quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

PERSPECTIVAS PARA 2016

Depois de um 2015 bastante difícil, o ano vem terminando com muitas mudanças, tais como o aumento dos juros nos EUA, a redução do crescimento chinês, a troca do ministro da Fazenda no Brasil e a perda do grau de investimento pela Fitch. Isto fez as estimativas de indicadores econômicos para o próximo ano mudarem consideravelmente. Muitos executivos, empresários, investidores e analistas têm se perguntado o que esperar de 2016 que, até aqui, tem tantas variáveis ainda indefinidas.​​

Em ambientes nos quais o passado não é um bom preditor do futuro, a boa técnica recomenda o uso de cenários. Para montar uma análise de cenários, vamos recorrer ao processo de duas variáveis descrito pela Gill Ringland. Selecionamos, assim, duas variáveis externas às empresas e as dicotomizamos. Selecionei uma variável interna do governo brasileiro e uma variável externa. 

A variável interna é a política econômica do próprio governo, e ela tem que ser dicotomizada entre a manutenção do ajuste fiscal com uma política ortodoxa, o que prevaleceu em 2015, e uma política de gastos governamentais e heterodoxia, o que prevaleceu até 2014, para a qual se ensaia um retorno com a troca do ministro da Fazenda.

A variável externa é o ambiente econômico internacional, que não chega a ser de crescimento mas, também, ainda não é de crise. Dicotomizei entre Estável e Crise. Um ambiente estável é o atual, no qual as commodities continuam baixas e os juros também, e com crescimento econômico fraco no mundo inteiro mas, ainda, sem configurar uma crise. Entretanto, existem indícios que apontam para a possibilidade de uma crise internacional, tais como a diminuição do crescimento da China, a guerra cada vez mais complexa na Síria, uma baixa cada vez mais acentuada dos preços do petróleo e, no caso particular do Brasil e de outros países emergentes, a determinação de os EUA de começarem a subir novamente os juros.

Assim sendo, podemos montar um quadro de cenário resultante desta combinação 2x2, que é mostrado na figura 1. Os nomes dos cenários são pictóricos.

Figura 1 – Quadro de cenários econômicos para 2016


​O cenário atual é o de TORMENTA, no qual o ambiente externo é estável e se mantém um ajuste fiscal com ortodoxia econômica. Embora duro, este cenário é o que demonstra alguma chance de levar a uma estabilidade em 2017 e recuperação em 2018. Aqui, o governo contém seus gastos e controla a inflação via juros, impostos e sua própria austeridade, reduzindo a pressão de demanda por dinheiro, permitindo aos juros não explodirem e não tendo de recorrer à impressão de moeda. Este cenário leva o governo a ter uma popularidade muito baixa, que só poderá ser recuperada em 2018.

O cenário de FURACÃO acontece se o ambiente externo piorar, o que parece altamente provável no momento. Aqui, embora o governo continue fazendo o “dever de casa”, apesar da impopularidade, há uma piora do clima econômico no mundo, com os juros nos EUA aumentando, e o preço das commodities caindo ainda mais. O governo é forçado a socorrer a Petrobras e a subir os juros para compensar o aumento dos juros nos EUA. O agronegócio e a mineração brasileiras aprofundam suas crises, pedindo alívio para um governo já muito pressionado, mas o governo resiste à tentação de imprimir dinheiro apesar da alta impopularidade.

O cenário de PÂNICO ocorre se o governo decidir mudar o rumo da política econômica e voltar aos gastos excessivos e à adoção de política heterodoxas, mas isto ainda ocorre em um ambiente internacional estável. Aqui, o governo decide aumentar impostos e imprimir mais dinheiro para lastrear “políticas anticíclicas”, ou seja, gastos para dinamizar a economia, o que pode funcionar no curtíssimo prazo, mas não se sustenta. A popularidade do governo melhora, mas os indicares econômicos deterioram rápido.

No cenário de HORROR, ocorre a “tempestade perfeita”. O governo não resiste ao apelo de gastar mais e decide por políticas “anticíclicas” para recuperar sua popularidade mas, ainda por cima, isto ocorre no meio de uma crise internacional, quando as commodities caem de preço e os EUA sobem os juros. A popularidade do governo melhora marginalmente enquanto os indicadores econômicos deterioram rapidamente. O governo entra em desespero e toma decisões desesperadas.

É difícil prever com precisão os indicares econômicos em cada um dos cenários, mas eles nos ajudam a ter um a panorama das possibilidades. A tabela 1 mostra alguns indicadores selecionados e as probabilidades estimadas de ocorrência de cada cenário. O leitor deve entender tal tabela como uma estimativa contendo erro, ou variação não explicada, ao invés de valores exatos.


As probabilidades foram calculadas estimando que existe 60% de chance ocorrer uma crise no mundo, e 60% para uma mudança de política do governo atual. O leitor que discordar destas estimativas pode fazer suas próprias e recalcular as probabilidades de cada cenário ocorrer. Uma das vantagens desta técnica é sua flexibilidade na análise.

Precisamos torcer para que o mundo não entre em uma crise tão rápido, e que o governo, apesar da impopularidade e da pressão, resista e permaneça firme no propósito de fazer um ajuste fiscal, mantendo políticas ortodoxas. 

