segunda-feira, 6 de novembro de 2017

CHE GUEVARA É VENERADO PORQUE TEM SANGUE VERDADEIRO PARA MOSTRAR


Che Guevara morreu há 50 anos e ainda há quem lhe conceda o benefício da dúvida. Na semana passada, recebi um convite para um "debate" sobre Guevara e o seu legado. Pensei que era piada. Ainda perguntei: "Vocês querem saber se ele matou muito ou pouco?".

Ninguém riu. A ideia era mesmo "debater". Eu estaria entre os "críticos" (muito obrigado) e, do outro lado da mesa, estariam os apologistas. Recusei.

Aliás, quando o assunto são psicopatas, eu recuso sempre —uma questão de respeito pela minha própria sanidade. Nunca me passaria pela cabeça debater seriamente o Holocausto com um negacionista. Por que motivo o comunismo seria diferente? Escutar alguém a defender a União Soviética é tão grotesco como estar na presença de um neonazi a defender Hitler e o Terceiro Reich.

De igual forma, também nunca me passaria pela cabeça convencer terceiros sobre a monstruosidade do nazismo —ou a do comunismo. Como se ainda houvesse dúvidas.

Não há -e, no caso de Guevara, o próprio deixou amplos testemunhos a comprovar a sua excelência. O culto do ódio; a excitação do cheiro a sangue; a necessidade de um revolucionário ser uma "máquina de matar" -o Che não enganava.

E os fuzilamentos, que ele executou ou mandou executar, são ostentados pelo nosso Ernesto como se fossem medalhas na farda de um general. A criminalidade de Che Guevara não é questão de opinião. Isso seria um insulto ao próprio.

Mas há um ponto que me interessa sobre o Che: a sua sobrevivência como símbolo. Atenção: não falo de adolescentes retardados que desconhecem o verdadeiro Che e ostentam na camiseta o retrato que Alberto Korda lhe tirou. A adolescência é uma fase inimputável que, nos piores casos, pode durar uma vida inteira.

Não. Falo dos intelectuais que, conhecendo Che Guevara e o seu "curriculum vitae", o canonizam sem hesitar. O que leva pessoas inteligentes a aplaudir um criminoso?

O sociólogo Paul Hollander dá uma ajuda no seu "From Benito Mussolini to Hugo Chávez - Intellectuals and a Century of Political Hero Worship". O título, apesar de longo, é importante.

Em primeiro lugar, porque Hollander não discrimina entre "direita" ou "esquerda". O totalitarismo só tem um sentido —a sepultura.

Em segundo lugar, porque não é a natureza dos regimes que interessa ao sociólogo; é a devoção dos intelectuais pelos "heróis" revolucionários do século.

No caso de Che, existem explicações históricas —e psicológicas.

As históricas lidam com a Revolução Cubana de 1959, ou seja, três anos depois de Nikita Khrushchev ter denunciado os crimes do camarada Stálin.

A desilusão foi profunda —e, para a "nova esquerda", a União Soviética deixava de ser o farol da humanidade. Era apenas mais um estado opressor (como os Estados Unidos, claro) que atraiçoara a beleza do ideal marxista.

A partir da década de 1960, os "peregrinos políticos" (expressão de outro livro famoso de Hollander) passaram a ver o Terceiro Mundo —Cuba, China, Vietnã, Nicarágua— como o paladino virginal da libertação do homem. Fidel Castro e o seu ajudante Che Guevara ocuparam os papéis principais como "bons selvagens".

Mas existe um motivo suplementar para Che palpitar no peito dos intelectuais, escreve Hollander: o fato de ele não ser um intelectual "defeituoso".

Uma história ajuda a compreender o adjetivo: em 1960, Sartre visitou Cuba e comoveu-se com as confissões de Fidel. "Nunca suportei a injustiça", disse o Comandante. Sartre concluiu que Fidel entendeu como ninguém "a inanidade das palavras".

Tradução: não basta falar contra o imperialismo/capitalismo/colonialismo; é preciso agir. Che Guevara, que Sartre batizou como "o mais completo ser humano do nosso tempo", simboliza essa totalidade. Alguém que não se fica pelas palavras —e passa aos atos. Che Guevara é venerado porque tem sangue verdadeiro para mostrar.

É um erro afirmar que os "intelectuais revolucionários" que admiram Che Guevara continuam a prestar-lhe homenagem apesar da violência e do crime. Pelo contrário: a violência e o crime estão no centro dessa homenagem.
Che sobrevive porque foi capaz de ser o "anjo exterminador" que todos eles sonharam e não conseguiram. 
Por: João Pereira Coutinho Escritor português, é doutor em ciência política. Do site: http://www1.folha.uol.com.br   Angelo Abu/Folhapress 

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

COMO É BOM VIVER NA SUÍÇA!

A CPI do Senado brasileiro concluiu: a Previdência não tem déficit, e sim superávit. Concluiu também que nós somos mais ricos que os suecos, que nunca houve corrupção no país e que, com a vitória na Copa de 2014, o Brasil é o único hexacampeão mundial.

É fácil nos enganar quando queremos ser enganados. Isso não é novidade. Eu já tinha alertado aqui sobre o uso disso pelos políticos antes das eleições de 2014. No ano que vem, com o justificadíssimo desejo de renovação política que toma conta do país, as propostas de soluções simplistas de falsos salvadores da pátria vão bater recordes.

Pensando bem, não será fácil bater o recorde desta CPI. Temos os senadores mais geniais do mundo! Pode haver forma melhor de resolver um problema do que decretar que ele não existe?!

A CPI concluiu que não só não há déficit, como o teto dos benefícios do INSS pode ser elevado em quase 70%, dos atuais R$ 5.531 para R$ 9.370. O número de aposentados cresce mais de 3% a.a. devido ao envelhecimento da população? Irrelevante. O Brasil já gasta mais com aposentados do que a Alemanha e o Japão, que têm proporcionalmente o triplo de idosos do que nós? Quem se importa?

A contabilidade criativa da CPI faz as pedaladas fiscais da Dilma parecerem fichinha. Segundo ela, os números que importam não são os da Previdência, mas os da Seguridade Social, que engloba Previdência, Saúde e Assistência Social. Quer dizer que somando os três temos superávit? Não. No ano passado, só no âmbito federal tivemos um déficit de R$ 257 bilhões, sem nem contar um déficit adicional de cerca de R$ 100 bilhões em estados e municípios.
É fácil nos enganar quando queremos ser enganados. Isso não é novidade. 

Qual a mágica da CPI, então? Comece desconsiderando o déficit de R$ 77 bilhões da Previdência dos servidores da União, embora seja coberto pelos mesmos impostos que cobrem o rombo do INSS. Em seguida, desconsidere as desvinculações de receitas da Seguridade – que, entre outras coisas, tiram recursos da Saúde para bancar o déficit da Previdência. Por fim, faça de conta que os benefícios podem ser pagos com recursos que nunca foram arrecadados, como as receitas das desonerações sociais e a sonegação de mais de R$ 400 bilhões que o INSS tem a receber, mas que nunca receberá integralmente porque a maior parte é de empresas que nem existem mais, como Varig, Transbrasil e Vasp, para citar só o setor aéreo.

Fazendo tudo isso, a Seguridade Social é superavitária? Ainda não. Segundo a própria CPI, mesmo com esta contabilidade de araque, a Seguridade Social teve um déficit de R$ 57 bilhões no ano passado.É fácil nos enganar quando queremos ser enganados. Isto não é novidade. 

Aí, a CPI dá o golpe final. Apesar do resultado desta contabilidade maluca piorar todo ano desde 2013 - ainda antes da recessão começar - os números vão melhorar significativamente a partir deste ano, eliminando o déficit. A mágica? Crescimento econômico acelerado que vai inflar as receitas acima do crescimento das despesas.

Em resumo, a CPI, presidida por Paulo Paim (PT) e relatada por Hélio José (PROS), está convencida de que, por conta das reformas de Temer e seu governo, o Brasil vai começar a crescer mais rapidamente do que a China.

É muito bom viver aqui na Suíça! Melhor que isto, só ser senador no Brasil.

Por: Ricardo Amorim, autor do bestseller Depois da Tempestade, apresentador do Manhattan Connection da Globonews, o economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes, o brasileiro mais influente no LinkedIn, único brasileiro entre os melhores palestrantes mundiais do Speakers Corner e ganhador do prêmio Os + Admirados da Imprensa de Economia, Negócios e Finanças. Do site: https://www.linkedin.com

sábado, 28 de outubro de 2017

O MULTICULTURALISMO ESTÁ DIVIDINDO O OCIDENTE

- O multiculturalismo está gerando a "partilha", a ruptura das sociedades europeias. – Alexandre Mendel, autor do novo livro Partilha: Crônica da Secessão Islamista na França.


- À luz do multiculturalismo europeu, as mulheres muçulmanas perderam inúmeros direitos que deveriam ter na Europa. O multiculturalismo está, a bem da verdade, calcado na legalização de uma sociedade paralela, fundamentada na sharia, que se baseia na rejeição dos valores ocidentais, acima de tudo no tocante à igualdade e à liberdade.

- O establishment europeu fechou os olhos enquanto os supremacistas muçulmanos violavam os direitos de seu próprio povo.
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As estatísticas oficiais da União Europeia sobre o terrorismo são impressionantes:

"Em 2016 foram registrados um total de 142 ataques terroristas, entre fracassados, frustrados e finalizados em oito Estados Membros da UE. Mais da metade (76) deles foram registrados pelo Reino Unido. A França registrou 23, Itália 17, Espanha 10, Grécia 6, Alemanha 5, Bélgica 4 e Holanda 1. Nos ataques morreram 142 pessoas e 379 ficaram feridas na UE. No mesmo ano 1.002 pessoas foram presas por crimes relacionados ao terrorismo".

Todos esses países procuraram integrar as comunidades muçulmanas e todos se viram num beco sem saída. "Enquanto este estado de coisas continuar, o fracasso da integração representará uma ameaça letal para a Europa", salientou o Wall Street Journal na esteira de um atentado suicida que matou 22 pessoas em Manchester. Segundo o novo livro Partition: Chronique de la sécession islamiste en France ("Partilha: Crônica da Secessão Islamista na França") de autoria do repórter francês Alexandre Mendel, o multiculturalismo está gerando rupturas nas sociedades europeias.

Essa conjuntura também está criando infindáveis ondas de ataques terroristas. Em agosto passado, em um único dia, os islamistas assassinaram 20 europeus em Barcelona e na Finlândia. Um mês depois eles massacraram duas meninas em Marselha e em Birmingham um menino xiita foi espancado com requintes de crueldade. Esses são os frutos fatais do multiculturalismo da Europa. É a ideologia europeia mais romântica e sedutora desde o comunismo.

Há uma "cadeia cada vez mais constante de 'comunidades suspensas' aninhadas dentro das nações ocidentais", salientou recentemente o historiador americano Andrew Michta .

"O surgimento desses enclaves, reforçado pelas políticas da elite do multiculturalismo, políticas de identidade de grupos e a desconstrução da tradição ocidental, contribuíram para a ruptura das nações da Europa Ocidental".

