segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

JAPÃO USA OITO VEZES MAIS AGROQUÍMICOS DO QUE O BRASIL


Campeão em longevidade, Japão usa oito vezes mais agroquímicos do que o Brasil

Na proporção do uso de agroquímicos pela quantidade de terras cultivadas, Brasil fica atrás de países como Japão, Alemanha, França, Itália e Reino UnidoArquivo


São Paulo (SP) |
01/12/2017 | 
09h50 | 
Marcos Tosi*

A imagem de que o Brasil é o país que mais utiliza agroquímicos no mundo é desconectada da realidade e apenas alimenta mitos e inverdades sobre a segurança dos alimentos produzidos no país. Na proporção de área cultivada, por exemplo, o Japão utiliza oito vezes mais defensivos agrícolas. É o que aponta estudo da Universidade Estadual Paulista em Botucatu (Unesp) apresentado nesta quinta-feira (30) no fórum Diálogo: Desafio 2050 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, promovido em São Paulo pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), Embrapa, Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef).

“Dizer que somos campeões mundiais no consumo de agrotóxicos é uma abordagem simplista e até irresponsável”, diz o professor Caio Carbonari, um dos autores da pesquisa. Segundo ele, apesar de utilizar o maior volume de defensivos (em função do tamanho continental), o Brasil está em 7º lugar na proporção com a quantidade de terras cultivadas, ficando atrás de países como Japão, Alemanha, França e Reino Unido. E se a análise for pelo volume de alimentos produzidos, o país cai para 11º no ranking do uso de defensivos, e passam à nossa frente Argentina, Estados Unidos, Austrália e Espanha.

“Estamos numa situação bastante confortável quando olhamos os dados com a ótica mais adequada. Temos sido muito eficientes no uso da terra e dos insumos, e essa sustentabilidade só é possível por causa ciência e dos agroquímicos”, avalia o pesquisador. “A imagem que se cria do consumo de agrotóxicos no Brasil está desconectada de nossa realidade”, completa.

Gráfico do uso de agroquímicos pelo volume de alimentos produzidos
Gráfico do uso de agroquímicos pela quantidade de terras cultivadas

Mesmo os critérios de proporcionalidade não são os mais adequados para tratar do tema. A situação do Japão é emblemática disso. Na proporção de área cultivada, os japoneses utilizam oito vezes mais agroquímicos do que o Brasil. “Não dá para apontar o dedo para o Japão e dizer que o alimento deles está contaminado, que está prejudicando as pessoas. Afinal, a gente sabe da qualidade de vida e da longevidade dos japoneses”, afirma Carbonari. Segundo dados de 2016 da Organização Mundial de Saúde (OMS), a expectativa média de vida da população japonesa é de 83,7 anos, a mais alta do planeta. No Brasil, a média é de 75 anos.

Qual o melhor critério então para medir o uso equilibrado de agroquímicos? O índice mais adequado seria o EIQ, que vem das iniciais, em inglês, de Quociente de Impacto Ambiental, referenciado pela FAO e pela literatura científica moderna. O EIQ leva em conta os riscos associados ao uso dos agroquímicos nas mais diversas situações, incluindo o mecanismo de ação na planta, a degradação e persistência no solo, e os níveis de toxidade e possíveis riscos de contaminação da água, dos alimentos e do próprio homem, seja o trabalhador rural, seja o consumidor final.

O trabalho de pesquisa analisou dados do uso de agroquímicos nas culturas de soja, milho, algodão e cana de açúcar entre os anos de 2002 e 2015. Em todos os principais quesitos, houve diminuição significativa dos riscos. Para o trabalhador rural, o risco de contaminação diminuiu 54,2%, enquanto para o consumidor a queda foi de 37% e, para o meio ambiente, de 33%.

Caio Antonio Carbonari é pós-doutor pela Unesp Botucatu

“Desde 2004 a gente vem numa tendência clara de equalizar, de estacionar o consumo de agrotóxicos no Brasil; ou seja, na contramão de toda a imagem que se construiu na sociedade brasileira”, diz Carbonari. “Não existe crescimento exacerbado como se divulga. E se falarmos em termos de risco, estamos em situação extremamente positiva, com quedas acentuadas. Comparados com outros países, em qualquer uma dessas culturas, estamos em situação igual ou melhor”.

Para Elisabeth Nascimento, professora de toxicologia da Universidade de São Paulo, compreender a avaliação dos riscos é fundamental para mudar a percepção das pessoas. Ela lembra que desde os anos 80 os produtores rurais vêm sendo orientados sobre como usar corretamente o que chama de “praguicidas”. Para se manterem legalizados no mercado interno, e mesmo para exportar, os grandes produtores sabem da necessidade de seguir o receituário agronômico. A obediência aos parâmetros é fiscalizada, entre outros, pelo Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes, do Ministério da Agricultura, e pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos, da Agência Nacional de Vigilãncia Sanitária. “Temos que lembrar também que os defensivos não são tão baratos assim, então o produtor procura usar nas doses recomendadas”, afirma.

A pesquisadora acredita que a população deveria ser melhor informada sobre o conceito de IDA – ou seja, de Ingestão Diária Aceitável. “Temos hoje no país inúmeros instrumentos que podem nos dizer, com certeza, quanto podemos comer sem correr riscos. Claro que não existe risco zero e nem segurança absoluta. O que mata não é um pouco disso, um pouco daquilo, mas a exposição crônica”, argumenta. 
Do site: http://www.gazetadopovo.com.br/agronegocio/mercado/campeao-em-longevidade-japao-usa-oito-vezes-mais-agroquimicos-do-que-o-brasil-dcxlf3wuo4aduzkar8sdih7bv

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

AVISO DE SPOILER: A PREVIDÊNCIA JÁ QUEBROU!

Em 1988, o país fez uma escolha e criamos a chamada seguridade social que contempla os gastos com educação, saúde e previdência. Também escolhemos que nosso sistema seria o de partilha ao invés de capitalização. A diferença entre os dois é a seguinte: no primeiro, quem contribui hoje paga quem recebe hoje. Os que estão trabalhando pagam para quem está aposentado. No segundo, cada pessoa tem uma conta individual e é responsável pela sua própria contribuição. O Chile e a Austrália utilizam esse sistema.

O sistema de partilha depende muito da demografia do país. Um país jovem se dá ao luxo de ter muitos ativos contribuindo e poucos inativos recebendo. Um país mais velho tem menos ativos para mais inativos. Para a conta fechar em países mais velhos, a contribuição é alta. Via de regra, países desenvolvidos tem populações mais velhas e países em desenvolvimento tem população mais jovem. Isso acontece porque a expectativa de vida aumenta, as pessoas morrem menos e morrem mais velhas também. Para você entender melhor: se ativos e inativos recebessem o mesmo valor bruto e um ativo fosse descontado em 10%, um décimo do salário, precisaríamos de 10 ativos para pagar 1 inativo. As variações do sistema são feitas com base na expectativa de crescimento econômico do país e da sua demografia.

Nosso sistema previdenciário tem muitos problemas. Não vou entrar em cada um dos pontos aqui. São distorções das mais variadas possíveis, da paridade e integralidade do setor público (resolvida para novos entrantes no setor em uma reforma anterior), ao LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social) que é basicamente um valor dado a um idoso caso ele preencha requisitos. Fora as infinitas regras diferentes para cada categoria.

É claro que poderíamos apresentar aqui gráficos históricos com tendência futura com estimativa de quantos anos o sistema poderia se sustentar. O fato é que a previdência é deficitária há muitos anos. O Tesouro precisa cobrir seus rombos todos os anos e vem aqui um fato assustador: o Brasil gasta algo como 15% do PIB com previdência, tendo 5% de idosos em sua população. O Japão também gasta 15% do seu PIB, portanto o mesmo que o Brasil, mas com 26% de idosos na população. Gastamos a mesma coisa que um país que tem 5 vezes mais idosos

A trajetória desse gasto é crescente desde sua criação. Sem a reforma, o próximo presidente precisará fazer escolhas. Com a reforma, talvez consigamos levar o debate para a próxima década. Foco no talvez. O fato é que qualquer pessoa que te diga que a reforma, que aliás já perdeu 40% do seu poder de economia desde que foi criada com as mudanças feitas pelo congresso, estará mentindo para você. E mais, estará condenando a próxima geração que pagará a conta pelas péssimas escolhas que fizemos. A mudança será feita ou o país quebrará. 
Por Heitor Machado  Do site: www.institutoliberal.org.br

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

A VOLTA DO PÊNDULO


A VOLTA DO PÊNDULO : HORA DO RETORNO AO REGIME AUTORITÁRIO NO BRASIL?

