quarta-feira, 28 de setembro de 2016

ALEMANHA: É O COMEÇO DO FIM DA ERA MERKEL?

- O partido anti-imigração Alternativa para Alemanha (AfD) ficou à frente da União Democrata Cristã (CDU) de Angela Merkel nas eleições em seu estado natal Mecklenburg-West Pomerania.


- A eleição era considerada pela maioria da população como uma espécie de referendo sobre a política de portas abertas para a imigração da Chanceler Merkel e no tocante à sua decisão de permitir a entrada na Alemanha de mais de um milhão de migrantes da África, Ásia e Oriente Médio em 2015.

- Merkel rejeitou qualquer correção de curso na política de migração: "estou muito insatisfeita com o resultado da eleição. Inegavelmente ela tem algo a ver com a questão migratória. Acredito que as decisões tomadas estão corretas." Ela passou a culpar os eleitores alemães por não valorizarem a "competência em resolver problemas" de seu governo.

- Outrora muitas das posições da AfD eram defendidas pela CDU de Merkel, mas posteriormente abandonadas.

- Uma pesquisa de opinião realizada em 1º de setembro para a rede de TV ARD mostrou que o índice de popularidade de Merkel despencou para 45%, a menor em cinco anos. Mais da metade (51%) dos entrevistados disseram que "não seria bom" se Merkel concorresse a mais um mandato em 2017.

A Chanceler alemã Angela Merkel sofreu um duro golpe em 4 de setembro, quando o partido anti-imigração Alternativa para Alemanha (AfD) ficou à frente da União Democrata Cristã (CDU) nas eleições em seu estado natal Mecklenburg-West Pomerania.

Com 20,8% dos votos, o partido AfD ficou em segundo lugar atrás dos sociais-democratas (SPD) de centro-esquerda com (30,6%). Em terceiro lugar ficou a CDU de Merkel com 19% dos votos, o pior resultado já obtido em Meck-Pomm, como o estado é chamado em sua forma abreviada.

A eleição em Meck-Pomm era considerada pela maioria da população como uma espécie de referendo sobre a política de portas abertas para a imigração da Chanceler Merkel e no tocante à sua decisão de permitir a entrada na Alemanha de mais de um milhão de migrantes da África, Ásia e Oriente Médio em 2015. O fluxo de migrantes resultou em um considerável aumento da criminalidade na Alemanha. A crescente sensação de insegurança aumentou ainda mais por conta de uma série de ataques ocorridos neste verão, perpetrados por migrantes muçulmanos, nos quais dez pessoas foram mortas e dezenas ficaram feridas.

O fiasco da CDU em Meck-Pomm leva a duas conclusões importantes: 1) as esperanças de Merkel de vencer — ou mesmo de concorrer — ao quarto mandato nas eleições gerais em 2017 já é incerto; e 2) a AfD é uma força a ser levada em conta na política alemã. O partido já não pode simplesmente ser menosprezado como um mero "partido nanico".

Observadores em todo o espectro político parecem concordar que a eleição em Meck-Pomm marca um divisor de águas para Merkel, que está à frente da CDU desde o ano 2.000 e é chanceler desde novembro de 2005. Há quem diga que a sua carreira política poderá estar no fim se a CDU sofrer perdas substanciais para a AfD nas eleições estaduais em Berlim em 18 de setembro.

"Este foi um dia sombrio para Merkel," salientou Thomas Jaeger, cientista político da Universidade de Colônia. "Todos sabem que ela perdeu esta eleição. Seu distrito no parlamento é lá, ela fez campanha lá, o problema dela são os refugiados."

O secretário-geral da CDU Peter Tauber, concorda: "o forte desempenho da AfD é amargo para muitos, mas em nosso partido o é para todos. Um número considerável de pessoas queria exprimir o seu descontentamento e protestar. Nós vimos isso particularmente nas conversas sobre os refugiados."

A líder da AfD Frauke Petry ressaltou: "o resultado é um duro golpe para Merkel, não só em Berlim, mas também em seu estado natal. Os eleitores demonstraram, de forma inequívoca, seu posicionamento contra as desastrosas políticas de imigração de Merkel. Isto a coloca em seu devido lugar."
A chanceler alemã Angela Merkel (esquerda) sofreu um duro golpe em 4 de setembro, quando o partido anti-imigração Alternativa para Alemanha (AfD) liderado por Frauke Petry (direita) ficou à frente da União Democrata Cristã (CDU) nas eleições em seu estado natal Mecklenburg-West Pomerania.


O líder local da AfD Leif-Erik Holm assinalou aos simpatizantes: "estamos escrevendo a história. Talvez isto seja o começo do fim da chancelaria de Angela Merkel. Este deve ser o nosso objetivo."

Gero Neugebauer, professor de ciência política da Universidade Livre de Berlim ressaltou:

"A população verá a derrota como o início do 'Kanzlerdämmerung' (crepúsculo da chanceler). Se um número considerável de membros da CDU começar a ver essa derrota como culpa de Merkel e se os membros do parlamento começarem a vê-la como perigo para o partido e para seus próprios mandatos no ano que vem, a situação fugirá ao controle. Se a AfD derrotar a CDU novamente em Berlim daqui a duas semanas, as coisas poderão se deteriorar rapidamente."

Em entrevista concedida ao Der Spiegel, Ralf Stegner, vice-presidente do SPD (Partido Social Democrata), disse que a CDU está em "estado de pânico", no tocante à ascensão da AfD e que Merkel se tornou um peso para o partido:

"Merkel inequivocamente já não está mais no apogeu. É um desastre para ela o fato da CDU ter caído para o terceiro lugar, com menos de 20% dos votos em seu próprio estado. Trata-se de uma grave crise para a CDU e no olho do furacão estão os nomes de Merkel e Seehofer. Há quem acredite que Merkel já não conduz o debate com Seehofer sobre a sua candidatura em 2017. Ao longo da sua história, a CDU tem sido incomplacente para com seus chanceleres caso haja a impressão de que o partido esteja enfrentando uma perda massiva de votos."

Stegner estava se referindo a uma reportagem de 27 de agosto da revista Der Spiegel, segundo a qual Merkel teria adiado um pronunciamento sobre a sua candidatura devido à oposição do partido União Social Cristã (CSU), irmão bávaro da CDU, que tem sido cada vez mais eloquente na crítica em relação à sua política de migração:

"Angela Merkel irá adiar o anúncio da sua decisão até a primavera de 2017, se deverá ou não concorrer a mais um mandato como chanceler da CDU nas eleições gerais no ano que vem. O adiamento foi necessário porque só então o chefe da CSU Horst Seehofer decidirá se o seu partido apoiará Merkel novamente, isso segundo membros da CDU. Esta é a segunda vez que Merkel teve que adiar o anúncio de seus planos.

"Na realidade a decisão deveria ter sido anunciada há muito tempo. O plano original era que Merkel anunciasse suas intenções já no início da primavera passada. Então a crise dos refugiados e a disputa acirrada com a CSU complicaram as coisas. A chanceler decidiu esperar até o outono deste ano.

"Desta vez o atraso é bem mais problemático para Merkel. Em dezembro o congresso do partido CDU ocorrerá em Essen, onde Merkel quer ser eleita presidente do partido por mais dois anos.

"Mas ela só poderá ser presidente do partido se for candidata na eleição geral. O congresso do partido deverá enviar um sinal verde de que a CDU apoia integralmente a chanceler. Isso não vai dar certo se o partido não souber se Merkel quer continuar.

"Vista pela perspectiva de Merkel, a outra alternativa seria mais arriscada: se ela anunciar a sua candidatura a chanceler sem o apoio de Seehofer, tal atitude poderia se voltar contra ela politicamente."

Em entrevista concedida ao jornal Süddeutsche Zeitung, em 6 de setembro, o líder da CSU Horst Seehofer salientou que o resultado "desastroso" da eleição em Meck-Pomm foi a consequência direta da política de migração de Merkel. Ele acrescentou que Merkel ignorou "vários alertas para a correção de rumo" e que a sua recusa em ceder, ameaça o futuro da CDU. "A confiança no governo está minguando rapidamente," alertou ele. "As pessoas não entendem como a política é feita na Alemanha."

