sexta-feira, 4 de outubro de 2013

HONESTIDADE E CONFIANÇA


Atitudes como desonestidade, mentira e trapaça não são tratadas com a devida abjeção que merecem. Para se compreender melhor a importância da honestidade e da confiança, apenas imagine como seria nossa rotina diária se não pudéssemos confiar em ninguém. Quando compramos em uma farmácia um recipiente contendo 100 pequenas pílulas (como vidros de homeopatia, por exemplo), quantos de nós nos damos ao trabalho de realmente contar as pílulas? E quando o remédio é líquido, quantos de nós conferimos se o volume divulgado no rótulo corresponde ao volume verdadeiro? Quando abastecemos nosso carro no posto, como sabemos que os litros especificados na bomba realmente correspondem ao volume que entrou no tanque do carro? Quando você vai ao supermercado e compra 1 quilo de carne, você por acaso verifica — por meios independentes — se realmente está levando um quilo de carne? Em cada um desses casos, e em milhares de outros, nós simplesmente confiamos no vendedor.

Inversamente, há milhares de situações em que é o vendedor quem tem de confiar no comprador. Após um mês de trabalho, o empregado confia que seu patrão irá lhe pagar o salário combinado. Um comerciante vende um produto e recebe em troca um cheque, o qual ele confia que tenha fundo. Um fornecedor entrega uma mercadoria para seu cliente e confia que este irá lhe pagar dali a 30 dias, como combinado.

Exemplos de honestidade e confiança são abundantes, mas imagine o custo e a inconveniência caso não pudéssemos confiar em ninguém. Teríamos de andar sempre carregando instrumentos de medição para nos certificarmos de que realmente estamos recebendo o volume correto de gasolina e o quilo correto de carne. Imagine a inconveniência de ter de contar o número de pílulas ou de mensurar o volume de um líquido dentro de um recipiente?

Se não pudéssemos confiar em ninguém, se a simples palavra do vendedor ou do comprador não tivesse valor nenhum, teríamos de arcar com o oneroso fardo de fazer contratos por escrito para toda e qualquer transação efetuada. Teríamos de arcar com todos os custos de monitoramento que garantem que a outra parte irá fazer corretamente até mesmo às mais simples transações. Podemos dizer com toda a certeza que tudo aquilo que solapa a honestidade e a confiança aumenta os custos de transação, reduz o real valor das trocas voluntárias e nos torna mais pobres.

Honestidade e confiança se manifestam de maneiras que poucos de nós sequer conseguimos imaginar. Em determinadas vizinhanças, por exemplo, é comum que empresas de entrega deixem encomendas muitas vezes valiosas em frente à porta caso o morador não esteja em casa para recebê-la. Não há necessidade de marcar horário para a entrega, o que é bom tanto para o morador quanto para a empresa. Ambos ficam com suas agendas livres e aumentam sua produtividade. Da mesma maneira, supermercados e demais estabelecimentos comerciais podem tranquilamente expor várias mercadorias perto das portas de entrada e saída do estabelecimento, ou até mesmo deixá-las do lado de fora do estabelecimento, sem se preocupar com roubos.

Já em vizinhanças notoriamente menos honestas, empresas de entrega que deixassem encomendas na porta de uma casa e estabelecimentos comerciais que expusessem mercadorias perto da rua estariam cometendo o equivalente a um suicídio econômico.

Desonestidade é algo oneroso. Empresas de entrega não podem simplesmente deixar encomendas em frente à porta caso o morador não esteja em casa. A empresa terá de arcar com os custos de fazer uma nova viagem em outro horário. Ou terá de tentar agendar um horário. Ou então o cliente terá de arcar com os custos de ter ele próprio de ir recolher o produto. Se um estabelecimento comercial decidir exibir algumas de suas mercadorias do lado de fora, ele terá da arcar com os custos de contratar um auxiliar — isso se ele realmente puder se arriscar a deixar suas mercadorias do lado de fora.

A honestidade afeta os estabelecimentos comerciais de uma outra maneira. Por exemplo, o objetivo de um gerente de supermercado é maximizar a taxa de vendas de mercadorias por metro quadrado de espaço alugado. Quando os índices de criminalidade — como furto — são baixos, o gerente pode utilizar todo o espaço alugado, inclusive os espaços perto da porta de entrada e saída, aumentando desta forma seu potencial de lucro. Esta oportunidade é negada aos supermercados e mercearias em localidades em que há menos honestidade. Nestes locais, o espaço aproveitado é menor. Em muitos casos, é preciso que haja espaços livres para que o dono da mercearia ou mesmo o gerente de um supermercado possa manter os olhos em seus clientes e funcionários para se certificar de que ninguém está furtando nada. Isso, por sua vez, significa um maior custo para se empreender, o que se traduz em maiores preços, menores lucros e menos amenidades para os consumidores.

A criminalidade, a desconfiança e a desonestidade impõem enormes prejuízos que vão muito além daqueles sentidos diretamente. Boa parte do custo da criminalidade e da desonestidade recai justamente sobre aquelas pessoas que menos podem se dar ao luxo de arcar com tudo isso: os mais pobres. São os mais pobres que acabam tendo menos opções de escolha e pagando mais caro, ou tendo de arcar com os custos de se locomover para ir fazer compras em localidades melhores e mais distantes. São aqueles pobres que moram em localidades de alta criminalidade que sequer conseguem receber uma pizza em casa.

O fato de honestidade e confiança serem tão vitais deveria nos fazer repensar a nossa tolerância com criminosos e pessoas desonestas — a começar por todos os criminosos que estão no poder e que gozam de impunidade.

Walter Williams é professor honorário de economia da George Mason University e autor de sete livros. Suas colunas semanais são publicadas em mais de 140 jornais americanos.

Tradução de Leandro Roque

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

SOCIEDADES POBRES E SOCIEDADES RICAS - O QUE FAZ A DIFERENÇA

Querer ajudar os pobres e necessitados é um sentimento nobre e correto, e está presente em sua forma mais pura principalmente nos jovens e adolescentes. Mas é necessário ter alguns cuidados para não se deixar ser manipulado. É necessário estudar a situação com grande rigor científico, caso contrário corre-se o risco de acabar punindo aquele a quem se quer ajudar.

Riqueza e pobreza

A diferença entre o Robinson Crusoé pobre e o Robinson Crusoé rico é aparentemente simples, porém essencial: o rico dispõe de bens de capital. E para ter esses bens de capital, ele teve de poupar e investir. 

Bens de capital são fatores de produção — no mundo atual, ferramentas, maquinários, computadores, equipamentos de construção, tratores, escavadeiras, britadeiras, serras elétricas, edificações, fábricas, meios de transporte e de comunicação, minas, fazendas agrícolas, armazéns, escritórios etc. — que auxiliam os seres humanos em suas tarefas e, consequentemente, tornam o trabalho humano mais produtivo.

Os bens de capital do Robinson Crusoé rico (por exemplo, uma rede e uma vara de pescar, construídas com bens que ele demorou, digamos, 5 dias para produzir) foram obtidos porque ele poupou (absteve-se do consumo) e, por meio de seu trabalho, transformou os recursos que ele não havia consumido em bens de capital. Estes bens de capital permitiram ao Robinson Crusoé rico produzir bens de consumo (pescar peixes e colher frutas) e com isso seguir vivendo cada vez melhor.

Já o Robinson Crusoé pobre, por sua vez, não dispõe de bens de capital. Todo o seu trabalho é feito à mão. Consequentemente, ele é menos produtivo e, por produzir menos e ter menos bens à sua disposição, ele é mais pobre e seu padrão de vida é mais baixo.

O Robinson Crusoé rico é mais produtivo. E, por ser mais produtivo, não apenas ele pode descansar mais, como também pode poupar mais, o que irá lhe permitir acumular ainda mais bens de capital e consequentemente aumentar ainda mais a sua produtividade no futuro. Já o Robinson Crusoé pobre consome tudo o que produz. Ele não tem outra opção. Como ele não é produtivo, ele não pode se dar ao luxo de descansar e poupar. Essa ausência de poupança compromete suas chances de aumentar seu padrão de vida no futuro.

O mesmo raciocínio pode ser aplicado para se diferenciar uma nação rica de uma nação pobre.

Que diferença há entre EUA e Índia? Será que a população indiana é mais pobre porque trabalha menos? Não. Na Índia, trabalha-se até mais do que nos EUA. Será que um indiano — ou um egípcio ou um mexicano ou um haitiano — possui menos conhecimento tecnológico que um americano ou um suíço? Não, o conhecimento está hoje disperso pelo mundo e tende a ser o mesmo. Com efeito, os técnicos indianos são reconhecidos como uns dos melhores do mundo. Então, por que há pessoas desnutridas e morrendo de inanição em Calcutá mas não em Zurique ou em San Francisco?

A diferença entre uma nação rica e uma nação pobre pode ser explicada exclusivamente por um único fator: a nação rica possui uma quantia muito maior de bens de capital do que uma nação pobre. 

Ao passo que na Índia um agricultor cultiva sua terra com duas vacas e um arado, nos EUA, um agricultor utiliza um trator e um computador. E, com esses bens de capital, ele é múltiplas vezes mais produtivo que seu congênere indiano. O americano seria o Robinson Crusoé rico, que possui uma rede e uma vara de pescar; o indiano seria o Robinson Crusoé pobre, que utiliza as próprias mãos para colher alimentos.

Quando um indivíduo tem de utilizar apenas o trabalho de suas mãos, e o produto que ele produz é utilizado imediatamente para seu consumo final, ele é pobre. Quando este mesmo indivíduo passa a utilizar bens de capital, como tratores, computadores e vários tipos de máquinas — os quais só puderam ser construídos graças à poupança e ao subsequente investimento de outras pessoas —, ele pode multiplicar acentuadamente sua produtividade e, consequentemente, ser muito mais rico.