De crise em crise o coração da nação pulsa entre aberturas democráticas e fechamentos institucionais

General Golbery do Couto e Silva - tese da alternância política do mentor do regime militar volta ao cenário

"Não interrompa uma pessoa que lhe conta algo que você já sabe.
Uma história nunca é contada duas vezes da mesma maneira 
e é sempre bom ter mais uma versão".Golbery do Couto e Silva

A volta do pêndulo 

O pêndulo das liberdades democráticas no Brasil parece ter chegado no seu ponto de inflexão. As sucessivas crises institucionais, o esgotamento do modelo constitucional, a profunda crise de liderança e a perda de qualidade dos quadros à testa dos poderes da República apresenta um quadro de descontrole que ameaça a Ordem Econômica e Social, a Ordem Pública, a Administração do Estado, a propriedade e a segurança do cidadão.

Elementos essenciais para a composição do tecido social, como a família, a segurança jurídica e a moralidade, passaram a ser vergastados por programas emanados da própria estrutura jusburocrática inoculada nos três poderes.

À crise política, soma-se a depressão econômica. 

As raízes estruturais dessa deseconomia sistêmica afetam diretamente o Estado e, embora já diagnosticadas, não encontram respaldo governamental, legislativo e judicial, para um efetivo combate. Pelo contário, as reformas necessárias encontram forte resistência na própria base do governo. 

No campo fiscal, a pesada jusburocracia de Estado compromete o Tesouro e avança sobre os depósitos e poupança popular ampliando a dívida pública e comprometendo a previdência. Literalmente, dezenas de milhões de trabalhadores do setor privado, hoje, pagam uma previdência pública para sustentar algumas centenas de milhares de funcionários privilegiados, enquanto se vêem obrigados a recorrer, cada vez mais, a uma previdência privada. A previdência tornou-se um programa de transferência de renda dos pobres para os privilegiados no Brasil. 

Surge o paradoxo: o Estado devora a própria sociedade que o compõe, e a estrutura política que sustenta a ambos está à beira do colapso.

O corpo social, no limite da tolerância, pode estar prestes a reagir, e a correção de rumos irá demandar centralização e eventual reforma autoritária - a volta do pêndulo.

Como nas vezes anteriores, o problema pode não estar na assunção de um período de centralização e, sim, nos "guardas da esquina", que dele se aproveitam. 

Sístoles e Diástoles no coração da República

Já vimos isso antes, várias vezes, no Brasil. Alberto Torres e Oliveira Viana também já haviam diagnosticado esse pêndulo - sistematizado pelo General Golbery do Couto e Silva como entendimento da política de Estado no contexto cronológico e geopolítico.

Golbery, resumiu toda a ópera: a história política do Brasil é pendular, oscila entre a centralização e a descentralização, entre regimes autoritários e democráticos.

Em 1º de julho de 1980, o General Golbery proferiu longa conferência na ESG - Escola Superior de Guerra, abordando a centralização e a descentralização da administração.

Golbery situou a centralização como a opção indisfarçável dos regimes arbitrários e a descentralização como o modelo mais compatível com os sistemas democráticos(*1). Remeteu a centralização adotada pela intervenção militar de março de 1964, aos fatores de crise que interferiram na consolidação da autoridade do Poder Central. Justificou a conservação do modelo por um período além do desejável, relacionando dentre os fatores de instabilidade o aparecimento imprevisto dos surtos terroristas. Defendeu então o pluralismo partidário, como modelo mais flexível para governos negociarem saídas nos momentos de crise.

O movimento cardíaco da sístole (contração) e diástole (dilatação) foi a metáfora encontrada pelo gênio estratégico de Golbery para contextualizar o período de abertura política, então em curso no histórico processo pendular brasileiro.

Nessa ocasião, a abertura política estava em plena marcha de consolidação, visando encerrar a "sístole" - o chamado "período de exceção", iniciado em 1964.

Iniciada no governo Geisel e cumprida à risca pelo sucessor João Figueiredo, a abertura política seguiu "firme e gradual", apesar dos solavancos ocorridos - dentre eles o frustrado atentado à bomba no Riocentro (fato que levou à saída de Golbery da chefia da Casa Civil), as manifestações populares e a decretação das medidas de emergência no Distrito Federal, para a votação da Emenda Constitucional pelas eleições diretas. 

Com a eleição de Tancredo Neves pelo Congresso Nacional, o General João Figueiredo terminou seu mandato, completando a transição para a Nova República. 

Como ensina Sir Basil Liddell Hart, o melhor exército se conhece "nas derrotas", principalmente quando se retira do teatro de operações. No caso brasileiro, os militares desmobilizaram seu aparato de intervenção e se retiraram da política, de forma organizada e sem conflitos, seguindo os preceitos reeducadores propugnados por Golbery e conferindo, com sucesso, suporte à transição para a Nova República.

Golbery foi o cérebro por trás de todo esse processo. Observou a necessidade de ver a estratégia para além do contexto militar. Aduziu que “a estratégia deixa de ser apenas a arte dos generais, é também estratégia econômica, estratégia política, estratégia psicossocial [...]”, e no que se refere à segurança nacional, considerou que “a estratégia é a Política de Segurança Nacional”, e ainda, “é o grau relativo de garantia que o Estado proporciona à coletividade nacional, para a consecução e salvaguarda de seus Objetivos [...]”(*2).

Em verdade, a visão conceitual de Golbery já alcançava o caráter híbrido inserido nos "conflitos assimétricos" (*3), atualmente ocorrentes no mundo . 

Como meio de resolução da crise em direção a um Estado pluralista, propôs Golbey, na célebre conferência da ESG, as seguintes medidas reeducadoras de convivência democrática:
a) evitar pronunciamentos de militares que indiquem sintomas de enfraquecimento do governo;
b) procurar legitimar nos conflitos sindicais, soluções negociadas que evitem as situações de confronto;
c) desconhecer entidades estudantis não legalmente reconhecidas e desconfiar sempre do sentido de movimentos que aliem professores e alunos; e
d) reprimir por meios legais manifestações consideradas impróprias que ocorram contra o governo, tanto no meio parlamentar quanto por parte dos órgãos de comunicação.

Sábias lições, aprendidas na transição para a "Nova República", porém não aplicadas pelos novos quadros dirigentes republicanos...

Brossard, a ação pendular e a baixa qualidade dos quadros republicanos

De fato 

Se com o advento da "Nova República", consolidada com a Constituição de 1988, iniciou-se a "diástole" democrática, entremeada por crises em volume crescente, agora parece crer que o pêndulo esteja se movendo na trajetória inversa...

Não é difícil perceber a harmonização do movimento com o contexto geopolítico mundial. 

O Brasil segue o movimento pendular que hoje já ocorre em escala global, consolidando posições das grandes potências face à assimetria dos conflitos em curso no globo. Da China aos Estados Unidos, passando por Rússia, Alemanha e o resto da Europa, o pêndulo oscila em direção ao pulso firme.

Essa harmonização também se deve à perda de qualidade e substância das lideranças. Me lembro, a propósito, de uma célebre palestra do Senador Paulo Brossard, que pude assistir pessoalmente no Hotel Macksoud, em São Paulo, no final dos anos 80.

Em pleno período de implementação da "Constituição Cidadã", Brossard já previa o desastre a médio e longo prazo, ao lado de um incrédulo e como sempre ensimesmado FHC.

Brossard convalidava a análise de Golbery quanto às sístoles e diástoles. Porém, afirmava que as crises ocorriam por conta de estarmos sofrendo uma perda contínua de qualidade, de preparo intelectual e capacidade de governança nos quadros da política brasileira. Senão vejamos: 

As crises nas repúblicas da República

1ª República:

A República de 1889 surgiu da união dos novos e brilhantes bacharéis com o velhos e experientes generais do Exército imperial, sob o patrocínio do ascendente capital cafeeiro e industrial. 

Articulados com o que havia de mais atual na modernidade europeia, os novos bacharéis republicanos estavam empenhados em buscar uma identidade nacional e implementar os princípios basilares do Capitalismo - gerado no Brasil somente a partir da lei de 1850 (que instituiu a propriedade privada). O país, de fato, acabava de receber suas primeiras ondas de imigrantes e abolir o regime de escravidão. 

Os entusiasmados bacharéis - nata da aristocracia cafeeira, capitaneados por Prudente de Morais e orientados por juristas do escol de Ruy Barbosa, uniram seu capital ao exército - formado por velhos e experientes oficiais (temperados pela Guerra do Paraguai e pelas revoltas regionais), assumiram o aparelho de Estado imperial sem encontrar resistência e simplesmente "demitiram" a família real, que tomou o rumo do exílio. 

