domingo, 15 de junho de 2014

A DIREITA MATOU TONY RAMOS

De todos os crimes e licenças do roteiro, o mais grave é relativizar algo que é fato (o atentado a Carlos Lacerda, que vitimou o major Rubens Vaz) e dar como certa a inocência de Vargas, o que está longe de ser um ponto pacífico da história brasileira.


Se você sente náuseas com blogueiros bancados por estatais, espere até assistir um filme “baseado em fatos reais” patrocinado por elas. Bem vindo à era da história reescrita pelo cinema nacional chapa-branca.

Como filme, “Getúlio” não inova em nada. A fotografia é óbvia, a trilha é burocrática, a narrativa é claramente inspirada em “A Queda – As Últimas Horas de Hitler (2004)”, as atuações esquemáticas, com momentos constrangedores como quando os atores tentam falar com sotaque gaúcho. Como registro histórico, “Getúlio” é um acinte a serviço de uma agenda política.

Para não deixar dúvidas, João Jardim, diretor e co-roteirista do filme, disse: “é bom lançar o filme em ano de eleição, para fazer com que as pessoas reflitam antes de votar”. Em diversas entrevistas, Jardim deixa claro que vê similaridades entre o momento político atual brasileiro e aqueles 19 dias que separaram o atentado a Carlos Lacerda na Rua Tonelero e o suicídio de Vargas.

O Getúlio Vargas de João Jardim é o defensor dos trabalhadores que criou a Petrobras, uma das patrocinadoras do filme, o que teria colocado o ex-presidente em oposição aos militares. Em que país João Jardim foi encontrar militares opositores de estatais? No Brasil é que não foi. O regime militar iniciado em 1964 encontrou um país com 50 estatais e devolveu com mais de 500. Se esses são os militares que não gostam de estatais, imagino o que fariam se gostassem.

A Petrobras foi criada a partir de uma campanha ultranacionalista encabeçada pelo general Felicíssimo Cardoso, que entrou para a história como o “general do petróleo”. Felicíssimo esteve à frente da campanha “O Petróleo é Nosso”, criou um think tank (Centro de Estudos e Defesa do Petróleo e da Economia Nacional) e uma revista com o objetivo explícito de pressionar o governo a criar a estatal. Se alguém pode ser considerado o “pai” da Petrobras é o general Felicíssimo Cardoso, mas como ele é também tio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fica fácil entender porque seu nome está sendo apagado da história e não é lembrado nos filmes que a Petrobras hoje patrocina.

De todos os crimes e licenças do roteiro, o mais grave é relativizar algo que é fato (o atentado a Carlos Lacerda, que vitimou o major Rubens Vaz) e dar como certa a inocência de Vargas, o que está longe de ser um ponto pacífico da história brasileira. O diretor de “Getúlio” tem todo direito de não acreditar que o ex-ditador, líder de um dos regimes mais autoritários e sangrentos da história do país, o famigerado Estado Novo, não estava diretamente envolvido com o atentado, mas colocar a questão como resolvida e Vargas como inocente é reescrever a história.

O cinema praticamente nasceu produzindo libelos políticos. O clássico “O Nascimento de uma Nação” (D. W. Griffith, 1915) já defendia a agenda política racista do Partido Democrata americano e do presidente da época, Woodrow Wilson, colocando negros como uma sub-raça e enaltecendo a Ku Klux Klan. Griffith inspirou Serguei Eisenstein, seu fã confesso e cineasta-militante do bolchevismo soviético. Desde então, o cinema nunca parou de defender, explicitamente ou não, causas políticas, especialmente os produzidos com patrocínio direto ou indireto de governos.
Em “Getúlio”, o roteiro pretende resolver uma das maiores polêmicas da história do Brasil: Vargas estava envolvido ou não na tentativa de assassinato de Carlos Lacerda? Para o filme, não estava e pronto. Não satisfeito, o roteiro dá piscadelas para teorias conspiratórias lisérgicas como sugerir que Lacerda pudesse ter simulado o próprio atentado, algo que nem o getulista mais empedernido ousaria pensar.

O filme quer passar a idéia de que Vargas, defensor do povo e das estatais, foi vítima de uma armação política suja com o apoio da imprensa golpista. O protagonista do filme tem pouca noção do que seus auxiliares mais próximos faziam dentro do palácio e sua boa fé acabou por custar seu governo. O Getúlio de João Jardim é, evidentemente, o Lula do ideário petista, um pai dos pobres vilipendiado por uma trama que unia a imprensa e a direita inescrupulosa, antidemocrática e sedenta de poder.
Ao colocar Tony Ramos no papel principal, logo o ator mais querido e popular do Brasil, João Jardim buscou criar uma identificação imediata do público com o ex-presidente, uma opção para que o espectador não tivesse qualquer dúvida de quem apoiar desde o início. Já nos créditos finais, o filme subestima mais uma vez a capacidade do público de tirar suas próprias conclusões e coloca uma frase de Tancredo Neves, num didatismo gritante, afirmando que o suicídio de Vargas em 1954 atrasou o golpe militar em dez anos.
“Getúlio” é uma peça de propaganda ideológica dissimulada, com uma leitura muito particular e ideológica da história do Brasil, que faz escolhas que tentam recontar a época torcendo episódios para que se encaixem na narrativa que interessa ao diretor e aos patrocinadores do filme.

Se “Getúlio” for o marco inicial de uma safra de filmes militantes, é mais um motivo para arrumar as malas e buscar o Galeão que tanto assombrava Vargas, um mártir da própria consciência que levou para o túmulo a verdade sobre a tentativa de assassinato de um opositor, o único crime comprovadamente ocorrido naqueles 19 dias de agosto de 1954.
Publicado na Reaçonaria.

Por: Alexandre Borges é diretor do Instituto Liberal.

sábado, 14 de junho de 2014

BILDERBERG


"Você já viu as pessoas que estão em tais encontros? Vão os ministros, os reis, a OTAN, o FMI...
Tais pessoas não se deslocam para conversar sobre o tempo."


No domingo passado (01/06) veio a término a 62ª edição da reunião anual do Clube Bilderberg, a seleta organização que congrega as autoridades máximas da política, economia, aristocracia e do poder militar da Europa e dos Estados Unidos.

Todas as propostas e deliberações, celebradas num hotel de Copenhague, foram feitas no mais absoluto segredo: às portas fechadas, sem acesso dos meios de informação e sem publicação das suas conclusões. Embora o clube diga que suas reuniões não tem um caráter oficial e é apenas um fórum de discussão privado, há quem considere o Bilderberg como o encontro internacional mais importante no mundo, onde são tomadas decisões concretas que afetam a todas as pessoas.

“O efeito mais imediato dessa reunião do clube que acabamos de tomar conhecimento é a abdicação do rei Juan Carlos”, afirma ao El Confidencial a jornalista Cristina Martín Jiménez, que há 10 anos investiga os meandros da instituição. “Note que todas as monarquias estão fazendo o traslado geracional. Eles trabalham em consenso e foi decidido que chegou o momento onde é necessário efetuar esse traslado. Não tenho a menor dúvida que a abdicação do rei é uma decisão consensual do Bilderberg”.

Na opinião da autora de 'Perdidos. Los planes secretos del Club Bilderberg (Martínez Roca)', não é um acaso que a reunião desse ano tenha tido a participação da rainha Sofia, da rainha Beatriz da Holanda (filha do fundador do clube, Bernardo de Holanda) e do príncipe Felipe da Bélgica, que também recebeu a chefia da monarquia no ano passado. “Estão renovando todas as cúpulas dos poderes que trabalham conjuntamente no Bilderberg”, assegura ela.

Uma grande reestruturação militar, econômica e comercial

Porém, embora a abdicação do rei da Espanha afete especialmente nosso país, Martín Jiménez tem por certo que este não foi o tema mais discutido em Copenhague. Neste ano, grande parte das conversações orbitou sobre possíveis conflitos armados na Rússia, China e no Oriente Médio. E é por isso que a presença militar foi especialmente significativa.

Na lista de convidados desse ano estavam o secretário geral da OTAN, Anders Fogh Rasmussen; o general em chefe das Forças Norte-Americanas na Europa, Philip Breedlove – que, segundo informa Charlie Skelton do The Guardian, foi acompanhado de representantes de altos cargos do Ministério da Defesa Norte-Americano; o ex-diretor da CIA, David Petraeus; o chefe do MI6 (o serviço de espionagem britânico), Sir John Sawers; bem como diversos ministros do exterior europeus, entre outros da Espanha, José Manuel García-Margallo (que compareceu acompanhado de Mercedes Millán Rajoy, diplomata espanhola e sobrinha do presidente).

Na opinião de Martín Jiménez, o Clube Bilderberg está preparando o cenário para a possibilidade de um grande conflito bélico: “O consenso é que daqui a alguns meses ou um ano haverá uma grande reestruturação militar, econômica e comercial com origem em alguma modificação importante na história mundial: um conflito bélico de grandes dimensões”.

O Clube Bilderberg celebrou sua primeira reunião em 29 e 30 de maio de 1954, no hotel Bilderberg, na Holanda, encontro promovido pelo imigrante polonês e conselheiro político Jozef Retinger, preocupado pelo crescente antiamericanismo provocado pelo Plano Marshall na Europa. Desde então, afirma Martín Jiménez, sua principal preocupação tem sido preservar a hegemonia do Ocidente, que agora está sendo questionada.