Quanto maior a estrutura de produção — isto é, quanto maior o número de etapas intermediárias utilizadas para a produção de um bem —, mais produtivo tende a ser o processo de produção. Por exemplo, se o bem de consumo a ser produzido é o milho, você tem de preparar e cultivar a terra. Você pode fazer tal tarefa com um arado ou com um trator. O trator moderno é um bem de capital cuja produção exige um conjunto de etapas muito mais numeroso, complexo e prolongado do que o número de etapas necessário para a produção de um arado. Consequentemente, para arar a terra, um trator moderno é muito mais produtivo do que um arado. Portanto, o processo de produção do milho será mais produtivo caso você utilize um trator (cuja produção demandou um processo de várias etapas) em vez de um arado (cujo processo de produção é extremamente mais simples).

Isto explica por que um trabalhador nos EUA ganha um salário muito maior do que um trabalhador na Índia executando a mesma função. O primeiro possui à sua disposição bens de capital em maior quantidade e de maior qualidade do que o segundo. Logo, o primeiro produz muito mais do que o segundo em um mesmo período de tempo. Quem produz mais pode ganhar salários maiores.

Essa é a característica que diferencia um país rico de um país pobre.

Implicações lógicas

A única maneira de se favorecer as classes trabalhadoras e os mais pobres, portanto, é dotando-lhes de bens de capital, os quais são produzidos graças à poupança e ao investimento de capitalistas. 

O que é um capitalista? Capitalista é todo indivíduo que poupa (que consome menos do que poderia) e que, ao abrir mão de seu consumo, permite que recursos escassos sejam utilizados para a criação de bens de capital.

Consequentemente, se um determinado país pobre quer enriquecer, ele deve criar um ambiente empreendedorial e institucional que garanta a segurança da poupança e dos investimentos. A única maneira de se sair da pobreza é fomentando a poupança, permitindo o livre investimento da poupança em bens de capital, e estabelecendo um sistema de respeito à propriedade privada que favoreça a criatividade empresarial e a livre iniciativa. Em suma, deve-se permitir que os capitalistas tenham liberdade e segurança para investir e desfrutar os frutos de seus investimentos (o lucro).

Um país que persegue os capitalistas, que tolhe a livre iniciativa, que não assegura a propriedade privada, que tributa os lucros gerados pelos investimentos, e que cria burocracias e regulamentações sobre vários setores do mercado é um país condenado à pobreza. Já um país que fomenta a poupança, que respeita a propriedade privada, e que permite a liberdade empreendedorial e a acumulação de bens de capital é um país que sairá da pobreza e em poucas gerações poderá chegar à vanguarda do desenvolvimento econômico.

Cigarras e formigas

Vivemos em um mundo repleto de demagogia e de políticos populistas. Estes são os principais inimigos da criação de riqueza. Acrescente-se a isso um arranjo democrático, e o estrago tende a ser irreversível.

Se um partido político prometer que, uma vez eleito, os salários serão duplicados e as horas de trabalho serão reduzidas à metade, suas chances de chegar ao poder tendem a aumentar. Caso ele de fato seja eleito e decrete tais medidas, o país empobreceria de imediato. Manipular salários ou mesmo imprimir dinheiro para manipular a taxa de juros são medidas que absolutamente nada podem fazer para contornar o fato de que vivemos em um mundo de escassez. E escassez significa que os recursos têm antes de ser poupados para só então serem investidos para criar bens de capital. Manipulação de salários e juros não pode abolir a escassez. Não pode aumentar a quantidade de bens de capital e nem a produtividade dos trabalhadores. A necessidade de se abster do consumo (poupar) é um sacrifício que não pode ser encurtado por políticas populistas. O enriquecimento não é algo que pode ser alcançado pela demagogia.

Se este mesmo partido prometer apenas uma "redistribuição de riqueza", tirando dos ricos para dar aos pobres, os efeitos tendem a ser igualmente devastadores. Seria o triunfo da filosofia da cigarra sobre a filosofia da formiga. É fácil entender como se daria este efeito deletério.

Os proprietários dos bens de capital de uma economia são os capitalistas. Se o partido que está no poder for seguidor de uma ideologia socialista que defenda a expropriação dos capitalistas e a subsequente entrega de seus bens de capital para os trabalhadores, o que ocorrerá caso esta política seja implantada é que estes trabalhadores irão apenas consumir este capital, pois tal consumo fará com que seu padrão de vida aumente momentaneamente. A consequência? Tendo consumido o capital, todas as etapas intermediárias dos processos produtivos serão extintas. A estrutura de produção da economia será dramaticamente reduzida. A produtividade despencará. Todos estarão condenados à pobreza. 

A riqueza física dos ricos está justamente na forma de sua propriedade de bens de capital — que foram criados por meio da poupança e disponibilizados para o uso dos trabalhadores —, os quais possibilitam um aumento da produtividade e consequentemente dos salários dos trabalhadores. A redistribuição da propriedade destes bens de capital levará apenas ao seu consumo imediato, impossibilitando-os de criar mais riqueza no futuro.

A riqueza só pode ser criada por meio da poupança e da acumulação de bens de capital. Não há atalhos para esse processo. 

O mesmo raciocínio é válido para uma situação que envolva apenas a redistribuição de dinheiro. Um milionário que tenha quase todo o seu dinheiro distribuído aos pobres, de modo a ficar praticamente com a mesma renda deles, fará apenas com que a população desta economia esteja indubitavelmente mais pobre no futuro. Os beneficiados por essa redistribuição irão apenas consumir o seu dinheiro — pois isso lhes trará um imediato aumento de seu padrão de vida — e não mais haverá poupança (abstenção de consumo) nesta sociedade que permita a acumulação de bens de capital. Em vez de postergar o consumo para possibilitar a criação de bens de capital, haverá apenas um intenso consumo presente do capital existente. O Robinson Crusoé rico deu sua rede e sua vara de pescar para Sexta-Feira, que as consumiu e deixou ambos com um padrão de vida futuro bem mais reduzido.

A redistribuição de riqueza gera pobreza e perpetua a pobreza. Porém, como tal fenômeno não é imediato, ele pode ser implantado durante algum tempo sem que suas consequências sejam imediatamente sentidas. 

Para uma sociedade prosperar, a poupança e a acumulação de capital devem ser incentivadas; jamais devem ser punidas. Sociedades que permitem que as cigarras imponham sua filosofia às formigas jamais poderão ser ricas. 


Jesús Huerta de Soto , professor de economia da Universidade Rey Juan Carlos, em Madri, é o principal economista austríaco da Espanha. Autor, tradutor, editor e professor, ele também é um dos mais ativos embaixadores do capitalismo libertário ao redor do mundo. Ele é o autor de A Escola Austríaca: Mercado e Criatividade Empresarial, Socialismo, cálculo econômico e função empresarial e da monumental obra Moeda, Crédito Bancário e Ciclos Econômicos.

ESQUERDA, DIREITA E ESPANTALHOS


Meu artigo sobre a caricatura que a esquerda faz da direita recebeu uma crítica legítima: também fiz uma caricatura da esquerda. Confesso. Mea culpa. Mas há um motivo para isso: a esquerda que retratei de forma caricatural, aquela que “ama a Humanidade”, mas adora ditadores assassinos, não só é bem vasta e representada politicamente no Brasil (PT, PSTU, PSOL), como está no poder!

Há vida inteligente na esquerda? Em minha opinião, sim. Respeito vários quadros do PSDB, por exemplo, que é claramente um partido de centro-esquerda. Mas aqui começam os problemas: o Brasil está tão atrasado no debate político, e essa esquerda jurássica e caricata que apontei está há tanto tempo disseminando mentiras, que o PSDB passou a ser visto como direita!

Portanto, quando falo de uma esquerda hipócrita e autoritária, que se diz “progressista”, monopoliza os fins nobres, e bajula ditadores enquanto isso, estou falando da esquerdamainstream, da esquerda que está no governo, que controla as universidades, parte da imprensa, parte da igreja. A caricatura não é injusta, ou seja, nem é bem uma caricatura. A realidade dela é que parece caricatural, de tão reacionária e retrógrada que é (como pode alguém ainda defender o regime cubano em pleno século 21?).

Dito isso, a direita que a esquerda pinta como fanática e reacionária existe, sem dúvida. Mas está longe de ser a maioria ou algo perto disso, como a esquerda dá a entender. Essa, sim, é uma imagem caricatural. Pegam uma minoria mais barulhenta, saudosista do regime militar (não confundir com o contragolpe de 1964 e o governo Castello Branco), ou que abraça um fanatismo religioso incompatível com a liberdade individual (não confundir com a religião em si), e transformam isso em toda a direita. Espantalho puro, como mostrei.

Alguns leitores não gostaram de eu ter colocado Bolsonaro na lista das caricaturas que a esquerda usa contra a direita. Reconheço que o deputado tem coragem de combater os comunistas, a corja dos petralhas, mas isso não faz dele uma direita razoável. Ser antipetista é condição necessária, mas não suficiente para ser louvável.

Alguém que diz que FHC devia ser “fuzilado” por ter privatizado a Vale não pode merecer muito respeito, ainda que seja um aliado temporário contra o inimigo principal, que está no poder. É preciso saber separar as coisas. Alianças e concessões pragmáticas devem ser feitas em nome de uma causa maior, que no momento é tirar o PT do poder. Mas isso não quer dizer que seja vantajoso ou desejável, para a direita liberal, ou conservadora de “boa estirpe”, como costumo dizer, associar-se a figuras assim.

