sexta-feira, 19 de outubro de 2012

ALINHAMENTO DOS ASTROS EM 2013

Já estamos na parte final do ano e os olhos dos analistas se voltam para 2013. A grande pergunta que se coloca é se a economia mundial vai entrar -ou não- em processo sistêmico de recuperação.

O cenário de "Fim do Mundo" -que teve um grande número de adeptos até recentemente- não me parece mais uma alternativa com credibilidade no mercado. Embora exista ainda o risco pontual de uma tragédia fiscal nos EUA depois das eleições, a aposta maior contempla um acordo entre os republicanos e democratas que a evite.

A maioria dos pessimistas de plantão está trocando para 2013 o cenário de "Fim do Mundo" pelo de mais um ano de crescimento muito baixo e continuidade do pessimismo entre os investidores e empresas. Nesse cenário, a volta dos investimentos não vai se realizar, e a recuperação da economia mundial vai demorar ainda para acontecer.

O Brasil é um dos exemplos mais claros de como o pessimismo em relação ao crescimento econômico do mundo está afetando a taxa de investimentos. Mesmo longe das áreas mais críticas, como Europa e EUA, e tendo o consumo interno como a grande força por trás de seu crescimento, estamos vivendo uma desaceleração muito forte por conta do verdadeiro colapso da chamada formação bruta de capital fixo.

Tivemos nesta semana mais uma prova disso, com o aumento do número dos postos formais de trabalho em setembro caindo 75% em relação aos números anteriores a 2011 e igualando-se, depois de muitos anos, ao número de novos entrantes no mercado de trabalho.

Gostaria de trazer hoje ao leitor da Folha um cenário alternativo para 2013. Tenho dado a ele o nome de "O Alinhamento dos Astros", em homenagem à minha mulher, que gosta de olhar para o Universo como fonte de inspiração profissional.

Na astrologia, o alinhamento dos astros pode ser associado a condições favoráveis para os acontecimentos humanos futuros. No caso da economia brasileira, os astros relevantes são as economias da China, dos EUA e, em menor importância, da União Europeia. Em minha opinião, eles podem se alinhar no próximo ano, criando condições mais favoráveis para o Brasil.

O astro China é o que tem a maior importância sobre nós, via o canal dos preços dos principais produtos primários exportados pelo Brasil. O economista Fabio Ramos, da Quest, tem um intensivo trabalho de pesquisa sobre a correlação entre o crescimento do PIB brasileiro e o índice CRB de commodities. Os números impressionam...

Nesse sentido, os dados divulgados anteontem sobre a economia chinesa, ao mostrar tendência sutil de recuperação da atividade industrial, do consumo e do investimento em infraestrutura econômica, reforçam esse meu cenário de recuperação. Embora sejam sinais ainda muito precários, um grande número de analistas considerou-os como indicadores de que a economia vai voltar a um crescimento sustentável.

Também nos EUA os mais recentes dados sobre o mercado de trabalho, a construção civil e a produção industrial apontam para uma economia mais sustentada do que a do passado recente. Se ocorrer o esperado acordo político sobre a questão fiscal para 2013, o processo de cura que está ocorrendo na maior economia do mundo vai se fortalecer e levar a uma retomada dos investimentos privados.

Na Europa -terceiro astro de minha imagem-, vivemos um período de maior otimismo em relação à estabilidade do euro e de menor pessimismo em relação aos títulos soberanos dos países mais endividados do mediterrâneo. Embora a maioria dos países vá continuar em recessão econômica, para o alinhamento dos astros que visualizo, esse cenário de estabilidade institucional, sem colapso de sua moeda única, já é suficiente.

Se estiver certo sobre o cenário para o próximo ano, as empresas brasileiras devem retomar os investimentos para compensar o tempo perdido, pois o consumo interno deve crescer 6% em 2012 e repetir a dose em 2013.

Se o governo sair de seu labirinto ideológico e acelerar o processo de concessões ao setor privado, o investimento privado pode voltar a colocar o crescimento econômico brasileiro na rota, que foi perdida nos últimos anos. Por: Luis Carlos Mendonça de Barros

A ERA DAS LEIS RACIAIS




Os Estados Unidos aboliram a escravidão em 1865, mas só cem anos depois deram cabo das leis de discriminação racial. O Brasil extinguiu a escravidão, e com ela qualquer distinção legal em razão da cor da pele, em 1888. Mais de um século depois, reintroduzem-se aqui instituições segregacionistas, agora a título de promover os negros.

Dissemina-se a pressão pelas cotas, amparada no Estatuto da Igualdade Racial, de 2010, e na decisão do Supremo Tribunal Federal que em abril passado referendou a reserva de vagas no ensino superior. Até o final do ano, o governo federal pretende estender as cotas por critério de cor aos concursos do funcionalismo.

Trata-se de uma onda avassaladora, a induzir silêncio e autocensura nos que se opõem a sua implantação.

Pelo estatuto racial do século 21, é considerado negro todo brasileiro que declare ser parda ou preta a cor de sua pele. Estranho estratagema. Por que não determinar ao IBGE que restrinja as suas categorias a "negro" e "branco" --suprimindo-se o "pardo" e o "preto"--, a fim de saber ao certo o grau de negritude no Brasil?

Já que imitamos os EUA no diagnóstico e no tratamento da questão, por que não importar também a nomenclatura dualista das raças imiscíveis? Obriguem-se 82 milhões de brasileiros (43% da população) autodeclarados pardos a tomar partido. Que os próprios cidadãos se pronunciem nos termos do jogo proposto.

A sociedade dividida à força entre brancos e negros consumaria o retrocesso histórico da recidiva das leis raciais no Brasil. Chame-as de "racistas" ou "racialistas", na língua da moda, elas exumam e validam termos de velhos adversários da modernidade quando instituem privilégios baseados em atributos corporais. O sangue, a cor, a linhagem.

Desta vez é para fazer o bem e reparar o mal, argumenta-se. Tenho dúvidas --e saudades do tempo em que ser moderno era não discriminar nem aceitar discriminação. Por: Vinícius Mota, Folha de SP

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

O USO DA CIÊNCIA



Pouca gente sabe, mas há bons indícios de que a teoria da relatividade esteja sendo revista. Cientistas do CERN – Organização Européia para Pesquisa Nuclear – estão analisando evidências de que algumas partículas subatômicas são capazes de locomover-se em velocidades superiores a da luz, algo que seria impossível, segundo Einstein. Caso confirmada, tal descoberta viria atestar, mais uma vez, que a verdadeira ciência é um processo contínuo, raramente conclusivo e, acima de tudo, despolitizado. Ciência não é matéria sujeita a consensos ou escrutínios. Ao contrário, espera-se que as teorias sejam constantemente testadas e, se for o caso, falseadas. Imagine como seria a física hoje se Galileu não tivesse questionado a teoria aristotélica, se Newton não tivesse estendido e generalizado o trabalho de Galileu e Einstein estivesse plenamente satisfeito com as conclusões de Newton. Na verdade, o esforço para “negar” as teorias científicas é tão antigo e saudável quanto a própria ciência.

É assim que as ciências da natureza trabalham. Observações levam a hipóteses. Hipóteses são testadas através de experimentos. Os resultados são divulgados, examinados e duplicados antes que uma boa teoria seja divulgada. Certezas são raras, leis são muito poucas. Ciência não é fonte de autoridade, mas de conhecimento.

Cientistas não são deuses. São seres humanos sujeitos aos mesmos impulsos que todos nós. Einstein, por exemplo, queria tanto demonstrar que a teoria quântica era determinística e não probabilística que chegou a invocar o Todo-Poderoso: “Deus não joga dados com o universo”, teria dito o alemão, gerando a resposta jocosa de seu colega Nils Bohr: “Einstein, pare de dizer a Deus o que fazer”.

Esses mesmos impulsos humanos quase sempre nos levem a acreditar que estamos certos, ou pelo menos do lado certo. No entanto, isso não é desculpa para endossar métodos e comportamentos não científicos. Muitos cientistas subscrevem a teoria do Aquecimento Global Antropogênico sem que tenham feito qualquer pesquisa ou estudo mais aprofundado a respeito. Adotam tal postura simplesmente porque este seria o lado “in” da questão. Na maioria dos casos, é assim que o chamado “consenso” científico é estabelecido.