Infelizmente, as probabilidades parecem estar contra o Brasil.
Por: Paulo Vicente dos Santos Alves, professor da FDC em 21/12/2015 01:59
Categoria: Estratégia
Do site: http://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Lists/Postagens/Post.aspx?ID=474

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

O PROCESSO DE SELEÇÃO QUE OCORRE NO MERCADO

O processo de seleção que ocorre no mercado - e o que é necessário para vencer

Costuma-se falar, em um sentido metafórico, das forças automáticas e anônimas que influenciam o "mecanismo" do mercado. Ao empregar tais metáforas, as pessoas estão propensas a desconsiderar o fato de que os únicos fatores que dirigem o mercado e influenciam a formação de preços são as ações intencionais dos homens. Não há nenhum automatismo; existem apenas homens conscientes e que, deliberadamente, visam a atingir os objetivos que escolheram.

O mercado é um corpo social; é o corpo social por excelência. Todos agem por conta própria; mas as ações de cada um procuram satisfazer tanto as suas próprias necessidades como também as necessidades de outras pessoas. Ao agir, todos servem seus concidadãos. Por outro lado, todos são por eles servidos. Cada um é ao mesmo tempo um meio e um fim; um fim último em si mesmo e um meio para que outras pessoas possam atingir seus próprios fins.

Todos os homens são livres; ninguém tem de se submeter a um déspota. O indivíduo, por vontade própria, se integra num sistema de cooperação. O mercado o orienta e lhe indica a melhor maneira de promover o seu próprio bem estar, bem como o das demais pessoas. O mercado comanda tudo; por si só coloca em ordem todo o sistema social, dando-lhe sentido e significado.

O mercado não é um local, uma coisa, uma entidade coletiva. O mercado é um processo, impulsionado pela interação das ações dos vários indivíduos que cooperam sob o regime da divisão do trabalho.

A reiteração de atos individuais de troca vai dando origem ao mercado, à medida que a divisão de trabalho evolui numa sociedade baseada na propriedade privada. Tais trocas só podem ser efetuadas se cada uma das partes atribuir maior valor ao que recebe do que ao que renuncia.

O mercado é um processo coerente e indivisível. É um entrelaçamento indissolúvel de ações e reações, de avanços e recuos. Entretanto, a insuficiência de nossa capacidade mental nos obriga a dividi-lo em partes e a analisar separadamente cada uma delas. Ao recorrer a tais divisões artificiais, não devemos esquecer que a aparente existência autônoma dessas partes é um artifício de nossa mente. São apenas partes, isto é, não podem ser concebidas como independentes da estrutura geral do todo.

O processo de seleção que ocorre no mercado é impulsionado pela combinação de esforços de todos os participantes da economia de mercado. Motivado pelo desejo de diminuir tanto quanto possível o seu próprio desconforto, cada indivíduo procura, por um lado, colocar-se numa posição que lhe permita contribuir ao máximo para que as demais pessoas tenham a maior satisfação possível e, por outro lado, tirar o melhor proveito dos serviços por elas oferecidos.

Em outras palavras: cada indivíduo tenta vender no mercado mais caro e comprar no mercado mais barato. A resultante desses esforços é não apenas a estrutura de preços, mas também a estrutura social, a atribuição de tarefas específicas aos vários indivíduos.

A economia de mercado, em princípio, não respeita fronteiras políticas. Seu âmbito é mundial. O mercado torna as pessoas ricas ou pobres, determina quem dirigirá as grandes indústrias e quem limpará o chão, fixa quantas pessoas trabalharão nas minas de cobre e quantas no setor de entretenimento. Nenhuma dessas decisões é definitiva: são revogáveis a qualquer momento. 

O processo de seleção, além de não parar nunca, segue inexoravelmente adiante, ajustando o aparato social de produção às mudanças na oferta e procura. Revê, incessantemente, suas decisões prévias e força todo mundo a se submeter a um reexame de seu caso. Ninguém pode considerar sua posição como assegurada e não existe nenhum direito que garanta uma posição conquistada no passado. Ninguém pode eximir-se da lei do mercado, da soberania do consumidor.

A propriedade dos meios de produção não é um privilégio: é uma responsabilidade social. Os capitalistas e os proprietários de terras são compelidos a utilizar sua propriedade de maneira a satisfazer, da melhor forma, os consumidores. Se forem lentos e ineptos no cumprimento de seus deveres, sofrem prejuízos. Se não aprendem a lição e não mudam o seu comportamento, perdem sua fortuna. Nenhum investimento é seguro para sempre. Quem não utilizar sua propriedade para servir o consumidor da maneira mais eficiente está condenado ao fracasso. Não há lugar para as pessoas que querem usufruir suas fortunas na ociosidade e na imprudência. O proprietário deve procurar investir seus recursos de maneira a não diminuir o principal e a renda.

No tempo dos privilégios de casta e das barreiras comerciais, havia rendas que não dependiam do mercado. Os príncipes e os membros da nobreza viviam à custa de escravos e servos humildes que eram obrigados a trabalhar de graça, a pagar dízimos e tributos. A propriedade da terra só podia ser adquirida por conquista ou por generosidade do conquistador. Só podia ser perdida por abjuração do doador ou para outro conquistador. Mesmo mais tarde, quando os nobres e seus vassalos começaram a vender seus excedentes de produção no mercado, não podiam ser desalojados pela competição de pessoas mais eficientes. 