Não custa lembrar que Leandro Narloch, em pesquisa para seu novo livro, entrevistou políticos brasileiros com perguntas baseadas em Mussolini, sem que soubessem, e Bolsonaro foi o campeão de respostas afirmativas, endossando o credo fascista. Ficou bem perto da turma do PCdoB, autoritária ao extremo.

O pastor Marco Feliciano tampouco deve ser considerado um representante da direita que presta. Não só votou e foi aliado do PT até ontem, como não dá para levar muito a sério sua postura. Uma coisa é defendê-lo dos ataques coordenados e pérfidos da esquerda e do movimento gay, autoritário e intolerante; outra, bem diferente, é colocá-lo como ícone da direita liberal ou conservadora.

Para liberais como eu, não há problema em se colocar na direita, desde que esta seja qualificada. Talvez a melhor distinção seja foco individual versus coletivismo. Pois não resta dúvida de que existe uma direita autoritária e coletivista, e dessa os liberais devem manter distância, ainda que possam fazer vista grossa no curto prazo de olho no inimigo comum (Churchill lutou ao lado até de Stalin quando era para derrotar Hitler).

O viés nacionalista (não confundir com patriotismo saudável) é outro elo que freqüentemente liga alguns conservadores ao coletivismo. Pensar em termos de “nossa” indústria ou “nosso” recurso natural é um pequeno passo de distância para começar a demandar que tais ativos nacionais sejam direcionados para o “interesse nacional”. Protecionismo, reservas de mercado, subsídios agrícolas, são algumas das medidas que podem colocar conservadores lado a lado com socialistas, ambos contra os liberais.

Enfim, o debate político-ideológico no Brasil ainda precisa melhorar muito. Alguns extremos devem ser podados para não contaminarem a coisa toda. Reacionários e autoritários existem tanto na esquerda como na direita. Ao mesmo tempo, há uma (pequena) parte da esquerda que merece respeito, que é a social-democracia moderna. Discordo dela, claro, mas respeito o debate.

Infelizmente, ela é vista como direita no Brasil, e a direita liberal ou conservadora, que nem tem organização político-partidária, é vista como “ultraliberal” ou “reacionária”, sendo que figuras caricatas de uma direita realmente obsoleta servem de ícones para toda a direita, uma tática deliberada da esquerda para refutar um espantalho e fugir do debate verdadeiro.

Como o país seria melhor se socialistas, fanáticos religiosos e anarquistas fossem ignorados, e o debate ficasse concentrado entre social-democratas, liberais e conservadores de boa estirpe. Um sonho! Será que chegaremos lá um dia?
Por: Rodrigo Constantino  

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

CONTRA O IMEDIATISMO

No premiado livro de Suzanne Chantal A Vida Quotidiana em Portugal Depois do Terremoto de Lisboa de 1755 (Hachette, 1962), diz-se que os juízes lusitanos eram astuciosos. Eu cito: "Sabiam que o delito não contava. O que mais importava era saber quem o cometera, por conta de quem, quem prejudicava e quem beneficiava e qual era, dentre todos os partidos em causa, o mais poderoso, aquele que se devia esperar mais ou que mais se havia de temer. Por isso tomavam o maior cuidado em não agir com demasiada precipitação. Era frequente um processo esperar quatro ou cinco anos antes de ser instruído; mais ainda para ser julgado" (pág. 252).

Isso ocorria num Portugal do tempo dos "terramotos", como lá se diz. Nós, cá de um Brasil sem terremotos, somos imunes a tais malfeitos, justamente porque não nos precipitamos. Somos - independentemente do delito e do devido processo legal - contra o imediatismo e a voz das "multidões".

Nada deve ser imediato. Muito menos a prisão ou a luz elétrica. A boa educação obriga a esperar. Protele-se, pois, a velocidade das corridas de cavalo e do forno de micro-ondas. Condenar sem conceder todos os direitos aos criminosos donos do poder, é contra a nossa natureza de país pautado pela lei. Terra adorada na qual os poderosos ("gente boa") - jamais foram para a cadeia.

Ultralegalistas, amamos a lei pela lei. Somos a favor do processo legal lento e grandioso em tamanho e absurdo. Tomemos a polícia. Ela deve primeiro testemunhar, com absoluta certeza, que algumas propriedades foram vandalizadas para agir. E, mesmo assim, levar em conta que a depredação de bancos e lojas pode ser sinal de uma nova era. Não sabemos ainda que mensagem é essa, mas ela certamente vai surgir com mais clareza tal como em março (ou seria abril?) de 1964; tal como ocorreu com o Estado Novo e na Alemanha a partir de 1933. Somos seguros e gradualistas. Demoramos mais ou menos 60 anos para abolir a escravidão e mais um outro tanto para retomar a democracia. Aliás, considerando o mensalão, hoje vemos com mais serenidade que ele foi um deslize banal. É mais um mero caso de corrupção, semelhante às dúzias de outros exemplos ocorridos em todos os governos, realizados por quase todo mundo. Diante disso, a Abolição da Escravatura foi um milagre de Nossa Senhora Aparecida.

Tudo o que é rápido e que produz resultados instantâneos e sem a intermediação dos compadres, dos ex-secretários e dos ex-advogados que nos julgam de modo ponderado e isento, deve ser pensado e evitado ou até mesmo - reitero - proibido. Mas proibido com tranquilidade, sem rompantes reveladores de má-educação e de gosto duvidoso.

O imediatismo - como dizia um velho e sábio professor favorável a uma "sociologia da calma" - era o problema do nosso tempo. Claro que esse "nosso tempo" deveria ser igualmente ponderado senão ele se transformaria num indesejável imediatismo o qual fatalmente levaria a um arriscado "colocar o carro adiante dos bois".

A pressa é inimiga da perfeição. O corre-corre é uma característica definitiva de inferiores: dos criados e dos serviçais. E com o perdão que invoca os velhos e bons tempos, nos quais cada qual tinha (não existia ainda essa novidade burguesa e liberal de saber) o seu lugar - como na escravidão -, os nobres eram sempre calmos. Até mesmo quando metiam a chibata, o faziam por meio de capatazes tranquilos. Eles decidiam com consciência, tendo na memória os princípios perenes da desigualdade. Por isso, prendiam suspeitos e com ajuda de alguns mecanismos, sabiam como transformar um "não" num "sim" em certas circunstâncias e com o justificado uso de certos mediadores como uns bofetes na cara, o choque elétrico e o pau de arara. Ou realizando julgamentos duplos, triplos ou múltiplos - ou, melhor ainda, sem julgamento -, esse direito fundamental que, em certas circunstâncias, pode ser substituído por instrumentos mais eficazes, como o fuzilamento sumário, desde que a causa seja justa como parir a justiça social, aplacar o ciúme da mulher bonita, inibir a competição de um colega brilhante, ou garantir a proteção do país contra alguma nação, "raça" ou classe como essa famigerada mídia comprada que hoje faz uma campanha vergonhosamente antiesquerdista. Essa esquerda que é inimputável, feita de cruzados; que a tudo renunciou em nome do povo e que jamais roubou, corrompeu ou pecou. Essa esquerda que ,por sua total inexperiência no poder - onde está faz mais de uma década -, tem cometido pequenos exageros. Erros dilatados pela mídia corrupta, liberal e imediatista, a ser posta de quarentena para que, numa apreciação mais detida e sem o clamor da multidão ensandecida, possam ser reavaliados à luz do nosso exemplar direito luso-brasileiro.

Claro que o imediatismo tem tudo a ver com grandes injustiças. Talvez pior que a agilidade seja esperar sentado. Mas, conforme sabemos, quem espera, sempre alcança.

Por: Roberto Damatta - O Estado de S.Paulo

PRAZER EM CONHECER

Devem as sociedades ocidentais permitir o uso do véu em público por mulheres muçulmanas? Sazonalmente, a Europa confronta-se com essas perguntas. Sazonalmente, tenta responder a elas.

No Reino Unido, um juiz decretou que a mulher tem de remover o véu em tribunal no momento em que presta testemunho.

Na França, o ministro da Educação publicitou a sua "carta laicista", um documento obrigatório para todas as escolas públicas do país e onde se proíbe o uso ostensivo de "símbolos religiosos". Associações muçulmanas não gostaram e protestaram. Que dizer de tudo isso?

Oh Deus. A verdade, só a verdade, nada mais que a verdade: sempre que me cruzo na Europa com uma mulher de rosto coberto, eu estremeço um pouco. Amigos multiculturalistas tentam civilizar-me com odes gloriosas à liberdade religiosa e à tolerância cultural. Não consigo. O temor e o tremor acompanham-me sempre. Estarei doente?

O único médico que verdadeiramente respeito diz que não: Theodore Dalrymple, pseudónimo literário do psiquiatra Anthony Daniels, escreveu no "Daily Telegraph" um texto precioso sobre a matéria. Não necessariamente contra o uso do véu integral em público (também). Mas ao mostrar como as posições mais progressistas sobre a matéria são, na verdade, as mais reacionárias.

Comecemos pelo princípio: se o véu é uma expressão de religiosidade, não deve o Ocidente tolerar e respeitar a liberdade de culto das diversas seitas?

Dalrymple tem razão quando suspeita que a ocultação do rosto não tem necessariamente uma caução corânica a sustentá-la. Mas não vale a pena perder tempo com essas discussões bizantinas. Porque a questão é outra: mesmo que o véu fosse uma expressão de religiosidade, isso significaria necessariamente que a sociedade teria que a aceitar?

