sábado, 31 de março de 2012

Revoguem a anistia (do mensalão)

Revoguem a anistia (do mensalão) Guilherme Fiuza, O GLOBO As comemorações do golpe de 64 ganharam um alento este ano. O patético "parabéns pra você" no 31 de março, data inaugural da ditadura militar, andava quase inaudível na caserna, quando ganhou um reforço de peso. Dessa vez, o Brasil inteiro ouvirá os nostálgicos dos anos de chumbo - graças à ex-guerrilheira Dilma Rousseff. No final dos anos 70, quando o regime autoritário chegava ao seu último capítulo, o general João Figueiredo assumiu a Presidência da República com um inesquecível brado "democrático": avisou que ia "prender e arrebentar" quem fosse contra a abertura política. Figueiredo fez escola. Na polêmica sobre a Comissão da Verdade, Dilma Rousseff botou para quebrar, em nome da democracia. A presidente do governo popular mandou amordaçar militares da reserva que criticaram duas de suas ministras. As auxiliares de Dilma haviam defendido a revogação da Lei da Anistia - o pacto nacional para a saída da ditadura. Os militares contrariados publicaram um manifesto de repúdio no site do Clube Militar. Dilma mandou o Exército apagar o texto e enquadrou os militares como insubordinados. Quem for contra a Comissão da Verdade, ela prende e arrebenta (ou pelo menos censura). Era o que faltava para ressuscitar as almas penadas leais ao golpe de 64. Autoritarismo é vitamina para elas. Mas ser a favor do regime militar também não pode. O governo de esquerda aceita o pensamento de direita, desde que ninguém o manifeste. A democracia popular tem dono: ame-a ou deixe-a. Foi com esse espírito que um bando de militantes de partidos filiados ao poder central foi para a porta do Clube Militar, no Centro do Rio. Lá dentro ocorria uma homenagem ao movimento de março de 64. Do lado de fora, em defesa dos direitos humanos e da verdade, os manifestantes fecharam a Avenida Rio Branco na marra. Atiraram ovos contra seguranças do prédio, incendiaram cartazes e tentaram agredir militares que saíam do evento, provocando a reação da polícia que tentava protegê-los e transformando a Cinelândia em praça de guerra. Um show de democracia. A Comissão da Verdade pretende investigar os crimes cometidos pela direita no poder. O país não pode mesmo dormir tranquilo sobre certos disparates, como a versão militar de que Vladimir Herzog se suicidou na cela do DOI-Codi. É um escárnio. O problema dessa revisão é que não se encontrará a verdade no passado sem saber onde ela anda no presente. Hoje o Brasil é governado pela esquerda. E a esquerda combateu a ditadura, defendendo a democracia, a liberdade e os pobres. Como essa autoridade moral foi usada no poder? De várias formas - algumas delas não contabilizadas. Quando estourou o escândalo do mensalão, Delúbio Soares, então poderoso tesoureiro do PT, negou o flagrante com convicção: "É uma conspiração da direita contra o governo popular." O ex-guerrilheiro José Dirceu, apontado como chefe da quadrilha, caiu em desgraça, mas fez sua sucessora na Casa Civil: a "querida companheira de armas" Dilma Rousseff. Em meio às tramoias, a mística da resistência à ditadura estava intacta. A virtude de mulher-coragem, ex-refém dos militares, levou Dilma longe. Candidata a presidente, transformou em ministra da Casa Civil a obscura companheira Erenice Guerra, também ungida pela mística da militância de esquerda. Enquanto Erenice caía por tráfico de influência, descobria-se que Dilma se fizera passar pela atriz Norma Bengell numa foto da Passeata dos Cem Mil, em 1968, divulgada por sua campanha. O que seria dela sem a ditadura? Dilma não teria sido eleita - nem qualquer outro afilhado revolucionário de Lula - se os companheiros do mensalão tivessem sido punidos. Ali estava, para quem quisesse ver, a conversão de um partido e de uma causa "libertária" em sistema de perpetuação no poder, a partir de um planejado assalto ao Estado. Transcorridos quase sete anos, essa fraude política sem precedentes permanece misteriosamente no colo do Supremo Tribunal Federal, prestes a sumir do mapa pela extinção do processo. Aí a Justiça brasileira terá legalizado as palavras do general Lula: "O mensalão não existiu." Haverá uma Comissão da Verdade para desenterrar o crime dos heróis da resistência? Enquanto o mito não se desmancha, as vítimas profissionais da ditadura vão fazendo o seu pé de meia. Na série de revoluções ministeriais, os comunistas se destacaram partilhando o dinheiro do Esporte entre as ONGs amigas do PCdoB. A imprensa burguesa bombardeou essa distribuição de renda e o ministro caiu, mas a companheira Dilma manteve o cargo com a agremiação. Em comunismo que está ganhando não se mexe (ainda mais em véspera de Copa do Mundo). Assim como o ex-guerrilheiro Fernando Pimentel, que uniu forças com a amiga Dilma e se tornou um próspero consultor, muitos companheiros viverão em paz sob a anistia do mensalão. Essa, ninguém revoga.

sexta-feira, 30 de março de 2012

O advento da ditadura secreta

O advento da ditadura secreta ESCRITO POR OLAVO DE CARVALHO | 28 MARÇO 2012 ARTIGOS - GLOBALISMO Obama deu a si mesmo poderes ditatoriais em momentos calculados para desviar as atenções e frustrar a divulgação. A precaução acabou por se revelar desnecessária: jornais e canais de TV, levando a solicitude até o último limite, não publicaram praticamente nada a respeito.   Escolados pelo precedente do Foro de São Paulo, cuja existência lhes foi ocultada durante dezesseis anos pela mídia soi disant respeitável, alguns leitores brasileiros talvez não se sintam tão espantados ao ver que o New York Times, o Washington Post, a CNN e demais organizações jornalísticas de maior prestígio nos EUA, mesmo depois do pito que levaram do Pravda, continuam sonegando ao público qualquer notícia sobre os documentos forjados de Barack Hussein Obama. Nos dois casos, a recusa de cumprir a mais primária obrigação do jornalismo pode se explicar, de início, pela reação automática de ceticismo ante condutas que, de tão perversas, maliciosas e abjetas, parecem inverossímeis.  Quem poderia acreditar, assim sem mais nem menos, que a esquerda, desmoralizada e aparentemente moribunda após a queda da URSS, estava preparando um retorno triunfal na América Latina por meio de um acordo secreto entre organizações legais e criminosas, planejado para controlar, pelas costas do eleitorado, a política de todo um continente? Quem poderia engolir, na primeira colherada, a hipótese de que um bandidinho com identidade falsa, subsidiado por bandidões, ludibriou a espécie humana praticamente inteira e, da noite para o dia, saiu do nada para se tornar presidente da nação mais poderosa do mundo?  É mesmo difícil. Mas quando nem mesmo o acúmulo incessante de provas inquestionáveis demove do seu silêncio os profissionais que são pagos para falar, então é impossível evitar a suspeita de que o engodo não foi tramado só por políticos, mas também pelos donos de jornais, revistas e canais de TV, secundados pelo proletariado intelectual das redações.          No entanto, como qualquer pessoa com mais de quinze anos tem a obrigação de saber, não há nada que esteja tão ruim que não possa piorar. Após ocultar a maior fraude política de todos os tempos, a mídia americana passou a esconder até decretos oficiais do governo Obama, que assim são impostos a uma população desprovida do elementar direito de saber que eles existem.  Os leitores mais velhos devem se lembrar de que a nossa ditadura militar inventou, um belo dia, um treco chamado "decreto secreto", que entraria em vigor sem precisar ser publicado. Inventou-o mas, que eu saiba, não teve a cara-de-pau de chegar a usá-lo. Pois bem, graças às empresas de comunicações de Nova York e também de  Washington, essa deformidade jurídica inigualável está em pleno uso na mais velha e – até recentemente – mais estável democracia do mundo.         Quando o amor fanático da classe jornalística a um político se coloca acima da Constituição, das leis, da segurança nacional e de todas as regras básicas da moralidade, não há como explicar isso pela mera preferência espontânea dos profissionais de imprensa, por mais obamistas que eles comprovadamente sejam.  Alguns jornalistas chegaram a queixar-se ao chefe da Comissão Arpaio, Michael Zullo, de que haviam recebido ameaças diretas do governo para que nada publicassem das investigações. Artigos a respeito foram misteriosamente retirados até de sites conservadores como www.townhall.com, e uma entrevista marcada com Jerome Corsi, o incansável investigador da fraude documental, foi suspensa na Fox News por ordem explícita da diretoria. Com toda a evidência, o bloqueio vem de muito alto, envolvendo tanto funcionários do governo quanto potentados da mídia.          Quando se conhece, porém, o conteúdo dos decretos ocultados, vê-se que a coisa é infinitamente mais grave do que o simples boicote organizado do direito à informação.  Em 31 de dezembro, quando o povo estava distraído festejando o Ano Novo, Obama assinou o Defense Authorization Act, que lhe dava, simplesmente, o direito de mandar matar ou de prender por tempo indefinido, sem processo nem habeas corpus, qualquer cidadão americano.  No crepúsculo da sexta-feira, 16 de março, veio uma ordem executiva (o equivalente da nossa "medida provisória", com a diferença de que não é provisória) que confere ao presidente os poderes necessários para estatizar, a qualquer momento e sem indenização, todos os recursos energéticos do país, incluindo as empresas de petróleo, mais a indústria de alimentos, e ainda para instituir quando bem deseje, sem autorização do Congresso, o recrutamento militar obrigatório.  Em suma: o homem deu a si mesmo poderes ditatoriais, e nas duas ocasiões fez isso em momentos calculados para desviar as atenções e frustrar a divulgação. A precaução acabou por se revelar desnecessária: jornais e canais de TV, levando a solicitude até o último limite, não publicaram praticamente nada a respeito, de modo que, com exceção daqueles que já voltaram as costas à mídia elegante e preferem informar-se pela internet, os americanos, tendo adormecido numa democracia, acordaram numa ditadura sem ter ideia do que havia acontecido (v. os comentários de Dick Morris em http://www.dickmorris.com/obama-assumes-dictatorial-powers/).  Não que esta seja a primeira ditadura a ocultar sua própria existência. O segredo, ensinava René Guénon, é da essência mesma do poder. As diferenças são duas: 1– Pela primeira vez na história do mundo a ditadura secreta é implantada por um ilustre desconhecido cuja identidade permanece secreta, bloqueada a todas as investigações. 2– O episódio evidencia com clareza obscena o fenômeno mundial, a que já aludi muitas vezes, do giro de 180 graus na função da grande mídia, que de veículo de informação se transmutou maciçamente, nas últimas décadas, em órgão de censura e controle governamental da opinião pública.    Publicado no Diário do Comércio.

