segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

DESPENCANDO LADEIRA ABAIXO

Ano sombrio com nuvens carregadas se avizinha, com nosso continente despencando ladeira abaixo rumo ao socialismo mais torpe, amoral e criminoso.

Quando vai chegando o fim do ano, fazer um balanço do decorrido é quase inevitável, sobretudo quando se vive num continente já totalmente dominado pelo esquerdismo mais rude e abjeto de que se tenha tido notícia.

Esse foi um ano de muitas e grandes eleições, começando pela Venezuela que, através de múltiplas fraudes e crimes eleitorais “elegeu” Nicolás Maduro, mesmo quando se tinha as provas de que ele não é venezuelano e sim colombiano, o que fere frontalmente a Constituição Nacional. Mas ele era desde sempre o eleito dos ditadores cubanos Castro e, tal como Obama, vem mantendo sua verdadeira identidade sob uma blindagem ignominiosa e intransponível.

O Paraguai teve mais sorte e elegeu o empresário Horacio Cartes. Em Honduras, a candidata Xiomara Castro, esposa do destituído Manuel Zelaya que recebeu apoio descarado em vídeo de Lula, presidente de honra desta organização criminosa, não foi eleita. Entretanto, essas foram as duas baixas sofridas pelo Foro de São Paulo.

A Colômbia vive momentos dramáticos com o acosso das FARC, comandado desde Havana, onde estão os cabeças da organização terrorista, com a farsa de “negociações de paz” com o governo do traidor Juan Manuel Santos. O serviço de inteligência da Polícia descobriu planos das FARC para assassinar o ex-presidente Uribe, o Procurador Geral Alejandro Ordóñez Maldonado e o ex-ministro da Justiça Fernando Londoño. Tudo isso enquanto se refestelavam com os luxos capitalistas em Havana, e cujo processo “de paz” se dá inteiramente baseado em seu Plano Estratégico.

Há poucos dias, depois de anunciar um cessar fogo pelas festividades natalinas, as FARC atacaram com um carro bomba o município de Inzá-Cauca, deixando um saldo de 7 mortos (adultos, crianças, civis e militares), 53 feridos, 127 casas afetadas, centenas de pessoas traumatizadas e 3 bilhões de pesos [1] em perdas materiais. Mas isto não foi o bastante para que Santos compreendesse que não há qualquer interesse nesse bando terrorista em encerrar definitivamente o conflito que já dura mais de 50 anos, e continua com a farsa criminosa que está custando ao bolso do contribuinte uma soma incalculável. E enquanto as famílias lastimavam suas perdas, em vidas e bens materiais, Santos organizou uma comitiva para ir prantear o comunista Mandela, falecido na África do Sul, sem se importar um milímetro por seus compatriotas assassinados.

Como se toda essa desgraça não fosse o bastante, o prefeito de Bogotá, Gustavo Petro, foi destituído pelo Procurador Ordóñez e inabilitado para a política durante 15 anos, por haver realizado negócios escusos com empresas de coleta de lixo. O “ex” terrorista do M-19, cognome “Comandante Aureliano”, não aceitou a sentença que chamou de “golpe de Estado” e convocou sua militância para uma manifestação na Praça de Bolívar, onde se localiza do Palácio Liévano, sede da Prefeitura. Do balcão, ele gritava que foi convidado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA, onde será ouvido e conclamava o povo a “se indignar”, num claro crime de incitação à rebelião.

Gustavo Petro em seu discurso incendiário no balcão da Prefeitura

O ato do Procurador foi rigorosamente dentro da Lei, entretanto, as FARC imediatamente emitiram um comunicado em apoio a Petro, assim como várias organizações comunistas ao redor do mundo. As manifestações em Bogotá continuam e prometem muita violência.

Na Argentina, durante duas semanas várias cidades foram alvo de saques e depredações, em decorrência de uma greve de policias iniciada em Córdoba. Até o momento contam-se 13 mortos e dezenas de feridos, sendo Tucumán a cidade mais afetada. Os vândalos, tal como se viu aqui no Brasil, depredaram e saquearam lojas, supermercados e lojas atacadistas, chegando ao absurdo de 50 pessoas agredirem e assassinarem um chinês, proprietário de uma loja, incendiando-a depois.

E para culminar, como se não bastasse a estatização da maconha por parte do “ex” terrorista José Mujica, presidente do Uruguai, o Chile deu seu aval novamente à ex-presidente Michelle Bachelet. O número de abstenções foi um dos mais expressivos já registrados, algo em torno dos 62%, além dos votos nulos e em branco, decorrente do descrédito dos chilenos com o presidente Sebastián Piñera, de centro-direita, que fez um péssimo governo para a ala conservadora, inclusive por ter recebido o ditador Raúl Castro que foi nomeado presidente da CELAC, com honras de chefe de Estado e muitos rapapés.

Bachelet volta com promessas de reformar a Constituição que, para ela, tem muitos “ferrolhos anti-democráticos”, uma vez que foi escrita durante a gestão do falecido General Augusto Pinochet. Na agenda, como não poderia faltar, estão a legalização do aborto e a aprovação do casamento entre pares homossexuais.

Ano sombrio com nuvens carregadas se avizinha, com nosso continente despencando ladeira abaixo rumo ao socialismo mais torpe, amoral e criminoso, sobretudo no Brasil, com a invasão cubana que tende a aumentar e se consolidar. Que Deus tenha piedade de todos nós!
Nota: Equivalente a R$ 3 milhões de reais.

Por: Graça Salqueiro Do site www.midiasemmascara.com.br 

MANDELA E O MENSALÃO

No embalo do espírito natalino, virou moda entre a elite culta defender José Genoino

A frase que resume os dez anos de reinado do oprimido no Brasil foi dita pelo deputado João Paulo Cunha (PT-SP), condenado no processo do mensalão: “Se o Mandela ficou 27 anos preso, eu suportarei também.”

Nelson Mandela tinha acabado de morrer, e já era contrabandeado pelo herói mensaleiro. Os oprimidos de gravata sugam o que podem, até a memória alheia. Não se pode esquecer que, em sua propaganda eleitoral, Dilma Rousseff confiscou a identidade de Norma Bengell, usando uma foto da atriz na passeata de 1968 em sua apresentação biográfica. No dia seguinte ao brado de João Paulo Cunha, Dilma estava no Congresso do PT que apoiou os mensaleiros condenados. A presidente repetiu, com a ajuda de Lula, o já famoso gesto do braço erguido com o punho cerrado — inaugurado por Dirceu e Genoíno na chegada à prisão. Não se sabe bem o que significa aquela mão fechada. Há quem diga que é um aviso de que não vão devolver o que roubaram.

Como pode a presidente da República participar de um comício em defesa de corruptos condenados e presos? Um comício onde um partido político censura a mais alta corte da Justiça, com pesados ataques ao seu presidente? Dilma pode. Assim como o mensaleiro João Paulo pode se comparar a Mandela e, em seguida, dizer “longe de mim me comparar a Mandela”. Pode também distribuir centenas de exemplares de uma revista inocentando a si mesmo, e se declarar ofendido quando a imprensa pergunta quem pagou aquilo. Num país saudável, João Paulo Cunha viraria piada e Dilma Rousseff teria de prestar esclarecimentos no Congresso Nacional sobre seu gesto favorável a criminosos. Mas no Brasil a moral virou geleia.

Tanto que, no embalo do espírito natalino, virou moda entre a elite culta defender José Genoíno. Vozes intelectualizadas se erguem para avisar que o ex-presidente do PT, condenado e preso, não ficou rico e vive até hoje modestamente. Os samaritanos não chegam a dizer que o mensalão não existiu, mas dizem que a biografia de Genoíno é ótima e ele é cardíaco. Bradam que é um absurdo estigmatizar como bandido um cara tão legal.

Não é preciso dizer mais nada para explicar o Brasil de hoje. Um indivíduo condenado como partícipe do maior assalto aos cofres públicos da história da República encontra, entre vozes supostamente respeitáveis, uma espécie de anistia informal. Estava no bando mensaleiro, mas leva uma vida franciscana. Se meteu nesse rolo, mas é gente boa. Note-se que essas pessoas de bem não chegam ao delírio petista de afirmar que qualquer um dos mensaleiros seja inocente. Apenas se mostram indignadas com o fato de um sujeito bacana como Genoíno (condenado por corrupção ativa e formação de quadrilha) ser tratado como criminoso. Está inaugurada a figura do infrator bonzinho.

Possivelmente Genoíno não tramaria o valerioduto, exatamente por sua boa índole. Mas então deveria, em vez de assinar a papelada suja de Valério, ter se demitido imediatamente da presidência do PT. Não o fez porque já havia transformado a política em emprego, assim como o exército de companheiros medíocres que tomaram o Brasil de assalto como meio de vida. E não largarão o osso em 2014, justamente porque os brasileiros honestos são indulgentes com o infrator bonzinho.

No mesmo congresso partidário em que Dilma participou do desagravo aos mensaleiros, Lula deu mais uma aula de princípios. O oráculo afirmou que a imprensa (sempre ela) exagerou no caso do emprego de José Dirceu. Um sujeito condenado por desviar uma montanha de dinheiro público consegue, na prisão, salário de 20 mil reais como gerente de um hotel que tem um “laranja” entre seus donos. Mais impressionante: esse condenado que não disfarça suas ótimas relações com o submundo é apoiado em público pelo ex-presidente e sua preposta que governam o país. E o país, ato contínuo, avisa que vai reeleger o bando em primeiro turno.

Pensando bem, com um salvo-conduto desses, piratear Nelson Mandela e Norma Bengell está barato. Jesus Cristo não escapa.