Apenas vinte minutos separam Marais, o elegante bairro de Paris, onde estava localizada a redação da revista Charlie Hebdo e Gennevilliers, um subúrbio que abriga 10 mil muçulmanos, onde os irmãos Kouachi, que assassinaram a tiros os cartunistas da Charlie Hebdo, nasceram e foram criados. Em Birmingham há um subúrbio chamado Sparkbrook, de onde sai um décimo dos jihadistas da Inglaterra. Todas as cidades de maior importância da Europa abrigam enclaves onde proliferam o apartheid islâmico.

Lá burcas e barbas têm um significado. A maneira de se vestir sempre simbolizou lealdade a um estilo de vida, uma civilização. Quando Mustafa Kemal Atatürk aboliu o califado na Turquia, ele proibiu que os homens deixassem crescer as barbas e que as mulheres usassem véus. A proliferação de símbolos islâmicos nos guetos da Europa demarcam a separação desses subúrbios. O novo líder do Partido da Independência do Reino Unido (UKIP), Henry Bolton, disse recentemente que a Grã-Bretanha encontra-se "enterrada" pelo Islã e "inundada" pelo multiculturalismo.



(Imagem: Yann Caradec, Coco0612/Wikimedia Commons)


De acordo com o ex-arcebispo de Canterbury, Lord Carey of Clifton o "multiculturalismo", "desencadeou assassinatos em nome da honra, circuncisão genital feminina e o estabelecimento da Lei Islâmica (Sharia) em bolsões das cidades em todo o Reino Unido". À luz do multiculturalismo europeu, as mulheres muçulmanas perderam inúmeros direitos que deveriam ter na Europa. Elas se defrontam com "crimes em nome da honra" por se recusarem a usar o véu islâmico, por se vestirem com roupas ocidentais, por se encontrarem com amigos cristãos, por se converterem para uma outra religião, por pedirem o divórcio, por se recusarem a serem espancadas e por serem demasiadamente "independentes".

É uma das grandes ironias do multiculturalismo: cinco membros europeus da OTAN estão lutando no Afeganistão contra os talibãs que escravizam as mulheres, ao mesmo tempo em que elas são escravizadas em nossos próprios guetos na Europa.

Sob o regime do multiculturalismo, a poligamia avançou juntamente com a mutilação genital feminina (500 mil casos em toda a Europa). O multiculturalismo está, a bem da verdade, calcado na legalização de uma sociedade paralela, fundamentada na sharia, que se baseia na rejeição dos valores ocidentais, acima de tudo no tocante à igualdade e à liberdade.

Além disso, o medo de "ofender" as minorias islâmicas acabou criando uma espécie de cegueira autoimposta. Foi o que aconteceu em Rotherham, uma cidade de 117 mil habitantes situada no norte da Inglaterra, onde o estupro em massa e o aliciamento de pelo menos 1.400 crianças por "gangues de estupradores de origem paquistanesa" correu solto por anos a fio.

Sob o multiculturalismo, o antissemitismo também disparou, principalmente na França. O semanário francês L'Express acaba de dedicar uma edição especial exclusiva ao "novo mal-estar dos judeus franceses".

Todos os recentes terremotos políticos ocorridos na Europa representam as consequências do fracasso do multiculturalismo. Conforme salienta o historiador britânico Niall Ferguson: a principal razão da vitória do Brexit foi a imigração.

"Muitos no Reino Unido olhavam para a crise dos refugiados na Europa e pensavam: se eles adquirirem um passaporte alemão, virão para a Grã-Bretanha e não teremos condições de fazer nada para detê-los. Esta foi a motivação central dos votantes e, legitimamente, porque os alemães abriram as portas a um enorme influxo do mundo muçulmano. Visto a partir do Reino Unido, a reação foi: pera aí, e se eles vierem para cá?"

Na Holanda, a ascensão de Geert Wilders é a consequência direta do assassinato do cineasta Theo van Gogh por um islamista holandês e a reação ao multiculturalismo que se seguiu. Na França, a ascensão política de Marine Le Pen coincidiu com dois anos de ataques terroristas de grandes proporções nos quais 230 cidadãos franceses foram assassinados.

Além disso, o extraordinário sucesso do partido Alternativa para a Alemanha (AfD) nas recentes eleições gerais é consequência da decisão fatal da chanceler Angela Merkel de abrir as portas para mais de um milhão de refugiados e migrantes. Beatrix von Storch, uma das líderes do AfD, ressaltou à BBC que "não há lugar para o Islã na Alemanha". Ela explicou que uma coisa é permitir que os muçulmanos pratiquem a fé islâmica em recintos fechados, outra é acomodar o Islã político, que almeja mudar a democracia e a sociedade alemã.

O establishment europeu fechou os olhos enquanto os supremacistas muçulmanos violavam os direitos de seu próprio povo. Muitos islamistas então bateram às portas da Europa cada vez com mais determinação. O multiculturalismo mata e desestabiliza a Europa somente como o nazismo e o comunismo foram capazes fazê-lo.
Por: Giulio Meotti, Editor Cultural do diário Il Foglio, é jornalista e escritor italiano.
Tradução: Joseph Skilnik  Do site: https://pt.gatestoneinstitute.org

terça-feira, 24 de outubro de 2017

PADRE PAULO RICARDO DENUNCIA A IDEOLOGIA DE GÊNERO NA CÂMARA DOS DEPUTADOS

IMPORTAÇÃO DE BESTEIRA


O grande escritor britânico G. K. Chesterton, comentando o que passa por moralidade nos Estados Unidos, afirmou, com razão, que o que lá faz suas vezes na verdade não é um padrão de certo e errado, mas sua substituição por alguns gostos e desgostos paroquiais. E é verdade. Isto se deve, antes de mais nada, à acomodação de um padrão de (pseudo)moralidade kantiana em uma matriz de pensamento dualista de base calvinista com que se formou aquele estranho território tão pobre espiritualmente quanto cheio de riqueza material. Do calvinismo veio a certeza de que as pessoas são monstruosas ou santas, salvas ou perdidas, vencedoras ou perdedoras, sem meios-termos e sem possibilidade de conversão ou perversão de um ou de outro. Da moral kantiana, a substituição de um sistema moral verdadeiro por um par de listinhas de coisas proibidas e de coisas obrigatórias. Evidentemente, é pela adesão comportamental às listinhas de imperativos morais categóricos que se pode reconhecer os mocinhos e os vilões. E, mais evidentemente ainda, quando a listinha do próximo não for igual àquela que usamos, o próximo é vilão para nós e nós somos vilões para ele.

Isso é especialmente claro na política americana, em que a divisão entre a esquerda e a direita vem se aprofundando, com cada vez menos pontos em comum nas listinhas pseudomorais dos dois partidos opostos. Como o que lhes falta em civilização sobra em dinheiro, logo, em influência político-cultural, as briguinhas intestinas da política americana vêm se repetir aqui como farsa. Por exemplo, a esquerda americana acusa (com razão) o sistema judicial americano de prender demais. Afinal, não apenas os EUA têm a maior população carcerária do mundo, tanto em termos absolutos quanto relativos, como condenam habitualmente a longuíssimas penas de prisão, ou mesmo à prisão perpétua, criminosos culpados de menor potencial ofensivo. Em alguns estados do Grande Irmão do Norte, uma terceira condenação por fumar maconha ou roubar galinha pode levar ao encarceramento perpétuo.

Ora, isso é o oposto da situação brasileira, em que o furto simplesmente não é mais punido, na prática, e raríssimos são os casos de condenados que cumprem mais que um sexto da pena em regime fechado. Ah, sim: aqui a pena máxima é de 30 anos. Em outras palavras, monstros assassinos aqui podem passar cinco anos atrás das grades; os demais criminosos passam muito menos ou – a maioria – se livram soltos. Mas a nossa esquerda copia sem tirar nem pôr a bandeira da esquerda americana, e faz de tudo para que se prenda ainda menos aqui, onde o problema, lembro novamente, é o oposto. O mesmo vale para outras péssimas importações, estando as cotas e outras políticas racistas entre elas.

Para que não se diga que estou de implicância com os sinistros canhotos, aponto que a recentemente ressuscitada direita brasileira tem o mesmo hábito pacóvio de importar pacotes prontos de sua homóloga anglo-saxã. Entre vários, poderíamos citar a visão de mundo segundo a qual tudo está aí para ser consumido, que faz com que, macaqueando a direita gringa, vários dentre os poucos direitistas brasileiros lancem frases de efeito afirmando que a Amazônia deveria ser transformada em estacionamento, por exemplo. No original, trata-se de uma inversão do discurso ambientalista radical: se uns dizem que nem uma folha de grama pode ser cortada, os outros têm de dizer que todas devem sê-lo. Aqui é só besteira, mesmo.

Igualmente importado é o horror ao imigrante, compreensível (ainda que não justificável) no caso da direita americana por estar lá havendo um grande influxo dos descendentes latino-americanos de sobreviventes das populações indígenas dizimadas pela colonização anglo-saxã. Tanta gente chegando ao mesmo tempo com a mesma língua e cultura estranhas leva-os a temer pela própria, que efetivamente corre o risco de sofrer a influência civilizatória dos imigrantes latino-americanos. Afinal, estes levam consigo uma cultura muito mais rica, nuançada e profunda, e é muito mais provável que a cultura mais rica influencie a mais pobre que o oposto, a despeito de a distribuição de riquezas materiais ser oposta à da riqueza cultural.

Já aqui, igualmente por questões culturais, a segunda geração de uma família de imigrantes em geral já está completamente brasileira; nossa cultura é muito inclusiva e tolerante, o que faz com que seja quase impossível a imigrantes manter-se à parte de nossa sociedade. Mesmo os japoneses, no século passado, um dos povos mais culturalmente coesos e fechados do mundo, integraram-se plenamente nas populações que os acolheram em uma ou duas gerações. Além disso, não há nenhum grupo de imigrantes suficientemente numeroso para fazer a diferença. Os americanos, aliás, são uma das nacionalidades mais presentes entre os imigrantes para o Brasil, com praticamente um americano para cada dois bolivianos. Mas mesmo assim os pafúncios importadores de besteira adoram rasgar as vestes e ulular de desespero diante de uma suposta invasão de imigrantes, ou mesmo de imigrantes islâmicos. Ora, bolas, entre Paris e Botucatu, com Paris sendo muito mais perto, acho pouco provável que a hégira atual se dirija às nossas plagas. E, se vierem, eu garanto: em menos de duas gerações estão saindo de porta-bandeira e mestre-sala numa escola de samba, alimentando-se de feijão com arroz e implicando com os argentinos.

