesquisas em todos os campos da ciência e engenharia), mas a pergunta ainda permanece: quantas empresas privadas importantes tiveram necessariamente de existir antes para que o estado pudesse lhes cobrar impostos (ou tomar dinheiro emprestado) para assim poder financiar a criação da NSF?

Mais: a tese de Mazzucato simplesmente não consegue explicar processos fundamentais como a Revolução Industrial. Na época, o gasto estatal direcionado à Pesquisa e Desenvolvimento era praticamente inexistente. Com efeito, em 1930, o gasto estatal em P&D representava somente 14%de todo o gasto com P&D nos EUA (os outros 86% eram privados).

Essas constatações empíricas, por si sós, mostram que o setor privado, quando livre, não vê problema nenhum em assumir riscos e empreender, mesmo não havendo um governo que o subsidie.

Outro ponto completamente ignorado pela tese de Mazzucato é o famoso "custo de oportunidade". Dado que o governo tem de tomar dinheiro do setor privado para financiar pesquisas, então o setor privado inevitavelmente fica com menos recursos para que ele próprio faça pesquisa e desenvolvimento. E também com menos recursos que poderiam ser direcionados a melhores fins. Questão de lógica econômica.

Toda ação econômica carrega custos de oportunidade, e pode gerar consequências não-previstas. O investimento estatal feito com recursos extraídos do setor privado pode obstruir o desenvolvimento de outras áreas da economia, as quais agora, sem recursos suficientes (pois foram confiscados pelo estado), não mais terão como levar adiante seus projetos e inovações.

Apple e Google são os exemplos favoritos de Mazzucato. Segundo ela, sem o estado, tais empresas não existiriam. Além de todos os problemas de custos de oportunidades já citados acima, Mazzucato ignora que várias outras empresas também tiveram acesso ao mesmo investimento estatal em P&D utilizado por Google e Apple, mas nenhuma delas alcançou o êxito de ambas em termos de inovação tecnológica.

O êxito do iPhone, por exemplo, não se deve à tecnologia financiada pelo estado. Já havia outros dispositivos com as mesmas características do iPhone. O êxito do iPhone se deve a seu desenho e a seu sistema operacional. E este foi um desenvolvimento puramente interno, da empresa.

Exemplos práticos

Além de defender a tese de que o estado deve ser o maior responsável pelas pesquisas inovadoras nas áreas fundamentais da ciência e tecnologia, Mazzucato separa o que chama de invenções "ligeiras" — as produzidas pelo setor privado, como novos modelos de tablets — e inovações "grandes", de horizontes mais amplos, como as da área da saúde e mecanismos de "ciclo completo", como a Internet.

Ela afirma que as grandes inovações produzidas nos EUA foram todas financiadas e criadas pelo estado, como a Internet, o GPS (pelo Pentágono) e medicamentos (pelo Departamento de Saúde). E afirma que o setor privado tem "medo" de assumir riscos, o que não acontece com o estado. 

Mas vejamos algumas curiosidades.

A Internet, ou melhor, sua tataravó, foi de fato concebida em plena Guerra Fria por técnicos da NASA, mediante o ARPA (Advanced Research Projects Agency), mas só se expandiu e progrediu com o desenvolvimento da rede em ambiente mais livre, não militar — ou seja, privado —, em que não apenas os pesquisadores, mas também seus alunos e os amigos desses alunos, puderam ter acesso aos estudos já empreendidos e usaram sua inteligência e desenvolveram esforços para aperfeiçoá-los de uma forma fantástica. 

O mesmo processo se deu com a Internet propriamente dita: foram jovens da chamada "contracultura" — e não funcionários do estado —, ideologicamente defensores da difusão livre de informações, que realmente contribuíram decisivamente para a formação da Internet como hoje é conhecida.