Enquanto isso, na realidade tediosa dos que não têm os punhos cerrados em direção ao céu, o Brasil bate mais um recorde: maior rombo nas contas externas em mais de 50 anos. Uma bobagem, puro preconceito contra o governo popular: os investidores estão fugindo do Brasil só porque o governo petista mente sobre suas contas, tenta esconder a inflação comprimindo tarifas e comprometendo empresas como a Petrobras, diz coisas desencontradas sobre política monetária, abandona a infraestrutura e fatura com a selva tributária, fazendo o risco Brasil disparar. Tudo inveja da ascensão terceiro-mundista, diria o saudoso Hugo Chávez.

Agora há uma corrente do PT defendendo apoio formal aos métodos boçais dos black blocs. Medida desnecessária. Os métodos do partido destroem com muito mais eficácia.
Por: Guilherme Fiuza  O Globo



DISJUNTORES DA ECONOMIA DE MERCADO

Já refleti várias vezes neste espaço sobre o que chamo de "disjuntores de uma economia de mercado".


Disjuntores são pequenas peças de engenharia cujo objetivo é sempre o de provocar uma interrupção no funcionamento de equipamentos mecânicos ou elétricos, quando alguma anormalidade ocorre. Desculpem-me meus colegas engenheiros por essa explicação singela, mas, para construir a imagem desses mecanismos de segurança no campo da economia, ela é suficiente.

Nas economias de mercado, há vários mecanismos que funcionam da mesma forma que os disjuntores citados acima. Sua função é esfriar a atividade econômica quando algum mal funcionamento nos mercados ameaça criar um desequilíbrio muito forte na economia.

Essa minha imagem tem inspiração no pensamento de Lord Keynes, que foi um dos primeiros economistas a questionar a ideia -ainda dominante em setores liberais mais radicais- de que no sistema capitalista esse tipo de disfunção não poderia acontecer.

Na prática temos dois grandes grupos de disjuntores em uma economia como a brasileira.

O primeiro agrega os mecanismos de defesa que se desenvolvem de forma natural e autônoma em uma economia de mercado.

O outro grupo é formado por disjuntores acionados pela regulação externa ao sistema e que são construídos pelo próprio homem. O maior número de elementos desse grupo foi criado no passado para enfrentar situações em que a inflação representava o grande desafio a enfrentar.

Apenas muito raramente esses mecanismos externos de intervenção visavam combater a situação oposta que pode ocorrer, ou seja, a deflação e a depressão econômica.

Nos últimos cinco anos, em que vivemos de forma intensa essa patologia, acompanhamos a criação de novas formas "ad hoc" de intervenção externa. Os chamados instrumentos de expansão monetária quantitativa -QE, na expressão inglesa-, no caso de ameaça de deflação mais séria, são os exemplos mais marcantes dessa busca.

No Brasil de hoje vivemos um momento em que alguns desses disjuntores mais tradicionais, tanto os naturais como os criados pelo homem, entraram em funcionamento após um longo período de expansão da economia e o aparecimento normal de gargalos importantes no lado da oferta. Um dos mais importantes tem sido a redução do endividamento do consumidor em razão de dificuldades de solvência. O outro, colocado em funcionamento autonomamente pelo BC, é o aumento da Selic.

Na euforia dos últimos anos, o comprometimento da renda do consumidor com o pagamento de dívidas passou do limite natural e começou a provocar desequilíbrios em seus orçamentos domésticos.

Em um país em que somos monitorados implacavelmente pelo Big Brother Serasa, não restou outra saída para a nova classe média senão moderar o consumo.

Esse processo de ajuste foi reforçado pelo disjuntor representado pelo Copom e por sua decisão de impor juros bem mais elevados aos tomadores de crédito.

As estatísticas divulgadas pelo próprio BC mostram que os gastos com juros e amortizações passaram de mais 16% da renda das famílias, no início de 2006, para mais de 22% na euforia do consumo no ano eleitoral de 2010. Agora, em novembro, em tempos mais bicudos de crescimento, o BC informa que estamos abaixo do nível crítico de 20% da renda familiar.

Além desses, outros disjuntores também estão agindo sobre o crescimento econômico e moderando sua intensidade. Um deles -a queda dos termos de troca do comércio exterior brasileiro- está sendo acionado por forças totalmente externas a nós, como a redução da demanda chinesa e, principalmente, a valorização do dólar no mercado internacional.

Criado em razão das expectativas de mudanças na política monetária do Fed, esse disjuntor poderá ser o grande fator negativo em 2014, caso as projeções de parte do mercado se confirmem.

É o funcionamento desses disjuntores que, para mim, explicam de forma mais clara essa nova velocidade de cruzeiro da economia brasileira. E essa velocidade não pode ser alterada sem que uma terapia mais adequada, para enfrentar os desequilíbrios de oferta que enfrentamos hoje, seja implementada pelo governo.Por: Luiz Carlos Mendonça de Barros Folha de SP

domingo, 29 de dezembro de 2013

SAMBA DO BRASILEIRO DOIDO

Encastelados no trono, passaram a falsificar a história.


Orwell já disse que “quem controla o futuro controla o presente, e quem controla o presente controla o passado”. Os ditadores comunistas especializaram-se nisso, apagando das fotos todos os poderosos que caíram em desgraça. Recentemente pudemos ver este mecanismo em ação na Coreia do Norte, onde o tio do ditador vem sendo apagado da memória oficial.

É mais ou menos a mesma coisa que vem acontecendo com a história recente de nosso país. Tivemos, de 1964 até 1985, um governo desenvolvimentista autoritário, combatido na maior parte do tempo por grupelhos de guerrilha maoísta, stalinista e trotskista que – ao contrário do governo – não dispunham de absolutamente nenhum apoio popular para seus planos de estabelecer uma “ditadura do proletariado” semelhante às de Cuba ou da Coreia. Uma pequeníssima parcela da classe média urbana os apoiava, mas só. Sua ação, para piorar as coisas, levou a um recrudescimento ditatorial do autoritarismo já reinante, atrasando a redemocratização do país em pelo menos 15 anos.

Após o fim da ditadura, usando como escada a esquerda moderada que os governos militares não só toleravam, mas incentivavam, membros desses grupelhos chegaram ao poder, presenteando-se com pensões milionárias, isentas de Imposto de Renda. Até aí, nada de novo; o patrimonialismo que faz dos bens públicos prêmios a amigos do governo é uma antiquíssima tradição brasileira.

Encastelados no trono, contudo, passaram a falsificar a história. Escolas nomeadas em homenagem a presidentes militares passaram a homenagear terroristas assassinos, procurados com razão pela polícia durante os governos militares. O cadáver do pobre Jango, um presidente fraco que se deixou levar pelo que de pior havia na esquerda de então, foi desenterrado e cutucado sem que nada de errado fosse encontrado. Mesmo assim, na hora de devolvê-lo ao campo santo, fez-se uma farsa ao dar-lhe honras militares, seguidas pela devolução simbólica da Presidência ao cadáver. É a reescrita farsesca da história. Com JK, então, a coisa é ainda mais delirante: inventou-se – contrariamente ao discernido pela perícia e ao bom senso – que ele foi assassinado, provavelmente por um atirador saído de algum filme americano, capaz de acertar a cabeça de um motorista no meio de uma curva movimentada na Via Dutra. Pudera que os parentes do motorista considerem toda essa movimentação uma piada macabra.

Ninguém na história é santo: nem os militares, nem os terroristas ora no poder. Esta farsa, contudo, já está ficando ridícula.

Publicado no jornal Gazeta do Povo.

Por: Carlos Ramalhete é professor.

GOVERNO, GOVERNANÇA E CONTRATO

Governança é uma expressão relativamente nova, e tem a ver com o desenho dos processos decisórios dentro de organizações, públicas e privadas, com o objetivo de evitar, entre tantos vícios, os decorrentes de conflitos de interesses. Diz-se que a governança é de boa qualidade quando impede que maiorias escravizem minorias, ou vice-versa, ou que os dirigentes abusem dos mandatos a eles conferidos.


Enquanto a governança corporativa (a das empresas) só fez evoluir - sobretudo a partir de 2000, quando a Bovespa estabeleceu protocolos para a boa governança e listagens especiais para as empresas que os adotassem -, a governança no setor público vem sofrendo um enorme retrocesso. A legitimidade conferida pelas urnas não faz do governante um Todo Poderoso ou uma encarnação do interesse público, mas apenas um custo diante deste, e por tempo determinado e dentro de limites, como em qualquer democracia. Os bons governos precisam caber dentro de seus mandatos, conviver produtivamente com minoritários (que serão os mandachuvas de amanhã) e com a transparência própria dos mercados e da imprensa livre.

Quando, em vez disso, o governo faz uso contumaz do método "goela abaixo", ao atropelar processos e extrapolar atribuições, invariavelmente se acha na posição do controlador não confiável que abusa de seus poderes e desequilibra os contratos que implícita ou explicitamente mantém com o setor privado.

Tome-se o exemplo da Petrobrás, empresa de controle estatal listada em bolsa com muitos sócios minoritários, nacionais e estrangeiros. O controlador decidiu introduzir um novo sistema para explorar o petróleo do pré-sal, de vezo excessivamente nacionalista, por conseguinte muito caro, e do que resultou um salto nos gastos de investimento da companhia de US$ 10.6 bilhões em 2005 para US$ 43,4 bilhões em 2010.

Diante dessas necessidades foi feito um aumento de capital, que a União não integralizou propriamente em dinheiro, mas usando os direitos a petróleo que estaria disponível no futuro. Adicionalmente, como os preços dos produtos vendidos foram mantidos em níveis defasados, por causa do interesse do controlador em evitar a aceleração da inflação, a companhia viu-se em dificuldades financeiras. Seu endividamento foi de US$ 46 bilhões ao final de 2006 para US$ 115 bilhões em 2010 e US$ 250 bilhões em 2013.