O secretário-geral da CSU Andreas Scheuer reiterou o pedido para que Merkel mude o curso: "temos que impor um teto na entrada de refugiados, deportações mais rápidas e melhor integração."

O ministro da fazenda bávaro Markus Söder concorda: "o resultado deve ser um sinal de alerta para a CDU. O estado de espírito das pessoas não pode mais ser ignorado. É necessário que haja uma mudança de curso em Berlim."

Merkel permanece irredutível. Um dia após o fiasco em Meck-Pomm, Merkel rejeitou qualquer correção de curso na política de migração:


"Estou muito insatisfeita com o resultado da eleição. Inegavelmente ela tem algo a ver com a questão migratória. Acredito que as decisões tomadas estão corretas."

Ela passou a culpar os eleitores alemães por não valorizarem a "competência em resolver problemas" de seu governo (Lösungskompetenz).

Em 7 de setembro, em um discurso inflamado perante o parlamento alemão, Merkel salientouque a postura anti-imigração da AfD constituía uma ameaça para a Alemanha. "Todos nós deveríamos perceber que a AfD é uma ameaça não só para a União Democrata Cristã... ela é uma ameaça a todos desta casa." Ela também pode ter indicado que pretende concorrer a mais um mandato como chanceler ao ressaltar: "ainda há muito trabalho a ser feito."
Alternativa para a Alemanha (AfD)

Em mais de um aspecto Angela Merkel é diretamente responsável pelo crescimento da AfD. Em mais de dez anos como chanceler, ela mudou tanto o rumo da CDU para a esquerda, em tantos aspectos cruciais, que o partido já não é mais conservador no verdadeiro sentido da palavra.

Sob o comando de Merkel, as políticas da CDU no tocante à energia nuclear tornaram-se em sua essência idênticas as do Partido Verde. Merkel também adotou muitas das políticas sociais do SPD. Em termos da política de portas abertas para a imigração, a posição da CDU é praticamente indistinguível tanto do SPD quanto em relação ao Partido Verde. Criou-se assim uma abertura para a AfD.

Lançado em 2013, a AfD está presente em nove dos 16 parlamentos estaduais da Alemanha. Ele está prestes a ingressar pela primeira vez no parlamento federal em 2017. De acordo com uma sondagem da Insa citada pelo portal de notícias Bild em 5 de setembro, se as eleições gerais fossem realizadas hoje a AfD teria 15% dos votos, o que a tornaria o terceiro maior partido na Alemanha.

O levantamento da Insa também constatou que na eleição de Meck-Pomm, a AfD abocanhou mais de 55.000 votos de outros partidos. Mais de 22.000 eleitores da CDU votaram para a AfD, 15.000 eleitores da SPD também votaram para a AfD e mais de 22.000 eleitores filiados a outros partidos deram seus votos para a AfD.

O partido foi fundado, a princípio, para protestar contra a forma do governo alemão de lidar com a crise da zona do euro. Seu manifesto de fundação declara:

"A República Federal da Alemanha enfrenta a mais grave crise de sua história. A moeda da zona do euro provou ser inviável. Países do sul da Europa estão despencando na pobreza por conta da pressão competitiva do euro. Países inteiros estão à beira do colapso.

"Centenas de bilhões de euros já estão comprometidos pela União. O fim desta política não está à vista. Isto é excessivo e irresponsável. Nós, nossos filhos e nossos netos teremos que pagar por tudo isso com impostos, estagnação e inflação. Ao mesmo tempo, isto está minando nossa democracia. Nesta situação, a CDU, CSU, SPD, FDP e os Verdes têm somente uma resposta: manter o curso!"

Em abril de 2013, o jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung revelou que pessoas de dentro da CDU com informações privilegiadas viam a ascensão da AfD como "o fim da chancelaria Merkel". Uma estratégia foi então arquitetada para realizar pesquisas e pintar a oposição da AfD como um partido "conservador nacional" conduzido pelos proponentes do "radicalismo de mercado".

A AfD — parecida em diversos aspectos com o movimento arrivista Tea Party dos Estados Unidos — sofreu ferimentos auto-inflingidos como resultado de desentendimentos políticos e lutas internas pelo poder. Políticos do establishment e da grande mídia recorrentemente se apegaram a comentários ultrajantes feitos por alguns membros do partido a fim de retratá-lo como um partido de "extrema-direita" que representa uma ameaça aos valores alemães.

Em entrevista concedida ao jornal Guardian, Frauke Petry, líder da AfD, salientou que às vezes o partido se sente forçado a usar a linguagem direta para que seja ouvido. Ela ressaltou:

"Bem, às vezes, não nego, achamos que temos que usar argumentos provocativos a fim de chamarmos a atenção. Nós tentamos de todas as maneiras, no início de 2013, sermos ouvidos, apresentamos uma série de ideias e argumentos muito sensatos e simplesmente ninguém nos ouviu. Então o que fazer? Você apresenta um argumento provocativo e às vezes lhe é dada a oportunidade de explicar o que você quer dizer. Sei que é uma escolha difícil de se fazer, mas às vezes, para nós, parece ser a única."

Petry também ressaltou que a AfD não se opõe aos "verdadeiros refugiados", mas é contra as centenas de milhares de migrantes econômicos que se fazem passar por refugiados. "Há espaço suficiente para os refugiados na Alemanha, mas o problema é que nós não distinguimos mais quem é migrante e quem é candidato a asilo", realçou ela.

Um manifesto abrangente do partido publicado em maio de 2016 pedia: limites ao estado, limites de mandato, reforma no financiamento de campanha, redução do poder dos partidos políticos, eleições direitas para chanceler, transferência de poder aos estados da federação, referendo sobre o euro, reforma das Nações Unidas, uma poderosa força militar baseada na Aliança da OTAN, reintrodução do serviço militar obrigatório, aplicação mais rigorosa da lei, reforma da justiça, direito de porte de armas, proteção das fronteiras alemãs, reforma do mercado de trabalho, eliminação da burocracia onerosa, promoção da família tradicional, incentivar os alemães a terem mais filhos ao invés de recorrer à migração em massa para corrigir os problemas demográficos, proteger os direitos dos que ainda estão por nascer, promover a cultura alemã ao invés do multiculturalismo, promover a língua alemã como base na identidade e integração alemãs, proibir o financiamento estrangeiro de mesquitas, eliminar os subsídios do governo para o rádio e a televisão, e assim por diante. Muitas das posições da AfD foram mantidas, mas depois abandonadas pela CDU.

Entretanto uma pesquisa de opinião realizada em 1º de setembro para a rede de TV ARD,mostrou que o índice de popularidade de Merkel despencou para 45%, o menor em cinco anos de um patamar de 67% há apenas um ano. Mais da metade (51%) dos entrevistados disseram que "não seria bom" se Merkel concorresse a mais um mandato em 2017. Se as eleições nacionais fossem hoje, a CDU teria apenas 33% dos votos, bem abaixo dos 42% de um ano atrás.

A sondagem mostrou um fator a favor de Merkel: a falta de um rival político forte o suficiente para enfrentá-la.
Por: Soeren Kern, colaborador sênior do Gatestone Institute sediado em Nova Iorque. Ele também é colaborador sênior do European Politics do Grupo de Estudios Estratégicos / Strategic Studies Group sediado em Madri. Siga-o no Facebook e no Twitter.
Tradução: Joseph Skilnik Do site: pt.gatestoneinstitute.org




terça-feira, 27 de setembro de 2016

POR QUE LIXEIROS E PROFESSORES GANHAM MENOS QUE ARTISTAS E JOGADORES DE FUTEBOL


O mundo real não funciona exatamente como quer os seus sentimentos e desejos

Por que professores não ganham tanto quanto jogadores de futebol e apresentadores de televisão? Por que lixeiros não ganham tanto quanto professores e artistas?

Exemplos como esse são sempre invocados para mostrar como os mercados são injustos: qualquer sistema que pague a X mais do que paga a Y — sendo que Y parece desempenhar um trabalho muito mais socialmente importante — não pode ser um sistema moral, com boas prioridades.

Mas esta conclusão está errada. Há motivos lógicos que explicam por que financistas, artistas e jogadores de futebol ganham muito mais que lixeiros e professores.