Infelizmente, estamos cercados de gente que diz saber muito mais do que realmente sabe. Quando essas pessoas sonham e fazem projetos contando com seu próprio tempo e dinheiro, tudo bem. O problema é que muitas dessas pessoas confiam tanto na própria sabedoria que pretendem impor aos demais os seus planos, utilizando-se para isso da força dos governos. Esses indivíduos sentem-se capazes de planejar cada detalhe de nossas vidas, não importa quão bem (ou mal) planejem as suas.

O antídoto contra o uso político da ciência é realçar a própria falibilidade científica, além de estimular o ceticismo. Não é justo, nem inteligente, sair por aí chamando de herético quem desconfia da atividade humana como causa do aquecimento global, ou duvida das catastróficas previsões dos computadores. Heresia tem a ver com fé, e ciência não é assunto de fé. A ciência não prescreve dogmas, nem evolui conforme a opinião da maioria. Por: João Luiz Mauad, O GLOBO 




terça-feira, 16 de outubro de 2012

QUEM NÃO BEBE.....




Beber é essencial para ter uma carreira profissional promissora e, conseguentemente, ganhar dinheiro. A afirmação é do jornal mais influente do mundo, o The New York Times, que, em reportagem publicada, afirma que quem não bebe álcool é visto com desconfiança e dificilmente consegue fechar um bom negócio.

Dizendo até que a cerveja é um dos ingredientes importantes de Obama na corrida à releeição nos EUA, a reportagem afirma que “as pesquisas apoiam a ideia de que os que não bebem têm dificuldades para subir na hierarquia corporativa. Vários estudos demonstraram que as pessoas que bebem ganham mais dinheiro do que as que não bebem.”

“Esperam que você beba, e beber é parte do que você faz; as pessoas ficam meio sérias se você disser que não bebe”, disse Link Christin, diretor de um programa de tratamento especial para advogados que faz parte de um centro de recuperação contra álcool e drogas que fica no estado de Minnesota. “Se disser que não bebe, você tem que lidar com a suspeita de que não sabe jogar.”

Segundo John Crepsac, um terapeuta de Nova York, em Wall Street, os investidores que não bebem “queixam-se de que não conseguem fechar negócios, não conseguem mesmo entrar nas negociações iniciais porque não entram no comportamento de beber.”

Foto: Andrew Scrivani for The New York Times

HORA DE COLOCAR O TIME EM CAMPO



Com a Copa das Confederações programada para 2013 no Brasil, o mundo poderá avaliar melhor as condições em que se realizará aqui, em 2014, a Copa do Mundo. O ano de 2013 vai ser um teste importante rumo a 2014 também na economia, mas aqui o desafio será outro: como segurar a inflação. A alta dos preços pode se tornar uma dor de cabeça bem pior do que se imagina. O risco é a inflação ultrapassar o teto oficial de tolerância de 6,5% no próximo ano, e se aproximar da marca de 7%. O consenso entre os analistas tem ficado emperrado perto de 5,5% por um bom tempo. O centro da meta oficial é de 4,5%.

Vários fatores conspiram para empurrar a inflação para cima em 2013. 

- Primeiro, os salários estão crescendo velozmente, acima de qualquer estimativa razoável de ganhos de produtividade, em um mercado de trabalho apertado, com desemprego perto das mínimas históricas. 

- Segundo, as expectativas de inflação estão desancoradas da meta oficial de 4,5%. 

- Terceiro, há o fim de alguns fatores temporários que ajudaram a segurar a inflação em 2012. 

- Quarto, os preços elevados de commodities (alimentos) no mercado internacional. 

- Quinto, não se pode mais contar com muita valorização cambial para conter a inflação, pelo menos enquanto o governo estiver engajado em uma "guerra cambial" contra a valorização do real.

Para começo de conversa, o quadro atual de inflação já não é lá grande coisa. Em sua menor marca recente, a inflação desacelerou para 4,9% em junho. Mesmo no nível mais baixo, a alta ainda corre acima do centro da meta oficial de 4,5%, apesar do crescimento fraco no primeiro semestre e da ajuda de fatores pontuais específicos (redução de IPI sobre automóveis e bens duráveis e a mudança favorável nos critério de pesos para composição da cesta do IPCA).


Em outras palavras, o dilema entre crescimento e inflação parece pior do que o governo gostaria. Entre os fatores a serem avaliados, o agravamento desse dilema pode ser reflexo de uma queda da taxa de crescimento potencial da economia - um tema mais amplo, que não se limita a apenas ao Brasil. Na verdade, como o banco central americano, o Federal Reserve (Fed) disse recentemente, o ritmo moderado da recuperação dos EUA pode estar apontando para uma redução mais substancial na própria trajetória do produto potencial. Em particular, segundo alguns diretores do Fed, esperava-se que a inflação tivesse caído mais nos últimos anos, se a folga aberta pelo desvio da atividade econômica abaixo do "potencial" tivesse sido tão grande como as medidas usuais sugerem. Ou seja, talvez o potencial de crescimento da economia (sem inflação) não seja tão alto hoje em dia como antes se supunha.

Em economias desenvolvidas, como a dos EUA, e em mercados emergentes, como o brasileiro, um tema comum é que a inflação não caiu tanto quanto a desaceleração do crescimento poderia sugerir. Olhando para frente, a lenta recuperação global e a ampla ociosidade nas economias desenvolvidas sugerem que ainda pode demorar algum tempo antes que a inflação se torne uma questão importante para os bancos centrais de mercados desenvolvidos.

No entanto, em mercados emergentes, menor ociosidade na utilização dos recursos da economia e a recuperação mais rápida da economia sugerem que a inflação pode se tornar uma preocupação maior bem antes do que muitos esperam. Esse é o caso do Brasil, temo. Com a economia ganhando fôlego nos próximos trimestres, a tendência subjacente da inflação dificilmente cai muito. Pelo contrário, o risco é a alta dos preços se tornar uma questão mais espinhosa do que se imagina.

O que está errado com o consenso? A projeção praticamente unânime entre os analistas para a inflação de 2013 tinha subido, já há algum tempo, para 5,5%, descolando da previsão inicial de 4,5% que se imaginava inicialmente. Parece ter se difundido a percepção (correta ou não), de que o governo estaria satisfeito com a inflação em algum lugar na banda superior do intervalo de tolerância. Ou seja, em algum lugar entre o centro da meta de 4,5% e o teto de tolerância de 6,5%. A marca de 5,5% fica exatamente no ponto médio dessa banda superior. 

Assim, não é por acaso que o consenso tenha mirado nesse número, como a verdadeira nova meta de inflação na prática, pelo menos na percepção do mercado. Entretanto, o risco pela frente parece ser de inflação maior, a julgar por modelos de projeção sob determinadas hipóteses, assumindo preços de commodities em alta, taxa de câmbio relativamente estável, recuperação forte do crescimento doméstico, mercado de trabalho apertado, e expectativas de inflação ainda acima do centro da meta. Mas e as reduções de impostos, como o corte do custo de energia elétrica, não podem reduzir a inflação? Um problema com esse tipo de medida é que isso certamente ajuda a mitigar temporariamente a medida oficial de inflação, mas não resolve as pressões latentes de inflação. Aspirinas aliviam sintomas, mas não curam doenças.

O foco do mercado financeiro no Brasil deve mudar nos próximos trimestres. Se o tema de 2012 foi "crescimento baixo", talvez o tema em 2013 seja "inflação alta". Ou seja, as preocupações com crescimento fraco na primeira metade de 2012 cada vez mais podem dar lugar a preocupações sobre inflação no ano que vem.

Em resumo, na economia como no futebol, 2013 será um teste importante. Em ambos os casos, será hora de colocar o time em campo.
Marcelo Carvalho é economista-chefe para a América Latina do Banco BNP Paribas.

A RIQUEZA DAS NAÇÕES


Riqueza das nacoes


Por mais de 10.000 anos, a renda per capita do mundo era de uns míseros US 2 por dia, e olhe lá! 

Mesmo depois de publicado o livro "A Riqueza das Nações" em 1776, de Adam Smith, as ideias contidas no livro fizeram pouco para melhorar a pobreza do mundo.

