QUANDO TUDO O QUE SE ESCREVE TIVER SE DESFEITO EM FARRAPOS, QUANDO ATÉ MESMO OS MELHORES TIVEREM SE TORNADO APENAS VERBETES DE ENCICLOPÉDIA JAMAIS CONSULTADA, AS PALAVRAS DE UM PENSADOR AINDA ESTARÃO VIVAS PARA MOSTRAR, SOBRE RUÍNAS DOS TEMPOS, A PERENIDADE DO ESPÍRITO HUMANO.
quinta-feira, 21 de junho de 2012
OS CAPITALISTAS PREGUIÇOSOS QUE TEMEM O PROGRESSO
A tecnologia digital está reinventando o mundo, a serviço de você e de mim. Trata-se de um livre mercado com esteróides. Ela está driblando e contornando os guardiões do status quo e dando poderes a cada um de nós para inventarmos nossa própria civilização de acordo com nossas próprias especificações.
A promessa do futuro não é nada menos que espetacular — desde que aqueles que não possuem a imaginação para ver este potencial não consigam impor a todos nós o seu atraso. Infelizmente, mas previsivelmente, algumas das maiores barreiras para este futuro brilhante e promissor são os próprios capitalistas que temem o futuro e que não querem ter o trabalho de se aprimorarem.
Um bom exemplo disso é a atual histeria a respeito da impressora que imprime em 3-D e, com isso, literalmente duplica objetos. Trata-se de uma tecnologia que, com inacreditável rapidez, saiu do âmbito da ficção científica e veio para o mundo real, aparentemente em questão de meses. Você pode hoje conseguir impressoras destas por míseros US$400. Estas impressoras permitem que objetos sejam transportados digitalmente, e sejam literalmente impressos e criados em frente a seus olhos.
É como um milagre! Isto pode mudar absolutamente tudo o que conhecemos hoje sobre o transporte de objetos físicos. Em vez de enviar caixotes e navios ao redor do mundo, no futuro iremos apenas enviar dígitos, que serão convertidos em objetos. O potencial que esta invenção apresenta para se combater e contornar monopólios e interesses estabelecidos é espetacular.
Mas veja o que relatou a revista Wired Magazine [revista sobre tecnologia] na semana passada:
No início deste ano, Thomas Valenty comprou uma MakerBot — uma impressora 3-D barata que permite a você criar objetos de plástico. Seu irmão possuía alguns Guardas Imperiais do jogo de tabuleiro Warhammer, de modo que Valenty teve a ideia de desenhar algumas miniaturas baseadas no mesmo estilo das miniaturas do jogo, como um guerreiro e um tanque.
Ele passou uma semana refinando os desenhos até finalmente ficar satisfeito. "Tive muito trabalho", diz ele. Após a criação, ele postou os arquivos para download gratuito no Thingiverse, um site que permite a você compartilhar instruções para a impressão de objetos em 3-D. Pouco tempo depois, vários outros fãs começaram a fazer o mesmo.
Até que alguns advogados foram acionados.
A Games Workshop, a empresa do Reino Unido que produz o Warhammer, descobriu o trabalho de Valenty e enviou ao Thingiverse uma notificação de fechamento de site, citando o Digital Millennium Copyright Act. O Thingiverse retirou os arquivos do site, e Valenty repentinamente se tornou um relutante combatente da próxima guerra digital: a batalha pela cópia de objetos físicos.
Então aí está. A Câmara de Comércio dos EUA — a suposta defensora da livre iniciativa — está em estado de pânico completo, determinada a esmagar a impressão 3-D em seu berço, ou, no mínimo, a garantir que ela jamais cresça.
Na década de 1940, Joseph Schumpeter disse que os capitalistas iriam destruir o capitalismo caso insistissem em fazer com que seus vigentes modelos de lucratividade se perpetuassem para sempre, em total descompasso com todas as mudanças no mercado que surgem continuamente. Ele disse que a classe capitalista iria, com o tempo, perder o gosto pela inovação e iria insistir para que o governo criasse leis que abolissem as inovações. Tudo em nome da proteção das elites empresariais.
Um exemplo: quando músicas e livros começaram a ser digitalizados, houve muita gritaria. Como iriam escritores e músicos sobreviver a este ataque?
A verdade é que não houve nenhum ataque. Muito pelo contrário. Aquilo que foi inicialmente pensado para dar mais comodidade aos consumidores se transformou na maior dádiva já concebida para a música e para a literatura. Hoje podemos ver como tudo isso está funcionando. E não apenas está funcionando, como há escritores e músicos ganhando mais dinheiro hoje do que jamais na história.
Os métodos utilizados atualmente jamais poderiam ter sido imaginados antecipadamente. Alguns disponibilizam seus conteúdos e vendem suas apresentações ao vivo. Outros inventaram novos e interessantes métodos de distribuir conteúdos, como estabelecendo um site acessível apenas para assinantes, e cobrando quantias módicas e convenientes. Escritores estão começando a publicar sem recorrer a grandes editoras, utilizando para isso vários foros criados por usuários de internet.
Recentemente, visitando alguns museus, comecei a me dar conta de algo extremamente importante a respeito do nosso longo processo de aperfeiçoamento tecnológico. Ao longo de toda a nossa história de luta por aprimoramentos e avanços, cada melhoria, cada mudança de paradigma, cada abandono do velho em prol do novo geraram pânicos. O maior pânico, tipicamente, sempre advém dos próprios produtores, que se ressentem da maneira como o processo de mercado desestabiliza seus modelos empresariais.
Já foi dito que o rádio acabaria com as apresentações ao vivo. Ninguém mais iria querer aprender música. Todas as músicas, concertos e apresentações seriam executadas apenas uma vez, gravadas para a eternidade, e este seria o fim. É claro que isso não foi o que aconteceu.
Depois, quando inventaram o disco, novo pânico. Dizia-se que esta invenção iria destruir o rádio. Depois o mesmo processo se repetiu com a invenção das fitas K-7, com todo mundo prevendo o novo fim da indústria da música, já que as músicas podiam agora ser facilmente duplicadas ("A Gravação Doméstica Está Matando a Música"). E o mesmo apocalipse foi vaticinado com a invenção da música digital: agora sim veremos o fim de toda a música!
E pense no mercado de livros do século XIX. Naquela época, grandes e poucas casas editoriais dominavam o mercado. Muitos previram que isso iria acabar com o surgimento de novos escritores porque as pessoas iriam comprar apenas livros de velhos autores, que eram baratos e acessíveis. Novos escritores iriam morrer de fome e, com isso, ninguém mais iria querer escrever.
Observe que há um padrão nisso tudo. Cada nova tecnologia que é inventada e que se torna lucrativa faz com que as pessoas gritem e lamentem as dificuldades de seus atuais produtores. Mas aí ocorre o imprevisto: com o tempo, este setor que todos imaginavam em apuros começa a prosperar como nunca antes, só que de maneiras que ninguém realmente esperava.
O grande segredo da economia de mercado é que ela agrega uma tendência de longo prazo: caso os métodos de produção e distribuição não sejam continuamente alterados, todos os lucros serão dissipados. É assim que a concorrência funciona. É assim que a concorrência não apenas inspira o aperfeiçoamento, como também faz com que ele seja inevitável. E este é um dos motivos por que vários capitalistas odeiam o capitalismo.
O processo funciona assim: uma nova invenção surge no mercado e começa a auferir altos lucros. Ato contínuo, os imitadores se dão conta desta nova invenção e começam a fazer o mesmo, só que de forma melhor e mais barata, acabando com o status monopolista do primeiro produtor. Imitadores geram novos imitadores, dando continuidade ao processo. No final, os lucros tendem a zero. E aí algo ainda melhor tem de ser inventado para atrair novos empreendimentos e permitir novos lucros. Isso, por sua vez, irá estimular novos imitadores, reiniciando todo o processo.
Nunca consegui entender por que esquerdistas reclamam de os lucros irem para os capitalistas. Em uma economia de mercado vibrante, lucros são a exceção temporária à regra. Eles são conseguidos somente pelas empresas mais inovadoras e eficientes, aquelas que servem com mais eficácia aos consumidores. Os ganhos nunca são permanentes. Tão logo a empresa perca sua vanguarda, os lucros empreendedoriais desaparecem.
Sob a concorrência gerada pelo livre mercado, escreveu Ludwig von Mises, a trajetória dos modelos de produção e distribuição vigentes sempre tende a reduzir os lucros a zero. Para aqueles que querem se manter lucrativos, descanso e relaxamento são atitudes proibidas. Manter-se original e aprimorado é uma exigência diária. É necessário um incessante esforço para descobrir como servir aos consumidores de maneiras que são cada vez mais excelentes.
É por isso que as grandes empresas estão sempre correndo para o colo do governo, pedindo proteção. Acabem com esta nova tecnologia! Parem as importações! Aumentem os custos para a concorrência! Criem mais regulamentações! Concedam-nos uma patente para que possamos derrotar os outros caras! Imponham novas leis antitruste! Protejam-me com direitos autorais! Intensifiquem as regulamentações e aumente a burocracia até tirar os novos do mercado! Socorram-nos com pacotes de estímulo!
Além de tudo isso, sempre há o temor público em relação ao novo. Caso contrário, as pessoas de maneira alguma seriam persuadidas por todos estes protestos rotineiramente feitos por empresários já estabelecidos. Afinal, eles protestam exclusivamente em causa própria.
E eis aí um fato notável sobre a mente humana: temos grandes dificuldades em imaginar soluções que ainda têm de ser apresentadas. Não importa o quão recorrentemente o mercado se mostre capaz de solucionar problemas aparentemente incuráveis; ainda assim não conseguimos nos acostumar a esta realidade. Nossa mente raciocina em termos das condições existentes, o que nos faz prever todos os tipos de catástrofes. Com incrível frequência somos incapazes de consistentemente esperar pelo inesperável.
Isto gera um sério problema para a economia de mercado, que nada mais é do que a capacidade do sistema de inspirar a descoberta de novas ideias e novas soluções para os problemas vigentes. Os problemas trazidos pela mudança são suficientemente óbvios; mas as soluções são de "conteúdo aberto" e surgem de lugares, pessoas e instituições que não podem ser vistas ou previstas com antecedência.
O capitalismo não é para os fracos e preguiçosos que não querem se aprimorar continuamente. Se você quer um arranjo que privilegie o lucro de alguns poucos em detrimento da prosperidade e da abundância para todos, então o socialismo e o fascismo realmente são sistemas preferíveis.
As pressões para se interromper o progresso gerado pelo mercado não funcionarão no longo prazo, é claro. A tecnologia, com o tempo, conseguirá derrubar as forças que se opõem ao progresso. Os mercantilistas podem apenas postergar este processo, mas jamais conseguirão suprimir a incontrolável ânsia humana por uma vida melhor.
Jeffrey Tucker
é o presidente da Laissez-Faire Books e consultor editorial do mises.org. É também autor dos livros It's a Jetsons World: Private Miracles and Public Crimes e Bourbon for Breakfast: Living Outside the Statist Quo
E O RELATÓRIO DE LEWANDOVSKI?