1. Não existe isso de "o real valor" de uma profissão

Há uma ideia intuitiva, mas totalmente errada, de que bens e serviços possuem um valor inerente, um valor intrínseco, o qual pode ser objetivamente determinado por nós. 

Intuições como essa acompanham a humanidade há séculos, sendo provavelmente mais bem representada pela teoria do valor-trabalho. Karl Marx (entre outros) acreditava que o valor de um bem ou serviço poderia ser determinado pela quantidade de "trabalho socialmente necessário" para se produzir esse bem ou serviço. Marx também acreditava que era possível determinar objetivamente o "valor de uso" de um produto ou serviço — qual o real valor que aquele bem ou serviço possui em uso; a maneira concreta na qual um bem ou serviço atende às necessidades humanas.

Determine esses valores (valor-trabalho e valor de uso), e será possível descobrir quanto deveriam ganhar os lixeiros e professores e quanto deveriam ganhar os banqueiros, artistas e jogadores de futebol.

Mas a verdadeira ciência econômica nos ensina que isso é impossível de ser feito. Não há uma maneira objetiva de estipular quanto um bem ou serviço deveria valer no mercado. O valor de um bem ou serviço é determinado por um complexo arranjo de fatores (oferta, demanda e a existência de substitutos de igual ou semelhante qualidade). Esses fatores fazem com que seja impossível determinar objetivamente o valor objetivo de um bem ou serviço.

Para determinar quanto algo vale, você tem, antes de tudo, descobrir quanto aquele algo vale para alguém. O valor de um bem ou serviço é amplamente determinado pelo seguinte valor subjetivo: quanto as pessoas estão dispostas a pagar por ele.

Pode parecer lamentável que as pessoas estejam dispostas a pagar mais por X do que por Y, sendo que, para você, Y parece muito mais valioso do que X. Porém, dizer que Y deveria ganhar mais do que X significa dizer a todas as pessoas que os valores e prioridades delas estão errados, e que apenas os seus valores é que estão certos.

2. Pense em termos de substitutos

Se um lixeiro, um professor, um artista e um jogador de futebol saíssem de seus respectivos empregos, qual setor teria mais facilidade para contratar um substituto se o salário oferecido para todas as profissões fosse o mesmo?

Coletar lixo é, sem dúvida nenhuma, um trabalho extremamente importante, mas as qualificações necessárias para se tornar um lixeiro são geralmente mais baixas do que as necessárias para se tornar um artista ou um jogador de futebol. Parcialmente por causa disso, a oferta de candidatos para substituir o lixeiro será maior do que para as outras profissões. 

O mesmo raciocínio é válido para professores. A importância da profissão é indiscutível, mas a oferta de mão-de-obra é igualmente grande (para escolas).

Por essa razão (dentre outras), a emissora de televisão certamente terá de ofertar um salário maior do que a empresa de lixo e a escola para atrair bons candidatos. O mesmo vale para o time de futebol.

3. Pense em termos de criação subjetiva de valor

Além da oferta, da demanda e da existência de substitutos, há outro fator crucial: o valor gerado.

O que realmente determina a sua remuneração no mercado não é a beleza da sua profissão, mas sim o valor que você consegue gerar tanto para quem consome seu bem ou serviço quanto para quem paga seu salário.

Um bom professor pode realmente gerar valor para seus alunos e para os pais de seus alunos, mas ele gera valor para uma quantidade pequena de pessoas ao ano. Quantos alunos diferentes ele tem? Provavelmente, não mais do que 200 (um número bem exagerado). Portanto, ele cria valor para 200 pessoas por ano. Pode-se dizer que é uma produtividade extremamente baixa. 

Já artistas e jogadores de futebol têm alcance nacional (alguns, mundial). Milhões de pessoas consomem voluntariamente seus serviços, e eles geram retornos — goste você ou não deles — para seus empregadores e patrocinadores semanalmente, que estão satisfeitos em lhes pagar salários milionários. Se não gerassem valor, seria simplesmente impossível terem esses salários.

O professor, por melhor que seja a qualidade do seu serviço, alcança um número limitado de pessoas. Já os artistas e jogadores de futebol alcançam milhões de pessoas. Com um público consumidor maior e com menos concorrência em sua área, é natural que estes últimos ganhem mais que professores.

De novo: o que você pensa sobre essas profissões é imaterial. O fato concreto é que tais pessoas geram grandes retornos para seus empregadores. E geram grandes retornos porque há milhões de pessoas voluntariamente dispostas a consumir seus bens ou serviços.

4. Leve tudo em consideração

Salários, no mercado, não são e não podem ser determinados exclusivamente em termos daquilo que você, que é um mero observador externo, pensa a respeito de uma profissão, e de como você acredita que ela deveria ser remunerada.

Empresas têm de levar em conta o valor que cada empregado gera, a demanda por aquele serviço, a oferta de mão-de-obra de igual qualidade e o custo de se obter e manter bons empregados. Tudo isso se transforma em diferenças salariais.

O salário de uma pessoa irá refletir o tanto que suas habilidades particulares e sua experiência podem ser facilmente substituídas pelas de outro candidato àquela vaga de emprego. Ao passo coletar lixo é uma atividade de alto valor social, poucas pessoas irão perceber se um lixeiro for trocado por outro. O mesmo não se aplica para artistas e jogadores de futebol.

Se o sistema de coleta de lixo repentinamente desaparecesse, todos nós estaríamos dispostos a pagar mais para que alguém se livrasse do lixo para nós. Porém, há muitas pessoas e muitas empresas capacitadas e dispostas a fazer isso. A concorrência entre elas levaria a uma redução dos preços. 

Já a concorrência para substituir, com a mesma qualidade, artistas e jogadores de futebol não é muito abundante.

Conclusão

O mercado é simplesmente uma arena na qual compradores e vendedores de bens e serviços compram e vendem bens e serviços. 

Preços são simplesmente o resultado dessa interação, na qual as pessoas tomam decisões sobre o que estão dispostas vender ou comprar, e por quanto.

Todos nós temos sentimentos e boas intenções sobre o real valor social de determinados empregos. Mas, no mundo real, é impossível querer que lixeiros e professores ganhem mais que artistas e jogadores de futebol. A explicação é puramente econômica. 

O que você pensa a respeito de determinadas profissões é totalmente irrelevante perante o que o resto do mundo (mais de 7 bilhões de pessoas), que voluntariamente consome os bens e serviços destas profissões, também pensa sobre ela. 
ppor Kevin Currie-Knight Do site: http://www.mises.org.br/



segunda-feira, 26 de setembro de 2016

AÇUCAR X GORDURA


Como a indústria do açúcar empurrou a culpa para a gordura
Divulgação 

Máquinas agrícolas durante colheita de cana-de-açúcar em Mirante do Paranapanema (SP)

A indústria do açúcar dos EUA pagou cientistas nos anos 60 para que minimizassem a conexão entre o açúcar e doenças cardíacas, e para que promovesse a gordura saturada como responsável pelo problema, mostram documentos históricos que acabam de ser divulgados.

Documentos internos da indústria do açúcar, descobertos recentemente por uma pesquisadora na Universidade da Califórnia em San Francisco e publicados nesta semana pela "JAMA Internal Medicine", uma revista científica, sugerem que cinco décadas de pesquisa sobre o papel da nutrição nas doenças cardíacas, o que inclui muitas recomendações dietéticas que continuam a ser seguidas ainda hoje, podem ter sido orientadas basicamente pelas prioridades do setor de açúcar.

"Eles conseguiram tirar a discussão sobre o açúcar dos trilhos por décadas", disse Stanton Glantz, professor de medicina na Universidade da Califórnia em San Francisco e autor do estudo.

Os documentos demonstram que uma associação setorial chamada Fundação da Pesquisa do Açúcar, hoje conhecida como Associação do Açúcar, pagou a três cientistas da Universidade Harvard o equivalente a cerca de US$ 50 mil em dólares atuais para que publicassem uma revisão das pesquisas sobre açúcar, gordura e doenças cardíacas, em 1967. Os estudos usados para a revisão foram selecionados cuidadosamente pela associação do setor de açúcar, e o artigo, publicado pela prestigiosa revista médica "New England Journal of Medicine", minimizava a conexão entre o consumo de açúcar e a saúde cardíaca, e atribuía muitos efeitos nocivos à gordura saturada.