A pobreza começa a ser realmente reduzida a partir de 1900, e de forma exponencial. 

Milhares de livros já foram escritos sobre o motivo deste crescimento - educação, investimentos do Estado e infraestrutura.

GOVERNO E MERCADO


Se você detesta o estado, leia este livro. Se você ama o estado, leia esse livro!



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INSTRUÇÕES PARA USOSe você detesta o estado, leia este livro. Se você ama o estado, leia esse livro! Estudantes, pesquisadores e demais pessoas instruídas poderão se beneficiar com a leitura de Governo e Mercado. No presente volume, Murray N. Rothbard (1926-1995), usa a teoria econômica para analisar diferentes projetos e propostas visando alterar ou eliminar as soluções de mercado. Num cenário no qual os partidários da ação governamental apresentam inúmeros motivos pelos quais o governo "precisa" fazer isso ou aquilo, Rothbard põe limites às fantasias políticas. Ele demonstra como o estado não é uma entidade benigna que poderá facilmente corrigir os problemas no mundo. Ao contrário, o estado é um aparato imperfeito e inerentemente coercitivo.

O presente livro, após trinta e cinco anos da primeira edição, ainda é a mais sistemática análise da intervenção governamental. Man, Economy, and State [Homem, economia e estado], o principal tratado de Rothbard, descreve as trocas na economia de mercado, ao passo queGoverno e Mercado analisa a economia da intervenção governamental. Rothbard deixa claro que a economia é desprovida de juízos morais, não oferecendo nenhum julgamento ético final, ao mesmo tempo em que, também, aponta como a ciência econômica pode ser utilizada para criticar determinados posicionamentos morais, da seguinte forma: "Caso a autocontradição e a impossibilidade conceitual de execução de uma finalidade ética possam ser demonstradas, então nitidamente tal fim é um absurdo e deve ser abandonado por todos". Em certos aspectos, o livro poderia ser considerado um dos primeiros exemplos de economia da escolha pública, porque utiliza o instrumental econômico para analisar governo, e certamente elimina as visões românticas sobre a política. No entanto, Rothbard diferia dos economistas da escolha pública, tais como James M. Buchanan e Gordon Tullock — e, a esse respeito, de todos os seus contemporâneos —, pois sempre viu o estado como um agente coercitivo, uma instituição que não foi criada para fazer o bem.

Os capítulos centrais de Governo e Mercado oferecem uma tipologia e debatem os diferentes tipos de intervenção estatal. A intervenção binária ocorre quando o estado interfere diretamente num grupo privado (por exemplo, impostos e gastos do governo), e a intervenção triangular ocorre quando o estado interfere na interação de dois grupos (por exemplo, controles de preços ou regulamentos de produtos). As pessoas estão em melhor situação quando o estado tutela o dinheiro delas contra a sua própria vontade? As pessoas estão em melhor situação quando o estado gasta o seu dinheiro em algo que você não teria comprado por conta própria? As entidades privadas se tornam melhores quando são impedidas de se envolver em trocas que consideram mutuamente benéficas? Dica: A resposta correta é não! Leia os capítulos III, IV e V para ver as análises de Rothbard.

Ao longo desse volume, Rothbard descreve o porquê do governo não ser uma força benigna, como muitos defensores dessa instituição acreditam. O governo é um aparato de coerção que interfere nas relações voluntárias no mercado. Apenas para se ter uma ideia de até onde vai a lógica do autor, Rothbard inicia já no capítulo I com uma argumentação sobre o porquê do governo ser desnecessário! Governo e Mercado é importante pois "é a primeira análise da economia governamental a argumentar que o fornecimento de bens ou serviços não requer a existência de governos". Antes de Rothbard, até mesmo a maioria dos teóricos do livre mercado, tais como Ludwig von Mises (1881-1973), Henry Hazlitt (1894-1993), Ayn Rand (1905-1982) e Friedrich Hayek (1899-1992) pressupunham simplesmente que os serviços, assim como a aplicação da lei, deveriam ser fornecidos pelo estado. Rothbard entende que a aplicação da lei deve ser analisada em termos de unidades marginais e, como outros bens, essas unidades podem ser fornecidas por agentes privados. Ele menciona brevemente alguns exemplos históricos da aplicação privada da lei e, em seguida, especula como um sistema puramente privado poderia funcionar. A proposta de Rothbard é demasiado utópica? Ele responde:

O conceito apresentado é bem mais funcional do que a ideia verdadeiramente utópica de um governo rigorosamente limitado; uma ideia que nunca funcionou na história. E é muito compreensível, pois o monopólio da agressão e a ausência de freios de mercado inerentes à estrutura estatal, possibilitaram a destruição de quaisquer amarras que indivíduos bem intencionados tentaram aplicar a um governo limitado

O anarquismo libertário de Murray Rothbard influenciou muitos pensadores subsequentes, que, desde então, escreveram vários artigos e livros sobre o porquê do governo ser desnecessário.


Além de desbravar novos caminhos na sua época, o livro é extremamente relevante para a economia política hoje. Por exemplo, o capítulo final de Governo e Mercado é uma crítica contundente da ética antimercado, que se manteve como resquício de uma visão pré-moderna e que vem ganhando popularidade em nossos dias. Tomemos como exemplo a visão de muitos economistas comportamentais que argumentam que a sociedade não deve confiar no livre mercado, porque as pessoas nem sempre sabem o que é melhor para elas. Rothbard concorda que muitas vezes as pessoas cometem erros, mas discorda se isso é motivo para a existência do paternalismo. Se as pessoas não sabem o que é melhor para elas, como podem estar aptas para eleger líderes que tomarão as decisões por elas? O livro serve para desmitificar a visão popular de muitos economistas da escolha pública que argumentam em favor da aplicação da coerção governamental porque a natureza humana é imperfeita. Rothbard concorda que os homens não são anjos, mas isso não justifica, para ele, o governo. Se os seres humanos são tão ruins, como podemos esperar que um governo coercitivo composto de seres humanos melhore a situação? Rothbard adota esses argumentos e muitos mais.

Em Governo e Mercado, nenhum aspecto da intervenção governamental é poupado. Os argumentos de Rothbard podem servir como uma pausa e meio de reflexão para as pessoas que desejam resolver os problemas sociais usando meios políticos. Para Rothbard, o estado não é perfeito, desejável, ou necessário, é totalmente o oposto! O estado, em todas as suas formas, é prejudicial para a sociedade civil, e se realmente queremos melhorar o mundo, devemos olhar para além do governo. Soluções reais não estão no poder político, mas nas forças do livre mercado.