Vinton Cerf foi o indivíduo que desenvolveu os protocolos TCP/IP, que são a espinha dorsal (a rede de transporte) da internet. Tim Berners-Lee merece os créditos pelos hyperlinks. Mas foi nos laboratórios da Xerox PARC, no Vale do Silício, na década de 1970, que a Ethernet foi desenvolvidapara conectar diferentes redes de computadores. 

Quanto ao GPS — e poucos sabem disso — foi uma ideia de uma estrela de Hollywood, a belíssima Hedy Lamarr, nome artístico de Hedwig Eva Maria Kiesler (1913-2000), nascida em Viena, estrela sexy de filmes como Idílio Perigoso (1944), Sansão e Dalila (1949), O Vale da ambição (1950) Meu Espião Favorito (1951), e A História da Humanidade (1957), entre muitos outros. Hedy criou a tecnologia básica para o Sistema de Posicionamento Global (GPS, na sigla em inglês) durante a II Guerra Mundial. 

Judaica de origem e horrorizada com o avanço nazista, queria ajudar os EUA e os aliados. Havia aprendido sobre radiocomunicação graças à convivência, ainda na Áustria, com o ex-marido, Fritz Mandl, um rico fabricante de armas e seus colegas engenheiros. E sua contribuição científica aconteceu quando já havia se divorciado de Mandl e fugido para os EUA.

Conforme relatado aqui, a famosa atriz inspirou-se no som do piano para bolar sua maior invenção: em 1940, conheceu o compositor George Antheil, também curioso por ciência. Certa noite, quando tocavam piano, ela se deu conta de que cada tecla emitia uma frequência de longo alcance diferente. E, assim como elas se alternavam rapidamente em uma música, talvez algo parecido pudesse ser aplicado aos espectros de comunicação militar. Aprimorada por Antheil, a análise de Lamarr originou o sistema "salto de frequência", no qual estações de radiocomunicação eram programadas para mudar de sinal 88 vezes seguidas (o mesmo total de teclas de um piano). Com isso, as forças inimigas teriam dificuldade em detectar esse registro alternado, que poderia ser então usado por navios e aviões, para orientar torpedos.

A dupla chegou a patentear a ideia e a ofereceu à Marinha dos EUA, mas foi rejeitada, sob o argumento de que seria demasiadamente cara (existe algo "caro" para governos)? A invenção perdeu — felizmente — exclusividade militar e se tornou a base de várias tecnologias atuais. Ela é aplicada, por exemplo, em satélites de orientação para meios de transporte civis — o famoso GPS (Global Position System) e também no wi-fi e no bluetooth.

E há mais.

Masaru Ibuka, um engenheiro, e Akio Morita, um físico, ambos japoneses, logo após a II Guerra Mundial, procuraram o Ministério da Indústria e Comércio do Japão em busca de recursos para desenvolverem suas ideias. Receberam um sonoro "não"! Resolveram, então, fundar a empresa Totsuko, em maio de 1946, em um grande armazém bombardeado pelos americanos, em Tóquio. A nova empresa não tinha qualquer maquinaria e possuía muito pouco equipamento científico e contava apenas com a inteligência, conhecimentos de engenharia e o espírito empreendedor de Ibuka e Morita. Trata-se, como o leitor já deve ter percebido, simplesmente, da Sony.

Como você poderá ver aqui e também aqui, graças ao espírito verdadeiramente empreendedor desses dois fantásticos homens, a Sony cresceu e hoje seu nome está associado a inovação, tecnologia avançada, qualidade e durabilidade. Ver televisão em uma Bravia, trabalhar em um laptop Vaio, tirar fotos com uma Cybershot, jogar Playstation, gravar com uma Handycam, ouvir música em um Walkman — essas são apenas algumas das "crias" tecnológicas de dois indivíduos, graças ao "não" recebido dos burocratas japoneses. 

Perguntemos à Professora Mazzucato se eles eram funcionários púbicos.