“No ano passado, Tony Blair, outro dos líderes que trabalham com os Bilderberg, escreveu um artigo para o Daily Mirror (1) em que dizia claramente que a questão não é a paz, mas sim de falar sobre questões de poder”, explica Martín Jiménez. “Isso foi dito alguns meses antes de reunir-se com o clube na Inglaterra (entre 8 e 9 de junho do ano passado), pois existia uma grande rejeição popular à União Europeia, e recém havia sido criado o UkiP (2), que agora teve grande sucesso nas eleições. Blair interviu afirmando que os trabalhistas e os conservadores teriam de se unir para dar apoio à União Europeia. Estão sendo formados blocos de poder. O Ocidente é um bloco, e ele está sendo reforçado para não permitir a sua invasão por outros blocos.”

Convidados que não vão apenas para papear

A jornalista tem consciência que suas afirmações levantam suspeitas, porém ela está convencida que aquilo que é dito no Bilderberg é de extrema importância. “Eles possuem um mecanismo para desprestigiar aquelas pessoas que os investigam, tachando suas atividades de 'conspiranóia', para que acreditemos que não estão fazendo nada. Dizem que são apenas reuniões informais nas quais as pessoas participam em caráter privado, e que por esse motivo não tem de dar informações. Você já viu as pessoas que estão em tais encontros? Vão os ministros, os reis, a OTAN, o FMI... Tais pessoas não se deslocam para conversar sobre o tempo.”

Além dos grandes líderes militares e da aristocracia, este ano participaram do Bilderberg diretores de corporações como Shell, BP, Fiat, Novartis, Dow Chemicals, Unilever, Airbus e Nestlé; diretores de bancos e instituições financeiras como HSBC, Citigroup, Lazard, Goldman Sachs, Santander, Barclays, American Express, JP Morgan, TD Bank e do Deutsch Bank; e os CEOs e presidentes do Google, LinkedIn e Microsoft; proprietários, editores e representantes de meios de informação como The Financial Times, The Wall Street Journal, Die Zeit, Le Monde, El País e The Washington Post; líderes e políticos de instituições como o Banco Mundial, a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu, Banco de Compensações Internacionais, o FMI, a Reserva Federal e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos; e políticos europeus, norte-americanos e canadenses como Mark Rutte, o primeiro ministro holandês, ou David Cameron, primeiro ministro britânico.

A representação espanhola incluiu além da rainha Sofia, o ministro de Relações Exteriores, o diretor geral da La Caixa, Juan Maria Nin, e o presidente do grupo Prisa, Juan Luis Cebrián.

O grande grupo de pressão ocidental

As decisões do Bilderberg, afirma Martín Jiménez, são consensuais e tem efeitos diretos sobre as políticas nacionais. Apenas 15 dias após a reunião do clube em 2012, realizada nos Estados Unidos, a Espanha pediu um empréstimo à Europa para fazer o resgate bancário. Uma decisão que, segundo a jornalista, foi tomada na conferência do Clube, que naquele ano havia tido a participação da vice-presidente Soraya Sáenz de Santamaría. O Bilderberg também foi responsável, ainda segundo Martín Jiménez, de colocar Mario Monti, membro do Comitê Diretor do Clube, como primeiro ministro italiano. “E assim os italianos tiveram de engolir um primeiro ministro que não foi eleito nas urnas”, assegura a jornalista.

O Bilderberg também está por trás dos cortes orçamentários realizados no nosso país. “A Fundação Rockfeller (outro dos grandes promotores históricos do clube) tem falado do tema da superpopulação desde os anos 30”, explica ela. “Não é coisa nova. Os mais velhos e os doentes não são úteis, pois são um ônus econômico. Bruxelas pressiona nossos governos eleitos democraticamente para que reduzam as ajudas aos dependentes e o orçamento para a saúde”.

O clube põe suas mãos em tudo aquilo que possa afetar o desempenho de seus sócios (a elite econômica e política). Incluindo o futuro sucessor do PSOE (3). “Segundo minhas investigações, Madina é o candidato que apoiam os membros espanhóis do Bilderberg”, afirma a jornalista. Somente o tempo dirá se ela está certa, ainda que ela mesma reconheça, “há muitas coisas que eles preveem, porém mais tarde seus planos não se desenvolvem como havia sido desejado”.

Notas:
(1) O artigo em questão pode ser lido aqui: http://dailym.ai/1o5bEWP. No trecho referido o líder do Partido Trabalhista diz: 

“(...) Em 1946, Winston Churchill fez seu afamado discurso conclamando por um Estados Unidos da Europa. Ele via um continente assolado por séculos de conflito e recentemente por duas guerras mundiais. Ele via uma França e uma Alemanha – inimigos em ambas as guerras – tornando-se amigos numa nova união. O racional para a Europa [naquele momento] era simples – paz e não a guerra. Em 2013, existe uma nova lógica que é mais forte, clara e mais duradoura: não a paz, mas o poder. O cenário geopolítico para o Século XXI está passando por uma revolução. A questão para a Grã-Bretanha é: qual é o ponto que nos dá mais vantagens nesse novo cenário? Ao fim do século XIX, a Grã-Bretanha era a maior potência mundial. No final do século XX, eram os EUA. No final do século XXI, possivelmente será a China ou, no mínimo, a China e possivelmente a Índia serão tão poderosos quanto os EUA. Nós precisamos compreender quão profunda é essa mudança e como ela irá nos atingir (...)”


(2) UKiP – Partido Independista do Reino Unido. Eurocéptico. Direita. O partido defende a independência da Inglaterra frente à União Europeia (abandonar a UE). O título do seu Manifesto 2014 diz: “Imigração portas-abertas está sucateando os serviços públicos locais no R.U.” Suas propostas envolvem: soberania e livre comércio sem união política. Proteção das fronteiras e imigração sob condições reguladas. Isenção fiscal sobre salário mínimo e sobre a transmissão de heranças. Fim de subsídios e ajudas ao exterior. Combate ao crime. Cassação do direito a voto de prisioneiros. Sair da jurisdição da Corte Europeia de Direitos Humanos. Permitir a fundação de novas 'grammar schools'. Rejeição ao politicamente correto como proteção ao livre discurso (“free speech”).


(3) PSOE – Partido SOCIALISTA Operário Espanhol, fundado em 1879 (o segundo mais antigo da Espanha). Principal partido de oposição. Parte integrante do Partido SOCIALISTA Europeu e da Internacional Socialista. Adepto da Terceira Via, do multiculturalismo, do humanismo laico, progressista.


Por: Miguel Ayuso
Tradução: Francis Lauer


sexta-feira, 13 de junho de 2014

UM PAÍS BOM PRA CACHORRO

A presidente Dilma disse na segunda-feira passada, em resposta às críticas feitas por Ronaldo “Fenômeno”, que “não temos complexo de vira-latas”. Os inimigos do governo estão dizendo que esse discurso foi cachorrada, mas ela falou sério — e dou razão.


Esse tal complexo poderia ser verdadeiro no passado, quando Nelson Rodrigues cunhou a expressão, rosnando e espumando em seu reacionarismo. Mas agora perdeu o sentido, caiu em desuso, os tempos são outros.

Nosso país está diferente. Vejam essas bandeirolas tremulando. É a Copa das Copas, e o tal complexo de vira-latas deixamos lá atrás, quando perdemos em casa. Dessa vez, em casa, só ganhamos porque ninguém vai levar estádio e aeroporto na mala — até porque nem ficou pronto.

Ter Copa em casa nos livra desse sentimento canino de inferioridade em relação ao resto do mundo. Alguns cães até ladram, mas a Copa não vai parar. O brasileiro aguarda o início dos jogos com a língua de fora, vendo pingar na máquina o caldo quente da propaganda. Está embriagado em sua paixão natural — e legítima, diga-se — pelo esporte. Pega a bolinha, pega.

Mas, roendo a outra ponta do osso, e sem querer ser hidrófobo, vemos algumas estatísticas que teimam em demonstrar, com o peso asfixiante dos números, que a propaganda ufanista apelando ao nosso orgulho é latido oco: o cidadão comum que vive no Brasil está mesmo revirando lixo, mesmo que não queira se enxergar dessa forma.

Ora, como péssimos cãezinhos amestrados, estamos, por diversos anos consecutivos, nos últimos lugaresem rankings que medem a educação. O governo consegue gastar 280 bilhões sem ter uma única universidade entre as cem melhores do mundo.

Estamos na coleira quando o assunto é liberdade econômica. Somos o 114º país num total de 178, perdendo para o Quênia, Tunísia, Camboja, Tanzânia e Gabão. E se continuarmos em queda, não demora a chegarmos à categoria em que se enquadram, pela ordem, Coréia do Norte, Cuba, Zimbábue, Venezuela e Irã, campeões de repressão econômica.

No índice de desenvolvimento humano ocupamos a 85º posição entre 186 países. Isso significa que não somos os mais judiados de todos os cães, mas ainda estamos na rabada, e melhorando pouco.

Somos tosados em nossa liberdade de imprensa, ocupando a 108ª posição entre 179 países, e caindo! A cada oito dias é registrada uma violação grave à liberdade de expressão no país.

O Brasil é o primeiro dos dez destinos mais perigosos para um turista. Batemos o nosso próprio recorde de homicídios e temos um número absoluto de 56.337 mortes violentas por ano. Quem mora em Trinidad e Tobago, Angola, Quênia, Uganda, Congo, e Ruanda está mais seguro do que você neste momento. De fato, ninguém sai hoje de casa numa cidade brasileira sem o rabo entre as pernas.

Se quiser mais sarna para se coçar, confira os índices de percepção da corrupção,saneamento, saúde,impostos, suicídio epedofilia.

Estou de acordo, presidente: não temos complexo de vira-latas. Ou, pelo menos, não temos mais o direito à ilusão de nos imaginarmos inferiores ao resto do mundo. Nós já chegamos lá, na maior parte dos casos. Não é mais um complexo, é algo passível de demonstração estatística, e por diversos ângulos.