Ainda que o tráfico de influência revelado pelos documentos tenha acontecido quase 50 anos atrás, relatórios mais recentes demonstram que a indústria do alimento continua a influenciar a ciência da nutrição.

No ano passado, um artigo publicado pelo "New York Times" revelou que a Coca-Cola, maior fabricante mundial de bebidas açucaradas, havia fornecido milhões de dólares em verbas a pesquisadores cujo trabalho buscava minimizar a conexão entre bebidas açucaradas e a obesidade. Em junho, a agência de notícias Associated Press reportou que fabricantes de confeitos bancaram estudos segundo os quais crianças que comem doces tendem a pesar menos do que aquelas que não o fazem.

Os cientistas da Harvard e os executivos da indústria do açúcar com quem eles colaboraram já morreram. Um dos cientistas que recebeu pagamentos da indústria do açúcar foi o Dr. Mark Hegsted, que mais tarde em sua carreira se tornou diretor de nutrição no Departamento da Agricultura dos Estados Unidos, onde em 1977 ele ajudou a redigir um documento que serviu como precursor das futuras normas do governo federal quanto a uma boa nutrição. Outro beneficiário foi o Dr. Frederick Stare, diretor do departamento de nutrição em Harvard.

Em comunicado divulgado como resposta ao artigo da "JAMA", a Associação do Açúcar afirma que a revisão de 1967 foi publicada em um momento na qual as revistas científicas tipicamente não requeriam que os pesquisadores revelassem a proveniência de suas verbas. O "New England Journal of Medicine" só passou a solicitar esse tipo de informação a partir de 1984.

O setor "deveria ter exercitado mais transparência em todas as suas atividades de pesquisa", afirmou a Associação do Açúcar em seu comunicado. Mesmo assim, ela defendeu pesquisas com financiamento setorial e afirmou que elas desempenham papel importante e informativo no debate científico. A organização afirmou que décadas de pesquisas haviam concluído que "o açúcar não tem papel único nas doenças cardíacas".

DEBATE DESVIRTUADO

As revelações são importantes porque o debate quanto aos males relativos do açúcar e da gordura saturada continua até hoje, disse o Dr. Glantz. Por muitas décadas, as autoridades de saúde encorajaram os norte-americanos a reduzir seu consumo de gordura, o que levou muita gente a consumir alimentos com baixo teor de gordura e alto teor de açúcar, fator ao qual hoje muitos especialistas atribuem a culpa pela crise de obesidade.

"Foi uma coisa muito inteligente, o que a indústria do açúcar fez, porque estudos de revisão, especialmente se forem publicados em uma revista importante, tendem a dar forma à discussão científica mais ampla", ele disse.

O Dr. Hegsted usou sua pesquisa para influenciar as recomendações nutricionais do governo, que enfatizavam a gordura saturada como causa de doença cardíaca, e em geral caracterizavam o açúcar como calorias "vazias" associadas a problemas dentários. Hoje, os alertas quanto à gordura saturada continuam a ser uma das recomendações básicas nas normas nutricionais do governo, ainda que nos últimos anos a Associação Cardíaca Americana, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e outras autoridades de saúde tenham também começado a alertar que adicionar açúcar demais à dieta pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares.

Marion Nestle, professora de nutrição, estudos da alimentação e saúde pública na Universidade de Nova York, escreveu um editorial publicado em companhia do novo estudo no qual ela afirma que os documentos oferecem "prova convincente" de que o setor de açúcar havia iniciado pesquisas "com o objetivo expresso de inocentar o açúcar como fator importante de risco de doenças coronárias".

"Para mim, isso é revoltante", ela afirmou. "Jamais vemos exemplos assim tão gritantes".

O Dr. Walter Willett, diretor do departamento de nutrição na Escola T. H. Chan de Saúde Pública, Universidade Harvard, disse que as regras acadêmicas sobre conflitos de interesse mudaram muito dos anos 60 para cá, mas que pesquisas bancadas pela indústria servem como lembrete do motivo "para que pesquisas devam ser bancadas por verbas públicas e não por verbas empresariais".

O Dr. Willett disse que os pesquisadores dispunham de dados limitados para avaliar o risco relativo do açúcar comparado ao da gordura. "Dados os dados que temos hoje, demonstramos que os carboidratos refinados, e especialmente as bebidas açucaradas, são fatores de risco para a doença cardiovascular, mas que o tipo de gordura consumida na dieta também é muito importante", ele disse.

DOCUMENTOS

O estudo da "JAMA" se baseou em milhares de páginas de correspondência e outros documentos que Cristin Kearns, pesquisadora de pós-doutorado na Universidade da Califórnia em San Francisco, localizou nos arquivos de Harvard, da Universidade do Illinois e em outras bibliotecas.

Os documentos demonstram que, em 1964, John Hickson, importante executivo da indústria do açúcar, discutiu com outras pessoas do setor um plano para influenciar a opinião pública "por meio de nossas pesquisa, informação e programas legislativos".

Na época, estudos haviam começado a apontar para uma correlação entre dietas com alto teor de açúcar e a elevada incidência de doenças cardíacas nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, outros cientistas, entre os quais o renomado fisiologista Ancel Keys, de Minnesota, estavam investigando uma teoria rival, de que a gordura saturada e a presença de colesterol na dieta é que acarretavam maior risco de doença cardíaca.

Hickson propôs rebater as constatações alarmantes sobre o açúcar com pesquisas bancadas pelo setor. "Então poderemos publicar dados que refutem nossos detratores', ele escreveu.
Em 1965, Hickson buscou a ajuda dos pesquisadores de Harvard para que escrevessem uma revisão com o objetivo de negar os estudos negativos quanto ao açúcar. Eles receberam US$ 6,5 mil, o equivalente a US$ 49 mil hoje. Hickson selecionou os estudos para que eles revisassem, e deixou claro que desejava um resultado favorável ao açúcar.

O Dr. Hegsted, de Harvard, reassegurou os executivos do açúcar. "Estamos bem cientes de seu interesse específico", ele escreveu, "e vamos cobrir esse tema da melhor maneira que pudermos".

Enquanto trabalhavam em sua resenha, os pesquisadores de Harvard encaminharam rascunhos iniciais a Hickson e os discutiram com ele; o executivo respondeu que estava satisfeito com aquilo que estavam escrevendo. Os cientistas de Harvard também descartaram os dados quanto ao açúcar como fracos, e depositaram confiança muito maior nos dados que implicavam a gordura saturada.

"Permita-me garantir que era isso que tínhamos em mente, e mal podemos esperar pela publicação", escreveu Hickson.

Depois que a revisão foi publicada, o debate quanto ao papel do açúcar nas doenças cardíacas morreu, enquanto dietas com baixo teor de gordura conquistaram o endosso de muitas autoridades de saúde, disse o Dr. Glantz.

"Pelos padrões atuais, eles se comportaram muito mal", ele disse.
Por: Anahad O"connor  Publicado originalmente no: New York Times 16/09/2016 
Tradução de PAULO MIGLIACCI Publicado no Brasil: Folha de São Paulo

sábado, 24 de setembro de 2016

A EUROPA DEBATE O USO DO BURQUÍNI

-  "Nós iremos colonizar vocês com essas leis democráticas." — Yusuf al-Qaradawi, clérigo islâmico egípcio e presidente da União Internacional de Sábios Muçulmanos.


-  "Praias, assim como qualquer espaço público, devem estar fora de asseverações religiosas. O burquíni é um projeto político antissocial com o propósito especial de subjugar as mulheres. Isso não é compatível com os valores da França e da República. Diante de tais provocações a República tem a obrigação de se defender." — Primeiro Ministro da França Manuel Valls.

-  Segundo o prefeito de Villeneuve-Loubet, a deliberação do Supremo Tribunal contra a proibição dos burquínis, "longe de apaziguar os muçulmanos, irá, na realidade, aumentar tanto as tensões quanto as paixões."