E o que dizer do próprio Steve Jobs, que revolucionou seis indústrias: computadores pessoais, filmes de animação, música, telefones, tablets e publicação digital? Era por acaso funcionário público? E Bill Gates e Paul Allen, criadores da Microsoft em 1975, em Albuquerque, no Novo México? Eram burocratas iluminados ou empreendedores que acreditaram em suas ideias e assumiram os riscos de colocá-las em prática?

Mais exemplos: Jorge Paulo Lehmann é um burocrata? E Alexandre Tadeu da Costa, fundador da Cacau Show? E Antônio Alberto Saraiva, criador da Habib´s? E Romero Rodrigues, da Buscapé Company? E Robinson Chiba, da China in Box? E Flavio Augusto da Silva, que, com apenas 23 anos, decidiu lançar um projeto inovador com o objetivo de, em 18 meses, dar fluência na língua inglesa a adultos, e que, para fundar sua empresa, a Wise Up, usou R$ 20 mil de seu cheque especial, com juros de 12% ao mês? 

Qual o papel exercido pelo estado em todos esses casos, a não ser o de recolher tributos para benefício próprio?

O BNDES nos trouxe algo de bom?

Em 2013, Mazzucato concedeu uma entrevista ao programa "Milênio", da Globonews. Elogiou o então governo brasileiro e o BNDES.

Compreensível. De certa forma, o BNDES faz aquilo que Mazzucato defende: financia, subsidia e participa das decisões de grandes empresas, tornando o estado um empreendedor.

E fazer do estado um empreendedor foi o exatamente o objetivo do BNDES fez na última década. O Tesouro se endividou emitindo títulos que pagam a SELIC e repassou esse dinheiro para o BNDES, o qual então emprestou esse dinheiro a grandes empresas cobrando juros abaixo de 5%, e em prazos que chegam a 30 anos.

Ou seja, utilizando dinheiro de impostos, o governo fez empréstimos subsidiados — e a condições artificialmente favoráveis — às grandes empresas escolhidas por ele. 

Estado empreendedor em sua melhor definição. Mazzucato, com razão, elogiou este arranjo.

Essa política de privilégios a grandes empresas ficou conhecida como a política das "campeãs nacionais", e tinha como objetivo criar empresas fortes e mundialmente competitivas em vários setores da economia: de empreiteiras a telefônicas, passando por frigoríficos, empresa de alimentos, de laticínios e de celulose.

Logo, a política de "campeãs nacionais" nada mais foi do que uma política industrial na qual o governo transferia renda da população para determinados setores ou empresas favorecidas, para que estas então pudessem se desenvolver com a ajuda do estado.

As consequências econômicas dessa política industrial do BNDES foram a explosão do endividamento do governo e a estagnação da economia (explicada em detalhes neste artigo). Já a consequência moral foi a Lava-Jato

E a ideia, em si, contou com o apoio de Mazzucato.

Conclusão

Criatividade só se converte em inovação quando o papel de descobrir as melhores oportunidades para as empresas cabe ao empreendedor, e não ao burocrata.

Mazzucato defende que governo trate o empreendedorismo como se este fosse algo relacionado a planejamentos estratégicos, quando, na verdade, é um processo de descobertas inovadoras.

E a competitividade de uma economia depende desse processo de descobertas.

A inovação e a criatividade são características intrínsecas do ser humano. E elas se desenvolvem com maior ímpeto naqueles países em que predomina a liberdade economia, a qual permite que as pessoas possam se arriscar e usufruir os benefícios de seus empreendimentos. A tese de que a intervenção estatal é a chave para que este processo se desenvolva não apenas atenta contra a lógica econômica, como também serve apenas como argumento para intensificar políticas intervencionistas, as quais sempre se comprovam nocivas para o desenvolvimento de longo prazo dos países.

Quem deve escolher os vencedores do mercado não são os burocratas do estado, como que Mazzucato, mas sim os milhões de consumidores.

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Iván Carrino é analista econômico da Fundación Libertad y Progreso na Argentina e possui mestrado em Economia Austriaca pela Universidad Rey Juan Carlos, de Madri.