Em consequência, o valor de mercado da empresa caiu de US$ 200 bilhões no começo de 2010 para US$ 90 bilhões ao final de 2013.

São US$ 110 bilhões de riqueza destruída por um nacionalismo tolo combinado ao velho populismo tarifário e embrulhado em uma contabilidade feita por quem acredita na função social da matemática. O resultado é algo que se pode descrever como dilapidação do patrimônio público.

Há muitas questões de governança pertinentes à definição de responsabilidades pela tragédia. Ao utilizar a empresa como ferramenta de políticas de governo, o controlador não devia indenizar a companhia, como fazia até 2001 por meio da "conta petróleo"? Os representantes do controlador não estão conflitados em decisões como as de preço, por exemplo? Com 32,3% do capital (55,6% do capital votante) deve a União nomear 8 de 10 conselheiros?

Bem, esse é apenas um exemplo, e há histórias parecidas em toda parte, inclusive no delicado terreno da política monetária, o segundo exemplo logo abaixo.

O governo detém o controle do único banco com poder de emissão de moeda, um poder tão grande quanto os sonhos de qualquer político, e aqui não há minoritários. Há, em vez disso, 180 milhões de "preferencialistas", que são os "acionistas" sem direito a voto que carregam papéis ao portador, emitidos em pequenas denominações pelo Banco Central do Brasil, de aceitação obrigatória fixada em lei, cujo valor é fixado por livre negociação no comércio.

Por isso, ao redor deste planeta, adotam-se providências de governança de modo a isolar os bancos centrais da influência de seus controladores. Não se trata de assunto ideológico, mas de um imperativo de boa governança: é o melhor arranjo institucional para preservar a integridade da missão do banco central, a estabilidade da moeda.

Entretanto, o Banco Central do Brasil não é independente, a formulação da política monetária cabe ao um conselho de três ministros (um deles, o presidente do BC), obrigado a seguir diretrizes do presidente da República. A política de metas para a inflação está fixada em um decreto presidencial, e os ministros decidiram que era 4,5% mas, na verdade, o BC vem trabalhando como se fosse 6,5%, por orientação do Palácio.

Nos dois casos está claro o conflito entre os interesses políticos de curto prazo do governo e os das maiorias afetadas pelas decisões. É evidente o predomínio inconteste da vontade do controlador.

Arranjos institucionais mais aperfeiçoados poderiam melhorar a governança em ambas as situações, evitar os abusos de poder de controle e as inconsistências. Essas, por sua vez, formam a prole mais dileta do método "goela abaixo", e a lista vai bem além dos exemplos aqui explorados: o governo liga as térmicas e manda baixar a conta de luz, incentiva a produção de automóveis e diminui as ruas, arrocha os preços dos serviços públicos e põe concessões para vender, elege campeões que entram em recuperação judicial e por aí vamos.

Nada pode ser mais assustador aos agentes privados que um governo despreocupado com a boa governança, pois o assunto aqui tem tudo que ver com a letra do contrato. Ao falsear a contabilidade pública, a meta de inflação, o preço da gasolina, a conta de luz, o governo falta com a palavra empenhada, pois compromissos de governo publicamente assumidos são como contratos. Ao escrever 4,5% como meta para o IPCA e praticar 6,5%, ou ao fazer "deduções" da meta de superávit primário, as autoridades quebram contratos que elas mesmas propuseram.

A alegação da presidente sobre respeito aos contratos, feita em tom agressivo em Nova York meses atrás, e prestes a ser repetida em Davos, infelizmente não estará convincentemente apoiada em ações de governo.

Por: GUSTAVO H.B. FRANCO EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA RIO BRAVO INVESTIMENTOS O Estado de S.Paulo

CRESCE E DESAPARECE

1. Com a morte de Mandela, confesso que passei horas e horas a ler sobre o senhor. Mas nenhum texto me impressionou tanto --na sua imbecilidade e ignorância-- como o elogio cético que Slavoj Zizek dedicou a Madiba no "Guardian".

Verdade que Zizek nunca desilude. Mas o texto atinge novos patamares de mendacidade intelectual quando informa o auditório de que Mandela morreu um homem amargo.

Uma afirmação dessas, vinda de um enfermeiro, teria o seu valor. Mas o objetivo de Zizek é político, não clínico: Mandela morreu amargo porque a promessa de uma África do Sul resplandecente não se cumpriu.

Até aqui, nada a dizer: a pobreza, a violência e o crime continuam a fazer parte do cotidiano do país. Mas para Zizek essas falhas devem-se à "traição" que Mandela cometeu sobre os seus ideais "socialistas", sucumbindo às sereias do capitalismo.

Nesse sentido, Mandela representa bem o destino da esquerda contemporânea, diz Zizek: na oposição a um regime iníquo, a esquerda promete maravilhas sem fim; quando chega ao poder, abre a porta ao compromisso "burguês".

A ignorância de Zizek começa logo aqui: ao não entender que o derrube do apartheid começou por um ato de compromisso. Que o mesmo é dizer: Mandela pousaria as armas e o regime começaria a tratá-lo com outra brandura.

Isso pode soar ofensivo para quem vive no jardim infantil da política e divide o mundo entre índios e cowboys. Não soou ofensivo para Mandela nem para a ala mais moderada do ANC.

Mas há mais: acusar Mandela de atraiçoar os seus ideais "socialistas" é ignorar a importância que o fim desses ideais teve para derrubar o próprio regime.

A queda do apartheid, ao contrário do que imagina Zizek, não começou com a saída de Mandela da prisão em 1990. Começou um ano antes, quando um certo Muro de Berlim foi reduzido a escombros. Com o desaparecimento da ameaça ideológica de Moscou, a elite branca não apenas deixou de temer a transição para um regime democrático pleno --como, no limite, o permitiu.

Finalmente, Zizek pergunta: não será possível ir além do legado tímido de Mandela sem cair no extremismo totalitário de Robert Mugabe, o vizinho do Zimbábue que arruinou o seu país?

Curiosamente, Zizek nem se apercebe da contradição da pergunta: Mugabe destruiu o país porque seguiu a cartilha "socialista" que Zizek acusa Mandela de ter renegado.

O resultado desse programa de "coletivização dos meios de produção" determinou que um dos mais prósperos países africanos seja hoje um caso internacional de fome, miséria e, claro, guerra civil larvar de negros contra brancos. Ou, pelo menos, contra os brancos que ainda restam por lá.

Quando será que Zizek cresce e desaparece?

2. A culpa é de John Lennon: quando o ex-Beatle começou a dissertar sobre os grandes temas do mundo, o mundo prestou atenção e a moda estava lançada.

Bizarro: eu gosto da minha empregada doméstica. Mas não presto atenção ao que ela diz sobre, por exemplo, o aquecimento global ou a crise das dívidas soberanas na Europa. Por que motivo devemos prestar atenção ao que dizem os músicos sobre assuntos que eles grotescamente desconhecem?

Roger Waters é um caso recente: o líder do Pink Floyd considerou Israel um Estado perfeitamente comparável à Alemanha nazista. Motivo? A forma como trata os palestinos de Gaza e da Cisjordânia. Roger Waters só não explicou direito se também falava dos campos de extermínio e dos fornos crematórios que existem em Tel Aviv.

Ponto prévio: você, leitor, pode não concordar com a política de Israel; pode condenar vivamente a construção de assentamentos na Cisjordânia; e pode até atribuir todas as culpas do mundo aos judeus pelo fracasso das sucessivas negociações entre Israel e a autoridade palestina. Está no seu direito e na posse razoável das suas faculdades mentais.

Mas quando alguém compara Israel com a Alemanha de Hitler --o mais infame regime da história, que fabricou a morte sistemática de milhões de judeus e outras minorias e foi responsável pela maior catástrofe militar do século 20 --essa comparação não é apenas ofensiva para a "memória das vítimas", como dizem os poetas.

A comparação é ofensiva para você, leitor, tratado como um idiota ignorante por outro idiota ignorante. Por: João pereira Coutinho Folha de SP

sábado, 28 de dezembro de 2013

CENÁRIOS SOMBRIOS, UMA CHANCE PARA A PRESIDENTE

Nem Papai Noel daria à presidente Dilma Rousseff uma oportunidade melhor depois de três anos de fracasso. Todas as projeções para 2014 apontam mais um ano ruim, com baixo crescimento econômico, inflação alta e grande buraco nas contas externas. Poderá haver algum avanço no investimento – se as concessões forem adiante e começar a execução dos projetos de infraestrutura. Com um pano de fundo tão feio, será fácil exibir e celebrar como vitória qualquer desempenho melhor que o de 2013. Projeções menos sombrias poderiam criar expectativas perigosamente otimistas e sujeitar a candidata à reeleição a cobranças constrangedoras. Os mais otimistas ainda poderão apostar num fator negligenciado nas projeções conhecidas até agora: a mudança ministerial no primeiro bimestre. Mas o otimismo, neste caso, conflita com o conhecimento. A experiência proíbe a esperança, quando se trata de imaginar um Ministério mais competente, depois dessa reforma, e mais orientado para acertar.


A economia brasileira crescerá 2,3% nos quatro trimestres até setembro de 2014, segundo a nova estimativa do Banco Central (BC). Será, portanto, uma repetição do cenário geral de 2013. O quadro apresentado no último informe da Confederação Nacional da Indústria (CNI) é muito parecido, mas um pouco menos luminoso: expansão de 2,4% neste ano e de 2,1% no próximo. As projeções de mercado coletadas pelo BC no dia 13 de dezembro pouco diferem das outras duas: expansão de 2,3% para o produto interno bruto (PIB) neste ano e de 2,01% em 2014 (esses números são medianas das estimativas).

