segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

COMO FUNCIONA O MERCADO DE CARTÕES

Como funciona o mercado de cartões de crédito e por que seus juros são os maiores de todos

E quais seriam os efeitos de se impor um teto aos juros do rotativo e encurtar os prazos de repasse

Você vai a uma churrascaria rodízio e, ao final, paga a conta com seu cartão de crédito. Para você, é um ótimo negócio. Você só irá efetivamente pagar esse banquete quando quitar a sua fatura.

Isso significa que você postergou o seu pagamento. Você, literalmente, 'comeu a crédito'.

Suponha que a sua fatura vença todo dia 2 de cada mês (como é o caso da minha). Qualquer coisa que você comprar a partir do dia 28 de um mês, você só irá pagar no dia 2 do outro mês sem ser o próximo. Ou seja, se você for a essa churrascaria no dia 28 de dezembro, só irá pagar a conta dela no dia 2 de fevereiro — isto é, dali a 36 dias.

Consequentemente, você poderá deixar esse dinheiro aplicado, rendendo juros, e só desembolsá-lo 36 dias após o almoço. Excelente.

Mas, como sempre, há o outro lado da história: se você só irá pagar a conta do almoço daqui a 36 dias, isso implica que o dono do estabelecimento demorará no mínimo 36 dias para receber seu dinheiro.

Os envolvidos

Quando você paga essa conta na churrascaria com seu cartão de crédito, há nada menos que 5 partes envolvidas na transação:

1) O consumidor: que é você, o portador do cartão de crédito.

2) O estabelecimento comercial: que é a churrascaria, que está aceitando o seu cartão de crédito como forma de pagamento.

3) O emissor: que é a instituição que emitiu o cartão de crédito. A esmagadora maioria dos cartões é emitida por bancos. Há alguns emitidos por redes varejistas. São os emissores, portanto, que decidem se você terá ou não um cartão de crédito e se as suas transações serão aprovadas. São eles também que definem os limites de crédito e as taxas cobradas. E são eles que emitem a fatura e cobram os juros em caso de inadimplência.

4) O credenciador: é a empresa que, como diz o nome, credencia os estabelecimentos que podem utilizar o cartão como meio de pagamento. Em termos populares, são os credenciadores que fornecem (na verdade, alugam) as maquininhas (terminais) em que você insere o seu cartão de crédito. Cielo, Rede e Getnet são as principais. Um credenciador também recebe o pomposo nome de "adquirente".

5) A bandeira: essa é a famosa "marca" do cartão. Visa, MasterCard, American Express e Diners são as mais conhecidas. Tais empresas fazem a ligação entre o emissor do cartão (banco) e o credenciador (a maquininha). É a bandeira quem intermedeia a transação entre o emissor e o credenciador. As bandeiras também estabelecem regras e ajudam a desenvolver o sistema.

Portanto, eis o que ocorre no nosso exemplo: após o almoço, você se dirige ao caixa e insere seu cartão de crédito na máquina. Ao digitar a senha, a máquina se comunica com o credenciador (Cielo, Rede ou Getnet), que então comunica a transação para a bandeira (Visa, Mastercard, American Express, Diners). A bandeira, por sua vez, direciona o valor para o emissor (o banco que emitiu o seu cartão).

Caso a transação seja aprovada pelo emissor — e tal decisão depende inteiramente do emissor —, essa decisão é comunicada de volta à bandeira, que então comunica o credenciador, que então permite que transação seja concluída pela máquina.

Pronto, você pagou o seu almoço a crédito. Mas você ainda não gastou dinheiro nenhum. E o dono do restaurante ainda não recebeu dinheiro nenhum.

O que irá ocorrer

Como dito, seu almoço na churrascaria só será efetivamente pago quando você quitar sua fatura do cartão de crédito, o que irá ocorrer, no nosso exemplo, dali a uns 30 dias.

Mas, mesmo assim, quando você quitar a fatura, o dono da churrascaria não receberá o valor integral.

Se a sua conta ficou em, suponhamos, R$ 100, o restaurante receberá aproximadamente R$ 95.

Isso significa que ele perde aproximadamente 5% do valor total. Por quê? Porque não há almoço grátis. Todas as partes envolvidas na transação cobram por seus serviços.

O primeiro a dar uma mordida é o emissor (banco). Ao repassar os R$ 100 para o credenciador, o emissor cobra um percentual por isso. Normalmente, algo entre 1,5% e 2%. Essa taxa é chamada de "tarifa de intercâmbio". Portanto, o emissor retém algo entre R$ 1,50 e R$ 2, e repassa para o credenciador algo entre R$ 98 e R$ 98,50.

Ato contínuo, é a vez de o credenciador dar a sua mordida. Por meio da "tarifa de desconto", que é um percentual cobrado sobre o valor da compra, o credenciador também cobra pelo seu serviço.

(Vale ressaltar que, além dessa mordida do credenciador, o dono do estabelecimento também tem de pagar para o credenciador um aluguel mensal para utilizar o terminal — a maquininha —, o qual pode chegar a R$ 150 por mês.)

Por fim, falta agora a bandeira. A bandeira dará a sua mordida por meio da tarifa de acesso, a qual é paga tanto por credenciador como pelo emissor, pelo privilégio de usar a "marca" do cartão. Sim, a bandeira cobra um valor para utilização de sua marca.

Portanto, ao fim e ao cabo, daqueles R$ 100 que você pagou, aproximadamente R$ 95 vão para o dono da churrascaria, algo entre R$ 1,50 e R$ 2 vão para o emissor, e algo entre R$ 3 e R$ 3,50 são divididos entre o credenciador (que também cobra um aluguel mensal do estabelecimento) e a bandeira.

Eis um organograma:

Implicações

Hoje, o emissor do cartão de crédito só repassa o dinheiro ao estabelecimento comercial (depois de pagar o pedágio à bandeira e ao credenciador) após o cliente ter quitado a sua fatura.

Isso significa que o emissor não precisa ir ao mercado financeiro tomar empréstimos para prontamente repassar o dinheiro ao credenciador (que então o repassa ao lojista); ele pode tranquilamente esperar o cliente quitar a sua fatura.

Agora, caso o emissor fosse obrigado por lei a repassar esse dinheiro dentro de um prazo de tempo menor — como vem aventando o governo —, ele teria de recorrer ao mercado financeiro para pegar dinheiro emprestado. 