A República de 1889 representou uma grande diástole. Estruturada com a Constituição de 1891, conferiu autonomia aos estados da federação e liberdade partidária. Estabeleceu eleições diretas para a Câmara e o Senado e a escolha do Presidente (embora soldados, religiosos, analfabetos e mulheres ainda não votassem). 

A queda de qualidade no estamento político não tardou a ocorrer. 

Ao par do suporte da economia privada, o coronelismo reinante na política desde os tempos imperiais promoveu a gradual substituição das águias da república pelos falcões dos interesses paroquiais e destes pelos corvos e urubus da burocracia partidária. A degradação ocasionou o "triunfo das nulidades", denunciado por Ruy Barbosa em seu célebre discurso na formatura da turma de 1922, na Faculdade de Direito de São Paulo.

As eleições “a bico de pena” não resistiram à crise tenentista de 1922, à revolução paulista de 1924, à Coluna Prestes de 1927 e à crise econômica mundial de 1929. Tudo ruiu com a Revolução de 1930, impulsionando o pêndulo na direção do centralismo e o coração da república no impulso da sístole.

2ª República e Estado Novo:

Getúlio assumiu o poder pela força, sob os escombros da República Velha, anunciando uma nova democracia. Porém, adotou um regime de intervenção. 

Após a revolução sangrenta de 1932 em São Paulo, a constituição caótica e corporativista de 1934 e a covarde intentona comunista de 1935, cumpriu ao caudilho gaúcho provocar o golpe do Estado Novo, em 1937, instalando uma ditadura em moldes fascistas no Brasil. 

Por meio do regime ditatorial, Getúlio pôde conduzir a transformação da base econômica brasileira em direção à industrialização e urbanização - em especial com a instalação da indústria de base (siderurgia). Getúlio não estava sozinho, o movimento pendular seguia a inércia da política internacional, clamando por um Estado provedor, liderado por um poder executivo hegemônico.

Adveio a II Grande Guerra e, após ela, o modelo getulista restou fora do contexto. 

3ª República: 

Getúlio caiu. Porém, próceres e experientes políticos da República Velha ainda se encontravam vivos no cenário nacional, bem como a geração de ministros de primeira linha consolidados no período getulista. 

Assim, a Constituinte liberal de 1946 contava com três ex-presidentes da República, líderes políticos importantes à direita e à esquerda, incluso os comunistas, e juristas de escol responsáveis pela construção do direito brasileiro. Esta talvez tenha sido a razão de se ter uma Constituição liberal e estruturante, que permitiu à Terceira República administrar as crises de governança transcorridas nos 18 anos seguintes.

No entanto, os quadros que formaram o arcabouço constitucional de 1946 não chegaram à metade da década de 1950. O Brasil perdeu seus líderes mais antigos por "decurso de prazo". As novas lideranças, criadas no período da ditadura getulista e durante a guerra, carregaram para dentro do governo todos os vícios relacionados ao caudilhismo e à polarização ideológica da nascente guerra fria.

A transição foi complexa. Getúlio reassumiu democraticamente, propondo um projeto nacionalista em moldes populistas absolutamente desconforme com a ideia liberal projetada no regime constitucional. A disparidade de contextos impulsionou um mecanismo de paradoxos, como o discurso nacionalista do "o petróleo é nosso" e a sucessão de escândalos de corrupção do "mar de lama". 

O suicídio de Getúlio, seguido de revoltas militares localizadas, tentativas de golpe e sucessivas trocas de governo, encontraram um breve hiato de estabilidade no programa econômico e desenvolvimentista de JK - centrado em um projeto nacional e geopolítico, de modernização da infraestrutura nacional. Juscelino, por sua vez, demonstrou rara habilidade para contornar as crises militares e concentrar esforços na construção da nova Capital do Brasil.

Porém, o populismo retomara as rédeas da república. Sobrevieram a eleição e renúncia de Jânio Quadros, a crise militar da rede da legalidade montada por Brizola (para garantir a assunção do Vice, João Goulart), a introdução casuísta do regime parlamentarista, o plebiscito de 1963 - restaurando o regime presidencial, a explosão sindicalista e a crise de hierarquia nas Forças Armadas. 

1964: O horizonte novamente se escurece

A crise se deveu, mais uma vez, à má qualidade das lideranças - inexperientes, sem vivência democrática, principalmente na formação intelectual. 

Os novos quadros da terceira república abandonaram o Estado Novo getulista para singrar o mar do regime democrático dos anos 50, abrigados nos barcos furados das afirmações ideológicas totalitárias peronistas, nasseristas, stalinistas, castristas e no engajamento sem neutralidade de Foster Dulles, condicionados pelo pesadelo da Guerra Fria. 

Assim, após reações populares de grandes proporções, nas ruas das principais capitais do país - algo que a mídia engajada insiste até hoje em ignorar, o estamento militar engrena a tomada do Poder pelo golpe de Estado - tal qual na primeira, segunda e terceira repúblicas - com ocupação militar e defenestramento dos quadros do regime anterior.

O golpe militar de 1964, como revelou Golbery e afirmava solenemente o Marechal Castelo Branco, era novamente uma "ação de transição". 

Porém, a edição do Ato Institucional nº1 demonstrou que o quadro militar não desocuparia o poder até "restaurar no Brasil a ordem econômica e financeira e tomar as urgentes medidas destinadas a drenar o bolsão comunista, cuja purulência já se havia infiltrado não só na cúpula do governo como nas suas dependências administrativas". 

Claro estava a intenção de alterar as estruturas em vigor, como afirmava o preambulo do Ato Institucional (invenção normativa do mesmo autor do mecanismo dos Decretos do Estado Novo, Francisco Campos): 

"A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma. Ela destitui o governo anterior e tem a capacidade de constituir o novo governo. Nela se contém a força normativa, inerente ao Poder Constituinte. Ela edita normas jurídicas sem que nisto seja limitada pela normatividade anterior à sua vitória. Os Chefes da revolução vitoriosa, graças à ação das Forças Armadas e ao apoio inequívoco da Nação, representam o Povo e em seu nome exercem o Poder Constituinte, de que o Povo é o único titular. O Ato Institucional que é hoje editado pelos Comandantes-em-Chefe do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, em nome da revolução que se tornou vitoriosa com o apoio da Nação na sua quase totalidade, se destina a assegurar ao novo governo a ser instituído, os meios indispensáveis à obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil, de maneira a poder enfrentar, de modo direto e imediato, os graves e urgentes problemas de que depende a restauração da ordem interna e do prestígio internacional da nossa Pátria. A revolução vitoriosa necessita de se institucionalizar e se apressa pela sua institucionalização a limitar os plenos poderes de que efetivamente dispõe."

Preocupados com a questão secular das sinecuras e benesses conferidas à elite do funcionalismo público, cientes que não procederiam à "limpeza" sem interferir no regime de privilégios, os militares não hesitaram em atacar o instituto da estabilidade funcional no próprio Ato Institucional nº1: 

"Art. 7º - Ficam suspensas, por seis (6) meses, as garantias constitucionais ou legais de vitaliciedade e estabilidade.

§ 1º - Mediante investigação sumária, no prazo fixado neste artigo, os titulares dessas garantias poderão ser demitidos ou dispensados, ou ainda, com vencimentos e as vantagens proporcionais ao tempo de serviço, postos em disponibilidade, aposentados, transferidos para a reserva ou reformados, mediante atos do Comando Supremo da Revolução até a posse do Presidente da República e, depois da sua posse, por decreto presidencial ou, em se tratando de servidores estaduais, por decreto do governo do Estado, desde que tenham tentado contra a segurança do Pais, o regime democrático e a probidade da administração pública, sem prejuízo das sanções penais a que estejam sujeitos. 

§ 2º - Ficam sujeitos às mesmas sanções os servidores municipais. Neste caso, a sanção prevista no § 1º lhes será aplicada por decreto do Governador do Estado, mediante proposta do Prefeito municipal."
A Constituição de 1967, institucionalizou o regime militar. Manteve o bipartidarismo criado pelo Ato Adicional nº 2 e estabeleceu eleições indiretas para presidente da República.


Conflagrado o quadro pela reação esquerdista inspirada nas guerrilhas cubanófilas e nos atentados terroristas na europa, o sistema militar reagiu. Ampliou a "sístole" com a edição do Ato Institucional nº 5, em dezembro de 1968, seguido da Emenda Constitucional nº1, de 1969, que incorporou aquele, permitindo ao presidente da República cassar mandatos de parlamentares e magistrados, suspender os direitos políticos dos cidadãos, por congresso em recesso e legislar sobre matéria política, eleitoral, tributária e econômica. 