A inflação deve continuar longe da meta, 4,5%, segundo as projeções publicadas até agora. A alta de preços deve ficar em 5,7% neste ano e alcançar 6% no próximo, de acordo com o documento da CNI. As estimativas do BC vão até 2015 e mostram números distantes da meta por mais dois anos. O cenário básico inclui números finais de 5,8% para 2013, 5,6% para 2014 e 5,4% para o ano seguinte. Juros básicos de 10%, recém fixados, câmbio de R$ 2,35 por dólar e contas públicas em condições mais ou menos estáveis foram tomados como base para os cálculos.

Todos esses dados justificam mais um ou dois aumentos da taxa Selic, incluídos na previsão do mercado financeiro para 2014 (já elevada de 10,25% para 10,5%). Pelas contas do mercado, a inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), deve ficar em 5,7% neste ano e bater em 5,95% no próximo. Segundo o governo, continuará, portanto, dentro da meta. Patacoada. A meta é 4,5%. O resto é margem para acomodar desvios. Mas desvios tão amplos são justificáveis somente em situações muito especiais. Nada tão especial ocorreu nos últimos três anos ou quatro anos, exceto na coleção de erros de política econômica. Isso inclui, entre outros itens, a redução dos juros no momento impróprio, o excesso de gastos federais e os estímulos mal planejados ao consumo.

Crescimento baseado no incentivo ao consumo é estratégia superada, segundo os analistas menos distraídos e um pouquinho mais atentos aos números de inflação, produção industrial e comércio exterior. É preciso investir muito mais para ampliar a capacidade de produção e o potencial de crescimento da economia. Essa necessidade é agora admitida até no governo, tanto por ministros quanto por uma presidente pouco propensos a reconhecer os desajustes econômicos (eles continuam, por exemplo, classificando como “dentro da meta” qualquer inflação até o limite de 6,5%).

O potencial de crescimento do Brasil caiu de 4,3% ao ano pouco antes da crise global para 2,7% no terceiro trimestre de 2013, segundo estimativa publicada no último informe conjuntural da CNI. Para crescer mais o País precisará de mais capital físico – máquinas, equipamentos e instalações — e de muito mais produtividade. Isso dependerá tanto do setor privado quanto do governo. No ano passado o investimento diminuiu 4%. Deve ter aumentado 7,1% neste ano e poderá crescer mais 5% no próximo, de acordo com o documento da CNI. Se essas estimativas estiverem corretas, o País ainda investirá em 2014 pouco menos de 20% do PIB, bem menos que vários de seus vizinhos. No Equador, por exemplo, essa relação é próxima de 27%.

Na estimativa do BC, o investimento em capital fixo deve ter crescido 6,8% neste ano e deve aumentar 3,7% nos quatro trimestres até o terceiro de 2014. O cenário desenhado pelo pessoal da CNI parece mais bonito, mas é menos atraente quando visto em detalhes. O principal fator positivo deverá ser o programa de concessões na infraestrutura, mas seu impacto imediato será limitado.

Neste ano, o investimento privado foi em boa parte puxado pelas compras de equipamentos de transporte. A lei exigiu motores a diesel com menor emissão de enxofre e, além disso, a boa safra de grãos e oleaginosas favoreceu o aumento das frotas de caminhões e de máquinas agrícolas. As compras de outros tipos de máquinas e equipamentos também cresceram, mas em menor proporção. Isso se reflete no baixo crescimento da indústria de transformação, estimado em 2,3% pela CNI. Reflete-se também no baixo poder de competição do setor industrial, em apuros tanto no exterior quanto no mercado interno. Nem o real desvalorizado compensou a baixa competitividade da maior parte dos produtores de manufaturados.

De janeiro até a segunda semana de dezembro as exportações totais, US$ 230,42 bilhões, foram 1,6% menores que as de um ano antes, pelas médias dos dias úteis. As importações, US$ 230,4 bilhões, foram 6,7% menores. Também isso mostra a fraqueza da economia brasileira e o tamanho do desafio posto diante do governo. Reconhecer o problema, admitir sua origem interna e tentar enfrentá-lo sem os truques baratos do protecionismo será um bom começo. 
Publicado no Estadão deste sábado   Por: Rolf Kunz

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

NÃO ESTRAGUE A FESTA, ESTÚPIDO!

O país da Copa é grande e bobo. "Esta será a Copa das Copas", disse a presidente, de boca cheia, na cerimônia de sorteio dos grupos. No país dela, que é o nosso, ninguém circula nas cidades travadas, nas estradas paralisadas, nos aeroportos congestionados -mas 12 arenas superfaturadas, em recordistas 12 sedes, receberão a mais cara das Copas. Do enclave do Sauípe, uma bolha segura, esparramou-se pelo mundo a linguagem do verde-amarelismo balofo. No país da Copa, um governo "popular" e "de esquerda" reverbera, tanto tempo depois, as frases e os tiques do general-presidente que gostava de futebol. Há um cheiro de queimado no ar.


"O Brasil está muito feliz em receber todos nesta Copa porque somos um povo alegre e acolhedor." Violência é a palavra da hora -e ela surge em curiosas associações com a "Copa das Copas". A barbárie das torcidas do Atlético Paranaense e do Vasco não foi deplorada por seus significados intrínsecos, mas pelas mensagens que supostamente envia ao mundo. Gaiatos da política, do marketing e do colunismo ensaiaram uma sentença que menciona a violência "dentro e fora dos estádios". É senha, com endereço certo: no saco fundo, cabem tanto os torcedores selvagens e os sumidos black blocs quanto manifestantes pacíficos mas indignados com a "Copa das Copas". O pau vai comer.

"Não repara a bagunça" -o dístico popular nacional, candidato eterno, e perfeito, a substituir o "Ordem e Progresso" no núcleo de nossa bandeira, trai o medo da vergonha. Joseph Blatter entendeu e traduziu, chamando-nos a congelar a indignação, sublimar as insatisfações, colocar entre parêntesis as divisões. A unidade em torno de um bem maior, que é a imagem do país diante do planeta que nos vê: eis a gramática do discurso político sugerida pelo chefão da potência ocupante. No país da Copa, a convocação à unidade já foi integrada ao discurso da publicidade. Será repetida à exaustão, como uma ladainha, até o apito final. Não estrague a festa, estúpido!

"Será uma Copa para ninguém esquecer", jactou-se a presidente, formulando uma ameaça involuntária. A partir do Gabinete de Segurança Institucional, estrutura-se uma operação de guerra que abrange as três forças em armas e um desdobrado aparato cibernético. Nas telas dos computadores do sistema de vigilância, cada arena figura como ponto focal de um envelope tridimensional de segurança. Nas ruas, o controle físico do perímetro das arenas, a cargo das PMs, terá a missão de proteger as marcas dos patrocinadores oficiais da ameaça simbólica representada pela presença de manifestantes. Jamais, em tempo algum, o Estado serviu tão direta e exclusivamente a interesses privados. Não: ninguém esquecerá.

O país da Copa não se respeita. Ontem, o partido do governo celebrou políticos condenados por corrupção -e, sob o silêncio cúmplice do presidente de facto e da presidente de direito, achincalhou um STF composto por juízes que eles mesmos indicaram. O país da Copa perdeu o autorrespeito. Os líderes governistas manobram para o Congresso não ouvir um ex-secretário nacional de Justiça que acusa o governo ao qual serviu de operar uma fábrica de dossiês contra adversários políticos. O país da Copa perdeu o respeito. As lideranças do PSDB preferem empregar táticas diversionistas vexatórias a colher assinaturas para uma CPI destinada a investigar todos os contratos estaduais e federais firmados com a Siemens. Yes, nós gostamos de futebol.

No vale-tudo da nova ordem do racialismo, perdemos, ademais, um senso básico de decoro: eu li -aqui mesmo, não nas catacumbas da internet!- que Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert formaram "um casal mais parecido com representantes de afrikâners". Cores, rancores. No país da Copa, nativos felizes, contentes, de bunda de fora, tocavam caxirola. Foi bonita a festa, pá -pena que nem começou. 
Por: Demétrio Magnoli Folha de SP

HADDAD QUEBRA-0VOS

O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, do PT, espalhou faixas exclusivas de ônibus cidade afora, onde são e onde não são necessárias. Pragmatismo é coisa de gente chulé. Pensadores lidam com conceitos e com abstrações que estão acima da contingência e livres do império da necessidade. Haddad quer ver triunfar um valor: o "coletivo". Pretende, com o didatismo da porrada, ensinar a essa gente inzoneira que o individualismo é uma chaga moral.


Se a vida dos motoristas --convencidos a comprar carro pelo crédito fácil estimulado por Lula e Dilma-- virou um inferno pior do que antes, que migrem para o transporte público. O prefeito sabe "que não se faz omelete sem quebrar ovos", frase que não é de Stálin, mas de Nadejda Mándelstam, casada com o poeta Ossip Mándelstam, um dos 35 milhões que o ditador matou. Nadejda se referia à sem-cerimônia com que o bigodudo eliminava pessoas, sempre "com a desculpa de que construíamos um notável mundo novo".

Haddad tem a convicção, percebi pelas entrevistas que concedeu a esta Folha e ao "Valor", de que está construindo uma notável cidade nova. Afinal, se o coletivo se opõe ao individual e lhe é moralmente superior --e até parte considerável da imprensa, vivendo seus dias de apagão bibliográfico, acha o mesmo--, ele só pode estar certo. O prefeito quebra ovos com metódica desfaçatez. Só não consegue fazer omeletes. Aos poucos, a cidade vai recuperando a memória do caos.