-  "Praias são iguais as ruas, onde o uso ostentoso de símbolos religiosos também é rejeitado por dois terços dos franceses." — Jérôme Fourquet, diretor do Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop).


A cidade francesa de Nice suspendeu a polêmica proibição do uso de burquínis muçulmanos depois que um tribunal decidiu que a proibição era ilegal. A proibição de trajes de banho que cobrem o corpo inteiro também foi suspensa em Cannes, Fréjus, Roquebrune e Villeneuve-Loubet, mas continuam vigorando em pelo menos 25 cidades da costa francesa.

A controvérsia em torno dos burquínis — um neologismo que mistura a burca com o biquíni — reacendeu um debate de longa data em relação aos códigos de vestimenta islâmicos na França e em outros países europeus seculares (consulte o apêndice abaixo).

Em 26 de agosto o Conselho de Estado, que é o tribunal de última instância da Françadeliberou que as autoridades municipais em Villeneuve-Loubet, uma cidade costeira na Riviera francesa, não tinham a prerrogativa de proibir os burquínis. O tribunal considerou que a proibição — que foi emitida depois do ataque jihadista em Nice em 14 de julho, no qual 86 pessoas foram massacradas — era "um ataque violento, claramente ilegal, contra as liberdades fundamentais incluindo a liberdade de ir e vir e a liberdade de consciência." Os juízes deliberaram que as autoridades locais só poderiam restringir as liberdades individuais se houvesse um "claro indício de perigo" à ordem pública. Não havia, segundo eles, nenhuma evidência de perigo dessa natureza.

Embora a deliberação se referisse somente à proibição em Villeneuve-Loubet, observadores salientaram que a decisão abrirá um precedente legal em trinta cidades que também adotaram a proibição dos burquínis.

A decisão do Supremo Tribunal revogou a deliberação do Tribunal de Primeira Instância emitida em 22 de agosto, proferindo que a proibição do burquíni era "necessária, adequada e proporcional" para garantir a ordem pública.

A Associação contra a Islamofobia na França (CCIF) e a Liga dos Direitos Humanos (LDH) entraram com uma ação na justiça. Os dois grupos se comprometeram a entrar com ações judiciais contra qualquer município que proíba o burquíni, ressaltando que a proibição viola a liberdade religiosa dos muçulmanos na França.

Patrice Spinosi, advogado da LDH, salientou que na ausência de uma clara ameaça à ordem pública, o Supremo Tribunal "se pronunciou e denotou que prefeitos não têm o direito de estabelecer limites no tocante ao uso de símbolos religiosos em espaços públicos. Vai contra a liberdade de religião, que é uma liberdade fundamental."

Em contrapartida, os defensores da proibição — abrangendo todo o espectro político — argumentam que os burquínis são artigos de vestuário indicando conotação política, não religiosa.

O cronista francês Yves Thréard fez o seguinte alerta no jornal Le Figaro:

"Na pior das hipóteses o debate se arrastaria e se enveredaria em considerações totalmente alheias a esta vestimenta afrontosa. Secularismo e religião são irrelevantes neste caso. O burquíni não é um ditame islâmico e sim mais uma manifestação do Islã político, militante, destrutivo, buscando questionar o nosso modo de vida, nossa cultura, nossa civilização. Véus em escolas, orações nas ruas, menus halal nas escolas, apartheid de gênero nas piscinas, hospitais, ônibus escolares, nicabes, burcas... nos últimos trinta anos esta infiltração tem minado a nossa sociedade, buscando desestabilizá-la. Está na hora de bater a porta na cara dela. Youssef al-Qaradawi, famoso pregador egípcio, ex-conferencista na França, alertou: nós iremos colonizar vocês com essas leis democráticas. Com a nossa indiferença, bem como com a nossa ingenuidade, temos sido cúmplices nesse tópico sórdido e mortal."

Segundo o Primeiro Ministro da França Manuel Valls, os burquínis são "a afirmação do Islã político no espaço público." Em uma entrevista concedida ao La Provence, Valls, um socialista,salientou:

"Eu apoio aqueles que emitiram as proibições... Praias, assim como qualquer espaço público, devem estar fora de asseverações religiosas. O burquíni é um projeto político antissocial, com o propósito especial de subjugar as mulheres. Atrás do burquíni encontra-se a ideia de que as mulheres são, pela própria natureza, meretrizes, impuras que devem ficar completamente cobertas. Isso não é compatível com os valores da França e da República. Diante de tais provocações a República tem a obrigação de se defender."

Laurence Rossignol, socialista, Ministra da Família, Juventude e Direitos das Mulheres, também afirmou apoiar a proibição dos burquínis. Em uma entrevista concedida ao Le Parisien, ela ressaltou:

"O burquíni não é uma nova linha de trajes de banho. É a versão da burca para a praia e tem a mesma lógica: esconder o corpo das mulheres para melhor controlá-las. Por trás disso há uma visão profundamente arcaica do lugar das mulheres na sociedade. Há a ideia de que, pela própria natureza, as mulheres são impuras e imorais devendo portanto esconder seu corpo e desaparecer do espaço público.

"O burquíni causa tanto alvoroço devido à sua dimensão política coletiva. Ele não diz respeito apenas às mulheres que o usam. O burquíni é o símbolo de um projeto político hostil à diversidade e à autonomia."
O primeiro ministro francês Manuel Valls, declarou recentemente que "o burquíni é um projeto político antissocial, com o propósito especial de subjugar as mulheres... ele não é compatível com os valores da França e da República. Diante de tais provocações, a República tem a obrigação de se defender." Na foto acima: quatro policiais em Nice, França, são retratados obrigando uma mulher a remover parte das suas roupas, porque o traje viola a proibição do burquíni na cidade, 23 de agosto. Eles também a multaram pela infração. (imagem: captura de tela da NBC News)

O ex-presidente francês Nicolas Sarkozy, que recentemente anunciou que irá se candidatar às eleições presidenciais de 2017, salientou que, se eleito, irá "mudar a constituição" e pressionar pela proibição do burquíni em todo o território nacional. Em um comício de campanha em 26 de agosto, Sarkozy, um conservador, ressaltou:

"Eu serei o presidente que restabelecerá a autoridade do estado. Eu quero ser o presidente que garantirá a segurança da França e de cada francês...

"Eu me recuso permitir que o burquíni se imponha nas praias e piscinas francesas... haverá uma lei para proibi-lo em todo o território da República. Nossa identidade está ameaçada ao aceitarmos uma política de imigração que não faz o menor sentido."

Em entrevista concedida ao Le Figaro, Sarkozy deu a seguinte explicação:

"O uso do burquíni é um ato político militante, uma provocação. As mulheres que o usam estão testando a resistência da República francesa. Se não pusermos um fim a isto, haverá o risco de que em dez anos as jovens muçulmanas que não quiserem usar o burquíni ou o véu serão estigmatizadas e pressionadas a usá-lo."

Henri Leroy, prefeito de Mandelieu-La-Napoule, uma das primeiras cidades francesas a proibir o burquíni, assinalou que os residentes muçulmanos deveriam ser lembrados que "em primeiro lugar eles são franceses e em segundo lugar muçulmanos." Ele acrescentou: "nossa República tem tradições e costumes que precisam ser respeitados".

O prefeito conservador de Cannes, David Lisnard, ressaltou que o burkini é um "uniforme símbolo do extremismo islâmico." O administrador da cidade Thierry Migoule realçou que o burquíni é um "traje ostensivo que sinaliza fidelidade aos movimentos terroristas que declararam guerra contra nós."

O prefeito de Fréjus, David Rachline, ressaltou que a deliberação do Supremo Tribunal foi uma "vitória para o Islã radical, para o Islã político, que está avançando em nosso país."

Lionnel Luca, prefeito conservador de Villeneuve-Loubet, assinalou que a proibição do burquíni é necessária para "conter a gradual islamização que está progredindo em nosso país." Ele acrescentou que a deliberação do Supremo Tribunal, "longe de apaziguar os muçulmanos, irá, na realidade, aumentar tanto as tensões quanto as paixões."