Fracassamos

Nem o dr. Pangloss, célebre personagem de Voltaire, deve estar satisfeito com os rumos da nossa democracia. Não há otimismo que resista ao cotidiano da política brasileira e ao péssimo funcionamento das instituições. Imaginava-se, quando ruiu o regime militar, que seria edificado um novo país. Seria a refundação do Brasil. Ledo engano. Em 1974, Ernesto Geisel falou em distensão. Mas apenas em 1985 terminou o regime militar. Somente três anos depois foi promulgada uma Constituição democrática. No ano seguinte, tivemos a eleição direta para presidente. Ou seja, 15 anos se passaram entre o início da distensão e a conclusão do processo. É, com certeza, a transição mais longa conhecida na história ocidental. Tão longa que permitiu eliminar as referências políticas do antigo regime. Todos passaram a ser democráticos, opositores do autoritarismo. A nova roupagem não representou qualquer mudança nos velhos hábitos. Pelo contrário, os egressos da antiga ordem foram gradualmente ocupando os espaços políticos no regime democrático e impondo a sua peculiar forma de fazer política aos que lutaram contra o autoritarismo. Assim, a nova ordem já nasceu velha, carcomida e corrompida. Os oligarcas passaram a representar, de forma caricata, o papel de democratas sinceros. O melhor (e mais triste) exemplo é o de José Sarney. Mesmo com o arcabouço legal da Constituição de 1988, a hegemônica presença da velha ordem transformou a democracia em uma farsa. Se hoje temos liberdades garantidas constitucionalmente (apesar de tantas ameaças autoritárias na última década), algo que não é pouco, principalmente quando analisamos a história do Brasil republicano, o funcionamento dos três Poderes é pífio. A participação popular se resume ao ato formal de, a cada dois anos, escolher candidatos em um processo marcado pela despolitização. A cada eleição diminui o interesse popular. Os debates são marcados pela discussão vazia. Para preencher a falta de conteúdo, os candidatos espalham dossiês demonizando seus adversários. O pior é que todo o processo eleitoral é elogiado pelos analistas, quem lembram, no século 21, o conselheiro Acácio. Louvam tudo, chegam até a buscar racionalidade no voto do eleitor. Dias depois da "festa democrática", voltam a pipocar denúncias de corrupção e casos escabrosos de má administração dos recursos públicos. Como de hábito, ninguém será punido, permitindo a manutenção da indústria da corrupção com a participação ativa dos três Poderes. Isso tudo, claro, é temperado com o discurso da defesa da democracia. Afinal, no Brasil de hoje, até os corruptos são democratas. No último dia 15, a Nova República completou 17 anos. Ninguém lembrou do seu aniversário. Também pudera, lembrar para que? No discurso que fez no dia 15 de janeiro de 1985, logo após a sua eleição pelo colégio eleitoral, Tancredo Neves disse que vinha "para realizar urgentes e corajosas mudanças políticas, sociais e econômicas, indispensáveis ao bem-estar do povo". Mais do que uma promessa, era um desejo. Tudo não passou de ilusão. Certos estavam Monteiro Lobato e Euclides da Cunha. Escreveram em uma outra conjuntura, é verdade. Mas, como no Brasil a história está petrificada, eles servem como brilhantes analistas. Para Lobato, o Brasil "permanece naquele eterno mutismo de peixe". E Euclides arremata: "Este país é organicamente inviável. Deu o que podia de dar: escravidão, alguns atos de heroísmo amalucado, uma república hilariante e por fim o que aí está: a bandalheira sistematizada". MARCO ANTONIO VILLA, 55, é historiador e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Folha SP

segunda-feira, 26 de março de 2012

A terceira revolução industrial

A terceira revolução industrial por Hans F. Sennholz, sábado, 24 de março de 2012 Economistas de vários países ocidentais, tanto desenvolvidos quanto em desenvolvimento, estão preocupados com a "ameaça" de perda de vários empregos no setor industrial em decorrência da avassaladora capacidade produtiva da China, da Índia e de outros países asiáticos, que exportam seus produtos a preços baixos, retirando assim competitividade da indústria nacional destes países ocidentais.  Muitos temem uma maciça transferência de empregos industriais para o Oriente, fazendo com que os ocidentais encontrem trabalho apenas no setor de serviços.  Já se fala em uma nova Revolução Industrial, a terceira desde o século XVIII, que irá transformar o comércio e a indústria, exigindo dolorosos ajustes internos. A primeira revolução trouxe drásticas mudanças para a Inglaterra e durou de meados do século XVIII até meados do século XIX.  Durante esta época, algumas invenções e inovações tecnológicas originaram o sistema industrial, e a população economicamente ativa, que até então trabalhava na agricultura, encontrou empregos mais bem remunerados na produção industrial.  A revolução se espalhou para a Europa Ocidental e para os Estados Unidos uma ou duas gerações depois.  Desde então, ele se espalhou para a maioria dos países do globo. Em suas vívidas descrições sobre os primórdios da industrialização, a maioria dos historiadores raramente faz alguma referência às mudanças políticas e ideológicas que de fato pavimentaram o caminho para a revolução.  Eles mostram alguma admiração pelas primeiras transformações ocorridas na indústria do algodão e aplaudem a indústria de ferro e aço, que se esforçou para atender à crescente demanda por todos os tipos de projeto de construção civil.  Porém, eles raramente mencionam os escritos dos economistas clássicos, de Adam Smith e de seus numerosos mestres e precursores, como Frances Hutcheson, David Hume, Josiah Tucker e vários outros.  Estes economistas clássicos escreveram numerosos ensaios sobre o comércio e a tributação, e apresentaram novas observações sobre os princípios básicos de uma ordem de mercado.  Eles foram bem sucedidos em persuadir seus governos a removerem restrições milenares e a permitirem que as pessoas buscassem livremente seus interesses econômicos. Os historiadores econômicos também falam de uma segunda Revolução Industrial que deixou sua marca no século XX e que agora está se difundindo com muita intensidade para as outras partes do mundo industrial, inclusive países em desenvolvimento.  Mais especificamente, eles estão se referindo à poderosa mudança ocorrida na base econômica destes países, que estão abandonando a indústria e indo em direção ao setor de serviços.  Por todo o velho mundo industrial, o número de empregos nas indústrias vem declinando lentamente ao passo que o número de empregos no setor de serviços vem aumentando continuamente.  Nos EUA, por exemplo, onde este fenômeno é mais evidente, apenas um sexto dos empregos não agrícolas está nas indústrias produtoras de bens, ao passo que cinco sextos estão no setor de serviços. [No Brasil, em 2011, a participação da indústria no PIB caiu para 14,6%, nível igual ao da década de 1950]. Muitos historiadores raramente, para não dizer nunca, mencionam a ordem de mercado que impeliu e facilitou esta mudança.  A proteção à propriedade privada dos meios de produção, o que estimulou o empreendedorismo e facilitou amplos investimentos em capital, elevaram a produtividade da mão-de-obra.  Menos trabalhadores se tornaram necessários para a produção de um mesmo volume de bens.  A oferta aumentou e os preços reais diminuíram.  Os salários reais subiram e o padrão de vida disparou, o que permitiu aos trabalhadores direcionar fatias cada vez maiores de sua renda para serviços como saúde, entretenimento e educação. Simultaneamente, legislações trabalhistas, encargos sociais onerosos e carga tributária crescente, tudo obra dos governos, aceleraram a expansão do setor de serviços.  Tais medidas possibilitaram e encorajaram os sindicatos do setor industrial a elevar os custos trabalhistas para acima de sua produtividade, o que gerou um fenômeno econômico até então atípico para este setor, que sempre demandou mão-de-obra em massa: o desemprego e a consequente debandada desta mão-de-obra desempregada para o setor de serviços, fenômeno este que vem se intensificando desde então.  O setor de serviços passou a funcionar como uma grande rede, legal e ilegal, que absorve a mão-de-obra dos outros setores e as direciona para usos produtivos. E agora uma terceira Revolução Industrial vem surgindo nos países mais ricos e industrializados.  E, assim como as duas primeiras, esta também está destinada a introduzir várias mudanças e forçar milhões de pessoas a fazerem ajustes dolorosos.  Trata-se de uma "revolução da informação", a qual expande enormemente o alcance dos serviços comercializáveis internacionalmente e tende a transferir mais empregos do setor de serviços para a Índia, a China e outros países em desenvolvimento recém-chegados aderidos à globalização, onde a mão-de-obra é muito mais barata.  Este movimento é implacável.  Se antes eram os empregos industriais que estavam saindo dos países onde os custos trabalhistas eram mais altos e indo para os países onde estes custos eram menores, agora, com a terceira revolução, a tendência é que um número cada vez maior de empregos no setor de serviços também seja exportado para países de custo de produção menor.  É claro que empregos que prestam serviços pessoais não podem ser exportados; meu barbeiro não pode ir para a China, nem o meu lava-jato, minha oficina e meu restaurante.  Porém, novas tecnologias tornaram vários empregos comercializáveis, os quais podem agora ir para qualquer lugar onde os custos trabalhistas sejam menores.  Os serviços de contadores e de programadores de computadores são apropriados para entrega eletrônica, o que significa que eles podem ser exportados.  Qualquer país cujo setor de serviços possua uma fatia significativa destes empregos e os custos da mão-de-obra sejam elevados certamente passará por dolorosas transformações num futuro próximo.  Só nos EUA, um recente estudo da McKinsey constatou que 11% dos empregos correm o risco de serem exportados para outros países, algo que certamente será uma grande preocupação política no futuro. Um mercado genuinamente livre, desobstruído de regulamentações, leis salariais e encargos sociais e trabalhistas, iria prontamente facilitar os reajustes necessários.  Sob a pressão da concorrência externa, com seus baixos custos, os salários tanto das indústrias quanto destes serviços comercializáveis internacionalmente iriam indubitavelmente ficar estagnados ou até mesmo cairiam, o que faria com que alguns trabalhadores destes setores se movessem para o mercado de serviços pessoais, o que iria pressionar para baixo os salários deste setor.  O programador de computadores pode ter de se tornar um técnico de computadores ou um reparador.  O ex-empregado da indústria pode ter de se tornar um mecânico ou um eletricista.  Ou até mesmo um barbeiro.  No entanto, sua renda real não necessariamente irá declinar, pois a maior oferta de bens e serviços importados, cujos custos agora são menores, tenderá a reduzir os preços.  Adicionalmente, enquanto a quantidade de capital investida no país continuar a subir em termos per capita, não haverá fatores concorrendo para uma queda em sua renda.  O setor de serviços pessoais pode se expandir tão rápido quanto, ou até mesmo mais rápido que, a contração do setor dos serviços impessoais e da indústria. Os políticos irão interferir no processo de reajustamento econômico?  Sem dúvida.  Todas as forças protecionistas, das mais arcaicas imagináveis, não apenas irão encontrar meios de limitar as importações, como também se esforçarão para obstruir o capital nacional investido no exterior. As forças da intervenção política, com o intuito de proteger e beneficiar a mão de obra nacional, irão apenas fazer com que haja uma elevação dos custos trabalhistas, o que invariavelmente gera ou desemprego ou estagnação salarial.  Afinal, cada centavo de custos trabalhistas que excede a produtividade da mão-de-obra está fadado a gerar desemprego ou estagnação salarial.  Os países com as mais fervorosas leis de proteção trabalhista, como os europeus, são aqueles que sempre apresentaram taxas de desemprego acima dos 10%.  Nos anos vindouros, a terceira revolução industrial irá exigir vários e dolorosos ajustes.  As taxas de desemprego e de estagnação econômica tenderão a ser proporcionais aos poderes políticos que exercerão a resistência e o controle da economia. O processo de mudança industrial e de ajuste da mão-de-obra se torna ainda mais complexo e doloroso em decorrência de um outro fator político: a propensão dos atuais governos a apresentarem seguidos e altos déficits orçamentários, os quais, para serem financiados, consomem a maior parte da poupança das pessoas.  Todos os principais governos da atualidade, com seus gastos e déficits crescentes, estão consumindo recursos do setor privado que de outra forma poderiam estar sendo investidos e, com isso, criando empregos e pagando salários maiores.  Caso realmente quisessem evitar a perda de empregos em determinados setores para os concorrentes estrangeiros, a redução de gastos, déficits e impostos já permitiria um sensível aumento na acumulação de capital, o que traria maior competitividade a empresas e setores da economia. Déficits e endividamentos sempre representam o pior tipo de pobreza.  Quanto mais altos, maiores serão os gastos dos governos apenas para financiá-los.  A terceira Revolução Industrial poderá confirmar este fato nos anos e décadas vindouros. Hans F. Sennholz  (1922-2007) foi o primeiro aluno Ph.D de Mises nos Estados Unidos.  Ele lecionou economia no Grove City College, de 1956 a 1992, tendo sido contratado assim que chegou.  Após ter se aposentado, tornou-se presidente da Foundation for Economic Education, 1992-1997.  Foi um scholar adjunto do Mises Institute e, em outubro de 2004, ganhou prêmio Gary G. Schlarbaum por sua defesa vitalícia da liberdade. Tradução de Leandro Augusto Gomes Roque

Desindustrialização ou lobby?

