sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

AFINAL DE CONTAS, O CAPITALISMO É MESMO CRUEL E EXPLORADOR?


Comunistas, socialistas, distributivistas e outros grupos não cansam de falar que o capitalismo é cruel. Mas será que eles sabem o que é o capitalismo?


As ideias, as instituições e o impacto social do capitalismo foram alguns dos assuntos ideologicamente mais atacados nos últimos 100 anos. Pense em algo que alguém não gosta no mundo e você pode ter certeza que o agente causador é sempre o mesmo – o "capitalismo". Mas o que é de fato culpa do capitalismo e o que não é? 

As palavras "capitalismo" e "capitalista" foram usadas de diversas formas ao longo dos séculos, mas foram criadas principalmente pelos críticos da sociedade mercantil que desenvolveu suas formas mais modernas no começo dos anos 1800. O seu uso e conotação eram usados para transmitir a ideia de uma ordem social na qual apenas "alguns" possuíam os meios de produção (o "capital" da sociedade), o que os permitia explorar e abusar a maioria das pessoas para obter vantagens materiais e financeiras. 
Capitalismo como inimigo do desenvolvimento humano 

O uso mais popular da palavra é, sem dúvida, proveniente dos escritos de Karl Marx e outros pensadores que estavam certos de que se não fosse pela propriedade privada dos meios de produção, a humanidade não carregaria em seus ombros o peso de nenhum mal ou dificuldade. A posse comum ou coletiva e o uso comunitário dos bens de produção poderiam eliminar a pobreza, abolir disparidades de salário e riqueza e criar um mundo em que os conflitos de classe social seriam coisa do passado. 

Na segunda metade do século 20, porém, os experimentos socialistas existentes com posse coletiva e administração centralizada no governo resultaram em tiranias governamentais, em uma nova sociedade baseada no status político, que dava privilégios para aqueles que eram membros do partido ou que tinham alguma posição de destaque na burocracia. Além disso, eram sociedades com uma grande estagnação econômica e com padrões de vida muito distantes daqueles dos países capitalistas. 

Depois dessas experiências, o Ocidente, falando principalmente daqueles indivíduos que que defendiam o regime soviético na Rússia e outros governos comunistas no mundo, mudou de discurso. A propriedade privada não precisava ser abolida rapidamente em todos os cantos da sociedade. Empresas privadas ainda poderiam produzir bens, mas precisariam ser controladas por uma teia de regulamentações e restrições para garantir que o capitalismo produzisse bens específicos em certos locais de modo a contribuir com um bem comum, não apenas seguir direções econômicas baseadas apenas no lucro. 

O estado intervencionista precisaria ser acompanhado, ao mesmo tempo, por um estado de bem-estar social para garantir uma redistribuição menos exploradora e mais igualitária da riqueza por meio de um sistema de impostos que tire mais dos ricos para dar para a faixa mais pobre da sociedade. Isso pressupõe que os ricos não merecem suas riquezas, mas que os pobres merecem. 

Ao criticar a economia de mercado, uma tendência comum é ser referir ao capitalismo como se ele fosse algo vivo, uma entidade que respira e age contra a sociedade. Consequentemente, o capitalismo explora os trabalhadores. O capitalismo cria a pobreza. O capitalismo destrói o meio ambiente. O capitalismo é racista. O capitalismo discrimina mulheres. 

A palavra tem tantas conotações negativas que algumas pessoas sugerem que ela não seja mais utilizada para se referir a um sistema econômico que propõe a defesa livre das empresas. Outra sugestão foi adicionar uma palavra que a suavize: "capitalismo compassivo", "capitalismo consciente", "capitalismo democrático", "capitalismo das pessoas", "capitalismo liberal"... 

Para o bem ou para o mal, na minha opinião, a palavra "capitalismo" não irá desaparecer e seus oponentes vão continuar encrencando com seus defensores. Mas o que significa capitalismo para um crítico? O que o capitalismo não é? 
Propriedade privada, liberdades pessoas e a sociedade política 

Um dos conceitos fundamentais para se explicar o capitalismo é a noção de propriedade privada. Ou seja, a ideia que um indivíduo tem direito de posse e uso exclusivo de um determinado bem. Para um liberal clássico, o direito de posse mais fundamental de qualquer indivíduo é o de si mesmo. Em outras palavras, um indivíduo possui a si mesmo. Ele não pode, legal ou ilegalmente, ser tratado como escravo de uma outra pessoa. O indivíduo tem a posse completa de seu intelecto e de seu corpo. Nenhum deles pode ser controlado ou comandado por outra pessoa pelo uso ou ameaça da força. 

Isso implica que, se todos os seres humanos têm o direito de posse de si mesmo, todas as associações e relações entre indivíduos devem ser baseadas no consentimento voluntário e em acordos mútuos. Nenhuma pessoa deve ser forçada ou enganada a entrar em uma relação de troca que não deseja. 

Um liberal clássico também acredita que se esse princípio for seguido pela comunidade, a tendência é se criar uma configuração social que respeita e tolera os outros e que favorece suas escolhas individuais. Além disso, isso gera, de diversas formas, uma sociedade mais humana. As pessoas têm necessidade da ajuda e companhia uma das outras em formas variadas. Se a força não pode ser usada e somente o consentimento voluntário pode servir de base para as conexões entre indivíduos, isso faria com que os indivíduos agissem com cortesia, consideração e dignidade uns com os outros. 

Isso não quer dizer que palavras e ações rudes, desrespeitosas ou até cruéis não possam acontecer. Mas significa que elas terão um custo, já que as pessoas que agem assim terão menos chances de ter trocas ou outros tipos de relação com outras pessoas. Alguns podem não se importar e agir de má fé mesmo assim. Mas, para a maioria das pessoas, os benefícios das relações serenas e equilibradas são maiores do que os malefícios de lidar com seus próprios preconceitos. 

Além disso, em uma sociedade de associação voluntária, a cortesia, o respeito, a consideração e a educação se tornam normas sociais ao longo do tempo, e aqueles que não agem assim com os outros são vistos com ostracismo ou criticismo social por seu "mau comportamento". Isso reduziria as chances do indivíduo alcançar seus objetivos e propósitos, já que não contaria com a cooperação de outros indivíduos. 
A origem da propriedade de direito e porque ela é justa 

Mas a filosofia liberal clássica da liberdade e do capitalismo não aborda apenas o princípio da autopropriedade de cada indivíduo. Ela também defende o direito dos indivíduos obterem a posse de qualquer tipo de propriedade: recursos, matéria bruta, terra, meios de produção já produzidos (como máquinas, ferramentas, equipamentos) e os bens finais originados deles. 

Isso se baseia, principalmente, na ideia de "apropriação inicial" ou de aquisição por meio de troca voluntária com outros indivíduos da sociedade. A teoria do direito natural é controversa entre filósofos políticos no geral e causa problemas mesmo entre vários pensadores liberais clássicos. Mas permanece, ainda assim, um conceito central derivado de John Locke. Segundo esse princípio, se um homem se estabelecer em uma terra que não era previamente ocupada ou de posse de outros, o indivíduo em questão tem legitimidade para declarar a posse do espaço e trabalhar e modificar a terra, limpar o campo, plantar e cuidar da plantação até a colheita. 

Essa ideia segue um senso comum compartilhado por basicamente todas as pessoas: de que seria injusto ou errado se um grupo de ladrões chegasse na terra do nosso fazendeiro e roubasse os frutos do trabalho físico e intelectual dele. Afinal, o indivíduo planejou a transformação da terra em uma fazenda e se esforçou para produzir suas plantas. 

Se a terra não for propriedade privada do indivíduo, então quem pode reclamar os frutos do trabalho? A gangue ameaçadora de ladrões? Alguma outra pessoa que não tem relação com a existência da plantação, mas que afirma precisar daquilo para sobrevivência ou prazer? 

Se uma declaração desse tipo for feita por ladrões, o que acontece se o fazendeiro não se afastar voluntariamente da fazenda? Será que as pessoas vão usar força para afastá-lo? Vão ameaçar sua vida se ele resistir? Irão matá-lo se ele tentar manter a posse dos frutos do seu trabalho? E, se a resposta para a última questão for sim, será que tirar a vida do fazendo é uma morte sem justificativa? 

Se nosso infeliz fazendeiro não resistisse aos ladrões por temer mais a morte do que sua tentativa de subsistência, será que ele poderia imaginar que é possível que isso aconteça novamente se ele plantar a próxima safra? Será que ele poderia, então, decidir não produzir mais e viver apenas daquilo que consegue tirar da natureza, sem nenhuma ação transformadora da sua parte? 

Se o grupo de ladrões voltar e não encontrar nada para roubar, poderia controlar fisicamente o indivíduo e ameaçá-lo para que trabalhe? Se isso acontecer, nosso indivíduo não teria sido escravizado, alienado da sua liberdade intelectual e física e forçado a trabalhar para o interesse dos outros? 