Isso traz implicações óbvias.

Caso o emissor seja um grande banco, ele não terá dificuldade nenhuma em conseguir este financiamento de forma barata. Com efeito, ele pode nem precisar recorrer a financiamento: ele pode simplesmente usar seu capital próprio. Por outro lado, caso o emissor seja uma instituição financeira pequena, de baixo capital — como uma fintech —, sua situação pode se tornar insustentável.

Uma empresa pequena, com um capital pequeno, inevitavelmente terá de pagar juros muito altos para obter empréstimos recorrentes. Não há como ela concorrer com os grandes bancos neste mercado. 

Pior: mais emissores tendo de recorrer ao mercado de crédito para pegar dinheiro emprestado para então repassar esse dinheiro a credenciadoras (e daí para lojistas) não é exatamente uma medida propícia a uma redução de juros no mercado financeiro. No mínimo, mais demanda por crédito — de um segmento que até então pouco o utilizava — tende a elevar os juros, e não a reduzi-los, como almeja o governo.

Tal medida, portanto, embora seja boa à primeira vista (principalmente para os lojistas), pode não só levar a um aumento dos juros, como pode também levar a uma concentração ainda maior do mercado de emissores. Os pequenos emissores (fintechs) simplesmente não terão como concorrer em pé de igualdade com os grandes (bancos).

Aquela que aparentemente seria uma lei punitiva para os grandes bancos, pode acabar sendo ótima para eles: sua concorrência menos poderosa será a mais prejudicada.

Adicionalmente, alem do aumento geral dos juros de mercado, tal medida tende a gerar um aumento dos juros do rotativo do cartão de crédito.

É isso o que veremos.

Por que os juros do cartão de crédito são os maiores

Voltemos ao exemplo da churrascaria. A sua fatura foi de R$ 100. Mas suponha que você opte por pagar apenas o valor mínimo permitido, que equivale a 15% da fatura total. (Para simplificar, vamos supor que toda a fatura se resuma ao gasto na churrascaria).

Portanto, em vez de pagar a fatura inteira (R$ 100), você decidiu pagar apenas R$ 15.

Ao fazer isso — pagar menos que o total —, você está entrando no chamado crédito rotativo.

Na prática, isso significa que o emissor — o banco — está lhe fazendo um empréstimo de R$ 85.

Mas não se trata de um empréstimo qualquer. Esse é o tipo mais arriscado de empréstimo que um banco pode fazer.

Para começar, não se trata de um empréstimo para investimento. Não é um dinheiro que você está pegando para abrir um empreendimento. Não é um empréstimo que será usado por você para aumentar a sua renda futura (o que possibilitaria a quitação desse empréstimo).

Trata-se, na prática, de um empréstimo voltado para o consumo puro. E pior: um empréstimo sem nenhuma garantia. É o empréstimo menos seguro possível.

Normalmente, empréstimos voltados para o consumo são os mais caros do mercado exatamente porque eles não criam renda futura. Ao não criarem renda futura, eles não facilitam a sua quitação. Uma coisa é você pegar um empréstimo para empreender (o que possibilitará uma renda futura); outra coisa, bem diferente, é você pegar um empréstimo para viajar, pagar hotel, comprar uma roupa, um sapato ou para almoçar.

Mas mesmo entre os empréstimos voltados para o consumo há diferenças.

Por exemplo, um empréstimo utilizado para comprar um automóvel fornece uma garantia para o banco: na pior das hipóteses, ele pode arrestar o carro, vendê-lo e reaver uma parte do empréstimo.

Já um empréstimo feito pelo crédito consignado permite ao banco reter o dinheiro do tomador do empréstimo sempre que entrar algum dinheiro em sua conta.

Com efeito, mesmo o cheque especial fornece mais garantias que o rotativo. Na pior das hipóteses, o banco pode confiscar o dinheiro que eventualmente entrar na conta do inadimplente.

Já com o rotativo do cartão de crédito, porém, nada disso é possível. Não há nenhuma dessas garantias. O banco do indivíduo que entrou no rotativo não necessariamente é o mesmo banco emissor do cartão. Sendo assim, simplesmente não há acesso do banco emissor ao dinheiro do inadimplente.

Mas ainda piora.

Por absoluta falta de educação financeira, muitas pessoas utilizam o cartão de crédito porque estão sem dinheiro. "Ah, quero comprar uma roupa, mas estou sem dinheiro. Vou usar o cartão de crédito". E aí, quando a fatura chega, elas continuam sem dinheiro. E então acabam entrando no rotativo. E, uma vez no rotativo, vão empurrando com a barriga. 

Vale ressaltar essa obviedade: só entra no rotativo do cartão de crédito quem, por definição, não tem dinheiro para saldar a fatura. Por mais que isso possa soar ofensivo, essa é a realidade.

Ou seja, o rotativo é um crédito concedido a quem não tem renda para quitá-lo. É uma prática extremamente arriscada para o emprestador.

E, em caso de inadimplência, não há como os bancos reaverem esse dinheiro. Não há consignado, não há arresto de bens, não há penhoras, não há ativos que possam ser tomados para se saldar as contas. 

Trata-se, portanto, de um crédito concedido a quem não tem garantia nenhuma para oferecer em troca.

Não tem como os juros serem baixos em uma modalidade dessas. 

Como adendo, eis uma informação assustadora: em 2013, 77% da população brasileira tinha cartão de crédito. E 72% não sabia quanto pagava de juros no crédito rotativo. (Fonte

Ou seja, três em cada quatro brasileiros possuem um cartão de crédito, e quase todas essas pessoas não sabem quanto pagam de juros no rotativo. Ao passo que, em outros países, cartão de crédito é exclusividade de rico — o que acaba tornando bastante seletiva sua posse, influenciando para baixo os juros do rotativo —, no Brasil ele é algo popular. Assim, muitas pessoas de baixa renda utilizam seu cartão de crédito sem conhecer o mais básico sobre seu funcionamento, e quase sempre recorrem ao rotativo por estarem sem renda, empurrando os juros dessa modalidade para cima. 

É realmente de se estranhar que, sob todas essas condições, os juros dessa modalidade sejam estratosféricos?

Pior: se muitos entram no rotativo com os juros já astronômicos, imagina então se eles fossem baixos? 