[1] O presente volume foi originalmente escrito como a terceira e última parte do manuscrito de 1.500 páginas deMan, Economy and State.  O tamanho do manuscrito e o fato das conclusões políticas de Rothbard divergirem das visões dominantes sobre a análise do papel do governo na sociedade foram demais para alguns, por isso, Man, Economy, and State Power and Market foram publicados como volumes separados em 1962 e em 1970.  Ver: STROMBERG, Joseph. "Introduction to Man, Economy, and State with Power and Market". In: ROTHBARD, Murray N. Man, Economy, and State with Power and Market: Scholar's edition. Auburn: Mises Institute, 2004. pp. lxv—lxxi.
[2] ROTHBARD. Power and Market. p. 251. Na presente edição, Capítulo VI (primeiro parágrafo).
[3] A visão dos economistas da Public Choice [escolha pública] sobre o governo e a anarquia são apresentados em: STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy, State, and Public Choice. Cheltenham: Edward Elgar, 2006.
[4] ROTHBARD. Power and Market. p. 9. (Capítulo I).
[5] Ver por exemplo: BARNETT, Randy. The Structure of Liberty: Justice and the Rule of Law. Oxford: Clarendon Press, 1998; BENSON, Bruce. The Enterprise of Law: Justice Without the State. San Francisco: Pacific Research Institute for Public Policy, 1990; BENSON, Bruce. To Serve and Protect: Privatization and Community in Criminal Justice. New York: New York University Press, 1998; HOPPE, Hans-Hermann. Theory of Socialism and Capitalism. Boston: Kluwer, 1989; HOPPE, Hans-Hermann. Democracy — The God That Failed: The Economic and Politics of Monarchy, Democracy, and Natural Order. New Brunswick: Transaction Publishers, 2001; HOPPE, Hans-Hermann. (Ed.). The Myth of National Defense: Essays on the Theory and History of Security Production. Auburn: Mises Institute, 2003; DE JASAY, Anthony. Against Politics: On Government, Anarchy, and Order. London: Routledge, 1997; STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy, State, and Public Choice. Cheltenham: Edward Elgar Publishing, 2006; e STRINGHAM, Edward (Ed.). Anarchy and the Law: The Political Economy of Choice. New Brunswick: Transaction Publishers, 2006.
[6] THALER, Richard H. & SUNSTEIN, Cass R. "Libertarian Paternalism". American Economic Review, Volume 93, Number 2 (May 2003): 175-79.
[7] ROTHBARD. Power and Market. p. 254. (Capítulo VI).
[8] Ver: McGUIRE, Martin C. & OLSON, Mancur. "The Economics of Autocracy and Majority Rule: The Invisible Hand and the Use of Force". Journal of Economic Literature, Volume 34, Number 1 (March 1996): 72-96. O argumento libertário sobre o ponto de vista dos economistas da escolha pública aparece na já citada obraAnarchy, State, and Public Choice organizada por Edward Stringham.
[9] ROTHBARD. Power and Market. p. 260. (Capítulo VI). Ver também: POWELL, Benjamin & COYNE, Christopher. "Do Pessimistic Assumptions About Human Behavior Justify Government?" Journal of Libertarian Studies, Volume 17 (Fall, 2003): 17-38.
[10] A abrangência de muitos tópicos impediu que Rothbard descesse a minúcias em qualquer um deles. Essa amplitude de tópicos, no entanto, é parte do atrativo do livro.  Desta perspectiva, a obra de Rothbard pode ser vista como um trampolim para o aprofundamento de muitos tópicos do moderno libertarianismo.  Rothbard escreveu: "A argumentação ao longo deste livro é, primariamente, teórica. Não foi feita nenhuma tentativa de enumerar exemplos institucionais de intervenção governamental no mundo de hoje, uma tentativa que, é claro, iria requerer muitíssimos volumes" (Power and Market [1970], p. vii).  A boa notícia é que o salvo-conduto inicial de Rothbard deu aos estudiosos do libertarianismo de hoje oportunidade para ilustrar ou ampliar as ideias teóricas de Governo e Mercado.  Por exemplo, muitos de meus artigos sobre a coercibilidade das regras privadas tentam mostrar exatamente isso: STRINGHAM, Edward. "Market Chosen Law". Journal of Libertarian Studies, Volume 14, Number 1 (Winter, 1998-1999): 53-77; STRINGHAM, Edward. "The Emergence of the London Stock Exchange as a Self-Policing Club". Journal of Private Enterprise, Volume 17, Number 2 (2002): 1-19; STRINGHAM, Edward. "The Extralegal Development of Securities Trading in Seventeenth Century Amsterdam". Quarterly Review of Economics and Finance, Volume 43, Number 2 (Summer, 2003): 321-44; BRYAN, Caplan & STRINGHAM, Edward. "Networks, Law, and the Paradox of Cooperation". Review of Austrian Economics, Volume 16, Number 4 (December 2003): 309-26; STRINGHAM, Edward. "Overlapping Jurisdictions, Proprietary Communities, and Competition in the Realm of Law". Journal of Institutional and Theoretical Economics, Volume 162, Number 3 (September 2006): 516-34.

[Este artigo foi extraído do prefácio do livro Governo e Mercado: a economia da intervenção estatal, que está sendo lançado hoje pelo Instituto Ludwig von Mises Brasil]
Edward P. Stringham ocupa a cadeira Lloyd Hackley Endowed de Estudos Sobre o Capitalismo e Livre Iniciativa na Fayetteville State University. Mande um e-mail para ele.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

SEXTA LIÇÃO

Dez lições de economia para iniciantes - Sexta lição: lucros, perdas e empreendedorismo

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Duas das palavras mais amaldiçoadas pelos socialistas e comunistas são: lucro e empresário. Essa gente, entre os quais muitos professores de História, cujos conhecimentos de economia são nulos, repetem como papagaios que os que ganham lucros são ladrões, exploradores do povo, tubarões e outras bobagens desse gênero; da mesma forma identificam os empresários, pois, afinal, são eles que ganham lucros...

Pois saiba você que a pessoa que inventou o computador pessoal e as que o aperfeiçoaram, assim como as que desenvolveram a Internet, ganharam muitos milhões de lucros por suas invenções e que, se não fossem esses "ladrões e exploradores", você e muitos milhões de pessoas no mundo inteiro não teriam acesso a muitas facilidades que tornaram a sua vida muito mais interessante do que na época em que não existiam computadores pessoais e nem Internet! Então, sempre que alguém xingar gratuitamente os empresários ou falar mal dos lucros, pense nisso e dê esse exemplo. Garanto que essa pessoa ficará desconcertada e não terá argumentos para rebater a verdade que você lhe disse.

Os lucros representam a remuneração dos empreendedores, que são aqueles empresários que, por meio de sua ação nos mercados, criam novas informações e as transmitem, coordenam as ações dos agentes econômicos, e descobrem oportunidades de lucros. Os verdadeiros empreendedores precisam estar em permanente estado de alerta, de vigilância e de atenção.

Entenda o que significa dizer que os empreendedores "coordenam as ações dos agentes": quando eles descobrem que podem comprar barato certo recurso para revender esse recurso a um preço maior, eles fazem com que o comportamento que era descoordenado dos donos desse recurso passe a ser coordenado com o comportamento de quem precisa desse recurso. Ao fazer isso, eles estão empreendendo.

Quanto mais forte for a atividade dos empreendedores, maiores serão as novas descobertas de meios e fins, a criatividade e a coordenação e, portanto, mais dinâmica e eficiente será a economia.

Intervencionismo e empreendedorismo são estados contraditórios. Não admitem meios termos, da mesma forma que não há meio termo entre chover e não chover: ou está chovendo ou então não está; ou há empreendedorismo ou intervencionismo. Infelizmente, poucos percebem isso e a imensa maioria das pessoas, incluindo muitos empresários, crê que intervencionismo e empreendedorismo podem conviver na geração do progresso. O empreendedorismo brota do espírito criativo dos indivíduos, que os leva a assumir riscos para criar mais riqueza. Para que possa florescer, depende de quatro atributos: governo limitado, respeito aos direitos de propriedade, leis boas e estáveis e economia de mercado. Quanto mais uma sociedade afastar-se desses pressupostos, mais sufocada ficará a atividade de empreender e mais prejudicada a economia, pois não se conhece exemplo de desenvolvimento econômico sem a presença de empreendedores. Neste artigo, enfatizamos os efeitos do intervencionismo.

Podemos definir empreendedorismo ou função empresarial como o atributo individual de perceber as possibilidades de lucros ou ganhos eventualmente existentes. Ora, como isso se constitui em uma categoria de ação, esta pode ser encarada como um fenômeno empresarial, que põe em destaque as capacidades perceptiva, criativa e de coordenação de cada agente. O empreendedor é aquele indivíduo que percebe que uma determinada idéia poderá lhe proporcionar ganhos e se empenha para desenvolvê-la na prática. O fato de esse indivíduo ser ou não um empresário (no sentido de ser diretor ou dono de uma empresa), no momento em que nasce sua boa idéia, não é, portanto, relevante para que possamos defini-lo como empreendedor.

Um dos aspectos mais importantes do conceito de empreendedorismo ou função empresarial é que o empreendedor não é meramente a mola propulsora de uma economia de mercado, mas um produto exclusivo da economia de mercado. Em outras palavras, só pode existir empreendedorismo onde houver economia de mercado, uma vez que o processo de descoberta que caracteriza os mercados livres e que exige um permanente estado de sagacidade para descobrir as necessidades específicas dos consumidores não pode ser substituído pelo planejamento, por computadores, por reuniões da "sociedade civil", por "movimentos sindicais", por "câmaras setoriais" ou por "soluções" políticas.

Há diferenças entre empresário e empreendedor: diversas categorias de pessoas podem ser consideradas como "empresários": sindicalistas, diretores de "empresas" estatais, herdeiros de empresas que não trabalham, ou envolvidos em "atividades empresariais políticas" (como os lobistas), enquanto o que caracteriza o empreendedor é a percepção da oportunidade de ganho, mesmo que ele não possua um simples centavo ou não detenha qualquer poder.