O Executivo passou a substituir o Legislativo e o Judiciário, concedendo-lhes, em contrapartida, gordos salários e vantagens funcionais...

Foi o grande erro estratégico do governo militar. 

O sistema de arbítrio permitiu o avanço do cancro da corrupção na estrutura policial e na baixa burocracia (os "guardinhas da esquina" preconizados por Pedro Aleixo). As benesses concedidas em troca da docilidade perante o poder gerou um estamento de jusburocratas e parlamentares viciado em privilégios e protegido pela estabilidade, que se tornariam os "guardiões" da Constituição de 1988.

Vale dizer, consolidou a secular casta de "marajás" com poder normativo e jurisdicional. 

A Nova República e o fim da Constituição de 1988

Os militares cumpriram com um processo gradual de retirada das Forças Armadas do Cenário Político Nacional, deixando a administração do Estado para os quadros civis da "Nova República. Não o fizeram por coação e, sim, com planejamento, cientes do esgotamento iminente do seu sistema de governança. 

No entanto, os quadros civis que assumiram a estrutura política do governo central foram os mesmos responsáveis pelo seu esfacelamento em 1964, com raras exceções.

O partido responsável pelo eixo de transformações que marcaram a nova república havia sido criado na reforma partidária introduzida pelo Ato Institucional nº2, com a junção de forças opositoras ao governo militar: o Movimento Democrático Brasileiro, hoje denominado PMDB. 

O PMDB foi o início, o meio e o fim da Nova República. 

Os partidos que o sucederam no Poder Central da República, PSDB e PT, tornaram-se, de uma forma ou outra, reféns do apoio peemedebista. 

A "Constituição Cidadã", de 1988 consolidou a maior de todas as diástoles políticas até então produzidas na história do Brasil. Porém, elevou criticamente a pressão do organismo nacional, que, agora, parece estar recolhido à UTI. 

Dos oito chefes de Estado da Nova República, um morreu antes de sentar na cadeira presidencial, três assumiram na condição de vices no impedimento do titular, dois titulares sofreram impeachment, dois foram eleitos e reeleitos, cumprindo o mandato até o fim. 

Uma grande reforma do Estado foi executada nos anos 90, com FHC. Uma ampla sucessão de programas sociais e projetos estruturantes foram implementados na primeira década do século XXI, com Lula. Três reformas econômicas resultaram em retumbantes desastres - com Sarney e seu Cruzado, Color e seu confisco da poupança e Dilma e sua política de dirigismos e pedaladas fiscais. Uma reforma econômica mudou a face do país, com Itamar Franco e seu Plano Real. 

Temer encetou o seu programa "Ponte Para o Futuro", iniciando um conjunto de reformas, procurando atrair investimentos e estancar a sangria fiscal provocada pelo governo Dilma. 

Dilma saiu pela porta dos fundos, para entrar no rodapé da história. 

Sob os escombros do lulopetismo, afogados no mar de lama e destruídos pela judicialização absoluta da política nacional, jazem os corpos da Nova República de 1985 e da Constituição de 1988. 

O Lulopetismo, apeado do Poder, não saiu de cena. Permanece moribundo, sustentado por militantes sem rumo e colado ao fantasma do regime cuja Constituição, ironicamente, haviam os petistas recusado ratificar...

Os inimigos da República

A assimetria, reinante nos conflitos deste novo século, muitas vezes nubla a visão do analista mais atento ao cenário político. No entanto, é possível divisar no horizonte da república e nos seus órgãos intestinos, a chusma de inimigos que poderá enterrá-la mais cedo que parece, apressando a velocidade do pêndulo. 

O inimigo interno, inoculado no próprio Estado, é justamente o guardião da zumbilândia normativa da Nova República: a jusburocracia instalada no Poder Judiciário e também aboletada nas carreiras jurídicas, existentes nos demais poderes da República. 

Esse bolsão de benesses autoconcedidas, engordado no regime militar e perenizado pela Constituição de 1988 dá-se o direito de não apenas ditar normas como negar validade àquelas que não lhe convém. 

Senhora dos organismos de controle, cuja proporção é de pelo menos três para cada unidade de execução na Administração Pública, a jusburocracia ganha méritos pela negatividade - quanto maior o número de "não aprovações", maior será seu poder junto aos poderes. Nela reside a maior responsabilidade pela paralisia quase absoluta da máquina do Estado Nacional. 

Nada mais é decidido, em todos os níveis de governo. Dos contratos aos concursos, passando pela aprovação de obras e serviços. 

A batalha contra esse bolsão constitui um dos eixos justificadores da demanda por uma nova sístole republicana. A exemplo do Ato Institucional nº1, com certeza deverá merecer a suspensão de "direitos adquiridos", "estabilidades" e outras tantas regalias. 

Antes, porém, será preciso consertar e concertar o quadro político. 

Par e passo com a falta de maiores perspectivas, além das reformas já postas na pauta do atual governo, o que se vê é um absoluto vazio. 

Para "encerrar o expediente", cerrar as portas e apagar a luz, restou outro inimigo, o PMDB, Partido do Movimento Democrático Brasileiro - o porteiro do dia e da noite de todos os arranjos de poder ocorridos no período da Nova República. 

Passadas as tentativas de golpe institucional patrocinadas pela "República dos Delatores" e a chefia da procuradoria da república, o governo de transição peemedebista, no entanto, presencia um quadro de absoluta falta de alternativas para sua própria sucessão. 

Mergulhado no fisiologismo, sem o qual não consegue empurrar uma máquina que nada mais decide em prol do país, o governo central peemedebista, ocupa-se apenas em corrigir o quadro fiscal e encetar as reformas estruturais necessárias para manter vivo o estado de coisas. No resto, vários de seus quadros continuam a praticar o bom e velho fisiologismo, como se o enorme fluxo de operações de rescaldo e combate à corrupção não abalasse a carreira de "acertos" de vários dirigentes ativos - um comportamento próximo de um fenômeno digno de pesquisa acadêmica criminológica. 

Outro grande inimigo da República é a falta de novos (e mesmo velhos) talentos. Não há líderes disponíveis para a sucessão do Presidente. Não há programas definidos, apontando saídas concretas para a crise - a não ser o plano de reformas já proposto pelo governo.

Há partidos sem legitimidade e candidatos sem discurso. Os falastrões que aparecem apresentam fórmulas idênticas aos velhos ternos surrados - daqueles que saem do guarda-roupa sozinhos, em direção aos lugares habituais, sem mesmo vestirem os donos.

Almofadinhas xexelentos patrocinados por uma mídia idiotizada, tentam ensaiar uma sucessão da "República dos Militontos" para uma "República dos Mauricinhos". Por outro lado, a simbiose entre Lula e Bolsonaro promete prorrogar a vida dos dois em prejuízo da necessária comunhão nacional. O fato só demonstra o tamanho do vazio na garrafinha esquerdista nacional. 

Outro grande inimigo da República, à esquerda, hoje, é o PSDB. Este partido formado por ególatras autocentrados ensaia passos conservadores enquanto subscreve manifestos esquerdizóides que até um petista aprovaria... Ensaia verdadeiros "passos de Janio Quadros", como na famosa foto de Emo Schneider para o Jornal do Brasil, ganhadora do Prêmio Esso de Jornalismo de 1962.

Os tucanos, quando o ego deixa, apresentam-se como próceres da segurança jurídica, quando, na verdade, poderão disparar os mais sérios conflitos institucionais na República. A "esfinge" Geraldo Alckmin representa o tucanato menos tucano de toda a história do partido. O candidato parece, mais uma vez, querer "cair por gravidade" na cadeira presidencial, na ausência de opções do eleitorado nacional. 

Já os petistas e seus satélites, hoje, não representam "ameaça política" e, sim, criminológica. Todos deveriam ser recolhidos à prisão.

Na falta de quadros, inteligência e propostas, sobra a ameaça do populismo. A grande praga parece querer produzir as catarses necessárias para legitimar-se, de novo, no poder.

Já disse uma vez que "da queda em desgraça sem qualquer glória do 'Socialismo do Século XXI' europeu e latino-americano, á ascensão da neo-direita nacionalista e xenofóbica franco-anglo-americana, passando pelo populismo muçulmano turco-iraniano, o mundo tem acumulado sucessões de experiências negativas de ordem populista, mas parece disposto a continuar involuindo politicamente até o momento em que o somatório desses experimentos disparar o gatilho de um novo conflito mundial..." (*4).

A sinalização disso não é boa, no mundo e no Brasil. Nuvens negras aparecem no horizonte, praticamente sem relevo...

Olhando o Brasil atual, a situação parece mesmo favorável à sístole política.