A "cracolândia" voltou a seus dias de esplendor, estimulada pela mal digerida política de redução de danos. Voltou, mas num estágio superior. Agora já há uma "civilização do crack", com seus teóricos, seus artistas, até sua arquitetura... Logo os veremos no "Esquenta", da Regina Casé. Se viciados em clarineta, Chicabon ou cigarros Hollywood decidissem privatizar uma área da cidade, cassando direitos de terceiros, impondo-lhes uma disciplina ao arrepio da lei, não duvidem de que seriam reprimidos. Clarineta, Chicabon e Hollywood não alcançaram ainda o estatuto de uma cultura de resistência.

O desgraçado que mora no centro da cidade que pague o "Imposto Michel Foucault" --refiro-me ao filósofo que está na raiz desse pensamento torto que advoga, no fim das contas, que o direito à autodestruição supõe a supressão de direitos alheios. Foucault, esquerdista e gay, é aquele senhor que via na revolução iraniana um fervor, acreditem!, erótico! Khomeini chegou ao poder e começou a fila de enforcamentos pelos... esquerdistas e gays. O "despensador" morreu em 1984 sem emitir um pio de arrependimento. "Qual a razão do rosnado digressivo, seu reacionário?" A exemplo de Foucault, Haddad acha que sua teoria está certa; a realidade é que perdeu o rumo.

Só um intelectual de esquerda, ou alguém com tal pretensão, age como Haddad. Não por acaso, Lula, um notável e pernóstico conservador, nutre por essa gente imenso desprezo. O Barba é da turma do pragmatismo chulé. "E por que fez o outro candidato?" Porque mirou num produto eleitoral, não num gestor. O prefeito é o esquerdista que parece brincar no "play" sem sujar o shortinho. Mas alimenta ideias bem malvadinhas. O caso do IPTU repete a receita aplicada nos transportes e na cracolândia: o arranca-rabo de classes.

Compreensível. Em 2004, pouco antes de assumir o Ministério da Educação, Haddad escreveu num livro intitulado "Trabalho e Linguagem - Para a Renovação do Socialismo" a seguinte pérola: "O sistema soviético nada tinha de reacionário. Trata-se de uma manifestação absolutamente moderna frente à expansão do império do capital". Bacana. Lênin, o fundador do "sistema" que ele exalta, deixou para a história um pensamento inequívoco: "Uma revolução sem pelotão de fuzilamento não faz sentido". Haddad, o acólito, é um homem em busca de sentido.Por: Reinaldo Azevedo Folha de SP

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

O MÉTODO PARA NÃO ENTENDER NADA

Richard Rorty diz que, não havendo nenhuma verdade a ser encontrada acima das divergências de opinião, a filosofia se reduz a um puro divertimento, no qual, em vez de procurar saber se tal ou qual filósofo tinha razão, você deve tentar apenas "pensar como ele", como quem assiste a um drama – ou o escreve – e se identifica com os pontos de vista dos vários personagens sem chegar a conclusão nenhuma.

Ele ia até mais longe e afirmava que a mesma tolerância e abstinência de julgamento deveria ser praticada com os grandes agentes históricos, não havendo razão nenhuma para que algum escritor não produza uma biografia de Hitler desde o ponto de vista do próprio Hitler, representando mentalmente e sentindo, sem julgá-lo, o ódio anti-semita que o movia.

O primeiro desses conselhos é um bom método para começar a estudar filosofia, mas não constitui uma filosofia de maneira alguma, assim como o segundo é um bom meio de iniciar uma investigação histórica, mas não de concluí-la

É evidente que, quando você estuda as doutrinas de um filósofo, deve absorvê-las como se fossem as suas próprias antes de poder julgá-las. Se você salta essa etapa, as idéias dele permanecem um corpo estranho e ao julgá-las desde fora você não as atinge, apenas desliza sobre elas.

Entretanto, se, após ter feito um esforço para pensar como se fosse Descartes ou Nietzsche você não é capaz de voltar a ser você mesmo e julgá-los desde o seu próprio ponto de vista, fica também impossível julgar Descartes desde o ponto de vista de Nietzsche, ou vice-versa, isto é, toda comparação se revela inviável e a filosofia se reduz a uma coleção de discursos separados e inconexos, um diálogo entre quem não ouve e quem não fala.

Em segundo lugar, para "pensar como" fulano ou beltrano, você precisa saber o que eles sabem. Mas será possível e necessário, também, ignorar o que eles ignoram? Por exemplo, algo que se descobriu depois que eles morreram, e do qual você está bem informado. Se o mapa da sua ignorância não coincide exatamente com o de um outro indivíduo, você jamais poderá pensar exatamente como ele. Você pode, é claro, fingir que ignora o que ele ignora, mas esse fingimento é algo que não estava no pensamento dele e que você está introduzindo nele desde fora.

Se, ao contrário, você realmente ignora o que ele ignora, então não é da ignorância dele que se trata, e sim da sua própria, que só por acaso coincide com a dele. E é loucura imaginar que a coincidência fortuita de duas ignorâncias seja um bom método para compreender o que quer que seja.

Chega a ser inacreditável que um filósofo de grande reputação como o professor Rorty não percebesse, de imediato, a completa inviabilidade do método que sugeria.

O que cabe fazer em filosofia, o que no fundo todo estudante acaba fazendo sem nem mesmo ter a intenção clara de fazê-lo, é tentar pensar como o filósofo que você está estudando e depois, confrontando o que ele sabia com o que você sabe, criar a sua própria opinião sobre as opiniões dele. (É claro que existem maus estudantes – muitos deles, decerto, professores – que já criam a sua própria opinião a respeito antes de deixar o filósofo terminar de falar, e alguns até antes de que ele comece a falar. Mas "non raggionam da lor".)

Quanto aos personagens históricos, é claro que devem também ser estudados desde suas próprias intenções e valores, "sine ira et studio", mas é impossível fazê-lo sem levar em conta que competiam com as intenções e valores de outros personagens e que tanto as intenções e valores de uns quanto as dos outros se recortavam sobre um horizonte de consciência (e de inconsciência) que não é o do historiador que os está estudando. Este, portanto, nada compreenderá do drama histórico se, desde os dados à sua disposição, não puder distinguir, entre os personagens históricos, quais viam a situação mais apropriadamente que outros.

Posso, por exemplo, tentar me colocar no lugar de Hitler e "sentir" imaginariamente o ódio que sentia aos judeus, desde as razões que ele se apresentava para tanto. Mas devo levar essa tolerância relativista ao ponto de ter de ignorar o que ele ignorava? Devo fazer de conta que não sei que ele acusava os judeus de crimes que eles não haviam cometido e enxergava neles defeitos de constituição cerebral que eles não têm de maneira alguma?

Posso até fingir isso, mas aí já não estarei pensando como Hitler e sim como um dramaturgo que inventa um personagem chamado "Hitler" sem ter em conta o Hitler da História. Pior ainda, se depois de mergulhar no horizonte de consciência de Hitler não saio fora dele para julgá-lo de cima, como posso distinguir se Hitler acreditava mesmo naquelas coisas ou se apenas as fingia, por sua vez, para tirar delas proveito político?

Tanto em filosofia quanto em historiografia, o método do professor Rorty pode levar somente a um resultado: uma confusão dos diabos. Não espanta que, havendo-o praticado por anos a fio, ele próprio chegasse a concluir que nenhum problema tem solução e que a única coisa que o filósofo tem a fazer é entregar-se ao divertido empreendimento de não entender nada.

Muito menos espanta que um seu discípulo local, um tipo folclórico que se denomina "o filósofo da cidade de São Paulo" – como se não tivessem sido da capital paulista os maiores filósofos que o Brasil já teve, Mário Ferreira dos Santos, Miguel Reale, Vicente Ferreira da Silva e Vilém Flusser – depois de ter absorvido as idéias do mestre, acabasse acreditando que a pedofilia é uma coisa boa e que, historicamente, a prática generalizada do coito anal antecedeu a do coito vaginal...
Por: Olavo de Carvalho é jornalista, ensaísta e professor de Filosofia

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

UM PRESENTE DE NATAL DEFINITIVO PARA A MINHA FILHA

Minha querida filha:

Todo Natal eu passo pelo mesmo problema de ter de escolher que presente dar a você. Sei que há várias coisas das quais você certamente iria gostar, como livros, jogos, roupas etc. Porém, eu sou muito egoísta. Sempre quis dar a você algo que iria durar mais do que alguns meses ou anos. Sempre quis dar para você um presente que lhe faria se lembrar de mim a cada Natal, para sempre.

Se eu pudesse lhe dar apenas um presente, o qual você pudesse carregar consigo para sempre, esse presente seria algo aparentemente muito trivial, mas que me tomou vários anos para que eu finalmente o entendesse. Esse presente seria uma verdade aparentemente simples, porém libertadora. E se você aprendê-la agora, essa simples verdade poderá enriquecer sua vida de incontáveis maneiras. Mais ainda: ela poderá lhe poupar de ter de enfrentar vários problemas que já machucaram muitas pessoas que simplesmente nunca a aprenderam.

Essa verdade aparentemente simples, porém libertadora, é a seguinte:

Ninguém deve nada a você.

Importância

Como pode uma afirmação tão simples ser importante? Pode não parecer, mas entendê-la realmente pode ser uma bênção para toda a sua vida.

Ninguém deve nada a você.