Para que você compreenda de uma vez por todas o papel dos empreendedores, repito em seguida o exemplo de meu artigo João, Maria, José, Empreendedorismo e Intervencionismo, publicado em 28 de setembro de 2010.


Consideremos dois agentes, João e Maria. Cada um deles possui um conjunto próprio e peculiar de informações que o outro não possui. Ora, um observador externo, por exemplo, um terceiro agente, pode afirmar com razão que existe um conhecimento que ele, como observador, não tem, e que se encontra disperso entre João e Maria, significando com isso que João detém uma parte dele e Maria a outra parte. Há casos em que, para alcançar determinado fim, o agente necessite apenas de seu conjunto pessoal de informações, sem necessidade de ter que relacionar-se com outros agentes.

Mas estes casos são minoria no mundo real, em que a maior parte das ações envolve uma complexidade muito maior. Por exemplo, suponha que João pretende alcançar um fim FJ, para o qual precisa utilizar um meio MJ que não está à sua disposição e que, além disso, ele não saiba como obtê-lo. Admitamos também que Maria pretenda alcançar um fim FM, diferente de FJ e que tenha à sua disposição uma quantidade razoável do meio MJ tão útil para João, mas que para ela não seja importante. Porém, Maria não sabe que esse meio é importante para João e este não sabe que Maria o possui e, ainda, que não pretende utilizá-lo. O que acontece neste exemplo sucede também na maioria das situações reais: o fato dos fins FJ e FM serem contraditórios, ou seja, cada agente busca fins diferentes, com intensidades também diferentes e com um conjunto relativo de informações, no que diz respeito a eles e aos meios utilizáveis. Há, claramente, um desajuste e uma ausência de coordenação, motivados pela dispersão do conhecimento e que só desaparecerão por meio do exercício da função empresarial, ou empreendedorismo.

Suponhamos agora que um terceiro agente — José — percebe a situação de falta de coordenação que foi descrita e se disponha a exercer o empreendedorismo, quando descobre a possibilidade de obter um lucro se procurar Maria, para quem o meio MJ não tem utilidade e propor-lhe que o venda por, suponhamos, R$80.000,00. Sem dúvida, um excelente negócio para Maria, que atribuía ao meio um valor zero ou próximo de zero. Após comprar MJ de Maria, José procura João, que está interessado nele para que possa alcançar o seu fim FJ e lhe propõe vendê-lo por, suponhamos, R$100.000,00. Observe que José não precisa necessariamente possuir recursos para comprar o meio, bastará que tome um empréstimo cujos juros compensem o negócio. Assim, José conseguiu obter do nada — ex nihilo — um lucro empresarial puro de R$ 20.000,00 do meio MJ. Em consequência, a ação empresarial de José produziu três efeitos: primeiro, criou nova informação, novo conhecimento; segundo, transmitiu esse novo conhecimento no mercado; e terceiro, ensinou os outros dois agentes a agirem em um processo de dependência recíproca.

A criação empresarial de conhecimento representa uma transmissão instantânea dessa informação nos mercados. José não apenas transmitiu a Maria a informação de que o recurso MJ, que ela possuía, mas ao qual não atribuía valor, era importante para alguém e que não havia, racionalmente, razão para desperdiçá-lo, mas também transmitiu a João a informação de que poderia prosseguir com a ação para alcançar o seu objetivo FJ e que poderia ter sido abandonada pela falta do meio adequado. O exemplo ilustra também a importância do sistema de preços como um transmissor de informações muito eficiente, que se espalha sucessivamente por todo o processo de mercado, eliminando a falta de coordenação. José, que apenas percebeu que o recurso MJ possuía valor para João, embora não tivesse valor para Maria, nada mais fez do que transmitir ao mercado essa sua percepção, agindo como um empreendedor e auferindo um lucro.

Observemos também que o conjunto relevante de informações tem natureza essencialmente subjetiva, porque depende daqueles agentes empreendedores que sejam capazes intuitivamente de descobri-lo. Mesmo aquele tipo de informações ou de conhecimento que é geralmente encarado como "objetivo", como os próprios preços, por exemplo, é na realidade gerado por informações subjetivas, como a que levou José a procurar Maria, propor-lhe a compra do meio e, depois, a procurar João e dizer-lhe que estava disposto a vendê-lo.

Mas não foram apenas João, Maria e José que ficaram satisfeitos com a ação empreendedora do último. Suponhamos que o fim de João era abrir uma oficina de mecânica de automóveis em uma determinada rua de um bairro, que o meio de que necessitava era um terreno e que Maria tenha herdado de uma tia um terreno baldio nessa mesma rua, que só lhe estava causando custos com as taxas e impostos escorchantes que o município lhe cobrava. Maria e João não se conhecem, mas eis que surge José que, conhecendo os desejos de ambos, percebe uma boa oportunidade de ganho se comprar o terreno de Maria por R$ 80.000,00 (valor que ele possui em uma conta poupança) e revendê-lo para João por um valor maior. Maria vende o terreno para José por aquele valor e José consegue revendê-lo para João por R$ 100.000,00. Admitamos, por fim, que João, de posse do terreno, abra a sua oficina e, com isso, dê emprego para cinco pessoas que se encontravam desempregadas.

Observemos quantos indivíduos ganharam com a idéia que José conseguiu levar adiante. Primeiro, o próprio José, que lucrou R$ 20.000,00; depois, Maria, que, além de ver-se livre das despesas com o terreno, embolsou, em termos brutos, R$ 80.000,00; em terceiro lugar, João, que pode finalmente realizar o seu desejo de ser proprietário de uma oficina mecânica e que poderá obter lucros com o seu funcionamento; e, por fim, os cinco empregados do novo negócio e, obviamente, as suas famílias, que — admitamos - totalizavam, somando as esposas e os três filhos de cada um, vinte pessoas. Portanto, o empreendedorismo de José beneficiou, ao fim e ao cabo, ele mesmo, João, Maria, os cinco mecânicos e mais vinte pessoas, ou seja, vinte e oito pessoas.

Notemos que José, para colocar em prática a sua idéia, nem precisava dispor dos R$ 80.000,00 necessários para comprar o terreno de Maria, bastando que tomasse um empréstimo nesse valor e que o total de juros que teria que pagar pela operação fosse inferior ao ganho obtido com a revenda do terreno para João. Vemos, então, que o empreendedor não precisa ser alguém necessariamente rico, mas alguém que tenha criatividade, inventividade - ideias, enfim.

Ora, se isto acontece em um pequeno negócio como o desse exemplo simples, podemos imaginar a amplitude dos benefícios proporcionados pelos grandes negócios, que envolvem a geração de empregos de centenas e de milhares de pessoas. No entanto, a cultura antiempresarial insiste invariavelmente em associar os grandes negócios a fraudes, negociatas e "maracutaias", em que apenas os "empresários" obtêm lucros e sempre a partir da "exploração" alheia...

Assim, José, o empreendedor inicial (aquele que teve a ideia), conseguiu obter um lucro empresarial bruto de R$ 20.000,00. Mas Maria, de imediato, já ganhou R$ 80.000,00 e poderá, ao longo do tempo, ganhar mais do que o lucro de José, caso aplique bem o seu dinheiro. Da mesma forma, o negócio de João, que lhe custou R$ 100.000,00 pela compra do terreno, fora os custos com máquinas, empregados e a construção de um galpão, entre outros, depois de algum tempo, compensará os seus custos fixos e variáveis de abrir e manter a oficina. A ação empresarial de José produziu vários efeitos: criou nova informação; transmitiu essa informação ao mercado; coordenou os planos de João com os de Maria; deu emprego para cinco mecânicos; beneficiou suas famílias; e aumentou a competição no setor de mecânica de automóveis, porque criou mais uma empresa e, portanto, beneficiou também os proprietários de carros.