João Luiz Mauad, O GLOBO Alguém já disse: torture os números e eles confessarão qualquer coisa. De fato, as estatísticas são, hoje em dia, as grandes aliadas dos mistificadores, que as utilizam de forma indiscriminada para dar aparencia científica às falácias e mentiras em prol de suas causas. Você pode desenvolver rígida argumentação lógica a respeito de um assunto sem convencer muita gente, mas basta acrescentar alguns números, tabelas e gráficos para respaldá-la e as pessoas passam a olhar os seus argumentos com outros olhos. Um exemplo gritante disso apareceu no jornal Folha de São Paulo, de 09 de março. Nesse dia, uma matéria naquele diário informava - sob o título “Participação da indústria no PIB recua aos anos JK” - que “a participação da indústria no PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro recuou aos níveis de 1956, quando a indústria respondeu por 13,8% do PIB. De lá para cá, a indústria se diversificou, mas seu peso relativo diminuiu. O auge da contribuição da indústria para a geração de riquezas no país ocorreu em 1985: 27,2% do PIB. Desde então, tem caído.” Malgrado o título bombástico, até aqui a matéria é meramente informativa e apenas noticia um fato que as estatísticas a respeito desvendam. Seu uso oportunista só fica claro a partir do ponto em que se começa a apontar eventuais causas para um suposto problema. Assim, depois da introdução, entra em cena o senhor Paulo Skaf, que vem a ser o presidente da FIESP. Eis o que diz o valente: “Temos energia cara, spreads bancários dos maiores do mundo, câmbio valorizado, custo tributário enorme e uma importação maciça. A queda da indústria no PIB é a prova do processo de desindustrialização”. Exceto pelo exagero de afirmar que há no Brasil - um dos países mais protecionistas do mundo - volumes de importação maciços, quase tudo o que ele diz, fora a conclusão, é a mais pura verdade. O problema é que temos ali várias verdades sendo ditas com o propósito de retirar delas conclusões absolutamente falsas. Primeiro, a maioria dos entraves listados por Skaf, além de outros tantos integrantes daquilo que se convencionou chamar de “custo Brasil, não prejudicam somente a indústria, mas todos os setores da economia. Segundo, se a queda da participação relativa do setor manufatureiro no PIB é prova da famigerada desindustrialização, então o que temos hoje é uma desindustrialização mundial. De acordo com dados compilados pelas Nações Unidas, a queda da participação do setor de manufaturas no PIB é um fenômeno global, a exemplo do que já ocorrera anteriormente com a agricultura. Assim, de 1970 a 2010 esta queda foi de 24,5% para 13,5% no Brasil, de 22% para 13% nos EUA, de 19% para 10,5% no Canadá, de 31,5% para 18,7% na Alemanha e de 27% para 16% no mundo inteiro. A causa dessa queda generalizada não está, evidentemente, numa suposta desindustrialização, mas no aumento da participação de outros setores, antes irrisórios, como serviços em geral, comércio, finanças, saúde, educação, ciência e tecnologia, etc. A verdade é que a produção total da indústria no mundo, se não está no seu pico está muito perto dele. Já a produção industrial brasileira é certamente muito maior hoje, em termos absolutos, do que era em 1985, ano em que, segundo a matéria, o setor manufatureiro alcançou a sua maior participação relativa no PIB. Desindustrialização e Doença Holandesa são duas expressões caras aos lobbistas da indústria local. Uma rápida pesquisa com essas palavras no Google mostra diversos estudos e trabalhos “científicos” a respeito, repletos de gráficos e tabelas, a maioria deles patrocinada por entidades como FIESP, CNI e congêneres. Esse é também um importante nicho do pensamento nacionalista e intervencionista, utilizado amiúde para defender interesses, vantagens e privilégios diversos junto ao governo. Os pleitos desse pessoal não costumam variar muito. Seus alvos prioritários são as ditas políticas industriais (geralmente baseadas em subsídios e isenções fiscais) e protecionistas, leia-se: controles cambiais e barreiras alfandegárias / tarifárias. O argumento aparente é quase sempre a criação e manutenção de empregos domésticos, mas a real intenção é a transferência de renda de consumidores para produtores ineficientes. Para que a estratégia seja 100% eficaz, a manipulação da opinião pública e o consequente respaldo político são essenciais, é claro.

domingo, 25 de março de 2012

Os "contra" da Ufsc

Os "contra" da Ufsc 25 de março de 2012 0              Florianópolis está comemorando 286 anos com duas posições da Universidade Federal de Santa Catarina contrários a dois projetos públicos:  o primeiro, negando-se a ceder pequena área para duplicação da Rua Antônio Edu Vieira, projeto que tem mais de nove anos;  o segundo, com seu Departamento de Arquitetura mobilizando-se contra o Parque da Ponta do Coral.             A área da Ponta do Coral é privada.  Foi comprada pelo falecido empresário Realdo Guglielmi há 30 anos. Os herdeiros se associaram ao grupo Hantei para ali implantar um novo complexo hoteleiro com marina e múltiplos espaços públicos para uso comunitário.   O hotel ficará na área privada.  A área a ser aterrada será totalmente destinada ao público. Para uso da população, o parque contará com nove praças públicas, centro de eventos e convenções, anfiteatro, concha acústica, restaurantes, cafés, mirantes, lojas, ciclovias e amplo estacionamento. Todos com paisagismo na área a ser aterrada.   De acordo com os empreendedores, vai criar 1.500 novos postos de trabalho e incrementar a receita do município em R$  25 milhões por ano.            Há 30 anos aquela área serve de palco para  traficantes, craqueiros e desocupados.   A comunidade tem ali zero de desfrute.   E, ao invés de se inteirar do projeto, colaborando para seu aprimoramento, propondo inovações para maiores benefícios ao público, dando sua contribuição à cidade, o que faz a Ufsc?  Campanha contra.            Mas o Departamento de Arquitetura, por seus conceituados arquitetos e estudantes, não move uma única palha para humanizar, florir e embelezar o coração do “campus”  ou os espaços externos do Hospital Universitário.   Bons tempos aqueles de décadas passadas em que a Ufsc só trabalhava pela população de Florianópolis.            Duplicação            A polêmica sobre a duplicação da rodovia Antônio Edu Vieira, que liga o “campus” ao Saco dos Limões, é outra prova deste isolamento. O Conselho Universitário negou a liberação da área. Alega que o projeto está incompleto. Levou nove anos para fazer esta constatação. O primeiro estudo data da gestão Diomário Queirós.  E precisou mais de um ano e cinco meses para dar parecer. O projeto da prefeitura deu entrada no segundo semestre de 2010.             A recusa foi formalizada em sessão do Conselho Universitário que acolheu parecer do acadêmico de História, Sérgio Luiz Schlatter.          -  Ele é filiado ao P-Sol e pré-candidato a Câmara Municipal – acusa o vice-prefeito João Batista Nunes(PSDB), revoltado com a recusa da Ufsc.         Schlatter realmente é do P-Sol e candidato. Foi um dos cabos eleitorais da futura reitora  Roselane Neckel, que também deu voto contra.   E liderou a invasão da Reitoria, quando o hall foi transformado num acampamento, com meias sujas misturadas com material escolar, tênis e até roupas íntimas.              Ele nega contaminação partidária no veto.  Diz que o projeto não serve, não vai resolver a falta de mobilidade na região, que a comunidade é contra e que a rejeição deu-se por esmagadora maioria.   O vice-prefeito diz que Schlatter e o relator, professor Juarez Nascimento, deram prazo de seis meses por razões eleitoreiras.  Querem  impedir o lançamento do edital e da ordem de serviço antes da eleição.          A versão corrente no “campus” e na Prefeitura sustenta  que o processo foi totalmente politizado.  Se procedente, pobre da Ufsc.  Afinal, numa universidade, quando os partidos políticos entram pela porta, a autonomia, a liberdade e a pluralidade desaparecem pela janela. Postado por Moacir Pereira, às 9:43

Ética de mercado

Ética de mercado Rodrigo Constantino, revista VOTO Uma reportagem do “Fantástico” na Rede Globo gerou indignação em muitos brasileiros, cansados das cenas constantes de corrupção que vem à tona sem surtir o efeito desejado. Nas imagens chocantes, ainda que o fato em si seja de conhecimento geral, representantes de empresas privadas fornecedoras de produtos para um hospital público conversavam tranquilamente sobre as propinas envolvidas no negócio. A certa altura, um dos envolvidos repete que esta é a “ética de mercado”, querendo dizer que este tipo de esquema é o normal. A deixa foi aproveitada pelos governantes. O foco voltou-se totalmente para os corruptores. Falou-se em CPI, em investigação das empresas privadas envolvidas, em cancelar os contratos. Ou seja, ataca-se os sintomas do problema, preservando intactas as verdadeiras causas da enorme corrupção que campeia no país. E quais seriam então estas causas? Em primeiro lugar, no topo da lista, a impunidade. Não basta mostrar imagens que embrulham o estômago dos brasileiros decentes, se estes sabem que nada de concreto vai acontecer com os culpados. Após tantos escândalos de corrupção e nenhum peixe graúdo atrás das grades, fica difícil manter a confiança na justiça. Vale lembrar que nem o “mensalão” foi julgado ainda. Um país com tanta impunidade destroça seu tecido social, as pessoas perdem a esperança e o incentivo para serem corretas. O jeitinho compensa, a honestidade é punida. Mas acabar com a impunidade, ainda que necessário, não é suficiente. Mesmo um país com severas punições vai se ver diante de diversos casos de corrupção quando o governo concentra poder e recurso em demasia. A explicação é simples: o dinheiro é da “viúva”, e faz parte da gestão pública um desleixo maior na administração dos recursos. É da natureza humana cuidar melhor daquilo que se tem a propriedade. Ninguém apresenta o mesmo esmero ao cuidar de um carro alugado em comparação aos cuidados com o próprio carro. E funcionários públicos administram fortunas de titularidade alheia. Um convite e tanto à corrupção. O sujeito negocia contratos bilionários, sem o escrutínio de sócios privados preocupados com o uso de seus recursos, e sem um mecanismo adequado de incentivos à sua eficiência. Ou seja, ele não é premiado por competência como ocorre no setor privado, tampouco é punido da mesma forma quando se mostra pouco produtivo. No setor público, de forma geral, há um estímulo às trocas de “favores”, não de produtos e serviços eficientes em busca de maior lucratividade. Depender somente do altruísmo e da honestidade do funcionário que concentra tanto poder é um risco enorme. Qualquer um minimamente informado tem consciência disso, bastando pensar nos esquemas de licitação para obras públicas. Uma maior transparência pode ajudar, mas não resolve. As somas envolvidas e a natureza do governo fazem com que a corrupção seja tentadora demais. Por isso o desvio do foco para o corruptor é um erro, que agrada justamente àqueles interessados em manter o status quo. Não que o corruptor deva ser poupado. Ao contrário: é preciso puni-lo com rigor, mas ciente de que isso não vai resolver o problema, não vai atacar suas raízes. As empresas X, Y e Z sairão de cena, apenas para dar lugar às empresas A, B e C. E a propina continuará existindo, assim como o superfaturamento das obras e outras formas de se desviar recursos públicos. A ética do mercado, portanto, não tem nada a ver com o escândalo mostrado pelo “Fantástico”. É justamente o oposto: a verdadeira ética do mercado é premiar a meritocracia, a competência, fazendo com que os melhores e mais eficientes no atendimento da demanda fiquem com os lucros justos, as recompensas legítimas das trocas voluntárias entre consumidores e produtores. A fortuna que Steve Jobs criou ao oferecer ao mundo os desejados produtos da Apple, eis um bom exemplo da “ética de mercado”. A livre concorrência garantindo que os mais aptos a satisfazer as demandas possam enriquecer de maneira honesta. Quando entendemos isso, fica claro que empresas subornando funcionários públicos para furar a livre concorrência não apresentam semelhança alguma com esta ética descrita acima, uma ética capitalista ou de mercado, na falta de termo melhor. Enquanto o governo for o dono de um cartão de débito que lhe dá o direito de gastar 40% de tudo aquilo que é produzido no país, corruptores vão voar em torno dos funcionários públicos como moscas em volta de mel. A hipertrofia do governo é um convite irresistível aos parasitas de plantão, que disputam as infindáveis tetas estatais não por meio da ética de mercado, mas sim através das tentadoras propinas. Resumindo, enquanto os brasileiros não voltarem sua atenção e energia para o cerne da questão, cenas abjetas como aquelas mostradas na TV serão parte de nosso cotidiano. A impunidade deve ser o primeiro alvo, sem dúvida. Tolerância zero com corruptos e corruptores. Mas é preciso mais. É preciso reduzir o poder e a quantidade de recursos que trafega pelo governo.