Além destes fenômenos que descrevi acima, contudo, há outro mais grave ora ocorrendo: a importação direta (e, na prática, inevitável) de algumas das piores manias e práticas pouco civilizadas dos Estados Unidos, por intermédio do Facebook e, em menor escala, do Google. Como todos os meus três leitores sabem, o Facebook e o Google são os dois gigantes da internet mundial, dividindo a imensíssima maior parte do fluxo de dados não pornográficos da rede. Dentro do Facebook há um sistema de troca de mensagens instantâneas, o Messenger. Fora dele, mas igualmente pertencente à mesma companhia, há o WhatsApp. O Google é o proprietário do Gmail, o maior provedor de e-mails do mundo. Pois o Facebook, por conta dos ânimos cada vez mais acirrados da política americana, decidiu tomar partido e censurar ativamente postagens de seus usuários. Isso, se não examinássemos a situação, poderia parecer aceitável: afinal de contas, trata-se de uma companhia particular. Mas será que se pode assim definir um conglomerado que detém mais informações e movimenta mais dinheiro que a maior parte dos governos, inclusive de países ricos? Este é um primeiro ponto importante. Corremos o risco de, em algumas décadas, sermos literalmente governados pelas corporações; assim como hoje as identidades digitais fornecidas pelo Google e pelo Facebook servem para inscrever-se em um sem-número de páginas, e mesmo em lojas e serviços de todos os tipos, não é um pulo muito grande unir a CNH digital a essas identidades. Daí, poder-se-ia partir para unir o CPF e o título de eleitor, e quem sabe estaremos votando no sucessor do próximo presidente usando o login do Facebook ou do Google? A cada dia os Estados nacionais perdem importância e as corporações aumentam em poder. É importante que conquistemos algum direito de cidadania virtual nelas, para que elas não venham a ser ditaduras abertas, como cada vez mais parece estar acontecendo. Foi muito difícil recuperarmos nosso direito de livre expressão no Brasil; não podemos nem queremos perdê-lo de novo, menos ainda nas mãos de uma entidade que não responde a ninguém e cuja cultura nos é estranha.

O desprezo do Facebook pelos que evidentemente vê como seus inferiores é tornado claro em atos como a flagrante desobediência aos tribunais brasileiros; no momento, em apenas uma ação no Paraná, o Facebook está sofrendo multa de R$ 70 mil ao dia por se negar a dar informações não pessoais sobre investigados; mas o que são R$ 70 mil para eles? Troco de pinga.

E eis que esses poderosíssimos novos senhores consideram sumamente importante preservar os tabus e gostos provincianos peculiares que fazem as vezes de moral nas terras do Norte. Assim, por exemplo, é absolutamente proibido postar fotos de mulheres com pouca roupa, mas não há problema algum em publicar fotos e mesmo filmes de decapitações, atropelamentos e outras formas de violência brutal. Do mesmo modo, há uma lista de palavras proibidas. Escrevê-las significa ser punido com bloqueios que podem variar de dias a semanas, ou mesmo com a expulsão da rede. Não importa se a vítima dos desmandos do Facebook usa o Messenger para trabalho: no momento em que sofra o bloqueio – que normalmente ocorre de forma súbita, dias após a postagem em que se tenha violado algum tabu americano desconhecido –, passa a ser impossível comunicar-se. O busílis da questão, todavia, é que a lista de palavras proibidas é secreta! O único jeito de descobrir quais são elas é sendo bloqueado, com a ameaça sempre presente de ser expulso subitamente da rede e do meio de comunicação pessoal que ela inclui. Ora, isso é, hoje em dia, equivalente ao que seria, poucas décadas atrás, cortar o telefone e o correio, ou mesmo fechar o acesso à porta da casa ou da loja de alguém. E mesmo assim a coisa não é perfeitamente clara, na medida em que eles simplesmente apresentam o texto completo da postagem como razão para a punição, sem precisar qual teria sido a palavra-tabu. Provavelmente para um nativo ela seria relativamente evidente, dada a sua familiaridade com os sistemas tabuísticos tribais de sua cultura, mas para um brasileiro em geral a coisa simplesmente não faz qualquer sentido. O contexto tampouco importa, por se tratar de um tabu e não de uma questão moral: um amigo foi bloqueado por um longo período, sem aviso prévio, por ter escrito a um amigo íntimo seu algo nas linhas de “fala, viado, amanhã eu passo aí”. Típica grosseria carinhosa masculina, que em absolutamente nada se assemelharia, nem nos sonhos mais delirantes do mais famigerado entusiasta LGBT, a uma violação do tabu igualmente importado da “homofobia” (literalmente, “medo do igual”; na prática trata-se, no mais das vezes, de tolerar atos que sempre foram considerados moralmente condenáveis, em vez de bater palmas entusiasmadas para eles).

Mais do que as importações culturais, que sempre sofrem alguma mediação no Brasil, a implantação direta de um sistema de tabuísmos estrangeiros é uma questão séria, com que o Brasil terá de lidar mais cedo ou mais tarde. Afinal, são muito poucos os bobos que engolem completamente o pensamento racista que justifica cotas e outras barbaridades, por exemplo, e em geral quem as defende aqui o faz por uma visão moral um pouco confusa, não por observância de tabuísmos exóticos. O mesmo vale para o temor ao imigrante e outras tristes importações. A importação de besteiras indireta sofre a mediação da cultura nacional na medida em que é inserida no dia a dia e nas práticas da nossa cultura.

A partir, contudo, do momento em que o WhatsApp e o Facebook se tornaram os meios de comunicação preferenciais da população, é absurdo e criminoso que regras secretas como as listinhas de palavras-tabu do Facebook possam fazer com que sejam punidas pessoas inocentes e ignorantes, com razão, dos sistemas de tabuísmo de outra cultura. São importações diretas, que poderiam ser equiparadas, mutatis mutandis, a uma intervenção estrangeira. A polícia interna do Facebook está para os seus usuários brasileiros como as tropas brasileiras estavam para os cidadãos haitianos. E a ação dessa polícia que não trata os usuários do sistema como cidadãos é brutal. Como já escrevi, hoje em dia cortar o Facebook ou o WhatsApp de muita gente equivale a forçar o fechamento da loja ou mesmo murar a porta da casa. Não é algo que possa ser feito por questões comezinhas ou por posicionamentos políticos, que dirá por tabuísmos de povos exóticos. Esta é uma questão urgente.

As pessoas não se dão conta, em geral, de que no Facebook os usuários são a mercadoria. A rede social é a minhoca no anzol. O negócio na verdade é um sistema de coleta de informações pessoais para revenda a anunciantes, não um sistema de comunicação. A comunicação é permitida e até, em certa medida, incentivada apenas para que através dela o Facebook consiga saber mais sobre o usuário e assim direcionar melhor os anúncios que publica. Os fregueses reais, os anunciantes, podem pela primeira vez na história da humanidade anunciar apenas para mulheres solteiras entre 38 e 45 anos de idade que gostem de chocolate, não possam usar saltos altos por problemas de coluna e prefiram o vermelho ao verde. Ah, sim: e que morem neste ou naquele bairro, ou a menos de tantos metros de uma franquia de uma determinada companhia, que tenham tantos filhos de tal idade, que ouçam tal tipo de música… O céu é o limite. Mas nós, mercadorias nas prateleiras, por menos que pareçamos importantes para a corporação que dirige o meio, somos seres humanos, cidadãos não apenas da comunidade física brasileira quanto da virtual, com direitos e deveres, e quem assume a responsabilidade de prover serviços de comunicação vê-se obrigado moralmente (moral de verdade faz uma falta a eles!…) a mantê-los em funcionamento, a não ser que haja razões graves para interrompê-los. Não precisamos, com todos os problemas que já temos, importar uma polícia dedicada a fazer vigorar tabus exóticos nas nossas comunicações.

Se esta questão não for resolvida, em breve podemos esperar que o mesmo passe a ocorrer em outras áreas da vida; podemos ter a luz cortada porque dissemos algo inocente, porém proibido por um tabu estrangeiro, ao falarmos com nossos botões na solidão de nosso automóvel. Afinal, o reconhecimento de voz do telefone celular pode transmitir a informação a uma central que determine automaticamente a nossa punição. E talvez o tal sistema tenha entendido errado o que dissemos, o que na prática não faria diferença alguma: uma vez punido, punido se está. Não há nenhum impedimento, legal ou prático, para que isso ocorra no momento atual. A tecnologia está aí, assim como a prática da censura punitiva; basta juntar as coisas já existentes, o que fatalmente ocorrerá assim que isso fizer sentido financeiro para as corporações envolvidas. Tudo está cada vez mais entremeado, e não há mais qualquer expectativa de privacidade. A maior parte dos telefones atuais já mantém o microfone perpetuamente ligado, esperando identificar uma expressão que indique que ele deva agir em função de um comando de voz (“OK, Google”, por exemplo). Se o nosso direito a serviços de que dependemos progressivamente mais não for garantido, se pudermos ser punidos por desobediência a códigos secretos de culturas exóticas, neste contexto de completa impossibilidade de intimidade e politização do discurso, corremos o sério risco de vermos muitos dentre nós efetivamente ostracizados, cortados do mercado de trabalho e mesmo das amizades sem que haja absolutamente razão alguma para tal.

Importar besteira é muito perigoso. 
Por: Carlos Ramalhete Publicado originalmente em Gazeta do Povo  
Foto: Josh Edelson/AFP

domingo, 22 de outubro de 2017

A SUBVERSÃO DOS IDIOTAS


Ninguém aguenta mais ouvir falar da exposição do banco Santander em que todo tipo de perversão sexual era apresentado a crianças, acompanhado de “artes” como hóstias com palavrões escritos. O que eu venho apontar aqui, contudo, talvez seja um pouco diferente das reações médias, da indignação da direita à defesa confusa de um suposto direito de expressão da esquerda.

O que mais me chamou a atenção na exposição é o seu amadorismo. Na verdade, o jeitão dela era todo o de uma feira de ciências de colégio suburbano, com quadros com todo o jeitão de terem sido pintados por crianças de 12 anos (inclusive na pornografia) e maquetes de vulcão mal feitas, tudo com o objetivo de “passar um conteúdo” que valha uma nota. E qual era o conteúdo da exposição queer (termo que significava originalmente “esquisito”, mas que foi adotado como sinônimo de “homossexual”)? Era basicamente o que as pobres crianças de hoje aprendem na escola e na mídia desde a mais tenra idade, a herança orgulhosamente contracultural do Maio de 68: a desconstrução e a desmitificação. Sem jamais entender direito o que significa a Independência do Brasil, por exemplo, e sem que sejam postas por um instante que seja a pensar nas alternativas então possíveis, as crianças aprendem que dom Pedro estava montado numa mula e com diarreia, ou sei lá que besteira se venha a dizer. A história passa a consistir de uma sucessão de ridículos, de modo a “vacinar” as crianças contra a noção de autoridade, contra a admiração pelos feitos de nossos ancestrais etc. A literatura passa a celebrar a vida sexual dos escritores, em detrimento daquilo que os faz escritores: a sua arte. A geografia acaba parecendo a muçulmana, que divide o mundo entre “território da submissão” (o Islã) e “território da guerra” (todo o resto, como os europeus vêm descobrindo): os países mais desenvolvidos não são desenvolvidos, são monstruosos; os países pobres não estão em vias de desenvolvimento, e sim sendo estuprados pelos poderosos, que cometem o crime de comprar os produtos que produzimos. E por aí vai.

O termo técnico para essas tentativas de puxar o tapete sob toda a narrativa civilizacional e patriótica é “subversão”; lembro-me até hoje da minha avó observando, indignada, que alguns deputados cassados pelos militares batiam no peito por terem sido cassados por subversão, não por corrupção. Ora, a subversão é a pior forma de corrupção: é a corrupção ativa e direcionada contra o âmago da sociedade, contra aquilo que é partilhado por todos os cidadãos. A subversão significa justamente o ataque às bases da ordem social. E de Maio de 68 para cá estas bases são atacadas constantemente pelos mesmíssimos meios que deveriam se dedicar a mantê-las. As escolas, por exemplo, têm – ou deveriam ter – como missão precípua a manutenção da ordem social pela transmissão do conjunto de valores e conhecimentos que perfazem a herança cultural que cada membro da nossa cultura e civilização tem o direito de receber. Mas não. Elas, assim como a mídia, percebem-se hoje como “agentes de mudança”. Mudança rumo a quê, isso ninguém sabe. O que se sabe é que seria de alguma forma um dever, a quintessência mesmo do ensino paulofreiriano ou do jornalismo uspiano demolir todo sinal de civilização, toda ordem herdada dos ancestrais.