Faltam 7 dias úteis para ele entregar o relatório como revisor do processo do Mensalão. Isto de acordo com o prazo que ele mesmo inventou, o de que entregaria no primeiro semestre. Vale recordar que ele recebeu o processo do relator (Joaquim Barbosa) em dezembro do ano passado.
Examinando a folha de pagamento de março de 2012 (disponibilizada no site do STF) é possível contar entre os assessores diretos do ministro cerca de 50 funcionários, entre efetivos, cedidos ao STF e terceirizados.
São:
1. recepcionista: 5;
2. seguranças: 3;
3. analista judiciário: 17;
4. técnico em secretariado: 3;
5. técnico judiciário: 4;
6. assistente administrativo:1;
7. procurador federal: 1;
8. assistente administrativo:1;
9. chefe de gabinete: 1
A lista não está completa. É possível deduzir que não é por falta de funcionário que o relatório não foi entregue até hoje.Por: Marco Antonio Villa
FARSA HISTÓRICA
A foto que incomodou Luiza Erundina e chocou o país, do ex-presidente Lula ao lado de Paulo Maluf para fechar um acordo político de apoio ao candidato petista à Prefeitura paulistana (o nome dele pouco importa a essa altura) é simbólica de um momento muito especial da infalibilidade política de Lula.
Sua obsessão pela vitória em São Paulo é tamanha que ele não está mais evitando riscos de contaminação como o que está assumindo com o malufismo, certo de que tudo pode para manter ou ampliar o seu poder político.
O choque causado por esse movimento radical pouco importará se a vitória vier em outubro. Mas se sobrevier uma derrota, a foto nos jardins da mansão daquele que não pode sair do país por que está na lista dos mais procurados pela Interpol será a marca da decadência política de Lula, que estará então encerrando um largo ciclo político em que foi considerado insuperável na estratégia eleitoral.
Até o momento, as alianças políticas com Maluf eram feitas por baixo dos panos, de maneira envergonhada, como a negociação em que o PSDB paulista fechava um acordo com o PP em busca de seu 1m30s de tempo de propaganda eleitoral.
A própria Erundina disse, candidamente, que o que a incomodara foi o excesso de exposição do acordo partidário.
Maluf, do seu ponto de vista, agiu com a esperteza que sempre o caracterizou, mas com requintes de crueldade.
Ao exigir que Lula fosse à sua casa para selar o acordo, e chamar a imprensa para registrar o momento glorioso para ele e infame para grande parte dos petistas, ele estava se aproveitando da fragilidade momentânea do PT, que tem um candidato desconhecido que precisa ser exposto ao eleitorado para tentar se eleger.
Lula, como se esse fosse o último reduto eleitoral que lhe falta controlar, está fazendo qualquer negócio para viabilizar a candidatura que inventou.
Já se entregara ao PSD do prefeito Gilberto Kassab, provocando um racha no PT talvez tão grande quanto o de agora, e acabou levando uma rasteira que já prenunciava que talvez o rei estivesse nu.
Agora, quem lhe deu a rasteira foi uma dupla irreconciliável, que Lula tentou colocar no mesmo saco sem nem ao menos ter se dado ao trabalho de conversar antes: Luiza Erundina, que um dia foi afastada do PT por ter aceitado um ministério no governo de coalizão nacional de Itamar Franco, agora se afasta do PT malufista.
E Maluf, que vinha minguando como força política, viu a possibilidade de recuperar a importância estratégica em São Paulo no pouco mais de um minuto de televisão que o PP detém por força de lei.
A sucessão de erros políticos que Lula parece vir cometendo nos últimos meses – a escolha de Haddad, o encontro com Gilmar Mendes, a CPI do Cachoeira, o acordo com Maluf – só será superada se acontecer o que hoje parece improvável, uma vitória de Fernando Haddad.
No resto do país, o PT está submetendo os aliados a seus interesses paulistas, fazendo acordos diversos para garantir em São Paulo uma aliança viável.
A foto de Lula confraternizando com Maluf tem mais um aspecto terrível para a biografia do ex-presidente: ela explicita uma maneira de fazer política que não tem barreiras morais e contagiou toda a política partidária, deteriorando o que já era podre.
As alianças políticas entre Lula, José Sarney, Fernando Collor e Maluf colocam no mesmo barco políticos que já estiveram em posições antagônicas fazendo a História do Brasil, e hoje fazem uma farsa histórica.
Em 1989, José Sarney era presidente da República depois de ter enfrentado Paulo Maluf no PDS. Ante uma previsível vitória do grupo de Maluf derrotando o de Mario Andreazza, Sarney rompeu com partido que presidia, ajudou a fundar a Frente Liberal (PFL) e foi vice de chapa de Tancredo.
Na campanha presidencial da sucessão de Sarney, Lula disse o seguinte dos hoje aliados Sarney e Maluf: "A Nova República é pior do que a velha, porque antigamente era o militar que vinha na TV e falava, e hoje o militar não precisa mais falar porque o Sarney fala pelos militares e os militares falam pelo Sarney. Nós sabemos que antigamente se dizia que o Adhemar de Barros era ladrão, que o Maluf era ladrão. Pois bem: Adhemar de Barros e Maluf poderiam ser ladrão (sic), mas eles são trombadinhas perto do grande ladrão que é o governante da Nova República, perto dos assaltos que se faz".
Na mesma campanha, Collor não deixou por menos: chamou o então presidente Sarney de "corrupto, incompetente e safado".
Durante a campanha das Diretas Já Lula se referiu assim a Maluf: "O símbolo da pouca-vergonha nacional está dizendo que quer ser presidente da República. Daremos a nossa própria vida para impedir que Paulo Maluf seja presidente".
Maluf e Collor tinham a mesma opinião sobre o PT até recentemente. Em 2005, quando Maluf foi preso e Lula festejou, e recebeu a seguinte resposta: “(..) se ele quiser realmente começar a prender os culpados comece por Brasília. Tenho certeza de que o número de presos dá a volta no quarteirão, e a maioria é do partido dele, do PT".
Já em 2006, em plena campanha presidencial marcada pelo mensalão, Collor disse que foi vítima de um "golpe parlamentar", do qual teriam participado José Genoino e José Dirceu,"enterrados até o pescoço no maior assalto aos cofres públicos já praticado nessa nação".
E garantiu: "Quadrilha quem montou foi ele (Lula)", citando ainda Luiz Gushiken, Antonio Palocci, Paulo Okamotto, Duda Mendonça, Jorge Mattoso e Fábio Luiz Lula da Silva, o filho do presidente.
São muitas histórias e muita História para serem esquecidas simplesmente por que Lula assim decidiu.Por: Merval Pereira
terça-feira, 19 de junho de 2012
ALÍVIO E ESPERANÇA
Em meio à grande crise contemporânea, há também os momentos de alívio e mesmo de renovada esperança em um futuro melhor. São janelas de oportunidade neste conturbado macroambiente econômico. O momento de alívio vem do resultado das eleições gregas deste domingo. E o olhar de esperança vem do surgimento de um novo bloco regional de enorme importância para a América Latina.
O mundo estava de olho nas urnas gregas. A derrota dos radicais de esquerda dá novo fôlego à moeda continental. Prossegue o quiproquó do auxílio financeiro europeu pela reforma das finanças públicas gregas. Os eleitores perceberam que a opção entre “austeridade” (euro) e “crescimento” (dracma) é um falso dilema. Mas é triste saber que a juventude europeia continua entregue às mãos dessa mesma classe política cujas demagogia e irresponsabilidade financeira tanto a infelicitaram com o desemprego em massa. Conservadores na Grécia e socialistas na França, demagogos e obsoletos, continuam no comando. Apenas se atenuam os temores de contágio e precipitação de uma crise bancária continental que pudesse desembocar na decomposição da zona do euro.
A derrota dos radicais de esquerda dá novo fôlego à moeda continental
Sem o mesmo destaque dos eventos no Velho Mundo, surge a Aliança do Pacífico, um novo bloco regional anunciado por México, Colômbia, Peru e Chile, com a adesão prevista de Panamá e Costa Rica ainda no segundo semestre de 2012. O Acordo de Antofagasta, com 215 milhões de consumidores, 35% do produto interno bruto e 55% das exportações da América Latina, prescreve a livre circulação de mão de obra, de capitais, de bens e serviços, além da integração de redes educacionais, um sinal da extraordinária importância atribuída à formação de capital humano para o futuro da região.
As regras de acesso ao novo bloco revelam aspirações de construir uma rede típica da Grande Sociedade Aberta: é preciso ser uma democracia, com estabilidade jurídica e constitucional, e aderir ao livre comércio com todos os sócios. Democracia e mercados, a síntese da moderna civilização ocidental, como exigências para integrar um bloco latino-americano! Enquanto isso, atolam os integrantes do Mercosul – Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai -, em meio a disputas tarifárias e escaramuças comerciais, e afundam os países do socialismo bolivariano – Venezuela, Equador e Bolívia -, por suas sempre bem-intencionadas, porém desastrosas, práticas populistas. Por: Paulo Guedes
Fonte: O Globo, 18/06/2012
COMO SERIA A PRODUÇÃO DE DINHEIRO NO LIVRE MERCADO
Em um artigo seminal publicado em 1920, "O cálculo econômico sob o socialismo", Ludwig von Mises demonstrou que existe apenas uma única maneira de se saber se a produção de algo gera um benefício para a sociedade como um todo: os recursos, quando utilizados para produzir um bem que satisfaça as preferências de algumas pessoas, têm de ter um valor maior do que quando utilizados para produzir um outro bem que satisfaça as preferências de outras pessoas. Quando esta premissa é satisfeita, o produtor obtém lucros; quando ela não é observada, o produtor colhe prejuízos.
A produção deixada a cargo do mercado é a única que satisfaz o teste de lucros e prejuízos, o qual mostra se uma produção é socialmente benéfica ou não. Esta é a implicação do famoso argumento de Mises de que planejadores centrais não têm como utilizar de maneira eficaz e racional os recursos de uma sociedade.
Para que Tim Cook [atual presidente da Apple] possa obter chips computacionais, vidros para as telas de seus iPads, mão-de-obra e outros recursos para fabricar seus produtos, ele tem de oferecer preços que sejam altos o suficiente para conseguir retirar estes recursos de outros empreendedores que, caso contrário, teriam utilizado estes recursos para produzir outros bens. Ao incorrer nestes custos de produção, a Apple compensa os proprietários destes recursos em um montante maior do que o valor dos outros bens que eles poderiam ter produzido para satisfazer um outro grupo de consumidores. A Apple, então, utiliza estes recursos para produzir iPads, que são valorados muito favoravelmente por seus consumidores, como demonstrado pelo fato de que suas vendas geram receitas para a Apple mais do que suficiente para cobrir seus custos.