sábado, 24 de março de 2012

Show de realidade Nelson Motta O Globo - 23/03/2012   Seguindo a atual preferência popular na televisão, foi um show de realidade, muito melhor do que qualquer Big Brother. O repórter do Fantástico se passa por gestor de saúde e detona quatro quadrilhas disfarçadas de empresas fornecedoras de hospitais públicos que subornavam funcionários, fraudavam licitações e inflavam preços para roubar o contribuinte. A mise-en-scène é moderna, mas os métodos são antigos e se espalham como um câncer nas administrações, só mudam os nomes dos malfeitores e dos partidos no poder, que não por acaso são sempre beneficiários de generosas contribuições das quadrilhas. Vai ser assim enquanto pessoas jurídicas - que não votam - puderem participar de campanhas eleitorais. Os ramos de atividade são clássicos da gatunagem: coleta de lixo (esse pessoal ama o lixo, como negócio e metáfora), quentinhas de presídios (são os melhores clientes, não reclamam nunca ), aluguel e manutenção de carros (em um ano recuperam o preço do veiculo). Roubar de hospitais, de crianças doentes, é repugnante, mas nada mais surpreende num país que já viu desbaratadas quadrilhas de funcionários, políticos e empresários que roubavam sangue, remédios para câncer e merenda escolar. Roubam de crianças, presos e doentes, e, num eufemismo delubiano, chamam de "ética do mercado". No Brasil Maravilha da propaganda oficial, é um show de realidade: com o país mais rico, rouba-se mais. Mas este não é só mais um dos incontáveis episódios de suborno de gestores e roubo de dinheiro público, é um arquétipo documentado, um padrão que deveria ser estudado como um modelo, porque que se reproduz de forma sistêmica em todo o Brasil, com a administração pública dominada - como nunca na história deste país - pelos interesses dos políticos e dos partidos. Como é incontestável que a maior parte dos nossos representantes federais, estaduais e municipais é de baixo nível ético, como esperar que os ruins façam boas indicações ? Você confiaria em alguém indicado por Sarney, Renan ou Jucá ? O castigo extra para os quadrilheiros cariocas vai ser comer a gororoba de preso que eles superfaturavam.
Sexta-feira, Março 23, 2012 A redução do desemprego - Luiz Carlos Mendonça de Barros FOLHA DE SP - 23/03/12 Apesar dos níveis baixos do desemprego, país não assiste a um aumento descontrolado de salários  A TAXA de desocupação no Brasil voltou a cair em fevereiro. Feitas as correções sazonais, ela chegou a 5,6% da população ativa, um novo recorde de baixa na série do IBGE. Esse número surpreendeu o economista Fabio Ramos, da Quest, que acompanha em detalhe o mercado de trabalho no Brasil. Nas suas palavras, "veio um novo piso. Ceder de 10% para 8% não foi difícil. E foi rápido, cerca de 1% a 2% de queda por ano. Mas esperávamos que a desocupação ficasse estável quando chegasse a 6% da população ativa. Mas continua cedendo, agora na velocidade de 0,5% ao ano". Ele refaz agora suas previsões: "Ainda em 2012, o crescimento do emprego pelo Caged vai igualar o número de brasileiros que chegam ao mercado de trabalho e, nesse momento, o desemprego vai se estabilizar". Apesar dos riscos, termina seu comentário dizendo que "não cederá dos 5,5%!". Vida de analista de economia -no Brasil e no mundo- é assim mesmo: surpresas constantes e coragem para recalibrar suas previsões. Mas vou continuar a trazer as observações do Fabio. No relatório que elaborou a partir dos dados do IBGE divulgados ontem, ele destaca ainda os seguintes pontos. A redução do desemprego veio quase que exclusivamente pelo lado dos serviços. A indústria patina e, se não for revertido o quadro, vai começar a desempregar. Mas, apesar dos níveis baixos do desemprego, não estamos assistindo a um aumento descontrolado de salários. Eles crescem a uma taxa anual real da ordem de 3,5%, que é alta, se não houver ganhos de produtividade da mesma magnitude. No caso da indústria, as importações de produtos intermediários têm minimizado esse aumento de custos do trabalho. Por isso a taxa de câmbio é uma âncora fundamental para manter a inflação dentro da banda do Banco Central. Já no setor de serviços, em que os aumentos salariais são superiores à média, o aumento de preços tem sido o caminho escolhido pelas empresas para manter suas margens de lucros. Não por outra razão a inflação para esses produtos tem corrido próxima a 9% ao ano. Como a geração de novos empregos está crescendo 2,5% ao ano nos últimos meses, a massa total de salários na economia cresce acima de 6% ao ano. Com o crédito bancário ainda em expansão -embora a taxas bem mais reduzidas- e a voracidade do brasileiro pelas compras, o consumo das famílias vai sustentar expansão de pelo menos 3,5% para o PIB. Mas volto a lembrar que, para chegarmos a um crescimento médio da ordem de 3,5% neste ano, será preciso que, no fim do ano, a economia se expanda a taxas superiores a 5,5% ao ano. Por isso seria de muito bom-senso o governo moderar seus estímulos à economia, como escrevi na minha coluna anterior. Para ter uma visão sobre a velocidade de retomada da atividade via consumo, listo abaixo as taxas anuais de aumento do salário real nos meses a partir de setembro do ano passado: -0,4%, -0,7%, -0,4%, +0,8%, +0,7%, +0,9%. Essa brusca variação no salário real nesse período está associada à inflação de 2011 acima de 6,5% ao ano e à deste início de 2012, próxima a 4% ao ano. Mas, ao longo dos próximos meses, uma inflação mais elevada vai reduzir os ganhos reais dos salários, com a média do ano convergindo para os 3,5% citados acima. Finalmente, gostaria de comentar os riscos e os efeitos positivos associados a uma taxa de desemprego tão baixa e à baixa qualificação profissional dos brasileiros que estão no grupo dos "sem ocupação". Os riscos são claramente ligados a aumentos salariais acima dos ganhos de produtividade das empresas e a pressões de custo que se seguem. Do lado positivo, gosto de mencionar o fato de que -pela primeira vez em muito tempo- as empresas estão sendo obrigadas a oferecer a seus funcionários e a terceiros cursos de especialização profissional. Essa mudança de comportamento pode acelerar a melhoria da qualificação profissional do brasileiro sem depender do governo, que sempre se mostrou lento e ineficiente

segunda-feira, 19 de março de 2012

Vinhos de SC: o milagre da qualidade

Vinhos de SC: o milagre da qualidade 18 de março de 2012 Há apenas treze anos, uma experiência inovadora acontecia em São Joaquim, até então, município conhecido como “terra da neve e da maçã” e de “gente hospitaleira”. Nascia a “Quinta da Neve”, do jornalista Acari Amorim. A ideia ganhou corpo e hoje já tem prêmios nacionais de qualidade com o disputado Pinot Noir. Hoje, Santa Catarina conta com 35 empreendimentos de vinhos de altitude, distribuídos nas regiões de São Joaquim, Campos Novos, Videira e Caçador. Os vinhedos ocupam 500 hectares e produzem 2 milhões de litros de vinho. Neste fim de semana está acontecendo a abertura da vindima, em Pericó, na Quinta Santa Maria, do empresário português Nazário Santos e sócios paulistas. Na próxima sexta-feira, em Videira, será lançada a “Revista Catarinense do Vinho”, iniciativa da Vinícola Pancieri. Em abril, 12 vinícolas de Santa Catarina estarão participando em São Paulo, da Expovine, a maior feira de vinhos da América Latina. A conhecida revista “Prazeres da Mesa” destacou 27 vinhos catarinenses na lista dos 100 melhores vinhos produzidos no Brasil. Premiou: Sanjo, Casa Pisani, Panceri, Kranz, Quinta da Neve, Villaggio Grando, Suzin, Pericó, Monte Agudo, Villa Francioni, Santo Emílio, Santa Augusta, Quinta Santa Maria, Abreu & Garcia, Villaggio Bassetti e Barão de Demétria. Para estes empreendimentos - e de tantos outros que não estão na seleta relação – há ricos relatos sobre pesquisas, testes, cuidados no plantio das uvas, a dedicação às colheitas, atenção nas etapas de produção. Muitas destas vinícolas contam com instalações belíssimas, humanizadas, ajardinadas, artísticas, construídas com capricho. Há vinhedos com cenários deslumbrantes. Um processo que – mais uma vez – teve a participação da Epagri, a empresa estadual de pesquisa. E as impressões digitais do enólogo Jean Pierre Rosier, Chefe do Laboratório Experimental de Videira. Arrojo Anos atrás conheci por acaso o milionário português Joe Berardo. Vinha de uma visita a São Joaquim, acompanhado de dois empresários e reunia-se no Hotel Majestic com a empresária Daniela Freitas. Foi-me apresentado como o maior colecionador de arte contemporânea de Portugal. Relatou-me, encantado, o que viu em São Joaquim e as novas potencialidades da serra. Mais surpreso, ainda, com a Vinícola Francioni, empreendimento de alto padrão, construído com sensibilidade artística e moderna tecnologia. Homem do mundo, confessou não ter visto nada igual lá fora. Homenageou o idealizador da Francioni, o saudoso Manoel Dilor de Freitas: “Ele era mais louco do que eu. Aqui não se construiu por dinheiro. Foi tudo concebido com amor, feito com paixão de quem conhece a arte do vinho”. A elevação do nível do vinho catarinense nestes últimos anos tem sido realmente um espanto. Começa na beleza dos rótulos, passa pelo perfil e a cor das garrafas, ganha força pelo aroma e, sobretudo, pelo paladar que garante premiações surpreendentes. E, mais uma vez, reeditando a criatividade, o zelo e o arrojo do empresário catarinense, que escolheu as melhores cepas, cuidou os vinhedos com carinho, equipou as vinícolas com alta tecnologia e adotou modernos métodos de produção. Assim, concorrendo com países de tradição milenar na Europa e nações latino-americanas que há séculos dedicam-se à atividade, empresários, técnicos e trabalhadores estão realizando um verdadeiro milagre em apenas uma década. O milagre dos premiados e saborosos vinhos de altitude. Postado por Moacir Pereira