A concorrência só podia existir de forma muito limitada. A aquisição de grandes extensões rurais era reservada aos nobres; a de propriedades urbanas, aos burgueses do município, a de pequenas propriedades agrícolas, aos camponeses. No campo das artes e ofícios, a competição era restringida pelas guildas. Os consumidores não podiam satisfazer seus desejos de forma mais econômica, uma vez que o controle de preços proibia os vendedores de oferecer preços menores. Os compradores ficavam à mercê de seus fornecedores. Se estes produtores privilegiados se recusassem a empregar as matérias-primas mais adequadas e os métodos de produção mais eficientes, os consumidores se viam forçados a suportar as consequências dessa teimosia e desse conservadorismo.

Aquele proprietário de terras que vivia em perfeita autossuficiência, dos frutos de sua própria atividade agrícola, era independente do mercado. Mas o agricultor moderno que compra equipamentos, fertilizantes, sementes, mão de obra, assim como outros fatores de produção, e vende produtos agrícolas, está sujeito às leis do mercado. Sua renda depende dos consumidores e ele terá de adaptar suas operações aos desejos dos consumidores.

A função selecionadora do mercado também funciona em relação ao trabalho. O trabalhador é atraído por aquele tipo de trabalho no qual espera ganhar mais. Da mesma forma que os fatores materiais de produção, o fator trabalho também é alocado para aquelas atividades nas quais serve melhor ao consumidor. Prevalece a tendência de não desperdiçar qualquer quantidade de trabalho na satisfação de uma demanda menos urgente, se uma demanda mais urgente não foi ainda satisfeita. Como todos os outros estratos da sociedade, o trabalhador também está sujeito à supremacia dos consumidores. Se desobedecer, será penalizado por uma redução nos seus ganhos.

A seleção feita pelo mercado não instaura ordens sociais, castas ou classes, no sentido marxista do termo. Empreendedores e promotores não formam uma classe social integrada. Todo indivíduo tem liberdade para se tornar um promotor, se estiver disposto a depender da sua própria capacidade de antecipar, melhor do que seus concidadãos, as futuras condições do mercado, e se a sua disposição de agir por conta própria e sob sua responsabilidade for aprovada pelos consumidores. 

É enfrentando espontaneamente as situações, aceitando o desafio ao qual o mercado submete todo aquele que deseja tornar-se um empresário ou permanecer nesta posição eminente, que se ascende à condição de empreendedor. Todos têm a possibilidade de tentar sua sorte. Quem quiser iniciar um negócio não precisa esperar que alguém o convide ou o encoraje. Deve lançar-se por conta própria e deve saber como conseguir os meios necessários.

Diz-se com frequência que, nas condições de um capitalismo "tardio" ou "maduro", não é mais possível, a quem não tenha dinheiro, galgar a escada da riqueza e atingir a posição de empresário. Ninguém jamais tentou demonstrar esta tese. Pelo contrário, desde que ela foi enunciada, a competição dos grupos empresariais e capitalistas mudou consideravelmente. Uma grande parte dos antigos empresários e seus herdeiros foram eliminados e outras pessoas, novos empresários, tomaram os seus lugares. 

Os consumidores escolhem os líderes da indústria e do comércio exclusivamente pela capacidade por estes demonstrada de ajustar a produção às necessidades dos próprios consumidores. Nenhuma outra característica ou mérito lhes interessa. Querem um fabricante de sapatos que fabrique sapatos bons e baratos. Não pretendem confiar a direção do negócio de calçados a pessoas amáveis, de boas maneiras, que tenham dons artísticos, sejam cultas ou possuam quaisquer outros talentos e virtudes. Um homem de negócios bem-sucedido, frequentemente, é desprovido daqueles atributos que contribuem para o sucesso pessoal em outras esferas da vida.

É muito frequente, hoje em dia, condenar os capitalistas e os empreendedores. O homem comum tem uma tendência a zombar das pessoas que são mais prósperas que ele. Pensa que, se essas pessoas são mais ricas, é simplesmente porque são menos escrupulosas, e que, se ele não fosse tão respeitador das leis da moralidade e da decência, também seria rico.

Ora, não há dúvida de que, nas condições criadas pelo intervencionismo, muitas pessoas enriquecem pelo suborno e pela corrupção. Em alguns países, o intervencionismo já solapou a supremacia do mercado a tal ponto, que é mais vantajoso para o homem de negócios recorrer à ajuda de alguém no governo do que depender de sua capacidade de melhor satisfazer os desejos dos consumidores. É indiscutivelmente verdadeiro que, se tais práticas não forem logo abolidas, tornarão impossível o funcionamento do processo de seleção do mercado.

Mas não é a isso que se referem os críticos mais populares da riqueza alheia. Tais críticos sustentam que a maneira pela qual se adquire riqueza numa genuína economia de mercado é condenável de um ponto de vista ético.

Contra tais argumentos, é necessário enfatizar que, na medida em que o funcionamento do mercado não seja sabotado pela interferência do governo, pelo protecionismo, por privilégios estatais e por outros fatores de coerção, o sucesso nos negócios é a prova de serviços prestados aos consumidores.

Um homem pobre não é necessariamente inferior ao próspero empresário; ele pode destacar-se por suas realizações científicas, literárias ou artísticas, ou por sua liderança cívica. Mas, no sistema social de produção, ele é inferior. Os funcionários e operários que alardeiam sua superioridade moral iludem-se a si mesmos e encontram consolo nessa ilusão. Não querem admitir que foram postos à prova por seus concidadãos, os consumidores, e não foram aprovados.

