domingo, 13 de maio de 2012

Mensalão


Este homem sabe tudo sobre o maior escândalo da história política do país e diz: “Chamar o mensalão de farsa é chamar o procurador-geral e os ministros do Supremo de farsantes”

Antônio Fernando de Souza: "Negar a existência do mensalão é querer apagar a história do país" (Foto:Joédson Alves/Folhapress)
Antônio Fernando de Souza: "Negar a existência do mensalão é querer apagar a história do país" (Foto: Joédson Alves/Folhapress)
Antônio Fernando de Souza, ex-procurador-geral da República, foi quem denunciou ao Supremo Tribunal Federal a quadrilha do mensalão, chefiada por José Dirceu, o deputado cassado por corrupção. É o maior escândalo da história republicana. Na verdade, é o maior escândalo da história brasileira. Nesse caso, com absoluta precisão, pode-se dizer que “nunca antes nestepaiz” um partido político havia tentado comprar um dos Poderes da República (o Legislativo), tornando-o irrelevante, ou substituir o Executivo por um governo paralelo. Os petistas, obviamente, não inventaram a corrupção. Eles só a levaram a dimensões inéditas. Achando que era pouco, tentaram transformá-la num ato de resistência.
Não contente com todo o mal que causou ao país, José Dirceu, aquele que é apontado na denúncia da Procuradoria Geral da República como o “chefe da quadrilha”, tenta agora arrastar as instituições para a lama. Em vez de deixar que a CPI que investiga as ações de Cachoeira siga o seu curso, punindo corruptos e corruptores, esforça-se para usá-la como palco de suas manobras defensivas. Atua nos bastidores, usando como arma a pena de aluguel do subjornalismo a soldo, para manchar a reputação da Procuradoria, do Supremo e da imprensa — não por acaso, três instâncias fundamentais do estado democrático e de direito.
Souza concedeu a Hugo Marques, na edição desta semana da VEJA, uma entrevista que precisa ser lida e espalhada na rede. Falou com serenidade e precisão:
1 - chamar o mensalão de farsa corresponde a chamar de farsantes o procurador-geral e os ministros do Supremo;
2 - negar a existência do mensalão é negar os fatos; é querer apagar a história;
3 - existem provas periciais demonstrando que dinheiro público foi usado na lambança;
4 - réus confessaram os crimes;
5- os réus do mensalão praticaram lavagem de dinheiro, corrupção passiva e ativa, peculato, evasão de divisas, formação de quadrilha e falsidade ideológica;
6 - a sociedade brasileira espera um julgamento justo e correto.
Leiam a entrevista e contribuam para que ela chegue ao maior número possível de brasileiros. E vamos torcer para que o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo, conclua o quanto antes a revisão do processo para que possa haver o julgamento.
*
Em 2006, o então procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, transformou em réus quarenta petistas e aliados. Eles operavam o que foi caracterizado na denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal de “sofisticada organização criminosa”, encabeçada pelo ex-ministro José Dirceu. Agora, com a proximidade do julgamento, o ex-chefe do Ministério Público afirma que a tentativa de negar a existência do mensalão é uma afronta à democracia.
O senhor sofreu pressão para não apresentar a denúncia do mensalão?Não. Minha postura reservada sempre inibiu qualquer atitude desse tipo. Nunca assumi nenhum compromisso com as autoridades que me procuraram. Fiz meu trabalho da forma mais precisa e célere possível. Tinha 100% de convicção formada. Conseguimos fazer a relação entre os fatos e montamos o quebra-cabeça do esquema, tudo em cima de documentos, de provas consistentes.
O PT tem se dedicado a difundir a versão de que o mensalão não passa de uma farsa… Chamar esse episódio de farsa é acusar o procurador-geral e os ministros do Supremo de farsantes. Dizer que aqueles fatos não existiram é brigar com a realidade, é querer apagar a história. Esse discurso não produzirá nenhum efeito no STF. Os ministros vão julgar o processo com base nos autos. E há inúmeras provas de tudo o que foi afirmado na denúncia. Depoimentos, extratos bancários, pessoas que foram retirar dinheiro e deixaram sua assinatura.
O senhor se sente incomodado com isso?Na democracia, todas as pessoas estão sujeitas à fiscalização, ao controle, à responsabilização, e há órgãos dispostos a isso. Não serão os partidos políticos nem seus dirigentes que vão dizer o que é crime e o que não é crime. Quando eles querem transmitir um ar de que não aconteceu nada, estão indo para o reino da fantasia. Negar a existência do mensalão é uma afronta à democracia.
Como o senhor vê as afirmações do atual procurador-geral, Roberto Gurgel, de que está sofrendo ataques de mensaleiros com medo do julgamento?Se ele fez essa acusação, preciso admitir que tem elementos para justificá-la. A CPI está se preocupando com um assunto que não tem relevância para o seu trabalho. O procurador-geral avaliou que a Operação Vegas não produziu evidências suficientes para pedir indiciamentos, mas não arquivou o inquérito - inclusive a pedido da Polícia Federal - para não prejudicar o andamento das investigações da Operação Monte Carlo. E a estratégia se mostrou bem-sucedida.
Está comprovado que o PT utilizou dinheiro público no mensalão?Quem vai fazer esse juízo é o Supremo. Da perspectiva de quem fez a denúncia e acompanhou o processo até 2009, digo que existe prova pericial mostrando que dinheiro público foi utilizado. Repito: há prova pericial disso. E o Supremo, quando recebeu a denúncia, considerou que esses fatos têm consistência.
O ex-ministro José Dirceu afirma que o senhor o apontou como chefe de uma organização criminosa para se vingar do fato de ele nunca tê-lo recebido na Casa Civil.Nunca tive nenhum interesse em falar com ele. A minha escolha como procurador-geral foi feita pelo presidente da República. Uma denúncia é formalizada somente se há elementos probatórios sobre uma conduta criminosa. Sentimentos pessoais não entram em jogo. Tudo o que se fala em relação à conduta dessa pessoa tem se revelado verdadeiro na prática. Reduzir uma denúncia dessa gravidade a uma rusga do procurador-geral é quase risível.
Como o senhor vê essa tentativa de usar a CPI para desviar o foco do julgamento do mensalão?É normal que quem está denunciado fique tenso às vésperas do julgamento. O julgamento no Supremo Tribunal Federal é uma decisão definitiva. Vivemos num país democrático, num estado de direito. O Supremo jamais faria um justiçamento, vai fazer um julgamento. Tem prova, tem condenação; não tem prova, não tem condenação.
O que o senhor achou da iniciativa de alguns parlamentares de tentar usar uma CPI para investigar a imprensa?A imprensa não faz processo penal, a imprensa dá a notícia, dá a informação. Parece mais um meio de desviar a atenção do inquérito fundamental.
Os acusados tentam reduzir o caso a um crime eleitoral. É uma boa estratégia?A referência que fazem é que a movimentação de dinheiro tinha origem em caixa dois de campanha. Do ponto de vista ético e jurídico, isso não altera nada. Quando há apropriação do dinheiro público, não é a sua finalidade que vai descaracterizar o crime. No processo do mensalão, temos imputação de crimes de lavagem de dinheiro, corrupção passiva, ativa, peculato, evasão de divisas, quadrilha, falsidade ideológica. Crimes assumidamente confessados. Eles não podem deixar de admitir.
O governo passado indicou a maioria dos ministros que, agora, vão julgar muitos de seus aliados. Isso pode influir de alguma maneira no resultado?Uma pessoa, quando aceita ocupar o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal, sabe das responsabilidades que tem e vai cumpri-las. Toda a sociedade espera um julgamento justo e correto. Que esse processo sirva para o amadurecimento da democracia.
Texto publicado originalmente às 5h56
Por Reinaldo Azevedo