Mundo cão.
Por: Márcio Santana Sobrinho é jornalista. Do site: http://www.midiasemmascara.org/


quinta-feira, 12 de junho de 2014

ŽIVI HRVATSKA!

Verde e amarelo são duas cores muito bonitas. Pelo menos quando separadas. Juntas, para mim pelo menos, causam brotoejas. Lembram não só a pátria, pela qual não tenho especial apreço, mas também o fanatismo futebolístico. É quando mais aparecem. A Copa, de longe, é o evento mais cultivado no país. Semana da Pátria é obrigação chata de militares e colegiais.

Há quem imagine que detesto futebol. Nada disso. Aliás, o considero um esporte bonito e inteligente. O problema são as multidões e o fanatismo que gera. Jamais entrei em um estádio. Enfim, a bem da verdade, certa vez entrei em um, em construção, para fazer uma reportagem. Foi em janeiro de 1969. Estava começando como repórter no Diário de Notícias, de Porto Alegre, e “seu” Olinto, o diretor de redação, me chamou:

- Janer, vai até o Gigante da Beira-Rio ver o andamento das obras.

Minha resposta quase custou-me o emprego:

- Certo, “seu” Olinto! De que time é mesmo esse estádio?

Perplexidade na redação. A sala era enorme, tínhamos de falar alto. Os redatores não acreditavam no que haviam ouvido. Do setor de esportes, voou pela redação uma pergunta indignada do editor:

- Tu não sabes a que time pertence o maior estádio particular do mundo?

Não sabia. Aliás, sabia até demais para minha erudição na área. Sabia pelo menos que o tal de Gigante tinha algo a ver com futebol. Essa foi a única vez que entrei em um estádio. Não por preconceito. Eu até que era bom no esporte, me lembro que certa vez fiz um gol. Milagres acontecem! Meus colegas não conseguiam acreditar no que haviam visto. Ocorre que multidões me horrorizam, sejam quais forem. Se uma multidão vai para o sul, eu rumo ao norte. Pela mesma razão, jamais assisti a uma tourada. Os réveillons quase sempre me pegam nalguma capital européia. Em vez de comemorar na rua com a multidão, me refugio no quarto do hotel.

O futebol é o início da guerra civil, escreveu Orwell. Civilizada seria a nação em que uma torcida aplaudisse uma jogada brilhante do time adversário. Mas isso pertence ao reino da utopia. Há no entanto um momento em que viro torcedor. É quando o Brasil é finalista. Só então me disponho a torcer... contra o Brasil. Se o Brasil perder na finalíssima, melhor ainda. Me soa como orgasmo interrompido pela chegada do marido.

Ninguém se iluda com essa gente que quer um Brasil sem Copa. Mal a bola começar a rolar, estarão ou nos estádios – que agora, sei lá por quais razões, chamam-se arenas – ou grudados na TV, torcendo pelo hexa. Os protestos são de mentirinha, nada mais que ameaças de desordem para obter ganhos, desde casa própria paga pelos contribuintes, tenham estes ou não casa própria - a aumentos salariais. É claro que continuarão durante a Copa. Mas, no fundo do coração do brasileiro médio, vai morar sempre um fanático. 

Todo leitor mais velho deve lembrar da Copa de 70, que Médici assumiu como coisa do governo. Eram os dias do “milagre econômico” e do “ninguém segura este país!” Torcer pela vitória do Brasil era alinhar-se à ditadura. As esquerdas fizeram boquinha de siri e torciam encabuladas, às escondidas. Isso que a Copa foi no México.

Já que falamos em Médici, vejamos a visão do cronista Nelson Rodrigues sobre 64: “muito antes do primeiro momento eu já achava que só as Forças Armadas podiam salvar o Brasil”. E sobre Médici: “Esse soldado é de uma natureza simples e profunda. Está disposto a tudo para que não façam do Brasil o anti-Brasil. Seja como for, deixará este nome, para sempre: – Emílio Garrastazu Médici”.

Hoje, Nelson parece ter virado porta-voz das esquerdas. Achados seus, como pátria em chuteiras e complexo de vira-latas foram encampados pelo governo e citados canhestramente até por Dona Dilma, vítima da ditadura dos militares que Nelson tanto incensava e chegou inclusive a negar que fossem torturadores.

“Uma outra coisa importantíssima surgiu no Brasil, importantíssima. E eu vou falar o que é. Ela está ligada, de uma certa forma, a uma crônica feita por um senhor que se tivesse nascido em qualquer lugar de língua inglesa seria considerada gênio lá. (…) Ele fez uma crônica ─ ele chamava Nelson Rodrigues, ele era muito engraçado ─ ele fez uma crônica que chamava “Complexo de Vira-lata”. Ele dizia que ─ isso foi na época, se eu não me engano, do jogo com a Suécia, final com a Suécia, não tenho certeza, mas foi na final, um pouco antes da final com a Suécia ─ ele fez uma crônica que ele dizia o seguinte: que o Brasil tinha complexo de vira-lata e que ele não podia ter complexo de vira-lata, e que a equipe era boa, tanto que a equipe era boa que ela era boa tecnicamente, taticamente, fisicamente, artisticamente. Tanto é que nós dessa vez ganhamos a Copa. Mas ele sempre falava desse complexo de vira-lata que pode… a gente pode traduzir como um pessimismo, aquela pessoa que sempre acha que tudo vai dar errado, que ela é menor que os outros. E ele dizia uma coisa, e eu queria dizer isso para vocês. Ele dizia que se uma equipe entra… eu não vou citar literalmente, não, mas se uma equipe entra para jogar com o nome Brasil, se ela entra para jogar com o fundo musical do Hino Nacional, então ela é a pátria de chuteiras”.

Com a Copa, até Nelson, o inimigo figadal das esquerdas, virou gênio para o PT. Como o cronista agora dileto da presidente atesta não ter havido torturas durante a ditadura, é até provável que seus alegados tormentos sejam fruto de uma imaginação fértil. 

Dona Dilma garante que os turistas não levarão as obras viárias de apoio à Copa nem os estádios. No que diz respeito às obras viárias, pelo que dizem os jornais, nem a metade será concluída até o começo da competição. Quanto aos estádios, seria melhor que os levassem. Muitos ficarão como elefantes brancos, monumentos faraônicos vazios de público, em memória de sonhos de poder do PT. 

Mas a hora é de união. Até mesmo um cronista liberal – seja lá o que isto quer dizer – e fanzoca deslumbrado da Disneylândia como Rodrigo Constantino, se abraça à presidente em seu amor pelo Brasil:

“É hora de deixar as diferenças de lado e vestir a camisa do Brasil. Assim que acabar a Copa, serei o primeiro a criticar o governo em tudo que ele merece ser criticado – e a lista é infindável. Aliás, pretendo continuar com as críticas durante os jogos. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Mas enquanto for o Brasil, e não o governo, representado pelos 11 jogadores em campo, pretendo torcer sim, e bastante. Pra cima deles, Neymar!”

Rodrigo Constantino e Dilma Rousseff, mesmo combate, quem diria? Vamos terminar com esses protestos idiotas contra um governo que investe mais em futebol que na educação e saúde. É vício de negativistas profissionais, como se dizia nos saudosos anos Médici. 

Só se vê o que existe no fundo de um lago quando as águas baixam. Imagine então uma Copa que pretende ser a Copa das Copas. A escolha do país-sede foi obra de Lula e o PT quer tirar um caldo desse osso. O oportunismo está mais para tiro no pé. Os tempos são outros e a maior parte da nação parece estar cansada do dito partido dos operários. Hoje, atrapalhar a Copa se tornou, para muitos, obrigação cívica. 

Ocorre ainda que o ano é eleitoral e as eleições ocorrem logo depois dos jogos. O que o PT condenava como recurso da ditadura no governo Médici, agora endossa com entusiasmo. Se a Copa, como organização, for um fiasco, milhões de votos a menos para Dona Dilma. Se o Brasil não emplacar o hexa, provavelmente o PT não emplaque o governo. O que parecia ser um trunfo, passou a ser aposta arriscada. Já prevendo uma eventual derrota, o governo está planejando um governo paralelo para o próximo mandato, a cargo de sovietes sob a tutela do PT. 

De minha parte, continuo o mesmo de sempre, o torcedor das finais. Contra o Brasil. Uma vitória dá ao povão uma sensação ilusória de algum ganho pessoal, quando na verdade só perderam tempo, trabalho e dinheiro. Particularmente nesta Copa, que apesar de ser um evento que gera lucros fabulosos, será patrocinada pelo teu, pelo meu, pelo nosso dinheirinho.

Uma desclassificação, de preferência já nos primeiros jogos, seria para mim uma dádiva dos deuses. Para a nação, um salutar banho de água fria em um público que se deixa nutrir alegremente por pão e circo. 

Que viva a Croácia!
Por: Janer Cristaldo Do site: http://cristaldo.blogspot.com.br/

BIOÉTICA E GUERRA CULTURAL II: ASSASSINANDO LEGADOS CULTURAIS


A medicina no Brasil já sente a decadência cultural, política e moral em suas fileiras, e já é escorraçada e desmoralizada pelo partido governante. 

Uma das formas mais discutidas, porém nem sempre percebidas, de se alterar os valores de uma sociedade é, sem dúvida nenhuma, a manipulação histórica e cultural.

Exemplos literários não saem de nossa cabeça. Quem não se lembra da distopia de Orwell, 1984? O Ministério da Verdade era aquele que cuidava justamente da reescrita da história, num paralelo interessante com as atuais comissões de busca ideológica da verdade.