A alternativa, no entanto, pode ser a adoção de roteiro comportamental similar ao apresentado por Golbery na ESG, em 1981, acima já exposto, adaptado para a dimensão assimétrica dos conflitos atuais.

De uma forma ou de outra, o estamento militar deve estar preparado para a mobilização. 

Importante, no entanto, desta vez, saber controlar "os guardas da esquina"...

Notas:


*1 in FGV-CPDOC, http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/silva-golberi-do-couto-e, visto em 28/11/2017


*2 Silva, Golbery do Couto e: "Geopolítica do Brasil", ed.Bibliex, 1967, pg. pg. 144-145, pg.155


*3 Pedro, Antonio Fernando Pinheiro: "Neoparamilitarismo, Conflitos Assimétricos, Interesses Difusos e Conflitos de 4ª Geração", in Blog - The Eagle View, set.2015, http://www.theeagleview.com.br/2015/09/paramilitarismo-direito-e-conflitos-de.html, visto em 30/11/2017
*4 Pedro, Antonio Fernando Pinheiro: "Populismo, Catarse e Tragédia", in Blog - The Eagle View, abr.2017, http://www.theeagleview.com.br/2017/04/populismo-catarse-e-tragedia.html, visto em 30/11/2017


Por: Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa - API. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.

domingo, 10 de dezembro de 2017

QUANDO FOI CRIADO O "POVO PALESTINO"? O GOOGLE TEM A RESPOSTA.

-  Todos aqueles que nasceram durante o período do Mandato Britânico da Palestina entre 1923 e 1948 tinham o termo "Palestina" carimbado nos passaportes. Acontece que os árabes ficavam ofendidos quando eram chamados de palestinos. Eles reclamavam: "não somos palestinos, somos árabes. Os palestinos são os judeus.


-  Após os exércitos árabes invasores serem derrotados, uma parcela de árabes locais que haviam fugido da guerra queriam voltar, mas eram considerados quinta coluna, não sendo portanto convidados a voltarem. Os árabes leais, que permaneceram em Israel durante a guerra e seus descendentes ainda estão em Israel, representando hoje um quinto da população do país. Eles são conhecidos como árabes israelenses. Eles têm os mesmíssimos direitos de judeus e cristãos, com a exceção de que não são obrigados a servirem o exército. Eles podem servir se assim o desejarem.

-  "O povo palestino não existe. A criação de um estado palestino é apenas um meio para continuar a nossa luta contra o Estado de Israel em nome da unidade árabe. Na realidade, hoje não há nenhuma diferença entre jordanianos, palestinos, sírios ou libaneses." – em entrevista concedida pelo líder da OLP Zuheir Mohsen em março de 1977 ao jornal holandês Trouw.
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Em um editorial do Guardian de 1º de novembro de 2017, antecedendo o 100ºaniversário da Declaração Balfour, o presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmoud Abbas, pediu à Grã-Bretanha que "peça desculpas" pelo século de "sofrimento" que o documento, segundo ele, trouxe ao "povo palestino". Abbas reiterou as reivindicações que vem fazendo desde 2016, para justificar uma surreal ação judicial que ele ameaça ingressar contra a Grã-Bretanha por ela apoiar a "criação de uma pátria para um povo (judeu), afirma ele, "resultando na desapropriação e perseguição contínua de outro".

"Palestinos" eram os judeus que viviam juntamente com muçulmanos e cristãos em uma terra chamada Palestina, que estava sob administração britânica de 1917 a 1948.

Todos aqueles que nasceram naquele território durante o período do mandato britânico tinham o termo "Palestina" carimbado nos passaportes. Acontece que os árabes ficavam ofendidos quando eram chamados de palestinos. Eles reclamavam: "não somos palestinos, somos árabes. Os palestinos são os judeus".

Bernard Lewis explica:

"Com o surgimento e disseminação de ideologias pan-árabes, os palestinos começaram a fazer questão em afirmar que eles eram árabes, não sírios do sul. Ao longo do período remanescente do mandato britânico e por muitos anos depois disso, as organizações palestinas se autodenominavam árabes e manifestavam sua identidade nacional em termos árabes, não em termos palestinos, nem em termos sírios".

Quando Israel declarou a independência em 14 de maio de 1948, os exércitos de cinco países árabes se uniram para destruir no berço a incipiente nação judaica. Após serem derrotados, uma parcela de árabes locais que haviam fugido da guerra queriam voltar, mas eram considerados quinta coluna não sendo portanto permitida a sua volta. Os árabes leais permaneceram em Israel durante a guerra e seus descendentes ainda estão em Israel, representando hoje um quinto da população do país. Eles são conhecidos como árabes israelenses. Eles têm os mesmíssimos direitos dos judeus, com a exceção de que não são legalmente obrigados a servirem o exército. Eles podem se voluntariar a servir se assim o desejarem.

Os árabes israelenses têm seus próprios partidos políticos. Eles são membros do Knesset (Parlamento de Israel) e trabalham em todas as profissões. A moral da história é ou deveria ser: não comece uma guerra a menos que esteja preparado para a derrota, como aconteceu recorrentemente com os árabes de Israel e com seus vizinhos em 1947/1948, 1967 e 1973.

A propósito, o território mantido pelo Mandato Britânico da Palestina como fiel depositário para os judeus, inicialmente incluía todas as terras que hoje pertencem ao Reino da Jordânia, que teve sua independência concedida em 1946 como Reino da Transjordânia.

(Imagem: Wikimedia Commons)

Menos de uma semana após a publicação do artigo no Guardian, Omar Barghouti, incitador das investidas de hoje de destruir Israel por meio do sufocamento da economia, ecoou Abbas em um artigo publicado na revista Newsweek, dizendo que a Declaração Balfour é "uma tragédia para o povo palestino".

O mesmo sentimento foi manifestado no final de setembro em uma palestraproferida por Rashid Khalidi − Edward Said Professor of Modern Arab Studies at Columbia University − no Centro Hagop Kevorkian de Estudos do Oriente Médio na cidade de Nova York: a Declaração Balfour "lançou um agressão que já dura um século contra os palestinos visando implantar e promover esta pátria nacional, mais tarde Estado de Israel, às suas custas..."

As alegações de Khalidi assim como as de Abbas e Barghouti são falsas. Antes da criação do Estado de Israel em 1948 não havia "palestinos". Conforme declaração do proeminente historiador e especialista libanês/americano sobre o Oriente Médio, Philip Hitti, em seu depoimento perante a Comissão de Inquérito Anglo-Americana de 1946: não existe essa coisa de Palestina na história, de jeito algum".

Os autores Guy Millière e David Horowitz analisaram detalhadamente a matéria no livro de 2015 Comment le peuple palestinien fut inventé ("Como o povo palestino foi inventado"), ilustrando que o propósito do embuste é o de "transformar uma população em uma arma de destruição em massa contra Israel e o povo judeu, para demonizar Israel e para fornecer ao totalitarismo e ao antissemitismo formas de agir".

A manobra deu certo, por um tempo funcionou bem acima das expectativas. O termo "palestinos" foi usado no mundo inteiro, inclusive em Israel, para se referir aos árabes que vivem na Cisjordânia e em Gaza. Muitas vezes o termo é empregado também para se referir aos árabes com cidadania israelense. A narrativa segundo a qual os judeus expulsaram os árabes ao estabelecerem um estado contradiz integralmente os fatos.

Quais são esses fatos? Quando foi, na realidade, criado o "povo palestino"? Usando simplesmente o Google Ngram Viewer se tem a resposta.

Ngram é um banco de dados que mostra a frequência que uma expressão aparece em livros publicados entre os anos 1500 a 2008. Quando um usuário insere o termo "povo palestino" e "estado palestino" na barra de pesquisa Ngram, ele percebe que o termo começa a aparecer somente em 1960.

Na carta datada de 2 de novembro de 1917 enviada a Walter Rothschild, líder da comunidade judaica da Grã-Bretanha, o Ministro das Relações Exteriores, Lord Balfour, salienta:

"O governo de Sua Majestade encara favoravelmente o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu e empregará todos os seus esforços no sentido de facilitar a realização desse objetivo, entendendo-se claramente que nada será feito que possa atentar contra os direitos civis e religiosos das coletividades não judaicas existentes na Palestina (itálico adicionado), nem contra os direitos e o estatuto político de que gozam os judeus em qualquer outro país".

Para completar, além do Ngram, também há as palavras do líder da OLP, Zuheir Mohsen, que em entrevista concedida em março de 1977 ao jornal holandês Trouw ressaltou:

"O povo palestino não existe. A criação de um estado palestino é apenas um meio para continuar a nossa luta contra o Estado de Israel em nome da unidade árabe. Na realidade, hoje não há nenhuma diferença entre jordanianos, palestinos, sírios ou libaneses. Somente por razões políticas e táticas falamos hoje sobre a existência de um povo palestino, uma vez que os interesses nacionais árabes exigem que postulemos a existência de um povo palestino distinto para se opor ao sionismo.