Eu escolhi apresentar esse cenário em forma de perguntas no lugar de fazer declarações afirmativas de propósito. O motivo para isso é perguntar diretamente para você, leitor, quais seriam as respostas para cada uma das perguntas. Eu suspeito a maioria chegou à mesma conclusão: a plantação é uma propriedade justa e produzida pelo indivíduo e não pode ser tirada dele sem seu consentimento. Seria igualmente injusto se ele fosse privado de sua liberdade de trabalhar para ser comandado por outros por meio de ameaças. 
Propriedade privada como fonte de riqueza e civilização 

Agora que o indivíduo tem direito à sua vida e à sua liberdade, além dos frutos de seu próprio trabalho, então é lógico que ele tenha direito de propriedade sobre as ferramentas, utensílios e equipamentos que o auxiliam em seus esforços produtivos e que foram por ele produzidos por meio do uso de seu trabalho físico e intelectual. 

Assim, ele tem direito de lavrar aquilo que plantou no campo que preparou. Esses meios de produção fabricados que ajudam no desempenho de um esforço produtivo são capital de direito do indivíduo. 

Ao ter liberdade pessoal e direito à propriedade tanto da terra como do capital físico necessário para produzir um determinado produto, o indivíduo aumentou sua capacidade de sobrevivência e de melhoria de vida. De fato, foi argumentado que o direito à propriedade privada e seu reconhecimento foram a base do que chamamos de civilização. 

O notável economista político britânico John R. McCulloch (1789-1864) explicou em seu famoso Princípios da Economia Política (1864): 

"Que não cometamos o erro de supor ser possível que qualquer pessoa saísse da barbárie ou ficasse rico, próspero e civilizado sem a segurança da propriedade […] Essa proteção permitiu que, nas sociedades civilizadas, a propriedade fosse mais relevante no aumento da riqueza dos indivíduos do que todas as outras instituições juntas […] O estabelecimento do direito à propriedade permite o esforço, a invenção e o empreendimento para que os indivíduos possam colher os frutos merecidos. Mas faz isso sem infringir o menor dano aos outros […] Os efeitos da propriedade são benéficos. É uma muralha criada pela sociedade contra os inimigos comuns – roubos, violências e opressão. Sem a proteção, os ricos ficariam pobres e os pobres jamais ficariam ricos – eles afundariam juntos no abismo da barbárie e da pobreza". 

O capitalismo é, assim, um sistema econômico fundamentado no princípio de direito de posse de cada indivíduo: da sua vida, da sua liberdade e da propriedade que adquiriu honestamente. Essa propriedade privada inclui seu intelecto e seu corpo, além dos produtos materiais que seu esforço intelectual e físico produziu. 

O sistema capitalista também tem por base que o reconhecimento do o direito de cada um à sua própria vida e liberdade exige que as relações e associações humanas sejam estabelecidas por meio de consentimento voluntário e acordo mútuo. Violência e fraude são incompatíveis com a lógica do sistema capitalista de produção e associação humana. 
Divisão de trabalho 

Pode ser sensato perguntar como seria um mundo no qual terras e recursos para produzir as necessidades da vida diária não estivessem mais disponíveis para indivíduos ou famílias. Nós entramos no mundo e os outros parecem ter tudo que existe. A noção de Locke de direito justo à propriedade parece ter pouca relevância em tempos modernos. Uma fronteira aberta e sem limites disponível para tomada e aquisição já não existe há muito tempo. 

Mas não é necessário que todos tenham terras e recursos e que fabriquem meios de produção para ter acesso aos bens finais desejados. É suficiente que aqueles que tenham as terras e os recursos estejam na posição em que possam investir em seus interesses e melhorias. Eles devem aplicar e direcionar o seu uso de formas que sirvam também para os outros indivíduos da sociedade. 

O economista austríaco Ludwig von Mises descreveu essa situação em seu conhecido trabalho Socialismo: uma Análise Econômica e Sociológica (1951): 

"No sentido econômico, para se ter os bens de produção e fazê-los servir aos propósitos econômicos de um indivíduo, não é necessário tê-los fisicamente no sentido de que o indivíduo precisa ter os bens de consumo se quer usá-los. Para se beber café não é necessário ter uma fazenda de café no Brasil, uma linha oceânica e uma torrefação, ainda que todos esses meios sejam necessários para que eu tenha uma xícara de café na minha mesa. É suficiente que outros tenham esses meios e os usem para mim. Numa sociedade que divide o trabalho ninguém é o dono exclusivo dos meios de produção, nem dos materiais nem das pessoas envolvidas com suas capacidades de trabalho. Todos os meios de produção prestam serviços para todos que compram e vendem no mercado". 

Em um sistema de divisão de trabalho baseada no mercado e no capitalismo, indivíduos encontram seu nicho na sociedade por meio de várias competências. O indivíduo que não possui nada além do trabalho de sua própria mente e de seu próprio corpo pode vender seus talentos e habilidades pelo que os outros acham que elas valem. Isso pode ser feito tanto ao satisfazer diretamente as demandas de outros consumidores ou ajudando um empregador a produzir um produto que será vendido para os consumidores no mercado. 

Com o salário recebido pelos serviços prestados, o indivíduo que não possui nada além de si mesmo tem acesso às oportunidades apresentadas para ele por donos privados de vários meios de produção que podem ganhar lucros ao encontrar donos interessados e dispostos a comprar os produtos e serviços oferecidos. Com seus próprios interesses, eles demandam resultados dos outros na arena das trocas de trabalho, na qual os donos de meios materiais de produção devem se esforçar nos seus papéis de produtores para suprir as necessidades dos consumidores. 

Um exemplo: eu ganho minha vida como professor de economia. Não sou bom em outras coisas além de dar aulas e escrever (pergunte para minha mulher como não sirvo nem para pequenos consertos em casa). Eu tenho meu intelecto e meu corpo. Eu aprendi muito sobre economia, história, filosofia política, sociologia e noções de literatura clássica. E tenho meu corpo para ir para as salas de aula e falar sobre essas ideias na frente de um grupo de alunos, que se sentam na frente de computadores para escrever sobre tudo isso. 

Ainda assim, com o salário que recebo da universidade por aula dada e outros serviços relacionados, sou capaz de ir para o mercado no meu papel de consumidor e pedir produtos de todas as outras pessoas do mercado mundial. Seus produtos são oferecidos para mim de uma maneira cortês e prazerosa, já que todos os comerciantes com quem eu interajo sabem que eu não preciso comprar os produtos deles. 

Eu posso apenas sair sem nada nas mãos se eu não gostar dos produtos, se não era exatamente aquilo que eu estava procurando ou se eu não achar o preço interessante. O vendedor sabe que nesse sistema voluntário de divisão de trabalho baseada no mercado eu posso comprar uma versão alternativa do produto vendida por um de seus concorrentes, que também têm interesse em fechar o negócio. 
Desigualdade salarial e evolução do mercado 

Mas será que nessa divisão de trabalho do sistema capitalista algumas pessoas não têm mais para gastar do que eu? Eles não podem comprar mais? E até se permitir pagar mais por determinado produto, fazendo com que ele fique indisponível para mim? Sim, isso é verdade. Mas por que eles têm mais para gastar do que eu? Porque todos que ganharam dinheiro preferiram gastar no produto ou serviço dessas pessoa que já tem dinheiro, não no meu. Meus colegas de mercado têm, de certa forma, feito escolhas com seu dinheiro e dito que consideram outros produtos mais importantes e valiosos do que o produto que eu ofereço no mercado. 

Todo o nosso rendimento individual e nossa posição na sociedade representa o que nossos colegas acham que nós valemos em satisfazer suas demandas. Cada um de nós ajuda a determinar o valor relativo do rendimento do trabalho das outras pessoas quando gastamos parte do nosso próprio rendimento em produtos que desejamos e pelos quais estamos dispostos a pagar. 

O sistema capitalista gera a estrutura institucional e de incentivo que dá liberdade para todos os indivíduos viverem sua própria vida, desfrutar sua própria liberdade e usar sua própria propriedade privada como quiserem. Pacificamente. 

Mas essa estrutura de associação e troca voluntária em uma rede emergente de divisões interdependentes de trabalho cria uma configuração na qual é interesse de todos focar em seus conhecimentos e nas habilidades das suas atividades produtivas para satisfazer as necessidades dos outros como meio de avançar em seus próprios objetivos e propósitos na sociedade. 