Uma das absurdidades de nossos dias de analfabetismo funcional é a proposta de vulgarizar Machado de Assis, na qual uma estudiosa iráassassinar Machado, na prática, com dinheiro público, já que conseguiu apoio da Lei Rouanet, do Ministério da Cultura.[1] Ao invés de elevar a capacidade compreensiva e expressiva de nossas crianças e jovens, o que se propõe é destruir o legado de Machado de Assis sob a desculpa de torná-lo acessível. Por fim, o que se alcança é a acessibilidade de um texto reinventado por outra pessoa.

Além de tornar idéias complexas e sutis em realidades distantes, quase alienígenas, idéias estas anteriormente comunicadas por meio do esforço árduo dos grandes escritores, essa vulgarização acabará por alterar o próprio significado do que Machado desejou transmitir. É, literalmente, a destruição da nossa agonizante cultura, daquele resto que nos alcançou depois de décadas de massacre e mediocrização intelectual.

Mas neste caso, há um precedente importantíssimo na medicina. Hipócrates, um antepassado muito mais distante, já sofreu nas mãos desses reinventores da cultura. A comparação entre o texto original e o que hoje em dia se oferece em códigos de ética pelos próprios conselhos de classe falará por si mesma:

Juramento de Hipócrates Original

Juro por Apolo médico, Asclépio, Hígia, Panacéia (3) e todos os deuses e deusas,fazendo-os testemunhas de que conforme minha capacidade e discernimento cumprireieste juramento e compromisso escrito:

Considerar aquele que me ensinou esta arte igual a meus pais, compartilhar com elemeus recursos e se necessário prover o que lhe faltar; considerar seus filhos meus irmãos, e aos do sexo masculino ensinarei esta arte, se desejarem aprendê-la, sem remuneraçãoou compromisso escrito; compartilhar os preceitos, ensinamentos e todas as demais instruções com os meus filhos, os filhos daquele que me ensinou, os discípulosque assumiram compromisso por escrito e prestaram juramento conforme a leimédica, e com ninguém mais;utilizarei a dieta para benefício dos que sofrem, conforme minha capacidade e discernimento,e além disso evitarei o mal e a injustiça;não darei a quem pedir nenhuma droga mortal e nem darei esse tipo de instrução; domesmo modo, não darei a mulher alguma pessário para abortar; com pureza e santidade conservarei minha vida e minha arte;não operarei ninguém que tenha a doença da pedra, e cederei o lugar aos homensque fazem isso;em quantas casas eu entrar, entrarei para benefício dos que sofrem, evitando todainjustiça voluntária ou outra forma de corrupção, e também atos libidinosos no corpode mulheres e homens, livres ou escravos;o que vir e ouvir durante o tratamento sobre a vida dos homens, sem relação com otratamento e que não for necessário divulgar, calarei, considerando tais coisas segredo.

Se cumprir e não violar este juramento, que eu possa desfrutar minha vida e minhaarte afamado junto a todos os homens, para sempre; mas se eu o transgredir e nãocumprir, o contrário dessas coisas aconteça.[2]


Juramento de Hipócrates amputado

Prometo que ao exercer a arte de curar, mostrar-me-ei sempre fiel aos preceitos da honestidade, da caridade e da ciência.

Penetrando no interior dos lares, meus olhos serão cegos, minha língua calará os segredos que me forem revelados, os quais terei como preceito de honra.

Nunca me servirei da profissão para corromper os costumes e favorecer o crime.

Se eu cumprir este juramento com fidelidade, goze eu, para sempre, a minha vida e a minha arte de boa reputação entre os homens.

Se o infringir ou dele me afastar, suceda-me o contrario.[3]


O médico deixou de ser um herói ou santo, eterno buscador da excelência e da virtude, deixou de ser um professo, um vocacionado, e tornou-se um honrado burguês preocupado com sua reputação entre os homens. E, de forma bem escancarada, simplesmente não se menciona o valor da vida ao proibir a eutanásia, o suicídio assistido e o abortamento voluntário.

E o que veio depois ainda foi mais chocante: o Conselho Federal de Medicina tentou emplacar uma resolução para liberação do abortamento até a 12ª semana!

Numa brincadeira boba com as palavras, o documento justifica-se da seguinte forma: 

É importante frisar que não se decidiu serem os Conselhos de Medicina favoráveis ao aborto, mas, sim, à autonomia da mulher e do médico. É como falar que cebola não faz com que ardam nossos olhos, ela tempera a comida simplesmente! O documento declara, com todas as palavras, que seria feito o abortamento por vontade da gestante até a 12ª semana da gestação.[4]

Felizmente nem todos os conselhos concordaram.[5]

Isso tudo num país majoritariamente contra o aborto e que adota a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) como Norma Constitucional! No pacto está descrito que pessoa é todo ser humano, e que toda vida do ser humano deve ser protegida desde sua concepção.[6]

Mas voltemos ao Juramento.

É óbvio que o mesmo, assim como a obra de Machado de Assis, deve ser interpretado após o estudo adequado. Leitores incultos – e, às vezes, mal intencionados - enxergam no Juramento o machismo grego como se fosse machismo médico, ou o respeito aos mestres como corporativismo, obviamente uma deturpação inaceitável para alguém que domine o mínimo de metodologia necessária ao ler um documento antigo.

A solução não é destruir o Juramento criando uma versão falsificada e inodora, ou distorcer a interpretação e a correta contextualização do original. Da mesma forma a solução não é destruir Machado de Assis em sua originalidade e genialidade.

A solução também não é proibir a versão original como tentaram fazer com o Monteiro Lobato, enxergando em suas brincadeiras literárias infantis um racismo cruel com a personagem de Tia Anastácia.[7]

A solução, ou a tentativa de evitar a criação de um grande problema, é resgatar a cultura e adquirir os significados e a expressividade de nosso legado. É estudar de forma adequada, respeitosa e prudente. É imperativo saber que essas “pequenas” mudanças culturais podem degenerar em assombrosas mutações civilizacionais.[8]




Destrua a cultura da vida e o legado da medicina hipocrática e cristã, e a sociedade é quem pagará o preço. A medicina no Brasil já sente a decadência cultural, política e moral em suas fileiras, e já é escorraçada e desmoralizada pelo partido governante. Se o médico brasileiro não aprender direito o que é ser médico e qual o valor da alta cultura (a verdadeira e única digna do nome, diga-se de passagem), provavelmente será o pequeno burguês de boas aparências do Juramento de Hipócrates adulterado.[9] Destrua a verdadeira cultura e a memória da medicina, e nossos médicos alcançarão a irrelevância frente à sociedade, tornando-se meros burocratas da saúde.

Notas:



[1] AZEVEDO, Reinaldo. Em vez de uma escola brasileira à altura de Machado, um “Machado” à baixura da escola brasileira. Blog Reinaldo Azevedo. Veja, 2014. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/em-vez-de-uma-escola-brasileira-a-altura-de-machado-um-machado-a-baixura-da-escola-brasileira/>. Acesso em: 03 jun. 2014.


[2] RIBEIRO JR., W.A. Juramento de Hipócrates. Modelo 19, Araraquara, v. 4, n. 9, p. 69-72,1999. Disponível em: <http://warj.med.br/pub/pdf/juramento.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2014.


[3]CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO DISTRITO FEDERAL. Código de Ética do Estudante de Medicina 3ª Edição. Brasília, DF, 2004.


[4] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Circular CFM N° 46/2013. Brasília, DF, 2013. Disponível em: <http://waldircardoso.files.wordpress.com/2013/03/ofc3adcio-circular-cfm-46-2013.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2014.


[5] PEREIRA, Sandra Helena. Posição do Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo (CRM-ES) e do Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre o abortamento voluntário. Mirabilia (Medicinae), 2013,vol. 1, pp. 7-12.


[6] MINISTÉRIO DAS RELAÇÔES EXTERIORES. Convenção Americana Sobre Direitos Humanos. Em vigor no Brasil desde 1992, conforme o Decreto 678, de 06 nov. 1992. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em: 03 jun. 2014.


[7] MENDES, Priscilla. Mais uma obra de Monteiro Lobato é questionada por suposto racismo. Brasília: G1 Educação. Disponível em: <http://g1.globo.com/educacao/noticia/2012/09/mais-uma-obra-de-monteiro-lobato-e-questionada-por-suposto-racismo.html>. Acesso em: 03 jun. 2014.


[8] Indico as seguintes obras para começar a entender o perigo que uma alteração de idéias pode representar: WEAVER, Richard. Idéias têm Consequências. São Paulo: Vide Editorial, 2012; JONAS, Hans. O Princípio da Responsabilidade. Rio de Janeiro: Editora PUC Rio, 2011.


[9] Para compreender melhor o que é ser médico no contexto histórico e filosófico, e como a benevolência e a busca pela excelência atuam num contexto de amizade com o paciente para estabelecer a Relação Médico-Paciente de forma adequada, sugiro a leitura das obras de Diego Gracia e Edmund Pellegrino. GRACIA-Guillén, Diego.Fundamentos de Bioética. Madrid: Editorial Triacastela, 2011; PELLEGRINO, Edmund. The Philosophy of Medicine Reborn: A Pellegrino Reader. Notre Dame, Indiana: University of Notre Dame Press, 2011.