Daí imbecilidades como a tal exposição queer do Santander (ironicamente, uma instituição com nome de santo; nada mais tradicional), ou como o próprio festejar incessante do “trans” e do queer, do que não se encaixa, do que se nega a aceitar a realidade biológica e social. Não se trata de uma campanha em prol de algo, por mais que – por motivos puramente políticos e de propaganda – finja-se que seja. Não se está defendendo os direitos de quem quer que seja, mesmo porque direitos que são inventados na hora, inexistiam cinco anos atrás e rapidamente serão abandonados em favor de outros mais recentes dificilmente seriam direitos reais. O que se está fazendo é um ataque sistemático às bases mesmas da sociedade e da civilização – de qualquer civilização; não estou falando simplesmente da civilização ocidental, em cujos subúrbios estamos. E quando eu digo que é às bases, não exagero: o ataque visa coisas tão básicas quanto o masculino e o feminino, necessários para a própria reprodução da espécie; a noção hierárquica de superior e inferior, necessária para qualquer reta ordenação social; a noção ético-moral de certo e errado, necessária para o juízo das ações que nós mesmos encetamos. É a destruição da possibilidade mesma de sociedade que esses processos irracionais almejam. O que importa para quem entrou nessa barca foucaultiana é a desconstrução de paradigmas e a desmitificação de coisas que, no mais das vezes, de mitos não têm nada. Não é mito que homens sejam diferentes de mulheres. Aliás, esta é uma realidade maravilhosa, e o homem que tenta ativamente diminuir sua masculinidade, assim como a mulher que procura combater a sua feminilidade, estão tentando misturar água e óleo. É impossível. A masculinidade e a feminilidade estão inscritas em todas as células do corpo da pessoa, e não importam em nada os delírios identitários que alguém que misture desejos venéreos com identidade.

Mas mesmo assim, apesar de ser uma causa perdida desde o início, há gente boba o suficiente para – como bom aluninho, CDF, que leva uma maçã para a professora todos os dias – engolir sem pensar o bestialógico que se lhe apresenta como se fosse a mais suma sabedoria e seu mais reto dever. E são estes, os bons aluninhos, que aprendem desde cedo que o que faz um trabalho ganhar boa nota é a quantidade de subversão que ele traz em si. A geração que tinha 20 anos em Maio de 68 conseguiu perverter as seguintes, e hoje as melhores mentes da geração que hoje tem seus 20 e poucos se veem vivendo a ilusão de que a subversão é um dever cívico e uma ação nobre. O que começou como um levante dos jovens contra os velhos (“não confie em ninguém com mais de 30 anos” era um dos lemas de 68) tornou-se uma campanha de subversão encetada por velhos de 70 anos de idade usando a força dos bons meninos obedientes de 20.

Ora, o que é a subversão? Literalmente, a palavra significa “deitar abaixo, derrubar”. O objetivo do ensino e da programação televisiva hoje em dia é fazer com que o aluno deite abaixo, derrube qualquer coisa que lhe seja apresentada como digna de respeito. “Irreverente” tornou-se um elogio! Convenhamos, isso é a mais perfeita receita para a criação de uma sociedade anômica em que 60 mil homicídios por ano parecem normais. Festejar-se o que é diferente da regra implica necessariamente em festejar-se a criminalidade, o lucro obtido pela violência desordenada e todos os demais sinais de que o tecido civilizacional se esgarça, deixando vazar a escravidão aos sentidos mais perversos e básicos. A sociedade é substituída pelos desejos venéreos e demais formas de concupiscência que ela sabia ordenar para fins melhores. O Davi de Michelangelo dá lugar a desenhos infantis de copulação com cabras. Quando a História passa a ser a apresentação em flashes de um Pedro Álvares Cabral farsesco que não consegue se comunicar com os índios, seguido de um dom João VI que só se preocupava em comer franguinhos, por sua vez dando lugar a um filho mulherengo que teve uma diarreia e então proclamou a independência etc., o que se tem não é História do Brasil, “desmistificada” ou não. O que se tem é uma palhaçada da qual ninguém se orgulharia de fazer parte. E quando a isso se soma o festejo do bizarro, a entronização das sobrancelhas de lagarta da pobre Frida Kahlo, a celebração do drag queen etc., o que se tem é uma tentativa de demolir a sociedade sem que sequer se dê aos jovens o direito de conhecer esta mesma sociedade antes de demoli-la.

Vejamos, por exemplo, as brincadeiras pipi-cocô-meleca dos “artistas” – que na verdade nem mesmo arteiros seriam, na medida em que fazem o que fazem por tê-lo aprendido na escola – da exposição do Santander. Um, ou um coletivo deles, sei lá (minha paciência também tem limites, ainda que tremendamente elásticos), resolveu que seria uma ótima ideia comprar um monte de hóstias (feitas para a celebração da Missa) e escrever nelas “pipi-cocô-meleca”, ou o equivalente. Até os 12 anos daria para descontar e relevar. Eu mesmo já vi, numa escola invadida durante as férias, uma pichação “viva a punheta” num quadro-negro. Não é exatamente um atestado de maturidade, e esse tipo de “intervenção artística”, depois de completada a puberdade, fica difícil.

Mas a ideia é evidentemente tão somente épater les bourgeois, “espantar os burgueses”. Ora, isso não espanta mais absolutamente ninguém. “Viva a punheta”, como qualquer afirmação “pipi-cocô-meleca” feita por alguém que já faz a barba, é no máximo constrangedor. Os idiotinhas que fizeram a “arte” provavelmente nunca haviam nem sequer visto uma hóstia de perto. Só o que sabiam era que aqueles objetos tinham um fim precípuo, que eles negaram ao fazer deles objeto de uma simples e crua manifestação de ódio. A negação dos fins precípuos dos componentes de uma sociedade é a essência mesma da subversão.

O mesmo vale para todo o resto que se viu da tal exposição nas redes sociais. Desenhos medonhos de atos sexuais depravados serviriam para “desconstruir” a sexualidade, sem que em momento algum pareça passar pela cabeça desse pessoal que sexo serve basicamente para garantir que a raça humana não se extinga, o que não será impedido por injeções de esperma em meio a fezes. Macacões de astronauta com zíperes em lugares estratégicos serviriam para que as crianças “explorassem o gênero”, como se fosse preciso ou mesmo saudável levar as crianças a fazer algo em que em breve será preciso conter os adolescentes para que não passem dos limites em suas descobertas.

O que se tem, assim, nesta e noutras exposições do mesmo calibre, é simplesmente o material que ganharia uma boa nota na escola, a “desmitificação” ou “desconstrução” que, num nível de escola primária, uma professorinha cheia de brilho paulofreiriano nos olhos poderia achar bem feita. Algo que “assuste os burgueses”… de maio de 1968. Algo que solape as bases da sociedade humana (o masculino e o feminino, ergo a família, ergo as associações voluntárias, ergo os fins precípuos dos componentes sociais etc.), abrindo espaço para que o governo federal, o Google e o Facebook disputem a propriedade das almas dos cidadãos. Algo, em suma, que não existe senão como negação: negação dos sexos, da hierarquia, da existência de um bem ou de um justo. E quem lucra com isso, claro, são os poderosos. Mas aí já é tema para outro texto.

O problema da exposição não é o suposto incentivo à pedofilia; este é muito maior na onipresença do funk e na erotização da infância na televisão. Tampouco, menos ainda, seria ele a sugestão de zoofilia: desenhos tão malfeitos não levariam ninguém a fantasiar noites de amor com uma cabrita ou um porco-espinho. O problema dela é que ela é perfeita e completamente careta, mainstream e encaixada ao último detalhe num afã subversivo institucionalizado que os próprios “artistas” não têm capacidade de reconhecer. É uma imbecilidade de nível primário ou ginasiano.

O problema é que um banco – e as redes de tevê, e o próprio governo, para não falar de toda a academia em ciências humanas, as ONGs e o que mais houver – entrou nesta imbecilidade e tratou o pipi-cocô-meleca como arte, somando-se às forças que desejam a subversão apenas por acreditarem, sem muito exame, numa fantasia de que o que virá após a destruição desta sociedade seria indubitavelmente algo melhor. Adoraria estar de acordo com eles, mas, quando se vê que a produção humana após serem retirados os limites morais consiste em desenhos malfeitos de idiotas tendo relações genitais com animais, fica difícil. Por Carlos Ramalhete Publicado originalmente em Gazeta do Povo
Foto: Fredy Vieira/ Santander Cultural 

sábado, 21 de outubro de 2017

NOSSA SENHORA APARECIDA


Trezentos anos atrás, Deus mandou ao povo brasileiro um recado com muitíssimas camadas de significado – como, aliás, costumam ser as Suas mensagens – ao nos enviar a imagem de Nossa Senhora da Imaculada Conceição Aparecida, cuja festa comemoramos neste dia 12.

Como nos vem sendo lembrado pelo que ainda resta na imprensa de católico, ou ao menos de respeitoso à religião da maioria do nosso povo, a imagem foi encontrada em partes, com a cabeça separada do corpo. Ora, quando uma imagem sacra se quebra, ensina a tradição cristã que ela não pode ser jogada no lixo: ela pode ser enterrada, jogada em águas profundas ou queimada. No caso, trata-se de uma imagem de terracota, que não se conseguiria destruir pelo fogo. Assim, é extremamente provável que a imagem de Nossa Senhora da Conceição que apareceu aos pescadores tenha sido jogada no Rio Paraíba por alguém que a venerava anteriormente, justamente por ter-se quebrado. Assim temos o primeiro detalhe do complexo recado que Deus nos dá: a imagem de Sua mãe que Ele nos indica a venerar não é de modo algum uma “novidade”.

Comparemo-la, por exemplo, com a imagem da Virgem dos Milagres de Caacupé, padroeira do Paraguai, que foi esculpida por um converso nativo na madeira de um enorme pé de mate atrás do qual se refugiou de perseguidores pagãos que o desejavam matar. A Senhora Aparecida é como que um renascimento de uma imagem, não uma obra nova. Talvez tenha vindo de Portugal; ao menos sabemos que de lá veio a nossa Fé. O que de lá veio e se quebrou, todavia, renasce e volta a ser objeto de veneração no Brasil. Com isso percebemos a vocação cristã do nosso país, que tende a guardar o melhor da civilização ocidental que nos plasmou no momento em que, no local de sua origem, ela está em seus últimos estertores, sendo dominada pelos mesmos mouros que sempre foram seus inimigos figadais, sem ter mais filhos, sem ter mais Fé, sem ter mais nem sequer a percepção da grandeza de seu passado.