Ange-Pierre Vivoni, o prefeito socialista da cidade corsa de Sisco, impôs a proibição de burquínis "para proteger a população", na esteira de um alvoroço causado por muçulmanos ocorrido em 14 de agosto, quando um turista tirou uma fotografia de várias mulheres usando burquíni nadando num riacho. Mais de 400 pessoas acabaram entrando na confusão, na qual os corsos locais entraram em confronto com migrantes do Norte da África. No dia seguinte, mais de 500 corsos marcharam pela cidade gritando "às armas! Esta é nossa casa!"

Pesquisas de opinião mostram amplo apoio público à proibição do burquíni. De acordo com um levantamento da Ifop publicado pelo Le Figaro em 25 de agosto, 64% dos franceses são contra o burquíni nas praias; apenas 6% são a favor. O diretor da IFOP Jérôme Fourquet ressaltou: "os resultados são semelhantes aos que nós tivemos em abril em relação ao uso dos véus nas ruas (63% eram contra). Praias são iguais as ruas, onde o uso ostentoso de símbolos religiosos também é rejeitado por dois terços dos franceses."

Soeren Kern é colaborador sênior do Gatestone Institutesediado em Nova Iorque. Ele também é colaborador sênior do European Politics do Grupo de Estudios Estratégicos / Strategic Studies Group sediado em Madri. Siga-o no Facebook e no Twitter.
Apêndice

Proibição da Burca em Países Europeus

A controvérsia francesa em torno dos burquínis — um neologismo que mistura a burca com o biquíni — reacendeu um debate de longa data em relação aos códigos de vestimenta islâmicos em outros países europeus.

Áustria. Em 13 de agosto Norbert Hofer, candidato a presidente do Partido da Liberdade da Áustria (FPÖ), defendeu a proibição da burca. "Acho que faz sentido", ressaltou. Vários dias depois, o Ministro das Relações Exteriores e da Integração Sebastian Kurz do Partido Popular da Áustria (ÖVP) ora no poder, ressaltou que uma nova lei de integração incluirá restrições em relação a burca. "Um véu de corpo inteiro está dificultando a integração," salientou Kurz. "A burca não é um símbolo religioso, mas um símbolo de uma sociedade contrária à nossa sociedade".

O ministro do interior Wolfgang Sobotka disse que a proibição total das burcas seria "constitucionalmente problemática." Ele ressaltou que uma proibição parcial das burcas nos postos fronteiriços e na direção de automóveis é mais realista.

Uma pesquisa de opinião de alcance nacional publicada em 25 de agosto constatou que 75% dos austríacos são a favor da proibição da burca.

O FPÖ já havia pedido a proibição da burca em julho de 2014. Naquela época Kurz rejeitou a proposta, tachando-a de "debate artificial".

Em junho de 2016, a cidade de Hainfeld se tornou o primeiro município da Áustria a proibir o burquíni em piscinas públicas. Em Viena a mídia local tem reportado um "aumento significativo" no número de mulheres usando burquínis em piscinas públicas na capital.

Países Bálticos. Em abril de 2016 o governo letão anunciou uma proposta para proibir a burca. O governo salientou que a finalidade da lei, que espera irá entrar em vigor em 2017, é garantir que imigrantes muçulmanos respeitem os valores do país. A proibição da burca também está sendo debatida na Estônia e na Lituânia.

Bélgica. Em julho de 2011, a Bélgica se tornou o segundo país europeu, depois da França, a proibir a burca. Aqueles que desrespeitarem a lei terão que pagar uma multa de €137 ($150) além de poderem ser condenados a uma pena de até sete dias no xilindró. Nos cinco anos desde que a proibição entrou em vigor, mais de 70 mulheres foram multadas por usar a peça de roupa em público. Este número inclui 67 mulheres em Bruxelas e sete em Liege.

Em agosto de 2016, Nadia Sminate, uma parlamentar belga de origem marroquina/flamenga, defendeu a proibição total da burca. Em entrevista concedida ao De Standaard, ela ressaltou:

"Nós temos que evitar, a todo custo, que mulheres andem por aí de burquínis na região de Flanders. Não somente na piscina e também não apenas na praia. Eu não acho que as mulheres querem andar na praia nessa monstruosidade em nome da religião. Se permitirmos isso estaremos colocando as mulheres à margem da sociedade. Vivemos na região de Flandres, somos nós que fazemos as leis. Se dissermos que temos que estabelecer limites e impor os nossos valores, temos que cumprir com a nossa palavra."

Grã-Bretanha. Em 31 de agosto, um levantamento do YouGov constatou que a maioria dos britânicos são a favor da proibição da burca em espaços públicos. De acordo com a pesquisa, 57% dos britânicos apoiam a proibição; 25% são contra. O único grupo, por idade, a se opor à proibição foi o de 18 a 24 anos de idade; os demais foram a favor, o grupo dos mais idosos, acima de 65 anos, apoiou a proibição na proporção de 78% a 12%. Os principais partidos políticos também mantiveram a grande proporcionalidade de votantes a favor da proibição. Outra pergunta feita pelo YouGov constatou que 46% dos britânicos querem que o burquíni seja proibido, 30% são contra.

Bulgária. Em junho de 2016 o parlamento búlgaro aprovou uma nova lei que proíbe a burca. A medida torna a Bulgária o terceiro país europeu a passar uma lei, depois da França e da Bélgica. A proibição se aplica a cidadãos búlgaros bem como a qualquer cidadão que esteja no país em caráter temporário.

A lei estipula que vestimentas que escondem o rosto não poderão ser usadas em repartições públicas centrais e locais, escolas, instituições culturais e locais de recreação pública, esportes e comunicações da Bulgária.

Cobrir a cabeça, olhos, ouvidos e boca serão permitidas somente em casos de necessidade, como por exemplo, razões de saúde, necessidades profissionais e em eventos esportivos e culturais. A proibição também se aplicará às casas de culto.

A lei prevê uma multa de 200 leves (€100; $115) para a primeira violação da proibição. Na segunda e demais violações, a multa é de 1500 leves (755€; $430) e perda de benefícios sociais.

Aquele que persuadir outros a cobrirem seus rostos estará sujeito a uma pena de até três anos de prisão e multa de 5000 leves (€2.500; $2.850). Se a pessoa persuadida a cobrir o rosto for menor de idade, a pena aumenta para um máximo de cinco anos de prisão e multa de até 10.000 leves (€5.000; $5.700).

República Tcheca. Em março de 2016 uma aluna muçulmana entrou com uma ação na justiça contra uma escola de enfermagem em Praga, depois que ela foi proibida de usar a hijab (véu muçulmano que cobre a cabeça e o pescoço) durante as aulas. A escola alegou que os alunos não devem ficar com as cabeças cobertas em sala de aula.

Dinamarca. Em agosto de 2016 o Partido do Povo Dinamarquês divulgou uma nota assinalando que apresentará ao parlamento uma proposta para proibir a burca. Em entrevista concedida ao Metro Express, o porta-voz do partido Kenneth Kristensen Berth ressaltou que a vestimenta deve ser proibida por motivos de segurança:

"Há inúmeros casos, principalmente no Oriente Médio, onde pessoas vestidas com burcas eram na realidade homens-bomba. É só uma questão de tempo para que isso também venha a acontecer na Europa. Acabo de regressar de Londres onde o número de burcas nas ruas aumentou consideravelmente. Elas podem ser usadas com o objetivo de plantar bombas sem serem detectadas."

França. Em abril de 2011 a França se tornou o primeiro país europeu a proibir a burca e a niqabe. Em julho de 2014 o Tribunal Europeu de Direitos Humanos manteve a proibição.

Depois do ataque jihadista em Nice em julho de 2016, no qual 86 pessoas foram mortas, pelo menos 30 cidades proibiram o burquíni em praias públicas.

Em 26 de agosto o Conselho de Estado, que é o tribunal de última instância da Françadeliberou que as autoridades municipais em Villeneuve-Loubet, uma cidade costeira na Riviera francesa, não tinham a prerrogativa de proibir os burquínis. Embora a decisão se aplique somente à proibição em Villeneuve-Loubet, observadores assinalaram que a decisão abrirá um precedente jurídico para o resto da França.