"Por razões táticas, a Jordânia, que é um estado soberano com fronteiras definidas, não pode reivindicar Haifa e Jaffa, ao passo que como palestino, posso indubitavelmente exigir Haifa, Jaffa, Beer-Sheva e Jerusalém. No entanto, no momento em que resgatarmos o nosso direito sobre toda a Palestina, não demoraremos sequer um minuto para unirmos a Palestina e a Jordânia".

Por Jean Patrick Grumberg jornalista do site de notícias de língua francesa Dreuz.
28 de Novembro de 2017

Tradução: Joseph Skilnik  Do site: https://pt.gatestoneinstitute.org

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

TRINTA ENSINAMENTOS

Trinta ensinamentos do filósofo Olavo de Carvalho para você começar a semana um pouco mais inteligente:


1- O tempo é a substância da vida humana. O dinheiro que se perde, ganha-se de novo. O tempo, nunca.

2- Um homem maduro é aquele em cuja alma todos os sentimentos e emoções – ternura, ódio, esperança, pressa, indiferença, todos eles – são balizados pela consciência da morte.

3- Não prostitua a sua personalidade em troca da aceitação pelo grupo. É um preço muito alto a ser pago.

4- O mistério da existência não é dado a qualquer um, mas para aquele que dá tudo e mais alguma coisa em troca de obtê-lo.

5- O medo de enxergar o tamanho do mal já é sinal de submissão ao demônio.

6- Aquilo que é nobre e elevado só transparece a quem o ama.

7- Quando você vê um casal bonito e fica sinceramente feliz com a felicidade deles, é sinal que Deus o está ajudando de muito perto.

8- Deus perdoa os adúlteros, os mentirosos, os ladrões e até os assassinos, mas não perdoa quem não perdoa. Posso estar enganado, mas suspeito que no inferno há menos adúlteros do que cônjuges virtuosos que lhes negaram o perdão.

9- A mais perfeita forma de amizade somente é possível para aqueles que buscam a Verdade. Pessoas mundanas, por melhores que sejam, jamais conhecerão a dimensão espiritual de um verdadeiro amigo.

10- Se um pai conseguir educar uma criança até os cinco anos sem nunca fazê-la chorar, ela vai amá-lo, respeitá-lo, admirá-lo e obedecê-lo pelo resto da vida.

11- As pessoas que mais se angustiam na vida são aquelas que padecem de uma desesperadora falta de problemas.

12- O capital intelectual é o que define o destino das nações.

13- A paciência é o começo da coragem. E é mesmo. Se você não consegue sofrer calado, sem choramingar nem amaldiçoar o destino, muito menos vai conseguir agir certo quando surgir a oportunidade.

14- O amor é sobretudo um instinto de defender o ser amado contra a tristeza.

15- As portas do espírito só se abrem à perfeita sinceridade de propósitos.

16- Não há ingenuidade maior do que querer parecer esperto.

17- O que você quer ter sido quando morrer?

18- O Brasil só tem DOIS problemas: uma incultura MONSTRUOSA e a ânsia do brilho fácil.

19- Pare de propor soluções nacionais, seu filho da puta. Faça algo para se educar e educar as pessoas em torno.

20- Não existe caminho das pedras. O Brasil só pode ser melhorado cérebro por cérebro.

21- Já expliquei mil vezes: Não tenho nenhuma solução para os problemas nacionais, mas tenho algumas para você deixar de ser burro.

22- Estudar pouco e discutir muito é a desgraça do brasileiro.

23- À medida que vai se empoderando, o sujeito sai logo enfoderando todo mundo em torno.

24- O comodismo conservador é tão obsceno quanto o fanatismo esquerdista.

25- A moral burguesa só se preocupa com pequenos deslizes sexuais porque é covarde demais para enxergar os grandes crimes do satanismo universal.

26- Ser jovem é uma doença que o tempo cura.

27- Em grego, “idios” quer dizer “o mesmo”. “Idiotes”, de onde veio o nosso termo “idiota”, é o sujeito que nada enxerga além dele mesmo, que julga tudo pela sua própria pequenez.

28- Quanto ao politicamente correto: só crianças acreditam que mudando o nome de algo, ele passa a ser o que elas desejam.

29- O Brasil é o país em que famílias de bandidos mortos em conflito de facções nos presídios tem o direito a uma indenização do Estado e as vítimas destes mesmos criminosos da sociedade não faz jus a nada.

30- A vocação é algo para o qual você tem uma resistência específica. A minha resistência específica é a burrice humana. 
Por: Marlon Belotti 
Do site: https://www.facebook.com/marlon.belotti/posts/1433621706736733

sábado, 2 de dezembro de 2017

BUTLER EM RECUO ESTRATÉGICO

“Escrevi essas notas por ocasião da leitura do artigo de Judith Butler na Folha de São Paulo em 20 de novembro de 2017, numa breve meditação filosófica. O texto é maior que as postagens habituais, mas penso que valha a pena sua leitura atenta e reflexão”


I. RECUO ESTRATÉGICO

Professora do departamento de retórica e literatura comparada da Universidade da Califórnia, em Berkeley, e diretora do Consórcio Internacional de Teoria Crítica, não é de se admirar que Judith Butler remodele seu discurso para torná-lo mais palatável ao ouvido sensível dos brasileiros, sobretudo após a onda de protestos causados por sua última vinda ao Brasil.

“Um passo em frente, dois pra trás”. Este é o título do livro que Vladimir Lênin publicou em 1904, e que, de certo modo, marcou sempre o modus procedendi de toda a esquerda quando pretende avançar por cima dos obstáculos.

Quando Fidel Castro assumiu o poder em Cuba em nome da democracia e contra a ditadura batistiana, em seguida, implantou a sua ditadura. Hugo Chávez fez a mesma coisa, apresentou um discurso democrático para, na sequência, impor seu totalitarismo.

Até mesmo o ex-presidente Lula fez isso. Quando tentava se eleger, nos anos 90, era rechaçado pela população. Então, com o auxílio do marqueteiro Duda Mendonça, repaginou-se, dando à luz o “Lulinha paz e amor”, que o elevou à presidência da república em 2002.

Agora, Butler segue a mesma estratégia. Reapresenta a sua teoria em recortes mais essencialistas e até moralistas, para fazê-la avançar.

II. A TEORIA DE GÊNERO BUTLERIANA

Apesar de aliviar as tintas em seu texto, qualquer pessoa que tenha tido um contato com a teoria de gênero sabe que esta transcende em muito o objetivo de atender os indivíduos que não correspondem às expectativas relativas ao seu gênero (segundo o artigo de Butler, “ao gênero atribuído no nascimento”).

Como ela mesma afirma, “meu trabalho consiste em delinear a última etapa da batalha filosófica contra a vida do impulso, o esforço filosófico de domesticar o desejo como uma instância de lugar metafísico, a luta por aceitar o desejo como princípio de deslocamento metafísico e dissonância psíquica e o esforço orientado por deslocar o desejo com o fim de derrotar a metafísica da identidade” (Subjects of desire, p. 15).

Obviamente, para ela, como o desejo não se realiza de acordo com um sujeito que lhe dê suporte, o “eu” seria apenas um discurso. Não haveria um ser por detrás da performance de gênero. Seriam estas performances, estas ações, que constituiriam a ficção do sujeito, pois esta ficção seria requerida pelo discurso que nós herdamos da metafísica da substância, discurso que, segundo ela, precisamos superar (Problemas de gênero, p. 56).

Masculinidade e feminilidade, portanto, para ela, são ações desligadas da biologia. Ela afirma, inclusive, que “a ‘presença’ das assim chamadas convenções heterossexuais nos contextos homossexuais, bem como a proliferação de discursos especificamente gays da diferença sexual, como no caso de buth (a lésbica masculinizada) e femme (a lésbica feminilizada) como identidades históricas de estilo sexual, não pode ser explicada como representação quimérica de identidades originalmente heterossexuais. E tampouco elas podem ser compreendidas como a insistência perniciosa de construtos heterossexistas na sexualidade e na identidade gays. A repetição de construtos heterossexuais nas culturas sexuais gay e hétero bem pode representar o lugar inevitável de desnaturalização das categorias de gênero” (Problemas de gênero, p. 66).