A imagem foi encontrada por pessoas pobres, pobres como a maioria de nosso povo. Eles estavam, contudo, a serviço da autoridade hierárquica: buscavam peixes para a festa de recepção do Conde de Assumar, governante da capitania de São Paulo e Minas. Tentaram aqui, tentaram ali, sem sucesso; quando, contudo, encontraram as duas partes da imagem, ela miraculosamente tornou-se imensamente pesada, de tal modo que não poderiam jogá-la fora novamente, mesmo se o quisessem. Foi então que, numa reminiscência clássica dos milagres do próprio Cristo, Cuja mãe a imagem representa, os pescadores encheram as redes com tantos peixes que temiam que o barco afundasse.

É uma lembrança divina de que a nossa sociedade, felizmente, é uma sociedade que respeita profundamente a hierarquia. Não somos uma sociedade igualitarista, e temos nítida noção dos deveres de estado tanto dos mais afortunados quanto dos menos, e sabemos claramente que cada um faz a sua parte na construção de um todo que é muito maior que a mera soma delas. Sem os pobres pescadores não seria possível o banquete oferecido ao conde; sem o conde não haveria a proteção social, e mesmo o emprego, que tinham os pescadores. Cada um cumpria a sua parte, e nesse todo hierárquico e bem ordenado surgiu miraculosamente, pelas mãos rudes dos mais pobres, a imagem da Mãe de Deus.

A cor escura dela provavelmente há de se dever, originalmente, à permanência no fundo do Rio Paraíba; a cerâmica porosa terá recebido e incorporado partículas escuras carregadas pela água. E a cor da Virgem, destarte, tornou-se em tudo semelhante à de tantas outras Virgens negras de enorme veneração em outras partes do globo, como Nossa Senhora de Montserrat na Espanha, Nossa Senhora de Jasna Gora na Polônia, Nossa Senhora de Bistrica na Croácia, Nossa Senhora de Altötting na Alemanha, ou Nossa Senhora dos Eremitas na Suíça. São imagens que nos lembram do Cântico dos Cânticos, em que a Amada diz que é negra, mas formosa. E assim é o Brasil: negro e formoso. Nossa população teve a graça de, desde seu princípio, ter-se composto pela mistura e mestiçagem absolutas, em princípio causada pela ausência de mulheres europeias e, em seguida, continuada pelo simples hábito, extremamente salutar em termos sociais e genéticos, de encontrar cônjuges de aparência distinta da própria. E assim o brasileiro ganhou sua cor morena que faz com que a imagem da Virgem Aparecida nos seja tão apropriada quanto as imagens da Virgem de olhos amendoados do Oriente distante: ela se fez ainda mais completamente uma de nós, afastando-se nisso da arte mais tradicional portuguesa, que, como em toda parte, tendia a fazê-la mais parecida com aquele povo, com a pele branca e os cabelos negros advindos da rica mestiçagem de godos, celtas e semitas que formou nossa pátria-mãe europeia.

E os milagres foram se sucedendo, arrastando multidões para venerar a imagem, tão pequena e simples. Foi-lhe então construída uma igreja, elevada a basílica em 1908 – a atual Basílica antiga, ainda em funcionamento a curta distância da gigantesca Basílica nova. A construção iniciou-se em 1834, mostrando-nos o quanto já havia crescido o culto salutar àquela pequena imagem em tão curto período de tempo, ao ponto de necessitar uma igreja de bom tamanho, e concluiu-se já com o Brasil sendo um país livre, logo após a Abolição da Escravatura. A coroa e o manto original da imagem foram doados pela própria princesa Isabel, em pagamento de promessa provavelmente relacionada ao seu grande feito: a assinatura da Lei Áurea. Assim a imagem da Senhora Aparecida viu-se duplamente ligada, pela data e pelo preito de vassalagem da princesa herdeira, à terminação da horrenda chaga da escravidão de seres humanos em nosso país.

Convém lembrar, nestes nossos tempos em que se busca reconstruir a história para favorecer um racismo que traz à mente o pior do século passado, que no Brasil – como aliás no mundo todo, com raras e desonrosas exceções – a escravidão não era diretamente ligada à cor da pele. As primeiras gerações de escravos brasileiros, por terem sido arrancados do seio da Mãe África, tinham certamente a pele mais escura. Muitas vezes, contudo, os portugueses amigavam-se com escravas e tinham filhos com elas, e estes raramente eram mantidos em cativeiro. Do mesmo modo, era possível a muitas categorias de escravos, notadamente aos então chamados “escravos de ganho”, que eram alugados pelo “dono” para prestação de serviços ou comércio, exercer atividade remunerada nas suas folgas, de modo a conseguir juntar dinheiro para comprar a própria liberdade. Tivemos até mesmo grandes senhores de escravos, com títulos de nobreza, com a pele negra retinta, da mesma cor daquela de muitos de seus servos, da mesma cor que o próprio Senhor escolheu para a imagem que no Brasil haveria de representar a Sua Mãe.

Em 1930, o papa Pio XI deu à Virgem Aparecida o título de Rainha e Copadroeira do Brasil. Nestes nossos tempos republicanos não se fala muito disso, mas o primeiro padroeiro do Brasil, que continua sempre a sê-lo, é São Pedro de Alcântara; ao dar à Senhora Aparecida o título de Copadroeira, não deixa de ter sido um recado à República ter-lhe sido dado também o título que de direito seria então da mesma princesa que lhe deu seu manto e sua coroa. É outro significado da Virgem Rainha que poderia nos passar oculto: após a sua mais meritória ação como governante provisória, a princesa Isabel foi expulsa da própria pátria, do país que libertara e que era seu direito governar; antes disso, ela foi ao santuário da Virgem Aparecida e, escolhendo esta apelação de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, deu-lhe uma coroa, que não era a sua, e um manto, que não era o de seu pai. Ao ter roubada a coroa e o manto de governo, com o nefando golpe de Estado que deu início à República de que até mesmo Rui Barbosa sentiu vergonha, permaneceram no Brasil uma coroa e um manto que davam honras de monarca àquela que, uma geração depois, as teve confirmadas pelo decreto papal. Assim, de uma certa forma o título de Rainha do Brasil da Virgem Aparecida continua amorosamente o título e a obra da princesa que a coroou.

A imagem que temos hoje, todavia, não é exatamente a mesma imagem encontrada no fundo do rio pelos pescadores 300 anos atrás. Aquela, contudo, está toda contida nesta. A imagem sofreu em 1978, quando ainda abrigada na Basílica velha, o horrendo ataque de um iconoclasta protestante, que praticamente a moeu a marteladas. Levada para restauração, foi então praticamente reconstruída, usando todo o material – mais pó que peças – recuperado do chão da Basílica, aglomerado com uma cola forte e praticamente modelado na forma da imagem original. Assim, a imagem, como em muitos aspectos o Brasil, é uma reconstrução. Somos de certa forma uma reconstrução da sociedade ocidental, fora do que é comumente chamado Ocidente; somos uma reconstrução de Portugal, nas Américas; somos uma reconstrução das sociedades que nos compuseram, todas elas, de cada povo índio e cada povo imigrante, cada um cedendo à cultura geral aspectos da sua cultura de origem, e cada um recebendo dela novas riquezas, com tudo preso, aglomerado, por uma cultura brasileira que na verdade é apenas a cola que une os elementos de inúmeras culturas, assim como une e mistura os elementos genéticos trazidos de cada parte do globo, do longínquo Japão à fria Alemanha, da quente África ao Líbano generoso.

O ataque é uma das muitas razões pelas quais a imagem é fortemente protegida na Basílica nova, consagrada pelo papa São João Paulo II em 1980 e ainda em construção, tendo sido iniciada a obra em 1955. Esta é a maior igreja dedicada à Virgem Maria no mundo.

A romaria a Aparecida, tão comum em enorme parte de nosso país, é sempre uma experiência marcante. O amor do povo brasileiro por aquela que o próprio Cristo nos deu por Mãe enquanto pendia da Cruz enche aquele imenso espaço; as vozes em oração, os gestos de devoção e piedade, os ex-votos a perder de conta mostram-nos um povo dedicado a Deus, um povo que respeita e percebe nitidamente a importância e a beleza do sagrado. Curiosamente, como não poderia deixar de ser, é exatamente onde Deus faz Sua igreja que o Inimigo faz sua capelinha, e ao mesmo tempo que lá vemos enorme beleza, Fé capaz de arrastar montanhas e amor sem fim e incondicional, encontramos o pior do comércio de bugigangas chinesas; restaurantes que, por saberem que nenhum romeiro estará lá no dia seguinte, servem comida de péssima qualidade; além de desrespeitos gravíssimos à lei e à prática litúrgica da Igreja no interior da própria Basílica. Mas tudo isso empalidece diante da beleza que é estarmos ali, junto de tantos irmãos e irmãs de todos os tamanhos, cores, hábitos, fortunas e famílias, diante daquela imagenzinha tão singela, mas com tantas camadas de sentido, todas unânimes em nos indicar o amor de Deus pelo povo brasileiro, que tanto O ama de volta.

Viva Nossa Senhora Aparecida! 
Por Carlos Ramalhete 11/10/2017  Publicado originalmente em Gazeta do Povo 

domingo, 15 de outubro de 2017

O MUNDO DOS IDIOTAS TRANSVIADOS


Transvalorar para mutilar o tecido social...

Francisco de Goya - Saturno devorando um filho. Museu do Prado 


A perda dos valores , a destruição da sociedade e o niilismo que nos contamina.

No mundo dos idiotas transviados, o politicamente correto, o ativismo judicial, o supremacismo vitimizador, o biocentrismo fascista, a ideologia de gênero e tantas outras "bandeiras de luta", contribuem para o progressivo esgarçamento da ordem e a perda de valores que esteiam nossa civilização. Não constituem, porém, ações diversas. Configuram partes de uma mesma postura, niilista, destruidora e letal. 

A praga do Niilismo

A "transvaloração de todos os valores", para Nietzsche, é o derradeiro objetivo do niilismo. 

Niilista é aquele que considera infundados todos os valores e crenças, não havendo qualquer sentido ou utilidade na sua existência. 

Assim, para Nietzsche, a missão da nova moral consistiria na “transvaloração de todos os valores, em um desprender-se de todos os valores morais, e um confiar e dizer sim a tudo o que até aqui foi proibido, desprezado, maldito”(1). 

Nietzsche propunha a transvaloração por entender que não se podia confiar nos conceitos de moral tradicionalmente recebidos, uma vez impostos pela "ordem dominante" (judaico-cristã). Assim, a transvaloração seria o questionamento dos valores supondo-os transmitidos como absolutos.

Em “Genealogia da Moral: Uma Polêmica”, o filósofo alemão afirma: “não vejo ninguém que tenha ousado fazer uma crítica dos juízos de valores morais" (...). "Até o momento ninguém examinou o valor da mais famosa das medicinas chamada moral". (...). "Esse é justamente nosso projeto”(2).

Pura pretensão... Nietzsche imaginava diferir, mas não diferia em nada dos demais filósofos vanguardistas, contestatários de sua época e dos "reféns da vanguarda" que a ele se seguiram. 

Do Anarquismo ao Nazifascismo, da Comuna de Paris à Escola de Frankfurt, Marx, Nietzsche, Schumpeter, Sartre e Marcuse, tudo ganha a mesma coloração parda, indefinida, em prol da "destruição criativa", como condição para se alcançar o paraíso platônico.