sexta-feira, 11 de maio de 2012

A desigualdade e o egoísmo estimulam o desenvolvimento

A desigualdade de renda e de riqueza é uma característica inerente a uma economia de mercado. A eliminação desta desigualdade destruiria completamente qualquer economia de mercado. O que as pessoas que propõem a igualdade têm em mente é sempre um aumento do seu próprio poder de consumir. Ao apoiar o princípio da igualdade como um postulado político, ninguém pensa em repartir sua renda com os que têm menos. Quando os assalariados falam de igualdade, estão querendo dizer que os lucros dos patrões deveriam ser distribuídos entre eles. Não estão propondo uma redução de sua própria renda em benefício dos 95% da população da terra cuja renda é menor do que a sua. Em uma sociedade de mercado, a desigualdade de renda representa um papel bem diferente daquele que ela representa em uma sociedade feudal ou em outros tipos de sociedades não capitalistas. Entretanto, no curso da evolução histórica, essa desigualdade pré-capitalista foi de enorme importância. Comparemos a história da China com a da Inglaterra. A China chegou a desenvolver uma civilização de alto nível. Dois mil anos atrás, estava muito mais adiantada do que a Inglaterra. Mas, no fim do século XIX, a Inglaterra era um país rico e civilizado, ao passo que a China era um país pobre. Seu estágio de civilização era praticamente o mesmo que já havia alcançado alguns séculos atrás; era uma civilização estagnada. Os esforços feitos pela China para implementar os princípios de igualdade de renda foram muito maiores do que os feitos pela Inglaterra. A terra foi dividida e subdividida. Não havia proletários sem terras. Já na Inglaterra do século XVIII, a quantidade de proletários sem terra era muito numerosa. Durante muito tempo, as práticas restritivas das atividades não agrícolas, consagradas pelas ideologias tradicionais, retardaram o surgimento da moderna atividade empresarial. Porém, quando a filosofia do laissez-faire, ao destruir completamente as falácias do restricionismo, abriu o caminho para o capitalismo, a evolução do sistema industrial pôde processar-se num ritmo acelerado porque a força de trabalho necessária já estava disponível. O que gerou a "era da máquina" não foi, conforme imaginava Werner Sombart, uma obsessão especial pelo enriquecimento, surgida misteriosamente do dia para a noite e que se apossou das mentes de algumas pessoas, transformando-as em "homens capitalistas". Sempre existiram pessoas ávidas para obter lucros ao melhor ajustarem a produção à satisfação das necessidades do público. Mas essas pessoas eram paralisadas pela ideologia que estigmatizava o desejo de lucrar como sendo imoral e que erigia barreiras com o propósito de impedi-lo. A substituição das doutrinas favoráveis ao sistema tradicional de restrições pelo laissez-faire removeu esses obstáculos ao progresso material e deu lugar a uma nova era. A filosofia liberal combatia o tradicional sistema de castas porque sua preservação era incompatível com o funcionamento da economia de mercado. Defendia a abolição dos privilégios para poder liberar aqueles que, graças à sua engenhosidade, sabiam como produzir de forma mais barata uma maior quantidade de produtos de melhor qualidade. Utilitaristas e economistas, neste particular, estavam de acordo com as ideias dos que combatiam os privilégios de classe em nome de um alegado direito natural e da teoria da igualdade de todos os homens. Ambos os grupos defendiam o princípio da igualdade de todos perante a lei. Mas esta coincidência de pontos de vista em alguns aspectos não eliminou as diferenças fundamentais entre essas duas correntes de pensamento. Para a escola do direito natural, todos os homens são biologicamente iguais e, portanto, possuem o inalienável direito a uma parcela igual de todas as coisas. A primeira afirmativa contraria frontalmente os fatos. A segunda, se interpretada consistentemente, conduz a absurdos tais que os seus defensores acabam abandonando completamente a lógica e passam a considerar certas instituições, por mais discriminatórias e iníquas que sejam, como perfeitamente compatíveis com a inalienável igualdade de todos os homens. Os eminentes cidadãos da Virgínia, cujas idéias inspiraram a Revolução Americana, admitiram que fosse preservada a escravidão negra. O sistema de governo mais despótico que a história jamais conheceu, o bolchevismo, se apresenta como a própria encarnação do princípio de igualdade e liberdade entre todos os homens. Os defensores da igualdade perante a lei tinham plena consciência da inata desigualdade entre os homens e de que é precisamente essa desigualdade que dá origem à cooperação social e à civilização. Para eles, o princípio da igualdade perante a lei não foi concebido com o propósito de corrigir os fatos inexoráveis do universo ou para fazer desaparecer a desigualdade natural. Era, muito pelo contrário, uma maneira de assegurar à humanidade inteira o máximo de benefícios que os homens podem extrair dessa desigualdade. Portanto, nenhuma instituição criada pelo homem deveria impedir alguém de atingir aquela posição na qual pudesse melhor servir a seus concidadãos. Para os liberais, o problema da desigualdade era visto pelo ângulo social e utilitário, e não segundo um alegado direito inalienável dos indivíduos. A igualdade perante a lei, diziam eles, é boa porque serve melhor aos interesses de todos. Permite, principalmente, que os consumidores decidam quem deve dirigir as atividades produtoras. Elimina, assim, as causas de conflitos violentos, o que assegura o estabelecimento de uma ordem social mais satisfatória. Foi o triunfo dessa filosofia liberal que produziu todos os fenômenos que, em seu conjunto, são denominados de civilização ocidental moderna. Entretanto, essa nova ideologia só poderia triunfar em um ambiente onde o ideal de igualdade de renda fosse ainda muito fraco. Se os ingleses do século XVIII estivessem encantados com a quimera da igualdade de renda, a filosofia do laissez-faire não lhes teria despertado o interesse, assim como ainda hoje não o faz entre os chineses ou os maometanos. Nesse sentido, o historiador deve reconhecer que a herança ideológica do feudalismo e do sistema senhorial muito contribuiu para o advento da civilização moderna, por mais diferente que esta seja daquela. Os filósofos do século XVIII, que não lograram compreender os princípios da nova teoria utilitária, continuaram perorando acerca da superioridade da China e dos países islâmicos. Certamente conheciam muito pouco sobre a estrutura social do mundo oriental. O que achavam louvável nas vagas informações de que dispunham era a ausência de uma aristocracia hereditária e de grandes latifúndios. Pelo que imaginavam, esses povos teriam conseguido implantar os princípios igualitários com mais êxito do que as suas próprias nações. Mais tarde, no século XIX, essas teses foram redescobertas pelos nacionalistas dos vários países. A mais em voga era o pan-eslavismo, cujos defensores exaltavam a superioridade do mir[1] e do artel[2] russos e do zadruga[3] iugoslavo. A crescente confusão semântica acabou convertendo o significado de termos políticos no seu oposto; o epíteto democrático passou a ser prodigamente utilizado. Os povos muçulmanos, que nunca conheceram outra forma de governo que não fosse o mais completo absolutismo, passaram a ser chamados de democráticos. Os nacionalistas indianos se vangloriam ao falar da tradicional democracia hindu. Os economistas e os historiadores são indiferentes a este tipo de efusão emocional. Ao descreverem as civilizações asiáticas como civilizações inferiores, não estão expressando um julgamento de valor. Meramente consignam o fato de que esses povos não souberam estabelecer as condições ideológicas e institucionais que, no Ocidente, produziram a civilização capitalista, cuja superioridade os asiáticos hoje implicitamente reconhecem ao clamarem pelo menos por seus implementos terapêuticos e tecnológicos e por sua parafernália. O reconhecimento do fato de que, no passado, a cultura de muitos povos asiáticos era mais avançada do que a dos seus contemporâneos ocidentais implica procurar saber as causas que impediram o progresso no Oriente. No caso da civilização hindu, a resposta é óbvia: o férreo controle do inflexível sistema de castas tolheu a iniciativa individual e cortou pela raiz qualquer possibilidade de desvio dos padrões tradicionais. Mas a China e os países muçulmanos, exceção feita à escravidão de um relativamente pequeno número de pessoas, não estavam sujeitos a um regime de castas. Eram governados por autocratas. Mas os súditos eram iguais sob o jugo do autocrata. Até mesmo os escravos e os eunucos não eram impedidos de exercer funções elevadas. É a essa igualdade sob o déspota que as pessoas se referem quando hoje mencionam os supostos costumes democráticos desses povos orientais. Esses povos e seus governantes estavam comprometidos com uma noção de igualdade econômica que, embora vaga e mal definida, era muito clara em um aspecto: o de condenar peremptoriamente qualquer indivíduo privado que acumulasse uma grande fortuna. Os governantes consideravam aqueles súditos que fossem ricos como uma ameaça à sua supremacia política. Todas as pessoas, governantes e governados, estavam convencidas de que não era possível acumular muitos recursos sem que isto privasse outras pessoas daquilo que, de direito, lhes pertencia — portanto, o patrimônio dos poucos ricos era a causa da pobreza de muitos. A situação de comerciantes prósperos em todos os países orientais era extremamente precária. Ficavam à mercê dos funcionários públicos. Mesmo propinas generosas não conseguiam evitar o confisco de seus bens. A população regozijava sempre que uma pessoa próspera era vitimada pela inveja e pelo ódio dos governantes. Essa mentalidade anticrematística obstruiu o progresso da civilização no Oriente e manteve as massas à beira da morte por inanição. Uma vez que a acumulação de capital estava impedida, não poderia haver progresso tecnológico. O capitalismo chegou ao Oriente como uma ideologia importada, imposta por exércitos e navios estrangeiros sob a forma ou de domínio colonial ou de jurisdição extraterritorial. Esses métodos violentos certamente não eram os mais adequados para mudar a mentalidade tradicionalista dos orientais. Mas o reconhecimento deste fato não invalida a constatação de que foi a aversão à acumulação de capital o que condenou centenas de milhões de asiáticos à pobreza e à fome. A noção de igualdade que os nossos atuais defensores do estado assistencialista têm em mente é uma réplica da ideia asiática de igualdade. Embora seja vaga sobre todos os aspectos, é bem nítida ao condenar as grandes fortunas. Opõe-se às grandes empresas e aos grandes patrimônios. Preconiza várias medidas para tolher o crescimento de empresas privadas e para impor mais igualdade por meio de taxação confiscatória de rendas e de propriedades. E apela para a inveja das massas menos avisadas. As consequências econômicas imediatas das políticas confiscatórias já foram examinadas alhures. É óbvio que, no longo prazo, tais políticas