Onde, então, está a "exploração" de trabalhadores e consumidores nessa sociedade capitalista? Onde estão os incentivos ou capacidades de "destruir o meio ambiente" ou promover a discriminação de pessoas com base em seu gênero ou raça? Quais possibilidades estão abertas e disponíveis para os desfavorecidos melhorarem de vida?
Por: Richard M. Ebeling FEE (Foundation for Economic Education) 
Do site: http://www.gazetadopovo.com.br

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

O RADAR DO FUTURO DA DEMOCRACIA


A sociedade do futuro será uma derivação do sistema de multas de trânsito atual


Não acredito em evolução social. Suspeito que andamos em círculos, indo pra lugar nenhum. Com isso não quero negar que “ganhamos algum terreno” em relação a situações desagradáveis aqui e ali (aumento de longevidade, eliminação em grande escala da escravidão e coisas semelhantes) nem que sejamos absolutamente dominados pela contingência cega.

Conseguimos controlar várias dimensões da vida. E são exatamente estas formas de controle que apontam para o “futuro da democracia”. A condição humana é tal que combatemos constantemente a contingência e a nós mesmos, em nossa infinita capacidade de criar sofrimentos. Mas a democracia, evidentemente, pode acabar um dia, inclusive pelas mãos de gente que a “defende”, principalmente porque o termo “democracia” pode significar coisas opostas.

Esta contradição é inerente ao processo modernizador 

Quer ver um exemplo banal dessa “instabilidade semântica” do termo “democracia”? Tem partidos políticos por aí que pretendem, em nome da democracia, intervir na mídia para garantir igualdade de oportunidades, por exemplo, destruir pessoas e grupos na mídia para colocar seus parceiros ideológicos no lugar dessas pessoas e grupos. O argumento é “democratizar a mídia”.

Por outro lado, deixar a mídia inteiramente livre (portanto, democrática) pode significar, por exemplo, a geração de discursos de ódio e a exclusão social de quem não conseguiu alcançar a posição de trabalho num desses grandes grupos de mídia.

Independente dessa questão “escolástica” (se não conhecer o termo, olhe no Google), de onde está a verdadeira democracia na mídia e em outros níveis, acho que o futuro nos reserva a sociedade mais controladora que o mundo já viu e, portanto, num sentido comum do termo, menos democrática.

Dito de forma direta: marchamos para um mundo totalitário, com controle cada vez mais maior dos comportamentos, mesmo que pessoas trans possam ser o que quiserem (dou esse exemplo como mero clichê de “liberdade individual”) ou você possa ter o perfil que quiser no Face ou odiar livremente quem você quiser nas redes.
Por: Luiz Felipe Pondé  Do site: http://www.gazetadopovo.com.br

O Antagonista entrevista Ricardo Felício – Íntegra: "Aquecimento global ...

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

UM PRESENTE DE NATAL DEFINITIVO PARA A MINHA FILHA

Minha querida filha:

Todo Natal eu passo pelo mesmo problema de ter de escolher que presente dar a você. Sei que há várias coisas das quais você certamente iria gostar, como livros, jogos, roupas etc. Porém, eu sou muito egoísta. Sempre quis dar a você algo que iria durar mais do que alguns meses ou anos. Sempre quis dar para você um presente que lhe faria se lembrar de mim a cada Natal, para sempre.

Se eu pudesse lhe dar apenas um presente, o qual você pudesse carregar consigo para sempre, esse presente seria algo aparentemente muito trivial, mas que me tomou vários anos para que eu finalmente o entendesse. Esse presente seria uma verdade aparentemente simples, porém libertadora. E se você aprendê-la agora, essa simples verdade poderá enriquecer sua vida de incontáveis maneiras. Mais ainda: ela poderá lhe poupar de ter de enfrentar vários problemas que já machucaram muitas pessoas que simplesmente nunca a aprenderam.

Essa verdade aparentemente simples, porém libertadora, é a seguinte:

Ninguém deve nada a você.

Importância

Como pode uma afirmação tão simples ser importante? Pode não parecer, mas entendê-la realmente pode ser uma bênção para toda a sua vida.

Ninguém deve nada a você.

Isso significa que nenhuma outra pessoa está vivendo para você, minha filha. Ninguém está nesse mundo para satisfazer suas reivindicações. Ninguém está vivendo em função de você. Simplesmente porque nenhuma outra pessoa é você. Cada pessoa vive por si própria; a felicidade de cada pessoa é algo único e particular, algo que somente ela pode sentir e ninguém mais.

Minha filha, quando você entender que ninguém tem a obrigação de dar a você a felicidade ou qualquer outra coisa, você será libertada e nunca mais terá expectativas em relação a coisas que provavelmente nunca serão como você quer.

Isso significa, por exemplo, que ninguém é obrigado a amar você. Se alguém a ama, é porque existe algo de especial em você que dá felicidade a essa pessoa. Descubra o que é essa coisa de especial que você tem e se esforce para amplificá-la. Assim você será ainda mais amada.

Quando as pessoas fazem algo por você, é simplesmente porque elas querem — porque você, de alguma forma, propicia a elas algo de significativo que faz com que elas queiram agradar você. Elas não agem assim somente porque devem algo a você.

Ninguém deve nada a você.

Da mesma forma, ninguém tem de gostar de você. Se seus amigos querem estar perto de você, não é porque eles se sentem nessa obrigação; é simplesmente porque eles se sentem bem estando com você. Descubra o que os deixa felizes e os faz se sentirem bem, e eles sempre irão querer estar perto de você, sem pedir nada em troca.

Ninguém tem a obrigação de respeitar você. Algumas pessoas podem até mesmo ser cruéis com você. Porém, tão logo você entenda que as pessoas não têm a obrigação de ser bondosas com você — e que, consequentemente, elas de fato podem ser más com você —, você irá aprender a evitar aquelas pessoas que podem lhe ser nocivas. Lembre-se de que você também não deve nada a elas.

Vivendo a sua vida

Ninguém deve nada a você.

Você deve apenas a você mesma a obrigação de ser a melhor pessoa possível. Porque apenas se você for assim é que as outras pessoas irão querer estar com você e irão querer dar a você as coisas que você quer em troca daquilo que você está dando a elas. Essa é a única maneira moralmente correta de se obter as coisas que você quer. Nunca exija nada de ninguém. Apenas faça por merecer.

Algumas pessoas irão optar por se afastar de você por motivos que nada têm a ver com você. Quando isso acontecer, procure em outro lugar as relações que você quer. Não faça com que os problemas de outras pessoas sejam também o seu problema.

Assim que você aprender que precisa fazer por merecer o amor e o respeito dos outros, você jamais irá esperar coisas impossíveis; e, por conseguinte, jamais terá decepções. Da mesma forma que as outras pessoas não têm a obrigação de compartilhar a propriedade delas com você, elas também não têm a obrigação de lhe devotar sentimentos e pensamentos.

Se elas o fizerem, é porque você fez por merecer essas coisas. E aí você terá todos os motivos para se sentir orgulhosa do amor que você recebe, do respeito dos seus amigos, da propriedade que você adquiriu. Porém, jamais pressuponha que tais coisas são fatos consumados. Se agir assim, você irá perdê-las facilmente. Essas coisas não são suas por direito. Não existe algo como "ter direito" a essas coisas. Você sempre terá de fazer por merecê-las.

Minha experiência

Um grande fardo foi retirado dos meus ombros no dia em que finalmente entendi que o mundo não devia nada a mim. Por muitos anos acreditei que havia coisas a que eu tinha direito pelo simples fato de ter nascido. E isso fez com que eu passasse por grandes desgastes — físicos e emocionais — em minha tentativa de coletar esses "direitos".

Ninguém deve a mim respeito, amizade, amor, cortesia, conduta moral ou inteligência. O mundo não me deve nada. E tão logo eu passei a reconhecer isso, todas as minhas relações imediatamente se tornaram muito mais gratificantes. Concentrei-me apenas em estar com aquelas pessoas que queriam fazer as coisas que eu queria que elas fizessem.

Essa compreensão de mundo permitiu que eu me desse bem com amigos, sócios comerciais, clientes, amores e estranhos. Sou constantemente relembrado de que só irei conseguir o que quero se puder entrar no mundo da outra pessoa. Eu tenho de entender como ela pensa, o que ela crê ser importante e o que ela quer. Somente assim eu poderei ser útil para ela e, com isso, conseguir as coisas que eu quero.

E somente então eu serei capaz de discernir se eu realmente quero estar envolvido com tal pessoa. Isso me permite selecionar bem as minhas relações, poupando-me de dissabores; e me permite também direcionar minhas energias apenas para aquelas pessoas com as quais eu realmente tenho mais coisas em comum.

Não é fácil resumir em poucas palavras aquilo que levei anos para aprender. Porém, talvez se você reler esse presente a cada Natal, seu significado ficará mais claro a cada ano.

Eu realmente espero que isso aconteça. Sendo seu pai, quero acima de tudo que você entenda essa simples verdade, a qual pode libertá-la para sempre.

Um Feliz Natal, minha filha!
Por: Harry Browne , o falecido autor de Por que o Governo Não Funciona e de vários outros livros, foi candidato à presidência dos EUA pelo Partido Libertário nas eleições de 1996 e 2000.