Isso significa que nenhuma outra pessoa está vivendo para você, minha filha. Ninguém está nesse mundo para satisfazer suas reivindicações. Ninguém está vivendo em função de você. Simplesmente porque nenhuma outra pessoa é você. Cada pessoa vive por si própria; a felicidade de cada pessoa é algo único e particular, algo que somente ela pode sentir e ninguém mais.

Minha filha, quando você entender que ninguém tem a obrigação de dar a você a felicidade ou qualquer outra coisa, você será libertada e nunca mais terá expectativas em relação a coisas que provavelmente nunca serão como você quer.

Isso significa, por exemplo, que ninguém é obrigado a amar você. Se alguém a ama, é porque existe algo de especial em você que dá felicidade a essa pessoa. Descubra o que é essa coisa de especial que você tem e se esforce para amplificá-la. Assim você será ainda mais amada.

Quando as pessoas fazem algo por você, é simplesmente porque elas querem — porque você, de alguma forma, propicia a elas algo de significativo que faz com que elas queiram agradar você. Elas não agem assim somente porque devem algo a você.

Ninguém deve nada a você.

Da mesma forma, ninguém tem de gostar de você. Se seus amigos querem estar perto de você, não é porque eles se sentem nessa obrigação; é simplesmente porque eles se sentem bem estando com você. Descubra o que os deixa felizes e os faz se sentirem bem, e eles sempre irão querer estar perto de você, sem pedir nada em troca.

Ninguém tem a obrigação de respeitar você. Algumas pessoas podem até mesmo ser cruéis com você. Porém, tão logo você entenda que as pessoas não têm a obrigação de ser bondosas com você — e que, consequentemente, elas de fato podem ser más com você —, você irá aprender a evitar aquelas pessoas que podem lhe ser nocivas. Lembre-se de que você também não deve nada a elas.

Vivendo a sua vida

Ninguém deve nada a você.

Você deve apenas a você mesma a obrigação de ser a melhor pessoa possível. Porque apenas se você for assim é que as outras pessoas irão querer estar com você e irão querer dar a você as coisas que você quer em troca daquilo que você está dando a elas. Essa é a única maneira moralmente correta de se obter as coisas que você quer. Nunca exija nada de ninguém. Apenas faça por merecer.

Algumas pessoas irão optar por se afastar de você por motivos que nada têm a ver com você. Quando isso acontecer, procure em outro lugar as relações que você quer. Não faça com que os problemas de outras pessoas sejam também o seu problema.

Assim que você aprender que precisa fazer por merecer o amor e o respeito dos outros, você jamais irá esperar coisas impossíveis; e, por conseguinte, jamais terá decepções. Da mesma forma que as outras pessoas não têm a obrigação de compartilhar a propriedade delas com você, elas também não têm a obrigação de lhe devotar sentimentos e pensamentos.

Se elas o fizerem, é porque você fez por merecer essas coisas. E aí você terá todos os motivos para se sentir orgulhosa do amor que você recebe, do respeito dos seus amigos, da propriedade que você adquiriu. Porém, jamais pressuponha que tais coisas são fatos consumados. Se agir assim, você irá perdê-las facilmente. Essas coisas não são suas por direito. Não existe algo como "ter direito" a essas coisas. Você sempre terá de fazer por merecê-las.

Minha experiência

Um grande fardo foi retirado dos meus ombros no dia em que finalmente entendi que o mundo não devia nada a mim. Por muitos anos acreditei que havia coisas a que eu tinha direito pelo simples fato de ter nascido. E isso fez com que eu passasse por grandes desgastes — físicos e emocionais — em minha tentativa de coletar esses "direitos".

Ninguém deve a mim respeito, amizade, amor, cortesia, conduta moral ou inteligência. O mundo não me deve nada. E tão logo eu passei a reconhecer isso, todas as minhas relações imediatamente se tornaram muito mais gratificantes. Concentrei-me apenas em estar com aquelas pessoas que queriam fazer as coisas que eu queria que elas fizessem.

Essa compreensão de mundo permitiu que eu me desse bem com amigos, sócios comerciais, clientes, amores e estranhos. Sou constantemente relembrado de que só irei conseguir o que quero se puder entrar no mundo da outra pessoa. Eu tenho de entender como ela pensa, o que ela crê ser importante e o que ela quer. Somente assim eu poderei ser útil para ela e, com isso, conseguir as coisas que eu quero.

E somente então eu serei capaz de discernir se eu realmente quero estar envolvido com tal pessoa. Isso me permite selecionar bem as minhas relações, poupando-me de dissabores; e me permite também direcionar minhas energias apenas para aquelas pessoas com as quais eu realmente tenho mais coisas em comum.

Não é fácil resumir em poucas palavras aquilo que levei anos para aprender. Porém, talvez se você reler esse presente a cada Natal, seu significado ficará mais claro a cada ano.

Eu realmente espero que isso aconteça. Sendo seu pai, quero acima de tudo que você entenda essa simples verdade, a qual pode libertá-la para sempre.

Um Feliz Natal, minha filha!

Por: Harry Browne , o falecido autor de Por que o Governo Não Funciona e de vários outros livros, foi candidato à presidência dos EUA pelo Partido Libertário nas eleições de 1996 e 2000.


ESQUERDA, IDA E VOLTA

Minha vizinha é linda. Minha vizinha é de esquerda. Um problema?

Não para mim, uma alma tolerante e pluralista e mentirosa. Para ela. Mas, como diria Jack, o Estripador, vamos por partes.

Aconteceu em setembro. Começou o ano acadêmico em Lisboa e uma espanhola mudou-se para o apartamento ao lado do meu. Encontrei-a na porta da rua, transportando as malas. Ofereci ajuda. Resposta dela: "Lá porque eu sou mulher você pensa que não consigo?".

Alarme. Feminista na área. Fugir, fugir, fugir --eis o sinal luminoso nos meus neurônios. Mas fugir daqueles olhos absurdamente azuis?

Não, claro que não, e depois falei de uma hérnia discal precisamente por excesso de peso. "É preciso ter cuidado." Ela comprou a primeira mentira. Se Deus me der tempo e saúde, outras se seguirão.

História da donzela: veio para Portugal apaixonada pela literatura dos lusos. A ideia é fazer doutorado, ficar uns anos, experimentar a vida do país. Excelente ideia.

"Pena chegar com esse governo fascistinha, você não acha?", perguntou ela.

Explicação prévia: o governo português atual, que alguns consideram de centro-direita, tem sido um exemplo de socialismo no seu pior. Sobretudo carregando nos impostos como nenhum governo socialista antes dele. Mas o que responder? A verdade, só a verdade, nada mais que a verdade?

Não. A mentira, só a mentira, nada mais que a mentira. "Fascistinha é dizer pouco", murmurei com venenoso sarcasmo.

E eu? Quem sou eu? Que faço? Quais são os meus gostos e desgostos? Falar de colunismo e televisão e livros é matéria interdita. Livros? O último chama-se "Por que Virei à Direita", Deus do céu.

Respondi vagamente ("dou aulas") e depois menti vagamente ("mas o meu sonho é trabalhar numa ONG"). Os olhos dela brilharam e eu senti o meu cachet a subir.

Mas tanta mentira desgasta. Voltando aos livros, é impossível esconder a biblioteca inteira. Foi o primeiro momento em que a máscara quase caiu. "Você lê muito autores de direita, não?", perguntou ela, olhando para as estantes com os meus Hayeks, os meus Oakeshotts, os meus Voegelins.

Pausa. Sangue frio. "Você tem que conhecer o inimigo", respondi. Ela concordou. E depois perguntou pelos autores da minha vida. "Tirando o Slavoj Zizek? Não vejo mais ninguém com qualidade hoje em dia."

Ela não conhecia Zizek. Com luvas e máscara de proteção, comprei um livro do ogro no dia seguinte. Foi o meu presente de aniversário em outubro. Ela gostou de Zizek; mas, surpresa das surpresas, achou as páginas sobre a necessidade de violência revolucionária um pouco excessivas. "Por causa dos inocentes", disse ela.

Eu poderia ter ficado calado. Não fiquei. "Mas você acha que no capitalismo há mesmo inocentes?" Silêncio. E epifania: a única forma de trazer esse anjo um pouco mais para o centro é eu próprio radicalizar-me à esquerda.

Dito e feito: nos últimos tempos, as conversas ficaram surreais. Defendo Cuba. Defendo a Venezuela. Ataco os Estados Unidos até pela falta de água em Lisboa.

E sobre os colunistas de direita que "invadiriam a mídia", os tribunais deveriam fazer qualquer coisa. "Onde está a liberdade, afinal?", pergunto eu, indignado.

De resto, a crise europeia tem responsáveis perfeitamente identificáveis ("a ganância dos bancos") e o "aquecimento global" é a maior ameaça à vida na Terra ("e quem diz o contrário deveria ser preso").

O resultado desse cortejo de insanidades está na moderação dela, que cresce de dia para dia: por cada loucura minha, ela tenta um equilíbrio. "Você é muito radical", eis o mantra dos últimos tempos. Eu medito, faço cara de caso. Depois rendo-me e concordo. "Sim, você tem razão."

O objetivo, agora, é virar o barco para a direita por influência dela. Há sinais de esperança. Tímidos. Tênues. Dias atrás, assistindo ao biopic sobre Thatcher com Meryl Streep no papel da "dama de ferro", arrisquei: "Essa Thatcher era mulher de coragem. Fascista, mas de coragem".

Ela completou. "Eu gosto dela. Quando você é mulher, tem que ser um pouco fascista num mundo de homens." Repicaram os sinos na minha alma.

Se as coisas continuam assim, no próximo ano estaremos os dois no Fórum da Liberdade de Porto Alegre, a cantar hossanas a Milton Friedman e à escola de Chicago. E por que não?
Vem na Bíblia: todas as grandes conversões são sempre histórias de amor à segunda vista.