Ademais, em diálogo com Witting, ela afirma que “a tarefa das mulheres é assumir a posição do sujeito falante autorizado e derrubar tanto a categoria de sexo como o sistema da heterossexualidade compulsória que está em sua origem. Para ela, a linguagem é o conjunto de atos, repetidos ao longo do tempo, que produzem efeitos de realidade que acabam sendo percebidos como ‘fatos’. Considerada coletivamente, a prática repetida de nomear a diferença sexual criou essa aparência de divisão natural. A ‘nomeação’ do sexo é um ato de dominação e coerção, um ato performativo, institucionalizado que cria e legisla a realidade social pela exigência de uma construção discursiva/perceptiva dos corpos, segundo os princípios da diferença sexual” (Problemas de gênero, p. 200).

Diante disso, soa completamente retórica e maquiada a seguinte pergunta de Butler em seu artigo da Folha: “O livro (Problemas de gênero) negou a existência de uma diferença natural entre os sexos? De maneira alguma, embora destaque a existência de paradigmas científicos divergentes para determinar as diferenças entre os sexos e observe que alguns corpos possuem atributos mistos que dificultam sua classificação”.

Então, Butler admite que existe a possibilidade de uma classificação objetiva, baseada na diferença biológica dos corpos? Obviamente, trata-se, aqui, de uma ginástica retórica para desorientar os menos informados em sua teoria.

III. IDEOLOGIA? SIM.

Segundo Butler, “em geral, uma ideologia é entendida como um ponto de vista que é tanto ilusório quanto dogmático, algo que ‘tomou conta’ do pensamento das pessoas de uma maneira acrítica. Meu ponto de vista, entretanto, é crítico, pois questiona o tipo de premissa que as pessoas adotam como certas em seu cotidiano” (artigo para a Folha).

O conceito de gênero é crítico apenas no sentido da “teoria crítica”, quer dizer, enquanto instrumento para criticar a realidade inteira, como ela mesma reconhece neste seu texto.

Contudo, como de praxe na teoria crítica, deve-se criticar tudo, menos a metodologia crítica ou seus instrumentos metodológicos críticos como, no caso, o conceito de gênero.

Ela mesma afirma que “se a noção estável de gênero dá mostras de não mais servir como premissa básica da política feminista, talvez um novo tipo de política feminista seja agora desejável para contestar as próprias reificações do gênero e da identidade – isto é, uma política feminista que tome a construção variável da identidade como um PRÉ-REQUISITO METODOLÓGICO E NORMATIVO, senão como um OBJETIVO POLÍTICO” (Problemas de gênero, p. 25).

Em outras palavras, a noção de gênero como identidade variável deve ser uma PREMISSA, aliás, a qual ela não procura demonstrar, antes, apenas apresenta de modo dogmático. A práxis da militância de gênero, ademais, sempre foi a de fazer com que a teoria de gênero “tomasse de conta” da sociedade inteira sem que ninguém se desse conta disso, portanto, de modo acrítico.

Aliás, por que fazem tanta questão de ensinar gênero para as criancinhas? Será que não é justamente porque as mesmas não têm suficientemente desenvolvida a sua capacidade crítica?

Portanto, segundo as próprias determinações de Butler, a sua teoria de gênero cabe muito bem nos limites daquilo que ela entende por uma ideologia.

Não, quem criou a ideologia de gênero não foi Joseph Ratzinger nem muito menos Jorge Scala. O “pai” da “criança” é a Judith Butler, mesmo!

IV. ESSENCIALISMO E A FALÁCIA DA ARQUEOLOGIA FOUCAULTIANA

Segundo Butler, “a noção de paródia de gênero aqui definida não presume a existência de um original que essas identidades parodísticas imitem (ela está falando da própria identidade de gênero…) Esse deslocamento perpétuo constitui uma fluidez de identidades que sugere uma abertura à ressignificação e à recontextualização; a proliferação parodística priva a cultura hegemônica e seus críticos da reinvindicação de identidades de gênero naturalizadas ou essencializadas” (Problemas de gênero, p. 238).

Servindo-se da metodologia própria da teoria crítica, Butler cria uma caricatura discursiva e começa a desconstruí-la, como se estivesse desconstruindo a realidade. Na verdade, ela está tão absorvida por seu próprio discurso que crê firmemente nele, substituindo a realidade por ele.

Deste modo, atribui a homem e mulher, termos que aparecem para ela sempre entre aspas, status de identidade essencialista, naturalista, sexista, binária, heterossexista, heteronormativa, fálica, reificada etc.

Para comprovar a ficção da identidade, ela analisa os discursos sobre o masculino e o feminino como se os mesmos fossem o homem e a mulher em si.

Aqui, ela é epistemologicamente dependente da metodologia de Foucault, o qual, partindo do pressuposto que a verdade não existe, passa a rastrear a história das “verdades” para demonstrar que as mesmas são apenas a projeção de um determinado poder regulador. Isto é aquilo que ele chama de arqueologia do saber.

Ora, se quiséssemos, por exemplo, fazer a arqueologia da ideia de “lei da gravidade”, obteríamos uma infinidade de discursos contraditórios e facilmente chegaríamos à conclusão de que a “teoria da gravidade não existe, é apenas um discurso de poder”. No entanto, se você se jogar da janela, de qualquer modo, com ou sem Foucault, vai se espatifar do mesmo modo!

Em outras palavras, estamos diante de um jogo de palavras, de um embaralhamento de discursos, daquilo que a filosofia chama de falácia. A realidade continua intocada, apenas se dribla o interlocutor com um lance desconstrucionista. É aquilo que no futebol chama-se de pedalada.

Como é possível que este tipo de artifício possa convencer alguém? Bem… Como ensinou Aristóteles (tanto nos Analíticos quanto no Peri hermeneias), não é fácil conhecer a essência das coisas. Precisamos proceder a um processo abstrativo complexo, que supõe um trabalho mental consideravelmente sofisticado. A história dos discursos pode ser a história dos bem ou mal sucedidos, e dos mal ou bem intencionados, esforços por alcançar a quididade, a essência das coisas reais. Por isso, o método foucaultiano é sofístico e pode enganar.

V. SOFISTAS DE GÊNERO

Butler é adepta da subversão da identidade através de atos corporais subversivos, típicos do movimento queer, quer dizer, a atuação de performances revolucionárias que choquem aquilo que ela chama de heteronormatividade.

Outra autora americana de gênero, Joan Scott, é mais ortodoxa, do ponto de vista foucaultiano: ela pretende reescrever a história a partir da noção de gênero (Gender and the politics of history, Nova York, 1999).

Estas são as duas autoras principais. Digamos, as mais representativas dos estudos de gênero.

Contudo, existem mais de 40 teorias diferentes de gênero, todas em disputa entre si. São modos diferentes de apresentar a mesma ideia, a saber: o gênero é um construto desligado da identidade sexual, vale dizer, biológica.

Este também é um expediente da teoria crítica: colocar um grupo imenso de pessoas para criticar implacavelmente a realidade, metralhando-a em todos os sentidos possíveis, sem necessariamente preocupar-se em justificar a própria crítica.

Uma pessoa que quiser encarar toda a aquarela dos estudos de gênero poderá gastar toda a vida apenas ocupando-se de entender as picuinhas intelectuais que os diferentes ativistas nutrem dialeticamente entre si. Decerto ficará perdido nesse labirinto sem saída e, completamente intoxicado de informações contraditórias, acabará por adotar uma entre elas, trocando a realidade pelo discurso.

Isso também aconteceu nos tempos de Sócrates (cf. Platão, O Sofista). Os sofistas eram retóricos pagos pelos políticos da época para convencerem o povo das ideias destes últimos. Destruíam a base mesma do saber, negando a existência do ser e da verdade, e submetiam o povo às suas opiniões. Sócrates os resistiu, pagou o preço de sua vida por isso, mas ao fim e ao cabo, desapareceram os sofistas e prevaleceu a verdadeira filosofia.

Hoje, os críticos, os desconstrucionistas, os ideólogos de gênero são os novos sofistas, pagos pelas fundações internacionais para convencerem o povo de que não existe a verdade, o ser, a essência, e imporem o seu totalitarismo disfarçado de democracia.

Com efeito, Judith Butler veio ao Brasil financiada pela Fundação Mellon para falar de democracia em nome do Consórcio Internacional de Teoria Crítica, fundado no final do ano passado com uma verba doada pela mesma Fundação de 1,5 milhões de dólares (vide o site do próprio Consórcio).

Submetam os ideólogos de gênero à arqueologia de suas ideias e à genealogia dos poderes que estão por trás deles, rastreiem a rota do dinheiro e verão que isso nada tem de amor desinteressado à humanidade.

VI. PEDOFILIA

Butler alega que a Igreja está por trás da estigmatização social da sua teoria de gênero e se defende da acusação de corruptora de crianças acusando a Igreja Católica de ter perdido a sua autoridade moral por proteger pedófilos em seu seio.