Também se afirma frequentemente que o fracasso do homem pobre no processo de competição é causado por sua falta de instrução. Só pode haver igualdade de oportunidade, costuma-se dizer, quando a educação, em qualquer grau, se torna acessível a todos. Prevalece hoje a tendência de reduzir as diferenças entre as pessoas a diferenças de educação, negando-se a existência de diferenças inatas como a inteligência, a força de vontade e o caráter. Geralmente não se percebe que a educação nunca pode ser mais do que uma doutrinação de teorias e ideias já conhecidas. 

A educação, qualquer que seja o seu benefício, é transmissão de doutrinas e valores tradicionais. É, por necessidade, conservadora; produz imitação e rotina, e não aperfeiçoamento e progresso. Os inovadores e os gênios criadores não se formam nas escolas. Eles são precisamente aqueles homens que questionam o que a escola lhes ensinou.

Para ser bem-sucedido nos negócios, um homem não precisa ter um diploma de administração de empresas. Essas escolas treinam os subalternos para trabalhos rotineiros. Certamente não formam empreendedores. Não é possível ensinar uma pessoa a ser empresário. Um homem se torna empreendedor ao perceber oportunidades e preencher vazios. O julgamento penetrante, a capacidade de previsão e a energia que a função empresarial requer não se aprendem na escola. 

Os homens de negócio mais bem-sucedidos foram frequentemente ignorantes, se considerarmos os critérios escolásticos do corpo docente. Mas estavam à altura de sua função social de ajustar a produção à demanda mais urgente. Em razão desse mérito, são escolhidos pelos consumidores para liderar a atividade econômica.

Ludwig von Mises foi o reconhecido líder da Escola Austríaca de pensamento econômico, um prodigioso originador na teoria econômica e um autor prolífico. Os escritos e palestras de Mises abarcavam teoria econômica, história, epistemologia, governo e filosofia política. Suas contribuições à teoria econômica incluem elucidações importantes sobre a teoria quantitativa de moeda, a teoria dos ciclos econômicos, a integração da teoria monetária à teoria econômica geral, e uma demonstração de que o socialismo necessariamente é insustentável, pois é incapaz de resolver o problema do cálculo econômico. Mises foi o primeiro estudioso a reconhecer que a economia faz parte de uma ciência maior dentro da ação humana, uma ciência que Mises chamou de "praxeologia". Do site: http://www.mises.org.br

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

UMA CRÍTICA CHICAGUISTA À TEORIA DOS CICLOS ECONÔMICOS

A Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos diz, de maneira bem sucinta, que a manipulação dos juros feita pelo Banco Central irá gerar "malinvestments" [investimentos errôneos para os quais não há uma genuína demanda]. Tão logo os juros voltem a subir, esses investimentos serão percebidos como insustentáveis (seu custo era maior do que a demanda imaginada), e terão de ser liquidados.


Os neoclássicos, como os seguidores da Escola de Chicago, costumam criticar a Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos com a alegação de que a teoria "despreza a racionalidade dos investidores e empreendedores". Afinal, dizem os neoclássicos, por que empreendedores incorreriam nestes investimentos sabendo do caráter temporário da baixa nos juros?

Respondo.

Porque, em primeiro lugar, os banqueiros irão seguramente emprestar as reservas criadas do nada pelo Banco Central, pois presumem, com razão, que o Banco Central irá socorrê-los, como sempre o fez (Greenspan and Bernanke 'put', pacotes de socorro, tranquilidade pela garantia do saldo dos correntistas etc.). Assim, o primeiro passo está criado.

Segundo, os especuladores, que sabem como funciona o ciclo, irão racionalmente exacerbá-lo para ganhar dinheiro na alta.

Terceiro, é verdade que os empresários conservadores tenderiam a não fazer projetos novos de longo prazo. No entanto, eles não podem se dar ao luxo de ficar de fora do mercado enquanto os demais empresários tomam empréstimos a juros baratos para melhorar sua produtividade. E essa é a tragédia dos ciclos econômicos gerados pela expansão do crédito. Eles obrigam mesmo os empresários prudentes e cônscios a embarcarem no desvario. Afinal, se você não o fizer, você simplesmente perderá fatia de mercado para os seus concorrentes. E como não é possível saber exatamente qual será a duração do boom (pode durar apenas alguns meses, como também pode durar vários anos), você não pode se dar ao luxo de ficar de braços cruzados.

A única coisa que você pode fazer é ir se protegendo ao mesmo tempo em que embarca na loucura.

Ademais, os empresários não são super-homens que podem adivinhar qual seria a taxa de juros de mercado sem a intervenção do Banco Central. Pior ainda, todos os preços de insumos e produtos estão distorcidos pela manipulação do crédito feita pelo Banco Central. Portanto, é virtualmente impossível o empresário determinar a realidade de lucros e prejuízos esperados expurgada dos efeitos do Banco Central.

O melhor que ele pode fazer, como ser humano imperfeito, é tomar os preços de mercado e ser conservador. Mas volta-se ao ponto anterior: ele não pode ser conservador o bastante a ponto de se dar ao luxo de se precificar fora do mercado, condenando sua empresa.
Por: Helio Beltrão, presidente do Instituto Mises Brasil. 
Do site: http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=2242

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

CARLOS LACERDA CONTRA O COMUNISMO

"...pois já são muitos os subjugados pelo medo, o medo de parecer reacionário e o medo de lutar contra o inevitável. O medo de se opor e o medo de não se opor. O comunismo é que é reacionário. E não é inevitável."