Emocionante Mensagem de Natal 2015

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

JAPÃO USA OITO VEZES MAIS AGROQUÍMICOS DO QUE O BRASIL


Campeão em longevidade, Japão usa oito vezes mais agroquímicos do que o Brasil

Na proporção do uso de agroquímicos pela quantidade de terras cultivadas, Brasil fica atrás de países como Japão, Alemanha, França, Itália e Reino UnidoArquivo


São Paulo (SP) |
01/12/2017 | 
09h50 | 
Marcos Tosi*

A imagem de que o Brasil é o país que mais utiliza agroquímicos no mundo é desconectada da realidade e apenas alimenta mitos e inverdades sobre a segurança dos alimentos produzidos no país. Na proporção de área cultivada, por exemplo, o Japão utiliza oito vezes mais defensivos agrícolas. É o que aponta estudo da Universidade Estadual Paulista em Botucatu (Unesp) apresentado nesta quinta-feira (30) no fórum Diálogo: Desafio 2050 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, promovido em São Paulo pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), Embrapa, Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef).

“Dizer que somos campeões mundiais no consumo de agrotóxicos é uma abordagem simplista e até irresponsável”, diz o professor Caio Carbonari, um dos autores da pesquisa. Segundo ele, apesar de utilizar o maior volume de defensivos (em função do tamanho continental), o Brasil está em 7º lugar na proporção com a quantidade de terras cultivadas, ficando atrás de países como Japão, Alemanha, França e Reino Unido. E se a análise for pelo volume de alimentos produzidos, o país cai para 11º no ranking do uso de defensivos, e passam à nossa frente Argentina, Estados Unidos, Austrália e Espanha.

“Estamos numa situação bastante confortável quando olhamos os dados com a ótica mais adequada. Temos sido muito eficientes no uso da terra e dos insumos, e essa sustentabilidade só é possível por causa ciência e dos agroquímicos”, avalia o pesquisador. “A imagem que se cria do consumo de agrotóxicos no Brasil está desconectada de nossa realidade”, completa.

Gráfico do uso de agroquímicos pelo volume de alimentos produzidos
Gráfico do uso de agroquímicos pela quantidade de terras cultivadas

Mesmo os critérios de proporcionalidade não são os mais adequados para tratar do tema. A situação do Japão é emblemática disso. Na proporção de área cultivada, os japoneses utilizam oito vezes mais agroquímicos do que o Brasil. “Não dá para apontar o dedo para o Japão e dizer que o alimento deles está contaminado, que está prejudicando as pessoas. Afinal, a gente sabe da qualidade de vida e da longevidade dos japoneses”, afirma Carbonari. Segundo dados de 2016 da Organização Mundial de Saúde (OMS), a expectativa média de vida da população japonesa é de 83,7 anos, a mais alta do planeta. No Brasil, a média é de 75 anos.

Qual o melhor critério então para medir o uso equilibrado de agroquímicos? O índice mais adequado seria o EIQ, que vem das iniciais, em inglês, de Quociente de Impacto Ambiental, referenciado pela FAO e pela literatura científica moderna. O EIQ leva em conta os riscos associados ao uso dos agroquímicos nas mais diversas situações, incluindo o mecanismo de ação na planta, a degradação e persistência no solo, e os níveis de toxidade e possíveis riscos de contaminação da água, dos alimentos e do próprio homem, seja o trabalhador rural, seja o consumidor final.

O trabalho de pesquisa analisou dados do uso de agroquímicos nas culturas de soja, milho, algodão e cana de açúcar entre os anos de 2002 e 2015. Em todos os principais quesitos, houve diminuição significativa dos riscos. Para o trabalhador rural, o risco de contaminação diminuiu 54,2%, enquanto para o consumidor a queda foi de 37% e, para o meio ambiente, de 33%.

Caio Antonio Carbonari é pós-doutor pela Unesp Botucatu

“Desde 2004 a gente vem numa tendência clara de equalizar, de estacionar o consumo de agrotóxicos no Brasil; ou seja, na contramão de toda a imagem que se construiu na sociedade brasileira”, diz Carbonari. “Não existe crescimento exacerbado como se divulga. E se falarmos em termos de risco, estamos em situação extremamente positiva, com quedas acentuadas. Comparados com outros países, em qualquer uma dessas culturas, estamos em situação igual ou melhor”.

Para Elisabeth Nascimento, professora de toxicologia da Universidade de São Paulo, compreender a avaliação dos riscos é fundamental para mudar a percepção das pessoas. Ela lembra que desde os anos 80 os produtores rurais vêm sendo orientados sobre como usar corretamente o que chama de “praguicidas”. Para se manterem legalizados no mercado interno, e mesmo para exportar, os grandes produtores sabem da necessidade de seguir o receituário agronômico. A obediência aos parâmetros é fiscalizada, entre outros, pelo Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes, do Ministério da Agricultura, e pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos, da Agência Nacional de Vigilãncia Sanitária. “Temos que lembrar também que os defensivos não são tão baratos assim, então o produtor procura usar nas doses recomendadas”, afirma.

A pesquisadora acredita que a população deveria ser melhor informada sobre o conceito de IDA – ou seja, de Ingestão Diária Aceitável. “Temos hoje no país inúmeros instrumentos que podem nos dizer, com certeza, quanto podemos comer sem correr riscos. Claro que não existe risco zero e nem segurança absoluta. O que mata não é um pouco disso, um pouco daquilo, mas a exposição crônica”, argumenta. 
Do site: http://www.gazetadopovo.com.br/agronegocio/mercado/campeao-em-longevidade-japao-usa-oito-vezes-mais-agroquimicos-do-que-o-brasil-dcxlf3wuo4aduzkar8sdih7bv

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

AVISO DE SPOILER: A PREVIDÊNCIA JÁ QUEBROU!

Em 1988, o país fez uma escolha e criamos a chamada seguridade social que contempla os gastos com educação, saúde e previdência. Também escolhemos que nosso sistema seria o de partilha ao invés de capitalização. A diferença entre os dois é a seguinte: no primeiro, quem contribui hoje paga quem recebe hoje. Os que estão trabalhando pagam para quem está aposentado. No segundo, cada pessoa tem uma conta individual e é responsável pela sua própria contribuição. O Chile e a Austrália utilizam esse sistema.

O sistema de partilha depende muito da demografia do país. Um país jovem se dá ao luxo de ter muitos ativos contribuindo e poucos inativos recebendo. Um país mais velho tem menos ativos para mais inativos. Para a conta fechar em países mais velhos, a contribuição é alta. Via de regra, países desenvolvidos tem populações mais velhas e países em desenvolvimento tem população mais jovem. Isso acontece porque a expectativa de vida aumenta, as pessoas morrem menos e morrem mais velhas também. Para você entender melhor: se ativos e inativos recebessem o mesmo valor bruto e um ativo fosse descontado em 10%, um décimo do salário, precisaríamos de 10 ativos para pagar 1 inativo. As variações do sistema são feitas com base na expectativa de crescimento econômico do país e da sua demografia.

Nosso sistema previdenciário tem muitos problemas. Não vou entrar em cada um dos pontos aqui. São distorções das mais variadas possíveis, da paridade e integralidade do setor público (resolvida para novos entrantes no setor em uma reforma anterior), ao LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social) que é basicamente um valor dado a um idoso caso ele preencha requisitos. Fora as infinitas regras diferentes para cada categoria.

É claro que poderíamos apresentar aqui gráficos históricos com tendência futura com estimativa de quantos anos o sistema poderia se sustentar. O fato é que a previdência é deficitária há muitos anos. O Tesouro precisa cobrir seus rombos todos os anos e vem aqui um fato assustador: o Brasil gasta algo como 15% do PIB com previdência, tendo 5% de idosos em sua população. O Japão também gasta 15% do seu PIB, portanto o mesmo que o Brasil, mas com 26% de idosos na população. Gastamos a mesma coisa que um país que tem 5 vezes mais idosos

A trajetória desse gasto é crescente desde sua criação. Sem a reforma, o próximo presidente precisará fazer escolhas. Com a reforma, talvez consigamos levar o debate para a próxima década. Foco no talvez. O fato é que qualquer pessoa que te diga que a reforma, que aliás já perdeu 40% do seu poder de economia desde que foi criada com as mudanças feitas pelo congresso, estará mentindo para você. E mais, estará condenando a próxima geração que pagará a conta pelas péssimas escolhas que fizemos. A mudança será feita ou o país quebrará. 
Por Heitor Machado  Do site: www.institutoliberal.org.br

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

A VOLTA DO PÊNDULO


A VOLTA DO PÊNDULO : HORA DO RETORNO AO REGIME AUTORITÁRIO NO BRASIL?