Por: João pereira Coutinho Folha de SP

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

NÃO ESTRAGUE A FESTA, ESTÚPIDO!

O país da Copa é grande e bobo. "Esta será a Copa das Copas", disse a presidente, de boca cheia, na cerimônia de sorteio dos grupos. No país dela, que é o nosso, ninguém circula nas cidades travadas, nas estradas paralisadas, nos aeroportos congestionados -mas 12 arenas superfaturadas, em recordistas 12 sedes, receberão a mais cara das Copas. Do enclave do Sauípe, uma bolha segura, esparramou-se pelo mundo a linguagem do verde-amarelismo balofo. No país da Copa, um governo "popular" e "de esquerda" reverbera, tanto tempo depois, as frases e os tiques do general-presidente que gostava de futebol. Há um cheiro de queimado no ar.

"O Brasil está muito feliz em receber todos nesta Copa porque somos um povo alegre e acolhedor." Violência é a palavra da hora -e ela surge em curiosas associações com a "Copa das Copas". A barbárie das torcidas do Atlético Paranaense e do Vasco não foi deplorada por seus significados intrínsecos, mas pelas mensagens que supostamente envia ao mundo. Gaiatos da política, do marketing e do colunismo ensaiaram uma sentença que menciona a violência "dentro e fora dos estádios". É senha, com endereço certo: no saco fundo, cabem tanto os torcedores selvagens e os sumidos black blocs quanto manifestantes pacíficos mas indignados com a "Copa das Copas". O pau vai comer.

"Não repara a bagunça" -o dístico popular nacional, candidato eterno, e perfeito, a substituir o "Ordem e Progresso" no núcleo de nossa bandeira, trai o medo da vergonha. Joseph Blatter entendeu e traduziu, chamando-nos a congelar a indignação, sublimar as insatisfações, colocar entre parêntesis as divisões. A unidade em torno de um bem maior, que é a imagem do país diante do planeta que nos vê: eis a gramática do discurso político sugerida pelo chefão da potência ocupante. No país da Copa, a convocação à unidade já foi integrada ao discurso da publicidade. Será repetida à exaustão, como uma ladainha, até o apito final. Não estrague a festa, estúpido!

"Será uma Copa para ninguém esquecer", jactou-se a presidente, formulando uma ameaça involuntária. A partir do Gabinete de Segurança Institucional, estrutura-se uma operação de guerra que abrange as três forças em armas e um desdobrado aparato cibernético. Nas telas dos computadores do sistema de vigilância, cada arena figura como ponto focal de um envelope tridimensional de segurança. Nas ruas, o controle físico do perímetro das arenas, a cargo das PMs, terá a missão de proteger as marcas dos patrocinadores oficiais da ameaça simbólica representada pela presença de manifestantes. Jamais, em tempo algum, o Estado serviu tão direta e exclusivamente a interesses privados. Não: ninguém esquecerá.

O país da Copa não se respeita. Ontem, o partido do governo celebrou políticos condenados por corrupção -e, sob o silêncio cúmplice do presidente de facto e da presidente de direito, achincalhou um STF composto por juízes que eles mesmos indicaram. O país da Copa perdeu o autorrespeito. Os líderes governistas manobram para o Congresso não ouvir um ex-secretário nacional de Justiça que acusa o governo ao qual serviu de operar uma fábrica de dossiês contra adversários políticos. O país da Copa perdeu o respeito. As lideranças do PSDB preferem empregar táticas diversionistas vexatórias a colher assinaturas para uma CPI destinada a investigar todos os contratos estaduais e federais firmados com a Siemens. Yes, nós gostamos de futebol.

No vale-tudo da nova ordem do racialismo, perdemos, ademais, um senso básico de decoro: eu li -aqui mesmo, não nas catacumbas da internet!- que Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert formaram "um casal mais parecido com representantes de afrikâners". Cores, rancores. No país da Copa, nativos felizes, contentes, de bunda de fora, tocavam caxirola. Foi bonita a festa, pá -pena que nem começou.
Por: Demétrio magnoli Folha de SP

OBAMA SE APROXIMA DO IRÃ E SAUDITAS SE IRRITAM

O "Plano de Ação Conjunta" assinado pelo Irã com o assim chamado P5+1 (China, França, Alemanha, Rússia, Reino Unido e Estados Unidos) em 24 de novembro, em Genebra, foi motivo de comemoração para os árabes xiitas, preocupação para os árabes sunitas e pânico para os sauditas. A reação saudita acarretará consequências imprevisíveis e de longo alcance.


Quando o chefe dos negociadores do Irã, Mohammad Javad Zarif, trouxe para casa um acordo no valor de cerca de 23 bilhões de dólares, os árabes xiitas acertaram o passo com Teerã. O primeiro ministro do Iraque Nouri al-Maliki manifestou seu "total apoio a esse passo". O presidente da Síria Bashar al-Assad deu boas-vindas ao acordo, como sendo "o melhor caminho para sustentar a paz e a estabilidade". O Presidente da Câmara do Parlamento do Líbano,Nabih Berri chamou o entendimento de "acordo do século". E o Hisbolá considerou o acordo uma "grande vitória para o Irã".

Multidão jubilosa dá boas-vindas ao negociador iraniano na chegada de Genebra.


Por outro lado, entre os sunitas de língua árabe, as reações iam desde um apoio discreto, irritação, até apavoramento. O mais entusiasmado, talvez, foi o jornal estatal do egípcio Al-Ahram, que classificou o acordo de "histórico". A maioria dos países permaneceu em silêncio. Os que mostraram maior preocupação foram os sauditas. Com efeito, o gabinete do governo declarou oficialmente que "se houver boa vontade, o acordo poderá ser um passo inicial para alcançar uma solução abrangente para o programa nuclear iraniano", contudo, observe o ceticismo conferido nas primeiras quatro palavras.

Assad da Síria, pichado no cartaz, elogiou o acordo de Genebra.


Se esta foi a reação mais moderada, talvez o comentário mais desenfreado tenha sido do príncipe saudita Alwaleed bin Talal, que vez ou outra solta balões de ensaio para a família real: classificou o Irã de "enorme ameaça" salientando que, falando historicamente, "o império persa sempre foi contra o império muçulmano árabe, especialmente contra os sunitas. A ameaça vem da Pérsia, não de Israel", uma declaração pública pioneira e memorável.

Príncipe saudita Alwaleed bin Talal no trono de sua aeronave, sentado sob o logotipo de sua companhia.


Alwaleed então enumerou que os iranianos estão "no Bahrein, no Iraque, na Síria, com o Hisbolá no Líbano e com o Hamas, que é sunita, em Gaza". Conforme indica a lista acima, os sauditas estão obcecados pelo perigo de estarem cercados por agentes do Irã, e mais assustados ainda pelas implicações não nucleares do plano conjunto do que pelas implicações nucleares. Gregory Gause da Universidade de Vermont entende que a preocupação dos sauditas é que o acordo abra o caminho "sem quaisquer obstáculos" para que o Irã atinja a hegemonia regional. (Esse quadro contrasta tanto com a posição israelense quanto com a ocidental, que se concentra no perigo nuclear).

Abdullah al-Askar, nomeado para presidente da comissão de negócios estrangeiros do Conselho Shura, faz a seguinte análise: sua preocupação se refere ao "oferecimento de mais espaço ao Irã ou carta branca na região. Mês a mês o governo do Irã tem comprovado ter um projeto ameaçador na região, consequentemente ninguém na região irá dormir sossegado e acreditar que está tudo bem. Os povos da região sabem que o Irã irá interferir na política de diversos países".

A mídia saudita vem repetindo essa linha de pensamento. Al-Watan, um jornal estatal, alertou que o regime do Irã, "que penetra outros países da região com seus tentáculos ou tenta penetrar a qualquer custo", não se intimidará pelo acordo. Outro diário, Al-Sharq, expressa em um editorial o temor que o "Irã teria feito concessões no dossiê nuclear em troca de maior liberdade de ação na região".

Alguns analistas, especialmente nos países de menor extensão do Golfo Pérsico, foram ainda mais longe. Jaber Mohammad, analista bareinita, previu que o "Irã e o Ocidente chegarão agora a um acordo sobre a divisão da influência no Golfo". O Al-Quds Al-Arabi de propriedade do governo do Catar teme "a aliança dos EUA com o Irã, com o apoio russo". A circulação de boatos sobre o desejo de Obama de visitar Teerã, só faz confirmar as suspeitas.

O embaixador saudita em Londres, Príncipe Mohammed bin Nawaf bin Abdulaziz, tirou a conclusão pública mais evidente, ameaçando, "não assistiremos passivamente, nem seremos ameaçados sem cogitar seriamente a melhor maneira de defender nosso país e nossa região". Colocando a coisa de maneira educada, normalmente não é assim que os diplomatas sauditas se referem aos seus colegas muçulmanos.

Como interpretar toda essa estranha retórica? A belicosidade iraniana e a política pró-iraniana da administração Obama juntas acabaram com muitas décadas de dependência estratégica saudita de Washington e fizeram com que eles começassem a pensar em como se defender. Isso é muito importante, visto que Alwaleed se vangloria corretamente, que seu país é o líder dos árabes, desfrutando da maior parte do respaldo internacional, regional, cultural e religioso. O resultado dessa convicção recém descoberta, lutar contra irmãos islamistas, aliar-se tacitamente com Israel, adquirir talvez armas nucleares paquistanesas e quem sabe até se aproximar de Teerã, marca outra consequência da implosão da política externa de Barack Obama.

POR DANIEL PIPES Publicado no The Washington Times.