O teste de lucros e prejuízos se aplica a toda e qualquer produção feita no mercado, inclusive a mineração de ouro e a cunhagem de moedas. Uma empresas mineradora de ouro irá produzir sempre que as receitas da venda de seu produto exceder os custos da compra de fatores de produção necessários para produzir seu produto. Nesta situação, a empresa irá oferecer salários altos o suficiente para retirar mão-de-obra de outros setores da economia, bem como preços altos o suficiente para retirar equipamentos de mineração e outros recursos daquelas aplicações que os consumidores atualmente consideram menos valiosas, e irá direcionar esta mão-de-obra, estes equipamentos de mineração e estes outros recursos para o setor de mineração de ouro, o qual os consumidores consideram mais valioso.
Uma empresa que faz cunhagem de moedas de ouro irá produzir sempre que as receitas da venda de seus serviços de certificação de ouro forem maiores que os custos de compra de seus fatores de produção. A empresa irá igualmente retirar mão-de-obra, equipamentos de cunhagem, terra e outros recursos de aplicações que os consumidores atualmente consideram menos valiosas e direcioná-los para a cunhagem de moedas, atividade esta que os consumidores atualmente consideram mais valiosa.
Assim como a produção de todos os outros bens, a produção de dinheiro, quando deixada a cargo do mercado, é regulada pelo sistema de lucros e prejuízos. Uma quantidade adicional de dinheiro será produzida quando a demanda por dinheiro aumentar ou quando a demanda por outros bens produzidos com estes mesmos recursos diminuir. Se a demanda por dinheiro aumentar, o valor das moedas de ouro irá aumentar. Ato contínuo, as empresas de cunhagem de moedas irão aumentar a produção para capturar este lucro adicional. À medida que elas aumentassem oferta de serviços de certificação de ouro, o preço deste serviço iria diminuir; e à medida que sua demanda por recursos que possibilitam a certificação de ouro aumentasse, os preços destes recursos subiriam e os lucros seriam dissipados.
Se a demanda por outros bens diminuísse, os preços de seus fatores de produção diminuiriam. Empresas mineradoras de ouro iriam aproveitar esta queda nos preços dos fatores de produção para aumentar sua produção e, com isso, aumentar seus lucros. Ao fazerem isso, os lucros oriundos de uma produção adicional serão eliminados. Desta maneira, a produção de dinheiro no mercado sempre será socialmente ótima. Foi por isso que Mises disse que fazer com que a produção de dinheiro se desse de acordo com a lucratividade da atividade e não com politicagens não era um defeito do padrão-ouro; era a sua principal virtude.
O teste de lucros e prejuízos também se aplica à produção de substitutos monetários no mercado. Substitutos monetários — ou certificados de dinheiro — são títulos de propriedade sobre o dinheiro metálico. Eles são emitidos por bancos e servem como substitutos para o dinheiro-commodity. As pessoas podem considerar mais conveniente e seguro utilizar contas-correntes bancárias em vez de terem de carregar dinheiro metálico consigo quando forem transacionar. Neste caso, os bancos irão criar e manter contas-correntes para seus clientes caso eles estejam dispostos a pagar tarifas bancárias que gerem receitas suficientes para cobrir os custos da administração de tais contas. Se a demanda por contas-correntes aumentar, os bancos irão expandir sua oferta para capturar este lucro adicional. À medida que eles aumentarem sua oferta de serviços de conta-corrente, as tarifas irão diminuir. E à medida que eles aumentarem sua demanda por recursos necessários para a administração de contas-correntes, os preços destes recursos subirão. Como consequência, os lucros serão dissipados e a produção adicional deste serviço seria interrompida em um ponto socialmente ótimo.
O teste de lucros e prejuízos também se aplica à intermediação financeira. Bancos efetuam a função de intermediadores no mercado de crédito ao pegarem emprestado recursos de poupadores e emprestarem estes recursos a investidores. Bancos agrupam a poupança de seus clientes, verificam a solvência e o histórico de crédito de investidores, e assumem o risco de calotes. Se os clientes dos bancos considerarem tais serviços valiosos, então eles, ao emprestarem sua poupança aos bancos, estarão dispostos a aceitar taxas de juros menores do que aquelas que os investidores estarão dispostos a pagar aos bancos para obterem recursos emprestados.
Os bancos fornecerão serviços de intermediação financeira se as receitas obtidas com este diferencial de juros forem altas o bastante para cobrir os custos deste serviço. Se a demanda por estes serviços aumentar, os bancos irão aumentar sua produção. O aumento de sua demanda por poupança de poupadores irá aumentar os juros que eles estarão dispostos a pagar aos poupadores, e o aumento da oferta de poupança para investidores irá reduzir os juros que os bancos cobrarão deles. Haverá uma redução no diferencial de juros. O contínuo aumento desta demanda por recursos dos poupadores irá aumentar o preço pago por esta poupança até que finalmente os lucros sejam dissipados e a produção adicional deste serviço de intermediação seja interrompida no ponto socialmente ótimo.
Ao sujeitar toda a produção, inclusive a de dinheiro e de serviços bancários, ao teste de lucros e prejuízos, o mercado produz um sistema integrado de produção que economiza otimamente o uso de todos os recursos da sociedade como um todo.
Inflação monetária e expansão do crédito
Uma moeda elástica, que pode ser produzida a custos ínfimos e de acordo com conveniências políticas, rompe toda esta integração da produção no mercado, pois é um elemento alheio ao teste de lucros e prejuízos. Uma moeda elástica possui duas características: um banco central com autonomia de poder para emitir papel-moeda fiduciário e de curso forçado e bancos comerciais autorizados a emitir meios fiduciários.
A produção de papel-moeda fiduciário e de curso forçado não pode ser regulada pelo sistema de lucros e prejuízos. É e sempre será lucrativo produzir dinheiro de papel. O custo médio de produção de um cédula de dinheiro é de $0,091. Sendo assim, um lucro de aproximadamente $4,90 pode ser obtido com a simples impressão de uma cédula de $5. Se o banco central continuar ordenando a impressão de cédulas de dinheiro enquanto tal atividade for lucrativa, então, no final, os preços dos fatores de produção necessários para a produção irão subir a tal ponto que custaria mais de $5 imprimir uma cédula de $5. Consequentemente, o banco central ordenaria a impressão de cédulas de $20, depois de $50 e daí por diante, indefinidamente, exatamente como vimos em hiperinflações como as do Zimbábue recentemente, da Alemanha da década de 1920, da Hungria da década de 1940 e do Brasil nos anos 1980 e 1990. Para evitar a destruição da hiperinflação, a produção de papel-moeda fiduciário e de curso forçado tem de ser regulada por políticas, adotando-se regras que serão inevitavelmente arbitrárias com relação ao uso de recursos escassos da sociedade como um todo.
Da mesma maneira, a produção de meios fiduciários não pode ser regulada pelo sistema de lucros e prejuízos. Meios fiduciários são títulos de restituição em dinheiro lastreados apenas fracionadamente por uma reserva de dinheiro. São depósitos bancários que podem ser utilizados como meios de pagamento e que não estão lastreados por dinheiro padrão, seja esse dinheiro alguma commodity como ouro ou simplesmente cédulas de papel-moeda. Ou seja, trata-se da moeda escritural que não tem nenhuma reserva lastreando-a, pois foi criada do nada pelo sistema bancário. Os bancos criam meios fiduciários ao criarem empréstimos. Por exemplo, um cliente vai ao seu banco e pede um empréstimo de $40.000 para a compra de um automóvel. Se o banco concordar em conceder o empréstimo, ele simplesmente cria um saldo de $40.000 na conta-corrente deste cliente. Tal empréstimo irá gerar uma receita de juros para o banco ao mesmo tempo em que o custo de criação de meios fiduciários é simbólico. Sempre será lucrativo para um banco criar outro empréstimo emitindo mais meios fiduciários. Se, por ser esta uma atividade lucrativa, um banco continuar emitindo meios fiduciários por meio da criação de mais crédito, ele tenderá a se tornar ilíquido e insolvente, pois haverá uma grande demanda pela restituição destes meios fiduciários em dinheiro padrão. Haverá uma corrida bancária e o banco entrará em falência. Para evitar tal destruição, um banco tem de regular sua emissão de meios fiduciários por meio de políticas e regras que serão inevitavelmente arbitrárias com relação ao uso de recursos escassos da sociedade como um todo.
Os defensores de uma moeda elástica sabem que sua produção não pode ser submetido ao, e muito menos ser aprovada pelo, sistema de lucros e prejuízos. Como disse F.A. Hayek,
Não há nenhuma justificativa histórica para a atual posição do governo como monopolista da criação de dinheiro. Jamais foi proposto, muito menos provado, que o governo pode nos fornecer um dinheiro de melhor qualidade do que o livre mercado.
Defensores de uma moeda elástica meramente alegam que tal arranjo monetário pode alcançar um resultado mais desejável do que aquele gerado por um sistema de dinheiro-commodity. A história, porém, mostra o contrário. Desde a abolição completa da moeda-commodity e massificação do papel-moeda fiduciário de curso forçado, não apenas a inflação de preços se tornou contínua e constante, como também os ciclos econômicos se tornaram mais profundos e prolongados.
Conclusão
Ninguém pode descrever hoje como seria a configuração de um sistema monetário criado por empreendedores operando livremente no mercado, assim como ninguém poderia prever, em 1900, como seria o desenvolvimento da indústria automotiva do século XXI, ou prever, em 1950, como seria a indústria de eletrônicos no século XXI. O que podemos saber de antemão é que a produção de dinheiro seria regulada pelo sistema de lucros e prejuízos e que, portanto, ela resultaria na satisfação das preferências dos consumidores, seus usuários. A inflação monetária e a expansão artificial do crédito, características constantes e deletérias de nosso vigente sistema monetário elástico, seriam eliminadas e, com elas, os ciclos econômicos que se tornaram uma calamidade em nosso mundo atual.
Jeffrey Herbener é professor de economia no Grove City College.
Tradução de Leandro Roque.
REQUINTES DE CRUELDADE
Fazer com que Lula fosse visitá-lo em sua casa para selar publicamente o acordo político de apoio à candidatura de Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo é o ponto de destaque, com requintes de crueldade, dessa aliança, que de inusitada não tem nada, a não ser a marcha batida do PT para escancarar seu pragmatismo à medida que Lula se sente acima do bem e do mal, podendo fazer qualquer coisa para vencer eleições.
Em 2004 Maluf já apoiara Marta Suplicy no segundo turno contra Serra, mas naquela ocasião ele disse que o fazia sem ter tido contato nem com Lula nem com Marta, reafirmando suas divergências com o PT.
Desta vez foi diferente. Além de ganhar para um indicado seu uma secretaria do Ministério das Cidades, um Maluf radiante recebeu Lula e Haddad em sua casa, destacando o “sacrifício” que o ex-presidente fizera indo até lá, apesar das cautelas médicas devido à sua recuperação da cirurgia de câncer.
Pelo menos o conselho de evitar falar em público ajudou Lula a sair de cena sem ter que justificar tal aliança.