Eis a pergunta fundamental. Que exige uma resposta fundamental: nem todas as expressões de religiosidade devem ser aceites por uma sociedade secular. Dalrymple dá como exemplos as práticas religiosas de várias civilizações primitivas que seriam impensáveis na Europa do século 21.

Mas, com a devia vênia ao dr. Dalrymple, não é preciso recuar ao princípio dos tempos para entender que a liberdade religiosa também tem limites. Porque, se assim não fosse, mesmo um cristão de hoje poderia continuar a usar a Bíblia para justificar ações punitivas severas contra idólatras (Êxod. 22:20), contra blasfemos (Lev. 24:15-16), contra sacerdotes embriagados (Lev. 10:8-9) e até contra crianças rebeldes que não respeitam os seus pais (Deut. 21:18-21).

Nenhuma sociedade poderia sobreviver como espaço pluralista se aceitasse, em nome do seu pluralismo, todas as expressões de religiosidade nas suas formas mais literalistas.

Usar o véu por alegadas razões religiosas pode colidir, por exemplo, com a necessidade social de nos conhecermos e reconhecermos mutuamente. De sermos capazes de vislumbrar no rosto do outro certas expressões e intenções. E de construir, a partir daqui, um mínimo de comunicação e confiança. Uma mulher com o rosto tapado será sempre, por definição, um espectro e um estranho.

Abandonada a religião, o que sobra? Sobra, como defendem vários multiculturalistas, a velha liberdade individual de nos vestirmos como queremos. É uma boa premissa se ela for aplicada ao espaço privado: eu, por exemplo, tenho o hábito de andar pela casa em cuecas, o que por vezes gera certos embaraços quando aparecem visitas sem avisar.

Mas a minha liberdade não me permite, como observa Theodore Dalrymple, que eu saia para a rua nesses preparos. Muito menos quando esses preparos podem não ser uma escolha livre e pessoal.

Uma mulher usa o véu integral porque quer? Ou o uso do véu é uma imposição do macho familiar?

A doutrina, aqui, também se divide. Mas não é preciso entrar em novas discussões bizantinas sobre o assunto. Thedorore Dalrymple, uma vez mais, contribui para o debate com uma observação crucial: são sempre as mulheres que cobrem o rosto, não os homens. Será que esse pormenor não incomoda as consciências igualitárias, progressistas e até feministas do Ocidente?

Retorno ao início. Sempre que me cruzo na Europa com uma mulher de rosto coberto, eu estremeço um pouco. Problema meu? Admito. Mas também admito que onde os outros só veem liberdade e diferença, eu suspeito sempre de opressão e obscurantismo.

Por: João Pereira Coutinho Folha de SP

terça-feira, 1 de outubro de 2013

A AURA DOS GOVERNANTES

A propaganda é a alma do negócio. O jargão mais conhecido do meio publicitário avança, a cada dia, na esfera da política, produzindo a máxima assemelhada: a propaganda é a aura dos governantes. Ela desenha a aureola que cobre a cara de políticos e governos, melhorando seu aspecto e tornando positiva sua avaliação popular. No campo privado, a propaganda vende produtos, burila a imagem de empresas, amplia suas margens nos mercados, é a mola propulsora dos negócios.


Perguntaram certa vez a Henry Ford, o criador da linha de montagem automobilística, como começaria tudo de novo e em que investiria se tivesse apenas um dólar? Respondeu ignorar em que área aplicaria, mas seguramente gastaria metade do dólar em propaganda do que viesse a produzir. A política usa essa ideia há séculos. Na contemporaneidade, os norte-americanos embalaram a propaganda no celofane do espetáculo. Enxertaram emoção no pacote de slogans, chavões e símbolos. O "negócio" da política passou a ser mais palatável aos sentidos dos consumidores. Abriu-se a era dos grandes debates televisivos. Em 1968 o assessor Ray Price pedia a Nixon mais calor, mais emoção, ensinando ao assustado candidato: "O que vale não é o que existe, e sim o que é projetado. Não precisamos, portanto, mudar você, mas a imagem que você transmite".

O ciclo da telepolítica abriu palcos para exibir seus atores, melhorar os discursos, maquiar situações, plantar versões. A propaganda pavimentou os caminhos dos governos, na esteira de um Estado adornado pela fosforescência midiática, exaltando seus chefes e promovendo desfiles de personalidades. A estética embalou a semântica, criando até embaraços em políticos não afeitos à teatralização, como François Mitterrand, o ex-presidente francês, que chegou a lamentar: "Na TV, o que eu digo vale bem menos do que a cor que as pessoas enxergam em mim".

A propaganda governamental evoluiu de tal maneira que passou a ser protagonista nas estratégias de persuasão social. Os governos tornaram-se os maiores anunciantes dos veículos. Vejam o nosso caso: R$ 16 bilhões (isso mesmo) foram gastos pelos governos Lula e Dilma com propaganda governamental. Esse montante daria para cobrir os custos de 170 mil casas populares. Cabe perguntar: há sentido em gastar tanto com propaganda quando se vê a infinidade de buracos na estrutura de serviços, a começar da saúde? (Com R$ 1 bilhão poderiam ser construídos 350 prontos-socorros.) Analisemos a questão.

É dever dos governos prestar contas de suas tarefas à sociedade, da mesma forma que é um direito do cidadão saber o que os governantes fazem, mas não deveriam fazer; não fazem, mas deveriam fazer; ou fazem porque são obrigados constitucionalmente a realizar. O jogo democrático carece de informação e transparência, possibilitando ao representado vigiar as ações dos representantes. O problema passa a existir a partir da montanha de exageros formada para glorificar as administrações. Plasmar uma aura para abrilhantar fatos que são mera obrigação do governante, criar efeitos estéticos para engabelar o telespectador, maquiar dados, montar uma engenharia persuasiva para provar que gato é lebre, enfim, cobrir o corpo dos governantes com um manto de beleza e exuberância, convenhamos, pode até ser elogiável sob o aspecto da criação publicitária, mas é discutível sob o prisma ético.

Faz-se a ressalva de que há modalidades de publicidade plenamente cabíveis, como campanhas de vacinação ou orientação eleitoral pelo TSE, ações que integram a planilha de serviços de utilidade pública. Da mesma forma, há produtos de empresas governamentais que carecem de divulgação, na medida em que enfrentam a concorrência do mercado. Produtos bancários, por exemplo. É de praxe que os governos façam sua publicidade legal, abrangendo comunicados que obedeçam a normas e regulamentos. O foco da crítica é mesmo a propaganda institucional, essa que erige altos altares para entronizar a imagem de governos, cantar loas a governantes, sob a trombeta de campanhas maciças em horário nobre da TV. Esse coro de glórias não fere os princípios constitucionais de moralidade, razoabilidade e proporcionalidade? A agregação artificial de porte mais robusto para governos altera sua identidade. Assemelha-se a uma cirurgia para mudar feições (normais) de alguém que a faz só por vaidade. Não haveria aí uma curva ética?

Se os governos usassem a propaganda para promover a cidadania e os valores democráticos, estariam contribuindo para a elevação dos padrões civilizatórios. Não é o que se vê. Ao contrário. Obras atrasadas em cronogramas são objeto de louvação; programas, como o Mais Médicos, até podem ser objeto de publicidade para ganhar confiança social, mas sem exagerar na dose. Afinal, mais saúde significa mais médicos, mais hospitais, mais remédios, mais equipamentos, mais paramédicos, infraestrutura adequada. Ora, esse acervo é sonegado. Se nossos médicos não querem trabalhar nos grotões do País, que venham de fora. Não serão eles, porém, a salvação da saúde.

O discurso propagandístico, infelizmente, em todos os governos e em todas as instâncias, abriga forte viés eleitoral. E assim, de exagero a exagero, o País vê alargadas as veredas da mistificação e o povo passa a "comprar" versões como verdades. Ao fim do processo, bilhões de reais, que poderiam ser usados de modo mais justo, são jogados no poço sem fundo do desperdício.

A Sagrada Escritura reza: "Nenhum homem, por maior esforço que faça, pode acrescentar um palmo à sua estatura e alterar este pequeno modelo, o corpo humano". Por estas plagas, os corpos governativos ganham metros de altura graças à engenharia milagreira da nossa propaganda governamental. Nosso edifício democrático, é triste constatar, tem muito tijolo de matéria plástica. 
Por: Gaudêncio Torquato - O Estado de S.Paulo

OS QUE PRODUZEM RIQUEZA SÃO ALVOS DA FÚRIA DOS QUE PRODUZEM DISCURSOS

O Banco Central divulgou nesta segunda a sua expectativa do PIB deste ano: baixou o crescimento de 2,7% para 2,5%. Crescimento da economia é aquela área na qual Guido Mantega costuma fazer previsões com margem de erro de até 2 pontos — a realidade sempre empurra para menos.

Pois bem: quem pode livrar o país de números ainda mais constrangedores? Como tem sido rotina nos últimos anos, é o setor agropecuário — o saco de pancadas predileto dos bem-pensantes brasileiros. Escreve Mauro Zafalon naFolha desta terça:
A queda na estimativa poderia ser pior se o desempenho da agropecuária não tivesse surpreendido. Ainda que representando apenas cerca de 5% do PIB, o setor se destaca no crescimento, passando de 8,4% para 10,5%. O resultado se explica por dois pilares: volume e preços. O setor vem de uma boa safra e se prepara para uma –se o clima ajudar– ainda maior. Os efeitos desse cenário favorável dentro da porteira se espalham pelos demais segmentos industriais e comerciais que dão suporte à atividade agropecuária. A regra abrange a maioria dos itens. Uns estão com um bom volume de produção; outros, além do volume, têm também bons preços. Há exceções, mas não o suficiente para impedir que o setor agropecuário sustente o PIB global neste ano.
(…)

Retomo
Tem sido essa a rotina do Brasil há já um bom tempo. Como vocês sabem, os “ruralistas” costumam ser muito malvistos por certos setores minoritários e barulhentos. Apanham de todo mundo: das esquerdas, dos verdes, dos índios, da imprensa, de atores e atrizes “progressistas”, de fanáticos do aquecimento global, do Bono Vox, do Sting…

Em suma: este é um dos únicos países do mundo em que os que produzem riquezas são alvos da fúria dos que produzem discursos.