De crise em crise o coração da nação pulsa entre aberturas democráticas e fechamentos institucionais

General Golbery do Couto e Silva - tese da alternância política do mentor do regime militar volta ao cenário

"Não interrompa uma pessoa que lhe conta algo que você já sabe.
Uma história nunca é contada duas vezes da mesma maneira 
e é sempre bom ter mais uma versão".Golbery do Couto e Silva

A volta do pêndulo 

O pêndulo das liberdades democráticas no Brasil parece ter chegado no seu ponto de inflexão. As sucessivas crises institucionais, o esgotamento do modelo constitucional, a profunda crise de liderança e a perda de qualidade dos quadros à testa dos poderes da República apresenta um quadro de descontrole que ameaça a Ordem Econômica e Social, a Ordem Pública, a Administração do Estado, a propriedade e a segurança do cidadão.

Elementos essenciais para a composição do tecido social, como a família, a segurança jurídica e a moralidade, passaram a ser vergastados por programas emanados da própria estrutura jusburocrática inoculada nos três poderes.

À crise política, soma-se a depressão econômica. 

As raízes estruturais dessa deseconomia sistêmica afetam diretamente o Estado e, embora já diagnosticadas, não encontram respaldo governamental, legislativo e judicial, para um efetivo combate. Pelo contário, as reformas necessárias encontram forte resistência na própria base do governo. 

No campo fiscal, a pesada jusburocracia de Estado compromete o Tesouro e avança sobre os depósitos e poupança popular ampliando a dívida pública e comprometendo a previdência. Literalmente, dezenas de milhões de trabalhadores do setor privado, hoje, pagam uma previdência pública para sustentar algumas centenas de milhares de funcionários privilegiados, enquanto se vêem obrigados a recorrer, cada vez mais, a uma previdência privada. A previdência tornou-se um programa de transferência de renda dos pobres para os privilegiados no Brasil. 

Surge o paradoxo: o Estado devora a própria sociedade que o compõe, e a estrutura política que sustenta a ambos está à beira do colapso.

O corpo social, no limite da tolerância, pode estar prestes a reagir, e a correção de rumos irá demandar centralização e eventual reforma autoritária - a volta do pêndulo.

Como nas vezes anteriores, o problema pode não estar na assunção de um período de centralização e, sim, nos "guardas da esquina", que dele se aproveitam. 

Sístoles e Diástoles no coração da República

Já vimos isso antes, várias vezes, no Brasil. Alberto Torres e Oliveira Viana também já haviam diagnosticado esse pêndulo - sistematizado pelo General Golbery do Couto e Silva como entendimento da política de Estado no contexto cronológico e geopolítico.

Golbery, resumiu toda a ópera: a história política do Brasil é pendular, oscila entre a centralização e a descentralização, entre regimes autoritários e democráticos.

Em 1º de julho de 1980, o General Golbery proferiu longa conferência na ESG - Escola Superior de Guerra, abordando a centralização e a descentralização da administração.

Golbery situou a centralização como a opção indisfarçável dos regimes arbitrários e a descentralização como o modelo mais compatível com os sistemas democráticos(*1). Remeteu a centralização adotada pela intervenção militar de março de 1964, aos fatores de crise que interferiram na consolidação da autoridade do Poder Central. Justificou a conservação do modelo por um período além do desejável, relacionando dentre os fatores de instabilidade o aparecimento imprevisto dos surtos terroristas. Defendeu então o pluralismo partidário, como modelo mais flexível para governos negociarem saídas nos momentos de crise.

O movimento cardíaco da sístole (contração) e diástole (dilatação) foi a metáfora encontrada pelo gênio estratégico de Golbery para contextualizar o período de abertura política, então em curso no histórico processo pendular brasileiro.

Nessa ocasião, a abertura política estava em plena marcha de consolidação, visando encerrar a "sístole" - o chamado "período de exceção", iniciado em 1964.

Iniciada no governo Geisel e cumprida à risca pelo sucessor João Figueiredo, a abertura política seguiu "firme e gradual", apesar dos solavancos ocorridos - dentre eles o frustrado atentado à bomba no Riocentro (fato que levou à saída de Golbery da chefia da Casa Civil), as manifestações populares e a decretação das medidas de emergência no Distrito Federal, para a votação da Emenda Constitucional pelas eleições diretas. 

Com a eleição de Tancredo Neves pelo Congresso Nacional, o General João Figueiredo terminou seu mandato, completando a transição para a Nova República. 

Como ensina Sir Basil Liddell Hart, o melhor exército se conhece "nas derrotas", principalmente quando se retira do teatro de operações. No caso brasileiro, os militares desmobilizaram seu aparato de intervenção e se retiraram da política, de forma organizada e sem conflitos, seguindo os preceitos reeducadores propugnados por Golbery e conferindo, com sucesso, suporte à transição para a Nova República.

Golbery foi o cérebro por trás de todo esse processo. Observou a necessidade de ver a estratégia para além do contexto militar. Aduziu que “a estratégia deixa de ser apenas a arte dos generais, é também estratégia econômica, estratégia política, estratégia psicossocial [...]”, e no que se refere à segurança nacional, considerou que “a estratégia é a Política de Segurança Nacional”, e ainda, “é o grau relativo de garantia que o Estado proporciona à coletividade nacional, para a consecução e salvaguarda de seus Objetivos [...]”(*2).

Em verdade, a visão conceitual de Golbery já alcançava o caráter híbrido inserido nos "conflitos assimétricos" (*3), atualmente ocorrentes no mundo . 

Como meio de resolução da crise em direção a um Estado pluralista, propôs Golbey, na célebre conferência da ESG, as seguintes medidas reeducadoras de convivência democrática:
a) evitar pronunciamentos de militares que indiquem sintomas de enfraquecimento do governo;
b) procurar legitimar nos conflitos sindicais, soluções negociadas que evitem as situações de confronto;
c) desconhecer entidades estudantis não legalmente reconhecidas e desconfiar sempre do sentido de movimentos que aliem professores e alunos; e
d) reprimir por meios legais manifestações consideradas impróprias que ocorram contra o governo, tanto no meio parlamentar quanto por parte dos órgãos de comunicação.

Sábias lições, aprendidas na transição para a "Nova República", porém não aplicadas pelos novos quadros dirigentes republicanos...

Brossard, a ação pendular e a baixa qualidade dos quadros republicanos

De fato 

Se com o advento da "Nova República", consolidada com a Constituição de 1988, iniciou-se a "diástole" democrática, entremeada por crises em volume crescente, agora parece crer que o pêndulo esteja se movendo na trajetória inversa...

Não é difícil perceber a harmonização do movimento com o contexto geopolítico mundial. 

O Brasil segue o movimento pendular que hoje já ocorre em escala global, consolidando posições das grandes potências face à assimetria dos conflitos em curso no globo. Da China aos Estados Unidos, passando por Rússia, Alemanha e o resto da Europa, o pêndulo oscila em direção ao pulso firme.

Essa harmonização também se deve à perda de qualidade e substância das lideranças. Me lembro, a propósito, de uma célebre palestra do Senador Paulo Brossard, que pude assistir pessoalmente no Hotel Macksoud, em São Paulo, no final dos anos 80.

Em pleno período de implementação da "Constituição Cidadã", Brossard já previa o desastre a médio e longo prazo, ao lado de um incrédulo e como sempre ensimesmado FHC.

Brossard convalidava a análise de Golbery quanto às sístoles e diástoles. Porém, afirmava que as crises ocorriam por conta de estarmos sofrendo uma perda contínua de qualidade, de preparo intelectual e capacidade de governança nos quadros da política brasileira. Senão vejamos: 

As crises nas repúblicas da República

1ª República:

A República de 1889 surgiu da união dos novos e brilhantes bacharéis com o velhos e experientes generais do Exército imperial, sob o patrocínio do ascendente capital cafeeiro e industrial. 

Articulados com o que havia de mais atual na modernidade europeia, os novos bacharéis republicanos estavam empenhados em buscar uma identidade nacional e implementar os princípios basilares do Capitalismo - gerado no Brasil somente a partir da lei de 1850 (que instituiu a propriedade privada). O país, de fato, acabava de receber suas primeiras ondas de imigrantes e abolir o regime de escravidão. 

Os entusiasmados bacharéis - nata da aristocracia cafeeira, capitaneados por Prudente de Morais e orientados por juristas do escol de Ruy Barbosa, uniram seu capital ao exército - formado por velhos e experientes oficiais (temperados pela Guerra do Paraguai e pelas revoltas regionais), assumiram o aparelho de Estado imperial sem encontrar resistência e simplesmente "demitiram" a família real, que tomou o rumo do exílio. 

A República de 1889 representou uma grande diástole. Estruturada com a Constituição de 1891, conferiu autonomia aos estados da federação e liberdade partidária. Estabeleceu eleições diretas para a Câmara e o Senado e a escolha do Presidente (embora soldados, religiosos, analfabetos e mulheres ainda não votassem). 