"O domínio pela coação psicológica e intelectual prepara monstros de conformismo, como os aleijões intelectuais que, mal saídos de uma universidade católica, vão dirigir a União Nacional dos Estudantes, ramo brasileiro da União Internacional com sede em Praga, ninho de filhotes de quinta-coluna; e de lá saem, pela mão do presidente em exercício da República, para dirigir a Reforma Agrária, em cujo nome tantos crimes se cometem – crimes contra a Constituição, contra a produção, contra a educação."

O comunismo é um sistema de poder totalitário no qual uma casta burocrática e privilegiada, reunindo pela primeira vez no mundo moderno todos os instrumentos do poder nas mesmas mãos, possui ao mesmo tempo os meios de produção e de troca e todos os meios de enquadramento político e cultural, dos quais se serve ditatorialmente.

Eis uma síntese para recordar o que o maior brasileiro de seu tempo, Carlos Frederico Werneck de Lacerda, escreveu no prefácio do livro "Em cima da Hora”, de Suzanne Labin, editado no Brasil em 1964, traduzido por Lacerda antes de março de 64.

No prefácio, Carlos Lacerda escreveu que o livro “Em Cima da Hora” é uma importante contribuição à luta pela democracia no Brasil, pois são impressionantes a ignorância e a candura com que se faz o jogo dos soviéticos, na infiltração, na propaganda e na conquista deste país, decisivo para a América Latina e para o próprio destino da liberdade no mundo.

"Os liberais arrependidos, os socialistas retardados, os religiosos tomados de surpresa, os ensaístas deslumbrados, os jornalistas alfabetizados, os intelectuais ressentidos, os desajustados da liberdade, os novos-ricos de certos bancos e os novos-pobres de certo espírito, formam as mais estranhas combinações para abrir caminho à propaganda, ao sofisma, às idéias-força da Guerra Subversiva que os soviéticos movem contra o mundo livre."

"Sem defesa adequada, com os partidos em dissolução, as Forças Armadas intrigadas e perplexas, a própria Igreja Católica ameaçada de divisão e de se colocar, em vários setores, a serviço da subversão pensando que assim se renova, o que mais admira é como o Povo, o simples e bom Povo do Brasil ainda não se convenceu, de vez, que o regime soviético é o melhor. Pois, de todos os lados, os responsáveis pela sua formação cultural, espiritual, econômica, e pela sua defesa militar, ou tentam convencê-lo a se entregar ou se omitem, com o pavor de não serem admitidos no paraíso soviético que pretende abrir aqui uma sucursal."

"Um Presidente da República tem o desplante de dizer que a Constituição que jurou defender e nunca respeitou nem cumpriu, está superada. E contra ela mobiliza, numa aliança natural, os negocistas e os comunistas, igualmente interessados em saquear o Brasil, privando-o da ordem democrática, da ordem com liberdade, da liberdade com responsabilidade."

"Há os que dizem: é inútil combater o comunismo, o que há a fazer é combater a miséria. Supondo que a miséria acabe no mundo antes do comunismo, tomemos o argumento: o comunismo só vence onde há miséria. Logo, ele precisa da miséria para vencer. Portanto, cada vez que se aceita a colaboração dos comunistas e seus auxiliares na alegada luta contra a miséria, está-se trazendo um balde de gasolina para apagar o incêndio."

"Outro argumento apresentado com freqüência é o da “coexistência pacífica”. Supor que a ditadura soviética se deixará confinar nos territórios já ocupados, e uma nova linha de Tordesilhas dividirá o mundo entre zonas de influência dos Estados Unidos e da Rússia, que se respeitarão entre si, é uma versão nova do espírito de Munique."

"Com deplorável leviandade, fruto da aflição servida pela ignorância, certos prelados confundem economia social com assistência social, e Jesus Cristo com Jean Jacques Rousseau. Uma epidemia de oportunismo, agravada pela ignorância e pelo pedantismo se apossa do Brasil. Este é bem o momento de fazer ouvir a voz clara e sincera de uma inteligência poderosa, leal à missão que se impôs."

"Certo, há que lutar pelo bem-estar social. Mas, a condição de êxito dessa luta é a eliminação do comunismo. Não é só a miséria a estimular o comunismo. É o comunismo a estimular a miséria."

"Poucos fatores podem ser tão decisivos, na guerra política, quanto um livro. Foi com livros que Lênin deu saída à Revolução Russa. É com livros, é com idéias que podemos fazer a Revolução Brasileira."

"Quem quiser entender o que se está passando no Brasil, e contribuir para mudar esses acontecimentos terríveis, deve ler este livro. Os inimigos também. Ele só não adianta aos tolos."
Por: Carlos Azambuja, historiador, é autor de A Hidra Vermelha. Do site: http://www.midiasemmascara.org/

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

ATÉ A RECESSÃO É DE QUALIDADE INFERIOR

Não se pode confiar nem na recessão, pelo menos naquela made in Brazil. Recessões decentes são em geral acompanhadas de inflação em queda e contas externas em recuperação. O caso brasileiro é especial. Os preços ao consumidor sobem 10%, enquanto o desemprego atinge 9% da força de trabalho, a renda real das famílias diminui, o crédito se torna mais difícil e o produto interno bruto (PIB) encolhe 3,5%, segundo as estimativas correntes. Só uma parte do script convencional parece estar sendo cumprida. O superávit comercial de US$ 14,21 bilhões acumulado no ano, até a primeira semana de dezembro, é o sinal mais vistoso da melhora do balanço de pagamentos.