Pesquisas de opinião mostram amplo apoio público à proibição do burquíni. De acordo com um levantamento da Ifop publicado pelo Le Figaro em 25 de agosto, 64% dos franceses são contra o burquíni nas praias; apenas 6% são a favor. O diretor da IFOP Jérôme Fourquet ressaltou: "os resultados são semelhantes aos que nós tivemos em abril em relação ao uso dos véus nas ruas (63% eram contra). Praias são iguais as ruas, onde o uso ostentoso de símbolos religiosos também é rejeitado por dois terços dos franceses."

Alemanha. Em 18 de agosto, o Ministro do Interior Thomas de Maizière anunciou uma proposta de "proibição parcial da burca" que proibiria o uso de véus muçulmanos em espaços públicos, incluindo jardins de infância, escolas, universidades, repartições públicas e na direção de veículos.

"Rejeitamos os véus que cobrem o rosto inteiro," ressaltou de Maizière. "Não só a burca, qualquer véu que mostre apenas os olhos. Isso não cabe em nossa sociedade, na nossa maneira de nos comunicarmos, na nossa coesão social. É por isso que exigimos que vocês mostrem seus rostos."

Em entrevista concedida em 12 de agosto ao jornal Bild, Julia Klöckner, vice-presidente da União Democrata Cristã (CDU) salientou:

"O véu que cobre o rosto inteiro dificulta e muito a integração das mulheres em nosso país. Ele não é um sinal de diversidade religiosa, mas representa uma imagem degradante da mulher. É proibido na França e o Tribunal Europeu de Direitos Humanos tem mantido a proibição."

Em entrevista concedida em 30 de julho ao jornal Die Welt, o político Jens Spahn da CDUrealçou:

"A proibição do véu que cobre integralmente o rosto, a niqabe bem como a burca, já deveria ter sido imposta há muito tempo, como um alerta para o mundo. Imagine como seria essa nossa conversa se nós estivéssemos totalmente cobertos. Eu não quero ver nenhuma burca neste país. Nesse sentido eu souburcafóbico".

Em um editorial escrito para o jornal Bild por Bassam Tibi, ex-professor da Universidade de Göttingen, que se autodenomina "europeu muçulmano," salientou que ele dá total apoio à proibição da burca:

"A proibição da burca seria uma medida política inteligente contra certas pessoas que se isolam em sociedades paralelas, para que a integração inclusiva de migrantes muçulmanos seja bem-sucedida e para a segurança da República Federal da Alemanha".

Uma nova pesquisa de opinião publicada pela Infratest dimap em 26 de agosto constatou que 81% dos alemães são a favor da proibição da burca em espaços públicos. A pesquisa também descobriu que 51% apoiam a proibição total da burca.

Em 22 de agosto, um tribunal em Osnabrück deliberou que uma estudante não poderá usar o véu em sala de aula naquela cidade. A escola Sophie Scholl tinha a princípio aceito a estudante mas mudou a decisão quando ela insistiu em usar a niqabe na sala de aula. Funcionários da escola disseram que a comunicação aberta necessária na educação não seria possível se somente os olhos da estudante estivessem visíveis.

Em junho a cidade bávara de Neutraubling proibiu os burquínis em piscinas públicas após frequentadoras reclamarem que a vestimenta não é higiênica. O prefeito Heinz Kiechle enfatizou: "não compreendo porque é necessário usar um burquíni ao anoitecer quando a piscina está reservada apenas para a natação das senhoras."

Itália. A partir de 1º de janeiro de 2016, tanto a burca quanto a niqabe estão proibidas em todas as repartições e hospitais públicos na região nordeste da Lombardia.

Em 17 de agosto, o Ministro do Interior Angelino Alfano declarou que a Itália não irá proibir o burquíni porque tal medida poderia provocar um retrocesso na comunidade muçulmana. Em entrevista concedida ao Corriere della Sera, ele ressaltou:

"O ministro do interior tem a responsabilidade de garantir a segurança pública e escolher o grau de rigor que jamais se transforme em provocação, que potencialmente provoque ataques."

Malta. Em outubro de 2015 o governo debateu a proibição de burcas em público depois que apareceu uma fotografia mostrando uma mulher dirigindo um automóvel enquanto usava um véu que cobria o rosto inteiro. O Artigo 338 do código penal estipula que é uma ameaça à ordem pública alguém "em qualquer lugar público usar uma máscara ou usar um disfarce, exceto quando e na forma permitida pela lei." Alguns membros do governo disseram que a lei existente deveria ser emendada no tocante, especificamente, à proibição da burca.

O imã local Mohammed Elsadi declarou que a proibição da burca ameaçaria a integração e a harmonia social em Malta. Ele acrescentou: "em um mundo globalizado, onde pessoas de diferentes culturas vivem juntas e se interagem das mais variadas formas e em muitas esferas da vida, é mais benéfico para qualquer país conceder do máximo de liberdades individuais possível." Ele ressaltou que os muçulmanos deveriam ter "toda a liberdade de exercer suas próprias normas culturais e o modo de vida que melhor lhes aprouver".

A Ministra da Igualdade Helena Dalli rebateu:

"Há milhares de muçulmanos em Malta e muitos estão aqui há muito tempo, até mesmo por várias gerações. A burca e a niqabe não são peças de vestuário que nós associaríamos a esta comunidade, de modo que uma proibição mais específica se referindo àquelas que cobrem o rosto inteiro não deverá, de forma alguma, ter impacto na maioria dos muçulmanos."

Holanda. Em maio de 2015 o governo holandês aprovou uma proibição parcial dos véus islâmicos que cobrem o rosto em transportes coletivos e em áreas públicas tais como escolas e hospitais. Os infratores estão sujeitos a uma multa de €405 ($450). A proibição não se aplica ao uso da burca ou da niqabe na rua.

Noruega. Em agosto de 2016 uma comissão multipartidária criada para tratar da integraçãopropôs a proibição de burcas e véus em instituições públicas e a proibição de hijabes em escolas públicas. Em um relatório de 50 páginas intitulado "Dez Mandamentos para Melhor Integração", a comissão solicitou a criação de diretrizes nacionais inequívocas sobre os códigos de vestimentas islâmicas para a melhoria da integração.

"Para melhorar a integração temos que incentivar maior participação na vida pública" realçouJette Christensen do Partido Trabalhista. "Portanto, não podemos permitir rostos cobertos."

Maryan Keshvari do Partido Progressista acrescentou: "não podemos permitir o principal uniforme islâmico nas escolas norueguesas"

Em 2013 o parlamento norueguês rejeitou a proibição da burca com base na argumentação de que a Noruega poderia ser censurada pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos (ECHR). Desde que o ECHR manteve a proibição na França em julho de 2014, os defensores noruegueses da proibição têm articulado, sem sucesso, convencer o parlamento a aprovar uma proibição semelhante na Noruega.

Eslovênia. Em novembro de 2015 o Partido Democrático (SDS), de oposição, apresentou um projeto de lei para proibir burcas e véus em público e restringir as condições para a obtenção de asilo na Eslovênia.

"Quando estrangeiros estiverem na Eslovênia, deverão respeitar a cultura e os costumes eslovenos," salientou o presidente do SDS Janez Janša. "É por isso que redigimos um projeto de lei que visa proibir a burca em público."

Vinko Gorenak parlamentar do SDS acrescentou: "temos que nos adaptar aos seus costumes quando estamos em seus países. Não há nenhuma razão para não exigirmos o mesmo deles quando eles estão em nosso ambiente cultural."

Espanha. Em dezembro de 2010 entrou em vigor na cidade catalã de Lérida a proibição de burcas em espaços públicos. Em fevereiro de 2013 a Suprema Corte da Espanha deliberouque a proibição era inconstitucional. O tribunal proferiu que a proibição "constitui uma limitação do direito fundamental ao exercício da liberdade de religião, o que é garantido pela Constituição da Espanha." O tribunal salientou que a limitação de um direito fundamental só pode ser alcançada através de leis de caráter nacional, não por meio de decretos locais.

Em setembro de 2014, em meio a um debate parlamentar sobre a Lei de Segurança Pública (Ley de Seguridad Ciudadana), o Ministro do Interior Jorge Fernández Díaz pediu a proibição da burca em espaços públicos. Ele disse que a questão tem duas dimensões: segurança e dignidade das mulheres.