resultam necessariamente não só numa redução da acumulação de capital, como também no consumo do capital que havia sido previamente acumulado. Não só impedem a criação de maior prosperidade material como até mesmo revertem essa tendência, dando origem a uma pobreza cada vez maior. Se estes ideais asiáticos triunfassem, o Oriente e o Ocidente acabariam por se igualar no mesmo nível de miséria. Os defensores do estado provedor não pretendem ser apenas os defensores dos interesses da sociedade geral contra os interesses egoístas das empresas ávidas por lucros; eles também afirmam estarem cuidando dos interesses permanentes e seculares da nação, se opondo aos interesses de curto prazo dos empreendedores e capitalistas, que só se preocupam com o próprio lucro, sem nunca se importar com o futuro da sociedade. Esta segunda pretensão é evidentemente incompatível com a preferência que tais pessoas dão a políticas de curto prazo em detrimento das considerações de longo prazo. Mas a consistência lógica não é uma das virtudes dos defensores do estado assistencialista. Não levemos em conta, portanto, esta contradição em suas proposições e examinêmo-las sem considerar sua inconsistência. A poupança, a acumulação de capital e o investimento retiram recursos que seriam usados no consumo corrente para empregá-los na melhoria das condições futuras. O poupador renuncia a um aumento da satisfação imediata a fim de melhorar o seu próprio bem-estar e o de sua família no futuro. Suas intenções certamente são egoístas no sentido popular do termo. Mas os efeitos de sua conduta egoísta favorecem os interesses permanentes da sociedade como um todo, bem como os de todos os seus membros. Seu comportamento produz todos aqueles fenômenos que até mesmo os mais fanáticos defensores do estado assistencialista rotulam de "desenvolvimento econômico" e "progresso social". Para haver acréscimo de poupança e acumulação de capital, ou mesmo para que o capital atual seja simplesmente preservado, é preciso que haja redução no consumo de hoje a fim de que possa haver maior oferta de bens amanhã. Há necessidade de uma abstinência, de uma renúncia a satisfações que poderiam ser desfrutadas imediatamente. A economia de mercado cria um contexto no qual essa abstinência é praticada numa certa medida, e no qual o capital acumulado daí decorrente é investido para produzir aquilo que melhor satisfaz as necessidades mais urgentes dos consumidores. As fábulas de Papai Noel dos defensores do estado provedor se caracterizam pela total incapacidade de compreender o papel representado pelo capital. Precisamente por isso, não se pode aceitar a designação de "economia do bem-estar" autoatribuída a esta doutrina. Quem não leva em consideração a escassez de bens de capital disponível não é um economista; é um fabulista. Não lida com a realidade, mas com um fabuloso mundo de abundância. Todas as generosidades verbais dos defensores do estado provedor baseiam-se, implicitamente, na pressuposição de que existe uma abundância de bens de capital. Se fosse assim, certamente seria fácil remediar todos os males, dar a cada um "segundo suas necessidades" e fazer com que todo mundo fosse perfeitamente feliz. Os defensores do estado provedor costumam afirmar que a motivação dos indivíduos é o egoísmo, ao passo que o governo atua com a intenção de servir a todos. Admitamos, pelo bem do debate, que os indivíduos sejam demoníacos e os governantes angelicais. Mas o que conta na vida real — apesar da opinião contrária de Kant — não são as boas intenções, mas os resultados. O que torna possível a evolução da sociedade é precisamente o fato de que a cooperação pacífica sob o signo da divisão do trabalho, a longo prazo, atende melhor aos interesses egoístas de todos os indivíduos. A superioridade da sociedade de mercado consiste no fato de que o seu funcionamento confirma esse princípio. Essa realidade, totalmente palpável e comprovada, já é o bastante para refutar o clichê paternalista que procura contrastar, de um lado, o egoísmo dos indivíduos de mentalidade estreita, preocupados exclusivamente com os prazeres do momento e sem nenhuma consideração com o bem-estar dos seus concidadãos e com os interesses permanentes da sociedade, e, do outro, o governo benevolente e clarividente, infatigável na sua dedicação para promover o bem-estar duradouro de toda a sociedade. Os defensores do estado provedor vêem no governo uma materialização da Divina Providência que, sábia e imperceptivelmente, conduz a humanidade a estágios mais elevados e mais perfeitos de um inexorável processo evolutivo; eles não são capazes de perceber a complexidade do problema e suas ramificações. O cerne de toda essa questão sobre a acumulação de capital consiste exatamente na forma como o egoísmo produz os seus efeitos. Em um sistema em que haja desigualdade, o egoísmo impele o homem a poupar e a procurar investir sua poupança de maneira a melhor atender às necessidades mais urgentes dos consumidores. Em um sistema igualitário, essa motivação desaparece. A redução do consumo em um futuro imediato é uma abstinência facilmente percebida, contrária aos interesses egoístas do indivíduo. Já a maior disponibilidade futura que se espera obter em decorrência dessa abstinência imediata é menos perceptível ao homem de inteligência média. O problema de manter o nível de capital existente e de aumentá-lo é insolúvel num sistema socialista no qual não se pode recorrer ao cálculo econômico. Uma sociedade socialista não dispõe de método para verificar se o capital existente está aumentando ou diminuindo. Mas, no sistema intervencionista atual, a situação não é tão grave. Neste caso, ainda é possível compreender o que está ocorrendo. Se em tal país prevalece um regime democrático, os problemas de preservação e de acumulação de capital adicional tornam-se o tema central dos antagonismos políticos. Não faltarão demagogos a propor que se dedique ao consumo mais do que o partido no poder ou os outros partidos estejam dispostos a aceitar. Estarão sempre dispostos a afirmar que "na atual emergência" não se pode pensar em acumular capital e que, pelo contrário, justifica-se plenamente o consumo de uma parte do capital já existente. Os vários partidos competirão entre si nas promessas feitas aos eleitores no sentido de aumentar os gastos públicos e de, ao mesmo tempo, reduzir os impostos que não onerem exclusivamente os ricos. No tempo do laissez-faire, as pessoas consideravam o governo como uma instituição cujo funcionamento implicava despesas que deveriam ser custeadas pelos impostos arrecadados dos cidadãos. No orçamento de cada indivíduo, o estado era um item da despesa. Hoje, a maioria dos cidadãos considera o governo como uma entidade que distribui benefícios. Os assalariados e os agricultores esperam receber do erário público mais do que contribuem para a sua receita. Consideram o estado como uma fonte de benefícios e não como um coletor de impostos. Essas crenças populares foram racionalizadas e elevadas à categoria de uma doutrina quase econômica por Lord Keynes e seus discípulos. Gastos públicos e déficits orçamentários são apenas sinônimos de consumo de capital. Se as despesas correntes, por mais benéficas que sejam consideradas, são financiadas ou por meio de impostos — principalmente pelo confisco daquela parte das maiores rendas que teria sido utilizada para investimento —, ou por aumento da dívida pública, o estado se converte no grande consumidor do capital existente. O fato de que um país ainda apresente um excedente anual de acumulação de capital em relação ao correspondente consumo de capital não invalida a afirmativa de que o conjunto das políticas financeiras do governo federal, dos estados e dos municípios provoca um crescente consumo de capital. No final, o que determina o curso da política econômica de uma nação são sempre as ideias econômicas aceitas pela opinião pública. Nenhum governo, seja democrático ou ditatorial, pode libertar-se da influência da ideologia dominante na sociedade. Os que defendem uma limitação das prerrogativas parlamentares em matéria de orçamento e de impostos, ou mesmo a substituição de um governo representativo por um governo autoritário, estão iludidos pela imagem quimérica de um perfeito chefe de estado. Esse homem, tão benevolente quanto sábio, se dedicaria sinceramente à promoção do bem-estar duradouro de seus súditos. Na realidade, entretanto, esse caudilho seria um homem mortal como todos os outros, e estaria, acima de tudo, preocupado com a perpetuação de seu poder e o de sua família, de seus amigos e do seu partido. Quando necessário, recorrerá a medidas impopulares apenas para atender a esses objetivos. Não investe nem acumula capital; apenas constrói fortalezas e equipa exércitos. Os tão famosos planos das ditaduras soviética e nazista consistiam em restringir o consumo corrente em favor dos "investimentos". Os nazistas nunca ocultaram que todos esses investimentos eram uma preparação para a guerra de agressão que pretendiam deflagrar. Os soviéticos foram, de início, mais discretos; mais tarde, proclamaram orgulhosamente que todo o seu planejamento estava dominado por considerações de poderio militar. A história não registra nenhum caso de acumulação de capital economicamente produtivo que tenha sido realizado pelo governo. O capital investido na construção de estradas, ferrovias e outras obras públicas úteis foi sempre obtido pela poupança individual dos cidadãos ou por empréstimo. Mas a maior parte dos fundos arrecadados através da dívida pública foi gasta em despesas correntes. O que os indivíduos haviam poupado foi dissipado pelo governo. Mesmo aqueles que consideram a desigualdade de renda e de riqueza uma coisa deplorável não podem negar que ela favorece a acumulação de novos capitais. E é somente o capital adicional que pode produzir progresso tecnológico, aumento de salários e um melhor padrão de vida. [1] Mir — comunidade rural. A terra era de propriedade comum dos lavradores, a cada um dos quais era atribuído um lote. O sistema não conseguiu sustentar a população crescente e foi abolido em 1906. [2] Artel — mutirão. [3] Zadruga — comunidade rural de quinze a setenta adultos e suas crianças, que viviam como uma grande família. A casa central do chefe da família possuía uma cozinha e um refeitório que atendia a todos. A propriedade não podia ser vendida. Ludwig von Mises foi o reconhecido líder da Escola Austríaca de pensamento econômico, um prodigioso originador na teoria econômica e um autor prolífico. Os escritos e palestras de Mises abarcavam teoria econômica, história, epistemologia, governo e filosofia política. Suas contribuições à teoria econômica incluem elucidações importantes sobre a teoria quantitativa de moeda, a teoria dos ciclos econômicos, a integração da teoria monetária à teoria econômica geral, e uma demonstração de que o socialismo necessariamente é insustentável, pois é incapaz de resolver o problema do cálculo econômico. Mises foi o primeiro estudioso a reconhecer que a economia faz parte de uma ciência maior dentro da ação humana, uma ciência que Mises chamou de "praxeologia".