Por Reinaldo Azevedo

TEORIA DA INDEPENDÊNCIA

Prioridades devem ser revistas sempre. As prioridades do Brasil há dez anos não são as mesmas de hoje. Na época, vínhamos de um padrão de crise recorrente por mais de duas décadas, com dívida pública vulnerável e sensível à aversão de risco dos investidores, inflação que atingiu 17% em maio de 2003 e dívida pública externa muito superior às reservas internacionais.


A prioridade, então, era estabilizar a economia e sanear as finanças públicas e, com isto, estabelecer condições para a criação de emprego e o crescimento sustentável.

Isso foi feito com todo o rigor: a inflação foi controlada, as reservas superaram o total da dívida externa pública e privada em 2008, e a dívida pública caiu substancialmente em relação ao PIB. Em consequência, o Brasil cresceu a taxas aceleradas entre 2004 e 2010, criando milhões de empregos e expandindo de forma impressionante o mercado consumidor interno.

Essa evolução trouxe maior estabilidade econômica, política e social à nação. É necessário manter o que foi conquistado e dar os próximos passos.

A única forma de retomar o crescimento é elevar a produtividade e o estoque de capital da economia. Ou seja, investir em máquinas e equipamentos, educação, treinamento e infraestrutura.
Esse aumento substancial do investimento requer, em última análise, aumento da poupança nacional, e aqui chegamos ao nó górdio. A poupança brasileira é baixa para os padrões internacionais e extremamente baixa pelo padrão dos países emergentes, como esta Folha mostrou na segunda-feira. O aumento da poupança é o próximo grande desafio nacional.

O passo mais imediato é o aumento da poupança pública, com redução de gastos correntes e mais investimentos, uma decisão essencialmente política. As dificuldades no Congresso nessa área são reais e compreensíveis. Mas não maiores que o desafio vencido na década passada de equilibrar as contas e estabilizar a economia.

O segundo passo é elevar a poupança privada. Para isso, será preciso que as políticas públicas deixem de privilegiar o aumento do crédito e do consumo e incentivem a poupança, mesmo com perda de consumo no curto prazo.

A alta do investimento virá com poupança nacional ou estrangeira. Mas a dependência estrangeira não é sustentável, devido ao aumento do déficit externo e das incertezas dos mercados internacionais.

Portanto, a poupança nacional é o único caminho viável para o desenvolvimento sustentável no médio e longo prazos.

Para isso, é preciso que as autoridades assumam essa prioridade como meta nacional, mesmo com sacrifício de políticas pró-consumo de curto prazo.

Por: Henrique Meirelles Folha de SP

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

O QUE DEVE SER FEITO PARA NOS LIVRARMOS DA OPRESSÃO ESTATAL

No último artigo, explicou-se a lógica por trás do aparato estatal, por que os piores sempre chegam ao poder e como eles ali se perpetuam. Agora, é hora de entendermos o que fornece sustento aos parasitas, o que permite que eles permaneçam no poder e, por fim, o que deve ser feito para reverter essa situação.

O papel dos intelectuais

Antes de procedermos à solução, um fato sociológico deve ser reconhecido: a importância do papel dos intelectuais, da educação e da ideologia. Tão logo uma agência de proteção adquira o monopólio territorial da violência e tomada suprema de decisões judiciais — ou seja, um estado — ela deixa de ser um protetor genuíno e se transforma numa máfia de extorsão. E, para combater qualquer eventual resistência por parte das vítimas a este esquema de extorsão, um estado necessita de legitimidade, de justificação intelectual para o que ele faz. Quanto mais explícito se torna o esquema de extorsão do estado — isto é, a cada aumento nos impostos e nas regulamentações —, maior se torna a necessidade de sua legitimação.

Para assegurar a predominância do correto pensamento estatista, este monopolista territorial irá utilizar sua posição privilegiada de beneficiário de um esquema de extorsão para estabelecer rapidamente um monopólio da educação. Afinal, apenas deter o monopólio não será suficiente, principalmente caso a agência seja formada por uma pequena minoria em relação ao número total de súditos. Uma minoria não pode dominar eternamente uma maioria apenas pelo uso da força bruta. Ela precisa dominar a opinião dessa maioria. A maioria da população deve ser adestrada a aceitar voluntariamente o seu domínio. Isso não quer dizer que a maioria tenha de concordar com cada uma de suas medidas. Na realidade, ela pode muito bem achar que muitas das suas políticas estão erradas. Entretanto, ela tem de ser levada a acreditar na legitimidade da instituição do estado como tal; e que, por conseguinte, mesmo que uma política em particular esteja errada, tal erro é um acidente que deve ser tolerado em nome de um bem maior fornecido pelo estado. 

Entretanto, como é possível persuadir a maioria da população a acreditar nisso? A resposta: somente com a ajuda dos intelectuais.

E como é possível fazer com que os intelectuais trabalhem a seu favor? A resposta a isso também é fácil: a demanda de mercado por serviços intelectuais não é exatamente alta e estável. Os intelectuais estariam à mercê dos valores efêmeros das massas; e as massas não estão interessadas em questões intelecto-filosóficas. O estado, por outro lado, pode acomodar os egos tipicamente hipertrofiados dos intelectuais e oferecer a eles um cargo cordial, seguro e permanente em seu aparato.

Porém, não é suficiente que o estado empregue apenas alguns intelectuais. O estado tem de empregar essencialmente todos eles, mesmo aqueles que trabalham em áreas bem distantes daquelas com as quais o estado está mais preocupado: filosofia, história, ciências sociais e literatura. Pois mesmo os intelectuais que trabalham com matemática ou ciências naturais, por exemplo, podem obviamente pensar por conta própria e se tornar potencialmente perigosos. Portanto, é importante que o estado também garanta a lealdade deles. Colocando de maneira diferente: é preciso ser um monopolista. E tal condição será melhor atingida se todas as instituições educacionais, desde o jardim de infância até as universidades, forem subjugadas ao controle estatal e todo o corpo docente for certificado e aprovado pelo estado.

Mas e se as pessoas não quiserem ser educadas? Para evitar isso, a educação deve ser declarada compulsória; e para que todas as pessoas sejam submetidas a uma educação controlada pelo estado pelo máximo de tempo possível, todos devem ser declarados igualmente educáveis. É óbvio que os intelectuais sabem que tal igualitarismo é falso. Entretanto, afirmar tolices do tipo "todos são Einsteins em potencial desde que recebam uma suficiente atenção educacional" é algo que agrada às massas e, por sua vez, gera uma demanda praticamente ilimitada por serviços intelectuais.

É claro que todas essas medidas não garantem que o almejado pensamento genuinamente estatista torne-se predominante. Entretanto, elas ajudam a alcançar a conclusão desejada caso o indivíduo perceba que, sem o estado, ele poderia estar sem seu emprego e talvez teria de tentar ganhar a vida como frentista. Isso seria uma tragédia quando se sabe que ele poderia muito bem ganhar um bom salário ocupando-se de assuntos mais prementes como alienação, igualdade, exploração, desconstrução do gênero e do papel dos sexos, opressão feminina, ou até mesmo a cultura dos esquimós, dos hopis e dos zulus.

E mesmo que os intelectuais venham a se sentir subestimados pelo estado, isto é, por uma administração estatal em particular, eles sabem que a ajuda só poderá vir da próxima administração estatal, e não de um ataque intelectual à instituição do estado. Portanto, não é surpresa alguma que a esmagadora maioria dos intelectuais contemporâneos, inclusive os mais conservadores ou mesmo os "livre-mercadistas", sejam filosófica e fundamentalmente estatistas.

A pergunta que fica: será que o trabalho dos intelectuais surtiu efeito para o estado? Eu diria que sim. Se perguntadas se a instituição do estado é necessária, não creio que seria exagerado dizer que 99% de todas as pessoas iriam resolutamente dizer que sim. E, ainda assim, esse sucesso se apóia em pilares muito instáveis, e todo o edifício estatista pode ser demolido caso o trabalho dos intelectuais seja contestado pelo trabalho de intelectuais anti-intelectuais, como eu gosto de chamá-los.

A enorme maioria dos defensores do estado não é formada por estatistas filosóficos, isto é, eles não pensaramprofundamente no assunto. A maioria das pessoas não pensa muito sobre qualquer questão filosófica. Elas apenas seguem sua rotina diária, e pronto. Logo, a maior parte do apoio ao estado advém do simples fato de que ele existe e sempre existiu desde há muito tempo (tempo esse que é tipicamente o tempo de vida da pessoa que pensou no assunto). Ou seja, a maior conquista dos intelectuais estatistas foi o fato de que eles cultivaram a preguiça (ou incapacidade) intelectual natural das massas, e nunca permitiram que o assunto viesse à tona para uma discussão séria. O estado passou a ser considerado uma parte inquestionável do tecido social.

A primeira e mais importante tarefa dos intelectuais anti-intelectuais, portanto, é atacar essa letargia dogmática das massas oferecendo uma definição precisa do estado, como feito no artigo anterior, para em seguida perguntar se não há nada de verdadeiramente incomum, estranho, bizarro, tosco, ridículo e de fato burlesco em uma instituição como essa. Estou confiante de que esse simples trabalho de definição irá produzir algumas sérias dúvidas em relação a uma instituição que anteriormente vinha sendo tida por natural.