Por: Hélio Angotti Neto, médico oftalmologista com graduação pela Universidade Federal do Espírito Santo e residência médica e doutorado em Ciências pela Universidade de São Paulo. Coordena o curso de medicina do Centro Universitário do Espírito Santo (UNESC-ES) e é o diretor da seção especializada em humanidades médicas da revista Mirabilia. Membro da Sociedade Brasileira de Bioética, do Conselho Brasileiro de Oftalmologia, do Comitê de Ética em Pesquisa do UNESC, do Center for Bioethics and Human Dignity, da Associação Brasileira de Educação Médica e do Seminário de Filosofia de Olavo de Carvalho. Coordena o SEFAM (Seminário de Filosofia Aplicada à Medicina).


quarta-feira, 11 de junho de 2014

ESQUERDA JÁ CONTROLA O CONTEÚDO DA IMPRENSA E QUER CONTROLAR TAMBÉM O COFRE

Apesar de já exercer um grande controle ideológico sobre o conteúdo dos meios de comunicação, a esquerda quer asfixiá-los economicamente, consolidando o sonhado controle totalitário da imprensa.


Se a presidente Dilma Rousseff for reeleita, a imprensa brasileira corre um grande risco de passar pelo que estão passando os veículos de comunicação da Venezuela e da Argentina.


A censura aos meios de comunicação – disfarçada com o eufemismo de “controle social da mí­dia” – volta a rondar o País. Segundo reportagem da “Folha de S. Paulo”, publicada na quarta-feira, 28, a presidente Dilma Rousseff, caso reeleita para um segundo mandato, pretende propor a regulação econômica dos meios de comunicação, encampando parcialmente a proposta original do Partido dos Traba­lha­dores que, historicamente, é defensor do controle total da mídia e, desde o primeiro governo de Luiz Iná­cio Lula da Silva, tentou pôr em prática esse ideal marxista-leninista, que caracteriza todos os governos socialistas da história – amigos de primeira hora da imprensa quando estão na oposição e seus mais figadais inimigos quando assumem o poder.

É certo que nenhum governo – socialista ou liberal, de direita ou de esquerda – gosta de imprensa livre e se pudesse calaria todas as críticas ao poder, transformando os veículos de comunicação em meras assessorias dos palácios. Mas há uma diferença substancial entre a pressão sobre a imprensa exercida por um governo que se deixa guiar pelas regras do capitalismo e outro que atende à ideologia socialista. No sistema capitalista, mesmo em ditaduras, o governo central costuma exercer pressões pontuais contra os meios de comunicação, censurando um ou outro assunto que não é de seu interesse. Já num regime socialista, a pressão é total e o controle dos meios de comunicação se dá nos mínimos detalhes, asfixiando completamente a liberdade de expressão, que passa a ser monopólio do partido que está no poder.

No Brasil, a esquerda já esteve prestes a exercer esse poder totalitário sobre a imprensa, antes mesmo de Franklin Martins, o então ministro da Comunicação Social de Lula, propor o controle dos meios de comunicação. O que salvou o Brasil de não ter uma espécie de versão midiática e múltipla da Santíssima Trindade, com as “Folhas”, os “Globos”, os “Estadãos”, os “Zero Horas” e os “Populares” constituindo um só “Granma”, foi, sem dúvida, o advento da internet, que abriu espaço para o pensamento liberal e de direita absolutamente alijado dos veículos de comunicação tradicionais. So­mente depois que pensadores de direita começaram a fazer tremendo sucesso na internet, como é o caso notório do filósofo Olavo de Car­va­lho, foi que a imprensa sentiu a necessidade de abrir espaço para alguns deles, ainda que na condição de mero contraponto ao esquerdismo do noticiário em geral.

Talvez seja por isso que Dilma Rousseff, segundo acredita ingenuamente a “Folha de S. Paulo” (ou finge acreditar), não pensa em controlar o conteúdo dos meios de comunicação. Na prática, o conteúdo já está controlado há muito. Eu não preciso assistir ao oligofrênico noticiário de televisão para saber que o “Jornal Nacio­nal”, por exemplo, parece ser editado pelos espíritos de Michel Foucault, no campo dos costumes, saúde e segurança pública, e de Paulo Freire, no campo da educação. Prova disso é que a única voz do noticiário em horário nobre da televisão que tentou destoar desse pensamento marxista pós-moderno – a jornalista Rachel She­he­razade – foi sistematicamente perseguida pelas patrulhas de esquerda até se tornar, provavelmente, a primeira bonequinha de luxo em forma de âncora da TV mundial.

Controle da mídia já existe
Um exemplo desse controle que a esquerda exerce no imaginário dos jornalistas pode ser encontrado na própria matéria da “Folha de S. Paulo” que trata do controle social da mídia. Eis como se inicia a reportagem assinada pelos jornalistas Valdo Cruz e Andreia Sadi: “A presidente Dilma Rousseff continua contra a adoção de algum tipo de controle de conteúdo da imprensa, como defendem lideranças do PT, mas já cedeu em parte a seu partido e vai encampar, num eventual segundo mandato, a proposta de regulação econômica da mídia”.

Ora, desde quando a “Folha de S. Paulo”, com seu estilo telegráfico e direto, em que cada frase constitui um parágrafo, subverte as normas de redação jornalística que ela própria defende e inicia uma matéria com uma oração assessória tomando o lugar do assunto principal? O normal seria a matéria ter começado assim: “A presidente Dilma Rousseff já cedeu em parte a seu partido e vai encampar, num eventual segundo mandato, a proposta de regulação econômica da mídia”.

Só depois de feito esse dever de casa do bom repórter da “Fo­lha”, que segundo o Manual de Re­dação do jornal deve ser sempre direto, aí, sim, os jornalistas que assinam a matéria poderiam acrescentar a informação secundária de que Dilma Rousseff continua contra o controle de conteúdo da mídia proposto pelo PT. Mesmo assim, jamais deveriam afirmar isso com tanta certeza como fizeram os repórteres, pois repórter, como o nome diz, reporta o que vê e ninguém vê o que vai por dentro de uma pessoa a ponto de saber, com toda certeza, se ela é contra algo ou não. O correto seria apenas relatar a posição de Dilma a partir de uma visão externa, que é a perspectiva do repórter, e não afirmá-la com absoluta certeza a partir de uma visão onisciente que lhe entra cabeça adentro, como se o repórter fosse Deus ou ficcionista.

Ou seja, os repórteres da “Folha”, se agissem com a devida imparcialidade, jamais poderiam afirmar que “a presidente Dilma Rousseff continua contra a adoção de algum tipo de controle de conteúdo da imprensa” e, sim, que “a presidente Dilma afirmou que continua contra” ou que uma determinada fonte fez essa afirmação a respeito dela. Muito provavelmente, os dois repórteres da “Folha” agiriam assim se estivessem noticiando um fato relativo aos tucanos José Serra ou Fernando Henrique Cardoso: primeiro, o destaque para o fato novo, que impacta o leitor, mesmo que ele seja negativo para o protagonista da reportagem, como é de praxe no jornalismo; só depois a informação secundária, que pode atenuar a afirmação anterior e ser favorável ao entrevistado, mas não tem o mesmo impacto da novidade e não merece o mesmo destaque. Afinal, qualquer aluno de jornalismo sabe que, entre um “Fulano continua assim ou assado” e um “Fulano fará isso”, a notícia, obviamente, é a ação e não o estado que já existia antes.

Outro exemplo ainda mais sintomático do controle de conteúdo que a esquerda já exerce nos meios de comunicação brasileiros pode ser encontrado na mesma edição da “Folha de S. Paulo”, nu­ma entrevista com o cientista político russo Aleksandr Dugin, de 52 anos, professor da Universidade Estatal de Moscou. O repórter Guilherme Celestino, que entrevistou Dugin, inicia a entrevista com a seguinte pergunta: “Os brasileiros não conhecem o senhor, poderia falar um pouco sobre sua carreira e teoria?” Ao tratar Ale­k­san­der Dugin como absoluto desconhecido no Brasil, o repórter se esquece de que o cientista político russo protagonizou um longo debate com o filósofo Olavo de Carvalho na internet, de março a julho de 2011, fartamente compartilhado e comentado nas redes sociais, que resultou no livro “Os EUA e a Nova Ordem Mundial” (Vi­­de Editorial, 2012, 240 páginas), cuja versão eletrônica se en­contra entre os 100 livros mais vendidos da Amazon na área de política, o­cupando atualmente a 31ª posição.

Como foi Olavo de Carvalho quem apresentou Dugin ao público brasileiro, em artigo publicado no jornal “O Globo”, em 26 de abril de 2003, portanto, há 11 anos, a impressão que fica é que, no Brasil, um pensador só passa a existir se for descoberto por um intelectual de esquerda. O fato de Dugin ter outro livro publicado em português – “A Grande Guerra dos Continentes” – também não foi levado em conta pelo repórter. É certo que esse livro foi lançado por uma editora alternativa, a Antagonista, que parece ter encerrado suas atividades no início de 2012, mas a obra continua no catálogo da Vide Editorial e também pode ser encontrada em versão eletrônica na Amazon. Tudo bem que a maioria dos brasileiros não lê livros de ciência política e jamais ouviu falar de Dugin, mas, quando um jornal apresenta um pensador, evidentemente não está pensando nas massas, caso contrário não seria apenas Aleksandr Dugin o desconhecido – o jornalista Clóvis Rossi, que integra a nobreza editorial da “Folha”, também não existe para a esmagadora maioria dos brasileiros, que não tem o hábito de consumir artigos políticos, a não ser que venham embalados pela retórica midiática de um Arnaldo Jabor.