No ano passado, no mesmo período, o saldo havia sido um déficit de US$ 3,95 bilhões, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Pelo menos as contas externas parecem refletir um efeito benigno da recessão. O mercado projeta para este ano um superávit de US$ 15 bilhões na conta de mercadorias. A última estimativa do Banco Central (BC), baseada em critério um pouco diferente, é de um saldo positivo de US$ 12 bilhões, com enorme recuperação, portanto, em relação ao resultado de 2014, quando o déficit chegou a US$ 6,53 bilhões.

Ainda pelas contas do BC, o déficit em conta corrente passará de US$ 104,08 bilhões no ano passado para um buraco muito menor, estimado em US$ 65 bilhões. A melhora, se confirmada, resultará tanto do superávit na conta de mercadorias quanto da redução do déficit em serviços e rendas. A tudo isso se acrescenta uma boa notícia: o investimento direto, o tipo mais seguro e mais produtivo de financiamento externo, será suficiente, de novo, para cobrir o rombo das transações correntes. Mas esse ajuste das contas externas será, de fato, um dado tão positivo?

Nem tanto. Recessões tendem a reduzir a demanda de bens importados e os gastos no exterior, até porque são frequentemente acompanhadas de uma desvalorização da moeda nacional. Mas também resultam, com frequência, em aumento de exportações. Diante da retração do mercado interno, empresários tendem a buscar negócios no exterior e nisso são ajudados, muitas vezes, pelo câmbio. A desvalorização de sua moeda barateia os produtos nacionais no mercado externo e encarece os importados. No caso brasileiro, só uma parte do roteiro se confirmou.

De janeiro até a primeira semana de dezembro, o valor exportado, US$ 177,39 bilhões, foi 14,9% menor que o de um ano antes. A conta só ficou superavitária porque o gasto com a importação de mercadorias diminuiu muito mais. A despesa com a importação, US$ 163,18 bilhões, foi 27,3% menor que a de igual período de 2014, pela média dos dias úteis. Como é normal, a recessão derrubou a procura de produtos estrangeiros, mas a exportação também diminuiu, embora em menor proporção.

A redução do valor exportado é explicável por dois fatores. O primeiro é a queda dos preços internacionais dos produtos básicos, em parte associada à diminuição do crescimento da economia chinesa. Apesar disso, as vendas de commodities ainda sustentaram o saldo comercial. O segundo fator é o mais preocupante. A indústria brasileira, mesmo em dificuldades no mercado interno, foi incapaz, de modo geral, de encontrar uma compensação nas vendas ao exterior.

Com algumas exceções, os produtores brasileiros de manufaturados vêm perdendo competitividade há anos. Os custos cresceram, a infraestrutura continua muito deficiente e a produtividade recuou. A alta do dólar pode ter trazido algum alento aos exportadores, mas insuficiente para compensar os entraves à competição. Industriais se queixaram, durante anos, do câmbio valorizado e, portanto, prejudicial a seus negócios. Mas pouco se fez, em termos políticos e empresariais, para cuidar de fatores muito mais importantes, a longo prazo, como a tributação irracional, a baixa qualidade da mão de obra, a burocracia excessiva, a insegurança jurídica e o acesso limitado a mercados externos e às cadeias internacionais de valor.

Este ponto, especialmente importante, remete à diplomacia comercial terceiro-mundista em vigor desde 2003 e ao revigoramento de uma política industrial abandonada, há muito, nas economias mais dinâmicas do mundo emergente. Muitos empresários se acomodaram facilmente, é claro, num ambiente marcado pelo protecionismo e pela pouca ambição quanto a acordos internacionais de comércio. 

A incapacidade de aproveitar a depreciação cambial para competir no mercado externo é explicável, em parte, pela acomodação, durante tanto tempo, num ambiente de confortável mediocridade. Quem se aproveitou das políticas de conteúdo nacional teve ainda menos motivação para se mexer e investir em produtividade e inovação.

Recessões, em outros países, são com frequência o custo imediato de políticas de ajuste das contas fiscais e do balanço de pagamentos. Isso já ocorreu também no Brasil. Desta vez, a promessa de arrumação fiscal só apareceu quando a economia já estava em recessão e a base tributária, por causa da contração dos negócios, era insuficiente para alimentar um Tesouro depredado. Não se produz de um dia para outro um desastre como o brasileiro: uma combinação especial de contas públicas estropiadas, economia retraída, inflação muito alta e ajuste externo conseguido só à custa da redução da corrente de comércio. No País, até a recessão é desarranjada e de qualidade inferior.