José Dirceu, acreditem!, prevê massas nas ruas se for condenado pelo STF!!!

Na raiz da pantomima do Zé está a briga pelo espólio do PT. A lenta sucessão no partido já começou Entenda por que José Dirceu montou a tresloucada operação para tentar se safar no Supremo, sem poupar STF, PGR ou imprensa. Ele quer mais do que a absolvição. Ele quer é, finalmente, ter o controle total do PT. Ai, ai, terei de apelar a um autor que eles julgam “deles”, mas que José Dirceu certamente não leu porque não consta que o folgazão tenha sido um socialista muito disciplinado. No “18 Brumário”, ao esculhambar Luís Bonaparte — o sobrinho de Napoleão, que tentava viver como farsa as glórias do tio — escreveu Marx, acusando-o de se ligar à pior escória e formar um exército informal de vagabundos e desclassificados: “(…) só quando ele próprio assume a sério o seu papel imperial, e sob a máscara napoleônica imagina ser o verdadeiro Napoleão, só aí ele se torna vítima de sua própria concepção do mundo, o bufão sério que não mais toma a história universal por uma comédia e sim a sua própria comédia pela história universal.” A tirada serviria tanto para definir Luiz Inácio Lula da Silva como José Dirceu. O primeiro, no entanto, já está virando história (e esse fato é central nesta pantomima) — e fatalmente chegará o tempo em que será revisitado, por mais que o país emburreça. A caracterização da personagem patética, que faz de si mesmo uma imagem que os fatos se negam a referendar, serve hoje como a luva em José Dirceu, certamente o elemento mais deletério do petismo porque não carrega consigo nem mesmo a marca de certa inovação que Lula, sem dúvida, representou num dado momento da história — depois o sindicalista se perdeu e se dedicou à construção do aparelho partidário que ambicionaria, como ambiciona, substituir a sociedade. Dirceu, com o aporte de Lula, está na raiz de uma frenética movimentação para tentar desmoralizar as instituições brasileiras. Nada escapa ao seu radar, como aqui se vem dizendo desde o fim de março: Procuradoria-Geral da República, Supremo Tribunal Federal e, obviamente, a imprensa. A exemplo de Luís Bonaparte, também tem a sua escória: o subjornalismo pistoleiro — em versão impressa e eletrônica — e uma gangue organizada para patrulhar a Internet e constituir uma enorme rede de difamação de adversários. O objetivo é um só: demonstrar que ninguém tem autoridade moral no país para condená-lo e aos demais quadrilheiros (como os caracterizou a Procuradoria Geral da República). Todas as acusações que há contra a turma — escandalosamente recheadas de EVIDÊNCIAS E CONFISSÕES, como a feita por Duda Mendonça — seriam fruto de uma grande conspiração. Não por acaso, Rui Falcão, presidente do PT, a lorpa da democracia e do estado de direito, saiu atirando contra a o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e contra a imprensa. “Contra a imprensa, não, contra a VEJA!”, diria um bobinho. Isso é bobagem! Podem ter lá a sua hierarquia de desafetos dentro do ódio geral. Mas o ódio que cultivam é à liberdade de expressão. Basta que lembremos quantas vezes eles tentaram criar mecanismos para censurar o jornalismo. Lula teria feito a promessa solene a alguns interlocutores que ainda conseguirá esse intento antes de sair de cena. Na semana passada, Falcão anunciou que a “mídia” será o próximo alvo do governo Dilma. Consta que falou por sua própria conta. De todo modo, o dinheiro público continua a financiar a esgotosfera, prática inexistente nas demais democracias do do mundo. Sigamos. Povo nas ruas O “Zé” agora deu para espalhar por aí, com convicção mesmo, a seus interlocutores que “a sociedade não aceitará a sua condenação” e que, se isso acontecer, “haverá reação”. É mesmo? Reação de quem? Dirceu está confundindo a súcia virtual criada pelos seus sequazes, que finge formar um exército de milhões na Internet, com pessoas de verdade. Quem irá às ruas por José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoino? Ousaria dizer que, hoje, nem mesmo o sindicalismo da CUT, que sabe ser pragmático quando interessa, se apressaria mover uma palha em favor deste senhor. Por que tanto desespero? Lula e Dirceu se uniram nessa batalha por motivos diferentes. O primeiro não quer que seu governo fique com a marca de ter protagonizado o maior escândalo da história republicana. Se for superado, será pelo próprio petismo — algo me diz que, bem investigada, as relação do governo federal com a Delta pode disputar o primeiro lugar. Lula já reescreveu o passado, fez com o presente o que bem quis — porque boa parte da crítica política houve por bem suspender o juízo — e agora pretende aprisionar o futuro. Tem alma de ditador, mas contida por uma institucionalidade que nunca foi de seu agrado. De todo modo, está de olho na história. Dirceu não! Dirceu está mesmo é de olho num, como direi, futuro mais próximo, que já começa a ser presente. Lula, é fato, perdeu muito de seu vigor. Ainda que venha a recobrar a saúde possível, já não é mais aquela força da natureza. Poucos se deram conta de que o PT começa a ensaiar os primeiros passos da sucessão — não sucessão formal, claro! Esta é irrelevante. O partido começa a dar os primeiros passos em busca da nova força unificadora. A máquina é gigantesca, e esse é um processo muito lento. Atenção! Não se trata de buscar um novo Lula — isso não haverá, como não houve um novo Getúlio Vargas (Emir Sader, o apedeuta diplomado, escreve “Getulho”!!!). Trata-se de consolidar posições para liderar uma era partidária pós-Lula. Se José Dirceu for condenado — e, acreditem, há mais gente no PT torcendo por isso do que no PSDB!!! —, é evidente que ele e seu grupo perdem força. Ninguém se candidata a liderar uma das maiores legendas no país com uma condenação das costas de “chefe de quadrilha”. Gente com essa denominação merece é aquele terno listrado. O Zé não está apenas querendo limpar a sua biografia ou pensando, sei lá, em obter ganhos pessoais. Nessa área, ele é um portento, não é mesmo? Já foi até consultor da construtora… Delta! Nada disso! O Zé quer é o poder mesmo! Se não for ele a liderar esse PT pós-Lula, pensa lá com seus botões, será quem? Sabe que a eventual condenação no Supremo provocará a deserção de alguns de seus generais. O Zé precisa da absolvição para travar a luta interna, que fatamente virá. Perderam o juízo e a vergonha Daí o vale-tudo. Essa gente perdeu o que restava de juízo e também a vergonha. E anda falando demais! Aqui e ali, os supostos votos no Supremo estão sendo cantados e anunciados como se a Corte fosse a casa da mãe-joana, e os ministros pudessem ser separados entre aqueles que estão enquadrados e aqueles que não estão. Prefiro pensar que isso tudo é fantasia e uma forma de difamação da corte. Nesse sentido, a defesa que ministros do Supremo fizeram ontem de Gurgel foi positiva. Eis Dirceu! Na luta pelo poder, este senhor não mede consequências. O que o Supremo vai decidir, além da sua culpa ou da sua inocência perante a Justiça (e que os ministros decidam segundo os autos), é se o Brasil continuará ou não sujeito a seus métodos e à sua comédia pessoal, vivida como se fosse a história universal.Por: Reinaldo Azevedo

A ideologia verde

Com a aproximação da Conferência Rio+20, as declarações apocalípticas dão o tom do debate. O ministro Gilberto Carvalho, por exemplo, declarou que “o mundo se acabaria rapidamente se fosse universalizado o padrão de consumo das elites”. No mesmo diapasão, o neoconservaciocista Delfim Neto – ninguém menos que um dos idealizadores da escandalosa Transamazônica - foi categórico, em entrevista ao Globo: “Conflitos serão inevitáveis. Não há como o planeta sustentar nove bilhões de pessoas com renda de US$ 20 mil cada”. Essa gente não tem a menor imaginação. No início do Século XIX, quando a Terra era habitada por apenas 1 bilhão de pessoas, Thomas Malthus previu que a população mundial cresceria em proporções geométricas, enquanto a produção de alimentos e outros recursos cresceria em progressão aritmética. “A morte prematura visitará a humanidade em breve, que sucumbirá em face da escassez de alimentos, das epidemias, das pestes e de outras pragas”, profetizou. Em 1968, quando a população mundial era de 3,5 bilhões, o ecologista Paul Ehrlich, um colecionador de prêmios e comendas científicas, escreveu um livro (The Population Bomb) onde previu que, como resultado da superpopulação, centenas de milhões de pessoas morreriam de fome nas décadas seguintes. Num discurso de 1971, ele previu que "até o ano de 2000, o Reino Unido será simplesmente um pequeno grupo de ilhas empobrecidas, habitadas por cerca de 70 milhões de famintos." De lá para cá, a população mundial dobrou e, embora ainda haja problemas sociais graves a resolver, principalmente ligados à pobreza, as previsões alarmistas de Malthus e Ehrlich jamais se concretizaram. Pelo contrário, graças às novas tecnologias e ao crescimento esponencial da produtividade, o percentual de subnutridos nos países em desenvolvimento, em relação ao total da população, vem apresentando uma firme tendência declinante há quatro décadas, tendo baixado de 33% em 1970 para 16% em 2004. O chamado “movimento verde” nasceu da justa indignação de alguns com o desmatamento, a poluição do ar, dos rios e dos mares, além da preocupação com os riscos para a saúde humana provenientes da atividade industrial. Com o tempo, entretanto, o movimento foi sendo dominado e transformado por ideólogos esquerdistas, preocupados não com a poluição ou com a nossa saúde, mas com a política e o poder. A partir desse ponto, a doutrinação, o proselitismo e a disseminação do pânico foram tão fortes que as teorias mais bizarras tornaram-se politicamente corretas. A essência da ideologia verde está na crença de que a humanidade deve minimizar o seu impacto sobre a natureza, custe o que custar. Vide a gritaria contra a aprovação do novo Código Florestal, uma lei extremamente preservacionista e restritiva à atividade econômica, sem similar no mundo, mas que, mesmo assim, conseguiu desagradar os xiitas. Mas os seus principais inimigos são mesmo os combustíveis fósseis, as hidrelétricas e termonucleares, que, não por acaso, ao todo significam quase 98% da produção de energia do planeta, e sem os quais o mundo para. O que os adeptos desse radicalismo se recusam a enxergar é que nós, seres humanos, só sobrevivemos e prosperamos através da transformação da natureza, sem o quê não satisfazemos as nossas necessidades mínimas. Nosso bem estar está diretamente ligado à nossa capacidade de tornar o ambiente a nossa volta menos agressivo e mais hospitaleiro. Pensem por um minuto no que seria de nós sem os modernos sistemas de esgotamento sanitário, a água encanada, as construções mais seguras, resistentes e protegidas das intempéries naturais, a comida fresca e farta, as vacinas e os remédios, os meios de transporte e comunicação rápidos e eficientes. Graças a Deus, as gerações que nos precederam visaram o progresso. Elas tiveram orgulho de construir fábricas, abrir estradas, perfurar poços e escavar a terra a procura de novos recursos. Felizmente, não estavam contaminados pela ideologia verde. O desenvolvimento econômico que eles nos legaram, longe de ser nocivo, é uma verdadeira dádiva, que nos forneceu as ferramentas e a tecnologia necessárias para tornar o nosso habitat mais saudável e acolhedor. É verdade que tudo isso resultou em alguma poluição e desmatamento. No entanto, mesmo esses indesejáveis efeitos negativos têm sido superadas com bastante êxito pelas nações mais avançadas. É claro que a solução não está na restrição do consumo, mas no aumento da produtividade e no desenvolvimento tecnológico. Sem falar que os mais prejudicados, caso esse fanatismo ambientalista prevaleça, serão os mais pobres, caso sejam privados do uso de fontes de energia eficientes e baratas, e, consequentemente, da chance de poderem um dia usufruir do padrão de vida dos países ricos.Por: João Luiz Mauad, O GLOBO

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Código Florestal


Os americanos dizem: " quer proteger fazendas e ranchos aqui? Proteja florestas lá". Lá é o Brasil.

O anúncio acima desmascara toda a campanha que Greenpeace, WWF, ISO e outras ONGS internacionais estão movendo contra o Brasil. Elas representam interesses internacionais poderosos, como da OGGA, associação dos plantadores de milho de Ohio e da Avoided Deforestation Partners, uma entidade de proteção de florestas. 

texto do anúncio é estarrecedor e diz que os americanos devem lutar para proteger as florestas tropicais para que eles possam continuar com as suas fazendas. Que isto é uma causa justa. Que a derrubada de florestas prejudica a agricultura americana, pois o desmatamento reduz o preço das commodities e prejudica a competitividade dos produtos, colocando pressões adicionais sobre as famílias americanas. Que a solução simples, rápida, eficaz e acessível é proteger as florestas. As nossas florestas. Para que eles possam ter fazendas e ranchos lá.

Eles estão errados? É claro que não! Errados somos nós, que aceitamos que as ONGS internacionais venham para cá, defendam os interesses de lá, prejudicando a agropecuária do Brasil, que é competitiva, eficiente e moderníssima. Hoje saiu a Balança Comercial da Agropecuária. Em quatro meses, o Agro deixou U$ 20 bilhões de superavit para o Brasil. E tem gente que comtinua defendendo florestas aqui para eles terem fazendas lá. Ninguém quer desmatar. O que não podemos admitir é abrir mão da nossa soberania territorial e da nossa democracia nesta discussão do Código Florestal.