Fingimento editorial na imprensa
Esses dois casos pinçados da “Folha de S. Paulo” estão longe de ser uma exceção. Em todo o resto da imprensa, a regra é a mesma – o pensamento de esquerda é dominante e o que não é de esquerda entra apenas como contraponto, numa espécie de fingimento editorial, espécie de faz de conta de que existe pluralidade ideológica nos veículos de comunicação. E se não fosse a força da internet, que fez surgir uma espécie de direita virtual no País, nem esse contraponto ideológico existiria e a parte de opinião da grande imprensa seria fatiada apenas entre articulistas como Luís Fernando Veríssimo, Vladimir Safatle, Leonardo Saka­mo­to ou Eliane Brum. O controle ideológico da esquerda é tão forte que nem mesmo alguns críticos do go­verno petista escapam dele. A jornalista Miriam Leitão é um exemplo. Em que pese não poupar críticas a determinadas decisões econômicas do governo federal, sendo execrada por isso nas hostes petistas, ela costuma, em questões de comportamento, a­linhar-se com o ideário de esquerda, fazendo, por exemplo, uma irracional de­fesa das cotas raciais esboçadas pe­lo tucanato e impostas pelo petismo.

Todavia, o controle de esquerda sobre a mídia brasileira beira a censura é no noticiário geral, fora da sessão de opinião dos jornais. Pouco adianta uma “Veja” ter Reinaldo Azevedo ou Rodrigo Constantino, uma “Folha” ter Luiz Felipe Pondé ou João Pereira Coutinho, uma “Época” e um “Globo” terem Guilherme Fiúza ou um “Estadão” ter Denis Rosenfield, se fora de suas respectivas editorias de opinião, em praticamente todo o noticiário dessas publicações, predomina a ideologia esquerdista. Diariamente, o público que lê jornal, ouve rádio ou vê televisão é submetido ao pensamento único de esquerda de forma imperceptível – geralmente por meio de especialistas oriundos das universidades, que supostamente falam com neutralidade sobre o assunto em questão, mas quase sempre não passam de ideólogos disfarçados de cientistas.

Todo o noticiário sério sobre segurança pública, por exemplo, é contaminado pelo pensamento do filósofo Michel Foucault, onipresente no discurso dos especialistas, que glorificam o banditismo, a pretexto de defender os direitos humanos, e espezinham as forças policiais, acusando-as até de crimes que não cometeram. O cientista político uspiano Paulo Sérgio Pinheiro, por exemplo, ao criticar os que pediam justiça no caso do menino João Hélio, arrastado e morto por assaltantes nas ruas do Rio de Janeiro em fevereiro de 2007, perpetrou a seguinte frase: “Nas semanas após o crime bárbaro, muitas chacinas, algumas balas perdidas de revólver de policiais acertam casualmente uma moradora no gueto. Mal são notadas: compaixão e clamor só para vítimas de fora dos guetos”. A vítima “fora dos guetos” a que ele se refere, como se lamentasse a comoção pública que uma vítima suscita, era justamente o menino João Hélio, uma inocente criança de apenas 6 anos, tratado pelos bandidos como “boneco de Judas”, após ficar enganchado no cinto de segurança do carro roubado e ser arrastado pela distância de sete quilômetros, enquanto seu corpo ia se desfazendo pelo caminho.

Panfleto ideológico travestido de notícia
Esse artigo de Paulo Sérgio Pinheiro, escrito em parceria com Marcelo Daher, integrante do Alto Comissariado da ONU, assim como Pinheiro, foi publicado na “Folha de S. Paulo” em 10 de abril de 2007, e nele os autores aproveitam para criticar a polícia, ao dizer que “algumas balas perdidas de revólver de policiais acertam casualmente uma moradora no gueto”. Ora, se a bala é reconhecidamente perdida como é que Paulo Sérgio Pinheiro e seu parceiro de surrealismo podem ter certeza de que ela partiu do revólver de um policial? Nesta simples frase, destituída até de bom senso, que dirá do rigor científico que se espera de um catedrático, Paulo Sérgio Pinheiro, que foi ministro de Direitos Humanos do governo Fernando Henrique Cardoso, revela todo o seu preconceito ide­ológico contra a polícia, oriundo das leituras de Foucault no Núcleo de Estudos da Violência da USP, fundado por ele em parceria com o sociólogo Sérgio Adorno.

Mas a notória parcialidade de Paulo Sérgio Pinheiro, que chega a conspurcar o cadáver de uma criança com sua esconsa ideologia dos direitos humanos, não o impede de ser chamado a pontificar nas matérias noticiosas sobre segurança pública, como se fosse uma autoridade científica neutra pairando com a verdade dos fatos sobre as paixões dos parentes de vítimas da criminalidade. No mesmo ano em que não teve dúvida em atribuir as balas perdidas aos revólveres dos policiais, como se bandido não atirasse e não errasse o alvo, Paulo Sérgio Pinheiro criticou o governo do Rio pela política de confronto nas favelas e sua crítica foi tratada pelo blogueiro Jorge Antonio de Bar­ros, o “repórter do crime” do jornal “O Globo”, como “tão contundente quanto autorizada”, pelo fato de Pinheiro ser “um dos fundadores do Núcleo de Estudos da Violência da USP e um dos pesquisadores mais gabaritados no assunto”.

Ora, como sabia Descartes, o primeiro dever de um pesquisador gabaritado, que busca a verdade, é partir da dúvida, especialmente quando os fatos não são claros. Mas não é assim que agem os ideólogos travestidos de cientistas que dão declarações em reportagens de rádio, TV e jornal, muitas vezes fechando a notícia com a última palavra sobre o assunto abordado. Essa onipresença dos acadêmicos de esquerda em reportagens sobre educação, segurança, saúde e cidadania, sempre disfarçados de cientistas neutros e portadores da verdade, transforma o que deveria ser uma matéria jornalística, com a devida pluralidade de opiniões, num panfleto ideológico travestido de notícia. Com isso, o público é adestrado a pensar como a esquerda sobre a maioria dos assuntos humanos, mesmo que politicamente abomine o PT. Quantos pastores evangélicos, sempre que vão criticar a ditatura gay, não fazem questão de deixar claro que também são contra a "homofobia", sem perceber que aceitar e usar o absurdo conceito de "homofobia" – que não tem qualquer lastro científico da forma como é usado – já é ser vítima, sem o saber, da própria ditadura gay que querem denunciar?

Controle do que já está controlado
Em síntese, o governo petista quer controlar o que já está controlado. Inclusive do ponto de vista político. Afinal, qual o grande grupo de mídia do Brasil que se opõe à ideologia de esquerda? O oligarca José Sarney, que detém um império de comunicação no Maranhão filiado à Rede Globo e é aliado de primeira hora de Lula? A própria Rede Globo, cuja teledramaturgia parece sair das páginas de Michel Foucault, promovendo toda sorte de devassidão moral defendida pela esquerda, desde a promiscuidade gay até a liberação das drogas, passando pelo culto sem limites à juventude, que destrói a autoridade paterna e docente? Os sindicatos de jornalistas que já são vergonhosamente totalitários, defendendo todos os atentados à liberdade de expressão que a esquerda comete ou intenta cometer, como é o caso da censura à jornalista Rachel Sheherazade, sem contar o silêncio da própria Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) diante das prisões de jornalistas em Cuba?

Se a presidente Dilma Rousseff for reeleita, a imprensa brasileira corre um grande risco de passar pelo que estão passando os veículos de comunicação da Venezuela e da Argentina. E não adianta achar – como os ingênuos tucanos – que o Brasil é institucionalmente mais estável do que seus vizinhos e que não corre o risco de submergir a uma ditatura institucional nos moldes do PRI mexicano ou do bolivarianismo de Hugo Chávez. Se o governo petista quiser quebrar a espinha dorsal dos grandes veículos de comunicação, ele tem o amparo dos artigos 220 e 221 da Consti­tuição para agir assim. E não será um Supremo cada vez mais bolivariano que conseguirá lhe dizer não. O Congresso Nacional pode até tentar, mas com credibilidade zero, pois estará advogando em causa própria, já que os oligarcas estaduais, presentes ou bem representados no Senado e na Câmara, estão entre os maiores donos de concessões de rádio e TV pelo País afora.

Mas se o PT não conseguir vencer essa guerra contra os grandes conglomerados de comunicação, a tendência é que ressuscite o Conselho Nacional de Jornalistas para atingir a parte mais fraca – os profissionais de comunicação. E, se isso ocorrer, o que é bem provável, os Marinhos, os Frias, os Mesquitas, os Sirotskys, os Câmaras, vão lavar as mãos, sem dúvida alguma. Então, nesse dia, os raros jornalistas de direita terão de se aposentar, pois a tendência é que o conselho profissional dos jornalistas – dado o histórico da Fenaj – seja tão ideológico quanto o Conselho Federal de Psicologia e persiga o profissional da área que não rezar pela sua cartilha. Essa tragédia contra a liberdade de expressão e a democracia só será evitada se a grande imprensa abrir seu noticiário – e não só as páginas de opinião – para o pensamento de direita, descobrindo e ouvindo intelectuais que não pensam como o PT também sobre os assuntos do dia a dia. Caso contrário, a grande imprensa pode até conservar a chave do cofre, mas perderá de vez a autonomia editorial, tornando-se mero boneco de ventríloquo dos chefes de quarteirão do pensamento.


Post scriptum – Jamais me deixei enganar por Joaquim Barbosa. Sua renúncia precoce e injustificável ao Supremo mostra que eu estava certo em todas as críticas que fiz ao ministro – o Brasil não nasceu para heróis. E Barbosa é a maior prova disso. Ainda volto ao assunto.
Publicado no Jornal Opção.
Por: José Maria e Silva é sociólogo e jornalista.