domingo, 18 de março de 2012

Nunhum imposto é neutro; qualquer imposto sempre afetará os mais pobres

Nenhum imposto é neutro; qualquer imposto sempre afetará os mais pobres por D.W. MacKenzie, quinta-feira, 17 de novembro de 2011 Em praticamente todos os países do mundo há um constante apelo para se tributar mais a renda dos mais ricos e utilizar essa receita adicional para fazer a "justiça social", promovendo uma ampla "distribuição de renda". O problema de se tributar os ricos, bem como todas as consequências econômicas negativas deste fato, já foram muito bem explicitadas neste artigo, de modo que o objetivo aqui será outro. O objetivo será explicar por que qualquer tipo de imposto, mesmo aquele voltado exclusivamente para as rendas mais altas, sempre acabará inevitavelmente sendo repassado aos mais pobres, de um jeito ou de outro. Em todo o debate ideológico acerca do capitalismo, há duas visões opostas que curiosamente partem do mesmo princípio: tanto os detratores do capitalismo quanto seus defensores dizem se tratar de um sistema puramente individualista, em que cada um age por conta própria, pensando exclusivamente no seu bem. Seus detratores condenam essa exortação à independência; já os defensores glorificam-na. Porém, nenhum dessas posições parece apreciar a verdadeira natureza do capitalismo, e o problema é que ambas essas concepções erradas estão hoje bastante difundidas. Há de fato um aspecto em que as pessoas realmente tentam ser as mais independentes possíveis: elas querem evitar pagar impostos. Todas as discussões a respeito de carga tributária e a respeito de quem — isto é, qual classe social — deve arcar com a maior parte do fardo tributário demonstram um total desconhecimento sobre como o mercado funciona. A esquerda sempre defendeu que os ricos sejam mais tributados, para que eles deem sua "contribuição justa" à sociedade. Já a direita costuma reagir dizendo que os mais ricos — tanto os indivíduos quanto as empresas — já respondem pela maior parte da receita tributária do governo, que a camada mais rica da população paga o mesmo volume de impostos que todo o restante da população combinada, e que boa parte da população não paga nada de imposto de renda. A esquerda então reage dizendo que a desigualdade permanece constante ou, em alguns casos, segue aumentando. Os ricos estão ficando mais ricos, e isso supostamente é ruim, pois precisamos de maior igualdade para atingir a justiça social. E por aí vai. Não irei aqui entrar na (i)moralidade de se defender a espoliação da propriedade alheia; o enfoque será puramente econômico. O problema em todo esse debate popular sobre impostos é que ele não leva em conta que os esforços para se evitar o pagamento de impostos vão muito além dessa pendenga sobre quais seriam as alíquotas de impostos "justas" e sobre quem deve pagar mais. Os esforços para se evitar o pagamento de impostos se estendem para todo o mercado. Se, por exemplo, a alíquota do imposto de renda que incide sobre as rendas mais altas fosse elevada em 20%, os trabalhadores de renda mais alta reagiriam a isso negociando um aumento salarial. (Dado que a esquerda quer muita gente pagando mais imposto, então creio ser correto dizer que ela defende maior imposto justamente sobre pessoas mais produtivas; caso contrário, seria na prática impossível elevar impostos permanentemente. Logo, por se tratar de pessoas produtivas, não é incorreto dizer que elas têm poder de barganha junto a seus empregadores). Se essas pessoas conseguirem um aumento salarial de, por exemplo, 10%, isso significa que praticamente metade do aumento de 20% da carga tributária foi repassada aos seus empregadores. Essa maior alíquota do imposto de renda reduziu os salários líquidos; o consequente aumento nos salários elevou os salários brutos. Neste ponto, a exata divisão do fardo tributário entre empregados e empregadores vai depender do relativo poder de barganha entre eles no mercado de trabalho. O que interessa é que os empregados de maior renda irão repassar uma parte, se não a maior parte, de qualquer aumento em seu imposto de renda para seus empregadores. Consequentemente, estes empregadores irão contratar menos empregados — ou tentarão contratar oferecendo salários bem menores, algo difícil —, e irão tentar repassar esse aumento havido nos custos trabalhistas para os consumidores, na forma de preços maiores. Esse aumento, no entanto, vai depender do relativo poder de barganha entre o vendedor e seus clientes, bem como do nível de concorrência no mercado. Os empresários irão repassar estes maiores custos aos consumidores até o ponto em que possam elevar preços sem sofrer uma relativamente grande perda no volume de vendas. Desta forma, os consumidores que ainda continuarem comprando a estes preços maiores estarão pagando parte do aumento na carga tributária que supostamente deveria afetar apenas os "ricos". Logo, vê-se que a direita está errada ao alegar que os mais pobres não pagam imposto de renda. Além de absolutamente toda a população pagar os impostos indiretos que estão embutidos nos preços dos bens e serviços, a classe média e os pobres também acabam pagando parte daquele aumento do imposto de renda que visava a atacar apenas os ricos. A esquerda, por sua vez, também está errada ao crer que todo o fardo de uma elevação de impostos pode ser confinada exclusivamente aos "ricos". A classe média e os pobres sempre acabarão pagando por um aumento de impostos sobre os ricos através dos maiores preços dos bens e serviços. Qualquer aumento no imposto de renda da camada mais rica da população — seja o 1% mais rico ou os 5% mais ricos — irá acabar por elevar os impostos que toda a população paga indiretamente. É possível contra-argumentar dizendo que o repasse para os preços desse aumento no imposto de renda seria muito pequeno. Talvez apenas uma pequena porcentagem da elevação do imposto de renda, o qual foi repassado aos empregadores, seria repassada aos consumidores na forma de preços maiores. No entanto, caso isso ocorra, o efeito de longo prazo será ainda pior. Se os empregadores tiverem de arcar com uma elevação marginal dos custos trabalhistas sem uma correspondente elevação marginal de sua receita, suas margens de lucro diminuirão. Redução nos lucros significa menos investimentos. E menos investimentos inibem um maior crescimento econômico. Um menor crescimento econômico significa menores aumentos nos salários e na renda de toda a população. Os efeitos dos impostos sobre o crescimento econômico, portanto, são bem mais indiretos do que se imagina. Economias de mercado são sistemas complexos nos quais os interesses de todos os indivíduos estão entrelaçados. Qualquer esforço para alterar os resultados gerados pela livre concorrência no mercado irá gerar consequências inesperadas e indesejadas. O conceito de justiça social é, por si só, algo indefinido e arbitrário. No entanto, mesmo se todos nós de alguma forma concordássemos com uma ideia de redistribuição "socialmente justa", simplesmente não haveria como estruturar a carga tributária (ou os gastos do governo) de maneira a alcançar este objetivo. A imposição de novos impostos altera preços e salários de maneiras impossíveis de serem previstas e difíceis de serem mensuradas mesmo após o fato já consumado. Esquerda e direita parecem ter definitivamente abraçado o mito de que o estado é perfeitamente capaz de restringir os efeitos da tributação a apenas uma determinada classe de pessoas. Embora não seja possível mensurar qual é realmente a verdadeira carga tributária que incide sobre cada pessoa, é perfeitamente possível entender que a real carga tributária é significativamente distinta daquela que havia sido planejada. Pessoas de alta renda não pagam tanto quanto as alíquotas oficiais sugerem. O mercado difunde o fardo tributário de uma maneira bem mais equitativa do que as pessoas imaginam. Tentativas de "fazer os ricos pagarem sua fatia justa" irá apenas aumentar o fardo tributário mutuamente compartilhado por todos, por meio de uma maior tributação indireta e oculta. Por outro lado, os benefícios de reduções de impostos são também mais amplamente compartilhados do que as pessoas imaginam. Há duas lições a serem tiradas disso tudo. A primeira é que nenhum de nós é realmente "independente" e está genuinamente "por conta própria", pois a economia de mercado é um sistema social. A segunda é que políticos não são capazes de utilizar impostos para alcançar objetivos específicos como uma "renda justa", pois a economia de mercado é extraordinariamente complexa e ajustável. E os políticos são qualquer coisa, menos oniscientes. Uma autoridade onisciente e onipotente até poderia impor alguma noção de justiça social; no entanto, a nossa realidade é que a justiça social é algo arbitrário e não exequível na prática. Estas duas lições possuem implicações profundas e extremamente importantes. Felizmente, há uma solução fácil para o problema da carga tributária. Dado que os benefícios do corte de impostos são também difundidos entre todos, qualquer corte no orçamento do governo que possibilite redução de impostos já seria um enorme "avanço social". Todos nós pagamos impostos desnecessariamente altos. Todos nós podemos pagar muito menos.

Cidades insustentáveis

Cidades insustentáveis Rodrigo Constantino A reportagem de capa do jornal O GLOBO neste domingo mostra que mais de 80% das cidades do país não se sustentam. O estudo, feito pela Firjan, aponta que nada menos que 4.372 prefeituras do país dependem de repasses federais e estaduais para sobreviver. Diz Guilherme Mercês, gerente de Estudos Econômicos da Firjan: "Se fossem uma empresa, seriam como uma filial falida da matriz". Sou ferrenho defensor do princípio de subsidiariedade. Ou seja, tudo aquilo que pode ser feito pelo indivíduo e sua família, assim deve ser feito. O que não for possível, deve ser feito pelo bairro. Em seguida, pelo município. Depois, pelo estado. E somente aquelas coisas impossíveis de serem realizadas por tais esferas é que ficaria sob o controle federal. Como o professor Og Leme, do Instituto Liberal, escreveu: "O próprio princípio da subsidiariedade, levado às suas últimas consequências, justificaria também à atribuição aos municípios, em caráter exclusivo, do poder de tributar. Se de fato os estados federados têm razão de existir - e penso que têm devido a economias de escala e benefícios decorrentes da coordenação - eles poderiam auferir renda pela venda de serviços aos municípios de sua jurisdição." O que vemos no Brasil, naturalmente, é o extremo oposto. A União arrecada o grosso dos impostos, e depois concentra o poder de distribuir entre estados e municípios. Segundo a própria reportagem, de 60% a 65% de toda a receita arrecadada no Brasil hoje são da União. Algo entre 20% e 25% pertence aos estados, e apenas de 17% a 19% fica com os municípios. Com esta pirâmide toda invertida, do ponto de vista da subsidiariedade, todos são reféns do governo federal. E vários municípios que jamais deveriam existir, pois não possuem a menor condição de se bancar por conta própria, acabam criados para viver de transferências da União. Em alguns casos, mais de 70% da receita desses municípios vai para o pagamento de pessoal. E como a grande maioria dos municípios com pior gestão fiscal está no nordeste, eis o que isso significa na prática: os impostos do sul e sudeste servem para sustentar funcionários públicos de municípios totalmente falidos no nordeste. A situação absurda se perpetua porque o poder dos coronéis nordestinos é desproporcional, uma vez que para eleger deputados e senadores, que desfrutam do mesmo poder, basta uma fração dos votos necessários para eleger deputados e senadores no sul e sudeste. E ainda querem criar mais estados no norte e nordeste! É esse o modelo de nossa República Federativa do Brasil! Ou seja, de federalismo mesmo não tem nada! Até quando vamos suportar esta situação? Os liberais pregam a descentralização do poder, e é legítimo delegar aos municípios muito mais em termos relativos ao que se faz hoje, até para esvaziar bastante o gigantesco poder concentrado em Brasília. Mas para tanto é preciso que cada município possa se sustentar por conta própria, sem mesada da União. Talvez o voto distrital seja o caminho para seguirmos nesta direção. Neste caso sim, podemos afirmar sem muito medo de errar: Pior que está, não fica!

Bons ventos

Bons ventos: Por: Merval pereira Mesmo que por inércia, o Brasil provavelmente chegará à elite do capitalismo global, mas ainda não se trata de uma certeza. Este pode ser o resumo da atualização de cenários prospectivos sobre o Brasil que a empresa de consultoria Macroplan faz de tempos em tempos, sempre com uma alta dose de acertos, e que costumo registrar aqui na coluna. A recorrência da questão “o Brasil tem jeito?” – que motivou uma série de livros da editora Zahar para debater as perspectivas do país, da qual fiz parte em 2006 - entre pensadores dedicados à análise de nossas possibilidades futuras e à investigação da causa dos entraves nacional, é a constatação de algo preocupante para o economista Claudio Porto, presidente da Macroplan: a evidência de que está aberta uma janela de oportunidades sem precedentes para o Brasil - e que pode determinar o desenvolvimento futuro do país - e, ao mesmo tempo, a dúvida quanto ao pleno aproveitamento deste momento histórico. No ano passado, os economistas Claudio Porto e Fábio Giambiaggi, do BNDES, organizaram o livro “2022: Propostas para um Brasil melhor no ano do Bicentenário”, que reuniu análises de 31 autores sobre o futuro do país. O livro parte das evidências históricas que comprovam que o Brasil atravessou vários momentos de crises e dificuldades, mas sempre em processo de acumulação de melhorias, para concluir que o país vive o seu melhor momento econômico em três décadas. Cenários econômicos possíveis para a próxima década foram apresentados no livro, desde os que registram um crescimento sustentado entre 4% e 5,5% ao ano, um sintomaticamente denominado “Capitalismo Chinês à Brasileira”, no qual a economia global oferece amplas possibilidades para países emergentes mais bem posicionados, até o que prevê um choque ortodoxo de capitalismo, improvável do ponto de visa político, mas que, segundo o estudo, pode ocorrer na medida em que o equilíbrio fiscal tornar-se muito ameaçado e houver uma reação dos agentes econômicos e políticos no sentido de um ajuste competitivo. O cenário menos provável prevê uma trajetória de dificuldades crescentes no cenário externo que obrigam o Brasil a fazer fortes ajustes no seu modelo econômico. Na atualização dos cenários da Macroplan, em principio, há motivos para o otimismo, registra Claudio Porto. Além de dados positivos como o mercado de trabalho a pleno emprego – embora os números de fevereiro tenham sido os piores em três anos – ou o recente anúncio de que o Brasil já é a 6ª economia mundial, Porto vê bons sintomas de mudanças no ambiente público. Para ele, não seria exagero dizer que o país, no cenário de crise internacional, passou a ser modelo no que se refere ao PROER, à Lei de Responsabilidade Fiscal e à solidez do nosso sistema bancário. A ampliação do investimento público em 2012 – comum em anos eleitorais - deve ocorrer também em função do prazo para a Copa do Mundo e Olimpíadas. O maior beneficio desses investimentos deve ser em áreas urbanas. Também é esperada a ampliação do programa “Minha casa, Minha Vida”, que oferece espaço para participação do setor privado e atende grande demanda da população. Finalmente, o aumento do salário mínimo deve fazer crescer o salário médio do brasileiro, mas sem grande impacto na inflação. A Macroplan destaca como fatos portadores de um bom futuro para o Brasil a óbvia exploração petrolífera do pré-sal, com a possibilidade de elevar o país à posição de 4º maior produtor de petróleo do mundo em 2030, a privatização de grandes aeroportos, que Claudio Porto considera simbolicamente, uma espécie de “queda do muro de Berlim” em relação ao tema privatização, e a expansão do mercado interno. A nova classe C terá até 2016 um poder de compra, segundo projeções da consultoria, que ultrapassará a barreira de R$ 1, 4 trilhões. Os motivos para o otimismo também extravasam as razões econômicas, analisa Porto. A mobilização social para a aprovação da Lei da Ficha Limpa e a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, confirmando a competência constitucional do Conselho Nacional de Justiça são episódios que, para ele, têm enviado sinais de que os brasileiros querem construir uma nova sociedade. O mais recente sinal portador de um bom futuro ocorreu há pouco, destaca o estudo da Macroplan: a aprovação na Câmara dos Deputados do projeto que institui novas regras para a aposentadoria dos servidores públicos, decisivo para equilibrar as contas no sistema previdenciário brasileiro. Uma reforma que se iniciou no 1º mandato do Presidente Fernando Henrique, deu um passo importante no 1º mandato do Governo Lula e finalmente será regulamentada quase 16 anos depois no 2º ano do Governo Dilma Roussef. Uma avaliação da trajetória mais provável desses cenários indica, segundo a consultoria Macroplan que as perspectivas são positivas. Mas se as evidências positivas preponderam, porque ainda nos questionamos se o Brasil tem jeito? Para o economista da Macroplan, o que nos impõe a dúvida é a falta, fundamentalmente, de uma visão de longo prazo para projetos e mudanças estratégicas para o país. Ele alerta que as análises e as formulações políticas e econômicas no país são, quase sempre, vinculadas ao curto prazo. “Num momento propício para lançar o país num novo ciclo de desenvolvimento econômico, a ênfase da nossa política econômica é cuidar de emergências, viés que se acentuou após a alta medíocre do PIB em 2011 e as dificuldades experimentadas pela indústria brasileira” lamenta. E infelizmente isso não é casual. Historicamente somos um país com uma cultura imediatista, com escassa visão de futuro, diz ele. “Sem uma visão de longo prazo corremos o risco de desperdiçar as melhores oportunidades”, alerta Claudio Porto. Merval Pereira