Dilema

Cada unidade exportada pelo Brasil em 2011 podia comprar 34% a mais do que em 2001 Leitor voraz de jornais, deparei-me há uns dias com a declaração de uma figura do alto escalão econômico do país comemorando a queda do preço das commodities, que, segundo ele, abriria espaço para a redução adicional da taxa de juros. Achei curiosa a celebração, pois, sendo o país um produtor e exportador de commodities, certa dose de masoquismo parece ser necessária para entender tamanha satisfação. Com efeito, qualquer um que tenha acompanhado o desempenho econômico do Brasil nos últimos anos deveria ter em mente o papel central que a elevação do preço internacional das commodities desempenhou de 2001 para cá. Entre 2001 e 2011, os preços de commodities em dólares (medidos pelo índice CRB) aumentaram 77%, já descontada a inflação (medida pelos preços ao produtor nos EUA). Não por acaso, os preços médios das exportações brasileiras cresceram 86% acima da inflação no mesmo período, superando amplamente a elevação dos preços de produtos importados (38%). Assim, cada unidade exportada pelo Brasil em 2011 podia comprar 34% a mais do que em 2001. Dado que a quantidade exportada cresceu 75% nesse período, nosso poder de compra externo aumentou nada menos do que 135%, permitindo uma elevação considerável das importações sem piora das contas externas. De fato, o deficit externo, que equivalia a 4,5% do PIB (40% das exportações) em 2001, caiu para 2,1% do PIB (20% das exportações) em 2011. Segundo minhas estimativas, essa melhora trouxe um ganho ao país da ordem de US$ 60 bilhões no ano passado, ou seja, 2,4% do PIB. Na prática, permitiu que a demanda interna crescesse sistematicamente acima da produção local (algo como um ponto percentual por ano nos últimos seis anos), sendo a diferença coberta por maiores importações, pagas principalmente pelo aumento do poder de compra das exportações. Não há como exagerar o papel das commodities nessa história. Todavia, tais preços vêm caindo desde o terceiro trimestre de 2011, trazendo consigo os preços das exportações nacionais e revertendo (parcialmente) o fenômeno observado até então. No primeiro trimestre deste ano, cada unidade exportada podia comprar cerca de 6% a menos do que no terceiro trimestre do ano passado. A queda na capacidade de importar também reduz o papel das commodities no sentido de manter baixos os preços de produtos manufaturados Por causa disso, de janeiro a março deste ano as exportações atingiram cerca de US$ 4,5 bilhões menos do que poderiam ter alcançado caso os preços não houvessem caído, pouco menos de 1% do PIB. Sem queda adicional de preços, estimo que as perdas podem chegar à casa de US$ 25 bilhões no ano, já descontado o efeito dos menores preços de produtos importados. Como houve redução adicional, contudo, esse valor representa hoje a estimativa mínima para a perda associada à queda de preços de commodities. À luz do descrito acima, não é difícil entender a relação estreita entre esses preços e o desempenho da moeda. Tipicamente o real se aprecia quando os preços de commodities sobem e perde valor quando o contrário ocorre, impedindo que seu aumento (ou queda) se traduza integralmente para os preços em reais e, portanto, mitigando seu efeito sobre a inflação doméstica. Entretanto, a intervenção pesada sobre a taxa de câmbio tem limitado esse mecanismo amortecedor. Enquanto os preços das commodities em dólares caíram 9% entre o terceiro trimestre do ano passado e abril de 2012, esses preços medidos em reais aumentaram 3% no mesmo intervalo (6% nos últimos dois meses), de onde se torna difícil ver sua propalada contribuição à queda da inflação. Por outro lado, a queda na capacidade de importar também reduz o papel das commodities no sentido de manter baixos os preços de produtos manufaturados. Em suma, celebrar a queda do preço de commodities me parece um exercício em masoquismo econômico ou então um desconhecimento alarmante do processo que vitaminou nosso crescimento nos últimos anos. Não saberia dizer qual é a pior alternativa. Por: Alexandre Schwartsman  

Os alemães devem ser idiotas

Você precisa reduzir o colesterol e entrar em forma. Um médico recomenda restrição alimentar - tipo peixe levemente grelhado com legumes no vapor, água com gás e o requinte máximo de uma rodela de limão - mais uma carga pesada de exercícios físicos. Diários. O outro diz que você pode chegar ao mesmo resultado comendo o que gosta, talvez reduzindo os doces, e jogando umas partidas de bocha. Havendo alguma chance de que esta segunda opção funcione, você será um idiota se escolher a primeira. Ou seja, os alemães são uns idiotas. Essa é a conclusão inevitável que se tira do modo como muita gente apresenta as alternativas de política econômica em disputa na Europa. Dizem: a chanceler Angela Merkel recomenda - mais do que isso, impõe o regime da austeridade, sacrifício e suor do rosto. François Hollande, o presidente eleito da França, admite que é preciso ter algum cuidado com a alimentação, as contas públicas, mas oferece o caminho do crescimento acelerado e, melhor, sem muito trabalho. Por exemplo, diz que vai reduzir a idade mínima de aposentadoria de 62 para 60 anos. Na Alemanha, é de 63 anos, mas está subindo para 65 e pode chegar a 67, em alguns casos. Hollande também vai garantir a jornada semanal de 35 horas - uma bandeira de seu Partido Socialista. Na Alemanha, a jornada média chega às 41 horas, sendo a mais longa entre os europeus mais ricos. E os salários na França são mais elevados do que na Alemanha. Como se dizia: é melhor ser rico com saúde do que pobre doente, não é mesmo? Melhor trabalhar menos, ganhar mais, e aposentar-se antes... Tem uns probleminhas, porém. O desemprego na Alemanha está na faixa dos 5%, um dos níveis mais baixos do mundo. Na França, é o dobro. Na saída da crise, a Alemanha cresceu acima de 3,2% em 2010 e 2011. A França, metade disso. Hollande alegou, durante a campanha, que a França cresceu pouco justamente por causa da receita de austeridade - redução do gasto público, especialmente - imposta pelo presidente Sarkozy, uma espécie de sub-Merkel. Não faz sentido. Sarkozy não aplicou a austeridade, de cuja ideia se afastou justamente por medo de perder a eleição, nem fez qualquer reforma estrutural importante. Conseguiu, é verdade, elevar a idade de aposentadoria para 62 anos, mas essa mudança só começaria a valer mais à frente - de modo que ainda não trouxera qualquer efeito antes de ser declarada morta. Também prometera colocar a França de volta ao trabalho, eliminando a jornada de 35 horas, mas conseguiu apenas algumas exceções, caras. Já a Alemanha fez boa parte dessas reformas estruturais no início dos anos 2000 - e isso, ironia, com um governo de esquerda, do social-democrata Gerhard Schröder. A partir daí, assentou as bases do crescimento da década seguinte e, especialmente, a capacidade de escapar da crise mais rapidamente. De onde tiraram que a receita alemã não funciona? É um equívoco enorme apresentar a receita Merkel como a da recessão, em oposição à agenda de crescimento de Hollande. Merkel está dizendo duas coisas: primeiro, que não é possível crescer de maneira sustentada aumentando déficits e dívidas públicas já elevadas; segundo, também não se cresce sem reformas estruturais que devolvam competitividade às economias nacionais. Ou seja, a França cresce pouco e tem desemprego alto não por causa da austeridade - o governo gasta lá o equivalente a 56% do PIB, recorde europeu - mas pela falta de competitividade e excesso de despesa e impostos. Como resolver a falta de crescimento? Ora, é simples, diz Hollande: crescendo mais... E sabe o que deve acontecer? Nada, além da retórica. O governo Hollande acabará sendo muito parecido com o de Sarkozy - nada de mudanças sensíveis. Merkel vai topar algum plano de novos investimentos europeus, com um dinheirinho de algum fundo de desenvolvimento, para o pessoal dizer que se aplicou a agenda do crescimento. Como as contas públicas francesas não estão em situação dramática, há um estímulo para continuar levando assim: crescimento baixo, desemprego alto - mas uma boa vida para quem está empregado ou aposentado. As futuras gerações que se danem. Por: CARLOS ALBERTO O GloboSARDENBERG

O BC e o coelhinho da Páscoa

O Estadão escreveu um importante editorial hoje alertando para os riscos de um BC politizado. O jornal afirma que "já não pode haver dúvida sobre a influência da presidente Dilma Rousseff na política oficial de juros, principal instrumento da administração monetária". A postura do BC tem sido claramente arriscada, para não dizer irresponsável. Os sinais de subserviência política são evidentes. O editorial conclui: "O resultado é um perigoso e indisfarçável retrocesso na gestão da política monetária". O presidente do BC, Alexandre Tombini, não gostou nada das acusações, e escreveu uma resposta publicada no site da instituição. Nela, Tombini garante: "O Banco Central tem assegurada total autonomia para tomar decisões de política monetária, sem quaisquer interferências de outros órgãos do governo ou de agentes econômicos". Mas a pergunta que não quer calar é: quem ainda acredita nisso? Em um ato falho talvez, Tombini usa em nota oficial o termo "presidenta" quando tenta negar a influência da presidente nas decisões de política monetária. Ora ora, meu caro Tombini, quem ainda não percebeu que a senha para detectar em um segundo um servo da presidente é justamente o uso dessa agressão à língua portuguesa que é o uso do termo presidenta? Sinto muito, mas você se entregou já nesse momento. Tombini afirma: "A presidenta da República, Dilma Rousseff, já afirmou publicamente que a condução da política monetária é da alçada exclusiva do Banco Central do Brasil". Eis o problema: dependemos da palavra da presidente, que pode não valer tanto assim para os investidores. O que vale mais são as atitudes e as instituições. Cabe perguntar: por que o Banco Central não goza de independência jurídica ainda? Por que sua autonomia não foi lavrada em lei, com mandato intercalado entre presidente da República e presidente do BC, como ocorre nos países desenvolvidos? É verdade que isso também não é uma garantia gravada em pedra e imutável, pois mesmo o independente BCE corre sérios riscos de politização. Mas ao menos não teríamos uma "autonomia" tão frágil assim, não é mesmo? A presidenta diz, então é verdade? Desculpa, mas nós investidores não funcionamos dessa forma... Por fim, Tombini tenta assegurar o critério estritamente técnico para as decisões do BC: "Todas as decisões tomadas pela atual diretoria colegiada seguem análises e critérios estritamente técnicos, que são explicitados nos documentos oficiais do Banco Central". Há controvérsias! Para quem quer outra opinião, recomendo os artigos de Alexandre Schwartsman na Folha, ou alguns meus mesmo, como esse em que falo dos malabarismos do BC, e esse, onde questiono o tal modelo SAMBA utilizado. Em suma, temos (ainda) liberdade de expressão sim, e cada um fala o que quer. O Estadão acusa o BC de estar domesticado, e o presidente do BC reage em defesa da "presidenta" e sua mesmo. Cada um acredita em quem quiser, claro. Tem gente que acredita em Papai Noel, em coelhinho da Páscoa, e até em nosso BC totalmente independente da pressão política da presidenta! Viva a liberdade de credo... Por: Rodrigo Constantino