A senadora Marta Suplicy, que aceitara de bom grado o apoio envergonhado de Maluf em 2004, hoje, rejeitada por ser uma alternativa política “velha”, de acordo com Lula, diz que a aliança com Maluf é “pesadelo” maior do que a com o prefeito Gilberto Kassab, que ela também rejeitara.
O maior problema, porém, para a candidatura petista é a reação da candidata a vice Luiza Erundina, que de incomodada com o pragmatismo petista, mas engolindo a seco a aliança, passou a rejeitá-la publicamente, convencida de que ela não será apenas uma união política “para constar”, diante da pose de Lula carrancudo com Maluf sorridente, tendo o “rapaz esforçado” Fernando Haddad no centro.
O acordo político com Maluf conseguiu ofuscar a boa notícia que a nova pesquisa Datafolha trouxe para a campanha petista.
Ter quase triplicado o apoio depois de algumas aparições ao lado de Lula e da presidente Dilma na televisão indicava que Haddad pode ter a esperança de vir a ser adotado pelo eleitorado petista conforme a campanha progredir, o que lhe daria um patamar mínimo de 30% dos votos para competir com o tucano José Serra.
Mas aliança tão formal e explícita com o grupo de Maluf está reforçando as críticas do grupo de Marta Suplicy dentro do PT e abriu uma divergência séria no PSB, que pelo visto terá que buscar outro candidato a vice para Haddad.
A ex-prefeita Luiza Erundina não parece ser do tipo que abre mão de suas convicções, mesmo que sejam ultrapassadas como o socialismo que ainda prega.
Sua presença na chapa petista levava a candidatura Haddad mais para a esquerda do que seria desejável numa capital que tem a tradição de votar ao centro, quando não à direita.
O próximo ataque especulativo de Lula será em cima do PMDB se a candidatura do deputado federal Gabriel Chalita permanecer estacionada abaixo dos dois dígitos e menor do que a de Haddad.
O PMDB queria usar a disputa paulistana para vender caro seu apoio ao PT nem segundo turno, ou até mesmo ter Chalita como o candidato oficial num segundo turno contra Serra.
Tudo para neutralizar o ataque que o PSB vem orquestrando, com o objetivo de tomar o seu lugar como principal partido da base aliada, abrindo caminho para o governador Eduardo Campos ser o vice de Dilma em 2014.
Ou, conforme os ventos da economia, surgir como uma altrernativa ao próprio PT.
O maior receio do PMDB é que, após a eleição, o PSB se una ao PSD de Kassab para formar o maior partido no Congresso.
Isso só não acontecerá, aliás, se o tucano José Serra vencer a eleição paulistana, o que coloca mais um pouco de incoerência nessa armação partidária onde ninguém é de ninguém e todo mundo é de todo mundo, dependendo da ocasião.
O PSD de Kassab iria para a aliança de Haddad se Serra não fosse o candidato tucano, e Maluf iria para a base serrista se o PSDB aceitasse pagar o alto preço que o PT pagou.
Esse imbróglio paulistano não é, no entanto, o único empecilho à aliança do PT com o PSB, que está se organizando nacionalmente para se colocar como protagonista na cena política em 2014.
Assim como a disputa pela Prefeitura em São Paulo está intimamente ligada à sucessão presidencial de 2014, com os dois partidos querendo fortalecer suas posições no maior colégio eleitoral do país, algumas outras capitais também definem agora disputas políticas que serão fundamentais para a campanha à reeleição da presidente Dilma e para o PSDB.
Em Fortaleza e Recife PT e PSB não conseguiram se entender até o momento, e tudo indica que sairão separados na disputa regional.
Em Salvador, ACM Neto do DEM, com o apoio do PSDB, pode fazer ressurgir a força carlista na capital baiana.
Em Manaus, uma aliança entre Amazonino Mendes e Arthur Virgilio pode dar ao ex-senador tucano as condições políticas para disputar a Prefeitura de Manaus, o que está preocupando a base aliada governista, à frente o ex-governador Eduardo Braga.
Líder do governo no Senado em substituição ao eterno líder de qualquer governo Romero Jucá, Braga vem sofrendo ataques do grupo de senadores como Sarney, Calheiros e o próprio Jucá, que aparentemente a Presidente Dilma quer ver fora do centro de decisões.
Se tiver que concorrer a Prefeito para unir a base governista contra a oposição, Braga corre o risco de perder o cargo no Senado, embora considere que pode acumular a candidatura com a liderança do governo.
Além do jogo de poder visando a eleição presidencial, há ainda em disputa as presidências da Câmara e do Senado.
O grupo do senador Sarney quer manter o controle do Senado mesmo depois que ele sair, e dois nomes aparecem na disputa no PMDB, a maior bancada: Edison Lobão e Renan Calheiros, o que aparentemente não agrada Dilma, que gostaria de um nome novo de sua confiança.
Na Câmara, a vez seria do PMDB, mas o candidato preferencial do partido, o líder Henrique Eduardo Alves desgastou-se com a presidente Dilma.
Um eventual acordo em São Paulo pode colocar em discussão a sucessão na Câmara, e o vice-presidente Michel Temer deverá ser o fiador.
Como se vê, há muito mais do que política municipal em disputa nas próximas eleições.
RPor: Merval pereira
RIO + 20: SALVEM AS FLORESTAS TEMPERADAS
Mais uma vez no Rio+20 iremos ouvir o brado da devastação da Amazônia, e ninguém vai sair protestando contra o desmatamento quase total das Florestas Temperadas.
Por que ninguém exige o reflorestamento do Mid-West Americano e da Europa?
Por que os brasileiros gastam 95% do seu tempo contra o desmantamento da Amazônia e nada protestam contra o desmatamento das Florestas Temperadas?
Em 2003, escrevi o artigo abaixo na Veja: Salvem as Florestas Temperadas, e a repercussão foi quase nula.
Não fui convidado para nenhuma das 54 Conferências sobre Ecologia realizadas no Brasil de lá para cá, ninguém achou este tema importante suficiente para se discutir.
Eis o artigo de 2003, que infelizmente continua válido.
No filme A Bruxa de Blair, sucesso de bilheteria do cinema alternativo americano, há uma cena que fez meu sangue de ecologista amador brasileiro e defensor do crescimento sustentável literalmente borbulhar.
Os três estudantes do longa estão totalmente perdidos numa floresta da Nova Inglaterra e a garota começa a entrar em pânico achando que nunca mais sairia daquela selva.
Seu colega então diz algo parecido com:
"Não seja idiota, nós destruímos todas as nossas florestas temperadas.
É só andarmos mais meia hora em linha reta que logo sairemos daqui".
Ecologistas do mundo todo vivem fazendo protestos para preservar a floresta tropical brasileira, mas raramente param para refletir sobre essa corajosa crítica contida nesse filme, que fez tanto sucesso.
Se alguém se perder na Floresta Amazônica, poderá ter de andar por noventa dias até achar uma saída, tal o nível de preservação de nossa Amazônia, comparada com as demais florestas.
Então, não seria correto também discutir a reconstituição das florestas temperadas, há muito tempo dizimadas?
Na Europa e nos Estados Unidos, boa parte das florestas foram destruídas.
O "Crescente Fértil" descrito na Bíblia é hoje o Iraque da "Desert Storm".
Em contrapartida, 86% da Floresta Amazônica continua intacta.
No famoso Museu Smithsonian de Washington, vi um painel que orgulhosamente mostrava um pioneiro derrubando uma árvore para criar uma área arável e poder "suprir nossos antepassados com a comida necessária".
Texto deles.
Destruíram tantas florestas temperadas para plantar comida que hoje eles têm muito mais agricultores do que o necessário, a maioria economicamente inviável.
Com a produtividade atual da agricultura, bastaria cultivar as planícies naturais que todos os países já possuem.
A destruição das florestas temperadas é uma das razões dos maciços subsídios que a Europa e os Estados Unidos dão à agricultura, razão de nossos protestos junto à OMC.
Quando negociadores do governo brasileiro reclamam desses subsídios, a resposta é que eles são necessários para manter a população no campo.
Caso contrário, os países teriam enormes espaços e terras vazias, com todo mundo vivendo nas cidades.
O erro dessa lógica política está na frase "espaços e terras vazias", uma vez que essas terras não eram "vazias" antes de as florestas temperadas serem dizimadas.
Há muito deveríamos ter colocado na agenda mundial a necessidade da reconstituição das florestas temperadas ao lado da preservação da Floresta Amazônica - o que exigiria dos países desenvolvidos a lenta substituição dos agricultores subsidiados por guardas e bombeiros florestais em constante vigilância.
Pelo menos os agricultores passariam a ser úteis, em vez de receber subsídios para nada plantarem.
Os espaços não ficariam vazios, como temem os políticos desses países. Voltariam ao equilíbrio original.
Isso teria importantes consequências econômicas para o Terceiro Mundo.
Acabaria com os enormes subsídios agrícolas e equilibraria a balança comercial de muito país em desenvolvimento.
Bjorn Lomborg, autor do The Skeptical Environmentalist, escreve na página 117 uma frase de muita coragem política:
"Que base nós (Primeiro Mundo) temos para nos indignarmos com o desmatamento das florestas tropicais, considerando o nosso desmatamento na Europa e Estados Unidos?
É uma hipocrisia aceitar que nós nos beneficiamos imensamente da destruição de enormes áreas de nossas próprias florestas mas não vamos permitir que países em desenvolvimento se beneficiem como nós o fizemos.
Se não quisermos que eles usem seus recursos naturais do jeito que nós usamos os nossos, devemos compensá-los de acordo".
Obviamente, ele foi massacrado, e por muitos brasileiros.
Da próxima vez que um amigo, um jornalista ou um diplomata estrangeiro lhe indagar sobre o que estamos fazendo com nossa Floresta Amazônica, antes de responder, pergunte-lhe o que ele está fazendo para reconstituir 85% de suas florestas temperadas.
Stephen Kanitz é administrador por Harvard (www.kanitz.com.br)
Revista Veja, Editora Abril, edição 1823, ano 36, nº 40 de 8 de outubro de 2003, página 22
segunda-feira, 18 de junho de 2012
ALARMISMO SUSTENTÁVEL
Os ambientalistas estão em polvorosa com o evento Rio+20, que consumiu milhões em gastos públicos e mobilizou inúmeras ONGs, além da grande imprensa. Seu tema ganhou a ordem do dia, e o foco de quase todos se voltou na direção dos mais alarmistas. O linguajar escatológico e as profecias apocalípticas viraram destaque no mundo todo. É o auge do ecoterrorismo.
O pânico vende bem. Oportunistas sempre souberam explorar a “pulsão de morte” presente em todos nós, segundo Freud. O livro sobre o Apocalipse na Bíblia sempre conquistou milhões de pessoas, todos aguardando ansiosamente pelo “juízo final”. Profetas sempre encontraram demanda para suas profecias catastróficas. Nostradamus fez sucesso em sua época e até hoje faz. Malthus virou praticamente guru de seita, com diversos seguidores prevendo a próxima desgraça iminente. O fim do mundo assusta, mas fascina.