COMO JUSTIFICAR O SOCIALISMO

Quase não há resposta à pergunta sobre quais são os argumentos a favor do socialismo, porque a maior parte dos argumentos dos socialistas não é em favor do socialismo, mas contra o capitalismo. Mais do que falhas econômicas, atribuem ao capitalismo supostos defeitos morais. Só que, nos últimos cem anos, os socialistas tiveram de ir mudando seus argumentos contra o capitalismo à medida que seus argumentos iam caindo. Vejamos, um a um:


1. EXPLORAÇÃO: No século XIX, Marx e Engels acusaram as empresas capitalistas de explorar seus trabalhadores mediante a suposta “mais-valia” que lhes era “extraída” (como uma chupada de sangue do Drácula). Porém, acontece que na Europa e Estados Unidos, os empregados e operários da Standard Oil, Shell, Ford, General Motors, General Eletric, e muitas outras empresas, não se tornaram cada vez mais pobres, como antecipava a profecia de Marx, pelo contrário, saíram da pobreza, e muitos prosperaram, dentro de poucos anos. Esse argumento contra o capitalismo caiu.

2. CRISE: Foi a manipulação do dinheiro por parte do banco central americano que causou a Grande Crise de 1929; porém, como sempre, os socialistas jogaram a culpa no capitalismo. Contudo, após a Segunda Guerra Mundial, os países derrotados abandonaram a economia planificada e fizeram reformas liberais. E assim escaparam da crise, desemprego e pobreza. Esse argumento também caiu.

3. IMPERIALISMO E DEPENDÊNCIA. Os professores de Sorbonne e os experts da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal), seguindo Lenin, acusaram o capitalismo de explorar mediante “imperialismo” os países do Terceiro Mundo. Porém aqueles países mais “dependentes” do comércio internacional, e mais abertos à economia global, como Hong Kong, Singapura, Taiwan e Coreia do Sul, saíram da pobreza massiva, e se tornaram ricos, em poucos anos. Outro argumento que cai.

4. JUVENTUDE OPRIMIDA. Em maio de 1968 em Paris, e em Berkeley, na Califórnia, Herbert Marcuse e os marxistas culturais acusaram o capitalismo de “oprimir aos jovens”, aos quais convidaram a que se rebelassem. Porém, depois, uma turminha de garotos imberbes como Bill Gates e Steve Jobs, no Vale do Silício, da própria Califórnia, e agora Mark Zuckerberg com o Facebook, ficaram multimilionários antes dos 40, sem pedir nada ao governo. E na década de 1990 umas reformas “neoliberais” muito tímidas e parciais, ainda muito longe de serem realmente capitalistas, abriram certas oportunidades em alguns mercados de ações e dividendos, e os jovens “yuppies” foram os que mais tiraram delas proveito para ganhar independência. Esse argumento caiu.

5.MACHISMO. A esquerda lançou-se com o feminismo, acusando o capitalismo de “oprimir a mulher”. Porém na China, Índia e América Latina, pequenas janelas de um capitalismo muito incompleto se abrem às pessoas na economia informal, e quem mais aproveita tais oportunidades para ascender são as mulheres. Diferentemente das pobres mulheres presas em sua dependência crônica do insustentável estado de bem-estar social, que agora implode, e lhes cai por cima aos pedaços na Europa e Estados Unidos.

6. RACISMO. Para piorar as coisas, a enorme maioria dessas mulheres da economia informal na América Latina são indígenas de pele avermelhada, bem como seus pais, maridos, irmãos e filhos dessa mesma cor, de modo que os socialistas não conseguem bom uso do argumento indigenista e racista contra o capitalismo.

7. PREJUÍZO ECOLÓGICO. O capitalismo é acusado de “destruir o meio-ambiente”. Porém em alguns lugares da África (agora poucos) estão provando que a propriedade privada é superior ao Estado no cuidado e preservação do meio ambiente e das espécies, pela simples razão de que cada um cuida melhor do que é seu, e “o que é de todos não é de ninguém”. Os vermelhos se vestem de verde e investem contra os transgênicos e nos assustam com notícias de que as indústrias multinacionais de alimento estão nos envenenando. Porém, em seguida aparece a confissão de Mark Lynas, um ex-“verde” arrependido, que diz: “Perdão, estávamos mentindo”.

Mas eles vão seguir. Os socialistas estão no poder, e são muito criativos em inventar defeitos para o capitalismo.

Publicado no jornal boliviano El Día. 
Alberto Mansueti é advogado e cientista político - http://albertomansueti.com/.
Tradução: Márcio Santana Sobrinho




terça-feira, 10 de junho de 2014

As Mentiras do Aquecimento Global - Luiz Carlos Molion - Programa 3A1-HD

DO ENIGMA AO DESASTRE


Os historiadores do futuro, se houver futuro, talvez nos dêem a solução do maior enigma político de todos os tempos. Por enquanto, tudo são névoas e perguntas sem respostas. Um homem que veio não se sabe de onde, que nunca teve um emprego fixo, que pagou seus estudos nas universidades mais caras com dinheiro de fonte misteriosa, que trocou de nome pelo menos quatro vezes, que nunca exibiu um só documento de identidade válido mas apresentou pelo menos três falsificados, que tem uma história de vida toda repleta de episódios suspeitos e passou anos em companhia íntima de gangsters e terroristas, um dia se elegeu senador pelo Estado de Illinois e, depois de apenas alguns meses de experiência política – se é que se pode chamar de experiência a ausência na maioria das sessões --, foi guindado à presidência da nação mais poderosa do globo sob aplausos gerais, despertando em centenas de milhões de eleitores a maior onda de esperanças messiânicas de que se tem notícia desde Lênin, Mussolini, Stálin, Hitler e Mao Dzedong. Decorridos seis anos de administração indescritivelmente desastrosa, continua no posto, impávido colosso, sem que ninguém possa investigar as zonas obscuras da sua biografia sem ser xingado de tudo quanto é nome pelos maiores jornais do país, bem como pela elite dos dois partidos, Democrata e Republicano. Aparentemente a obrigação mais incontornável do eleitor americano hoje em dia é deixar-se governar sem perguntar por quem, e fazendo de conta que tudo está perfeitamente normal.

Uma vez persuadido a acomodar-se a essa situação, sob pena de tornar-se um inimigo público, o cidadão está pronto para aceitar silencioso e cabisbaixo qualquer decisão que venha do governo, por absurda, imoral e inconstitucional que seja.

A última foi essa incrível troca de cinco dos mais temíveis líderes do Taliban por um soldadinho desertor – sem consulta ao Senado, é claro, o que soma à injúria o insulto.

Mas antes disso o número e a gravidade dos crimes do presidente já haviam ultrapassado as mais tétricas especulações futuristas: duplicou a dívida nacional que prometera reduzir, desmantelou o sistema de saúde para colocar em seu lugar a fraude monumental do Obamacare, pressionou hospitais religiosos para que realizassem abortos, entregou armas a traficantes mexicanos e terroristas sírios, encheu de dinheiro estatal firmas falidas de seus amigos e contribuintes de campanha, desmoralizou o dólar, estragou as relações diplomáticas com Israel, fez mil e um discursos culpando os EUA de tudo quanto acontece de mau no mundo, teve dezenas de encontros secretos com membros e parceiros da Fraternidade Muçulmana, usou o imposto de renda para perseguir inimigos políticos, instalou um monstruoso sistema de espionagem interna para chantagear jornalistas, incentivou o quanto pôde o ódio racial, armou a polícia civil com equipamentos de guerra para aterrorizar cidadãos desarmados, acabou com a liderança americana no mundo, recusou socorro a um embaixador cercado por terroristas e, depois que ele foi assassinado, tentou enganar o país inteiro com a historinha ridícula de que foi tudo culpa de um vídeo do youtube. Nesse ínterim, tirou mais férias, deu mais festas e jogou mais partidas de golfe do qualquer dos seus antecessores, além de faltar sistematicamente aobriefing diário com seus assessores. Nas horas vagas, sua esposa se dedicava a uma campanha altamente humanitária para que as crianças comessem mais nabos e menos batatinhas fritas, provocando a ira da população infantil.

A sucessão de ações maldosas e antipatrióticas, entremeada aqui e ali de futilidades obscenas, é tão incessante, tão coerente, que toda tentativa de explicá-la pela mera incompetência vai contra o mais mínimo senso de verossimilhança. Como escreveu Eileen F. Toplansky no último número do American Thinker, o homem não é um fracasso: é um sucesso. Sucesso num empreendimento frio e calculado de destruição do país (v. http://www.americanthinker.com/2014/05/a_most_successful_president.html).

Se, a despeito disso, ele continua blindado e inatingível, é porque a Constituição e as leis foram desativadas, sendo substituídas por um novo princípio de ordem: a autoridade da grande mídia, aliada à força de intimidação de uma vasta rede de colaboradores dispostos a tudo e amparada em corporações bilionárias interessadas em remover os EUA do caminho do governo mundial.

O Sistema americano, em suma, já não é mais o mesmo, e a restauração do antigo, se for possível, levará décadas. A obra de devastação foi muito além dos seus efeitos políticos imediatos: mudou o quadro inteiro da autoconsciência americana, fez da grande potência um país doente e aleijado, incapaz de reagir às mais brutais agressões psicológicas. Incapaz até mesmo de escandalizar-se.