Roberto Civita não é Rupert Murdoch

Editorial de O GLOBO 

Blogs e veículos de imprensa chapa branca que atuam como linha auxiliar de setores radicais do PT desfecharam uma campanha organizada contra a revista "Veja", na esteira do escândalo Cachoeira/Demóstenes/Delta. A operação tem todas as características de retaliação pelas várias reportagens da revista das quais biografias de figuras estreladas do partido saíram manchadas, e de denúncias de esquemas de corrupção urdidos em Brasília por partidos da base aliada do governo. É indisfarçável, ainda, a tentativa de atemorização da imprensa profissional como um todo, algo que esses mesmos setores radicais do PT têm tentado transformar em rotina nos últimos nove anos, sem sucesso, graças ao compromisso, antes do presidente Lula e agora da presidente Dilma Roussef, com a liberdade de expressão. A manobra se baseia em fragmentos de grampos legais feitos pela Polícia Federal na investigação das atividades do bicheiro Carlinhos Cachoeira, pela qual se descobriu a verdadeira face do senador Demóstenes Torres, outrora bastião da moralidade, e, entre outros achados, ligações espúrias de Cachoeira com a construtora Delta. As gravações registraram vários contatos entre o diretor da Sucursal de "Veja" em Brasília, Policarpo Jr, e Cachoeira. O bicheiro municiou a reportagem da revista com informações e material de vídeo/gravações sobre o baixo mundo da política, de que alguns políticos petistas e aliados fazem parte. A constatação animou alas radicais do partido a dar o troco. O presidente petista, Rui Falcão, chegou a declarar formalmente que a CPI do Cachoeira iria "desmascarar o mensalão". Aos poucos, os tais blogs começaram a soltar notas sobre uma suposta conspiração de "Veja" com o bicheiro. E, no fim de semana, reportagens de TV e na mídia impressa chapas brancas, devidamente replicados na internet, compararam Roberto Civita, da Abril, editora da revista, a Rupert Murdoch, o australiano-americano sob cerrada pressão na Inglaterra, devido aos crimes cometidos pelo seu jornal "News of the World", fechado pelo próprio Murdoch. Comparar Civita a Murdoch é tosco exercício de má-fé, pois o jornal inglês invadiu, ele próprio, a privacidade alheia. Quer-se produzir um escândalo de imprensa sobre um contato repórter-fonte. Cada organização jornalística tem códigos, em que as regras sobre este relacionamento — sem o qual não existe notícia — têm destaque, pela sua importância. Como inexiste notícia passada de forma desinteressada, é preciso extremo cuidado principalmente no tratamento de informações vazadas por fontes no anonimato. Até aqui, nenhuma das gravações divulgadas indica que o diretor de “Veja” estivesse a serviço do bicheiro, como afirmam os blogs, ou com ele trocasse favores espúrios. Ao contrário, numa das gravações, o bicheiro se irrita com o fato de municiar o jornalista com informações e dele nada receber em troca. Estabelecem as Organizações Globo em um dos itens de seus Princípios Editoriais: "(...) é altamente recomendável que a relação com a fonte, por mais próxima que seja, não se transforme em relação de amizade. A lealdade do jornalista é com a notícia". E em busca da notícia o repórter não pode escolher fontes. Mas as informações que vêm delas devem ser analisadas e confirmadas, antes da publicação. E nada pode ser oferecido em troca, com a óbvia exceção do anonimato, quando necessário. O próprio braço sindical do PT, durante a CPI de PC/Collor, abasteceu a imprensa com informações vazadas ilegalmente, a partir da quebra do sigilo bancário e fiscal de PC e outros. O "Washington Post" só pôde elucidar a invasão de um escritório democrata no conjunto Watergate porque um alto funcionário do FBI, o "Garganta Profunda", repassou a seus jornalistas, ilegalmente, informações sigilosas. Só alguém de dentro do esquema do mensalão poderia denunciá-lo. Coube a Roberto Jefferson esta tarefa. A questão é como processar as informações obtidas da fonte, a partir do interesse público que elas tenham. E não houve desmentidos das reportagens de "Veja" que irritaram alas do PT. Ao contrário, a maior parte delas resultou em atitudes firmes da presidente Dilma Roussef, que demitiu ministros e funcionários, no que ficou conhecido no início do governo como uma faxina ética.

terça-feira, 8 de maio de 2012

O naufrágio da Europa

François HOLLANDE ganha as presidenciais francesas e a Europa, ou uma parte dela, respira de alívio: agora, finalmente, será possível abandonar a austeridade e abraçar o crescimento econômico. O próprio Hollande foi alimentando as expectativas: com ele, a disciplina orçamental imposta pelos alemães aos restantes países da União Europeia seria "renegociada"; a economia francesa iria promover políticas de crescimento econômico a curto prazo; e o Estado social seria preservado, e até reforçado, com mais funcionários públicos, a diminuição da idade da reforma (dos 62 para os 60 anos) e subsídios de todo tipo (para famílias, jovens, empresas etc.). Infelizmente, faltou a pergunta sacramental: e quem paga todos esses delírios? Mistério. Verdade que "monsieur" Hollande, para sustentar algumas das suas propostas, acredita que a Europa será capaz de emitir "eurobonds" para financiar grandes projetos industriais ou de infraestruturas; ou até de alterar os estatutos do Banco Central Europeu para que a instituição passe a financiar diretamente os Estados. O que Hollande desconhece, ou propositadamente ignorou, é que nada disso depende da sua exclusiva vontade. E a Alemanha, que tem a chave do cofre, opõe-se frontalmente às ambições do novo presidente francês. Por questões de princípio, interesse econômico -e eleições em 2013. Ou muito me engano, ou as expectativas geradas por François Hollande só vão durar até as eleições legislativas de junho. Depois, será a ressaca da realidade. 2. Alguns amigos que trabalham na União Europeia não gostam das minhas posições eurocéticas. A União Europeia é sagrada, o euro, idem, as "políticas de austeridade" impostas pela Alemanha, ibidem. E eu não passo de um dinossauro, amarrado a noções anacrônicas de "soberania nacional" que não têm mais lugar no mundo globalizado onde vivemos. Defendo-me como posso. Digo que nada tenho contra a União Europeia. Pelo contrário: reconheço o seu papel como garantia de paz e prosperidade na Europa. Mas reconhecer isso não me obriga a reconhecer o resto. O euro, por exemplo, foi um erro político grave -e a sua manutenção a qualquer preço, um erro político ainda maior. Não é possível que uma moeda comum possa servir a países com estruturas econômicas tão distintas. A União Europeia não é uma federação de Estados. É apenas uma coleção de tribos com histórias, vícios e virtudes dissonantes. O euro, que supostamente acabaria por aproximar as nações do continente, apenas revelou o fosso inultrapassável que existe entre países excedentários (Alemanha) e deficitários (Grécia ou Portugal). De resto, e sobre as "políticas de austeridade", não me oponho a elas -em teoria: é importante que os Estados tenham controle nos gastos e moderação nos seus níveis de endividamento. A festa do euro, que possibilitou dinheiro fácil a juros baixos, não podia continuar. O problema é que não é possível realizar ajustamentos brutais nas economias endividadas do continente quando esses países perderam soberania monetária. A austeridade só alimenta ciclos recessivos sem fim que, por sua vez, exigem novas medidas de austeridade. A Grécia é o melhor exemplo dessa armadilha: depois de dois pacotes de resgate e de um calote negociado da dívida, o país está na mesma: quebrado. E, sem surpresa, com partidos extremistas a crescerem no Parlamento e nas ruas. 3. França, Grécia, Holanda em breve: a grande novidade nos ciclos eleitorais da Europa está no regresso dos extremismos. No primeiro turno das presidenciais francesas, a extrema-direita da Frente Nacional obteve 17,8% dos votos; Marine Le Pen promete agora repetir o resultado nas legislativas de junho. Na Grécia, a esquerda radical ficou em segundo lugar -e um partido abertamente neonazista elegeu duas dúzias de deputados. E, na Holanda, a extrema-direita derrubou o governo duas semanas atrás. Qualquer pessoa que tenha uma noção da história reconhece o que se está a passar: com economia moribunda e desemprego massivo, a Europa regressa à década de 1930. Os meus amigos euroentusiastas assobiam para o lado e fingem que não se passa nada. Essa atitude também faz parte do "déjà-vu".Por:João Pereira Coutinho, Folha de SP