O intelectualismo anti-intelectual

A partir desta constatação sobre a importância das ideias e do papel dos intelectuais como protetores do estado e do estatismo, segue-se que o papel mais importante no processo de liberalização — a restauração da justiça e da moralidade — deve ser assumido por aqueles que podemos chamar de intelectuais anti-intelectuais. No entanto, fica a pergunta: como estes intelectuais anti-intelectuais podem ter êxito em deslegitimar o estado perante a opinião pública se considerarmos que a esmagadora maioria de seus colegas é formada por estatistas que farão de tudo para isolá-los e desacreditá-los, taxando-os de extremistas e malucos? O espaço aqui me permite fazer apenas breves comentários sobre esta questão, que é fundamental.

Primeiro: Dado que será necessário enfrentar a oposição cruel e maliciosa de seus colegas, para que o indivíduo possa resistir e não se deixar abater é de máxima importância não basear sua posição no utilitarismo e na ciência econômica, e sim em argumentos de ordem ética e moral. Pois somente convicções morais provêem a força e a coragem necessárias para uma batalha intelectual e ideológica. Poucos se sentem inspirados ou se dispõem a aceitar sacrifícios quando estão se opondo a coisas que consideram ser meros erros ou superficialidades. Por outro lado, inspiração e coragem podem ser obtidas em grande dose se se souber que se está lutando contra o mal e combatendo mentiras perversas. (Retorno a este ponto brevemente).

Segundo: É importante reconhecer que não é necessário convencer outros intelectuais convencionais. Como demonstrou Thomas Kuhn, isto é algo bastante raro até mesmo nas ciências naturais. Nas ciências sociais, praticamente não se conhece casos de intelectuais consagrados que abandonaram suas opiniões anteriores e se converteram. Em vez disso, os esforços devem ser concentrados naqueles jovens que ainda não se comprometeram intelectualmente; jovens cujo idealismo também os torna particularmente mais receptivos a argumentos morais rigorosos. E, da mesma maneira, deve-se ignorar o mundo acadêmico e se esforçar para alcançar o grande público (isto é, os leigos inteligentes esclarecidos), o qual, de modo geral, nutre alguns saudáveis preconceitos anti-intelectuais, que podem ser facilmente explorados.

Terceiro (retornando à importância de um ataque moral contra o estado): É essencial compreender que não se pode fazer nenhuma concessão em nível de teoria. É claro que não se deve recusar uma cooperação com pessoas que possuam opiniões que sejam essencialmente erradas e confusas, desde que os objetivos delas possam ser classificados, clara e inequivocamente, como um passo correto em direção à desestatização da sociedade. Por exemplo, é correto cooperar com pessoas que pretendem introduzir um imposto de renda uniforme (flat) de 10% (embora não iríamos querer cooperar, por exemplo, com aqueles que gostariam de combinar esta medida com um aumento em outros impostos a fim de manter a arrecadação inalterada). No entanto, sob nenhuma circunstância esta cooperação deve levar a, ou ser obtida por meio de, uma contemporização dos próprios princípios. Ou a tributação é algo justo ou ela é injusta. E uma vez que ela seja aceita como justa, como então será possível se opor a qualquer aumento da mesma? A resposta logicamente é que não é possível!

Em outras palavras, fazer concessões em nível de teoria, como vemos acontecer, por exemplo, entre liberais moderados como Hayek e Friedman, ou mesmo entre os chamados minarquistas, não apenas denota uma grande falha filosófica, como também é uma atitude, do ponto de vista prático, inútil e contraproducente. As idéias destas pessoas podem ser — e de fato são — facilmente cooptadas e incorporadas pelos governantes e pelos ideólogos do estado. Aliás, não é de se estranhar a frequência com que ouvimos estatistas defendendo a agenda estatista dizendo coisas como "até mesmo Hayek (Friedman) diz — ou, nem mesmo Hayek (Friedman) nega — que isto e aquilo deve ser feito pelo estado!" Pessoalmente, eles até podem ter ficado descontentes com isso, mas não há como negar que suas obras serviram exatamente a este propósito; e, consequentemente, queiram ou não, eles realmente contribuíram para o contínuo e incessante crescimento do poder do estado.

Ou seja, gradualismo ou concessão teórica irá gerar apenas a perpetuação da falsidade, do mal e das mentiras do estatismo. Somente o purismo teórico, com seu radicalismo e sua intransigência, pode e irá resultar primeiro em reformas práticas e graduais, depois no aprimoramento, até finalmente chegar a uma possível vitória final. Deste modo, sendo um intelectual anti-intelectual no sentido rothbardiano, um indivíduo não deve se limitar apenas a criticar diversas tolices do governo, ainda que ele possa ter de começar por elas; ele deve sempre partir deste ponto e ministrar um ataque fundamental à instituição do estado, mostrando-o como uma afronta ética e moral. O mesmo deve ser feito com seus representantes, que devem ser expostos como fraudes morais e econômicas, bem como mentirosos e impostores — devemos sempre apontar que os reis estão nus.

Particularmente, o indivíduo jamais deve hesitar em atacar o próprio núcleo da legitimidade do estado: seu suposto papel de indispensável fornecedor de segurança e proteção. Já demonstrei em termos teóricos o quão ridícula é esta alegação: como é possível uma agência que pode expropriar propriedade privada alegar ser protetora da propriedade privada? Mas tão importante quanto o ataque teórico é atacar também a legitimidade do estado em bases empíricas. Isto é, trabalhar arduamente sobre o tema de que os estados, que supostamente deveriam nos proteger, são eles próprios a instituição responsável por 200 milhões de mortes apenas no século XX — mais do que as vítimas de crimes privados em toda a história da humanidade (e este número de vítimas de crimes privados, crimes contra os quais o governo não nos protegeu, teria sido bem menor caso os governos de todos os locais e de todas as épocas não tivessem se empenhado continuamente em desarmar seus próprios cidadãos para que eles mesmos, os governos, não encontrassem resistência e pudessem se tornar máquinas mortíferas ainda mais eficientes)!

Portanto, em vez de tratar políticos com respeito, nossa crítica a eles deveria ser significativamente intensificada: quase sem exceção, eles não são somente ladrões; são também falsificadores, corruptos, charlatães e chantagistas. Como ousam exigir nosso respeito e nossa lealdade?

Mas será que uma vigorosa e distinta radicalização ideológica trará os resultados desejados? Não tenho a menor dúvida que sim. De fato, apenas ideias radicais — e, na verdade, radicalmente simples — podem incitar as emoções das massas inertes e indolentes, e deslegitimar o governo perante seus olhos.

Uma revolução de baixo para cima

Finalmente, vamos à explicação detalhada do significado desta estratégia revolucionaria feita de baixo para cima. Para isto, deixe-me voltar aos comentários feitos no artigo anterior sobre o uso defensivo da democracia — isto é, o uso dos meios democráticos para se alcançar fins libertários não-democráticos e pró-propriedade privada. Duas constatações preliminares já foram estabelecidas.

Primeiro, da impossibilidade de uma estratégia de cima para baixo, segue-se que não se deve gastar muito (na verdade, nenhum) tempo, dinheiro e energia em disputas políticas nacionais, como eleições presidenciais. E, particularmente, também não se deve perder tempo em disputas por qualquer cargo no governo central, seja no senado ou na câmara dos deputados.

Segundo, de acordo com a constatação sobre o papel dos intelectuais na preservação do atual sistema, da atual máfia de extorsão, segue-se que, igualmente, não se deve gastar muito (ou nenhum) tempo, dinheiro ou energia tentando reformar a educação e o meio acadêmico a partir de sua própria estrutura. Tentar se infiltrar no sistema universitário para lecionar sobre livre iniciativa ou propriedade privada, por exemplo, só ajuda a emprestar legitimidade à própria ideia que se quer combater. As instituições oficiais de educação e pesquisa devem ser sistematicamente combatidas, agitando-se para que suas verbas e fontes de financiamento sejam retiradas e secadas. E, para que isso seja feito, todo o apoio ao trabalho intelectual — sendo isso uma parte essencial da tarefa geral que temos pela frente — deve logicamente ser dado a instituições e centros determinados a fazer precisamente isto, como este instituto.

As razões para estes dois conselhos são claras: nem a população como um todo e nem todos os educadores e intelectuais são completamente homogêneos ideologicamente. E, mesmo que seja impossível conquistar uma maioria que apoie uma plataforma decididamente antidemocrática e libertária em escala nacional, parece não haver nenhuma dificuldade insuperável para se conquistar esta mesma maioria em localidades suficientemente pequenas, e em funções locais e regionais dentro da estrutura governamental democrática geral. Com efeito, parece não ser nada fora da realidade esperar que essa maioria exista em milhares de localidades. Ou seja, localidades dispersas por todo o país, mas não dispersas uniformemente. Igualmente, mesmo que a classe intelectual deva ser de modo geral considerada inimiga natural da justiça e da segurança, existem em diversas localidades intelectuais anti-intelectuais isolados e, como o Instituto Mises comprova, é totalmente possível reunir estes indivíduos isolados em torno de um centro intelectual e dar a eles unidade e força, bem como uma plateia nacional ou até internacional.

Mas, e depois? Todo o resto advém quase que automaticamente do objetivo supremo, que deve ser mantido sempre em mente, em todas as atividades desenvolvidas: a restauração, de baixo para cima, da noção de propriedade privada e do direito de proteger a propriedade; o direito à autodefesa, à liberdade de contrato, e de excluir ou incluir quem quisermos em nossas relações. E a resposta pode ser dividida em duas partes. 