Claro que o assunto ambientalismo não ficaria de fora disso. Ao contrário: ele é um prato cheio para tais oportunistas. Afinal, o clima é um fenômeno complexo, sob a influência de infinitas variáveis e, portanto, imprevisível em certo ponto. Além disso, os leigos são totalmente ignorantes sobre o seu funcionamento. Nada melhor para embalar com a roupagem científica as previsões sem base alguma. O alarmismo seduz.
Para adicionar insulto à injúria, os socialistas ficaram órfãos após a queda do Muro de Berlim e do império soviético, sem uma ideologia para atacar o capitalismo. Encontraram o refúgio perfeito no ecoterrorismo. Podem culpar o capitalismo por seu sucesso, por criar riqueza demais, colocando o planeta em risco. Alegam que o padrão de consumo dos americanos necessitaria de outros cinco planetas Terra. Muitos ambientalistas viraram “melancias”: verdes por fora, mas vermelhos por dentro.
A palavra do momento passou a ser sustentabilidade. Um termo lindo, sem dúvida, mas que teve seu sentido completamente obliterado pelos oportunistas, assim como vários outros, como liberdade, cidadania, progresso ou justiça. Ninguém pode ser contra um desenvolvimento sustentável. A questão é saber como obter esta meta. Os ambientalistas, tais como os esquerdistas em geral, simplesmente monopolizaram o fim nobre, evadindo-se do debate sobre o melhor meio para alcançá-lo.
A afirmação de que os recursos naturais são finitos e estão se esgotando, por exemplo, ignora os avanços tecnológicos que permitem o uso bem mais eficiente destes recursos. Edwin Drake fez a primeira perfuração bem sucedida na Pensilvânia em 1859, achando petróleo. Poucos anos depois, já existiam especialistas alertando que a capacidade do “ouro negro” estava chegando perto do fim. O Clube de Roma, o mesmo que hoje faz alertas catastróficos, previu na década de 1970 que havia poucos anos de sobrevida para os principais recursos naturais.
A sorte dos alarmistas é que as pessoas têm memória curta. Aprendemos com a história que poucos aprendem com a história. As revistas especializadas da década de 1970 estampavam nas capas alertas sobre o esfriamento global iminente. Uma nova era do gelo estaria logo ali na frente. Depois, o aquecimento global passou a ser o maior risco de todos, com direito a muita histeria e paranoia. Hoje já falam em “mudanças climáticas”, termo vago que serve em qualquer ocasião.
Mas voltando ao ponto crucial da sustentabilidade, faz-se necessário debater os mecanismos mais adequados para garantir o futuro do progresso. E estes mecanismos passam longe das propostas pregadas pelos ambientalistas típicos. Não é abraçando a pobreza que vamos preservar o planeta, que, aliás, está aí para nos servir, ao contrário do que pensam os mais radicais que transformaram a natureza em uma deusa e o ambientalismo em seita religiosa. Para estes, o homem é a praga que deve ser eliminada pelo bem da “mãe” natureza (se tivessem que enfrentar o “inferno verde” de verdade, chamariam de madrasta natureza).
Tampouco é incutindo pânico nas crianças e ensinando a fechar o chuveiro durante o banho que vamos atacar o problema. O uso de sacolas ecologicamente corretas e das bicicletas pode até causar a sensação de superioridade moral nos ecochatos, assim como os alimentos orgânicos, mas não vão resolver nada de concreto.
E como obter então a desejada sustentabilidade? Ora, com mais capitalismo! O direito de propriedade privada é o melhor mecanismo de incentivo ao uso racional dos recursos. Vide as empresas privadas investindo para preservar sua lucratividade e seus ativos no longo prazo, enquanto estatais acabam utilizadas para fins eleitoreiros de curto prazo. O avanço tecnológico, fruto do capitalismo, pode fazer milagres também. O carvão queimado na China é bem mais poluente que as fontes de energia de países mais ricos.
O homem sempre transformou a natureza, e assim deve continuar fazendo. Produzir mais usando menos insumos é a marca registrada do capitalismo. É disso que o planeta precisa! Os recursos são finitos desde sempre e, no entanto, hoje eles são suficientes para preservar a vida de 7 bilhões de seres humanos, enquanto na Idade Média este número não chegava a décima parte. O que mudou? O advento do capitalismo e seu choque de produtividade. Se dependesse dos malthusianos da época, literalmente bilhões de pessoas não existiriam hoje (talvez isso seja visto com bons olhos pelos misantropos que preferem as árvores aos homens).
A retórica ambientalista, repleta de alarmismo infundado, precisa ser rechaçada em prol do progresso e da vida de bilhões de pessoas. Isso não quer dizer que devemos simplesmente ignorar questões como poluição ou sustentabilidade, mas sim que o caminho para estes objetivos são muitas vezes contrários ao que pregam os “verdes”. O ambientalismo cada vez mais assume cores autoritárias, de planejamento central com excesso de poder concentrado no estado em nome do “bem geral”. É a nova cor do totalitarismo.
O capitalismo liberal é o grande vilão deste movimento. Se o ecoterrorismo vencer esta batalha de ideias – e esse tem sido o caso até agora –, então a verdadeira sustentabilidade estará em perigo. Infelizmente, profetas do apocalipse sempre conseguiram amplas plateias para suas previsões, por mais erradas que tenham se mostrado no passado. Se há uma coisa que é realmente sustentável, é o alarmismo dos oportunistas. Como é difícil combater esta praga usando somente a razão! Por: Rodrigo Constantino
RIO + 20 = 0
Às vésperas da conferência Rio-92, 20 anos atrás, o secretário-geral da Cúpula da Terra, Maurice Strong, afirmou: “Esta é a nossa última chance de salvar o planeta”. Agora, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, avisa que a Rio+20 é a “única oportunidade” de garantir um futuro sustentável. Do jeito como as coisas vão, a Rio+40 será a última oportunidade de salvar o mundo dos ecoburocratas, que estão cada vez mais contagiosos e letais.
Os negociadores dos mais de 130 países que estarão representados na conferência estão preocupados. Vários deles já disseram que a grande questão a decidir na Rio+20 é quem financiará o desenvolvimento sustentável, com quanto dinheiro. E que não há acordo à vista sobre isso. Talvez seja necessário responder a outra questão antes dessa: quem nos salvará dessas festas ecológicas milionárias que não decidem nada? Quem dará um basta nesses banquetes insustentáveis que discutem sustentabilidade?
Quem dará um basta nesses banquetes insustentáveis que discutem sustentabilidade?
Ninguém segura a patrulha da bondade e seu alegre circo do apocalipse. No picadeiro da salvação sempre cabe mais um. É aquela oportunidade valiosa para os ativistas de si mesmos descolaremmais um flash por um mundo melhor. O oportunismo é verde. Cientistas políticos gritam que o tempo está se esgotando, artistas buscam sofregamente algum bordão conceitual, mesmo que se atrapalhem um pouquinho – como na célebre frase de uma cantora de MPB em momento ético: “O problema do Brasil é a falta de impunidade”.
Enquanto a feira de lugares-comuns e o show de autoajuda planetária evoluem na avenida, o mundo piora. A crise nascida na Europa veio mostrar que a farra estatal é boa, mas um dia a conta chega. Com a licença dos ecologistas: pode ser a última chance de descobrir que não é o Estado que sustenta a sociedade, mas o contrário. E que não existe Estado forte com sociedade fraca. Pois é nesse momento de alerta contra os governos perdulários que se monta o colossal almoço grátis da Rio+20. Um banquete para discutir o desperdício. Haja sustentabilidade.
O que quer a faminta burocracia verde, com seus sábios fashion de bolinha vermelha na testa e seus relatórios sobre o fim do mundo? Quer a Bolsa Ecologia. Quer mais dinheiro do contribuinte para mais relatórios, mais comissões, mais mesadas para ONGs, mais conferências coloridas e animadas. Enquanto isso, a vida real vai muito bem, obrigado, para monstros como a usina hidrelétrica de Belo Monte – uma estupidez ecológica, uma aberração econômica e um monumento ao desperdício estatal. O custo cada vez mais insustentável da energia nuclear também não é problema para os abastados anfitriões da Rio+20, como prova a construção de Angra 3 – cujo lixo radioativo tem garantia até a Rio+2020. Passaporte para o futuro é isso aí.
Duas décadas de sustentabilidade conceitual não chatearam os vilões reais. Na Rio 92, foram assinadas as convenções de Biodiversidade e do Clima. A primeira instituiu o direito das populações tradicionais sobre o patrimônio genético de suas terras. Enquanto a biotecnologia progride, os povos da maior floresta tropical da Terra continuam a ver navios no Rio Amazonas. Os royalties que conhecem vêm do contrabando de madeira – porque infelizmente não podem se alimentar de convenções. A Convenção do Clima gerou o que se sabe: uma sucessão de protocolos sobre redução das emissões de gás carbônico. Cada um é mais severo que o anterior, devidamente descumprido. Com novos prazos de carência, as metas vão ficando mais ambiciosas, numa espécie de pacto com o nunca.
E aí está a patrulha da bondade em mais uma conferência planetária, reunindo os melhores especialistas internacionais em sustentabilidade e sexo dos anjos. Eles dirão que o mundo vai acabar e a culpa é sua. Mandarão você deixar seu carro na garagem e tomar banho rápido. Não falarão em controle populacional, porque isso é de direita. Eles são progressistas, sociais, amam cada um dos 7 bilhões de habitantes da Terra, que serão 10 bilhões até o fimd este século, todos muito bem-vindos.
O problema, claro, é do capitalismo individualista, cheio de egoístas que demoram no banho. Serão necessários muitos banquetes ecológicos para mudar essa mentalidade.
Fonte: revista Época Por: 18 de junho de 2012
Autor: Guilherme Fiuza
OS PERIGOS DO ENDIVIDAMENTO EXTERNO
Economistas e jornalistas frequentemente citam os perigos da dívida pública externa — em contraposição à dívida interna, que normalmente é considerada menos preocupante. O Japão é um bom exemplo. O país possui uma enorme dívida pública em relação ao PIB, de mais de 200%. Mas argumenta-se que esta enorme porcentagem não seria um problema porque os japoneses poupam muito e os títulos do governo japonês estão majoritariamente nas mãos de cidadãos japoneses. Seria, portanto, uma dívida essencialmente interna.
Em contrapartida, a Espanha, que possui uma relação dívida/PIB muito mais baixa (espera-se que ela atinja 80% ao final deste ano), é considerada muito mais instável pelos investidores. Um dos motivos apresentados para a fragilidade espanhola é que aproximadamente metade dos títulos do governo espanhol está nas mãos de estrangeiros.[1]
À primeira vista, é de se duvidar deste raciocínio. De fato, sendo eu um indivíduo que mora na Espanha, pouco me importa se o empréstimo que irei obter será de um amigo espanhol ou de um amigo alemão. Por que seria diferente para o governo espanhol? Por que se importar se os empréstimos virão de espanhóis ou de alemães?