E se o governo reduzisse o prazo?

Agora, apenas imagine o que ocorrerá com os juros do rotativo caso o governo imponha uma lei reduzindo para 2 dias o prazo máximo de repasse dos emissores para os lojistas?

No exemplo da churrascaria acima, em que você pagou apenas 15% da fatura, o emissor primeiro recebeu seus R$ 15 e só então viu que tinha de pegar emprestado o restante para repassar ao credenciador e à bandeira.

Ou seja, após receber seus R$ 15, o emissor terá de pegar emprestado mais R$ 83,50 (e não R$ 85, pois o emissor fica com 1,5% do valor total) para repassar ao credenciador e à bandeira.

Já com a nova lei, primeiro o emissor terá inevitavelmente de pegar emprestado R$ 98,50 para repassar ao credenciador e à bandeira. Não há alternativa. E então, só depois de 36 dias é que ele saberá se a fatura será paga integralmente por você ou se você decidiu entrar no rotativo.

Se a fatura for paga integralmente por você (R$ 100), o emissor poderá quitar o empréstimo de R$ 98,50 (mais juros) que ele fez no mercado financeiro. Já se você pagar apenas R$ 15 e entrar no rotativo, o emissor ainda ficará com um empréstimo de R$ 83,50 pendente, que já está acumulando juros há 36 dias, e o qual agora terá de ser seguidamente rolado.

Com esse arranjo, você acha que os juros que os emissores cobrarão no rotativo tendem a cair ou a subir?

A proposta de reduzir os juros do rotativo na marra

Que os juros do rotativo no Brasil são estratosféricos, isso é senso comum. Não é a intenção deste artigo dizer que os valores cobrados atualmente são economicamente sensatos. Mas também não há como dizer que eles estão totalmente errados. 

Por isso, é de causar espécie um projeto de lei do senador Lindbergh Farias (PT-RJ) que visa a limitar os juros do rotativo a duas vezes a taxa do Certificado de Depósito Interbancário (CDI). Na prática, o rotativo passaria a ser, no máximo, igual ao dobro da SELIC, que hoje está em 13,75% ao ano.

Caso isso prosperasse, o rotativo ficaria mais barato até mesmo que empréstimos para pequenas empresas.

Ou seja, se você estourasse seu cartão de crédito comprando roupas e sapatos, e entrasse no rotativo, você pagaria juros menores que empreendedores que estão expandindo seus negócios, adquirindo maquinários e contratando mão-de-obra.

Quero crer que tal proposta não será aprovada. Entretanto, não é nada impossível que uma proposta semelhante — apenas um pouco menos bizarra — venha eventualmente a ser aprovada em um futuro não muito distante.

Assim, o que ocorreria caso o governo estipulasse um teto aos juros do rotativo?

Essa é fácil. 

Dado que o rotativo deixaria de ser lucrativo para os emissores, a primeira coisa que ocorreria é que os estes iriam restringir ao máximo a concessão de novos cartões de crédito. Apenas pessoas com um ótimo histórico de crédito conseguiriam um. Adicionalmente, haveria uma restrição intensa sobre os cartões já existentes.

Pessoas que até então entravam frequentemente no rotativo e que possuíssem histórico ruim não mais teriam seus cartões validados nas máquinas. E vários outros cartões seriam cancelados por inadimplência. Não compensaria manter essas pessoas.

Mesmo o mais disciplinado dos pobres não conseguiria um cartão. Os pobres mais economicamente prudentes acabariam pagando pelo comportamento dos pobres mais economicamente destrambelhados. 

Obviamente, as anuidades subiriam. E muito.

Mas a coisa se expande. Com o cancelamento dos cartões, as bandeiras e os credenciadores deixariam de ganhar dinheiro com as taxas cobradas nas transações. Consequentemente, as tarifas aumentariam. E novas taxas seriam criadas. Os prudentes pagariam a conta. E os destrambelhados ficariam sem nada. 

No final, ter cartão de crédito voltaria a ser luxo dos ricos. 

Conclusão

Várias pessoas vibraram com o anúncio de que os emissores de cartão de crédito teriam um prazo de apenas dois dias para repassar o dinheiro aos lojistas. "Isso acabará com a farra dos bancos!", disseram os mais animados.

Aparentemente eles se esqueceram de os bancos nunca se dão mal em uma economia. Quem se estrepa sempre são os pequenos — no caso, as fintechs.

Tal lei, caso aprovada, seria ótima para os bancões, pois aniquilaria a incipiente concorrência representada pelas fintechs.

A medida também geraria um inevitável aumento dos juros tanto do rotativo quanto do mercado em geral.

Quanto à imposição de um teto para os juros do rotativo, os bancos até poderiam ser afetados, mas os mais pobres — principalmente os mais prudentes e frugais — seriam aqueles que seriam realmente prejudicados. Eles ficariam sem nenhum cartão de crédito.

Como este Instituto não se cansa de repetir, não existe mágica na economia. Leis econômicas não podem ser repelidas por decreto e por "vontade política". Se isso fosse possível, Cuba e Venezuela seriam potências.

Quer reduzir os juros do cartão? Comece reduzindo o peso e os gastos do estado. E então defenda uma moeda sólida e estável. Sem ambas as coisas, nada feito.

Impossível haver juros baixos se há um mamute sugando todo o crédito disponível para financiar suas despesas correntes e há uma moeda que perde poder de compra aceleradamente.

Inflação de preços na meta e teto de gastos: isso já seria um bom começo para reduzir os juros do rotativo.
Por: Leandro Roque Do site: http://www.mises.org.br/

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

AS DEZ LEIS FUNDAMENTAIS DA ECONOMIA


Sociedades que as respeitam e não tentam revogá-las enriquecem

Em meio a tantas falácias econômicas sendo repetidas de maneira aparentemente incessante pela mídia e pelos comentaristas, a função do economista intelectualmente honesto é desfazer essa cortina de fumaça para o público e reafirmar algumas das mais básicas leis da economia.

Este Instituto já apresentou uma lista extremamente sucinta das dez leis fundamentais da economia. Vários leitores pediram para que ela fosse aprofundada. Eis, portanto, as dez leis fundamentais da economia que sempre devem ser repetidas para jamais serem esquecidas.