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Pagando para apanhar

De conivente com os seguidos maus-tratos que o governo de Cristina Kirchner vem aplicando às exportações brasileiras, o governo de Dilma Rousseff se dispõe agora a estimular a Argentina a agir como tem agido. Como que movido por um injustificável complexo de culpa - que o impede de cumprir o papel que dele se espera, de defesa dos interesses do País -, aos maus modos com que os fiéis servidores de Kirchner tratam os produtos brasileiros, o governo do Partido dos Trabalhadores responderá com oferta de crédito para as exportações argentinas. É como se estivesse disposto a pagar para que a economia brasileira continue a apanhar. Por coincidência, o volume a ser financiado pode chegar exatamente ao valor do superávit comercial registrado pelo Brasil no comércio com a Argentina em 2011, de US$ 5,8 bilhões, como admitiu o secretário executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Alessandro Teixeira. Se chegar a esse montante, o financiamento será maior do que o superávit que o País alcançará neste ano no comércio com a Argentina. As medidas protecionistas que, contrariando as regras do comércio internacional, o governo Kirchner adota há tempos estão provocando forte queda das importações de todas as origens. Mas entre os parceiros comerciais mais prejudicados pelo crescente protecionismo kirchnerista está o Brasil, principal sócio da Argentina no Mercosul - bloco comercial que, na prática, está se tornando cada vez menos relevante por causa de medidas como as adotadas pelos argentinos, que reduzem sua condição de união aduaneira a uma mera formalidade. Em abril, as exportações brasileiras para a Argentina caíram 27% em relação às vendas de abril de 2011. Medidas protecionistas, muitas disfarçadas de providências administrativas, são cada vez mais usadas pelo governo argentino. Continua a aumentar, por exemplo, a lista de produtos para os quais não há mais licença automática de importação - o que dificulta o comércio. Além disso, quando concedida, a licença tem demorado mais do que os 60 dias permitidos pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Desde fevereiro está em vigor a exigência de apresentação prévia, pelo importador, de uma detalhada declaração juramentada à Administração Federal da Receita Pública (Afip), equivalente à Receita Federal do Brasil. O documento é analisado também por outros órgãos do governo, que não têm prazo para se manifestar, o que retarda um processo já complicado. O resultado do controle mais severo das importações pelas autoridades argentinas, de um modo que vem sendo criticado cada vez mais duramente por seus parceiros e questionado na OMC, não poderia ser outro: atraso na liberação dos pedidos de importação e o acúmulo de mercadorias na alfândega. "Há um desordenamento total no fluxo do comércio exterior", resumiu a presidente executiva da Bracelpa (que reúne os produtores brasileiros de papel e celulose), Elizabeth de Carvalhaes, para o jornal Valor (2/5). Cerca de 40% dos embarques de papel e celulose feitos entre janeiro e março foram retidos nas alfândegas e as remessas de abril foram totalmente bloqueadas. O protecionismo argentino afeta boa parte da produção local, que o governo Kirchner diz querer proteger. Muitas indústrias argentinas, em tese protegidas pelo governo, dependem de componentes importados. É o caso das fabricantes de geladeiras, que utilizam compressores fabricados no Brasil. A indústria de liquidificadores utiliza vários componentes importados, como copos chineses. Boa parte da indústria de vestuário emprega tecido importado. Para o consumidor final, o produto considerado nacional fica mais caro ou começa a faltar nas lojas. Sem contar que produtos finais importados - entre os quais alimentos, eletrodomésticos e brinquedos - também desaparecem das prateleiras. Os exportadores brasileiros, além dos transtornos causados pelo aumento das exigências argentinas, são onerados com o aumento dos custos logísticos ou mesmo perda de negócios. O governo Dilma parece concordar com tudo isso.Por: EDITORIAL O ESTADÃO, O Estado de S. Paulo

Argentina, a marginalizada

Cerca de 20 anos atrás, um importante ministro argentino surpreendeu um embaixador recém-chegado do Brasil, dizendo-lhe que "a Argentina é pródiga em três coisas: carne, trigo e em tomar atitudes insanas". A decisão de expropriar 51% da YPF, maior empresa energética argentina, braço da empresa espanhola Repsol é um desses gestos. Somada à sua desconsideração em relação aos credores estrangeiros e ao crescente e arbitrário protecionismo que desrespeita todas as regras mundiais e regionais, a decisão tomada pela presidente Cristina Fernández de Kirchner leva a Argentina para mais perto de ser considerado internacionalmente como um país sem lei. Quaisquer que sejam seus benefícios e popularidade no curto prazo, gestos de tal gravidade sempre implicam graves consequências de longo prazo. Em particular, criam o risco de isolar um país dos principais fluxos de crédito, investimento e comércio - ou seja, todas as atividades que geram oportunidade econômica e prosperidade. Maus governos são sempre orientados por seu anseio de um surto imediato na popularidade, independentemente dos custos futuros. Governos argentinos vem fazendo disso um hábito desde que Juan Domingo Perón chegou ao poder em 1946. Com efeito, como resultado da decisão de Cristina, a Argentina agora se encontra em ostracismo internacional nos mercados de energia e financeiros. Impossibilitada de prover qualquer investimento ou recursos tecnológicos e know-how para explorar as reservas da YPF, seu governo precisará convidar outros para preencher o vazio financeiro e tecnológico criado pela exclusão forçada da Repsol. Mas qualquer empresa internacional que participe da exploração dos bens expropriados da Repsol poderá enfrentar sérios problemas legais. A Petrobras, gigante brasileira no setor energético e uma das maiores companhias do mundo, foi publicamente convidada a expandir sua produção na Argentina mediante novos investimentos. A Petrobras, com os seus interesses em todo o mundo, nunca poderia aceitar esse convite, especialmente em vista de seu esforço para obter o financiamento de que necessita para explorar as imensas reservas brasileiras de petróleo no mar. Comenta-se que a Sinopec, segunda maior empresa petrolífera chinesa, manteve discussões com a Repsol para adquirir uma parte substancial de seus ativos na Argentina. Agora, todas as alternativas estão fora de questão. Como disse à Reuters uma fonte chinesa não identificada, "essa é uma situação complicada para qualquer empresa, tendo em vista as medidas tomadas pelo governo. Para mim, seria suicídio político permitir a uma empresa chinesa prospectar os direitos de controle sobre a YPF, após o anúncio de estatização". A Repsol foi severamente prejudicada pela ação de Cristina, tendo perdido cerca de 50% de sua capacidade produtiva e um terço de sua receita. O governo da Espanha, indignado, promete vigorosa retaliação, e com certeza terá o apoio político da União Europeia. Mas é difícil imaginar que medidas poderão efetivamente levar Cristina a reconsiderar [sua decisão]. Afinal de contas, uma vez que tudo isso era previsível, e que os investidores estrangeiros agora ficarão mais reticentes em entrar no mercado, ela claramente calculou que os benefícios políticos superariam largamente os custos econômicos. Mas isso depende muito de a estatização resultar em aumento da produção. Parece claro que isso não acontecerá, a menos que o governo decida injetar enormes recursos fiscais na YPF à custa de outras necessidades prementes. Uma vez que isso é improvável, é inevitável uma escassez no suprimento. O petróleo desperta grande fascínio popular. Para países que o possuem em abundância, é um dos pilares mais sólidos e centrais de nacionalismo. E é, em toda parte, o motivo real ou imaginário de muitas guerras - o "ouro negro" que alimenta e desperta a cobiça. Para aqueles governantes que não se importam se suas vitórias são de Pirro, é também um recurso de fácil acesso para manipular a imaginação pública com as teorias da conspiração e posturas patrióticas. O governo de Cristina tem emitido sinais de que está determinado a continuar em seu curso errático, não apenas criando caos na economia, mas também marginalizando o país aos olhos da comunidade internacional. Mas decisões como essa, que por vezes parecem começar bem, invariavelmente, terminam mal. Pessoalmente, estou profundamente entristecido com o fato de a Argentina ter enveredado nesse terreno de erros e ilusões. É um grande país, com pessoas sofisticadas e extremamente bem-sucedidas em todos os campos. Para o Brasil, não pode haver satisfação em ver um vizinho tão próximo distanciar-se do direito internacional e envolver-se em aventuras perigosas, em última instância em detrimento de seu próprio povo.Por: LUIZ FELIPE LAMPREIA, Valor Econômico