Primeiro, o que fazer nestas pequenas localidades, onde um candidato pró-propriedade privada e personalidade anti-populista possa vencer. E segundo, como lidar com os níveis mais elevados do governo e, especialmente, com o governo federal centralizado. Primeiramente, como um passo inicial, e refiro-me agora ao que deveria ser feito em nível local, o primeiro alicerce central da plataforma deveria ser: deve-se fazer de tudo para restringir o direito de voto sobre decisões a respeito de impostos locais — particularmente a respeito de impostos sobre propriedades e regulamentações — aos donos de imóveis e propriedades. Somente donos de propriedades devem poder votar, e seus votos não devem ter pesos iguais, e sim devem valer de acordo com o valor do patrimônio líquido possuído e do total de impostos pago.

Além disso, todos os funcionários públicos — professores, juízes, policiais — e todos os recebedores de ajudas assistencialistas do estado, inclusive empresários protegidos, devem ser excluídos de votações que tratem de impostos locais e regulamentações locais. A renda destas pessoas advém de impostos e, por isso, elas não deveriam poder dizer nada a respeito do valor dos impostos. É óbvio que, com esta plataforma, não se pode vencer em todo lugar. Você certamente não será eleito em Brasília com uma plataforma como esta, mas eu arriscaria dizer que, em muitas localidades, principalmente naquelas formadas majoritariamente por indivíduos trabalhadores e produtores, isto pode facilmente acontecer. As localidades têm de ser pequenas o bastante e têm de ter um bom número de pessoas decentes.

Consequentemente, todos os impostos e taxas locais, bem como a arrecadação fiscal como um todo, irão inevitavelmente diminuir. O valor das propriedades e a maior parte da renda local irão aumentar, ao passo que o número de funcionários públicos e o valor de seus salários irão cair. 

Neste momento, e este é o passo mais decisivo, o seguinte deve ser feito – e sempre tenha em mente que estou falando sobre distritos territoriais muito pequenos.

Nesta crise de financiamento do governo, que surgirá assim que o direito de votar for retirado da turba, uma maneira de sair dela seria a privatização de todos os ativos do governo. Faz-se um inventário de todos os prédios públicos — e em um nível local não são tantos assim: escolas, corpo de bombeiros, delegacia de polícia, tribunais, ruas etc. — e, em seguida, ações ou títulos parciais de propriedade devem ser distribuídos aos donos de propriedade privada locais de acordo com o total de impostos — impostos sobre propriedade — que estes pagaram durante suas vidas. Afinal, tudo isso é deles, pois foram eles que pagaram por estas coisas.

Consequentemente, uma vez que as autoridades locais não mais estivessem sujeitas aos ditames do governo central, as ordens deste seriam apenas palavras ao vento. Todavia, enquanto o número de comunidades liberadas ainda for pequeno, esta postura parece ser um tanto perigosa. Seria aconselhável, portanto, que, durante esta fase, fossem evitados confrontos diretos com o governo central, não se condenando publicamente sua autoridade e nem mesmo renunciando solenemente ao reino.

Preferencialmente, seria aconselhável praticar uma política de não-cooperação e de resistência pacífica. Os cidadãos locais simplesmente param de ajudar na imposição e na execução de toda e qualquer lei federal. Pode-se assumir a seguinte atitude: "Tais regras são suas, e cabe a você impingi-las. Não posso impedir que você faça isso, mas também não irei ajudá-lo, pois meu único compromisso é com meu eleitorado local".

Se aplicado com consistência, sem nenhuma cooperação e sem nenhuma ajuda em nenhum nível, o poder do governo central diminuiria drasticamente. Ou até mesmo se evaporaria. E, levando-se em consideração a opinião pública geral, seria extremamente improvável que o governo federal ousasse ocupar um território em que os habitantes não fizeram nada além de tentar cuidar da própria vida.

Tão logo o número de territórios implicitamente separatistas atingisse uma massa crítica — e cada ação bem-sucedida em uma pequena localidade estimula e encoraja a próxima —, tudo inevitavelmente tornar-se-ia um movimento de municipalização radical em nível nacional, com políticas locais explicitamente secessionistas, demonstrando pública e insolentemente desobediência à autoridade federal.

E então, será em uma situação como esta — quando o governo central for obrigado a abdicar de seu monopólio da violência e da tomada suprema de decisões judiciais, e quando a relação entre as autoridades locais (em ressurgimento) e as autoridades centrais (prestes a perder seus poderes) puderem ser colocadas em um nível puramente contratual — que recuperaremos o poder de defender nossa própria propriedade novamente.

Hans-Hermann Hoppe é um membro sênior do Ludwig von Mises Institute, fundador e presidente da Property and Freedom Society e co-editor do periódico Review of Austrian Economics. Ele recebeu seu Ph.D e fez seu pós-doutorado na Goethe University em Frankfurt, Alemanha. Ele é o autor, entre outros trabalhos, de Uma Teoria sobre Socialismo e Capitalismo eThe Economics and Ethics of Private Property.

PROGRESSISTAS, REACIONÁRIOS, HISTERIA E A LONGA MARCHA GRAMSCIANA

Antonio Gramsci, filósofo criador do estratégico aparelhamento das instituições
Por que a esquerda sempre faz uma oposição histérica a toda e qualquer ínfima medida ou iniciativa que seja por ela tida como "antiprogressista" ou, pior ainda, "reacionária" e contrária ao seu "projeto de poder"? Seja no quesito aborto, no quesito dos "direitos" dos homossexuais ("direitos", no linguajar esquerdista, nada mais são do que deveres impingidos aos pagadores de impostos), nos privilégios raciais e sindicais, no feminismo, no desarmamento e até mesmo em tímidas propostas de reformas assistencialistas, a esquerda progressista sempre reage com um furor frenético contra qualquer pessoa — seja político, comentarista político ou apenas alguém da mídia alternativa — que se atreva a fazer algo que leve a um pequeno recuo destes sagrados esquemas socialistas.

O frenesi progressista que vem varrendo o mundo começou realmente no final dos anos 1930. Naquela época, vivendo em Nova York, minha família, meus amigos e meus vizinhos, todos esquerdistas, haviam chegado ao paroxismo do medo e da raiva por causa da contrarrevolução de Franco e da iminente derrocada do governo espanhol esquerdista durante a Guerra Civil Espanhola. Superabundavam denúncias e vituperações lacrimosas contra Franco, além de contínuas exortações para que "alguma coisa fosse feita". Houve a criação de organizações especializadas em enviar de tudo para a Espanha, desde leite até armas e soldados. Era a "Brigada Internacional", criada para defender a esquerda espanhola (alcunhada de "Legalistas" pelo sempre simpatizante The New York Times e por outros veículos da mídia "respeitável").

Vale enfatizar que estas pessoas jamais — nem antes e nem durante — haviam demonstrado qualquer tipo de interesse pela história, cultura ou política espanhola. Logo, por que repentinamente passaram a se preocupar com o país? O historiador esquerdista Allen Guttman chegou até a documentar e celebrar esta histeria em relação à Espanha em seu livro A Ferida no Coração (o título já diz tudo). Certa vez perguntei ao meu amigo Frank S. Meyer, que havia sido um proeminente comunista americano, a respeito deste enigma. Ele deu de ombros: "Nós [os comunistas] nunca conseguimos entender o porquê. Mas tiramos proveito do sentimentalismo progressista da questão".

A explicação ortodoxa dos historiadores é que os esquerdistas da época — cujo quartel-general, a fonte de financiamento, estava nos EUA — estavam especialmente temerosos quanto à "ameaça do fascismo", e defendiam freneticamente a esquerda espanhola porque viam a Guerra Civil daquele país como um prenúncio de uma inevitável Segunda Guerra Mundial. Mas o problema com esta explicação é que, embora a esquerda progressista houvesse defendido entusiasmadamente a "boa" Guerra contra o Eixo, ela nunca realmente arregimentou a mesma emotividade, a mesma exaltação, o mesmo furor que demonstrava em relação a Franco contra Hitler, por exemplo.

Então, qual a verdadeira explicação para a atual postura da esquerda em relação a temas cultural e economicamente progressistas?

Creio que uma pista pode ser encontrada na mini-histeria que a esquerda demonstrou a respeito da contrarrevolução ocorrida contra o regime esquerdista da Salvador Allende no Chile, uma contrarrevolução que colocou o General Augusto Pinochet no poder. A esquerda, até hoje, ainda não perdoou a direita chilena e a CIA por este golpe. Allende ainda é considerado um mártir querido pela esquerda, e sua filha Isabel, um ícone (embora ainda percam para Che Guevara). Seria esta raiva tão duradoura só porque um regime comunista foi derrubado? Quase, mas ainda longe. Afinal, a esquerda não demonstrou grandes emoções, não demonstrou nenhum desespero, quando os regimes comunistas entraram em colapso na União Soviética e no Leste Europeu.

Logo, sugiro que 'A Resposta' para este mistério é a seguinte: a esquerda é, em sua essência, "progressista", o que significa que ela acredita, à moda marxista ou Whig, que a história consiste em uma 'inevitável marcha ascendente' rumo à luz, rumo à utopia socialista. A esquerda progressista acredita no mito do progresso inevitável; ela acredita que a história está ao seu lado, sempre conspirando a seu favor. Sendo ela formada por social-democratas (mencheviques), primos dos comunistas (bolcheviques) — com quem vivem entre tapas e beijos —, a esquerda progressista possui um objetivo similar ao dos comunistas, mas não idêntico: um estado socialista igualitário, gerido totalmente por burocratas, intelectuais, tecnocratas, "terapeutas" e pela Nova Classe iluminada, geralmente em colaboração com — e sempre sendo apoiada por — credenciados membros de todos os tipos de grupos vitimológicos, aquela gente que se diz perseguida e que vive lutando por "direitos iguais" — sendo que o 'iguais' significa na verdade 'superiores'. Estes grupos são formados por negros, mulheres, gays, deficientes, índios, cegos, surdos, mudos etc. 