Espero que este exemplo simples tenha ajudado você a compreender a importância do empreendedorismo. Note que, no exemplo, tudo deu certo para José, o empreendedor. Mas e se não desse? Se, por exemplo, ele pagasse os R$80.000,00 pelo terreno de Maria, mas não conseguisse revendê-lo para João pelos R$100.000,00, mas apenas por R$76.000,00? Bem, nesse caso, ele incorreria em uma perda ou prejuízo: R$4.000,00 (perda direta, que pode ser medida) mais as perdas representadas pelo tempo que perdeu fazendo os dois negócios (perdas indiretas, que não podem ser calculadas).

A maioria das pessoas só olha para os lucros ganhos pelos empreendedores, mas se esquecem de que eles correm muitos riscos, sendo os principais os riscos de seus empreendimentos não darem bons resultados e isso lhes causar perdas.

Depois de todas essas observações, espero que tenha ficado bastante claro para você que um das condições, talvez a principal delas, para que uma economia se desenvolva é a liberdade de empreender, sem qualquer interferência do estado. Podemos, então encerrar com as palavras de um campeão da lógica e da liberdade, Ludwig von Mises, no artigo citado nas sugestões de leitura em seguida:

Aqueles empreendedores que se mostrarem incapazes de produzir, da melhor e mais barata maneira possível, os bens e serviços que os consumidores estão demandando com mais urgência, sofrerão prejuízos e serão, em última instância, eliminados de sua posição empreendedorial. Outros empreendedores que tenham maior capacidade administrativa e que saibam melhor como servir aos consumidores substituirão estes que fracassaram.

Ubiratan Jorge Iorio é economista, Diretor Acadêmico do IMB e Professor Associado de Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).  Visite seu website.

COMPETITIVIDADE: DESAFIO BRASILEIROS


O Brasil avança, mas ainda está no meio do caminho
Problemas de infraestrutura, impostos e educação deixam o País em situação ruim em rankings internacionais de competitividade


O transporte de uma tonelada de soja produzida no norte de Mato Grosso para Xangai, na China, passando pelo Porto de Santos, pode chegar a US$ 180, segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em comparação, levar uma tonelada de soja de Davenport, nos Estados Unidos, para a mesma cidade chinesa custa US$ 108. Na fazenda, o produto brasileiro é mais barato, mas acaba se tornando mais caro por causa da deficiência logística. O custo do transporte representa 19% do valor final do produto americano, comparado a 30% do brasileiro.

O gargalo da infraestrutura, no entanto, é apenas um dos problemas que afetam a competitividade do Brasil. "A questão da competitividade está razoavelmente bem diagnosticada", afirma o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da consultoria MB Associados.


"Não era tão clara há dois ou três anos, mas, ao longo do tempo, nos levou a uma grande convergência." Além da infraestrutura, ele aponta a complexidade do sistema tributário e a alta carga de impostos, a capacitação inadequada da mão de obra e a baixa qualidade da educação como pontos fundamentais que precisam ser melhorados para que o Brasil possa competir com mais sucesso no mercado global.

Os rankings globais de competitividade mostram um país no meio do caminho. No relatório mais recente do Fórum Econômico Mundial, o Brasil ficou em 48.º lugar, entre 144 países analisados. Outro estudo, feito pela Economist Intelligence Unit (EIU), mostrou o Brasil na 37.ª posição entre 82 países. Existe um contraste grande entre o posicionamento do País nesses rankings e o tamanho de sua economia, a sexta maior do mundo.

Num evento da Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação, em São Paulo, Justine Thody, diretora para as Américas da EIU, mostrou uma nova versão da famosa capa de uma edição de 2009 da Economist, em que o Cristo Redentor decolava como um foguete. A afirmação da capa original – "Brazil takes off" (Brasil decola) – ganhou um ponto de interrogação.

Segundo Justine, o Brasil foi o país que teve o crescimento mais prejudicado pela crise mundial entre os Brics (sigla que também inclui Rússia, Índia e China). "Também é o que tem a economia mais fechada", destacou. Ela mostrou o desempenho de um segundo grupo de países em desenvolvimento, chamado Civets (sigla em inglês de Colômbia, Indonésia, Vietnã, Egito, Turquia e África do Sul), que vem registrando um crescimento maior que o brasileiro.

Na lista do Fórum Econômico Mundial, o Brasil ganhou cinco posições no último ano, ficando pela primeira vez entre os 50 primeiros. O avanço se deu principalmente por melhoras na condição macroeconômica e na ampliação do uso de tecnologias da informação e comunicação. Entre os pontos positivos, o relatório destacou a sofisticação da comunidade de negócios do País (33.º lugar), em um dos maiores mercados internos do mundo (7.º). Entre os pontos negativos, estão a confiança nos políticos (121.º), a excessiva regulação do governo (144.º) e o desperdício de gastos públicos (135.º). A qualidade da infraestrutura de transportes ficou em 79.º lugar e a da educação em 116.º.

A pesquisa mostrou as regulações tributárias como o fator mais problemático para fazer negócios no Brasil, sendo apontado em 18,7% das respostas. Em segundo lugar, veio a oferta inadequada de infraestrutura (17,5%), seguida da carga tributária (17,2%), da burocracia governamental ineficiente (11,1%) e das regulações trabalhistas restritivas (10,1%).

Gargalos. Os impostos brasileiros não são somente altos. Também é complicado pagá-los. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), a carga tributária brasileira, que está próxima de 36% do Produto Interno Bruto (PIB), é a quarta maior do mundo, ficando atrás somente de Suécia, Noruega e Dinamarca. O excesso de regulação exige que as empresas cumpram 97 obrigações contábeis, o que representou, em 2011, um custo médio de 1,5% de seu faturamento.

"As empresas gastam muito nas chamadas informações parafiscais, que as empresas são obrigadas a enviar para a Receita", disse o economista Mendonça de Barros. Ele destacou que, se o Fisco simplificasse e tornasse mais claros os regulamentos, se reduzisse a quantidade de relatórios que as empresas precisam fornecer, já haveria um aumento de competitividade, mesmo sem mexer na carga tributária.

Recentemente, o governo anunciou um pacote de concessões que prevê o investimento de R$ 133 bilhões em ferrovias e rodovias federais. Para o professor Carlos Arruda, da Fundação Dom Cabral, tudo vai depender da execução. "Nos últimos anos, houve projetos fantásticos de infraestrutura, que não foram implementados", disse. A Fundação Dom Cabral é parceira do Fórum Econômico Mundial na elaboração do estudo sobre competitividade.

Boa parte dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) está atrasada por problemas como falta de licenciamento ambiental e indícios de irregularidades. Em 2011, o investimento brasileiro em infraestrutura cresceu apenas 2%, chegando a R$ 173 bilhões, de acordo com a Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).

Na área da educação, existe um problema emergencial, que é a falta de engenheiros e de profissionais com formação em ciências no Brasil. O grande desafio, no entanto, é aumentar a qualidade do ensino, principalmente do ensino fundamental.

O resultado mais recente do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mostrou que o Brasil está abaixo da média dos países avaliados em leitura, ciências e matemática e que, nas três áreas, mais da metade dos estudantes não consegue passar do nível mais básico de compreensão.

O programa avalia jovens com 15 anos completos. "Países como Coreia do Sul e China cresceram com investimento na educação", destacou o professor Carlos Arruda. "Mas o avanço nessa área demora uma geração."

O transporte de uma tonelada de soja produzida no norte de Mato Grosso para Xangai, na China, passando pelo Porto de Santos, pode chegar a US$ 180, segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em comparação, levar uma tonelada de soja de Davenport, nos Estados Unidos, para a mesma cidade chinesa custa US$ 108. Na fazenda, o produto brasileiro é mais barato, mas acaba se tornando mais caro por causa da deficiência logística. O custo do transporte representa 19% do valor final do produto americano, comparado a 30% do brasileiro. Por: Renato Cruz, especial para O Estado de S. Paulo

EXAME DE ABELHAS


"Vou me pintar de afrodescendente", gritou irritado um amigo meu carcamano, um apelido carinhoso que espero nunca ser considerado assédio cultural.

Às vezes, à noite, sou atormentado pelo que dizia Paulo Francis: os "frouxos venceram", não vamos poder pensar, dizer, criar, intuir mais nada que não esteja na cartilha dos autoritários. Sob o signo dos ofendidos, cala-se a alma, o humor e a inteligência. Antes era em nome do racismo nazista, do novo homem comunista, das heresias, agora é em nome dos "ofendidos".