1. A produção tem necessariamente de vir antes do consumo

Para consumir algo, esse algo deve antes existir. É impossível consumir algo que ainda não foi criado.

Embora essa seja uma constatação lógica e óbvia, ela é recorrentemente ignorada. A ideia de que o governo deve estimular o consumo da população para que isso então impulsione a produção e toda a economia é predominante na mídia e nos meios acadêmicos. Trata-se de uma perfeita inversão de causa e consequência.

Bens de consumo não simplesmente caem do céu. Bens de consumo são o resultado final de uma longa cadeia que envolve vários processos de produção interligados. Essa cadeia é chamada de "estrutura de produção".

Mesmo a produção de um item aparentemente simples, como um lápis ou um sanduíche, requer uma intrincada rede de processos produtivos que levam tempo para ser concluídos e que envolvem vários países e continentes.

Estimular o consumo, por definição, não pode gerar crescimento econômico.

2. O consumo é o objetivo final da produção

As pessoas produzem aquilo que outras pessoas querem consumir. Não faz sentido econômico produzir algo que ninguém irá consumir.

Por isso, o consumo é o objetivo de toda a atividade econômica. E a produção é o seu meio.

Defensores de políticas governamentais voltadas a "criar empregos" violam esta óbvia ideia. Programas voltados para a criação artificial de empregos transformam a produção no objetivo final, e não o consumo dessa produção. Criar empregos artificialmente significa estimular a produção de algo que não está sendo demandado voluntariamente pelos consumidores.

São os consumidores que atribuem valor aos bens de consumo final. Ao atribuírem valor aos bens de consumo, eles indiretamente também atribuem valor aos fatores de produção (mão-de-obra e maquinário) utilizados no processo de produção destes bens de consumo.


Ignorar as reais demandas do consumidor e querer criar empregos artificiais e processos de produção que não estão em linha com os desejos do consumidor é uma medida que tenta revogar toda essa realidade. Tal medida é economicamente destrutiva, pois imobiliza mão-de-obra e recursos escassos em atividades que não estão sendo demandadas pela população. Isso significa destruição de capital e de riqueza.

3. Nada é realmente gratuito; tudo tem custos

Não existe almoço grátis. Receber algo aparentemente gratuito significa apenas que há outra pessoa pagando por tudo.

Por trás de cada universidade pública, de serviços de saúde "gratuitos", de bolsas estudantis e de toda e qualquer forma de assistencialismo jaz o dinheiro de impostos de pessoas que trabalham e produzem.

Embora os pagadores de impostos saibam que é o governo quem confisca parte de sua renda, eles não sabem para quem para onde vai esse dinheiro. E embora os recebedores desse dinheiro e dos serviços custeados por esse dinheiro saibam que é o governo quem está por trás de tudo, eles não sabem de quem o governo tomou esse dinheiro.

4. O valor é subjetivo

A maneira como cada indivíduo atribui valor a um bem é subjetiva, e varia de acordo com a situação e com os gostos deste indivíduo. Um mesmo bem físico possui diferentes valores para diferentes pessoas.

A utilidade de cada bem é subjetiva, individual, situacional e marginal. Por isso, não pode haver algo como "consumo coletivo". Mesmo a temperatura de uma sala traz sensações distintas para cada pessoa ali presente. A mesma partida de futebol possui diferentes valores subjetivos para espectador, como é facilmente perceptível no momento que um dos times faz um gol.

5. É a produtividade o que determina os salários

A produção de um indivíduo durante um determinado período de tempo determina o quanto ele pode ganhar durante esse período de tempo.

Quanto mais esse indivíduo produzir um bem ou serviço voluntariamente demandado pelos consumidores em um determinado intervalo de tempo, maior poderá ser a sua remuneração.

Em um mercado de trabalho genuinamente livre, empresas contratarão mão-de-obra adicional sempre que a produtividade marginal de cada um desses trabalhadores for maior que o seu salário (custo). Em outras palavras, sempre que um trabalhador adicional for capaz de gerar mais receitas do que despesas, ele será contratado.

A concorrência entre as empresas irá elevar os salários até o ponto em que ele se equiparar à produtividade.

O poder dos sindicatos pode alterar a distribuição dos salários entre os diferentes grupos de trabalhadores, mas não pode elevar o valor total dos salários de todos esses trabalhadores. Estes dependem inteiramente da produtividade.

E o que aumenta a produtividade da mão-de-obra? Poupança, investimentos e acumulação de capital. Sem poupança não há investimento. E sem investimento não há acumulação de capital. Sem acumulação de capital não há maior produtividade. E sem mais produtividade não há aumento da renda.

6. Gastos representam, ao mesmo tempo, renda para uns e custo para outros

Keynesianos dizem que todo gasto gera renda. Eles apenas se esquecem de que todo gasto é também um custo. O gasto é um custo para o comprador e uma renda para o vendedor. A renda é igual ao custo.

O mecanismo do multiplicador de renda keynesiano diz que, quanto mais se gasta, mais se enriquece. Quanto mais todos gastam, mais ricos todos ficam. Tal lógica obviamente ignora os custos. O multiplicador fiscal, por definição, implica que os custos aumentam junto com a renda. Se a renda se multiplica, os custos também se multiplicam. O modelo do multiplicador keynesiano ignora esse efeito do custo.

Graves erros de política econômica ocorrem quando as políticas governamentais contabilizam os gastos públicos apenas pela ótica da renda, ignorando completamente o efeito dos custos.

Gastos, portanto, são custos. O multiplicador da renda implica a multiplicação dos custos.

7. Dinheiro não é riqueza

O valor do dinheiro consiste em seu poder de compra. O dinheiro serve como um instrumento para se efetuar trocas. Quanto maior o poder de compra do dinheiro, maior sua capacidade de efetuar trocas.

Mas o dinheiro, por si só, não é riqueza. É apenas um meio de troca. Riqueza é abundância de bens e serviços e bem-estar. A riqueza de um indivíduo está, portanto, em sua capacidade de ter acesso aos bens e serviços que ele deseja

O governo criar mais dinheiro não significa criar mais riqueza. Uma nação não pode aumentar sua riqueza ao aumentar a quantidade de dinheiro existente.

Robinson Crusoé não estaria um centavo mais rico caso encontrasse uma mina de ouro ou uma valise repleta de dinheiro em sua ilha isolada.