A passagem de Barack Hussein Obama pela presidência é o acontecimento mais desastroso que já se abateu sobre os EUA desde o bombardeio de Pearl Harbor.
Por: Olavo de Carvalho Publicado no Diário do Comércio.  www.olavodecarvalho.org


segunda-feira, 9 de junho de 2014

O GOVERNO ACABOU

Os ministérios estão paralisados. O que se mantém é a rotina administrativa


O governo Dilma definha a olhos vistos. Caminha para um fim melancólico. Os agentes econômicos têm plena consciência de que não podem esperar nada de novo. Cada declaração do ministro da Fazenda é recebida com desdém. As previsões são desmentidas semanas depois. Os planos não passam de ideias ao vento. O governo caiu no descrédito. Os ministérios estão paralisados. O que se mantém é a rotina administrativa. O governo se arrasta como um jogador de futebol, em fim de carreira, aos 40 minutos do segundo tempo, em uma tarde ensolarada.

Apesar do fracasso — e as pífias taxas de crescimento do PIB estão aí para que não haja nenhum desmentido —, Dilma é candidata à reeleição. São aquelas coisas que só acontecem no Brasil. Em qualquer lugar do mundo, após uma pálida gestão, o presidente abdicaria de concorrer. Não aqui. E, principalmente, tendo no governo a máquina petista que, hoje, só sobrevive como parasita do Estado.

A permanência no poder é a essência do projeto petista. Todo o resto é absolutamente secundário. O partido necessita da estrutura estatal para financeiramente se manter e o mesmo se aplica às suas lideranças — além dos milhares de assessores.

É nesta conjuntura que o partido tenta a todo custo manter o mesmo bloco que elegeu Dilma em 2010. E tem fracassado. Muitos dos companheiros de viagem já sentiram que os ventos estão soprando em sentido contrário. Estão procurando a oposição para manter o naco de poder que tiveram nos últimos 12 anos. O desafio para a oposição é como aproveitar esta divisão sem reproduzir a mesma forma de aliança que sempre condenou.

Como o cenário político foi ficando desfavorável à permanência do petismo, era mais que esperada a constante presença de Lula como elemento motivador e agregador para as alianças. Sabe, como criador, que o fracasso eleitoral da criatura será também o seu. Mas o sentimento popular de enfado, de cansaço, também o atingiu. O encanto está sendo quebrado, tanto no Brasil como no exterior. Hoje suas viagens internacionais não têm mais o apelo do período presidencial. Viaja como lobista utilizando descaradamente a estrutura governamental e intermediando negócios nebulosos à custa do Erário.

Se na campanha de 2010 era um presidente que pretendia eleger o sucessor, quatro anos depois a sua participação soa estranha, postiça. A tentativa de transferência do carisma fracassou. Isto explica por que Lula tem de trabalhar ativamente na campanha. Dilma deve ficar em um plano secundário quando o processo eleitoral efetivamente começar. Ela não tem o que apresentar. O figurino de faxineira, combatente da corrupção, foi esquecido. Na história da República, não houve um quadriênio com tantas acusações de “malfeitos” e desvios bilionários, como o dela. O figurino de gerentona foi abandonado com a sucessão de “pibinhos”. O que restou? Nada.

Lula está como gosta. É o centro das atenções. Acredita que pode novamente encarnar o personagem de Dom Sebastião. Em um país com uma pobre cultura democrática, não deve ser desprezada a sua participação nas eleições.

A paralisia política tem reflexos diretos na gestão governamental. As principais obras públicas estão atrasadas. Boa parte delas, além do atraso, teve majorados seus custos. Em três anos e meio, Dilma não conseguiu entregar nenhuma obra importante de infraestrutura. Isto em um país com os conhecidos problemas nesta área e que trazem sérios prejuízos à economia. Mas quando a ideologia se sobrepõe aos interesses nacionais não causa estranheza o investimento de US$ 1 bilhão na modernização e ampliação do porto de Mariel. Ou seja, a ironia da história é que a maior ação administrativa do governo Dilma não foi no Brasil, mas em Cuba.

Os investimentos de longo prazo foram caindo, os gastos para o desenvolvimento de educação, ciência e tecnologia são inferiores às necessidades de um país com as nossas carências. Não há uma área no governo que tenha cumprido suas metas, se destacado pela eficiência e que o ministro — alguém lembra o nome de ao menos cinco deles? — tenha se transformado em referência, positiva, claro, pois negativa não faltam candidatos.

O irresponsável namoro com o populismo econômico levou ao abandono das contas públicas, das metas de inflação e ao desequilíbrio das tarifas públicas. Basta ver o rombo produzido no setor elétrico. A ação governamental ficou pautada exclusivamente pela manutenção do PT no poder. As intervenções estatais impuseram uma lógica voluntarista e um estatismo fora de época. Basta citar as fabulosas injeções de capital — via Tesouro — para o BNDES e os generosos empréstimos (alguns, quase doações) ao grande capital. E a dívida pública, que está próxima dos R$ 2,5 trilhões?

No campo externo as opções escolhidas pelo governo foram as piores possíveis. Mais uma vez foi a ideologia que deu o tom. Basta citar um exemplo: a opção preferencial pelo Mercosul. Enquanto isso, o eixo dinâmico da economia mundial está se transferindo para a região Ásia-Pacífico.

Ainda não sabemos plenamente o significado para o país desta gestão. Mas quando comparamos os nossos índices de crescimento do PIB com os dos países emergentes ou nossos vizinhos da América Latina, o resultado é assustador. É possível estimar que no quadriênio Dilma a média sequer chegue a 2%. A média dos emergentes é de 5,2%, e da América Latina, de 3,2%. E o governo Dilma ainda tem mais sete meses pela frente. Meses de paralisia econômica. Haja agonia.

Por: Marco Antonio Villa é historiador

TEMPO REENCONTRADO

Envelhecer não é apenas um fato biológico. É também estético. Segundo os ensinamentos do dr. Coutinho, envelhecer significa rever certos filmes ou reler certos livros que a nossa ignorância juvenil considerava obras-primas —e depois pular do sofá, sustendo o vômito e gritando de pasmo: "Mas como foi possível eu ter gostado de uma bosta dessas?".


Recentemente, em mudanças, resolvi fazer uma tosquia na biblioteca. Mas, antes da tosquia, resolvi avaliar a qualidade do rebanho, começando pelos espécimes que ocupavam o panteão das paixões adolescentes.
Henry Miller estava no topo da lista, e a sua trilogia ("Sexus", "Plexus", "Nexus"), complementada pelos "Trópicos" (de Câncer e de Capricórnio), tinha deixado gratas memórias na memória da criança.

A criança, hoje a caminho da meia-idade, sentou e releu as páginas sublinhadas. E ficou abismada com a mediocridade da prosa e o priapismo repetitivo, sem sombra de humor, com que Miller polvilhava as suas fantasias parisienses. Como foi possível ter dado abrigo a Henry Miller durante tanto tempo?

Aliás, não apenas a ele: com os romances de Umberco Eco; a filosofia de Baudrillard; a poesia de Sylvia Plath foi precisamente a mesma coisa. Tudo para o balde.

E no cinema? Aqui, a minha vergonha é ainda maior: vinte anos atrás, eu acreditava genuinamente que Oliver Stone era um diretor de cinema. Fui acumulando os filmes do homem —"Nascido em 4 de Julho", "The Doors", o repelente "Assassinos por Natureza"— com gratidão cinéfila sincera.

Hoje, assistindo a qualquer um deles, é legítimo questionar que substâncias ilícitas eu consumia na década de 1990.

Pior: filmes declaradamente "sérios" e "dramáticos", como "Nascido em 4 de Julho", são impossíveis de engolir com cara séria. Acreditar em Tom Cruise como "marine" estropiado no Vietnã não é apenas "suspender a descrença". É suspender qualquer atividade cerebral significativa.

E quem fala em Stone, fala dos exercícios nulos de Jonathan Demme ("Filadélfia" em primeiro lugar); nos filmes de Mike Nichols (começando logo em "A Primeira Noite de um Homem"); e, obviamente, nesse caso perdido que dá pelo nome de Ridley Scott. Se "Thelma & Louise" não é o pior filme dos últimos largos anos, eu desafio o leitor a apresentar uma alternativa.

Mas nem tudo é necessariamente mau. O que jogamos no balde com alívio e repulsa é compensado por tudo o que resgatamos dele.

Falei de Ridley Scott. Mas, 20 anos depois, eu desconhecia que o talento da família estava com o irmão Tony. Sim, a filmografia do senhor é majoritariamente pavorosa. Mas depois existem uns milagres lá pelo meio -os filmes com Denzel Washington, como "Chamas da Vingança"- que redimem todas as falhas e todas as pirotecnias escusadas.

Ressurreições são também devidas a diretores entretanto desaparecidos em combate, como Steven Kloves (que nos deu "Susie e os Baker Boys", um filme etílico —em vários sentidos da palavra— e que envelheceu bem como os melhores vinhos) ou Lawrence Kasdan (que em "O Turista Acidental" dirigiu uma obra-prima do cinema americano moderno).

E, nos livros, uma confissão: a arte do conto foi destronando a ilusória grandiosidade do Romance (com maiúscula). Claro que os russos (como Dostoiévski), os ingleses (como Evelyn Waugh) ou os franceses (como Céline) permanecem intocáveis.

Mas sei hoje que, comparando colegas de geração, prefiro os contos de Richard Ford a qualquer romance de Don DeLillo; os contos de William Trevor a qualquer romance de Iris Murdoch; os contos de Hanif Kureishi a qualquer romance de Ian McEwan.

Lições para o futuro? Apenas uma: não confiar demasiado no passado. Como diria o velho Darwin, só sobrevive quem se adapta melhor aos desafios da evolução. O que significa que, evoluindo nós, os livros ou os filmes que ficam são aqueles que se adaptam aos dilemas, às alegrias e às tristezas que só chegam mais tarde nas nossas vidas.

O que jogamos no balde não é tempo perdido. É tempo reencontrado. 
Por: João Pereira Coutinnho Publicado na Folha de SP