Ubiratan Jorge Iorio é economista, Diretor Acadêmico do IMB e Professor Associado de Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Visite seu website.

Leandro Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.
Do site: http://www.mises.org.br/

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

O PARASITISMO SINDICAL É OUTRA PRAGA QUE TEM DE SER EXTINTA


Por causa da legislação, sindicatos se tornaram uma maneira legalizada de espoliar o trabalhador

Os sindicatos se dizem organizações preocupadas em promover os interesses dos trabalhadores. Quando destituída de toda a retórica marxista, tal afirmação não é de todo inverossímil: em alguns casos, os trabalhadores de fato possuem interesses em comum, cuja defesa pode ser delegada a um agente especializado (os sindicatos).

Por exemplo, dentro de uma mesma empresa, os empregados podem se coligar para melhorarmarginalmente suas condições de trabalho ou para influenciar em como serão cumpridos alguns dos direitos acordados em contrato com o empregador (calendário laboral, jornadas, forma de alimentação oferecida, turnos de descanso etc.).

No entanto, para resolver esses detalhes — que são de cunho estritamente localizado, peculiares a cada empresa e que variam para cada equipe de trabalho —, não é necessário recorrer a megacorporações sindicais, estilo CUT, Força Sindical e UGT. Basta ter representantes especializados e independentes, os quais, inclusive, podem ser escolhidos entre os próprios integrantes da equipe de trabalho que está sendo representada. Afinal, cada equipe de trabalho é algo muito bem definido, e não uma irreal "classe social".

O motivo de existirem megaburocracias sindicais — só a CUT controla 2.319 sindicatos, ao passo que a Força Sindical e a UGT controlam, respectivamente, 1.615 e 1.277 sindicatos — tem muito pouco a ver com a defesa dos trabalhadores e muito a ver com a necessidade de adquirir influência junto a políticos para arrebatar privilégios concedidos pelo estado.

Perante a casta governante, uma central sindical que represente, de maneira realmente eficaz, algumas poucas dezenas de trabalhadores não tem a mesma importância que outra central sindical que represente, mesmo que de maneira torpe, centenas de milhares de empregados. Vale mais a quantidade do que a qualidade.

O sindicalismo brasileiro

No Brasil, os grandes sindicatos já se converteram naquilo que a literatura econômica classifica como "rentistas" ou "caçadores de renda" (rent-seekers): seu verdadeiro propósito de existir não é representar os trabalhadores (essa é apenas sua desculpa instrumental), mas sim se beneficiar das prebendas regulatórias e monetárias garantidas pelo estado, com as quais alimentam sua própria burocracia interna.

O modelo de organização sindical vigente no Brasil tem raízes na Carta Constitucional de 1937, a qual tinha o objetivo explícito de fazer com que os sindicatos dessem sustentação ao governo, ignorando os interesses dos trabalhadores afiliados.

Esse arranjo se mantém intacto até hoje. Sindicatos servem aos interesses de seus líderes e do governo que os apóia, e não aos interesses de seus membros.

Sendo assim, a pergunta inevitável é: por que os sindicatos prosperam se seus líderes são meros politiqueiros?

E a resposta é: por causa dos privilégios que as entidades sindicais usufruem. Além de serem verdadeiros monopólios protegidos pelo estado, graças à unicidade sindical, eles são financiados compulsoriamente com dinheiro público, a chamada Contribuição Social Sindical — popularmente chamado de Imposto Sindical.

Vale ressaltar: embora ninguém seja obrigado a se filiar a um sindicato, todos os trabalhadores sãoobrigados a contribuir anualmente com o imposto sindical.

A lei estabelece uma contribuição obrigatória equivalente a um dia de trabalho de quem tem carteira assinada ao sindicato de sua categoria. Isto é, há o desconto em folha do trabalhador,mesmo que ele não seja filiado, tampouco se sinta representado por seu sindicato de classe.

Os valores movimentados pelo Imposto Sindical chegam a R$ 3 bilhões por ano. Trata-se de uma mamata para os sindicalistas. E, se há mamata, jamais faltará demanda por ela.