sexta-feira, 16 de março de 2012

As guerras do Pobrecon

As guerras do Pobrecon 16 de março de 2012 Autor: Carlos Alberto Sardenberg Você pode até desejar, do fundo do coração “gauchiste”, que o império americano seja um dia enterrado pelas forças populares globais. Mas, até que isso aconteça, a razão manda admitir que a boa saúde dos EUA é do interesse do Brasil e das demais nações. Os mercados sabem disso, claro. A Bovespa subiu forte na última terça, com as demais bolsas mundiais, na esteira de informações que confirmaram a recuperação da máquina americana. A lógica começa bem simples. Se tudo correr bem, o consumidor dos EUA vai torrar no shopping mais de US$ 10 trilhões neste ano. Comprando o quê? Mercadorias “made in China”, certo, mas também produzidos no mundo todo, incluindo Brasil. Além disso, para montar o que vende nos EUA, a China importa matérias-primas e componentes do mundo todo — e roda a economia de novo. Eis por que os investidores correram a comprar ações quando souberam que as vendas no varejo nos EUA, em fevereiro, haviam subido expressivamente. Além do mais, o fortalecimento da atividade econômica lá no império revigora o dólar, ou seja, valoriza as verdinhas em relação às demais moedas. No outro lado, na Europa, a ação do Banco Central — emprestando caminhões de dinheiro barato para os bancos — e o bom andamento da reestruturação da dívida grega afastaram a ameaça de crise aguda por pelo menos três anos. Portanto, boas notícias, certo? O problema é que esse panorama perturba o que se poderia chamar de “Pensamento Oficial Brasileiro Econômico” (Pobrecon), conforme tem sido exposto por diversas autoridades, a começar pela presidente Dilma. Não é que torça para isso, mas o Pobrecon, digamos, precisa de um agravamento da crise internacional para fechar sua lógica. O Banco Central, por exemplo, sustenta que essa crise, ao derrubar o crescimento global, produz efeitos “desinflacionários” pelo mundo afora, Brasil incluído. Logo, ele, BC, pode reduzir a taxa básica de juros mais agressivamente. Já na versão do Palácio do Planalto e da Fazenda, o Pobrecon precisa do “tsumani monetário” global. Se os EUA e a Europa estão colocando tanto dinheiro barato no mercado, isso é uma nova modalidade de guerra cambial. Em outras palavras, os ricos estariam fazendo isso só para desvalorizar suas respectivas moedas, fortalecer suas exportações e, assim, arrasar a expansão dos emergentes que resistiram melhor à crise financeira de 2008/09. Com isso, o Pobrecon justifica as medidas protecionistas, que bloqueiam importações e a entrada de dólares, aumentando preços internos e atrapalhando, por exemplo, as viagens de brasileiros que vão ao exterior em busca de produtos mais baratos e melhores. O governo Lula ganhou muita popularidade com o dólar barato e seus subprodutos: consumo local estimulado por preços baixos e a “bolsa Miami”, a facilidade da nova classe média para estrear seu passaporte. Mas o mundo mudou, diz o Pobrecon, agora estamos em guerra e a culpa é dos ricos. A ironia da história é que o “tsunami” está funcionando como esperavam seus autores. A enxurrada de dinheiro, a juros perto de zero, reequilibrou o sistema financeiro, afastou a ameaça de quebra de bancos e vai recompondo a concessão de crédito para empresas e consumidores. No primeiro momento, o tsumani derruba o valor de dólar e euro, espalha dinheiro barato pelo mundo. No segundo, a atividade econômica começa a engrenar de novo — e a “guerra” vai terminando. Ora, se isso se confirmar ao longo deste ano e se a China desacelerar suavemente, mantendo ainda um bom nível de expansão, estaremos deixando para trás o ambiente sombrio de meados de 2011. A boa notícia é que, mantida essa tendência mundial, o Pobrecon terá mais chance de alcançar sua outra meta, a de levar o Brasil a um crescimento de 4,5% neste ano. (Ou 5% se o mundo for favorável, como já disse o ministro Mantega). A má notícia é que, se crescer isso tudo, a inflação também deve subir — como sempre acontece quando o país acelera — e isso atrapalha o outro objetivo do Pobrecon, que é colocar a taxa de juros lá em baixo. Também cria dificuldades para uma outra meta do Pobrecon, que é colocar o real acima de R$ 1,80 por dólar. Dólar caro, importações mais caras, financiamento externo mais caro, tudo isso é inflacionário e atrapalha a atividade econômica imediata. Resumo da ópera: se tem guerra, os juros podem cair e o dólar subir, mas o país não cresce aquilo tudo. Se crescer, ajudado pelo fim da guerra, sobem a inflação e os juros, mas não o dólar. Mas vai ver que essa é a sacada do Pobrecon: relaciona tantos objetivos, tão diferentes e contraditórios, que pode cantar vitória qualquer que seja o resultado. Mas que deixa investidores e consumidores confusos, isso deixa. Talvez uma guerra de verdade ajudasse. Problema: quem vamos invadir? Fonte: O Globo, 15/03/2012

VISÃO GLOBAL: Capitalismo versão 2012

Se não notarem que seus 200 anos de êxito decorrem do equilíbrio, EUA verão seu modelo renascer em outra parte THOMAS FRIEDMAN THE NEW YORK TIMES David Rothkopf, diretor executivo e editor-geral da revista Foreign Policy, acaba de publicar um brilhante livro intitulado Power, Inc., sobre a épica rivalidade entre as grandes empresas e o governo que, de muitas formas, trata do que deveria estar em jogo nas eleições de 2012 nos EUA – não a “contracepção”, embora a palavra comece com C, mas sim o futuro do capitalismo e da possibilidade de esse capitalismo surgir não nos EUA, mas em alguma outra parte do mundo. Rothkopf afirma que, enquanto na maior parte do século 20 travou-se no cenário mundial o grande conflito entre capitalismo e comunismo – vencido pelo capitalismo -, a grande disputa do século 21 se dará sobre a versão do capitalismo que predominará, aquela que se mostrará mais eficiente para promover crescimento e se tornará a mais emulada. “Será o capitalismo de Pequim, de características chinesas?”, pergunta Rothkopf. “Será o capitalismo que favorece o desenvolvimento democrático, da Índia e do Brasil? Será o capitalismo europeu da rede de proteção? Ou será o capitalismo americano?” É uma questão interessante, que provoca outras: que tipo de capitalismo temos hoje nos EUA e o que permitirá que ele prospere no século 21? Segundo a concepção de Rothkopf, da qual compartilho, o que os outros mais admiraram e tentaram imitar do capitalismo americano é precisamente o que nós ignoramos. O sucesso dos EUA, durante mais de 200 anos, deveu-se em grande parte à sua saudável e equilibrada parceria entre o público e o privado – graças à qual o governo ofereceu as instituições, as normas, as redes de segurança, a educação, a pesquisa e a infraestrutura para dotar o setor privado do poder de inovar, investir e assumir os riscos que promovem o crescimento e os empregos. Quando o setor privado se sobrepõe ao setor público, temos a crise imobiliária de 2008. Quando o setor público se sobrepõe ao privado, entram em cena regulamentações que asfixiam a economia. Portanto, é preciso um equilíbrio e por isso devemos deixar de lado a caricatura de “argumento segundo o qual a escolha se dá entre governo total ou mercado total”, afirma Rothkopf. A lição que tiramos da história, acrescenta, é que o capitalismo tem mais condições de prosperar quando existe esse equilíbrio e “quando perdemos o equilíbrio temos problemas”. Por esse motivo, a eleição ideal de 2012 seria aquela que oferecesse ao eleitorado as versões conservadora e liberal das grandes negociações fundamentais – o equilíbrio básico do qual os EUA precisam para criar um capitalismo que seja adequado a este século. O primeiro é um grande pacto que permita resolver a questão do déficit estrutural de longo prazo introduzindo gradativamente, por meio da reforma fiscal, aumento de impostos equivalente a US$ 1 para cada US$ 3 e cortes para dotações orçamentárias e para a defesa, nos próximos dez anos. Se o Partido Republicano continuar defendendo a posição de que não deve haver aumentos de impostos, teremos um impasse. O capitalismo não pode funcionar sem redes de segurança socioeconômica ou sem prudência fiscal e nós precisamos de ambos num equilíbrio sustentado. Como parte disso, precisaremos de um grande pacto para não acabarmos numa guerra civil entre gerações. Precisamos de um equilíbrio adequado entre os gastos do governo com asilos e creches – para os seis primeiros meses de vida e para os últimos seis. Outro importante pacto de que precisamos é aquele entre a comunidade ambiental e a indústria do petróleo e gás no que se refere a como empreender imediatamente duas tarefas: a exploração segura das riquezas em gás natural recém-descobertas nos EUA e a construção de uma ponte para a economia de energia de baixo carbono, com ênfase na eficiência em matéria de energia. Outro importante pacto de que precisamos é o que diz respeito à infraestrutura. Temos um déficit de mais de US$ 2 trilhões em pontes, estradas, aeroportos, portos e conexão de internet. Precisamos de um pacto que permita ao governo associar-se ao setor privado a fim de desencadear investimentos privados em infraestrutura que sirvam ao público e ofereçam aos investidores retornos adequados. Nos campos da educação e da saúde, precisamos de importantes pactos para chegar a uma melhor alocação dos recursos entre remediar e prevenir. Em ambos os campos, gastamos mais do que qualquer outro país do mundo – sem, no entanto, obter resultados melhores. Desperdiçamos muito dinheiro tratando pessoas que têm doenças contra as quais deveria haver programas de prevenção e repetindo aos estudantes universitários o que eles deveriam ter aprendido no ensino médio. O capitalismo moderno exige trabalhadores especializados e trabalhadores que possam contar com a portabilidade dos seus planos de saúde, o que permite que se transfiram para qualquer tipo de emprego. Também precisamos de um importante acordo entre empregadores, empregados e o governo, como ocorre na Alemanha – onde o Estado fornece os incentivos para os empregadores contratarem, treinarem e reciclarem a mão de obra. Mas não poderá existir nenhum desses pactos sem um debate público mais detalhado. O “grande elemento que está faltando” na política americana hoje, disse-me recentemente Bill Gates em uma entrevista, “é a compreensão tecnocrática dos fatos, onde as coisas estão funcionando e onde não estão”. Portanto, o debate deveria ter base em dados e não em ideologia. O capitalismo e os sistemas políticos – como as companhias – precisam evoluir constantemente para se manterem vitais. As pessoas observam como evoluímos e se nossa versão do capitalismo democrático pode continuar prosperando. Há muitas coisas em jogo. Se os americanos “continuarem tratando a política como um reality show encenado com escasso talento teatral”, afirma Rothkopf, “aumentarão a probabilidade de que o próximo capítulo da atual história do capitalismo seja escrito em algum outro lugar”. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA É COLUNISTA