Governos, em última instância, se baseiam na violência física ou na ameaça de violência física. O estado possui o monopólio da violência dentro de um determinado território. E é na violência que jaz a diferença. Uma dívida cujos títulos estejam em posse de cidadãos nacionais gera renda para estes cidadãos, os quais, por sua vez, são tributados pelo governo nacional, que possui o monopólio da violência. Isto significa que parte dos juros que o governo paga sobre a dívida interna volta para o governo por meio de impostos. Já os juros pagos sobre a dívida externa vão para o bolso de cidadãos estrangeiros, os quais são tributados pelos governos destes outros países. Sendo assim, o governo nacional nada ganha no final.
Mas há outro e ainda mais persuasivo motivo por que o monopólio da violência é importante: eu não posso forçar nem o meu amigo espanhol nem o meu amigo alemão a rolarem seu empréstimo para mim quando ele maturar. Embora o governo nacional não possa forçar aqueles indivíduos fora do seu território a rolarem os empréstimos que concederam, ele pode forçar cidadãos e instituições dentro de sua jurisdição a fazê-lo. De uma forma mais sutil, governos podem pressionar seus financiadores tradicionais, os bancos, a rolarem a dívida pública.
Bancos e governos vivem em uma relação de simbiose. Os governos concederam aos bancos o privilégio de operarem com reservas fracionadas, e deram ao sistema bancário garantias implícitas e explícitas de socorro em caso de problemas. Um apoio adicional é fornecido por meio de um banco central controlado pelo governo, o qual pode ajudar em casos de problemas de liquidez. Adicionalmente, os governos controlam o sistema bancário por meio de uma miríade de regulamentações. Em troca do privilégio de poderem criar dinheiro do nada através do mecanismo das reservas fracionárias, os bancos utilizam este poder para financiar os governos comprando os títulos de sua dívida.
Por causa deste intenso relacionamento e do monopólio estatal da violência, o governo japonês pode pressionar seus bancos a rolarem a dívida pendente. Ele também pode pressioná-los a não saírem vendendo abruptamente os títulos desta dívida (o que faria com que seus preços caíssem e, consequentemente, os juros subissem), bem como estimulá-los a comprarem ainda mais dívida. No entanto, o governo japonês não pode obrigar os estrangeiros a se absterem de vender os títulos desta dívida ou a comprarem ainda mais. E é aí que está o perigo para os governos que possuem uma alta porcentagem de dívida em mãos estrangeiras, como é o caso do governo espanhol.
Ao passo que os bancos e os fundos de investimento espanhóis irão obedecer ao governo da Espanha e não irão inundar o mercado com títulos da dívida do governo espanhol, as instituições estrangeiras podem fazer o oposto.[2] E o governo espanhol não pode "persuadi-las" ou "forçá-las" a não agir assim, uma vez que elas estão localizadas em outras jurisdições. A única coisa que o governo espanhol pode fazer — e os governos da periferia do euro já estão fazendo — é pressionar os políticos destes países credores a pressionarem seus próprios bancos a manterem esses títulos da dívida em seus balancetes, e rolá-los em vez de vendê-los.
O endividamento externo também representa um perigo para o governo dos EUA. Bancos centrais estrangeiros, como o Banco Central da China ou o Banco Central do Japão, estão em posse de somas substantivas de títulos da dívida do governo americano. A ameaça — crível ou não — de despejar estes títulos no mercado (e, com isso, levar a um grande aumento dos juros nos EUA) pode dar a estes governos, especialmente o chinês, alguma alavancagem política.
E o déficit na balança comercial?
No que diz respeito à estabilidade de uma moeda ou à sustentabilidade da dívida de um governo, a balança comercial (a diferença entre exportações e importações de bens e serviços) também é importante.
Um superávit de exportações implica que um país está acumulando ativos estrangeiros — afinal, exportações trazem ao país moeda estrangeira, a qual tende a ser reinvestida no seu país de origem, normalmente em títulos da dívida do governo de lá. À medida que ativos estrangeiros são acumulados, a moeda nacional tende a ficar mais forte. Ativos estrangeiros podem ser utilizados em momentos de crise para financiar a reparação de estragos. O Japão, novamente, nos fornece um bom exemplo. Após o terremoto de março de 2011, ativos estrangeiros foram repatriados para o Japão e foram utilizados para pagar as importações necessárias. Cidadãos japoneses venderam seus dólares e euros em troca de produtos de infraestrutura, com os quais repararam os estragos ocorridos no país. Não houve nenhuma necessidade de pedir empréstimos em moeda estrangeira, o que pressionaria o iene.
O superávit comercial do Japão também se manifesta no balancete do Banco Central do Japão. Ao exportarem, os exportadores japoneses são pagos em moeda estrangeira, a qual é comprada pelo Banco Central do Japão em troca de ienes para os exportadores. Estas reservas estrangeiras podem ser utilizadas em uma situação de crise para reduzir a dívida pública ou para defender o valor da moeda no mercado de câmbio. Com efeito, se considerarmos as reservas estrangeiras em posse do Banco Central do Japão (de mais de US$ 1 trilhão), a dívida líquida de seu governo cai 20%. Sob essa ótica, superávits comerciais tendem a fortalecer uma moeda e a sustentabilidade da dívida pública do país.
Por outro lado, déficits comerciais — por um mecanismo inverso ao explicado acima — resultam em uma maior quantidade de dívida em mãos de estrangeiros. Um país com vários anos de déficits em sua balança comercial tende a ficar exposto a uma grande quantia de endividamento externo, algo que pode gerar problemas para o governo no futuro, como também discutido acima.
A balança comercial pode também ser um indicador da competitividade de uma economia e, indiretamente, da qualidade de sua moeda. Quanto mais competitiva a economia, mais o governo tende a conseguir se financiar por meio apenas da expropriação da riqueza real criada por esta economia competitiva, de modo que ele não terá problemas com o endividamento público. Adicionalmente, quanto mais competitiva a economia, menores as chances de os problemas gerados pelo endividamento público serem resolvidos por meio da impressão de dinheiro. Ao passo que um superávit comercial é um sinal de competitividade — pois a economia estaria produzindo mais do que consome —, um déficit comercial pode ser um sinal de falta de competitividade, pois a economia estaria produzindo menos do que consome. Com efeito, déficits comerciais duradouros, além de serem um sinal de falta de competitividade, frequentemente andam de mãos dadas com um alto endividamento público, o que exacerba a falta de competitividade da economia.
Economias com salários elevados e inflexíveis — como as do sul da Europa — podem ser pouco competitivas, e em consequência apresentarem déficits comerciais. A falta de competitividade é sustentada pelos altos gastos do governo. Os governos do sul da Europa contrataram um número excessivo de pessoas para ocuparem sinecuras em seus inchados setores públicos, criaram generosos esquemas de aposentadoria precoce, e ofereceram auxílios-desemprego em massa, aliviando desta forma as consequências do desemprego gerado por um mercado de trabalho inflexível. O resultado deste aumento nos gastos públicos foi não apenas uma falta de competitividade e um déficit comercial, mas também um déficit orçamentário para os governos. Consequentemente, déficits orçamentários e comerciais frequentemente andam lado a lado.
Na periferia europeia, as importações foram pagas com empréstimos concedidos por outros países da zona do euro. O déficit comercial destes países não pode durar para sempre, pois o endividamento público iria aumentar para sempre. Uma situação de contínuo déficit comercial, como o da Grécia, pode ser interpretada como um falta de vontade política para se reformar o mercado de trabalho e, com isso, readquirir competitividade. Por conseguinte, contínuos déficits comerciais podem causar uma desvalorização da moeda ou uma venda em massa dos títulos públicos deste país. Neste sentido, o superávit comercial da Alemanha sustenta o valor do euro, ao passo que os déficits comerciais da periferia europeia diluem seu valor.
Em suma, uma dívida pública alta (em mãos estrangeiras) e contínuos déficits comerciais são sinal de uma moeda fraca. O governo pode ter de dar um calote ou de recorrer à impressora de dinheiro para tentar se livrar destes problemas. Por outro lado, uma dívida pública baixa (em mãos estrangeiras) e contínuos superávits comerciais tendem a fortalecer uma moeda.[3]
[1] Outro importante motivo é que o governo espanhol não pode utilizar a impressora de dinheiro sempre que quiser, pois ela é compartilhada por outros governos da zona do euro, os quais podem protestar. Já o governo do Japão, por outro lado, controla seu banco central e, consequentemente, a impressora de dinheiro.
[2] Vale notar que os títulos recém-emitidos da dívida espanhola estão exclusivamente em mãos de bancos espanhóis, pois outros investidores estão cada vez menos interessados em financiar um governo que simplesmente se recusa a implantar medidas de austeridade reais e efetivas.
[3] Neste ponto, vale ressaltar a importância de um orçamento equilibrado. Caso os déficits orçamentários de um país (por exemplo, o Brasil) fossem eliminados, os déficits comerciais fariam com que os estrangeiros, em vez de aplicarem o dinheiro de suas exportações em títulos do governo brasileiro, necessariamente direcionassem esse dinheiro para o setor produtivo brasileiro, aumentando a riqueza nacional. Déficits comerciais não ampliariam a dívida em mãos estrangeiras, de modo que todo o resultante investimento estrangeiro ampliaria a poupança e a acumulação de capital do país. O problema, portanto, não é a existência de déficits comerciais, mas sim a existência de déficits orçamentários do governo. [N. do .T.]
Philipp Bagus
é professor adjunto da Universidad Rey Juan Carlos, em Madri. É o autor do livro A Tragédia do Euro. Veja seu website.
Tradução de Leandro Roque
LULA E MALUF
18/06/2012
às 15:39 \ Direto ao PontoSarney merecia ser padrinho do casamento celebrado na visita de Lula à casa de Maluf
Em setembro de 1987, num discurso em Aracaju, o deputado federal Luiz Inácio Lula da Silva, fundador e dono do PT, juntou no mesmo balaio da gatunagem o então presidente José Sarney e os ex-governadores paulistas Adhemar de Barros e Paulo Maluf. Trecho:
“E a Nova República é pior do que a velha, porque antigamente na Velha República era o militar que vinha na televisão e falava, e hoje o militar não precisa mais falar porque o Sarney fala pelos militares ou os militares falam pelo Sarney. Nós sabemos que antigamente ─ os mais jovens não conhecem ─, mas antigamente se dizia que o Ademar de Barros era ladrão, que o Maluf era ladrão; pois bem: Ademar de Barros e Maluf poderiam ser ladrão, mas eles são trombadinhas perto do grande ladrão que é o governante da nova República, perto dos assaltos que se faz”.
Nesta segunda-feira, Lula levou Fernando Haddad à mansão de Maluf para a pajelança que celebrou a troca de alianças entre o PT e o PP controlado pelo homem que considerava um ícone da ladroagem. “Não há contradição”, gaguejou Haddad. “A cidade de São Paulo deve ficar acima de possíveis divergências ideológicas entre as duas siglas”.