Consequentemente, apenas nos últimos oito anos, houve uma média de mais de 250 sindicatos criados por ano. Já há mais de 15 mil sindicatos operando no Brasil, com mais outros 2 mil esperando o registro

Por uma questão de lógica, não é difícil concluir que criar um sindicato se tornou um grande negócio. Hoje, sindicatos são criados visando apenas a arrecadar a "contribuição obrigatória".

As fraudes, obviamente, só se avolumam. Há desde entidades que são somente um meio para que dirigentes se perpetuem em cargos com altos salários até organizações fantasmas.

Trata-se de uma verdadeira caixa-preta, tendo em conta que, apesar de financiados com recursos públicos, não há qualquer prestação de contas e transparência. Por tudo isso, é comum os sindicatos brasileiros serem considerados irrelevantes.

O que fazer

Por causa desta renda compulsória e garantida, criada pelo estado, os sindicatos foram completamente desvirtuados: de representantes dos trabalhadores, se transformaram emcaçadores da renda destes mesmos trabalhadores

Na prática, são meros parasitas do dinheiro público. Criar um sindicato, hoje, é uma maneira legal de se enriquecer à custa dos mesmos trabalhadores que esses sindicalistas dizem defender.

Obviamente, não deveria ser assim. A questão é simples: o trabalhador não pode ter descontos em seu salário se ele não apóia a luta daquele sindicato. Mais: ele não pode ter descontos em seu salário se ele nem mesmo apóia a própria existência daquele sindicato.

Nesse sentido, um Projeto de Lei que visa tornar facultativa a contribuição dos empregados aos sindicatos foi recentemente apresentado pelo Deputado Federal Paulo Eduardo Martins (PSDB-PR). (Paulo é leitor do IMB e já foi duas vezes entrevistado para o nosso Podcast. Ver aqui e aqui). 

A ideia é que o empregado assine uma declaração manifestando se deseja ou não contribuir para o seu sindicato, podendo, é claro, reconsiderar sua decisão posteriormente.

O ordenamento jurídico brasileiro atual contraria a Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho, que prevê liberdade de escolher e contribuir para o sindicato que o trabalhador preferir. O fim do imposto sindical e o estabelecimento de doações voluntárias dos empregados aos sindicatos gerariam a necessidade de sindicalistas apresentarem um trabalho de fato representativo, a fim de justificar doações e conquistar mais filiados.

Trata-se de algo tão óbvio que nem sequer deveria ser mencionado: sindicatos e as centrais sindicais devem viver do dinheiro pago voluntariamente por seus associados, e não dos repasses compulsórios dos trabalhadores que não são filiados. 

Conclusão

Na prática, o comportamento dos sindicatos de hoje em nada se distingue do das máfias clássicas, com a diferença de que os sindicatos atuam com o apoio do governo. Cobram uma "contribuição compulsória" de todos os trabalhadores e visam apenas ao interesse de sua própria hierarquia.

Uma verdadeira defesa aos interesses dos trabalhadores está no fim da contribuição sindical, uma imposição legislativa que beneficia sindicalistas que não representam ninguém e prejudicam, principalmente, os trabalhadores mais pobres.

Se isso acontecer, veremos quão realmente demandados são os serviços sindicais. Enquanto isso não ocorre, continuamos com a dicotomia 'sindicalismo rico, trabalhador desesperado'.

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Juan Ramón Rallo, diretor do Instituto Juan de Mariana e professor associado de economia aplicada na Universidad Rey Juan Carlos, em Madri. É o autor do livro Los Errores de la Vieja Economía.

Luan Sperandio é graduando em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e coordenador estadual dos Estudantes pela Liberdade. Fez parte do Movimento Empresa Júnior e atualmente integra os Núcleos de estudo em Arbitragem e em Análise Econômica de Direito Civil da Ufes.

Leandro Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.
Do site: http://www.mises.org.br/