"Na minha opinião a burca é uma peça de vestuário que viola a dignidade das mulheres," realçou Fernández Díaz. "Mas isso não se encontra na esfera da responsabilidade do Ministério do Interior." Em termos de segurança, segundo ele, a burca "torna difícil identificar as pessoas que cometem crimes."

Em agosto de 2016 um parque aquático da cidade catalã de Girona proibiu o burquíni "por razões de segurança." Em junho de 2014 a cidade basca de Vitoria proibiu o burquíni em piscinas públicas. Em novembro de 2014 um motorista em Vitoria impediu uma mulher de burca de subir no ônibus.

Suíça. Em 1º de julho de 2016 a proibição da burca entrou em vigor em Ticino, primeiro cantão suíço a implementar a medida. Os infratores estão sujeitos a uma multa de 10.000 francos suíços (€9.100; $10.000). A medida entrou em vigor após um referendo realizado em setembro de 2013 no qual 65% dos eleitores de língua italiana daquele Cantão votaram a favor da proibição.

Por Soeren Kern 7 de Setembro de 2016
Original em inglês: Europe Debates the Burkini
Tradução: Joseph Skilnik Do site: pt.gatestoneinstitute.org

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

EUROPA: A SUBSTITUIÇÃO DE UMA POPULAÇÃO


Sai o velho, entra o novo... A Europa, conforme vai envelhecendo, já não renova suas gerações e em seu lugar saúda o ingresso de um enorme contingente de migrantes provenientes do Oriente Médio, África e Ásia que irão substituir os europeus nativos e que trarão culturas com valores radicalmente diferentes em relação a sexo, ciência, poder político, cultura, economia e a relação entre Deus e o homem.

Em uma geração a Europa ficará irreconhecível.

Mortes excedendo nascimentos podem parecer ficção científica, mas já são a realidade da Europa. Simplesmente aconteceu. No ano de 2015 houve 5,1 milhões de nascimentos na União Europeia, ao passo que 5,2 milhões de pessoas morreram, significando que a UE pela primeira vez na história moderna registrou um crescimento vegetativo negativo. Os dados foram divulgados pela Eurostat (departamento que cuida da estatística da União Europeia), responsável pelo recenseamento da população europeia desde 1961. Portanto é imbuída de caráter oficial.

Há mais revelações surpreendentes: a população europeia aumentou ao todo de 508,3 milhões para 510,1 milhões. Imagina por quê? A população de imigrantes aumentou aproximadamente em 2 milhões de habitantes em um ano, enquanto a população autóctone da Europa foi encolhendo. É a substituição de uma população. A Europa perdeu a disposição de manter ou aumentar a sua população. A situação é tão grave em termos demográficos quando da Peste Negra do século XIV.

Esta transição é o que o demógrafo britânico David Coleman descreve em seu estudo "Imigração e Substituição Étnica em Países de Baixa Fertilidade: Terceira Transição Demográfica." A taxa de natalidade suicida da Europa, combinada com os imigrantes que se multiplicam rapidamente, irá transformar a cultura europeia. O declínio da taxa de fertilidade dos europeus autóctones coincide, na realidade, com a institucionalização do Islã na Europa e a "reislamização" dos muçulmanos que lá residem.

Em 2015 Portugal registou a segunda menor taxa de natalidade da União Europeia (8,3 por 1.000 habitantes) e crescimento natural negativo de -2,2 por 1.000 habitantes. Qual país da UE teve a menor taxa de natalidade? A Itália. Desde o "baby boom" dos anos 1960, o país famoso pelas suas famílias com um grande número de pessoas, a taxa de natalidade caiu pela metade. Em 2015 o número de nascimentos caiu para 485.000, menos do que em qualquer ano desde que a Itália moderna foi estabelecida em 1861.

A Europa Oriental já apresenta "a maior perda de população da história moderna", a Alemanha ultrapassou o Japão e já conta com a menor taxa de natalidade do mundo, segundo a média dos últimos cinco anos. Tanto na Alemanha quanto na Itália os decréscimos foram especialmente dramáticos, para -2,3% e -2,7% respectivamente.

Há empresas que não estão mais interessadas nos mercados europeus. A Kimberly-Clark, que fabrica as fraldas Huggies, saiu da maior parte da Europa. O mercado simplesmente não é rentável. Enquanto isso, a Procter & Gamble, que produz as fraldas Pampers, tem investido no negócio do futuro: fraldas geriátricas.

A Europa está ficando cinzenta; é possível sentir toda a tristeza de um mundo que se exauriu. Em 2008 os países da União Europeia viram o nascimento de 5.469.000 crianças. Cinco anos mais tarde, havia quase meio milhão a menos, ou seja 5.075.000 -- uma retração de 7%. As taxas de fertilidade não têm só caído em países com economias que estão encolhendo como a Grécia, mas também em países como a Noruega que saíram, pode-se dizer, ilesos da crise financeira.

Conforme ressaltou recentemente Lorde Sacks "a queda da natalidade pode ser o prenúncio do fim do Ocidente". A Europa, conforme vai envelhecendo, já não renova suas gerações e em seu lugar saúda o ingresso de um enorme contingente de migrantes provenientes do Oriente Médio, África e Ásia que irão substituir os europeus nativos e que trarão culturas com valores radicalmente diferentes em relação a sexo, ciência, poder político, cultura, economia e a relação entre Deus e o homem.

Os liberais e os secularistas tendem a ignorar a importância das questões demográficas e culturais. É por esta razão que os alertas mais contundentes vêm de alguns líderes cristãos. O primeiro a assinalar esta tendência dramática foi o grande missionário italiano Padre Piero Gheddo, explicando que, devido à queda nas taxas de natalidade e à apatia religiosa, o "Islã mais cedo do de se imagina conquistará a maior parte da Europa". Outros manifestaram a mesma opinião, como o cardeal libanês Bechara Rai, que está à frente dos Católicos Orientais, que estão alinhados com o Vaticano. Rai alertou que "o Islã irá conquistar a Europa através da fé e da taxa de natalidade". O Cardeal Raymond Leo Burke acaba de fazer um alerta semelhante.

De agora em diante, em uma geração, a Europa ficará irreconhecível. Em grande parte as pessoas na Europa parecem ter a sensação de que a identidade da sua civilização está ameaçada principalmente por um liberalismo descabido, uma ideologia dissimulada de liberdade, que quer desconstruir todos os laços que unem o homem à sua família, sua origem, seu trabalho, sua história, sua religião, sua língua, sua nação, sua liberdade. Ela parece vir de uma inércia que não se importa se a Europa irá triunfar ou sucumbir, se a nossa civilização irá desaparecer, se afogar em meio ao caos étnico ou se será atropelada por uma nova religião vinda do deserto.

Segundo explica o jornal Washington Quarterly, a combinação fatal da queda nas taxas de natalidade na Europa e a ascensão do Islã já tiveram consequências significativas: a Europa se transformou em uma incubadora de terrorismo; criou uma nova forma de antissemitismo virulento e mortal; uma virada política para a extrema-direita; experimentou a maior crise de autoridade da União Europeia e testemunhou uma reorientação da política externa desde a retirada da Europa do Oriente Médio.

O suicídio demográfico não é apenas experimentado, ao que parece, é desejado. A burguesia xenófila europeia, que hoje controla a política e a mídia, ao que tudo indica, está imbuída de um racismo esnobe e masoquista. Eles se voltaram contra os valores da sua própria cultura judaico-cristã, combinada com uma visão alucinógena, romantizada dos valores de outras culturas. O triste paradoxo é que os europeus estão importando grandes contingentes de jovens do Oriente Médio para compensar suas opções de estilos de vida.

Um continente agnóstico e estéril -- privado de seus deuses e filhos porque os baniu -- não terá forças para combater ou assimilar uma civilização de devotos e jovens. O fracasso de conter a transformação que se avoluma no horizonte parece estar do lado do Islã. O que estamos presenciando são os últimos dias de verão?
Por:Giulio Meotti, editor cultural do diário Il Foglio, é jornalista e escritor italiano.
Publicado no site do Gatestone Institute.
Tradução: Joseph Skilnik