Feliz com os salamaleques dos visitantes, o anfitrião fez de conta que também achou muito natural a barganha que juntou o “homem novo” (segundo o Lula de 2012) e o velho inimigo que o Lula de 1987 chamava de ladrão. “Não adianta olhar pelo retrovisor”, ensinou Maluf. “Temos que olhar para o para-brisa”. Previsivelmente, Lula não quis fazer declarações. Ordem médica, alegou. Conversa fiada. Ele não tem o que dizer. Falaram por ele os sorrisos e o aperto de mãos que trocou com o dono da casa que visitou pela primeira vez.
De 1987 para cá, Maluf incorporou ao prontuário façanhas tão extraordinárias que acabou entrando no ranking dos mais procurados pela Interpol. Como o encontro revogou oficialmente a discurseira do passado, o ex-presidente perdeu uma boa chance de redimir-se por inteiro dos pecados de Aracaju. José Sarney merecia ser padrinho do casamento obsceno. Ao lado de Maluf, hoje é ele quem parece trombadinha. Por: Augusto Nunes
BAÚ DE PRESIDENTES
‘A soma e o resto’, o livro mais recente de Fernando Henrique Cardoso
Desde que a carranca de Jânio Quadros substituiu o sorriso de Juscelino Kubitschek em 1961, o gabinete presidencial já hospedou napoleões de hospício, generais de exército da salvação, perfeitas cavalgaduras, messias de gafieira, gatunos patológicos, vigaristas provincianos e outros exotismos da fauna brasileira. A rotina da anormalidade ─ que seria retomada por Lula, um ex-operário metalúrgico que acha leitura pior que exercício em esteira, e mantida por Dilma Rousseff, primeira mulher a exercer o cargo (e provavelmente a primeira figura a governar um país sem conseguir expressar-se de modo inteligível) ─ só foi interrompida entre 1° de janeiro de 1995 e 31 de dezembro de 2002, quando o Palácio do Planalto abrigou Fernando Henrique Cardoso. A soma e o resto ─ um olhar sobre a vida aos 80 anos (Civilização Brasileira; 195 páginas; 29,90 reais) confirma que foi FHC o ponto fora da curva. Lula e Dilma são duas formidáveis singularidades, mas parecem à vontade na galeria de retratos que os tornou vizinhos de parede de Jânio, João Goulart, Emilio Medici, João Figueiredo, José Sarney, Fernando Collor ou Itamar Franco. Todos executam harmoniosamente a partitura da ópera do absurdo. O acorde dissonante é Fernando Henrique, constata quem ouve as mais de 10 horas de lembranças, reflexões e desabafos reunidas no livro organizado por Miguel Darcy de Oliveira.
Eleitos pelo voto popular ou impostos pelo regime militar, quase todos os ex-presidentes têm tudo a ver com o Brasil dos 14 milhões de analfabetos, dos 50 milhões que não compreendem o que acabaram de ler nem conseguem somar dois mais dois, da imensidão de miseráveis embrutecidos pela ignorância. Tal paisagem ajuda a entender por que tantos brasileiros se dobraram a populistas sedutores ou foram dobrados por autoritários fardados. E torna especialmente intrigante a passagem pela Presidência de um intelectual brilhante, exemplarmente democrata, que escreveu muitos livros e fala sem espancar a língua portuguesa. A leitura de A soma e o resto explica alguma coisa, mas acentua a suspeita de que Fernando Henrique tinha tudo para não ser presidente do Brasil da virada do século.
“Este talvez seja o livro mais espontâneo que já publiquei”, avisa FHC. É mesmo: a transcrição quase literal das falas resultou numa obra sem parentesco formal com a escrita sofisticada (e eventualmente impenetrável) do sociólogo mundialmente respeitado. Tal opção cobrou seu preço em redundâncias, raciocínios que pedem mais espaço e histórias interrompidas. Esses pecados veniais são amplamente compensados por revelações que só ocorrem em diálogos sem gravata. Avesso a derramamentos e confidências, FHC nunca foi tão longe nas viagens íntimas, sobretudo as que o levam a reencontrar os pais e os avós. Aos 80 anos, completados em 18 de junho, ele enfim se animou a esboçar o retrato de um futuro presidente quando menino. Acabou tornando bem mais nítidos os contornos do adulto. “Sou cartesiano, mas com pitadas de candomblé”, informa. “Acasos, acidentes, escolhas, capacidade para assumir riscos… Os pontos de inflexão na minha trajetória são um misto de tudo isso”.
A frase se ampara na trajetória do professor universitário que disputou a primeira eleição aos 48 anos, virou suplente de senador, substituiu o titular em 1982, perdeu a prefeitura de São Paulo para Jânio Quadros em 1985, conseguiu outro mandato no Senado um ano mais tarde e já se conformara com a ideia de tentar uma vaga na Câmara dos Deputados, em 1994, quando o presidente Itamar Franco decidiu que seu chanceler deveria ser ministro da Fazenda. Os acasos e acidentes o colocaram frente a frente com a inflação de três dígitos. Coisas do candomblé. E então o cartesiano entrou em ação. Escolheu uma equipe de economistas excepcionais, comandou a implantação do Plano Real, rebaixou a inflação a porcentagens europeias e virou presidente. Por oito anos.
“É a curiosidade que me move”, diz. “O sentido que dei à minha vida foi tentar perceber o que vem de novo por aí”. Essa curiosidade permanente o levaria a inventar, de volta à planície, a versão brasileira do ex-presidente surgida nos Estados Unidos em 1951, quando a 22ª emenda estabeleceu o limite de dois mandatos. Nesta primavera, por exemplo, José Sarney e Fernando Collor agonizam no Senado e Lula escolhe candidatos a prefeito. Fernando Henrique se reúne com os Elders, grupo de ex-governantes fundado por Nelson Mandela, protagoniza um documentário sobre o problema das drogas, busca soluções para o Oriente Médio, escreve livros e coleciona afagos até da presidente Dilma Rousseff. No Brasil, quem conheceu o coração do poder não consegue respirar longe das urnas. FHC deixou a política miúda para, sem sair da vida, entrar na história. Por: Augusto Nunes
ATOLEIRO SÍRIO
Mais cedo ou mais tarde, após Assad e a sua encantadora esposa levantarem acampamento, os islamistas provavelmente tomarão o poder, os sunitas se vingarão e as tensões regionais irão se desenrolar na Síria.
À medida que o governo sírio aumenta de forma desesperada e cruel os esforços em se manter no poder, apelos para uma intervenção militar, mais ou menos no modelo líbio, têm se tornado cada vez mais insistentes. Com certeza, esse curso é moralmente atraente. Mas, será que os países ocidentais deveriam seguir esse ponto de vista? Acredito que não.
Essas chamadas à ação se dividem em três principais categorias: a muçulmana sunita que diz respeito aos seus correligionários, a que afeta a preocupação universal para o fim das torturas e assassinatos e a geopolítica que trata do impacto do conflito em andamento. Os primeiros dois motivos podem ser facilmente descartados. Se os governos sunitas – notadamente os da Turquia, Arábia Saudita e Catar – optassem por intervir em favor de seus colegas sunitas contra os alauitas, esta seria a prerrogativa deles e o Ocidente está pouco se lixando.
Interesses humanitários em geral enfrentam problemas de veracidade, viabilidade e importância. Insurgentes anti-regime, que estão vencendo no campo de batalha, aparentam ser responsáveis pelo menos por algumas atrocidades. Eleitorados ocidentais poderão não aceitar o preço em sangue e dinheiro necessários para uma intervenção humanitária. O resultado tem que ser muito rápido, digamos um ano. O governo sucessor poderá (como no caso líbio) ser ainda pior do que o totalitarismo atual. Juntos, esses fatores defendem de forma consistente a posição contra a intervenção humanitária.
Interesses quanto à política externa deve ter precedência, pelo fato dos países ocidentais não estarem tão fortes e seguros a ponto de dirigirem os olhos para a Síria apenas por preocupação pelos sírios, e mais do que isso, eles devem ver o país de forma estratégica, colocando a prioridade na sua própria segurança.
Robert Satloff do Washington Institute for Near Eastern Policy resumiu com presteza no The New Republic as razões pelas quais uma guerra civil na Síria apresenta perigo aos interesses dos Estados Unidos: o regime de Assad poderá perder o controle sobre o arsenal químico e biológico, poderá renovar a insurgência do PKK contra Ancara, regionalizar o conflito pressionando a sua população palestina a cruzar as fronteiras jordanianas, libanesas e israelenses e combater os sunitas do Líbano, reacendendo a guerra civil libanesa. Os combatentes sunitas membros da jihad, por sua vez poderiam transformar a Síria em um ponto de conexão global do violento terrorismo islamista – na vizinhança da OTAN e de Israel. Por último, ele receia que um conflito prolongado daria aos islamistas mais oportunidades do que um conflito de curta duração.
A minha resposta: Sim, as armas de destruição em massa poderão ficar fora de controle, mas eu me preocupo mais que caiam nas mãos de um governo sucessor islamista. Uma renovada insurgência do PKK contra o governo hostil, ora no poder na Turquia, ou o aumento nas tensões sunitas-alevitas naquele país, sequer contam como prioridade no Ocidente. Expulsar os palestinos dificilmente desestabilizaria a Jordânia ou Israel. O Líbano já é uma bagunça balcanizada e, ao contrário ao período de 1976-91, a luta interna em andamento afeta de forma marginal os interesses do Ocidente. A campanha da jihad global conta com recursos limitados, o local pode não ser o ideal, mas o que há de melhor do que combater o Pasdaran (Corpo de Guarda da Revolução Iraniana) até a morte na Síria?
E quanto ao tempo que conspira contra os interesses do Ocidente: ainda que o conflito sírio terminasse agora, eu não vejo nenhuma perspectiva de aparecer um governo com diversidade étnica ou religiosa. Mais cedo ou mais tarde, após Assad e a sua encantadora esposa levantarem acampamento, os islamistas provavelmente tomarão o poder, os sunitas se vingarão e as tensões regionais irão se desenrolar na Síria.
Além disso, a derrubada do governo sírio não significa o fim imediato da guerra civil. O mais provável é que a queda de Assad conduzirá os alauitas e outros elementos apoiados pelo Irã a se oporem ao novo governo. Além do mais, como mostra Gary Gambill, o envolvimento militar do Ocidente poderia reforçar a oposição a um novo governo, prolongando os combates. Por último (como já aconteceu no Iraque), o prolongamento do conflito na Síria proporciona algumas vantagens geopolíticas:
- diminui o risco de Damasco iniciar uma guerra contra Israel ou reocupar o Líbano.
- aumenta a possibilidade dos iranianos, ora vivendo sob domínio dos mulás, principais aliados de Assad, se inspirarem no levante sírio e na mesma linha se rebelarem contra os seus governantes.
- fortalece a ira árabe sunita contra Teerã, especialmente se levarmos em conta que a República Islâmica do Irã vem fornecendo armas, tecnologia e apoio financeiro para ajudar na repressão contra os sírios.
- alivia a pressão sobre os não muçulmanos: indicativo da nova forma de pensar, o líder salafista jordaniano Abou Mohamad Tahawi declarou recentemente que "a coalizão alawita com os xiitas é no momento a maior ameaça aos sunitas, maior ainda do que a israelense".