8. O trabalho, por si só, não cria valor

O trabalho, quando combinado com outros fatores de produção (matéria-prima, ferramentas e infraestrutura), cria produtos. Mas o valor desses produtos depende do quanto ele é útil para o consumidor.

A utilidade desse produto depende da valoração subjetiva feita por cada indivíduo (ver item 4). Por isso, criar empregos apenas para que haja mais empregos é algo economicamente insensato (ver item 2).

O que realmente importa é a criação de valor, e não o quão duro um indivíduo trabalha. Para ser útil, um produto ou serviço tem de gerar benefícios ao consumidor. O valor de um bem ou serviço não está diretamente ligado ao esforço necessário para produzi-lo.

Um homem pode gastar centenas de horas fazendo sorvetes de lama ou cavando buracos, mas se ninguém atribuir qualquer serventia a estes sorvetes de lama ou a estes buracos — e, portanto, não os valorizar o suficiente para pagar alguma coisa por eles —, tais produtos não terão nenhum valor, não obstante as centenas de horas gastas em sua fabricação.

9. O lucro é um bônus para o empreendedor

No capitalismo de livre concorrência, o lucro econômico é o bônus extra que uma empresa ganha por ter sabido alocar corretamente recursos escassos.

Em uma economia estacionária, na qual não ocorre nenhuma mudança, não haveria nem lucros nem prejuízos, e todas as empresas teriam a mesma taxa de retorno. Já em uma economia dinâmica e crescente, ocorrem mudanças diariamente nos desejos dos consumidores. E aqueles mais capazes de antecipar essas mudanças nos desejos dos consumidores e que souberem como direcionar recursos escassos — mão-de-obra, matéria-prima e bens de capital — para satisfazer esses consumidores irão colher os lucros econômicos.

Empreendedores capazes de antecipar as demandas futuras dos consumidores irão auferir as maiores taxas de lucro e irão crescer. Empreendedores que não tiverem essa capacidade de antecipar os desejos dos consumidores irão encolher até finalmente serem expulsos do mercado.

10. Todas as verdadeiras leis econômicas são puramente lógicas

As leis econômicas são aprioristas, o que significa que elas não precisam ser previamente verificadas e nem podem ser empiricamente falsificadas.

Ninguém pode falsificar tais leis empiricamente porque elas são verdadeiras em si mesmas. Como tal, as leis fundamentais da economia não requerem verificação empírica. Referências a fatos empíricos servem meramente como exemplos ilustrativos; elas não representam uma declaração de princípios. (Veja exemplos práticos aqui.)

É possível ignorar e violar as leis fundamentais da economia, mas não é possível alterá-las. Sociedades que entenderem e respeitarem essas 10 leis econômicas — sem tentar revogá-las — irão prosperar.
Por: Antony Mueller Do site: http://www.mises.org.br/


quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

COM A MORTE DE FIDEL, MUDA ALGUMA COISA EM CUBA?


Na festa dos 90 anos, Fidel já era um espectro de si mesmo.

Tudo naquela ilha sempre foi mistério, segredo de Estado, desde que se instalou o regime comunista até a causa mortis do maior genocida das Américas.

Finalmente, Fidel Castro morreu, aos 90 anos. Segundo anunciou em cadeia de rádio e televisão o ditador hereditário Raúl Castro, o falecimento se deu na noite do dia 25 de novembro e a partir das 06:00 horas do dia 26 até as 12:00 do dia 4 de dezembro Cuba entraria em Luto Nacional. Durante a vigência desse luto, proibiu-se qualquer atividade e espetáculo público, a rádio (sim, lá só há uma estação!) e a televisão foram obrigadas a manter uma programação “informativa, patriótica e histórica”. Até a saudação de “bom-dia”, “boa-tarde” e “boa-noite” foi suprimida dos noticiários por ser considerado “ofensa grave” diante do ilustre defunto.

Chamou fortemente minha atenção que o velório não tenha se dado com o defunto exposto no caixão como sempre ocorre com essas personalidades comunistas, mas o corpo foi cremado na manhãzinha do sábado só para familiares e depois as cinzas foram postas numa urna onde os escravos da ilha foram obrigados a visitar e chorar. Não havia livro de condolências. Cada cubano foi obrigado a fazer um juramento de dar continuidade ao projeto comunista implantado por Fidel ao descer da Sierra Maestra e depois assinavam um documento, para controle do G2.

Muita gente se questionou se essa morte de fato ocorreu na data citada, que “coincidia” com os 60 anos da partida do iate Granma do México para Cuba, onde tudo começou. Por que o corpo não foi apresentado aos visitantes? Seriam dele mesmo, as cinzas? Tudo naquela ilha sempre foi mistério, segredo de Estado, desde que se instalou o regime comunista até a causa mortis do maior genocida das Américas. TODAS as informações que saem na imprensa são manipuladas pela nomenklatura, de modo que não há meios de checar a veracidade do que dizem.

A imprensa internacional pró-Castro saiu alardeando que, com Raúl e sua “abertura econômica”, Cuba entraria num novo período mais flexível. Desinformação pura. Raúl sempre foi mais tirânico do que Fidel, chegando mesmo a ser considerado o “cérebro” por trás de todas as crueldades do regime. E foi o que se observou desde que Fidel passou o cetro, em 2006. A repressão recrudesceu absurdamente e a vida do cubano “a pé” não melhorou nada, apesar do reatamento das relações diplomáticas e comerciais com os Estados Unidos que, apesar disso, continuam sendo vistos como o maior inimigo dos cubanos.

Raúl anunciou que em 2018 vai deixar o poder e evidentemente vai passar o bastão para alguém da dinastia Castro. Há muitas especulações, porém, deve ser alguém que dê continuidade ao projeto revolucionário comunista do seu criador, agora definitivamente morto, Fidel.

Por ordem de proximidade familiar e importância temos: Alejandro Castro Espín, único filho homem de Raúl, com 51 anos, coronel do Ministério do Interior e conhecido como o temido responsável pelos serviços de inteligência e contra-inteligência. Quando da visita de Obama a Cuba, foi visto no Palácio da Revolução, meses depois de levar pessoalmente as estratégicas negociações com Vladimir Putin. Outras figuras cotadas são o neto Raúl Guillermo Rodríguez Castro e o ex-genro de Raúl, o poderoso general-de-brigada Luis Alberto Rodríguez López-Callejas.