Este meu amigo, normalmente, é uma pessoa doce, mas às vezes perde as estribeiras. Outro dia, acabou indo com a esposa e as duas filhas, num domingão quente pra burro, ver a Bienal no Ibirapuera.

Parou o carro longe (claro, trânsito infernal, sem lugar para parar o carro, e chamam isso de lazer...) e teve que fazer as três meninas andarem até o pavilhão sob o Sol, obviamente o culpando por tudo.

A mulher sempre culpa o marido por tudo de forma tranquila e sem pudores. Estas queixas vêm seguidas de beijos, sorrisos e sexo, quando passa a irritação, que numa mulher passa na mesma velocidade da luz em que ela cai no tédio.

Aprendeu uma dura lição: Ibirapuera domingo é para iniciantes (a menos que chova, aí é legal...), pior quando tem Bienal porque aí se junta o povo que quer ter saúde com o povo que quer fingir que gosta de arte. O mundo está dividido em dois grupos: os que gostam de arte e os que gostariam de gostar de arte.

O mesmo vale para jazz, blues e música erudita.

Outro dia ele foi fazer aquele negócio chamado "controlar", mais uma taxa para pagarmos. Esta é "verde". O burocrata técnico recusou seu carro por um detalhe qualquer. Daí, ele teve que começar tudo de novo. A vida, passo a passo, se torna uma teia infernal de controles.

O melhor é não ter carro, não dar emprego a ninguém, não casar, não ter filhos, enfim, negar investimento a um mundo controlado pelos "babacas do bem".

Mas não é disso que quero falar, mas sim da irritação do meu amigo carcamano com o novo edital racista do Ministério da Cultura. Todo mundo ouviu falar do edital para afrodescendentes (não ouso usar qualquer outra expressão por medo de ter minha vida destruída pelos "amantes da liberdade").

Enquanto esses tecnocratas ideológicos não conseguirem criar de fato racismo à la Ku Klux Klan no Brasil, não sossegarão.

A indústria do assédio jurídico cresce e os amantes da liberdade que tanto criticam a maldita ditadura e pedem uma Comissão da Verdade só para um dos lados, gozam com as novas formas de autoritarismo que empesteiam nossas vidas.

O apartheid do bem é a nova invenção do governo. Tanta gente morreu na Segunda Guerra Mundial, tanta gente morreu na mãos dos comunistas, e o fascismo venceu assim como um enxame de abelhas vence: começa devagar, você achando que está lutando apenas contra uma, mas, zumbindo, elas invadem sua casa e sua vida.

No mesmo processo, querem proibir Monteiro Lobato. Adianto que não gosto da obra de Monteiro Lobato, nem ela me marcou na infância. Preferia as aventuras de Abraão, Moisés e Deus. Mas meu gosto pouco importa.

Por que não fazem esses fascistas assistirem à famosa cena em que nazistas queimavam livros na Alemanha de Hitler? O que esses tarados não entendem é que os nazistas também achavam que tinham um bom motivo e que aqueles livros degeneravam as novas gerações. Alguma semelhança?

E ainda, para piorar, quem paga essa farra fascista somos nós. O governo e sua máquina imoral de arrecadação de impostos, este sócio parasita de cada pessoa que trabalha no país, alimenta tecnocratas aos montes deixando que inventem medidas discriminatórias dizendo que são do bem.

O argumento de que somos todos culpados pela escravidão é falso. Não conheço, no meu círculo de pessoas, ninguém que tenha tido escravos ou ganhado dinheiro com a escravidão ou coisa parecida.

Melhor seria este governo fascista criar uma educação decente de uma vez por todas para acabar com a pobreza cultural do país em vez de ressuscitar medidas racistas.
Por: Luis Felipe Pondé  Folha de SP

O PROTECIONISMO PODE ELEVAR SALÁRIOS?


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Investiguemos se ocorre ou não uma injustiça para com você quando o governo legislativamente decide determinar de quem você pode comprar os bens dos quais necessita — pão, carne, roupas ou artigos de cama e mesa —, bem como a escala artificial dos preços que você deve adotar em suas transações.

Seria verdade que o protecionismo, o qual admitidamente encarece os produtos que você compra e, nesse sentido, lhe impõe uma perda, aumenta proporcionalmente os seus salários? 

O que determina os salários?

Falando simplificadamente, porém ainda assim realisticamente, quando dois trabalhadores correm atrás de um empregador, os salários caem; quando dois empregadores vão atrás de um trabalhador, os salários sobem.

Em prol da brevidade, permita-me fazer uso desta fórmula um tanto científica, embora, talvez, não muito clara: os salários dependem da proporção entre a oferta de mão-de-obra e a demanda por ela.

Agora, o que determina a oferta de mão-de-obra?

O número de indivíduos em busca de emprego. Apenas isso. E, em relação a este fator, o protecionismo não possui efeito algum. Aumentar ou diminuir tarifas não altera a quantidade de pessoas economicamente ativas em uma economia.

E o que determina o nível dos salários?

Todo o capital disponível em uma nação — isto é, a quantidade e a qualidade de ferramentas que auxiliam o trabalhador a efetuar seu trabalho, tornando-o mais produtivo. Quanto maior a quantidade de capital disponível, maior tende a ser o salário do trabalhador.

Mas será que uma lei que diz que "Não mais adquiriremos determinado produto do exterior; vamos fabricá-lo nacionalmente" pode aumentar o capital? Nem sequer infimamente. Tal lei pode, no máximo, alterar o emprego do capital, retirando-o de um setor e direcionando-o para outro setor; mas ela não pode efetuar a mágica de aumentar a quantidade de capital disponível. Consequentemente, se tudo o que houve foi um rearranjo de capital, esta lei não pode elevar a demanda geral por mão-de-obra.

Escolha o leitor um setor manufatureiro que lhe dá orgulho. O capital que ele utiliza e que o mantém caiu da lua? Não. Este capital foi retirado da agricultura, do setor marítimo, da produção de bebidas. E é por essa razão que, sob o sistema de tarifas protecionistas, existem mais trabalhadores em nossas minas e em nossas cidades industriais, e menos marinheiros em nossos portos e menos agricultores em nossos campos e vinícolas. Eu poderia discorrer detalhada e longamente sobre este assunto, mas prefiro explicar meu ponto com um exemplo.

Um homem do campo possuía 20 acres de terra, no quais ele trabalhava com um capital de $400. Ele dividiu sua terra em quatro partes e estabeleceu o seguinte esquema de rotação de culturas: 1º, milho; 2º, trigo; 3º, erva; 4º, centeio. Ele destinava à sua própria família apenas uma porção moderada dos grãos, da carne e do leite que sua fazenda produzia, e vendia todo o excedente para comprar azeite, linho, vinho etc. Todo o seu capital era gasto anualmente em salários, contratações e pequenos pagamentos para os trabalhadores que ofertavam serviços em sua vizinhança. Mas todo este capital era recuperado com a receita das vendas de sua produção. Mais ainda: ele crescia ano após ano. 

Este homem do campo, sabendo perfeitamente que o capital nada produz caso não esteja sendo devidamente utilizado, beneficiava a classe trabalhadora de sua vizinhança ao contratá-la, com seus excedentes anuais, para fazer serviços de manutenção em suas terras, bem como para aperfeiçoar seus instrumentos agrícolas e suas instalações. Ele também possuía uma poupança depositada no banco da cidade mais próxima, cuja gerente, obviamente, utilizava esta poupança para conceder empréstimos para outros empreendedores, de modo que esta poupança se transformava em investimento e renda.

Após um longo tempo, este homem do campo morreu, e seu filho, que o sucedeu, disse para si próprio: "Meu pai foi um tolo durante toda a sua vida. Ele gastava dinheiro comprando azeite sendo que nossa própria terra, com algum esforço, pode passar a produzir azeitonas. Ele gastava dinheiro comprando tecidos, vinho e laranjas sendo que podemos cultivar cânhamo, parreiras e laranjeiras com relativo sucesso. Ele gastava dinheiro com moleiros e tecelões sendo que nós mesmos podemos tecer nossos linhos e moer nosso trigo. Desta forma ele desnecessariamente gastou com estranhos todo o dinheiro que ele poderia ter gasto em nossa própria fazenda."