- fomenta a fúria no Oriente Médio contra Moscou e Pequim por apoiarem o regime de Assad.
Os interesses do Ocidente sugerem ficar fora do atoleiro sírio.
Publicado no The Washington Times.ESCRITO POR DANIEL PIPES
Original em inglês: Stay out of the Syrian Morass
Tradução: Joseph Skilnik
E O GREENPEACE EXAGEROU NA DOSE
Aberta ontem pela presidente Dilma Rousseff, a conferência Rio+20 pode ser um momento importante para ampliar as discussões em torno do desenvolvimento sustentável, tema que é fundamental mas que, infelizmente, nem sempre é tratado com a seriedade que merece.
E o pior de tudo é que entre os responsáveis pelas leviandades que muitas vezes cercam esse debate estão organizações que, a princípio, deveriam ser um exemplo de seriedade.
Em nome da defesa de interesses aparentemente nobres, o Greenpeace e outras entidades do gênero são capazes de gestos que, em lugar de ajudar, servem apenas para prejudicar o avanço da causa do desenvolvimento sustentável.
Ontem, por exemplo, a Justiça expediu uma liminar em favor do frigorífico JBS (o maior produtor de carnes do mundo) contra o Greenpeace. A ONG vinha insistindo na acusação de que a empresa adquiria gado criado em terras embargadas pelo Ibama.
A Justiça entendeu que a acusação é mentirosa e determinou que o Greenpeace deixe de mandar panfletos a respeito do assunto para clientes do frigorífico – além de excluir de sua página na internet o conteúdo a respeito do tema.
É esse tipo de gente (que forja argumentos e tenta transformá-los em verdade) que vestirá a fantasia de salvador do planeta e fará barulho na conferência, tentando impor seus pontos de vista aos participantes.
O mundo deve muito às organizações que colocaram o debate ambiental na pauta das discussões muito antes de esse tema ser levado em conta pelos governos e pela própria ONU.
Mas, a partir do momento em que elas exageram na dose, a contribuição se transforma em desserviço.
Sem uma fonte de geração de energia mais segura e mais barata do que a atual, a indústria da Zona Franca pode se tornar inviável.
O Greenpeace e todos os que ainda se opõem à construção de Belo Monte e de outras hidrelétricas na região da Amazônia deveriam fazer uma avaliação sincera do que representa para a região a geração de energia por usinas térmicas com aquela velharia que abastece Manaus.
Pois bem: sem uma fonte de geração de energia mais segura e mais barata do que a atual, a indústria da Zona Franca pode se tornar inviável. E, caso as fábricas sejam fechadas, a população local será obrigada a buscar sua sobrevivência na floresta – e a destruição da mata será inevitável.
A questão do desenvolvimento sustentável, como se vê, vai muito além da preservação do meio ambiente (embora esse aspecto tenha uma importância inegável para a qualidade de vida no mundo).
Ela inclui, em papel de destaque, a necessidade de avanços sociais mais relevantes. O secretário-geral da Rio+20, Sha Zukang, tocou num ponto fundamental ao falar, ontem, sobre o documento que será emitido ao final da conferência.
“Nós precisamos de um documento com propostas ambiciosas e históricas que contenha iniciativas tecnológicas que possibilitem o desenvolvimento sustentável. Temos que transformar nossas aspirações sobre inclusão, prosperidade e igualdade em realidade”, disse ele.
Este é o xis da questão: não se promove o desenvolvimento sustentável olhando pelo retrovisor, nem existe aliado mais fiel do desenvolvimento sustentável do que o avanço tecnológico.Por: Ricardo Galuppo
Fonte: Brasil Econômico, 14/06/2012
domingo, 17 de junho de 2012
EFEITOS COLATERAIS DO BOLSA FAMÍLIA
Desde o surgimento dos primeiros programas de transferência de renda, mediante contrapartidas, já se passaram quase duas décadas, período mais do que suficiente para este tipo de ação social sofrer aperfeiçoamentos.
As primeiras "bolsas" - surgidas em 1994 e 95, em Campinas, na gestão do prefeito tucano José Roberto Magalhães Teixeira, e em Brasília, quando era governador Cristovam Buarque, então PT - atendiam a um desejo consensual da sociedade brasileira, consolidado na redemocratização, em 85: combater a pobreza. Ficara para trás, como símbolo do regime ditatorial, o lema do "primeiro, acumular, para depois distribuir".
No início, o recebimento do benefício era condicionado à manutenção dos filhos na escola. Daí ter sido chamado em Brasília de "Bolsa Escola". Depois, na Era FH, o leque de contrapartidas começou a ser ampliado, surgiram outros programas com subsídios ao pobre, até chegar o período Lula, quando uma série de linhas de sustentação social já existentes foi reunida sob o guarda-chuva do Bolsa Família. O programa ganhou amplitude e passou a receber um volume crescente de dinheiro do Tesouro. No ano passado, o Bolsa Família fechou com uma despesa de R$ 16,7 bilhões, distribuídos entre 13,3 milhões de famílias. O universo dos assistidos não para de se expandir. No início do ano, a presidente Dilma anunciou que serão incluídas no BF mães pobres com filhos pequenos.
Nunca esteve em discussão a necessidade de haver programas de transferência de renda num país como o Brasil. O ponto central é saber se o dinheiro é bem gasto, pois há enormes carências em áreas estratégicas - caso da Educação -, em que faltam recursos.
Divulgados ontem pelo GLOBO, alguns resultados de uma ampla pesquisa de avaliação do programa encomendada pelo Ministério do Desenvolvimento Social ajudam numa reflexão sobre adequações no BF. Ao lado de informações positivas - redução do trabalho infantil, frequência escolar, posição da mulher na família -, o levantamento trouxe alertas.
Foi detectado que o beneficiário do programa tende a se manter na informalidade, com medo de, ao ter carteira de trabalho, ser constatada sua elevação de renda, com a consequente exclusão do BF. Reportagem do jornal cita o caso de uma faxineira, no Piauí, que rejeitou emprego de babá, no qual ganharia salário mínimo, para continuar com os filhos, sustentada pelo Bolsa Família.
Confirma-se o risco de pessoas se acomodarem ao benefício do Estado, dentro de um estágio de pobreza um pouco acima da miséria. É por isso que falta mão de obra em certas regiões do Nordeste.
Assim, congela-se a possibilidade de ascensão social e engessa-se uma conta enorme dentro do Orçamento que poderia financiar outros gastos, à medida que os bolsistas fossem absorvidos pelo mercado de trabalho.
Diante deste quadro, é preciso enfatizar, mais uma vez, a necessidade das tais "portas de saída", pelas quais bolsistas, devidamente treinados, buscariam o sustento no próprio trabalho, um dos quesitos da dignidade humana. Há tempos o assunto morreu em Brasília.
Para obter os dados, O GLOBO teve de acionar o ministério com base na Lei de Acesso à Informação. O governo não deveria temer a divulgação de pesquisas de avaliação. É a partir delas que a própria administração pública pode melhorar. EDITORIAL O GLOBO
SUPREMO TRIBUNAL, SUPREMOS PROBLEMAS
Antes da posse, o ministro vai ao Senado. Só elogios. Une-se aí ao empreguista STF, com 235 recepcionistas, vira celebridade. E "lê" milhares de casos ao ano
Ao longo da história republicana, a atuação do Supremo Tribunal Federal esteve, quase sempre, em desacordo com valores democráticos.
Em um país como o nosso, de uma enraizada cultura autoritária, a omissão do STF foi perversa. Basta recordar o silêncio cúmplice com relação às graves violações dos direitos humanos durante o Estado Novo e durante a ditadura militar.
Em vez de o STF ser uma espécie de tribunal da cidadania, ele foi, neste mais de um século de vida, um instrumento de desprezo da ordem democrática. Fui também um elemento de reforço da impunidade, doença maligna que permeia o cotidiano brasileiro.
A Constituição de 1988 atribuiu ao STF um conjunto de competências. Ele foi transformado, na prática, em um tribunal de última instância, quando a sua função deveria ser estritamente interpretar o texto constitucional.
Assim, só em 2011 a Corte teve 102 mil decisões, das quais 89 mil foram monocráticas, ou seja, tomadas por apenas um ministro. Dentre essas, 36.754 foram exclusivamente do presidente do STF.
Mesmo com a existência da súmula vinculante, causa estranheza que um só ministro tenha proferido tantas decisões.
Imagine o leitor que se um processo tenha, em média, cem folhas -algo que, para os nossos padrões, caracterizado pela prolixidade, é considerado curto- e que o presidente tenha julgado originalmente somente um terço dos processos, cerca de dez mil, para facilitar as contas. Ele teria de ler 1 milhão de folhas. Será que leu?
O STF tem muitos outros problemas. Um deles é a escolha dos ministros, uma prerrogativa constitucional do presidente da República.
Cabe ao Senado aprová-la. As sabatinas exemplificam muito bem o descaso com a nomeação. Todos são aprovados sem que se conheça o que pensam. São elogiados de tal forma pelos senadores que fica a impressão que estão, com antecedência, desejando obter a simpatia dos futuros ministros frente a um eventual processo. Em síntese: as sabatinas são uma farsa e desmoralizam tanto o Senado como o STF.
No Brasil, estranhamente, os ministros acabaram virando celebridades. Dão entrevistas a toda hora e sobre qualquer assunto.
Um deles chegou a "abrir sua casa" para uma reportagem e tirou uma foto deitado na cama ao lado da sua esposa! Tem ministro poeta, outro é empresário de ensino, tem ministro que foi reprovado em concurso para juiz -duas vezes, e mesmo assim foi alçado ao posto maior da carreira, mas sem concurso, claro-, tem ministro que chegou lá devido à sorte de quem era vizinho da sua mãe. Pior ainda são aqueles que ficam alguns anos como ministros e retornam à advocacia, usando como grife a passagem pelo Supremo.
O STF padece também de um velha doença nacional: o empreguismo. São quase 3.000 funcionários, entre efetivos e terceirizados. Não é improvável que, se todos comparecerem no mesmo dia ao trabalho, as instalações da Corte não sejam suficientes para abrigá-los.
Como são 11 ministros, a média é de 272 funcionários para cada um. E o mais estranho são funcionários que não estão diretamente vinculados à função precípua de julgar, como as 235 recepcionistas e os 403 seguranças -deve ser a Corte mais segura do mundo.
Essa estrutura custa para a União uma bagatela da ordem de R$ 500 milhões ao ano.
Um bom momento para o STF reencontrar a cidadania é o julgamento do mensalão. Poderemos assistir como cada um dos 11 ministros vai agir. Pode ser que, finalmente, a Corte rompa com seu triste passado de conluio com o Executivo e seja um instrumento de defesa dos valores democráticos.
MARCO ANTONIO VILLA, 57, é historiador, professor da Universidade Federal de São Carlos, e autor, entre outros, de "A História das Constituições Brasileiras: 200 Anos de Luta Contra o Arbítrio" Por: MARCO ANTONIO VILLA
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