A generalização precipitada é um tipo de falácia de que abusam estes ideólogos em sua aversão ao catolicismo. É verdade que alguns delinquentes se esconderam na Igreja e que houve quem se omitisse em sua acusação, mas a Igreja os puniu severissimamente e, sobretudo, nunca os respaldou, justificando doutrinalmente seu desvio de conduta.

Ao contrário, o movimento feminista tem expoentes que defenderam abertamente o sexo com menores, e este não é um privilégio de Shulamith Firestone (The dialetic of sex, p. 215). Há quem queira despatologizar a pedofilia ou transformá-la numa opção sexual respeitável.

Butler apela para a teoria da projeção, sugerindo que os que a acusam de favorecer a pedofilia estão apenas lançando sobre ela o próprio vexame. Na verdade, a generalização precipitada é uma falácia em qualquer direção que se a aplique e o uso deste tipo de sofisma apenas demonstra malícia ou despreparo filosófico.

VII. FILOSOFIA, VERDADE E DEMOCRACIA

Algumas pessoas que trabalham com comunicação vieram queixar-se de que os protestos contra a vinda de Butler ao Brasil apenas projetaram-na ainda mais.

Tenho a impressão de que isto, do ponto de vista filosófico, não é necessariamente assim. Quero dizer apenas que os ideólogos sempre se favoreceram do anonimato e da difusão de ideias não conferidas, exatamente como Butler diz em seu artigo.

Quem coloca a questão nestes termos assume sem percebê-lo a premissa de que a verdade e o erro são equivalentes. Acontece que a força do erro está na hegemonia. Por isso, eles necessitam impô-la para todo o mundo. Mas a força da verdade está nela mesma!

Hoje, a verdade precisa mais de homens com uma verdadeira mente filosófica que da propaganda, é ela que gera os propagandistas, os comunicadores, a cultura e tudo o mais. Foi sobre estes cânones que se erigiu a civilização ocidental e é contra eles que estes bárbaros a estão destruindo.

Uma democracia que se propusesse como alternativa à verdade, caricaturizando-a como autoritarismo, apenas seria uma ditadura disfarçada, a imposição de uma hegemonia.

Notem que a própria Butler defende a identidade de suas ideias e protesta contra falsificações. E com razão. Contudo, ela o faz apenas em benefício de sua crítica, sem submeter-se a uma autocrítica.

Como afirma Butler em seu artigo na Folha, “liberdade não é – nunca é – a liberdade de fazer o mal. Se uma ação faz mal a outra pessoa ou a priva de liberdade, essa ação não pode ser qualificada como livre – ela se torna uma ação lesiva”.

No caso, a ideologia de gênero não nos quer apenas privar da identidade, mas também da liberdade e da verdade. De fato, se ninguém é alguém, como pode ter direitos?
Por: Pe. José Eduardo de Oliveira e Silva Do site: http://midiasemmascara.org/


terça-feira, 28 de novembro de 2017

LONGA NOITE

Se há uma coisa que, quanto mais você perde, menos sente falta dela, é a inteligência. Uso a palavra não no sentido vulgar de habilidadezinhas mensuráveis, mas no de percepção da realidade. Quanto menos você percebe, menos percebe que não percebe. Quase que invariavelmente, a perda vem por isso acompanhada de um sentimento de plenitude, de segurança, quase de infalibilidade. É claro: quanto mais burro você fica, menos atina com as contradições e dificuldades, e tudo lhe parece explicável em meia dúzia de palavras. Se as palavras vêm com a chancela da intelligentzia falante, então, meu filho, nada mais no mundo pode se opor à força avassaladora dos chavões que, num estalar de dedos, respondem a todas as perguntas, dirimem todas as dúvidas e instalam, com soberana tranqüilidade, o império do consenso final. Refiro-me especialmente a expressões como “desigualdade social”, “diversidade”, “fundamentalismo”, “direitos”, “extremismo”, “intolerância”, “tortura”, “medieval”, “racismo”, “ditadura”, “crença religiosa” e similares. O leitor pode, se quiser, completar o repertório mediante breve consulta às seções de opinião da chamada “grande imprensa”. Na mais ousada das hipóteses, não passam de uns vinte ou trinta vocábulos. Existe algo, entre os céus e a terra, que esses termos não exprimam com perfeição, não expliquem nos seus mais mínimos detalhes, não transmutem em conclusões inabaláveis que só um louco ousaria contestar? Em torno deles gira a mente brasileira hoje em dia, incapaz de conceber o que quer que esteja para além do que esse exíguo vocabulário pode abranger.


Que essas certezas sejam ostentadas por pessoas que ao mesmo tempo fazem profissão-de-fé relativista e até mesmo neguem peremptoriamente a existência de verdades objetivas, eis uma prova suplementar daquilo que eu vinha dizendo: quanto menos você entende, menos entende que não entende. Ao inverso da economia, onde vigora o princípio da escassez, na esfera da inteligência rege o princípio da abundância: quanto mais falta, mais dá a impressão de que sobra. A estupidez completa, se tão sublime ideal se pudesse atingir, corresponderia assim à plena auto-satisfação universal.

A mais eloqüente indício é o fato de que, num país onde há trinta anos não se publica um romance, uma novela, uma peça de teatro que valha a pena ler, ninguém dê pela falta de uma coisa outrora tão abundante, tão rica nestas plagas, que era a – como se chamava mesmo? – “literatura”. Digo que essa entidade sumiu porque – creiam – não cesso de procurá-la. Vasculho catálogos de editoras, reviro a internet em busca de sitesliterários, leio dezenas de obras de ficção e poesias que seus autores têm o sadismo de me enviar, e no fim das contas encontrei o quê? Nada. Tudo é monstruosamente bobo, vazio, presunçoso e escrito em língua de orangotangos. No máximo aponta aqui e ali algum talento anêmico, que para vingar precisaria ainda de muita leitura, experiência da vida e uns bons tabefes.

Mas, assim como não vejo nenhuma obra de literatura imaginativa que mereça atenção, muito menos deparo, nas resenhas de jornais e nas revistas “de cultura” que não cessam de aparecer, com alguém que se dê conta do descalabro, do supremo escândalo interectual que é um país de quase duzentos milhões de habitantes, com uma universidade em cada esquina, sem nenhuma literatura superior. Ninguém se mostra assustado, ninguém reclama, ninguém diz um “ai”. Todos parecem sentir que a casa está na mais perfeita ordem, e alguns até são loucos o bastante para acreditar que o grande sinal de saúde cultural do país são eles próprios. Pois não houve até um ministro da Cultura que assegurou estar a nossa produção cultural atravessando um dos seus momentos mais brilhantes, mais criativos? Media, decerto, pelo número de shows de funk.

Estão vendo como, no reino da inteligência, a escassez é abundância?

Mas o pior não é a penúria quantitativa.

Da Independência até os anos 70 do século XX, a história social e psicológica do Brasil aparecia, translúcida, na literatura nacional. Lendo os livros de Machado de Assis, Raul Pompéia, Lima Barreto, Antônio de Alcântara Machado, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Jorge Amado, Marques Rebelo, José Geraldo Vieira, Ciro dos Anjos, Octávio de Faria, Anníbal M. Machado e tantos outros, obtínhamos a imagem vívida da experiência de ser brasileiro, refletida com toda a variedade das suas manifestações regionais e epocais e com toda a complexidade das relações entre alma e História, indivíduo e sociedade.

A partir da década de 80, a literatura brasileira desaparece. A complexa e rica imagem da vida nacional que se via nas obras dos melhores escritores é então substituída por um sistema de estereótipos, vulgares e mecânicos até o desespero, infinitamente repetidos pela TV, pelo jornalismo, pelos livros didáticos e pelos discursos dos políticos.

No mesmo período, o Brasil sofreu mudanças histórico-culturais avassaladoras, que, sem o testemunho da literatura, não podem se integrar no imaginário coletivo nem muito menos tornar-se objeto de reflexão. Foram trinta anos de metamorfoses vividas em estado de sono hipnótico, talvez irrecuperáveis para sempre.

O tom de certeza definitiva com que qualquer bobagem politicamente correta se apresenta hoje como o nec plus ultra da inteligência humana jamais teria se tornado possível sem esse longo período de entorpecimento e de trevas, essa longa noite da inteligência, ao fim da qual estava perdida a simples capacidade de discernir entre o normal e o aberrante, o sensato e o absurdo, a obviedade gritante e o ilogismo impenetrável.
Por: Olavo de CarvalhoDiário do Comércio, 4 de junho de 2012 
Do site: http://www.olavodecarvalho.org