"Eis o que devemos almejar: a crítica implacável de tudo quanto existe. Digo implacável em dois sentidos: a crítica não deve temer suas próprias conclusões, nem o conflito com os poderes a que se dirige", escrevera Karl Marx a um amigo em 1843, cinco anos antes do "Manifesto Comunista".*

Marx também não era original. Copiava (e mal) o que pregava a maçonaria italiana em 1822, no auge de sua batalha revolucionária contra a igreja católica, em prol do Estado Laico: "Para propagar a luz, é conveniente e útil dar impulso a tudo aquilo que proporciona a mudança. O essencial é isolar o homem de sua família, fazê-lo perder sua moral."(3) 

Na ebulição de novas ideias e constatações revolucionárias que marcaram o Século XIX, o vanguardismo terminou por condicionar a mudança das estruturas econômicas, sociais e políticas à adoção de uma postura niilista. Foi assim que o vanguardismo niilista contaminou a filosofia no Século XIX, orientou o radicalismo político no Século XX e parece estar formatando o caráter cínico e hipócrita das relações de Estado no Século XXI. 

O niilismo, definitivamente, é a praga na formação do homem moderno. 

O niilismo e os transviados

Graças ao bom Deus, essa doença vanguardista-niilista da transvaloração de todos os valores não contaminou cabeças iluminadas que, ao fim e ao cabo, em vários momentos dos últimos duzentos anos, trataram de "por a casa em ordem". 

É o caso do maior filósofo do Século XX, Karl Popper, que observou, em primeiro lugar, o fato de a instauração de regimes “salvadores” sempre exigir a selvageria de um movimento revolucionário para reformar toda a ordem existente “sem deixar pedra por virar”. 

Popper identificou a origem enviesada deste vanguardismo destruidor "de tudo o que está aí": Platão, sua engenharia social utópica de República - um convite ao totalitarismo. 

Essa engenharia social platônica em prol da utopia, visando "recriar" o ser humano, gerou todas as aberrações que custaram milhões de vidas no Século XX. Platão, reformatado, influenciou a formulação das visões niilistas que inspiraram os regimes totalitários e marcaram os conflitos mundiais. 

“Tanto Platão quanto Marx sonharam com uma revolução apocalíptica que transfiguraria radicalmente todo o mundo social”, afirmou Popper em "A Sociedade Aberta e Seus Inimigos".(4)

Utopias à parte, a experiência de vida e o inafastável conhecimento da história revelam: Sem valores a personalidade desaba. 

Não por acaso, a mutilação da personalidade propicia a destruição e o totalitarismo. É apanágio dos cínicos, dos homicidas, dos suicidas, dos totalitários. É atributo, também, dos militantes sem causa e do ativismo sem conteúdo.

Daí porque a transvaloração niilista traduz fielmente o momento atual por que passamos, de completa imbecilização das performances contestatárias que nos assaltam diuturnamente.

A transvaloração niilista está inoculada no nosso cotidiano nacional. Ela gera transvias comportamentais pretensamente contestatárias e reproduz agentes transviados. Motiva a agressão programada dos idiotas inoculados nas grandes mídias contra os "valores burgueses" da sociedade - valores que passam a ser taxados como "fobias sociais" e "moralismo repressor". 

Essa transvaloração de transidiotias se reflete na performance dos cuspidores de imagens, postados em frente ao MASP, que conspurcavam fotografias de políticos "golpistas" durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Ela estána raiz das manifestações transgressivas da ideologia de gênero. Compõem também, o horizonte do pretensamente "asseptico" do "ativismo judicial", que desconstrói a Ordem a pretexto de reordená-la.

Não é fenômeno tupiniquim. Ocorre por certo no mundo todo. Das reações separatistas dos boquirrotos sem causa, passando pelo atirador a esmo da janelas do hotel em Las Vegas, até os supremacistas brancos, negros, gays, transgêneros, feministas e, também, feminicidas radicais terroristas, que massacram vítimas com requinte de crueldade em nome da paz e da harmonia do iluminado profeta de Alah...

Recentemente, nas redes sociais a professora e pedagoga Marilene Nunes vaticinou:

"Está tomando forma amplo processo de IDEOLOGIZAÇÃO da vida como nunca se viu antes em toda a história da humanidade. Seu objetivo é o de transformar a maneira como encaramos a vida e a vivemos. Suas pautas e agendas são: ecologismo, sexualidade, trabalho, educação e cultura. Sua tática, o uso da democracia pra impor privilégios como direitos, com base na demanda do DESEJO e, assim, detonar com os sistemas jurídicos das sociedades modernas."

Essa transvaloração de todos os valores, segundo a professora, pretende "a despersonalização do individuo pela rejeição da sua identidade sexual e bioemocional. Saturno está comendo seus filhos."(5)

Transidiotas exterminam nascituros para consolidar a liberdade

O efeito global dessa ação niilista destrutiva desconstrói a figura da autoridade, corrói a organização política da sociedade, deforma cognitivamente o caráter das novas gerações, fulmina a família como núcleo institucional, desacredita o regime democrático e transforma o pluralismo em condomínio de rancores, supremacismos de minorias barulhentas.

É nesse ambiente pulverizado, que operadores niilistas do direito ascendem à categoria de "aiatolás" da nova ordem "politicamente correta". Senão vejamos: 

Um exemplo definitivo é o voto do transvalorado ministro do Supremo Tribunal Federal Luis Roberto Barroso, em defesa do "direito ao aborto", sem causa, de nascituros com três meses de gestação : 

“A criminalização é incompatível com os seguintes direitos fundamentais: os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve conservar o direito de fazer suas escolhas existenciais; a integridade física e psíquica da gestante, que é quem sofre, no seu corpo e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e a igualdade da mulher, já que homens não engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero depende de se respeitar a vontade da mulher nessa matéria”. (6)

O entendimento é totalmente manipulado. Basta ler o que diz o art. 4º, 1. da Convenção Interamericana de Direitos Humanos (“Pacto de São José da Costa Rica”):

“Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”.

Como salienta o jurista Francisco Ilídio Ferreira Rocha:

“Reconhecendo o caráter constitucional dos textos convencionais que versam sobre Direitos Humanos, o Pacto de San José da Costa Rica é categórico ao dizer que ninguém poderá ser privado arbitrariamente da própria vida e a proteção da existência vital tem como marco inicial, em regra, a concepção.” (...) “Sendo assim, não só existe um critério adequado para firmar uma solução jurídica sobre o início da proteção da vida humana, mas também ele é decorrente de um texto convencional de elevada importância do qual o Brasil é signatário.”

Tal qual apontou o jornalista Felipe Moura Brasil (7), como todo niilista de esquerda, Barroso, quando não concorda com uma solução jurídica, diz que ela não existe.

Quem vai pagar por isso?

O exemplo acima, é demonstração cabal do potencial homicida da transvaloração de todos os valores, hoje travestida pelo manto do "politicamente correto". 

Como já apontado por mim em vários outros artigos, o ativismo judicial, o supremacismo vitimizador, o biocentrismo fascista, a ideologia de gênero e tantas outras "bandeiras de luta", não apenas contribuem para o progressivo esgarçamento da ordem de valores que esteia nossa civilização como, com certeza, matam... até mesmo quem não possui qualquer chance de se defender...

Ante essa perspectiva, a obra prima do compositor Lobão serve como mantra para os que ainda pretendem manter a sanidade nesse mundo de idiotas transviados: 

"Eu sei que já faz muito tempo que a gente volta aos princípios,
Tentando acertar o passo, usando mil artifícios. 
Mas sempre alguém tenta um salto, e a gente é que paga por isso. 
Fugimos para as grandes cidades, bichos do mato em busca do mito 
De uma nova sociedade, escravos de um novo rito.
Mas se tudo deu errado, quem é que vai pagar por isso? 
Eu não quero mais nenhuma chance, eu não quero mais revanche."

Os idiotas passam. Sempre passaram nos últimos dois séculos. Deixam, no entanto, um rastro de destruição, injustiça e morte. Terminam vencidos pela ordem natural da coisas.

A ordem natural das coisas não se deixa confundir pelo niilismo e não se altera pelas utopias. 

Fora do mundo dos idiotas transviados, a vida é plena de razão. Ela é plural, sofre mudanças e experimenta uma contínua evolução. Exige porém, sobretudo valores, e não dispensa o vetusto exercício didático da paciência.

Notas: 

1- NIETZSCHE, Friedrich. "Ecce Homo", in “Aurora”, § 1.
2- NIETZSCHE, Friedrich. No prefácio de "Genealogia da moral", § 2.
3- Carta de 18 de janeiro de 1822, citada por Crétineau-Joly, em L’Eglise romaine en face de la Révolution, t. II, pág. 104
4- POPPER, Karl. "A Sociedade Aberta e Seus Inimigos", p.180
5- NUNES, Marilene. Em https://www.facebook.com/marilene.nunes.7311/posts/1133248630143958
6- STF - HC 124306, Relator Min. MARCO AURÉLIO, Relator p/ Acórdão Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 09/08/2016, publ. 17-03-2017
7- MOURA BRASIL, Felipe. "Os truques de Barroso e PSOL para legalizar o aborto", Revista Veja
*- LASSUS, Arnaud de. "A Escola de Frankfurt e a Revolução Cultural", in http://permanencia.org.br/drupal/node/5194

Por: Antonio Fernando Pinheiro Pedro, advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, das Comissões de Política Criminal e de Infraestrutura e Sustentabilidade da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB/SP. É membro do Conselho Consultivo da União Brasileira de Advocacia Ambiental, Vice-Presidente Jurídico da Associação Paulista de Imprensa - API, Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Olavo de carvalho fala quem era realmente Che Guevara

Capítulo 2 - A Vila Rica - A Última Cruzada HD

Escravidão no Brasil | Paulo Cruz

QUANDO O BOM SENSO DE DONA REGINA CALOU OS INTELECTUAIS GLOBAIS

Os seres humanos já conseguem perscrutar um átomo até quase a sua última substância visível ou detectável, já saímos do globo terrestre em busca de novos mundos, novas possibilidades e até mesmo de novas vidas, tudo isso muito bem delineado em sistemas intrincados de cálculos e inferências lógicas. Entretanto, esses mesmos seres humanos inteligentíssimos, por vezes, relativizam coisas banais do dia a dia e minam os próprios princípios régios e universais que possibilitaram seu desenvolvimento científico e tecnológico. Como dizia Scott Randall Paine, comentando o pensamento de Chesterton: o cientista moderno “foi ensinado a fixar sua imaginação confusa nos bilhões de átomos sobre os quais se senta, e a esquecer a cadeira” (PAINE, 2008, p. 49).

Em nossa era o chamado senso comum se tornou sinônimo de inverdade ou de conhecimento sem bases confiáveis, mas podemos admitir que o senso comum é o conhecimento que mantém a sociedade minimamente organizada. Do direito natural apenas podemos ter intuições, inclinações e percepções primárias daquilo que é certo e errado, o “bom” só o conhecemos através da moral, que por sua vez não é passível de testes laboratoriais e revisões anatômicas. Entretanto, o senso comum que diz que matar um feto no ventre materno é um mau, não é impossível de ser racionalizado e defendido com premissas e conclusões lógicas.