Raulito, como é conhecido, é não só o neto favorito como seu assistente e principal guarda-costas, leva uma década junto a seu avô, quase como uma figura invisível. Outros apontam Miguel Díaz-Canel, primeiro vice-presidente do Conselho de Estado, 56 anos, que surpreendeu o mundo quando Raúl Castro decidiu colocá-lo à frente do governo, acima de seus velhos companheiros de Sierra Maestra. É o primero civil nascido na revolução capaz de herdar o poder em 2018 com uma carreira construída no seio do Partido Comunista.

Fidel Castro e Ernesto 'Che' Guevara: dois monstros abjetos deixaram o mundo melhor com suas ausências.

De todo modo, qualquer que seja o indicado tudo sinaliza a que nada vai mudar. Assim como não mudou com o afastamento de Fidel, nem com a abertura com os Estados Unidos. Fidel finalmente deixa este mundo com as carpideiras sinistras lembrando o seu “legado heróico”, mas o que deixa de fato este monstro é um rastro de sangue, dor e miséria em uma ilha paradisíaca que ele soube destruir e subjugar como se fosse o legítimo dono da vida e da morte de cada um dos infelizes 11 milhões de habitantes. Já foi tarde! A história não o absolverá!
(Para o jornal Inconfidência.)
Por: Graça Salgueiro, jornalista e psicóloga, é especialista em política latino-americana e autora do livro O Foro de São Paulo - A Mais Perigosa Organização Revolucionária das Américas. É colunista do Mídia Sem Máscara e apresenta o programa Observatório Latino, na Rádio Vox.Do site: http://www.midiasemmascara.org/

terça-feira, 3 de janeiro de 2017

PUTIN: "RÚSSIA NÃO TEM FRONTEIRA ALGUMA"


O pequeno Miroslav, de nove anos (na foto, com Putin), galardoado pela Sociedade de Geografia Russa pelo fato de decorar todos os limites dos países do mundo, foi levado ante o todo-poderoso presidente da Rússia, Vladimir Putin.

Este se pôs de cócoras ante o menino e diante de um auditório lhe perguntou onde acabavam as fronteiras da Rússia.

A criança se encheu de coragem e respondeu:

– A Rússia termina no Estreito de Bering, na fronteira com os Estados Unidos.

Putin apertou-a contra o peito e olhando para o publico corrigiu a criança modelo dizendo:

– As fronteiras da Rússia não terminam em parte alguma.

Na primeira fileira aplaudia o ministro de Defesa russo, Serguei Shoigu.

O fato deu-se recentemente e foi relatado pelo correspondente Xavier Colás do jornal “El Mundo” de Madri.

Enquanto o patriótico evento se desenvolvia em Moscou, a 1.092 quilômetros de distância, em Kaliningrado, enclave russo entre dois membros da OTAN (Lituânia e Polônia), os soldados de Putin montavam os sistemas de mísseis S-400 e Iskander, esses capazes de levar bombas atômicas.

O porta-voz do Kremlin Dimitri Peskov justificou a manobra dizendo que “a OTAN é um bloco agressivo”.

Na Polônia se diz que quando a Rússia fala em se defender, ela entende atacar. Quando se diz ameaçada é porque está montando a ofensiva. É a novilíngua soviética reciclada pelos atuais amos do Kremlin.

Estrategistas como o general Valeri Gerasimov, Comandante das Forças Armadas da Federação Russa, concluíram que a guerra contemporânea deve ser misturada com luta social, econômica e sobre tudo da informação.

A tecnologia de ponta da espionagem deve visar EUA.

E a Rússia mostrou sua habilidade para penetrar as estruturas cibernéticas de seu maior inimigo.

A infiltração das infraestruturas do adversário, a propaganda, os trolls, a ação psicológica sorrateira, a confusão e a cumplicidade de partes da sociedade civil do país vítima são armas da “guerra híbrida” que está em pleno andamento.

Da parte da Rússia, é claro.

No lado ocidental parece dominar a estratégia do avestruz: esconder a cabeça num buraco para não enxergar nada e achar que está tudo bom.

A Rússia “se prepara para uma guerra totalmente diferente da que imagina o Ocidente", diz o analista Gustav Gressel, do European Council of Foreign Relations. Ele detecta nos EUA “uma percepção do risco muito antiquada”.

“El Mundo” escolheu a sugestiva manchete: “Assim se prepara a Rússia para uma guerra com a Europa”.

Enquanto isso a União Europeia corrói os países que na teoria são seus membros mas na realidade são suas vítimas. A UE está deixando o continente inerme face ao enorme perigo que se prepara dentro das fronteiras da Rússia, que para o Kremlin, conforme afirmou Putin, são transitórias.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

QUEM É SUSTENTÁVEL?


Quem é sustentável? Brasil tem 62% de cobertura florestal, França apenas 31%, e Marrocos só 2% 

O Brasil possuía 519 milhões de hectares de cobertura florestal, em 2000, de acordo com dados do www.globalforestwatch.org. Isso representa 62% de cobertura florestal. Confira os dados abaixo:


Primária: nenhuma indicação visível de atividade humana ou distúrbio ecológico significativo;

Naturalmente regenerada: floresta naturalmente regenerada de espécies nativas, com indicações claras de atividades humanas;


Plantada: floresta estabelecida através do plantio.


Fonte: FAO, 2015.

O setor florestal contribuiu com US$ 22,5 bilhões à economia em 2011, que é aproximadamente 1,1% do PIB.

Além disso, 722 mil pessoas são diretamente empregadas pelo setor florestal, de acordo com dados de 2011 da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).

Em 2010, a taxa de reflorestamento foi de 519 kha/ano.

Comparação

França

A título de comparação, a França, que foi sede da Conferência do Clima de Paris, oficialmente conhecida como a 21ª Conferência das Partes (ou COP-21) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, possuía 31% de cobertura florestal no ano 2000 (17 milhões de hectares), como mostra a figura abaixo:




Marrocos

Já o Marrocos, sede da Conferência das Nações Unidas sobre o Clima desse ano (COP-22) possuía apenas 2% de cobertura florestal no ano 2000 (649 mil hectares), como mostra a figura abaixo:






Veja abaixo, uma comparação entre os três países:




Você pode acessar um mapa interativo com os dados de todos os países clicando na imagem abaixo:




Fonte: http://www.globalforestwatch.org, traduzida e adaptada pela Equipe BeefPoint.

domingo, 1 de janeiro de 2017

A CONFUSÃO DO VEGANISMO


Um dos grandes problemas ambientais é que as verdades se movem arrastando-se lentamente pela selva, enquanto as mentiras voam rápido pelo céu. Outro dos problemas é que, das boas intenções, podem-se tomar más decisões.