A queda de qualidade no estamento político não tardou a ocorrer. 

Ao par do suporte da economia privada, o coronelismo reinante na política desde os tempos imperiais promoveu a gradual substituição das águias da república pelos falcões dos interesses paroquiais e destes pelos corvos e urubus da burocracia partidária. A degradação ocasionou o "triunfo das nulidades", denunciado por Ruy Barbosa em seu célebre discurso na formatura da turma de 1922, na Faculdade de Direito de São Paulo.

As eleições “a bico de pena” não resistiram à crise tenentista de 1922, à revolução paulista de 1924, à Coluna Prestes de 1927 e à crise econômica mundial de 1929. Tudo ruiu com a Revolução de 1930, impulsionando o pêndulo na direção do centralismo e o coração da república no impulso da sístole.

2ª República e Estado Novo:

Getúlio assumiu o poder pela força, sob os escombros da República Velha, anunciando uma nova democracia. Porém, adotou um regime de intervenção. 

Após a revolução sangrenta de 1932 em São Paulo, a constituição caótica e corporativista de 1934 e a covarde intentona comunista de 1935, cumpriu ao caudilho gaúcho provocar o golpe do Estado Novo, em 1937, instalando uma ditadura em moldes fascistas no Brasil. 

Por meio do regime ditatorial, Getúlio pôde conduzir a transformação da base econômica brasileira em direção à industrialização e urbanização - em especial com a instalação da indústria de base (siderurgia). Getúlio não estava sozinho, o movimento pendular seguia a inércia da política internacional, clamando por um Estado provedor, liderado por um poder executivo hegemônico.

Adveio a II Grande Guerra e, após ela, o modelo getulista restou fora do contexto. 

3ª República: 

Getúlio caiu. Porém, próceres e experientes políticos da República Velha ainda se encontravam vivos no cenário nacional, bem como a geração de ministros de primeira linha consolidados no período getulista. 

Assim, a Constituinte liberal de 1946 contava com três ex-presidentes da República, líderes políticos importantes à direita e à esquerda, incluso os comunistas, e juristas de escol responsáveis pela construção do direito brasileiro. Esta talvez tenha sido a razão de se ter uma Constituição liberal e estruturante, que permitiu à Terceira República administrar as crises de governança transcorridas nos 18 anos seguintes.

No entanto, os quadros que formaram o arcabouço constitucional de 1946 não chegaram à metade da década de 1950. O Brasil perdeu seus líderes mais antigos por "decurso de prazo". As novas lideranças, criadas no período da ditadura getulista e durante a guerra, carregaram para dentro do governo todos os vícios relacionados ao caudilhismo e à polarização ideológica da nascente guerra fria.

A transição foi complexa. Getúlio reassumiu democraticamente, propondo um projeto nacionalista em moldes populistas absolutamente desconforme com a ideia liberal projetada no regime constitucional. A disparidade de contextos impulsionou um mecanismo de paradoxos, como o discurso nacionalista do "o petróleo é nosso" e a sucessão de escândalos de corrupção do "mar de lama". 

O suicídio de Getúlio, seguido de revoltas militares localizadas, tentativas de golpe e sucessivas trocas de governo, encontraram um breve hiato de estabilidade no programa econômico e desenvolvimentista de JK - centrado em um projeto nacional e geopolítico, de modernização da infraestrutura nacional. Juscelino, por sua vez, demonstrou rara habilidade para contornar as crises militares e concentrar esforços na construção da nova Capital do Brasil.

Porém, o populismo retomara as rédeas da república. Sobrevieram a eleição e renúncia de Jânio Quadros, a crise militar da rede da legalidade montada por Brizola (para garantir a assunção do Vice, João Goulart), a introdução casuísta do regime parlamentarista, o plebiscito de 1963 - restaurando o regime presidencial, a explosão sindicalista e a crise de hierarquia nas Forças Armadas. 

1964: O horizonte novamente se escurece

A crise se deveu, mais uma vez, à má qualidade das lideranças - inexperientes, sem vivência democrática, principalmente na formação intelectual. 

Os novos quadros da terceira república abandonaram o Estado Novo getulista para singrar o mar do regime democrático dos anos 50, abrigados nos barcos furados das afirmações ideológicas totalitárias peronistas, nasseristas, stalinistas, castristas e no engajamento sem neutralidade de Foster Dulles, condicionados pelo pesadelo da Guerra Fria. 

Assim, após reações populares de grandes proporções, nas ruas das principais capitais do país - algo que a mídia engajada insiste até hoje em ignorar, o estamento militar engrena a tomada do Poder pelo golpe de Estado - tal qual na primeira, segunda e terceira repúblicas - com ocupação militar e defenestramento dos quadros do regime anterior.

O golpe militar de 1964, como revelou Golbery e afirmava solenemente o Marechal Castelo Branco, era novamente uma "ação de transição". 

Porém, a edição do Ato Institucional nº1 demonstrou que o quadro militar não desocuparia o poder até "restaurar no Brasil a ordem econômica e financeira e tomar as urgentes medidas destinadas a drenar o bolsão comunista, cuja purulência já se havia infiltrado não só na cúpula do governo como nas suas dependências administrativas". 

Claro estava a intenção de alterar as estruturas em vigor, como afirmava o preambulo do Ato Institucional (invenção normativa do mesmo autor do mecanismo dos Decretos do Estado Novo, Francisco Campos): 

"A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma. Ela destitui o governo anterior e tem a capacidade de constituir o novo governo. Nela se contém a força normativa, inerente ao Poder Constituinte. Ela edita normas jurídicas sem que nisto seja limitada pela normatividade anterior à sua vitória. Os Chefes da revolução vitoriosa, graças à ação das Forças Armadas e ao apoio inequívoco da Nação, representam o Povo e em seu nome exercem o Poder Constituinte, de que o Povo é o único titular. O Ato Institucional que é hoje editado pelos Comandantes-em-Chefe do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, em nome da revolução que se tornou vitoriosa com o apoio da Nação na sua quase totalidade, se destina a assegurar ao novo governo a ser instituído, os meios indispensáveis à obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil, de maneira a poder enfrentar, de modo direto e imediato, os graves e urgentes problemas de que depende a restauração da ordem interna e do prestígio internacional da nossa Pátria. A revolução vitoriosa necessita de se institucionalizar e se apressa pela sua institucionalização a limitar os plenos poderes de que efetivamente dispõe."

Preocupados com a questão secular das sinecuras e benesses conferidas à elite do funcionalismo público, cientes que não procederiam à "limpeza" sem interferir no regime de privilégios, os militares não hesitaram em atacar o instituto da estabilidade funcional no próprio Ato Institucional nº1: 

"Art. 7º - Ficam suspensas, por seis (6) meses, as garantias constitucionais ou legais de vitaliciedade e estabilidade.

§ 1º - Mediante investigação sumária, no prazo fixado neste artigo, os titulares dessas garantias poderão ser demitidos ou dispensados, ou ainda, com vencimentos e as vantagens proporcionais ao tempo de serviço, postos em disponibilidade, aposentados, transferidos para a reserva ou reformados, mediante atos do Comando Supremo da Revolução até a posse do Presidente da República e, depois da sua posse, por decreto presidencial ou, em se tratando de servidores estaduais, por decreto do governo do Estado, desde que tenham tentado contra a segurança do Pais, o regime democrático e a probidade da administração pública, sem prejuízo das sanções penais a que estejam sujeitos. 

§ 2º - Ficam sujeitos às mesmas sanções os servidores municipais. Neste caso, a sanção prevista no § 1º lhes será aplicada por decreto do Governador do Estado, mediante proposta do Prefeito municipal."
A Constituição de 1967, institucionalizou o regime militar. Manteve o bipartidarismo criado pelo Ato Adicional nº 2 e estabeleceu eleições indiretas para presidente da República.


Conflagrado o quadro pela reação esquerdista inspirada nas guerrilhas cubanófilas e nos atentados terroristas na europa, o sistema militar reagiu. Ampliou a "sístole" com a edição do Ato Institucional nº 5, em dezembro de 1968, seguido da Emenda Constitucional nº1, de 1969, que incorporou aquele, permitindo ao presidente da República cassar mandatos de parlamentares e magistrados, suspender os direitos políticos dos cidadãos, por congresso em recesso e legislar sobre matéria política, eleitoral, tributária e econômica. 

O Executivo passou a substituir o Legislativo e o Judiciário, concedendo-lhes, em contrapartida, gordos salários e vantagens funcionais...

Foi o grande erro estratégico do governo militar. 

O sistema de arbítrio permitiu o avanço do cancro da corrupção na estrutura policial e na baixa burocracia (os "guardinhas da esquina" preconizados por Pedro Aleixo). As benesses concedidas em troca da docilidade perante o poder gerou um estamento de jusburocratas e parlamentares viciado em privilégios e protegido pela estabilidade, que se tornariam os "guardiões" da Constituição de 1988.