Princípios como o da democracia e o da liberdade são conceitos sustentados por tradições, hábitos, e contratos sociais, e não por descobertas científicas e nem por algoritmos colossais — o que não invalida, por sua vez, a sua realidade e necessidade na humanidade. Ninguém em sã consciência negaria o princípio da liberdade de expressão como pilar de uma sociedade sadia, assim como não aprovaria que o seu filho de 4 anos mantivesse relações sexuais com o seu vizinho; ainda sim, tais verdades não passaram pelo crivo científico de Descartes e nem por nenhum laboratório da NASA para se tornarem princípios incontestes e basilares.
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E é bom afirmar: longe de mim querer contrapor ciência — ou conhecimento acadêmico — e senso comum, ambos são extremamente necessários e, justamente por serem necessários, devem conviver em harmonia. Há como intelectuais se nutrirem das benesses do senso comum, assim como as donas de casa da ciência moderna. O que eu exponho aqui é a importância do senso comum contra um intelectualismo ideológico; contra o conhecimento acadêmico utilizado de modo parcial e vadio.

Tendo isso em mente, a questão a ser debatida é: como os intelectuais progressistas sempre tendem à vergonha justamente por ostentarem um discurso de soberba academicista pautada num cientificismo de feira. Um fato extremamente ilustrativo aconteceu no programa Encontro, da Rede Globo. Dona Regina, uma senhora já idosa e por isso mesmo experiente, participou da plateia do referido programa, e, chamada a opinar sobre a temática da criança exposta ao homem nu no MAM (Museu de Arte Moderna), sem demora demonstrou sua insatisfação com o crime lá cometido, deixando, assim, uma gama de atores e pseudointelectuais globais num vexame vistoso diante das câmeras. Atores e atrizes esses que defendiam abertamente a exposição e o ato da mãe de expor a filha de 5 anos ao homem nu.

Como não é preciso nenhum doutorado em Harvard — nem um título de livre docência em Oxford — para notar o absurdo do abuso infantil que ali ocorreu, dona Regina deu sua opinião contrária à exposição da criança à nudez adulta, afirmando tão somente o óbvio, ou seja, que a criança não estava preparada para tal situação. Os participantes de palco do programa ficaram visivelmente irritados com a opinião da senhora; Bruno Ferrari, artista global, que visivelmente estava incomodado para não dizer enraivecido, questionou dona Regina sobre qual o absurdo que a criança foi exposta, a senhora voltou a responder com a lógica, com o senso comum básico que nos diz que uma criança de cinco anos não deve ser exposta à nudez o à pornografia.

Dona Regina mostrou em rede nacional aquilo que os intelectuais de TV não sabiam mais que existia, isto é: o senso básico de pudor, moral e ética. Princípios esses que gerenciam o mundo real, aquele mundo que fica fora dos sets de filmagens de novela, aquele mundo real que se ausenta das reportagens do Fantástico. Dona Regina escancarou para os artistas, principalmente para Andreia Horta, a principal debatedora de Dona Regina naquele breve momento, que o mundo fora da Rede Globo não é aquele palacete de miragens utópicas no qual os artistas se chafurdam ao gravarem suas novelas.

O senso comum, aquele conhecimento legado através das heranças e experiências históricas guardadas por tradições, conceitos filosóficos e sociais. Tal conhecimento é mais que um mero “sentimento” (senso), é uma constatação racional da realidade; é mais que meramente “comum”, é basilar, é primevo. O que Dona Regina trouxe para o mundo das fadas da Globo, foi a realidade, aquela realidade que extrapola as paredes dos museus progressistas e os portões do Projac.

O mundo da Dona Regina pode ser entendido como aquele em que as realidades duras do dia a dia pautam suas decisões e escolhas, o mundo de Andreia Horta e Bruno Ferrari parece ser aquele em que antes da realidade em si vem os escritos de seus gurus, militâncias e roteiros de novela; no primeiro temos a realidade tal como ela se apresenta, e noutro temos a apresentação daquilo que quer ser realidade. Tais artistas “têm o objetivo perfeitamente definido de destruir certas ideias que, na opinião deles, se tornam estreitas de mais para o mundo, e sem as quais, em nossa opinião, o mundo sucumbiria” (CHESTERTON, 1946, p. 25).

O senso comum de dona Regina é o direito pleno e democrático daqueles que ontem construíram os alicerces da civilização e hoje querem falar e ter suas opiniões levadas a sério. O senso comum é justamente isso, as vozes dos mais velhos em favor dos nascituros, a necromancia social que nos permite, entre outras coisas, contar com a sabedoria daqueles que conhecem melhor sobre o que é cuidar de uma casa ou de um país. O senso comum, por fim, é o porta-voz da moralidade social, é o filete de sanidade que mantém a comunidade humana minimamente possível. Se hoje mostramos um homem nu a uma criança de cinco anos, qual o impedimento moral e ético teremos a oferecer contra aquele que com essa criança queira se relacionar sexualmente? A moral social é uma porta que quando destrancada dificilmente será novamente fechada. Como conclusão, darei voz ao maior pensador do século XX, Gilbert Keith Chesterton, um homem que, sobre o senso comum, tinha um conhecimento num grau colossal:

“Não é fácil citar uma coisa da qual se possa dizer que dela depende toda a enorme complexidade da vida humana. Mas, se de alguma coisa depende, é dessa frágil corda estendida entre as colinas esquecidas do ontem e as invisíveis montanhas do amanhã. Neste fio solitário e vibrátil estão penduradas todas as coisas, desde o Armageddon até o almanaque, desde uma revolução bem sucedida até um bilhete de volta. E é esse fio solitário que o Bárbaro golpeia pesadamente com um sabre, que felizmente já está bastante embotado” (CHESTERTON, 1946, p. 25)

Uma sociedade deve ser julgada através do tratamento que ela oferece aos mais velhos e às crianças. No Brasil, aos velhos nós damos o desprezo e a indiferença; às crianças, por sua vez, oferecemos as portas da pedofilia escancaradas e a confusão sexual como brinquedos de berçário. A corda — senso comum — que jaz amarrada entre as colinas do ontem e as montanhas do hoje, estão sendo arrancadas por uma parte da população a fim de se confeccionar uma forca na qual todos nós seremos oferecidos em expiação artística no palco da bizarrice, se assim permitirmos.

Referências:

CHESTERTON, G. K. A barbaria de Berlim, Rio de Janeiro: Livraria Agir, 1946

CHESTERTON, G. K. Ortodoxia, Campinas: Ecclesiae, 2013

PAINE, Scott Randall. Chesterton e o universo. Brasília DF: Editora UNB, 2008
Por Pedro Henrique Alves, publicado pelo Instituto Liberal 
Do site: https://www.institutoliberal.org.br

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

A IDEOLOGIA DE GÊNERO É O GÊNERO DA FARSA CRIMINOSA.


Mostra de "arte Queer" do Santander revela que está na hora de separar o joio do trigo nos movimentos pela diversidade sexual

Mostra "queer" no Centro Cultural Santander - Porto Alegre

"Liberdade de expressão não é um cheque em branco"
Ana Paula Henkel, sobre a exposição do Santander*


Ao custo (para o povo brasileiro) de aproximadamente 1 milhão de reais de renúncia fiscal, o Banco Santander patrocinou, em Porto Alegre, no seu Centro Cultural, uma mostra com desenhos pornográficos para crianças em idade escolar.

A mostra pretensamente artística tinha um nome sugestivo da polêmica que pretendia causar:
"Queermuseu - Cartografias da Diferença na Arte Brasileira".

Embora houvesse algumas obras de arte consagradas (e até históricas), misturadas à pura pornografia escatológica, o objetivo da mostra de forma alguma visava à cultura, à educação ou à exposição da arte engajada. O propósito da exposição era mesmo provocar, desconstruir e fazer proselitismo.

A curadoria da mostra foi descuidada. Não advertiu sobre o conteúdo da exposição, não estabeleceu idade mínima para visitação do espaço - dado o conteúdo ali à mostra e, também, não explicou efetivamente qual o objetivo do movimento inspirador da "cartografia da diferença", ali montada. 

Por conta disso, excursões de crianças em idade escolar e sem qualquer maturidade interagiram com conteúdo absolutamente impróprio, pornográfico e escatológico, fora da compreensão natural do que seja "arte" para o nível educacional pretendido com o evento, Cidadãos comuns foram impactados por blasfêmias e imagens explícitas de zoofilia, pedofilia, exploração sexual com conotação racista, sem extrair da experiência nada que não fosse agressão gratuita à própria dignidade. 

O clamor popular não tardou a surgir, com camapanha de boicote dos correntistas ao próprio banco que, então, com certeza movido pelos mais elevados interesses... resolveu encerrar o evento. 

Não sobrou pedra sobre pedra do desastre, que agora serve de mote para a grita de militantes da causa LGBT, e militontos sem causa. 

Não tardou que juristas, filósofos, contestatários, políticos e organizações sociais, manifestassem opiniões. Houve quem levantasse teses e imputasse ao "fascismo" o encerramento da equivocada mostra. Afinal, para ativistas sem rumo, até pedofilia travestida de arte serve de pretexto revolucionário ... 

De fato, expor crianças como objeto de lascívia e degradação não é arte. É proselitismo e perversão doentia. O Santander merecia mesmo uma nota ZERO.

Um detalhe determinante porém, passou desapercebido da discussão midiática. Esta é a razão do meu artigo.

A resposta à pergunta se o que foi exposto era arte provocativa ou provocação sem nenhuma arte, estava desde o início no próprio nome do evento: Queer.

Queer e o supremacismo vitimizador 

Queer é sinônimo de estranho, bizarro, inusual. Remete á situação desconfortável, ruim, e também pode denominar perversão sexual. Nos EUA, décadas passadas, era usado da mesma forma como se usa no Brasil alguns apelidos ofensivos para homossexuais, como "efeminado" ou "machona".

Talvez por isso mesmo, o termo "queer" ganhou espectro político. Talvez no nome esteja a raiz do movimento que hoje representa uma facção radical dentre várias que formam o movimento internacional supremacista- vitimizador. 

Já me referi antes a esse fenômeno*. O supremacismo vitimizador pretende o domínio ideológico agressivo das minorias sobre os aparelhos produtores de cultura da sociedade. Esse domínio é acobertado pelo Estado ao pressupor que pode "equilibrar o conflito assimétrico" favorecendo a expressão agressora minoritária. O resultado desse desequilíbrio, porém, reforça recalques, rancores e preconceitos de forma desastrosa. 

O tecido social das sociedades é construído organicamente. Ele é alimentado pelos valores morais cultivados pelos cidadãos comuns - com suas virtudes e misérias. É o senso comum o fator de equilíbrio social.

No entanto, graças ao supremacismo vitimizador, as relações sociais da cidadania vêm sofrendo impressionante esgarçamento. Os poucos movimentos de resistência são denunciados como preconceito e sofrem policiamento hipócrita das autoridades. 

Mas é esse o objetivo do movimento: destruir o senso comum, criminalizando-o, e inibir opiniões discordantes aos valores propugnados pelas minorias - cuja conduta apresenta crescente agressividade.

A ideia embutida na causa é impor aceitação incondicional dos valores distorcidos, como a nova regra a ser seguida - e não admitir qualquer tolerância crítica. Explico: o tolerante é aquele que discorda, mas não discrimina - é aquele que garante o debate e o pluralismo de valores e ideias no mundo democrático, compreendendo as diferenças e respeitando o senso comum - até mesmo para mudá-lo.