Por isso, dedico esse artigo a quem deixou de se alimentar com carne por compaixão ou solidariedade com os animais. Não o dirijo, então, a quem evita seu consumo por motivos nutricionais, filosóficos ou religiosos. Tampouco será apto para fanáticos, fundamentalistas ou para quem não duvida de suas crenças e opiniões. Não pretendo ferir ninguém.

Há pessoas que acham que, ao evitar o consumo de carne, não matam animais. Tenho uma péssima notícia para elas: isso não é verdade. O mais inocente prato de arroz ou um simples pedaço de pão também implica um impacto mortal para muitos animais. Que a gente não possa ver ou saber é outro assunto, mas a morte está presente de um modo inevitável.

Não existe o desenvolvimento humano com impacto ambiental zero: para que nós possamos viver, muitas formas de vida devem morrer. Essa afirmação é chocante, mas é uma das verdades mais óbvias da ecologia, que é a ciência que estuda as relações dos seres vivos entre si e com seu ambiente.


Vegetariano ou onívoro

Esclareço que fui vegetariano. Em minha adolescência, acreditava que era uma forma de evitar o sofrimento e a morte dos animais. Depois de alguns anos, voltei a ser onívoro. Explicarei os motivos, advertindo que não pretendo converter ninguém a nenhuma filosofia ou estilo de vida. Somente busco levantar informações, impressões e experiências para ajudar quem quiser revisar suas decisões alimentícias com implicações ambientais.

O que me fez mudar de opinião e de conduta? A constatação da realidade ambiental no terreno e, fundamentalmente, a comparação dos campos onde se produzem nossos alimentos. Por isso, proponho a vocês repetir o exercício. Visitem um campo de produção pecuária e outro de produção agrícola na mesma região e anotem a diversidade de formas de vida que veem em cada um deles. Esse exercício se pode fazer registrando somente a presença de aves, anfíbios, repteis, peixes, mamíferos, mariposas, fungos ou plantas, ou de todos esses grupos.

O resultado será inequívoco: um cultivo (soja, trigo, milho ou arroz, para citar os mais difundidos) não convivem com muito mais que si mesmo. Inclusive, acontece isso com a horta mais orgânica do mundo. As espécies animais não somente não são benvindas, mas também, nos cultivos não orgânicos (a maioria), são combatidas com biocidas ou agrotóxicos, quando não, tiros ou outras formas de luta para evitar a presença de predadores que causam danos ou perdas econômicas.

Uma das impressões mais contundentes foi o contraste entre a abundante vida silvestre dos estuários e córregos do nordeste argentino com as plantações de arroz vizinhas. Nessas últimas, não havia lugar para capivaras, veados do pântano, lontras, boas curiyú, garças, galeirões e patos.
Para cultivar arroz, os estuários, os córregos e os riachos são drenados para que se derive sua água e, muitas vezes, terminam secos ou mortos, sem vida. Como se empobrecem ou destroem esses ambientes naturais, muitos animais silvestres desamparados buscam refúgio ou comida nos cultivos que os estão substituindo. E assim se desata um segundo golpe. Para evitar que as aves ou mamíferos comam os grãos ou brotos, são espalhadas sementes envenenadas ou se trazem caçadores selvagens ou, ainda, são dados tiros de chumbo (também contaminante). Ninguém que saiba disso pode dizer que, por não comer carne e se alimentar com arroz, por exemplo, não se matam animais.

Claro, a morte é diferente, porque ocorre mais longe, de um modo difícil de ver e variada em sua forma (alterando o ambiente, envenenando ou disparando balas). Uma característica fundamental é que não se matam pontualmente os animais domésticos a consumir (para os que têm uma sensibilidade mais desenvolvida), mas sim, uma enorme quantidade de animais de uma grande diversidade de espécies silvestres: desde invertebrados até peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos. Esses impactos se tornam “invisíveis” à distância de uma grande cidade e, em consequência, são pouco emotivos. E o que não emociona, não é evocado.

Por desconhecimento, então, tem-se muito mais sensibilidade pelos animais domésticos que pelos silvestres (como se esses últimos tivessem menos direitos), quando o nível de preocupação deveria ser inverso. Diferentemente do que ocorre com as variedades domésticas, as espécies silvestres que se extinguem não têm reposição. Esse disparate tem um correlato coerente, ainda que irracional. Entre muitos vegetarianos e veganos, há dor ou lamento constante pela morte de animais domésticos (que vale a pena esclarecer, estão fora de perigo de extinção, porque são criados em grande escala) e um silêncio sepulcral diante da morte da variedade de indivíduos de espécies diferentes da fauna selvagem. Ou, o que é pior, diante do desaparecimento do ambiente em que convivem milhares de formas de vida, muitas vezes, de espécies ameaçadas.

Pecuária e agricultura

Por outro lado, com relação à pecuária, quando se pratica de um modo extensivo (ou seja, a campo), podem-se ver garças, rãs, cobras, peixes, gambás, raposas, gatos selvagens, doninhas, perdizes, fungos e muitas outras formas de vida entre os bovinos, os ovinos de lã ou cavalos. E se for realizada sobre pastos nativos, é possível a convivência até com espécies ameaçadas, como veados das pampas e tesoura-do-campo.

Porém, a pecuária vem cedendo terreno à agricultura. E, de fato, a expansão da fronteira agrícola (junto com a urbana) vem sendo há décadas a principal ameaça para a natureza argentina, dado que vão arrasando com nossos bosques, selvas, montes, savanas, estuários e pastos para substitui-los por campos de cultivo. Se a humanidade se tornasse vegana, para a natureza seria uma tragédia.

Está claro que, de uma forma ou de outra, a humanidade deve se alimentar e isso gera inevitavelmente um distúrbio na natureza, seja para substitui-la ou para intervir nela. E quando nossa população cresce com faz há séculos, de um modo irresponsável ou desentendido da capacidade de carga do planeta, a agricultura se transforma no mecanismo mais fácil para fornecer alimentos em grande escala e, em consequência, com grande impacto ambiental.