Vale dizer, consolidou a secular casta de "marajás" com poder normativo e jurisdicional. 

A Nova República e o fim da Constituição de 1988

Os militares cumpriram com um processo gradual de retirada das Forças Armadas do Cenário Político Nacional, deixando a administração do Estado para os quadros civis da "Nova República. Não o fizeram por coação e, sim, com planejamento, cientes do esgotamento iminente do seu sistema de governança. 

No entanto, os quadros civis que assumiram a estrutura política do governo central foram os mesmos responsáveis pelo seu esfacelamento em 1964, com raras exceções.

O partido responsável pelo eixo de transformações que marcaram a nova república havia sido criado na reforma partidária introduzida pelo Ato Institucional nº2, com a junção de forças opositoras ao governo militar: o Movimento Democrático Brasileiro, hoje denominado PMDB. 

O PMDB foi o início, o meio e o fim da Nova República. 

Os partidos que o sucederam no Poder Central da República, PSDB e PT, tornaram-se, de uma forma ou outra, reféns do apoio peemedebista. 

A "Constituição Cidadã", de 1988 consolidou a maior de todas as diástoles políticas até então produzidas na história do Brasil. Porém, elevou criticamente a pressão do organismo nacional, que, agora, parece estar recolhido à UTI. 

Dos oito chefes de Estado da Nova República, um morreu antes de sentar na cadeira presidencial, três assumiram na condição de vices no impedimento do titular, dois titulares sofreram impeachment, dois foram eleitos e reeleitos, cumprindo o mandato até o fim. 

Uma grande reforma do Estado foi executada nos anos 90, com FHC. Uma ampla sucessão de programas sociais e projetos estruturantes foram implementados na primeira década do século XXI, com Lula. Três reformas econômicas resultaram em retumbantes desastres - com Sarney e seu Cruzado, Color e seu confisco da poupança e Dilma e sua política de dirigismos e pedaladas fiscais. Uma reforma econômica mudou a face do país, com Itamar Franco e seu Plano Real. 

Temer encetou o seu programa "Ponte Para o Futuro", iniciando um conjunto de reformas, procurando atrair investimentos e estancar a sangria fiscal provocada pelo governo Dilma. 

Dilma saiu pela porta dos fundos, para entrar no rodapé da história. 

Sob os escombros do lulopetismo, afogados no mar de lama e destruídos pela judicialização absoluta da política nacional, jazem os corpos da Nova República de 1985 e da Constituição de 1988. 

O Lulopetismo, apeado do Poder, não saiu de cena. Permanece moribundo, sustentado por militantes sem rumo e colado ao fantasma do regime cuja Constituição, ironicamente, haviam os petistas recusado ratificar...

Os inimigos da República

A assimetria, reinante nos conflitos deste novo século, muitas vezes nubla a visão do analista mais atento ao cenário político. No entanto, é possível divisar no horizonte da república e nos seus órgãos intestinos, a chusma de inimigos que poderá enterrá-la mais cedo que parece, apressando a velocidade do pêndulo. 

O inimigo interno, inoculado no próprio Estado, é justamente o guardião da zumbilândia normativa da Nova República: a jusburocracia instalada no Poder Judiciário e também aboletada nas carreiras jurídicas, existentes nos demais poderes da República. 

Esse bolsão de benesses autoconcedidas, engordado no regime militar e perenizado pela Constituição de 1988 dá-se o direito de não apenas ditar normas como negar validade àquelas que não lhe convém. 

Senhora dos organismos de controle, cuja proporção é de pelo menos três para cada unidade de execução na Administração Pública, a jusburocracia ganha méritos pela negatividade - quanto maior o número de "não aprovações", maior será seu poder junto aos poderes. Nela reside a maior responsabilidade pela paralisia quase absoluta da máquina do Estado Nacional. 

Nada mais é decidido, em todos os níveis de governo. Dos contratos aos concursos, passando pela aprovação de obras e serviços. 

A batalha contra esse bolsão constitui um dos eixos justificadores da demanda por uma nova sístole republicana. A exemplo do Ato Institucional nº1, com certeza deverá merecer a suspensão de "direitos adquiridos", "estabilidades" e outras tantas regalias. 

Antes, porém, será preciso consertar e concertar o quadro político. 

Par e passo com a falta de maiores perspectivas, além das reformas já postas na pauta do atual governo, o que se vê é um absoluto vazio. 

Para "encerrar o expediente", cerrar as portas e apagar a luz, restou outro inimigo, o PMDB, Partido do Movimento Democrático Brasileiro - o porteiro do dia e da noite de todos os arranjos de poder ocorridos no período da Nova República. 

Passadas as tentativas de golpe institucional patrocinadas pela "República dos Delatores" e a chefia da procuradoria da república, o governo de transição peemedebista, no entanto, presencia um quadro de absoluta falta de alternativas para sua própria sucessão. 

Mergulhado no fisiologismo, sem o qual não consegue empurrar uma máquina que nada mais decide em prol do país, o governo central peemedebista, ocupa-se apenas em corrigir o quadro fiscal e encetar as reformas estruturais necessárias para manter vivo o estado de coisas. No resto, vários de seus quadros continuam a praticar o bom e velho fisiologismo, como se o enorme fluxo de operações de rescaldo e combate à corrupção não abalasse a carreira de "acertos" de vários dirigentes ativos - um comportamento próximo de um fenômeno digno de pesquisa acadêmica criminológica. 

Outro grande inimigo da República é a falta de novos (e mesmo velhos) talentos. Não há líderes disponíveis para a sucessão do Presidente. Não há programas definidos, apontando saídas concretas para a crise - a não ser o plano de reformas já proposto pelo governo.

Há partidos sem legitimidade e candidatos sem discurso. Os falastrões que aparecem apresentam fórmulas idênticas aos velhos ternos surrados - daqueles que saem do guarda-roupa sozinhos, em direção aos lugares habituais, sem mesmo vestirem os donos.

Almofadinhas xexelentos patrocinados por uma mídia idiotizada, tentam ensaiar uma sucessão da "República dos Militontos" para uma "República dos Mauricinhos". Por outro lado, a simbiose entre Lula e Bolsonaro promete prorrogar a vida dos dois em prejuízo da necessária comunhão nacional. O fato só demonstra o tamanho do vazio na garrafinha esquerdista nacional. 

Outro grande inimigo da República, à esquerda, hoje, é o PSDB. Este partido formado por ególatras autocentrados ensaia passos conservadores enquanto subscreve manifestos esquerdizóides que até um petista aprovaria... Ensaia verdadeiros "passos de Janio Quadros", como na famosa foto de Emo Schneider para o Jornal do Brasil, ganhadora do Prêmio Esso de Jornalismo de 1962.

Os tucanos, quando o ego deixa, apresentam-se como próceres da segurança jurídica, quando, na verdade, poderão disparar os mais sérios conflitos institucionais na República. A "esfinge" Geraldo Alckmin representa o tucanato menos tucano de toda a história do partido. O candidato parece, mais uma vez, querer "cair por gravidade" na cadeira presidencial, na ausência de opções do eleitorado nacional. 

Já os petistas e seus satélites, hoje, não representam "ameaça política" e, sim, criminológica. Todos deveriam ser recolhidos à prisão.

Na falta de quadros, inteligência e propostas, sobra a ameaça do populismo. A grande praga parece querer produzir as catarses necessárias para legitimar-se, de novo, no poder.

Já disse uma vez que "da queda em desgraça sem qualquer glória do 'Socialismo do Século XXI' europeu e latino-americano, á ascensão da neo-direita nacionalista e xenofóbica franco-anglo-americana, passando pelo populismo muçulmano turco-iraniano, o mundo tem acumulado sucessões de experiências negativas de ordem populista, mas parece disposto a continuar involuindo politicamente até o momento em que o somatório desses experimentos disparar o gatilho de um novo conflito mundial..." (*4).

A sinalização disso não é boa, no mundo e no Brasil. Nuvens negras aparecem no horizonte, praticamente sem relevo...

Olhando o Brasil atual, a situação parece mesmo favorável à sístole política.

A alternativa, no entanto, pode ser a adoção de roteiro comportamental similar ao apresentado por Golbery na ESG, em 1981, acima já exposto, adaptado para a dimensão assimétrica dos conflitos atuais.

De uma forma ou de outra, o estamento militar deve estar preparado para a mobilização. 

Importante, no entanto, desta vez, saber controlar "os guardas da esquina"...