A esquerda progressista acredita que a história está marchando inexoravelmente rumo a este objetivo. Uma parte vital deste objetivo é a destruição da família tradicional, "burguesa" e composta de pai e mãe, que deve ser substituída por um sistema em que as crianças são criadas e educadas pelo estado e por sua Nova Classe de orientadores, tutores, terapeutas e demais "cuidadores" infantis.

A utópica marcha da história, objetivo dos social-democratas, também é similar à dos comunistas, mas não exatamente a mesma. Para os comunistas, o objetivo era a estatização dos meios de produção, a erradicação da classe capitalista, e a tomada de poder pelo proletariado. Já os social-democratas entenderam ser muito melhor um arranjo em que o estado socialista mantém os capitalistas e uma truncada economia de mercado sob total controle, regulando, restringindo, controlando e submetendo todos os empreendedores às ordens do estado. O objetivo social-democrata não é necessariamente a "guerra de classes", mas sim um tipo de "harmonia de classes", na qual os capitalistas e o mercado são forçados a trabalhar arduamente para o bem da "sociedade" e do parasítico aparato estatal. Os comunistas queriam uma ditadura do partido único, com todos os dissidentes sendo enviados para os gulags. Os social-democratas preferem uma ditadura "branda" — aquilo que Herbert Marcuse, em outro contexto, rotulou de "tolerância repressiva" —, com um sistema bipartidário em que ambos os partidos concordam em relação a todas as questões fundamentais, discordando apenas polidamente acerca de detalhes triviais — "a carga tributária deve ser de 37% ou de 36,2%?".

Liberdade de expressão, de imprensa e de ideias é tolerada pelos social-democratas, mas desde que ela se mantenha dentro de um espectro de opiniões pré-aprovadas. Os social-democratas repelem a brutalidade dos gulags; eles preferem fazer com que os dissidentes padeçam da "suave" e "terapêutica" ditadura do politicamente correto, na qual eles forçosamente têm de aprender as maravilhosas virtudes de ser educado na "dignidade de estilos de vida alternativos", sempre submetidos a um intenso "treinamento de sensibilidade". Em outras palavras, Admirável Mundo Novo em vez de 1984. A "marcha ascendente da democracia" em vez da "ditadura do proletariado".

Também típica é a distinção, nas duas utopias, acerca de como lidar com a religião. Os comunistas, como fanáticos ateístas, tinham o objetivo de abolir por completo a religião. Já os social-democratas preferem uma abordagem mais suave: subverter o cristianismo de modo a fazer com que a religião se torne aliada da social-democracia. Daí a sagaz cooptação da esquerda cristã pelos social-democratas: enfatizando o modernismo entre os católicos e o evangelicalismo esquerdo-pietista entre os protestantes — este último objetivando criar um Reino de Deus na Terra na forma de uma coerciva e igualitária "comunidade de amor". 

Trata-se de uma estratégia muito mais astuta: cooptar religiosos em vez de assassinar padres e freiras e confiscar igrejas — esta última feita pelo regime republicano espanhol e por seus partidários trotskistas e anarquistas de esquerda, algo que não gerou absolutamente nenhum grito de protesto por parte de seus devotos defensores progressistas e social-democratas ao redor do mundo.

Esta distinção nos objetivos — totalitarismo brando vs. radical — também é refletida na acentuada diferença entre as estratégias e os meios utilizados. Os comunistas, ao menos em sua clássica fase leninista, ansiavam por uma revolução violenta e apocalíptica que destruiria o estado capitalista e levaria à ditadura do proletariado. Já os mencheviques — social-democratas ou neoconservadores —, fieis ao seu ideal "democrático", sempre se sentiram um tanto desconfortáveis com a ideia de revolução, preferindo muito mais a "evolução" gradual produzida pelas eleições democráticas. O estado deve ser totalmente aparelhado por intelectuais partidários e simpatizantes, de modo a garantir a continuidade da longa marcha gramsciana da conquista das instituições culturais e sociais do país. Daí a desconsideração pelos gulags e pela revolução armada. Por isso o desaparecimento de seus primos (e concorrentes) bolcheviques não ter sido lamentado pelos social-democratas. Muito pelo contrário: os social-democratas agora detêm o monopólio da marcha "progressista" da história rumo à Utopia.

O que me traz de volta à minha 'Resposta' sobre o porquê da histeria da esquerda progressista: ela se torna histérica sempre que percebe a ameaça de uma pequena reversão na Inevitável Marcha da História. Ela se torna histérica quando visualiza alguns empecilhos e, principalmente, retrocessos nesta sua inexorável marcha ao poder total, retrocessos estes que sempre são rotulados, obviamente, de "reações". Na visão de mundo tanto de comunistas quanto de social-democratas, a mais alta — desde que "progressista" — moralidade é se mostrar não apenas um defensor, mas também, e principalmente, um entusiasmado fomentador da 'inevitável próxima fase da história'. É ser a "parteira" (na famosa expressão de Marx) desta fase. Da mesma forma, a mais profunda, se não a única, imoralidade é ser "reacionário", ser alguém dedicado a se opor a este inevitável progresso — ou, pior ainda, alguém dedicado a fazer retroceder a maré, a restaurar costumes enraizados, a "atrasar o relógio". 

Este é o pior pecado de todos, e ele gera todo este frenesi justamente porque qualquer retrocesso bem-sucedido colocaria em dúvida aquele que é o mais profundo e o mais inquestionavelmente aceito mito "religioso" da esquerda progressista: a ideia de que o progresso histórico rumo à sua Utopia é inevitável. 

Trata-se, no mais profundo sentido, de uma guerra não apenas cultural e econômica, mas religiosa. "Religiosa" porque social-democracia/progressismo de esquerda é uma visão de mundo passional, uma "religião" no mais profundo sentido, pois guiada unicamente pela fé: trata-se da ideia de que o inevitável objetivo da história é um mundo perfeito, um mundo socialista igualitário, um Reino de Deus na Terra, seja este deus "panteizado" (sob Hegel e os adeptos do Romantismo) ou ateizado (sob Marx). 

Esta é uma visão de mundo em relação à qual não deve haver concessões ou clemência. Ela deve ser contrariada e combatida veementemente, com cada fibra de nosso ser.

Quem vai vencer essa guerra? Não se sabe. De que lado está a maioria da população? Certamente perdida, disponível para quem chegar primeiro. A maioria está confusa, vagando de um lado para o outro, dividida entre visões de mundo conflitantes. Ela pode pender para qualquer lado. Durante suas inúmeras batalhas faccionárias dentro do movimento marxista, Lênin certa vez escreveu que há dois grupos batalhando, cada um formado pela minoria da população, sendo que a maioria está no centro, e é formada justamente pelas pessoas confusas, às quais ele se referiu como O Brejo. A maioria da população hoje está confusa e constitui O Brejo; estas pessoas estão no terreno no qual a maioria das batalhas será disputada. E a metáfora é corretamente militar. A batalha iminente é muito mais ampla e profunda do que apenas discutir alíquotas de impostos. Trata-se de uma batalha de vida e morte pelo formato do nosso futuro. Daí se compreende o frenesi que acomete a esquerda sempre que uma medida "reacionária" parece ser favorecida pela sociedade.

A esquerda progressista não se importa muito com — na verdade, ela até gosta de — pequenos revezamentos de poder: uma década de governos abertamente progressistas, nos quais a agenda esquerdista é avançada, seguida de alguns anos de governo "oposicionista" ou "conservador", no qual há apenas uma consolidação ou simplesmente uma redução na velocidade do avanço. O que ela realmente teme é a perspectiva do conservadorismo se tornar reacionário, no sentido de realmente fazer retroceder alguns ganhos "progressistas". É isso que a apavora. Daí a histeria em relação a Franco e a Pinochet; daí o linchamento de Joe McCarthy, que realmente ameaçou ser bem-sucedido em fazer recuar não apenas os comunistas, mas até mesmo os progressistas e social-democratas. Ameace retroceder "direitos" obtidos por grupos de feministas, de gays, de negros, de desarmamentistas, de funcionários públicos, de sindicalistas ou de qualquer outro do ramo vitimológico, e você verá o que é uma fúria progressista.

Portanto, o combate requer, principalmente, coragem e nervos para não ceder e não se dobrar perante as totalmente previsíveis reações caluniosas e difamantes dos oponentes. Acima de tudo, o objetivo não deve ser o de se tornar querido e bem aceito por progressistas ou pela Mídia Respeitável. Tal postura irá gerar apenas mais rendição, mais derrotas. Igualmente, o objetivo não é apenas o de fazer retroceder o estado leviatã, sua cultura niilista e estas pessoas que querem se apossar do estado e impor sua agenda sobre nós. O objetivo tem de ser a eliminação completa e irreversível deste monstruoso sonho de um Perfeito Mundo Socializado gerido por "pessoas de bem".

Que a reação ocorra, que os "direitos" sejam retrocedidos, que esta gente recue, entre em órbita e finalmente perceba que, na realidade, sua religião é maléfica.

Murray N. Rothbard (1926-1995) foi um decano da Escola Austríaca e o fundador do moderno libertarianismo. Também foi o vice-presidente acadêmico do Ludwig von Mises Institute e do Center for Libertarian Studies.