A retração dos negócios deve continuar em 2016, os juros ainda podem subir e o compromisso de austeridade fiscal continua incerto. Outras agências podem seguir a Standard & Poor’s e rebaixar o crédito do Brasil ao nível especulativo. Mas a prioridade da presidente é evitar o impeachment – possível punição de apenas alguns dos desmandos fiscais. Com ela ou sem ela, o conserto será demorado e doloroso.
Por: ROLF KUNTZ, Jornalista.    Publicado no Estadão

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

EUA: PORTE DE ARMAS CRESCE 178% EM 7 ANOS; CRIMINALIDADE DESPENCA

"Mais permissões [para porte de armas] significa que está ficando mais difícil para os criminosos atacarem as vítimas".
De 2007 até o presente momento, o número de americanos com licença para portar armas cresceu 178% (fonte, página 9).


Só no ano passado, foram emitidas mais de 1,7 milhão de novas licenças, um crescimento de 15,4% num único ano — o maior já registrado —, totalizando 12,8 milhões de autorizações de porte de armas (fonte, página 6).

Essa estatística despertou a preocupação de diversas organizações desarmamentistas, que temiam que as armas elevassem as taxas de homicídio no país.

Mas o que os dados recentes revelaram foi justamente o contrário: ao mesmo tempo em que o número de cidadãos armados cresceu, a taxa de crimes violentos despencou no país inteiro.

Segundo estatísticas oficiais do governo, citadas neste estudo do Centro de Pesquisa para a Prevenção de Crimes, a taxa de crimes violentos caiu 25% no período e a taxa de homicídios por 100 mil habitantes saiu dos 5,6 para os 4,2, apesar do crescimento massivo do porte de armas. Os números são os mais baixosdesde 1957, quando a taxa de homicídios atingiu 4,0 por 100 mil habitantes.

Um dado interessante encontrado pelos pesquisadores foi o de que as mulheres estão se armando mais do que os homens: entre 2007 e 2014, o número de mulheres com porte de arma cresceu 270%, enquanto entre os homens o número foi elevado em 156% (fonte, página 10).

Além das mulheres, a população negra também está se armando mais. Uma análise, citada no estudo, revelou que entre 2012 e 2014, o grupo que mais mudou de opinião em relação aos benefícios do armamento foram os negros (fonte, página 14).

De acordo com a pesquisa, conduzida pelo Pew Research Center, a proporção de afro-americanos que responderam que armas contribuem mais para a autodefesa do que para crimes saltou dos 29% para 54% — um crescimento de 86% —, no sentido contrário do estereótipo de que armamentistas são, em geral, brancos. Além de terem se tornado mais favoráveis, a população negra também tirou mais licenças para porte de armas (fonte, página 10).

"Mais permissões [para porte de armas] significa que está ficando mais difícil para os criminosos atacarem as vítimas", afirma John Lott, autor do estudo. "A composição de pessoas que estão ganhando as novas permissões também está mudando. Estamos vendo um grande aumento entre minorias e mulheres tirando essa autorização. Ter esses grupos mais armados contribui muito para reduzir a criminalidade."

Para Lott, além da visão da população sobre o armamento ter mudado, outro fator que contribuiu para o crescimento do número de licenças para porte de armas foi a redução do custo dessas licenças, que varia de estado para estado.

Como destaca o economista, os estados que reduziram o custo dessa autorização — que varia de US$ 10 a US$ 450 (fonte, páginas 5 e 6) — ou ainda os que já praticavam preços mais baixos, tiveram maiores crescimentos no número de cidadãos negros registrando o porte.

Atualmente, 5,2% da população adulta possui licença para portar armas nos Estados Unidos (fonte, página 4). Apesar disso, em 5 estados (Alabama, Dakota do Sul, Indiana, Pensilvânia e Tennessee), a taxa de porte de armas por adulto está acima dos 10% (fonte, página 5).

O gráfico abaixo (fonte, página 5) mostra a evolução do porte de armas nos EUA em porcentagem da população adulta (eixo Y, linha contínua) e a evolução da taxa de homicídios por 100 mil habitantes (também eixo Y, pontos azuis):

Em contraste, no Brasil, apenas 0,00185% da população possui autorização para portar armas, segundo oInstituto Defesa— aqui, a UF com a maior taxa de porte de armas é a do Distrito Federal, que tem 7,2 vezes mais autorizações para porte que a média nacional.

O estudo ainda destaca que o policiamento não pode ser tomado como responsável pela queda na criminalidade: mesmo após isolar dados de policiamento per capita e de prisões, o crescimento do número de licenças para porte de armas continuou associado com a redução no número de crimes violentos e homicídios. (fonte, páginas 4 e 19)

Apesar do alto crescimento nos últimos anos, o número de licenças para porte de armas emitidas nos Estados Unidos pode diminuir nas próximas décadas, mas por uma outra razão: atualmente, em 6 estados, o ato de portar armas visíveis em público não requer nenhuma autorização. Apesar do número ainda pequeno, a cada ano mais estados se juntam a esse grupo — em 2010, 3 estados permitiam o porte sem autorização.

Maine, que no início deste mês anunciou a nova lei, foi o último estado a entrar para a lista. Com a mudança na legislação, que entra em vigor em outubro, o estado se junta ao grupo de estados mais liberais em relação ao porte de armas, ao lado de Alasca, Arizona, Wyoming, Kansas e Vermont. Além destes, outros cinco estados também possuem uma legislação similar em relação ao porte sem necessidade de autorização, embora apenas para casos especiais.

O mapa abaixo mostra a distribuição de assassinatos em massa praticados com armas de fogo (mass shootings) em cada estado americano:


Tiroteios em massa desde 2012. Fonte: Vox.com

Já este mapa mostra o número de armas de fogo por habitante.