Tradução: Joseph Skilnik


domingo, 22 de dezembro de 2013

HIPERTENÇÃO


Novo limite para pressão arterial deve ser adotado no Brasil

Recomendação americana sugere que nível máximo de pressão arterial passe para 15 por 9 em pessoas acima dos 60 anos. Há trinta anos, a diretriz é fixada em 14 por 9
Vivian Carrer Elias

Hipertensão: Novas recomendações americanas podem poupar muitos pacientes de tomar medicamentos para controlar a pressão arterial (Thinkstock)

Há trinta anos, os médicos preconizam que a pressão arterial de um paciente fique abaixo de 14 por 9. Um artigo publicado nesta quarta-feira por pesquisadores americanos sugere que essa medida passe a ser de 15 por 9 para pessoas com mais de 60 anos. A mudança pode resultar em uma considerável redução do número de pacientes que fazem uso de medicamentos para diminuir a pressão arterial.

Saiba mais:

Pressão arterial diastólica
É a pressão arterial mínima registrada durante a diástole, momento em que os músculos cardíacos relaxam e os ventrículos se enchem de sangue.

Pressão arterial sistólica
É a pressão máxima exercida sobre as artérias, no momento em que o coração bombeia sangue para o corpo.

Embora as mudanças tenham sido sugeridas nos Estados Unidos, é provável que elas sejam adotadas no Brasil. "Nós usamos as diretrizes americanas e europeias como um norte para as nossas. A tendência é seguirmos a mesma linha", diz o cardiologista Luiz Bortolotto, diretor da Unidade Clínica de Hipertensão do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da USP (Incor). O médico vai coordenar as novas diretrizes brasileiras sobre pressão arterial, que devem ser lançadas no ano que vem – as últimas saíram em 2010.

Leia também:

As orientações ainda devem levar uns meses para chegar aos pacientes brasileiros — segundo Bortolotto, as diretrizes americanas não serão adotadas imediatamente. As mudanças tampouco significam que todos os idosos com pressão menor do que 15 por 9 não precisem mais tomar remédios hipertensivos. "Uma diretriz funciona como um guia, mas todo o tratamento precisa ser individualizado", explica o cardiologista.

Proibido para menores — As recomendações se basearam nos resultados de uma série de estudos feitos nos últimos anos. Os especialistas não encontraram benefícios em reduzir a pressão para menos de 15 em pessoas acima de 60 anos. Para pacientes mais jovens, diabéticos e portadores de doenças renais, ainda não há evidências de que a medida deva ser adotada – motivo pelo qual as novas recomendações se restringem aos mais velhos.

"A pressão sistólica (máxima) do idoso aumenta em decorrência do enrijecimento do vaso, algo que acontece naturalmente com todos que envelhecem. Muitas vezes, porém, a pressão diastólica (mínima) passa a ser mais baixa do que o normal. Assim, tentar reduzir a pressão arterial de forma muito agressiva pode, em alguns casos, diminuir muito a diastólica e oferecer mais prejuízos do que benefícios", diz Bortolotto.

Além disso, explica o cardiologista, os idosos são mais tolerantes a uma pressão um pouco mais elevada do que os jovens, e podem sofrer efeitos adversos perigosos com uma pressão muito reduzida – incluindo tontura acentuada e risco de isquemia. "É aceitável uma pressão arterial pouco mais elevada entre idosos, mas dentro de limites estabelecidos por diretrizes como essas", diz Leopoldo Piegas, cardiologista do Hospital do Coração (HCor).

As novas orientações foram feitas por 17 especialistas nomeados pelo governo americano. Elas ainda não são oficiais — as diretrizes da Associação Americana do Coração e do Colégio Americano de Cardiologia devem ser atualizadas no fim de 2014. Especialistas ouvidos pelo jornal americano The New York Times não souberam precisar quantas pessoas que hoje tomam medicamentos para reduzir a pressão poderiam deixar de fazê-lo. Mas, segundo o presidente da Sociedade Americana da Hipertensão, William White, milhões de pessoas acima de 60 anos têm pressão sistólica entre 14 e 15. 
Fonte Revista Veja

O NARIZ DO VIKING


Desculpem voltar ao assunto, mas a inépcia da classe universitária neste país é uma fonte de inspiração inesgotável para este deslumbrado colunista. Há coisas que o gênio mais excelso não conseguiria inventar, que não existem nem entre o céu e a terra nem na nossa vã filosofia, mas que jorram da idiotice aos borbotões, num fluxo incessante de criatividade que só encontra igual, mutatis mutandis, no primeiro capítulo do Gênesis. 

Leiam esta frase da nossa já conhecida profa. Luciana Ballestrin: “Mesmo os velhos e os contemporâneos clássicos do liberalismo político moderado são capazes de aceitar a tolerância, a diferença, a liberdade de expressão...”

O tom de superior condescendência sugere que a tolerância, o respeito à diferença etc. são virtudes tão bem repartidas entre vários regimes políticos, que até mesmo os liberais são capazes de praticá-las um pouquinho.

No mundo real, porém, ninguém ignora que essas virtudes foram inventadas pelos liberais e só existem nos sistemas políticos que o liberalismo criou ou nos quais deixou sua marca profunda. Elas são o liberalismo. Em todos os outros regimes, só o que se vê é rigidez, intolerância, perseguição, encarceramento e matança dos divergentes. Não podendo negar esse fato, mas odiando reconhecê-lo, a articulista da Carta Maior apela ao expediente pueril de atenuá-lo mediante o uso do modo comparativo. Mas comparações só funcionam quando há elementos a ser comparados, e no caso não há nenhum. No mundo moderno não há exemplos de tolerância e liberdade fora do liberalismo. Não se trata portanto de uma comparação autêntica, mas de um fingimento, de uma comparação postiça, absurda, produzida à força para fins puramente pejorativos. Fingindo louvar um mérito, a professora o achincalha ao dividi-lo com quem não o tem, deixando ao seu portador único e genuíno só um tiquinho, uma lasquinha da virtude supostamente geral, como quem dissesse: “Até mesmo os ovíparos botam ovos.”

Para piorar um pouco mais as coisas, ela não reconhece essas virtudes políticas nem mesmo em todos os liberais, mas só nos “moderados”. Fica subentendido que existem liberais radicais que as negam. Mas a única facção radical que existe nas hostes liberais é o libertarianismo, que em vez de negar a tolerância e a liberdade as amplia até à demência. Se alguém entre os liberais aceita moderá-las em vista de outras considerações, são precisamente... os moderados.

Vem mais: “Seria um tanto contraproducente esboçar nessas linhas argumentos e razões que tentem comprovar que o Brasil não é governado por comunistas e que a universidade brasileira não está intoxicada pelo marxismo.” Se ela dissesse que esboçar esses argumentos é “desnecessário”, entenderíamos que, na sua opinião, são pontos pacíficos, fatos notórios que nem é preciso provar. É obviamente isso o que ela deseja que o leitor acredite. Mas, ao escolher a palavra com que vai dizê-lo, ela se trai e diz o inverso. Reiterar a demonstração do óbvio pode ser desnecessário, tedioso, supérfluo. “Contraproducente”, nunca: uma demonstração é contraproducente quando, em vez de dar o resultado esperado, produz o seu oposto e, no esforço de repetir a pretensa certeza adquirida, acaba por demoli-la. A professora sabe que é precisamente isso o que aconteceria se ela tentasse provar a inexistência da hegemonia marxista nas nossas universidades, pela simples razão de que essa hegemonia é um fato. Em tão constrangedora circunstância, ela tenta fazer o leitor engolir como verdade notória e arquiprovada algo que ao mesmo tempo ela confessa não poder provar de maneira alguma. Tentando ser esperta, só prova que é mesmo uma boboca. Numa das tiras de “Hagar, o Horrível”, o robusto viking encontra seu amigo magrinho, cujo nome esqueci, esmurrando vigorosamente o própio nariz. “Que raio de coisa é essa?”, pergunta o chefe. E o outro, todo orgulhoso: “Um guerreiro precisa vencer-se a si mesmo.” A profa. Ballestrin estudou nessa escola.

Completando: “Da mesma maneira estéril, argumentar que o eurocentrismo, o colonialismo e o progresso moderno não são completamente afastados do marxismo e que justamente por isso, ele encontra resistência nos movimentos decoloniais latino-americanos.”

Não liguem para a palavra “decoloniais”: é o neologismo pedantíssimo com que alguns intelectuais anticolonialistas de Nova York insinuam que ainda são colonizados, coitadinhos. O que a professora está dizendo é que eles se irritam com os parágrafos em que Marx reconhece o papel positivo do colonialismo europeu no desenvolvimento das forças produtivas. Mas ver nessa ranhetice de detalhe uma “resistência ao marxismo” é como dizer que Lênin “resistiu ao marxismo” quando achou que podia fazer a revolução com meia dúzia de intelectuais em vez de esperar pelo proletariado. Não faz o menor sentido ressaltar a “importância das várias correntes do marxismo, do vulgar e ortodoxo para o crítico e arejado” (sic), e depois imaginar que as diferenças que as separam sejam “resistências ao marxismo”. Todas essas divergências e uma infinidade de outras brotam dentro de um marco conceitual que permanece estritamente marxista.

Cada vez que os comunistas divergem uns dos outros, isso é explicado, dentro do movimento, como uma prova da sua pujança e riqueza de perspectivas, e, fora, como uma prova de que o comunismo acabou e de que preocupar-se com ele é “paranóia”. A professora Ballestrin pensa que pode fazer as duas coisas de uma vez. Por isso mesmo, acaba não fazendo nem uma, nem a outra. 

POR OLAVO DE CARVALHO Publicado no Diário do Comércio.