Para os supremacistas-vitimizadores, o tolerante é justamente o grande inimigo. Ele quebra o ciclo da violência, evita a confrontação e desmoraliza o discurso "politicamente correto", usado pelos supremacistas como canal de extravasamento de rancores, atitudes segregacionistas, ofensividade e recalques.

O tolerante, por não discriminar, deve ser incriminado pelo que pensa. Para tanto, sua opinião discordante será sempre rotulada pelos supremacistas como "fobia" - e a saída supremacista para o rótulo é justamente criminalizar a "fobia" e amordaçar a sociedade. O objetivo é reprimir o senso comum que esteia o tecido social. 

O movimento Queer é ramo deste supremacismo vitimizador. A teoria Queer tem íntima ligação com os movimentos libertários da contracultura e da revolução sexual, nos anos 60/70 - fortemente influenciados por Herbert Marcuse e Michel Foucault

O movimento Queer e a intolerância

O discurso Queer foi buscando via própria como teoria libertária nos anos 80, moldando-se como meio de afirmação gay, lésbico e feminista.

Porém, com o advento da supremacia das minorias no discurso politicamente correto, o movimento Queer ganhou notoriedade e permitiu-se rasgar a fantasia, transformando-se de "libertário" em "liberticida".

É preciso explicar o detalhe: os adeptos do movimento Queer resolveram "aprofundar" sua crítica á ideia de que o gênero é parte essencial do indivíduo. Posto isso, o movimento passou a combater a ciência e a negar a sexualidade biológica.

Os Queers negam as conquistas da ciência desengajada. Ignoram que a ciência constatou a natureza biológica da afetividade sexual, homo e hetero, sem descurar da distinção biológica de sexo.

Foi essa mesma ciência que compreendeu o fenômeno raríssimo da transsexualidade. Aliás, a natureza biológica da sexualidade e da afetividade foi a razão de ser dos movimentos de busca da tolerância para com a diversidade sexual no mundo moderno.

Os Queers, porém, não aceitam essa via. Ignoram a distinção sexual biológica para impor uma distinção determinada por impulsos comportamentais. Desumanizam o gênero humano, transferindo a noção de "gênero" para os comportamentos "desviantes", determinados por impulsos sexuais. Desconhecem a natureza da sexualidade para classificar "gêneros" pelo impulso comportamental do indivíduo - psicopata ou não. Esse detalhe diz tudo a respeito do que se pretende com a mostra do Santander.

Não se trata a mostra queer de arte em prol da tolerãncia e, sim, de proselitismo em favor da mais egocêntrica e recalcada intolerância.

Psicopatia militante 

O pensamento Queer busca diluir-se no movimento gay, mas não possui qualquer identidade com a vertente tradicional e democrática do combate ao preconceito contra homossexuais. 

O movimento gay firmou sua posição política de combate ao preconceito pautado pela ciência, mostrando a determinação biológica da atração sexual e do comportamento homoafetivo - razão da luta política pelo direito do indivíduo assumir sua real identidade.

Os queers dominam a chamada "ideologia de gênero", que despreza a ciência absolutamente. Eles buscam a supremacia política da ação "contra-natural" - como fenômeno exclusivamente comportamental, voluntário, ligado á "liberdade da psiqué". Posto isso, os queers expandem seu universo abrangendo TODO tipo de impulso sexual considerado "desviante".

Na verdade, como já dito, o movimento Queer confunde gênero com sexo e abole o último de forma a não distinguir sexos mas sim impulsos eróticos e comportamentais. Portanto, o queerismo é propositada e notoriamente marginal. Não propõe qualquer conciliação social ou "tolerância" para com diferenças, pois sua atividade se inclui nos processos sociais que sexualizam a sociedade como um todo, forçando unilateralmente a tolerância aos chamados "desvios de comportamento". 

Os Queers querem "heterossexualizar e/ou homossexualizar instituições, discursos e direitos" pela subversão da tolerância, priorizando comportamentos erotizados, obssessivos e compulsivos, ditados pela psiqué. Sua ideologia não é libertária e sim liberticida, sexista, comportamental, provocativa, movida pelo rancor social e pela apologia dos "desvios" como ação revolucionária. 

Segundo seus teóricos, o movimento Queer objetiva inverter a perspectiva social como qualquer outro movimento de cunho esquerdizóide. No entanto, propõe como estratégia revolucionária explicitar a sexualização da sociedade sob a ótica dos "socialmente estigmatizados".

Identificados os agentes da transformação, o movimento Queer prioriza identidades sociais "desviantes", que passa a considerar absolutamente normais. Sua noção de "cidadania" é baseada na identidade dos "sujeitos do desejo", que os queers classificam como legítimos e ilegítimos - sendo "ilegítimos" todos os que se firmam na conduta acorde com o senso comum, natural, seguindo vocação biológica. Neste rol de "ilegítimos", os queers incluem homossexuais com comportamento "familiar" ou "moralmente enquadrado na estrutura burguesa".

Os Queers desprezam gays e lésbicas que não lutam para a "mudança radical da sociedade". Também não consideram parte de seu movimento os transsexuais que buscaram a medicina visando um "enquadramento social". Consideram que estas "culturas sexuais", uma vez normalizadas, não mais apontam para a mudança social - tal qual entendem ocorrer com a conduta heterossexual...

É a subversão dos subvertidos. O movimento Queer pretende representar o sonho marcuseano do resgate puro da aliança entre a marginalidade e a intelectualidade contra toda a "ordem burguesa". Vai além: quer transformar a compulsão, a obsessão e a perversão em formas toleráveis de comportamento social. É assim que propugna a subversão revolucionária dos valores "burgueses".

Daí o interesse em privilegiar extremos comportamentais, como a travestilidade, a transgêneridade e a intersexualidade, "culturas sexuais não-hegemônicas" caracterizadas pela "subversão". Também objetiva, o movimento Queer, o "rompimento com normas socialmente prescritas de comportamento sexual e/ou amoroso" - leia-se: apologia à pedofilia, sadomasoquismo, zoofilia, etc... como "atos libertários".

O modus operandi do movimento é a "performance"... a apologia à psicopatia como forma de agressão. 

Foi nesse contexto "suavemente psicopata" que ocorreu a "mostra cultural do Santander". Foi um evento provocativo como são provocativas todas as performances queer em manifestações, as injúrias em locais públicos e os comportamentos absolutamente inadequados em recintos submetidos a alguma disciplina de convivência comum.

É preciso repetir. Não se trata de movimento democrático, pluralista ou "libertário". Pelo contrário, é radical, liberticida, preconceituoso, sexista e perverso - na mais ampla conotação que se possa dar ao termo.

O declínio da ideologia de gênero

Enquanto no Brasil somos obrigados a suportar os Queers por não sabermos diferenciar joio e trigo no ativismo homossexual - e nem o movimento parece sabê-lo - no mundo mais civilizado a coisa começa a mudar. 

Os países nórdicos já começaram a reagir ao movimento, que teve na região profunda influência, com resultados desastrosos.

Os governos da Suécia, Dinamarca, Finlândia e Islândia, determinaram a suspensão dos financiamentos até então concedidos ao Instituto Nórdico de Gênero, entidade promotora de ideias ligadas às chamadas “teorias de gênero“ - ponta de lança do movimento Queer.

A medida veio após a exibição, em 2010, do filme “Hjernevask” (“Lavagem Cerebral”), que questionava os fundamentos científicos dessas teorias – que, de fato, não passam de teorias sem comprovação empírica. No filme fica patente o comportamento anti-científico dos teóricos do gênero, que negam o fundamento biológico nas diferenças de comportamento entre homens e mulheres, afirmando que elas se devem meramente a construções sociais, enquanto cientistas mostram resultados de testes empíricos que constatam diferenças inatas nas preferências e comportamentos de homens e mulheres.

No vídeo, a “filósofa do gênero” Catherine Egeland, uma das entrevistadas, chega a afirmar que “não se interessa nem um pouco” por esse tipo de ciência e que “é espantoso que as pessoas se interessem em pesquisar essas diferenças” (!). A declaração selou o destino do "queerismo" em direção à incompatibilidade com o pluralismo e a democracia. 

É preciso, portanto, parar de confundir as bolas. O movimento Queer, apenas explicita melhor o funesto labirinto de conceitos e preconceitos que a ideologia de gênero pretende implantar na sociedade democrática.

Vamos por partes

A transexualidade orgânica é fenômeno muito raro. Diz respeito ao campo da medicina e demanda apoio da psiquiatria e da psicologia. O interesse do direito é de natureza civil, quanto à adoção da identidade.

Fenômeno absolutamente diverso é o homossexualismo - que nada tem de "raro" e cujo componente genético é hoje reconhecido pela medicina. Daí, portanto, demandar tutela na aceitação social.
Esses biotipos têm seu lugar na vida, tal qual os biotipos heterosexuais.

A desgraça da ideologia de gênero, e que revela sua periculosidade, foi pretender misturar fenômenos naturais com manifestações de caráter comportamental complexo, ligadas à libido, aliando manifestações artísticas, performáticas, estereótipos, distúrbios psicológicos e até psicopatias no mesmo discurso de "aceitação social".

Essa imensa bobagem militante, carregada de recalques, rancores, vitimizações, hipocrisias, ignorâncias e ma fé, vem reforçando preconceitos e ostentando estereótipos que esgarçam a fibra da tolerância social.

Assim...

O gênero humano é um só, composto de indivíduos de sexos opostos, masculino e feminino. Já a sexualidade pode ser determinada por fatores naturais, envolvendo atratividade por indivíduos do mesmo sexo, bem como pode incorrer em paradoxos afetos à medicina, como é o caso da transsexualidade. Fora isso, incorre-se no domínio vasto e complexo dos comportamentos compulsivos, obssessivos e dos hábitos extravagantes. Transformar e segregar este universo em "gêneros" é negar a natureza humana e desumanizar a sexualidade.

O documentário norueguês está chegando tarde ao Brasil...

Enquanto o documentário não vem, bancos precariamente administrados no campo da relação com a sociedade, como o Santander, patrocinam um movimento rancoroso e preconceituoso, pretextando combater o preconceito sexual, apoiados por uma mídia ignorante.

A mostra do Santander sofreu pela péssima comunicação e pela má fé em não explicitar a ideologia por trás do "Queermuseu". Submeteu estudantes de escolas públicas e inocentes desavisados a provocações pedófilas, cenas de zoofilia e de perversões provocativas, emolduradas ou esculpidas.

Não foi arte, foi proselitismo sob o pretexto de pregar "tolerância transgênero" e "liberdade de escolha". 

O problema, no entanto, é que segundo os organizadores da mostra queer, a "escolha", por ser comportamental, não guarda relação com o crescimento e o amadurecimento do ser humano, pode ser "conquistada" desde a tenra infância... ainda que prejudique para sempre a vida e a determinação biológica da criança. 

Fontes: 
Por: Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro da Comissão de Direito Ambiental do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e da Comissão Nacional de Direito Ambiental do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. É Editor- Chefe do Portal Ambiente Legal, do Mural Eletrônico DAZIBAO e responsável pelo blog The Eagle View.