Uma imagem vale mais que mil palavras. Os estados costeiros, por exemplo, possuem uma taxa de armas de fogo bem baixa e leis bem restritas com o porte e a posse desses artefatos. Nada disso impediu que 486 inocentes perdessem a vida entre 2000 e 2013 em assassinatos em massa praticados com armas de fogo (mass shootings) exatamente nestes estados.

Por fim, e ironicamente, o controle de armas tem um histórico racista. Nos Estados Unidos, foi usada por diversos estados como forma de evitar que os escravos revidassem os abusos de seus senhores. O medo era tão grande que até cães chegaram a ser considerados uma "arma" e sua posse por negros, proibida.

Publicado no site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.
Por: Leônidas Villeneuve é colunista do site Spotniks.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

INTIMAÇÃO

Tudo parece calculado, enfim – pelo demônio em pessoa, quem mais? -- para aprisionar a opinião pública mundial numa rede de ambigüidades e contradições paralisantes.

Até os anos 80 do século passado, programas como sex lib, feminismo, gayzismo, abortismo e liberação das drogas eram, para os governos comunistas, desvios pequeno-burgueses criados pelo imperialistas ianques para afastar a juventude da luta pelo socialismo.

Decorrida uma geração, todos esses temas foram absorvidos no discurso revolucionário e muito contribuíram para que o esquerdismo, aparentemente condenado à morte pela queda da URSS, não só sobrevivesse como se tornasse a força política dominante na Europa e nas Américas

Se isso não basta para tornar evidente a potência de autotransformação camaleônica do movimento revolucionário mundial, não sei mais quantos desenhos seria preciso esboçar no quadro negro para ilustrá-la. No entanto, pouquíssimas são as inteligências que, nas hostes liberais e conservadoras, se deram clara conta desse fenômeno e de suas conseqüências.

Mas outras mutações concomitantes, tão vastas e profundas como essa, vieram a tornar o panorama ainda mais confuso.

Cito somente quatro:

1. A invasão islâmica, a “ocupação pela imigração”, cuja realidade muitos negavam até ontem, é agora um fato patente que ameaça a segurança de todas as nações ocidentais. Ao mesmo tempo, o cristianismo vem sendo cada vez mais banido da esfera pública, só deixando aos governos, mesmo soi disant conservadores, a saída de opor, à islamização crescente, o apelo aos mesmos valores laicos “politicamente corretos” que a esquerda conseguiu impor como normas universalmente válidas. O resultado é óbvio: a invasão islâmica não cessa, mas a esquerda se afirma cada vez mais como a grande e única salvadora das democracias, que ao mesmo tempo ela solapa mediante o apoio ostensivo à imigração muçulmana em massa como alternativa “pacífica” ao terrorismo.

2. Instruído ao menos parcialmente pelo “eurasianismo” de Alexandre Duguin, o presidente russo Vladimir Putin decidiu empunhar a bandeira do cristianismo tradicional e brandi-la contra o Ocidente hedonista e agnóstico, ganhando com isso o apoio de amplas faixas de conservadores desiludidos. Desiludidos seja com o establishmentamericano, impotente para livrar-se de um bandidinho chinfrim sem documentos que já mal esconde suas simpatias islâmicas; seja com a Igreja Católica, cujo Papa se parece cada vez mais com um upgrade improvisado do sr. Leonardo Boff. Ao mesmo tempo que seduz esse público, porém, Putin vai, mediante acordos de cooperação econômica e militar, dando a maior força aos movimentos esquerdistas por toda parte, colocando os conservadores na posição desconfortável de servir a seus inimigos estratégicos em troca de um reconforto ideológico passageiro e muito provavelmente ilusório.

3. Também simultaneamente, muitos grupos capitalistas bilionários passaram a apoiar partidos e movimentos de esquerda de maneira cada vez mais ostensiva, culminando na declaração pública do sr. Bill Gates de que só o socialismo salvará o mundo. Nesse panorama, a mera defesa da economia de mercado, que até ontem era a pièce de resistance do cardápio liberal-conservador, perde todo sentido estratégico e se torna um mero pretexto para adotar, em nome da “modernidade” e da “democracia”, todo o programa sociocultural da esquerda: gayzismo, abortismo, etc. etc.

4. Por fim, esse programa foi integralmente subscrito pela ONU e se tornou obrigatório para todas as nações -- exceto as islâmicas, é claro, que assim se beneficiam duplamente da dissolução moral do Ocidente, por um lado aproveitando-se da debilitação das identidades nacionais (desprovidas cada vez mais de seus fundamentos religiosos) e arrombando portas para a entrada de novas levas de imigrantes, por outro lado oferecendo-se gentilmente como portadoras da esperança de uma possível “restauração da moralidade”.

Tudo parece calculado, enfim – pelo demônio em pessoa, quem mais? -- para aprisionar a opinião pública mundial numa rede de ambigüidades e contradições paralisantes, de modo pegá-la desprevenida, sonsa e inerme no dia em que se realizar a profecia que Carlos Drummond de Andrade enunciou nos versos da “Intimação”:

Abre em nome da lei.

Abre sem nome e lei.

Abre mesmo sem rei.

Abre sozinho ou grei.

Não, não abras; à força

de intimar-te, repara:

eu já te desventrei.

Por: Olavo de Carvalho
Publicado no Diário do Comércio.