Notas:


*1 in FGV-CPDOC, http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/silva-golberi-do-couto-e, visto em 28/11/2017


*2 Silva, Golbery do Couto e: "Geopolítica do Brasil", ed.Bibliex, 1967, pg. pg. 144-145, pg.155


*3 Pedro, Antonio Fernando Pinheiro: "Neoparamilitarismo, Conflitos Assimétricos, Interesses Difusos e Conflitos de 4ª Geração", in Blog - The Eagle View, set.2015, http://www.theeagleview.com.br/2015/09/paramilitarismo-direito-e-conflitos-de.html, visto em 30/11/2017
*4 Pedro, Antonio Fernando Pinheiro: "Populismo, Catarse e Tragédia", in Blog - The Eagle View, abr.2017, http://www.theeagleview.com.br/2017/04/populismo-catarse-e-tragedia.html, visto em 30/11/2017


Por: Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa - API. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.

domingo, 10 de dezembro de 2017

QUANDO FOI CRIADO O "POVO PALESTINO"? O GOOGLE TEM A RESPOSTA.

-  Todos aqueles que nasceram durante o período do Mandato Britânico da Palestina entre 1923 e 1948 tinham o termo "Palestina" carimbado nos passaportes. Acontece que os árabes ficavam ofendidos quando eram chamados de palestinos. Eles reclamavam: "não somos palestinos, somos árabes. Os palestinos são os judeus.


-  Após os exércitos árabes invasores serem derrotados, uma parcela de árabes locais que haviam fugido da guerra queriam voltar, mas eram considerados quinta coluna, não sendo portanto convidados a voltarem. Os árabes leais, que permaneceram em Israel durante a guerra e seus descendentes ainda estão em Israel, representando hoje um quinto da população do país. Eles são conhecidos como árabes israelenses. Eles têm os mesmíssimos direitos de judeus e cristãos, com a exceção de que não são obrigados a servirem o exército. Eles podem servir se assim o desejarem.

-  "O povo palestino não existe. A criação de um estado palestino é apenas um meio para continuar a nossa luta contra o Estado de Israel em nome da unidade árabe. Na realidade, hoje não há nenhuma diferença entre jordanianos, palestinos, sírios ou libaneses." – em entrevista concedida pelo líder da OLP Zuheir Mohsen em março de 1977 ao jornal holandês Trouw.
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Em um editorial do Guardian de 1º de novembro de 2017, antecedendo o 100ºaniversário da Declaração Balfour, o presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmoud Abbas, pediu à Grã-Bretanha que "peça desculpas" pelo século de "sofrimento" que o documento, segundo ele, trouxe ao "povo palestino". Abbas reiterou as reivindicações que vem fazendo desde 2016, para justificar uma surreal ação judicial que ele ameaça ingressar contra a Grã-Bretanha por ela apoiar a "criação de uma pátria para um povo (judeu), afirma ele, "resultando na desapropriação e perseguição contínua de outro".

"Palestinos" eram os judeus que viviam juntamente com muçulmanos e cristãos em uma terra chamada Palestina, que estava sob administração britânica de 1917 a 1948.

Todos aqueles que nasceram naquele território durante o período do mandato britânico tinham o termo "Palestina" carimbado nos passaportes. Acontece que os árabes ficavam ofendidos quando eram chamados de palestinos. Eles reclamavam: "não somos palestinos, somos árabes. Os palestinos são os judeus".

Bernard Lewis explica:

"Com o surgimento e disseminação de ideologias pan-árabes, os palestinos começaram a fazer questão em afirmar que eles eram árabes, não sírios do sul. Ao longo do período remanescente do mandato britânico e por muitos anos depois disso, as organizações palestinas se autodenominavam árabes e manifestavam sua identidade nacional em termos árabes, não em termos palestinos, nem em termos sírios".

Quando Israel declarou a independência em 14 de maio de 1948, os exércitos de cinco países árabes se uniram para destruir no berço a incipiente nação judaica. Após serem derrotados, uma parcela de árabes locais que haviam fugido da guerra queriam voltar, mas eram considerados quinta coluna não sendo portanto permitida a sua volta. Os árabes leais permaneceram em Israel durante a guerra e seus descendentes ainda estão em Israel, representando hoje um quinto da população do país. Eles são conhecidos como árabes israelenses. Eles têm os mesmíssimos direitos dos judeus, com a exceção de que não são legalmente obrigados a servirem o exército. Eles podem se voluntariar a servir se assim o desejarem.

Os árabes israelenses têm seus próprios partidos políticos. Eles são membros do Knesset (Parlamento de Israel) e trabalham em todas as profissões. A moral da história é ou deveria ser: não comece uma guerra a menos que esteja preparado para a derrota, como aconteceu recorrentemente com os árabes de Israel e com seus vizinhos em 1947/1948, 1967 e 1973.

A propósito, o território mantido pelo Mandato Britânico da Palestina como fiel depositário para os judeus, inicialmente incluía todas as terras que hoje pertencem ao Reino da Jordânia, que teve sua independência concedida em 1946 como Reino da Transjordânia.

(Imagem: Wikimedia Commons)

Menos de uma semana após a publicação do artigo no Guardian, Omar Barghouti, incitador das investidas de hoje de destruir Israel por meio do sufocamento da economia, ecoou Abbas em um artigo publicado na revista Newsweek, dizendo que a Declaração Balfour é "uma tragédia para o povo palestino".

O mesmo sentimento foi manifestado no final de setembro em uma palestraproferida por Rashid Khalidi − Edward Said Professor of Modern Arab Studies at Columbia University − no Centro Hagop Kevorkian de Estudos do Oriente Médio na cidade de Nova York: a Declaração Balfour "lançou um agressão que já dura um século contra os palestinos visando implantar e promover esta pátria nacional, mais tarde Estado de Israel, às suas custas..."

As alegações de Khalidi assim como as de Abbas e Barghouti são falsas. Antes da criação do Estado de Israel em 1948 não havia "palestinos". Conforme declaração do proeminente historiador e especialista libanês/americano sobre o Oriente Médio, Philip Hitti, em seu depoimento perante a Comissão de Inquérito Anglo-Americana de 1946: não existe essa coisa de Palestina na história, de jeito algum".

Os autores Guy Millière e David Horowitz analisaram detalhadamente a matéria no livro de 2015 Comment le peuple palestinien fut inventé ("Como o povo palestino foi inventado"), ilustrando que o propósito do embuste é o de "transformar uma população em uma arma de destruição em massa contra Israel e o povo judeu, para demonizar Israel e para fornecer ao totalitarismo e ao antissemitismo formas de agir".

A manobra deu certo, por um tempo funcionou bem acima das expectativas. O termo "palestinos" foi usado no mundo inteiro, inclusive em Israel, para se referir aos árabes que vivem na Cisjordânia e em Gaza. Muitas vezes o termo é empregado também para se referir aos árabes com cidadania israelense. A narrativa segundo a qual os judeus expulsaram os árabes ao estabelecerem um estado contradiz integralmente os fatos.

Quais são esses fatos? Quando foi, na realidade, criado o "povo palestino"? Usando simplesmente o Google Ngram Viewer se tem a resposta.

Ngram é um banco de dados que mostra a frequência que uma expressão aparece em livros publicados entre os anos 1500 a 2008. Quando um usuário insere o termo "povo palestino" e "estado palestino" na barra de pesquisa Ngram, ele percebe que o termo começa a aparecer somente em 1960.

Na carta datada de 2 de novembro de 1917 enviada a Walter Rothschild, líder da comunidade judaica da Grã-Bretanha, o Ministro das Relações Exteriores, Lord Balfour, salienta:

"O governo de Sua Majestade encara favoravelmente o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu e empregará todos os seus esforços no sentido de facilitar a realização desse objetivo, entendendo-se claramente que nada será feito que possa atentar contra os direitos civis e religiosos das coletividades não judaicas existentes na Palestina (itálico adicionado), nem contra os direitos e o estatuto político de que gozam os judeus em qualquer outro país".

Para completar, além do Ngram, também há as palavras do líder da OLP, Zuheir Mohsen, que em entrevista concedida em março de 1977 ao jornal holandês Trouw ressaltou:

"O povo palestino não existe. A criação de um estado palestino é apenas um meio para continuar a nossa luta contra o Estado de Israel em nome da unidade árabe. Na realidade, hoje não há nenhuma diferença entre jordanianos, palestinos, sírios ou libaneses. Somente por razões políticas e táticas falamos hoje sobre a existência de um povo palestino, uma vez que os interesses nacionais árabes exigem que postulemos a existência de um povo palestino distinto para se opor ao sionismo.

"Por razões táticas, a Jordânia, que é um estado soberano com fronteiras definidas, não pode reivindicar Haifa e Jaffa, ao passo que como palestino, posso indubitavelmente exigir Haifa, Jaffa, Beer-Sheva e Jerusalém. No entanto, no momento em que resgatarmos o nosso direito sobre toda a Palestina, não demoraremos sequer um minuto para unirmos a Palestina e a Jordânia".

Por Jean Patrick Grumberg jornalista do site de notícias de língua francesa Dreuz.
28 de Novembro de 2017

Tradução: Joseph Skilnik  Do site: https://pt.gatestoneinstitute.org