Já existem formas mais amigáveis de cultivar, mas não se praticam em grande escala e menos no contexto de crescimento populacional mundial.

Também existem formas menos sangrentas de matar os animais, mas quando se é sensível, até a eutanásia programada dói. O certo é que existem técnicas para aplicar uma “morte humanitária”, que é imediata, evitando maus-tratos, crueldade e agonia. Se aplicadas nos matadouros ou “criadouros”, poderia evitar os maus-tratos e a agonia que caracteriza muitos deles. Oxalá tivesse essa oportunidade os milhares de animais silvestres que morrem cotidianamente envenenados pelo uso de agroquímicos, gravemente feridos ou baleados por caçadores associados com a defesa dos cultivos ou os que ficam famintos e sem refúgio, porque seu ambiente foi arado.

Para evitar que se matem animais, a única solução é deixar de comer. Já vimos que qualquer dieta capaz de nos sustentar acarreta mais mortes do que imaginamos. Um dos grandes temas a resolver em escala mundial é como transformar a atual produção industrial de alimentos em um modelo compatível com a conservação dos espaços silvestres. Não somente praticando agricultura e pecuária sustentáveis, mas também, sendo mais humanitários com as demais formas de vida.

Esse caso exemplifica o quanto é difícil catalogar de “branco” ou “negro” um tema ambiental. A realidade tem abundantes tonalidades de “cinzas” e é mais complexa, à medida que nos aprofundamos nela. A princípio, parece ingrato fazê-lo porque – sem anestesia – destrói ideias utópicas próprias de um mundo ideal. Assim, concluiremos em escolher a opção menos ruim em lugar da melhor.

Nosso mundo real é imperfeito e não temos outro. É difícil mudar se nós não mudarmos. O historiador escocês, Thomas Carlyle (1795-1881) deixou uma reflexão oportuna para essa situação: “Que esta é uma época ruim? Pois bem, estamos aqui para torná-la melhor”. Se aceitarmos o desafio, torna-se inevitável parar e contrastar ideias e realidades para tomar decisões inteligentes e boas.
Por Claudio Bertonatti, museólogo, docente da Cátedra Unesco de Turismo Cultural, Escola Argentina de Naturalista e da Universidade do Museu Social Argentino. Conselheiro da Fundação Ambiente e Recursos Naturais (FARN) e assessor da Fundação de História Natural “Féliz de Azara”, para o Notícias Agropecuárias, traduzida pela Equipe BeefPoint.
Do site: http://www.beefpoint.com.br/

sábado, 31 de dezembro de 2016

SOCIEDADE IGUALITÁRIA - QUE DIABOS É ISSO?


A justiça, ao lado da liberdade e do desenvolvimento socioeconômico, são as principais vítimas do igualitarismo. 


Recentemente (eu continuo impressionado com o fato) uma turma de ministros do STF, argumentando em defesa do direito de abortar, alinhou o princípio da igualdade, que seria ferido gravemente pelo fato de que só a mulher engravida... A igualdade (justiça, para aqueles que impropriamente assemelham os dois conceitos) exigiria, em favor da mulher, o direito de abortar. A ideia do igualitarismo, da sociedade igualitária, está produzindo loucuras. É como se todas as diferenças, inclusive as determinadas pela natureza, devessem ser corrigidas, declaradas fora da lei, inconstitucionais, com vistas ao império final de um determinado conceito de Justiça.

Outro dia, lendo uma dessas revistas que se debruçam sobre as exuberantes prodigalidades do beautiful people, me vi diante da instransponível desigualdade entre o meu padrão de vida e o daqueles personagens. Dei-me conta, simultaneamente, de que bilhões de pessoas, se tivessem a possibilidade de olhar para mim – para mim! – experimentariam a mesma sensação. Armei-me de coragem e fui adiante nas divagações. Pensei em tantas habilidades notáveis, como as reveladas nas piruetas de um atleta olímpico, no escrutínio dos sentimentos humanos por um bom poeta, no arrebatador desempenho de um bom ator, na virtuosidade de um pianista consagrado (e fico por aqui porque a lista é inesgotável). Em todos sobram capacidades que não só me faltam como me fazem falta. Eu gostaria de tê-las! No entanto eu, o atleta, o ator, o bilionário, o virtuose e o poeta, somos iguais. "Iguais em quê?", perguntaria – carteiro de minhas próprias mensagens – ao Eterno Poeta. Iguais naquilo que mais conta e não nessas coisas de pouca monta, responderia Ele, porque os poetas, às vezes, dizem frases assim, irônicas, metafísicas, de pé-quebrado com a cadência mundana. Sim, muitos se desconcertam com a disparidade entre o deserto e a várzea, quer estejam na natureza ou nas habilidades do corpo e do espírito.

Ao criar com tão caprichosa variedade, Deus expressa desígnios que relutamos em aceitar. Diante da desigualdade, é comum, por exemplo, cairmos em uma ou outra de duas tentações. Na primeira, incorrem aqueles que sonham com essa ISO 9001 da qualidade humana, onde todos seriam perfeitos e haveria, pela engenharia genética e pela engenharia social, equânime provimento dos atributos que valorizamos, como beleza, saúde, inteligência, força. Várias utopias foram construídas sob essa inspiração, confundindo a igualdade de direitos e a igualdade perante a lei, com igualdade por força de lei. Levadas às vias de fato, redundaram em povos privados de seus bens e de sua liberdade, sob cruentos totalitarismos que beneficiaram suas elites políticas com os confortos da vida fácil. Na segunda tentação, incorrem aqueles que, revogando por conta própria o Mandamento do Amor, desconhecem a igual dignidade de todos os filhos de Deus, a solidariedade como virtude, e se deixam conduzir pelo egoísmo.

Uma ordem social justa nada tem a ver com sociedade igualitária. A justiça, ao lado da liberdade e do desenvolvimento socioeconômico, são as principais vítimas do igualitarismo. Embora seja apresentado como suposta virtude estatal, ele é mera arrogância política que afronta a Criação e o Plano de Deus.
Por: Percival Puggina   19 de dezembro 2016 
http://puggina.org  Do site: http://www.midiasemmascara.org/