O malabarismo do Copom

O malabarismo do Copom Rodrigo Constantino Nesta quinta-feira foi divulgada a ata do Copom, da reunião que decidiu por uma queda mais acelerada na taxa básica de juros (Selic). O que se extrai da ata é aquilo que já era esperado por alguns economistas: o Copom forçou a barra para derrubar mais rápido o juro, sem o devido respaldo técnico para tanto. A inflação acumulada segue em patamares elevados, acima da meta do Banco Central. A inflação esperada pelo mercado, para 2012 e 2013, também está acima da meta. É verdade que a economia brasileira se desacelerou nos últimos meses. Mas o mercado de trabalho segue aquecido, em pleno emprego na verdade, enquanto o Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) da indústria de transformação continua firme, perto de 83%. Em outras palavras, a economia nacional está sem “slack”, sem capacidade ociosa que permita uma retomada da atividade sem pressionar a inflação. O Copom tentou justificar sua medida com base no cenário externo. A hipótese adotada admite que “a deterioração do quadro internacional cause um impacto sobre a economia brasileira equivalente a um quarto do impacto observado durante a crise internacional de 2008/2009”. Se os dados internacionais melhorarem, como foi o caso nos EUA recentemente, o Copom ficará em uma sinuca de bico. Curiosamente, o Copom reconhece, ao menos no discurso, que é uma falácia aceitar um pouco mais de inflação para ter mais crescimento. A ata é clara ao afirmar que as taxas elevadas de inflação “não trazem qualquer resultado duradouro em termos de crescimento da economia e do emprego, mas, em contrapartida, trazem prejuízos permanentes para essas variáveis no médio e no longo prazos”. O problema é que, na prática, a política de juros tem permitido justamente mais inflação para estimular a economia. E o que é pior: o PIB não parece reagir conforme o esperado pelo governo. O BNDES foi alvo de uma critica indireta no parágrafo 27: “[...] o Comitê considera oportuna a introdução de iniciativas no sentido de moderar concessões de subsídios por intermédio de operações de crédito”. O problema é que, novamente, a prática mostra algo bem diferente. O governo Dilma, com Guido Mantega no controle da economia, tem avaliado constantemente a possibilidade de novos aumentos de capital no BNDES, para conceder ainda mais crédito subsidiado aos grandes grupos nacionais. Mas eis onde todo o malabarismo lingüístico do Copom fica evidente, para justificar o injustificável: “Em suma, desde a última reunião do Copom, o cenário central para a inflação evoluiu, em linhas gerais, conforme então esperado pelo Comitê, que, desta forma, não detecta mudanças substantivas nas estimativas para o ajuste total das condições monetárias subjacente a esse cenário. À vista disso, dois membros do Comitê ponderam que seria oportuna a manutenção do ritmo de ajuste da taxa Selic. Entretanto, a maioria argumenta que desenvolvimentos como os mencionados no parágrafo anterior recomendam, neste momento, redistribuição temporal do ajuste total das condições monetárias como a estratégia mais apropriada” (meu grifo). Traduzindo, ou tentando traduzir: tudo ocorreu dentro do esperado, sendo que a inflação atual e esperada está acima da meta do Copom, mas a maioria resolveu que era adequado acelerar a queda de juros logo de uma vez. Por que? Não se sabe ao certo. O Copom parece trabalhar com uma meta de juros, não de inflação. Esta meta, como fica claro na ata, é de algo bem perto de 9%. E o Copom resolveu, a despeito de todos os dados dentro do esperado, partir logo para esta meta em prazo mais curto. Só Deus sabe o porquê desta mudança! Eis uma hipótese: a presidente Dilma andou falando no “tsunami monetário”, e novas medidas protecionistas foram adotadas. Com o cenário externo do jeito que está, com taxa de juros negativa em termos reais, há uma enxurrada de recursos para países emergentes como o Brasil. O câmbio de valoriza, e a indústria reclama. Como o governo não faz uma única reforma estrutural para reduzir o velho Custo Brasil (e a presidente ainda descartou qualquer chance de reforma trabalhista), resta partir para medidas paliativas para acalmar os industriais. Protecionismo, subsídios do BNDES e queda de juros na marra, eis o que resta como opção. E às favas com o controle da inflação! O Copom deixa claro que conta com um “permanente” fluxo de poupança externa para financiar nosso crescimento, uma vez que falta poupança doméstica (o governo arrecada muito e gasta muito). Eis o que diz o parágrafo 34: “O Copom também pondera que têm contribuído para a redução das taxas de juros domésticas, inclusive da taxa neutra, o aumento na oferta de poupança externa e a redução no seu custo de captação, as quais, na avaliação do Comitê, em grande parte, são desenvolvimentos de caráter permanente” (meus grifos). Atentai para o uso deliberado do termo “permanente”. Os estrangeiros sempre estarão dispostos a investir no Brasil. Parece uma premissa bastante arrojada, para dizer o mínimo. Até quando esta perigosa brincadeira pode durar? Ninguém sabe ao certo. O que podemos afirmar com maior grau de convicção é que o governo parece um adolescente bêbado riscando fósforos em um paiol repleto de pólvora. Para esta ousada (ou irresponsável) aposta “dar certo” (leia-se não explodir no curto prazo), o cenário externo tem que permanecer como está por muito mais tempo. O governo vai testar até onde pode levar a taxa de juros real no Brasil, contando com a negligência dos agentes econômicos, amarrados pelas igualmente irresponsáveis medidas do Fed, BCE, Bank of England e Bank of Japan. Nunca foi boa desculpa fazer besteira só porque o vizinho também faz. Posted by Rodrigo Constantino

quinta-feira, 15 de março de 2012

Vitória de Pirro

Vitória de Pirro 15 de março de 2012 Autor: Alexandre Schwartsman - Convidado Nessa história de pedir que os chineses limitem suas exportações, o Brasil não fez um “negócio da China” Há algumas semanas, o governo brasileiro pediu à China que restringisse voluntariamente suas exportações de têxteis, confecções, calçados e eletrônicos. Caso contrário, o país poderia impor limites diretos às importações, alternativa que deve fazer com que a China aceite a proposta brasileira. Parece um ato de soberania, dos quais as autoridades, sempre que possível, se pavoneiam. Trata-se, porém, do proverbial “tiro no pé” – se alguém fez um “negócio da China” nessa história, lamento informar que não foi o governo brasileiro. Já tive a oportunidade de argumentar neste espaço sobre as restrições às importações, seja do ponto de vista macroeconômico seja do ponto de vista microeconômico. Observada pelo prisma macro, tais medidas geram impactos inflacionários que, sob um Banco Central comprometido com o controle da inflação (lamentavelmente não é o nosso caso), reduziriam o escopo para taxas de juros mais baixas e crescimento mais vigoroso da demanda interna. Já pelo prisma micro, o problema associa-se ao custo imposto ao consumidor, assim como a perda geral de eficiência. Tudo isso permanece válido e é sempre necessário lembrar que tais medidas geram benefícios para poucos em troca de perdas para muitos, mas não é esse o assunto do qual quero tratar hoje. Minha questão é outra, a saber, se -dada a decisão (equivocada) de limitar o volume de importações- as restrições voluntárias de exportações dos parceiros são uma medida melhor do que a mera imposição de uma tarifa ou uma cota de importação. Peço ao leitor que imagine um exemplo muito simples. Digamos que o país importe 50 unidades por ano de um determinado produto ao preço de R$ 10 por unidade, mas decida limitar as importações lançando mão de uma tarifa que gere as seguintes implicações: a quantidade importada cai de 50 para 40 por ano, fazendo com que preço interno salte de R$ 10 para R$ 15 por unidade, enquanto o valor líquido recebido pelo exportador chinês cai de R$ 10 para R$ 5 por unidade. Em outras palavras, os consumidores, que antes gastavam R$ 500 pelas 50 unidades, agora têm de gastar R$ 600 para consumir 10 unidades a menos (presumivelmente teriam de gastar mais R$ 150 relativos às unidades compradas de produtores nacionais, mas esse não é meu argumento central). O exportador chinês ficaria com R$ 200 (40 unidades ao preço líquido de R$ 5 por unidade) e o governo brasileiro com os R$ 400 de diferença, relativos à incidência da tarifa (R$ 10) sobre as 40 unidades importadas. Imagine, contudo, que -em vez de impor uma tarifa- o governo brasileiro resolva convencer o exportador chinês a restringir suas exportações a 40 unidades. Como a disponibilidade do produto importado é a mesma que no exemplo acima, o preço a que o produto é vendido no Brasil também deve ser o mesmo, isto é, R$ 15 por unidade. Sob tais condições, portanto, o exportador chinês agora recebe R$ 600 por 40 unidades. Não se impressionem pela receita chinesa agora ficar maior do que seria sem a restrição -esse não é um resultado geral, mas apenas fruto dos números particulares escolhidos para este exemplo. O resultado geral (e mais importante no contexto) é que, se sob a tarifa o governo brasileiro e o exportador chinês dividiam a receita advinda dos consumidores locais, agora, sob a restrição voluntária às exportações, toda (isso mesmo, toda) a receita fica para o exportador chinês! Não é preciso mais do que dois neurônios para concluir que, dadas as alternativas (restrição à importação versus restrição voluntária às exportações), a China sempre escolherá a segunda, ao custo de um governo que ignora as consequências dos seus próprios atos. Pirro, o general macedônio que derrotou os romanos na batalha de Ásculo, perdendo, porém, 4.000 dos seus soldados, teria dito que mais uma vitória como aquela o liquidaria militarmente. Difícil não concluir o mesmo da “vitória” brasileira na negociação. Fonte: Folha de S. Paulo, 14/03/2012