O assustador ataque aos bancos

O atual governo tem demonstrado inédita inquietude em relação aos juros. Em vez de prosseguir o trabalho paciente e tecnicamente fundamentado de seus antecessores, que permitiu diminuir de forma sustentada as taxas de juros, agiu politicamente. Determinou que os bancos públicos reduzissem as taxas de juros para induzir as instituições financeiras privadas a fazer o mesmo. Experiências semelhantes provocaram perdas e necessidade de injeção de recursos do Tesouro naqueles bancos. Em lugar de recorrer a medidas estruturais, a presidente Dilma decidiu atacar os bancos privados: "É inadmissível que o Brasil, que tem um dos sistemas financeiros mais sólidos e lucrativos, continue com um dos juros mais altos do mundo". Acontece que solidez e lucratividade não têm necessariamente relação com juros altos. A solidez foi construída ao longo de anos, fruto do trabalho dos bancos e do governo, particularmente do Banco Central. A solidez explica por que os bancos brasileiros resistiram bem aos efeitos da atual crise financeira mundial. A solidez é para ser comemorada, não para outros motivos. Quanto à lucratividade, estudos mostram que os bancos não têm retorno diferente do das grandes empresas brasileiras. Medidas para reduzir as elevadas taxas de juros do Brasil devem integrar permanentemente a agenda do governo. Isso têm acontecido nos últimos dezoito anos, pelo menos. Ainda figuramos entre os campeões dos juros altos, mas a situação tem melhorado. A taxa de juros básica do Banco Central (Selic) - que influencia as demais - já foi de mais de 40% ao ano e hoje caminha para as proximidades dos 8% ao ano. O spread bancário também diminuiu. Foi o efeito de um esforço de reformas para atacar as razões estruturais da excepcionalidade. A vitória contra a inflação descontrolada (Plano Real) e a estabilidade macroeconômica foram seguidas de outros avanços: a alienação fiduciária, a nova Lei de Falências, o crédito consignado, o acompanhamento sistemático das condições de crédito pelo Banco Central e, mais recentemente. a Lei do Cadastro Positivo. Tudo isso reforçou a segurança na concessão de empréstimos e melhorou o ambiente informacional. Os bancos adquiriram meios para bem avaliar riscos, premiar os bons pagadores com menores taxas de juros e expandir o acesso ao crédito. O potencial de crescimento se ampliou. O bem-estar aumentou. É preciso avançar com medidas estruturais de mesmo quilate. Por exemplo, duas causas explicam as altas taxas de juros: a tributação das transações financeiras e o volume de recursos que os bancos são obrigados a recolher ao Banco Central, ambos sem paralelo no mundo. Resquícios de insegurança jurídica típica do Brasil reclamam novas reformas. Além de ter taxas de juros das mais altas do mundo, o Brasil ostenta um dos maiores níveis de emprego informal do planeta. São duas excepcionalidades derivadas de problemas estruturais acumulados, de difícil solução em prazo curto. Não se vê, todavia, alguém culpando os empregadores pela informalidade no mercado de trabalho. Não há como promover no grito a formalização, nem dessa forma baixar a taxa de juros. Felizmente, tal como aconteceu nos juros, a informalidade tem diminuído sob a influência da estabilidade macroeconômica, do crescimento da economia, da melhor fiscalização e de avanços institucionais. A presidente mira e acena um alvo fácil. Atacar sintomas que a população confunde com causas faz subir a popularidade. A maioria pensa como Dilma. A desinformação é enorme. A educação financeira é deficiente no Brasil. Os bancos nunca foram benquistos. O tema tende a ser influenciado pela emoção. No Plano Cruzado (1986), faltou carne no mercado. Era um sintoma decorrente do insustentável congelamento dos preços. Vender gado para abate era o caminho certo para o prejuízo. Os pecuaristas se protegeram. O custo de reter o seu rebanho era preferível à falência. O governo empreendeu então uma espetaculosa caça ao boi no pasto, com helicópteros e policiais federais. A medida não salvou o Plano Cruzado. Espera-se que, caso fracasse sua cruzada contra os bancos, Dilma não se aventure a procurar juros baixos no pasto. REVISTA VEJA O atual governo tem demonstrado inédita inquietude em relação aos juros. Em vez de prosseguir o trabalho paciente e tecnicamente fundamentado de seus antecessores, que permitiu diminuir de forma sustentada as taxas de juros, agiu politicamente. Determinou que os bancos públicos reduzissem as taxas de juros para induzir as instituições financeiras privadas a fazer o mesmo. Experiências semelhantes provocaram perdas e necessidade de injeção de recursos do Tesouro naqueles bancos. Em lugar de recorrer a medidas estruturais, a presidente Dilma decidiu atacar os bancos privados: "É inadmissível que o Brasil, que tem um dos sistemas financeiros mais sólidos e lucrativos, continue com um dos juros mais altos do mundo". Acontece que solidez e lucratividade não têm necessariamente relação com juros altos. A solidez foi construída ao longo de anos, fruto do trabalho dos bancos e do governo, particularmente do Banco Central. A solidez explica por que os bancos brasileiros resistiram bem aos efeitos da atual crise financeira mundial. A solidez é para ser comemorada, não para outros motivos. Quanto à lucratividade, estudos mostram que os bancos não têm retorno diferente do das grandes empresas brasileiras. Medidas para reduzir as elevadas taxas de juros do Brasil devem integrar permanentemente a agenda do governo. Isso têm acontecido nos últimos dezoito anos, pelo menos. Ainda figuramos entre os campeões dos juros altos, mas a situação tem melhorado. A taxa de juros básica do Banco Central (Selic) - que influencia as demais - já foi de mais de 40% ao ano e hoje caminha para as proximidades dos 8% ao ano. O spread bancário também diminuiu. Foi o efeito de um esforço de reformas para atacar as razões estruturais da excepcionalidade. A vitória contra a inflação descontrolada (Plano Real) e a estabilidade macroeconômica foram seguidas de outros avanços: a alienação fiduciária, a nova Lei de Falências, o crédito consignado, o acompanhamento sistemático das condições de crédito pelo Banco Central e, mais recentemente. a Lei do Cadastro Positivo. Tudo isso reforçou a segurança na concessão de empréstimos e melhorou o ambiente informacional. Os bancos adquiriram meios para bem avaliar riscos, premiar os bons pagadores com menores taxas de juros e expandir o acesso ao crédito. O potencial de crescimento se ampliou. O bem-estar aumentou. É preciso avançar com medidas estruturais de mesmo quilate. Por exemplo, duas causas explicam as altas taxas de juros: a tributação das transações financeiras e o volume de recursos que os bancos são obrigados a recolher ao Banco Central, ambos sem paralelo no mundo. Resquícios de insegurança jurídica típica do Brasil reclamam novas reformas. Além de ter taxas de juros das mais altas do mundo, o Brasil ostenta um dos maiores níveis de emprego informal do planeta. São duas excepcionalidades derivadas de problemas estruturais acumulados, de difícil solução em prazo curto. Não se vê, todavia, alguém culpando os empregadores pela informalidade no mercado de trabalho. Não há como promover no grito a formalização, nem dessa forma baixar a taxa de juros. Felizmente, tal como aconteceu nos juros, a informalidade tem diminuído sob a influência da estabilidade macroeconômica, do crescimento da economia, da melhor fiscalização e de avanços institucionais. A presidente mira e acena um alvo fácil. Atacar sintomas que a população confunde com causas faz subir a popularidade. A maioria pensa como Dilma. A desinformação é enorme. A educação financeira é deficiente no Brasil. Os bancos nunca foram benquistos. O tema tende a ser influenciado pela emoção. No Plano Cruzado (1986), faltou carne no mercado. Era um sintoma decorrente do insustentável congelamento dos preços. Vender gado para abate era o caminho certo para o prejuízo. Os pecuaristas se protegeram. O custo de reter o seu rebanho era preferível à falência. O governo empreendeu então uma espetaculosa caça ao boi no pasto, com helicópteros e policiais federais. A medida não salvou o Plano Cruzado. Espera-se que, caso fracasse sua cruzada contra os bancos, Dilma não se aventure a procurar juros baixos no pasto.Por: MAILSON DA NÓBREGA, Revista Veja

Esquerdas Excitadas Acham que algo Mudou na França

França elege presidente socialista – mancheteiam os jornais. Para o leitor incauto, fica a impressão de que o campeão socialista, François Hollande, derrotou o malvado capitalista Nikolas Sarkozy. As esquerdas estão assanhadas. Já vi pessoinhas desinformadas vibrando com a vitória do bem sobre o mal. Ora, não é bem assim. Há horas venho falando no que os franceses chamam de “glissement de mots”. As palavras vão escorregando e acabam adquirindo um sentido oposto ao que antes significavam. Claro que tais escorregadelas não são inocentes. No século passado ocorreu uma, e das mais graves. A Rússia criou a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. E os europeus criaram a social-democracia. Os comunistas, num lampejo de marketing, associaram o socialismo europeu ao socialismo soviético. E toda Europa virou – pelo menos para os botocudos – socialista. Como se o socialismo comunista algo tivesse a ver com o socialismo social-democrata. Mas o sofisma pegou. Hollande não é socialista. É social-democrata, o que é bastante diferente de ser socialista. E muito próximo de ser capitalista. Ou centro-direita, como preferem os mais delicados, já que a palavrinha capitalismo se tornou um tanto fora de moda após o desmoronamento do comunista. Poucos ainda têm a coragem de usá-la. Entre estes, o cineasta Michael Moore, que permanece preso no passado e ainda vê um conflito entre capitalismo e democracia. Democracia, para o cineasta, é obviamente o socialismo. Aquele das Repúblicas Socialistas Soviéticas, bem entendido. "O dia 6 de maio marca um novo começo para a Europa", afirmou Hollande, observando que os eleitores escolheram a mudança. Como político, só pode falar em mudança. O espantoso é que ainda há quem acredite nisso. Em todos os jornais que leio, vejo alminhas ingênuas achando que ontem a França deu uma guinada à esquerda. Retornemos 31 anos atrás. Eu voltava da Inglaterra com uma amiga. Seriam seis da tarde. Em Paris, mal cheguei em casa, liguei a televisão. Na tela, aos poucos foi surgindo uma imagem. Começou pela testa e foi descendo, em fatias. Antes que tivesse chegado aos cílios, percebi que não era a careca de Giscard d’Estaing. O vencedor das eleições na França, naquele 10 de maio, era Mitterrand. Mesmo a imprensa internacional foi surpreendida. Havia apostado na vitória de Giscard. Só quando caminhões de champanhe começaram a abandonar o QG de Giscard, os jornalistas perceberam que a notícia estava ailleurs. Minha amiga, gaúcha em trânsito pela Europa, apavorou-se. Confundida pela associação que a imprensa brasileira fazia entre o socialismo francês e o socialismo soviético, queria pegar passaporte e voltar ao Brasil antes que o novo governo fechasse as fronteiras. Verdade que nem só ela se confundiu. Empresários franceses empacotaram seus dinheiros e tentaram sair do país através de discretas fronteiras suíças. Medo bobo. Como bom francês, Mitterrand não iria sacrificar o bem-estar de seus conterrâneos em nome de um ideal besta. Socialismo mesmo - le vrai - a França só recomenda para o Terceiro Mundo. A eleição de Mitterrand é um desses mistérios que confunde qualquer analista político. Ninguém desconhecia sua participação no governo pró-nazista de Vichy, do qual recebeu, na primavera de 43, a Francisque, a mais alta condecoração conferida pelo marechal Pétain. Tampouco era desconhecida sua participação decisiva, como ministro do Interior, na guerra da Argélia e nas torturas praticadas pelo Exército francês. Defensor de uma Argélia francesa, Miterrand reprimiu com ferocidade os movimentos insurrecionais. Em setembro de 53, declarou: "Para mim, a manutenção da presença francesa na África do Norte, de Bizerte a Casablanca, é o primeiro imperativo de toda política". Em 54, afirmou na tribuna da Assembléia Nacional: "A rebelião argelina não pode encontrar senão uma forma terminal: a guerra". Um golpe de imprensa empanava sua trajetória, o falso atentado nas cercanias do Luxembourg. Na noite de 15 de outubro de 59, ao sair da brasserie Lipp, Mitterrand, então senador pela Nièvre, sentiu-se perseguido por um carro. Ele faz um desvio pela avenue de l’Observatoire, pára sua 403, pula uma cerca viva e se joga de bruços na grama. Uma rajada de metralhadora é disparada sobre seu carro. No dia seguinte, o fato está na primeira página de todos os jornais, do Le Monde ao Humanité, o jornal oficial do PC francês. Aos 43 anos, o político ambicioso vira herói. A glória é efêmera. Três dias depois, o jornal Rivarol, entrevista um dos agressores de Mitterrand, que afirma ter sido o próprio Mitterrand que encomendara o atentado, para fazer subir sua cota de popularidade. O desmonte da farsa caiu no vazio. Processado por ultraje à magistratura, após a cassação de sua imunidade parlamentar, Mitterrand será beneficiado por um non-lieu, como também seus "agressores". Ex-colaborador de um governo pró-nazista, condecorado por este mesmo governo, mentor da guerra na Argélia e responsável pela tortura de milhares de argelinos, anticomunista ferrenho numa França que sempre nutriu simpatias pelo regime soviético, farsante vulgar capaz de forjar um atentado para ganhar votos, nada disto impediu Mitterrand de derrotar Giscard em 81, com 52,22% dos votos expressos, e de eleger-se por mais um setenato em 88. Empunhando a bandeira do socialismo, Mitterrand, político de extração nazista e queridinho de Pétain, enganou não só os franceses como o mundo todo. Na época, também se falou em mudanças. Mudou algo na França de 1981 para cá? Estruturalmente, nada. Mudaram apenas fatores que nada têm a ver com orientação política, mas dependem da economia e imigração, como maior desemprego e avanço do islamismo. Se algo novo ocorreu na França de lá para cá foi sua adesão ao euro, mas isso nada tem a ver com socialismo ou Mitterrand. Hollande prometeu aumentar gastos públicos e impostos. Não vai conseguir. Isto não depende dele, mas do consenso dos 27 da Europa. Que são governados, em sua maioria, por conservadores. Se em algum momento o candidato teve algum propósito socializante, terá de voltar atrás, como fez Mitterrand. Tire o cavalinho da chuva quem acha que a França mudou. A França é eterna. Não muda. Nem tem porque mudar, pelo menos rumo a um sistema que já morreu.Por: Janer Cristaldo