Os riscos de uma infecção inflacionária

Os riscos de uma infecção inflacionária Por Ricardo Valente, Valor Econômico O Banco Central do Brasil levou a taxa Selic ao patamar de um dígito, como desejava o governo, com uma aceleração do ritmo de cortes surpreendente. Apesar da incrível ousadia, se ainda há uma notável diferença entre o Brasil e o resto do mundo, ela está na taxa de juros. Uma vez que os países desenvolvidos lutam para resolver os problemas gerados pelo estouro da bolha imobiliária, com impactos fiscais e sobre o ritmo de atividade econômica, predomina atualmente um quadro de política monetária muito frouxa, com taxas de juros reais negativas e afrouxamento quantitativo. Assim, o diferencial de juros do Brasil para o mundo ficou ainda mais evidente, pois hoje não há, no País, debilidade fiscal que leve a dúvidas sobre a solvência no curto prazo. Eis o paradoxo. A taxa de juros que equilibra o fluxo de capitais para o País é muito inferior àquela que equilibra a inflação. De outra maneira, os investidores internacionais estão dispostos a financiar o Brasil (Estado e setor privado) a taxas de juros bem mais baixas que a taxa de juros doméstica de equilíbrio. O problema é que, sempre que baixamos a taxa de juros a níveis inferiores ao de equilíbrio, a economia doméstica cresce em ritmo acelerado e incompatível com a capacidade de curto prazo, elevando as pressões inflacionárias. Do lado macroeconômico, isso significa que o Brasil poderia usar a poupança externa para complementar a poupança doméstica, elevar o investimento e o potencial de crescimento da economia, para derrubar a taxa de juros permanentemente. Então por que isso não acontece? A absorção de poupança externa é a contraparte da apreciação real do câmbio, o que aprofunda os problemas de competitividade da indústria no País. Para o câmbio se valorizar ainda mais e garantir a sobrevivência da indústria, seriam necessárias amplas reformas macro e microeconômicas que priorizassem a questão da produtividade da economia. Um exemplo: a nossa carga tributária em percentual do PIB é cerca de 10% superior à média dos emergentes, e escandalosos 20% superior à média dos emergentes asiáticos. O investimento público é próximo a 10% do gasto público primário inferior à média dos emergentes, e, novamente, cerca de 20% do gasto público inferior ao dos emergentes asiáticos. Fora as questões "micro" relevantes, como obter licenças, abrir ou fechar empresas, resolver insolvência, sistema tributário complexo, dificuldade de negociar através de fronteiras, e outras. O câmbio é a variável que simplesmente esconde as ineficiências do modelo econômico. Mesmo que se tente administrar a taxa nominal, impedindo a apreciação, o câmbio real permanecerá valorizando-se, pois a inflação brasileira ficará acima da verificada nos principais parceiros comerciais. Assim, quanto menor a taxa de juros, maior será a apreciação real pelo lado inflacionário, o que cria um ambiente fértil para a reindexação da economia, que tanto custou no passado. O câmbio estável combinado com um mercado de trabalho muito aquecido leva a uma inflação diferente da observada no passado. O que se observa hoje no Brasil é resultado do aumento de salários e não da indexação massiva da economia ou do aumento do preço dos produtos importados. Com o crescente poder de compra do empregado, os incentivos políticos para o combate inflacionário são menores. Enquanto esse processo não levar à efetiva perda de popularidade do governo, a inflação via aumento de salários continuará "desejável". Isso eleva gradualmente as expectativas de inflação de longo prazo, com perda de credibilidade do regime de metas para inflação, o que tornará a inflação permanentemente mais alta, sem ganhos de crescimento. Em suma, não é possível esperar que a taxa de juros caia subitamente para o nível internacional sem o empenho em fazer reformas no país. Sem elas, dificilmente teremos ganhos de produtividade que possibilitem um potencial de crescimento mais favorável com menor inflação. No dia do "juízo final", teremos de subir ainda mais os juros e jogar a atividade econômica no chão para tratar da infecção inflacionária. O remédio será amargo. Nesse dia, teremos um câmbio depreciado. Com juros muito mais altos, a indústria não terá para quem vender. Ricardo Valente é gestor dos fundos de renda fixa da Credit Suisse Hedging-Griffo

quarta-feira, 14 de março de 2012

A China "comunista" e a América "capitalista" por Peter Schiff, quarta-feira, 14 de março de 2012 As revoluções comunistas do século XX tinham como objetivo confiscar a riqueza gerada por indústrias privadas e redistribuí-la para os trabalhadores "explorados", sobre cujos ombros os lucros foram extraídos. Os EUA fizeram da rejeição desta ideia e do seu apoio aos princípios do livre mercado o ponto central de sua narrativa econômica. No entanto, em decorrência da política tributária atual e da política tributária que vem sendo sugerida para ser aplicada sobre os acionistas das grandes empresas, não é nenhum exagero dizer que governo americano confisca uma fatia da produção industrial que geraria inveja até mesmo no mais raivoso e radical bolchevique. O propósito de uma empresa é gerar lucros para seus proprietários (todas as outras funções são secundárias a este objetivo). Empresas de capital aberto distribuem seus lucros por meio de dividendos. Porém, como resultado do sistema de tributação dupla vigente nos EUA, no qual a renda é tributada em nível corporativo e depois novamente em nível pessoal, o governo recebe uma fatia muito maior da renda das empresas do que seus próprios proprietários. Suponha que uma empresa americana tenha obtido uma renda de um milhão de dólares durante o período de um ano. Atualmente, seus lucros seriam tributados a uma alíquota de 35% (para este exemplo ficar mais fluente, não levarei em conta a alíquota menor que incide sobre os primeiros $100.000 de lucros), o que significa que a empresa teria de pagar $350.000 diretamente para o governo (supondo que ela obteve sua renda sem deduções tributárias especiais). Dos $650.000 restantes, uma típica empresa distribuidora de dividendos distribuiria 40% para seus acionistas (isso é conhecido como "relação de pagamento" e a média real é um pouco menor do que 40%). Portanto, neste exemplo, a empresa pagaria $260.000 (40% de $650.000) para seus acionistas. Os restantes $390.000 seriam normalmente mantidos como "lucros retidos" ou "lucros não distribuídos", e seriam utilizados para manter e substituir equipamentos depreciados, para fazer novos investimentos, para financiar pesquisa e desenvolvimento e para expandir as operações da empresa. Se a empresa não fizer tais investimentos, será impossível sobreviver, e sua capacidade de perpetuar suas distribuições de lucros estaria limitada. Estes lucros retidos ainda representam ativos para os acionistas, mas seu propósito principal é o de gerar lucros futuros e dividendos mais altos. Os acionistas só irão se beneficiar diretamente destes lucros retidos quando os dividendos futuros forem distribuídos. É claro que eles podem hoje vender suas ações e obter algum lucro — pagando o imposto sobre ganhos de capital ao fazerem isso —, mas tal atitude irá apenas transferir estes benefícios futuros para o novo comprador. Quando distribuídos para os acionistas, os $260.000 em dividendos são tributados novamente a uma alíquota de 15% (de acordo com a lei vigente), agora em nível pessoal. Como resultado, os acionistas recebem apenas $221.000 daquele lucro de $1 milhão. Some estes $39.000 de impostos sobre dividendos aos $350.000 já confiscados pela alíquota de 35% do imposto de pessoa jurídica, e temos que o confisco governamental total dos lucros da empresa é de praticamente $390.000. Em outras palavras, o governo americano obtém desta empresa um fluxo de caixa 75% maior do que seus genuínos proprietários. Olhando de maneira ligeiramente diferente, o governo confisca aproximadamente 65% dos lucros não retidos, ao passo que os acionistas, que colocaram seu dinheiro na empresa e que correram todo o risco, recebem 35%. Isso parece justo? Este nível de tributação coloca as empresas americanas em notória desvantagem em relação às empresas daqueles países contra os quais os EUA concorrem mais vigorosamente. Na China, a divisão do bolo é muito mais favorável aos proprietários. Lá, as empresas são tributadas a uma alíquota de 25%, e os dividendos, a 10%. Utilizando estes números (e a mesma "relação de pagamento" utilizada para a empresa americana), o governo chinês fica com 51% dos lucros corporativos distribuídos e os acionistas, com 49%. Em Hong Kong (que faz parte da China Comunista, mas que usufrui um governo independente), a situação é ainda melhor. Lá, a alíquota do imposto corporativo é de 16% e o imposto sobre dividendos é zero. Fazendo a mesma matemática, o governo fica com 33% e os acionistas ficam com 67%. Esta comparação levanta um ponto interessante. Se os acionistas na China comunista podem manter para si uma fatia maior de seus ganhos do que os acionistas na América capitalista, qual nação é mais comunista e qual é mais capitalista? No final de fevereiro, a administração Obama e Mitt Romney ofereceram propostas concorrenciais para uma reforma deste imposto corporativo, com ambos dizendo que suas propostas tornariam as empresas americanas mais competitivas. O plano de Romney reduz a alíquota do imposto corporativo para 25%, enquanto mantém o imposto sobre dividendos em 15%. Isto tornaria as coisas apenas ligeiramente melhores, com o governo abiscoitando 54% dos lucros distribuídos e os acionistas, 46% (distribuição esta ainda não tão generosa quanto a da China Comunista). Não surpreendentemente, o plano de Obama irá tornar as coisas muito mais difíceis. Embora o presidente proponha reduzir a alíquota do imposto corporativo para 28% e também queira abolir o imposto sobre dividendos, ele quer passar a tributar as distribuições de dividendos como se fossem renda comum. Na prática, a vasta maioria dos indivíduos que recebe dividendos está na faixa mais alta da renda tributável. Isto significa que uma fatia muito volumosa destes dividendos será tributada segundo a alíquota mais alta do imposto de renda de pessoa física, que é de 39%. Mas Obama também quer submeter estas pessoas de renda mais alta a uma sobretaxa para assim poder financiar o plano de saúde socializado que ele quer implementar, o que significa que vários recebedores de dividendos serão tributados a uma alíquota de 44% (isso também levando em conta a abolição das deduções pessoais para os indivíduos de alta renda). Portanto, para estes indivíduos de alta renda, utilizando nosso atual exemplo, a nova distribuição segundo a proposta de Obama será de aproximadamente 70/30 a favor do governo. Isto é ainda pior do que a atual situação. Mas as coisas são na realidade ainda piores do que isso. O imposto de renda corporativo é apenas uma das veias que as empresas abrem para o governo. Pense em todos os outros impostos que as empresas pagam, como encargos sociais e trabalhistas e impostos sobre vendas. É claro que estes impostos elas repassam aos seus empregados e consumidores, mas o fato é que a receita flui 100% para o governo, com seus acionistas não recebendo nada senão uma conta pelo custo da coleta. E ainda há todos os impostos pagos diretamente pelos próprios empregados sobre seus salários. Claro, este dinheiro pertence aos empregados e não aos acionistas, mas se não fossem os lucros das empresas, estes salários, bem como os impostos pagos sobre eles, não existiriam. Quando todos estes canais de coleta de impostos são considerados, pense no total que o governo arrecada de impostos oriundos de atividades empresariais e compare ao total que os proprietários das empresas recebem em dividendos. Não dá pra saber o valor correto, mas tenho certeza de que a fatia que o governo confisca é várias vezes maior do que o total que os acionistas recebem. Ainda no século XIX, a América era de fato um país capitalista. Não havia imposto de renda nem de pessoa física nem de pessoa jurídica. Os acionistas recebiam 100% dos lucros distribuídos. Como resultado desta estrutura, as empresas americanas cresceram aceleradamente e ajudaram a desencadear a mais veloz expansão econômica que o mundo jamais havia visto. Mas isso foi ontem, a realidade hoje é outra. Considerando-se os atuais números, mesmo se os líderes americanos fossem marxistas ferrenhos, quais seriam suas motivações para estatizar empresas que estão na lista da Fortune 500 [relação das 500 empresas mais bem-sucedidas pela revista Fortune]? Dado que eles já recebem a maior fatia da distribuição dos lucros, qual seria o ponto de se estatizar empresas? Tal atitude iria apenas desarranjar e desordenar as estruturas produtivas, destruindo o que ainda resta de qualquer motivação em se buscar o lucro. Tal medida iria apenas matar a galinha dos ovos de ouro, e os socialistas sabem disso. Se o governo estatizasse uma empresa, ele também teria de gerenciá-la. Alguém realmente crê que burocratas tomariam decisões melhores do que proprietários privados? Nem os próprios burocratas acreditam nisso. E o que é pior, se estas decisões gerassem prejuízos em vez de lucros, o governo teria de absorver 100% destes prejuízos. Sob o atual sistema, por outro lado, o governo obtém a maior fatia dos lucros, ao passo que os acionistas privados ficam com 100% dos prejuízos. Impossível um sistema mais confortável para o governo. Há um nome para este sistema vigente: fascismo. Embora o fascismo e o comunismo sejam formas de socialismo, os fascistas ao menos são espertos o bastante para entender que, se os meios de produção forem estatizados, seus empregados e proprietários não irão trabalhar com o mesmo afinco, e o governo acabará perdendo receitas. É vergonhoso constatar que o país que já foi visto como o farol das liberdades civis e econômicas não mais possua sequer a capacidade reconhecer o que é realmente capitalismo. Enquanto os proprietários das empresas continuarem não sendo apropriadamente recompensados pelos seus riscos por causa do governo, as empresas americanas jamais reconquistarão sua dominância, os americanos não reconquistarão suas liberdades perdidas e o padrão de vida do país continuará em queda livre. Como as coisas estão hoje, os EUA já se tornaram um povo que vive do governo, para o governo e pelo governo, e não o contrário. Os "comunistas" chineses têm muito o que aprender conosco.