Iludido por tal raciocínio, o obstinado jovem alterou todo o sistema de rotação de cultura. A terra foi agora dividida em 20 porções. Em uma ele plantou azeitonas, em outra ele plantou amoreiras, em uma terceira ele plantou linheira, em uma quarta ele plantou parreiras, em uma quinta ele plantou trigo, e assim por diante. Ao fazer isso, ele conseguiu suprir sua família com tudo aquilo de que ela necessitava, e por isso passou a se sentir muito independente. Ele não mais adquiria nada de fora da fazenda, o que significa que ele não retirava nada de circulação. Da mesma maneira, ele não mais acrescentava nada à economia.

Ele ficou mais rico por causa disso? Não. O solo não estava adaptado para o cultivo da parreira, e o clima não era adequado ao cultivo satisfatório das azeitonas. Não demorou muito para ele perceber que sua família estava agora menos provida do que na época de seu pai, que, ao comercializar o excedente de tudo o que produzia, conseguia prover fartamente a família com tudo aquilo que ela queria.

E no que diz respeito à classe trabalhadora da sua vizinhança, tais pessoas não tinham agora mais emprego do que antes. Havia de fato cinco vezes mais campos cultivados, mas cada um deles era cinco vezes menor; eles produziam azeite, mas produziam menos trigo; o fazendeiro não mais tinha de comprar linhos, mas também não mais vendia centeio. Adicionalmente, este fazendeiro podia gastar com salários apenas a quantia de seu capital, e seu capital havia diminuído consideravelmente. Uma substancial fatia dele havia sido direcionada para a construção de novas instalações e para a obtenção dos vários instrumentos necessários para os cultivos mais diversificados em que ele agora estava incorrendo. Em suma, a oferta de mão-de-obra permaneceu a mesma, mas dado que os meios de remuneração da mão-de-obra diminuíram, o resultado final foi uma forçosa redução dos salários.

Em uma escala mais ampla, isso é exatamente o que ocorre no caso de uma nação que se isola do mundo ao adotar tarifas protecionistas. É verdade que tal medida pode gerar uma multiplicação de alguns setores específicos da indústria nacional, mas estes passam a apresentar uma escala menor. Esta nação passa a adotar um sistema, por assim dizer, mais complicado de 'rotação de indústrias'. Mas isso não será produtivo porque seu capital e sua mão-de-obra têm agora de lutar contra dificuldades naturais. Uma maior fatia de seu capital circulante, o qual é utilizado para o pagamento de salários, terá de ser convertido em capital fixo (máquinas, equipamentos e instalações). O que sobrar deste capital poderá ser empregado em funções variadas, mas a questão é que a massa total não foi aumentada. É como distribuir a água de um grande reservatório entre vários pequenos reservatórios — uma maior área do solo será coberta e uma maior superfície estará exposta aos raios do sol, e a consequência inevitável é que toda essa água será absorvida, evaporada e perdida mais rapidamente.

A quantidade de capital e de mão-de-obra sendo constante, ambos criarão proporcionalmente uma menor quantidade de mercadorias sempre que tiverem de lidar com mais obstáculos. Não há dúvidas de que, sempre que obstruções internacionais forçarem capital e mão-de-obra a serem canalizados para setores em que haja mais dificuldades com o solo e com o clima, o resultado geral será, inevitavelmente, a criação de menos produtos — o que significa um menor padrão de vida para todos.

O que nos leva à pergunta final. Se o padrão de vida como um todo diminuiu, a fatia dos trabalhadores neste todo aumentou? Ora, se o padrão de vida dos trabalhadores de fato aumentou, como alegam os protecionistas, então isso significa, por definição, que o padrão de vida dos ricos — aqueles que criaram as leis — não apenas diminuiu, como ainda teve de diminuir em uma intensidade maior do que o aumento ocorrido na fatia dos trabalhadores. Isso é possível? Isso é crível? Por isso, fica aqui meu alerta para vocês, trabalhadores: rejeitem essa duvidosa "generosidade". 

O protecionismo serve apenas para encarecer produtos, proteger poderosos contra a concorrência estrangeira, reduzir a acumulação de capital e solapar a divisão do trabalho. E o que é mais importante: os salários gerais, como demonstrado, não terão como ser elevados.

Frédéric Bastiat foi o grande proto-austrolibertário cujas análises polêmicas ridicularizavam todos os clichês estatistas.  Seu desejo primordial como escritor era passar às pessoas, da maneira mais prática possível, a urgência moral e material da liberdade.

domingo, 14 de outubro de 2012

45 ANOS

Hoje, faço 45 anos e tenho muitas razões para estar feliz. Tenho quatro filhos, um rapaz e três raparigas, que amo incondicionalmente e por quem dava a vida num segundo. Estou apaixonado pela minha mulher, e todas as noites me deito ao seu lado de mão dada. Adoro a minha mãe e o meu pai, admiro-os e sobretudo preciso deles, como se ainda fosse uma criança. Tenho três irmãos que todos os dias tenho de saber se estão bem, uma enorme família de tios, tias, primos e primas, sobrinhos e sobrinhas, que faz de cada reunião uma festa divertida e barulhenta, onde as alegrias se multiplicam e as tristezas se dividem. E tenho muitos e bons amigos e amigas, com quem se pudesse ficaria noites inteiras a conversar ou a dançar, até o sol nascer. 

Sim, tenho 45 anos e muitas razões para ser feliz. Já escrevi sete livros, plantei muitas árvores no Alentejo, e conduzi um Ferrari F 40. Faço o que gosto, escrever, e dedico-me à escrita com o entusiasmo com que uma criança se dedica a saltar ao eixo no recreio.

No entanto, hoje não me sinto muito feliz. Nestes tempos, nós somos mais do que o nosso mundo privado, por mais bonito e harmonioso que ele seja. Hoje, sinto à minha volta um país em sofrimento, um país aterrado com o futuro, um país zangado e desesperado. Sinto Portugal à beira de um abismo, e isso estraga-me o meu desejo privado de felicidade. Não é possível sermos completamente felizes quando à nossa volta o nosso país se desmorona, às vezes depressa, outras em câmara lenta, como se a demora da queda a tornasse mais suportável.

Hoje, faço 45 anos mas gostava de fazer 2, para não me dar conta do que se passa, ou 95, para já me ser indiferente o destino do meu país. No entanto, faço 45, o que é idade mais do que suficiente para não esconder a cabeça debaixo da areia e enfrentar com serenidade e lucidez qualquer desafio que a vida me apresente. E é por isso que escrevo isto, os meus pensamentos de hoje, e os quero de partilhar com os meus leitores. Porque há momentos para ficar calado e momentos para falar, há momentos em que devemos deixar o rio correr e outros em que devemos navegá-lo, por mais difícil que isso seja.

Hoje, aos 45 anos, gostava de vos poder deixar uma mensagem de esperança, dizer-vos que acredito que o calvário que atravessamos vai terminar, que já não falta muito. Gostava de vos poder dizer "aguentem", "é só mais um bocadinho", "isto vai melhorar". Gostava mas não consigo, seria uma monumental mentira. Na verdade, e provavelmente como muitos de vós, eu não acredito que por este caminho as coisas vão melhorar. Não acredito que o futuro vá ser melhor, porque não acredito em quem nos conduz.

Nunca fui de esquerda, nem nunca vou ser, nunca votei à esquerda do PSD, nem me parece que algum dia vá votar, mas isso não significa nada. Neste momento, já interessa muito pouco se somos de esquerda ou de direita, se somos conservadores, democratas-cristãos, sociais-democratas, socialistas, liberais ou comunistas. Neste momento, a única coisa que interessa é que somos todos portugueses, e estamos todos com os bolsos cada vez mais vazios e a alma cada vez mais carregada de aflições.

Neste momento, a única coisa que interessa é mostrarmos ao mundo que não queremos mais este caminho tortuoso e inútil que não nos leva a lado nenhum. O que vou escrever, não o escrevo de ânimo leve, escrevo-o com tristeza. Este governo que temos é o mais incompetente dos últimos trinta e tal anos. Erra, e em vez de corrigir os erros, insiste neles e até os amplifica, com uma cegueira aterradora. Está a conduzir Portugal para um desastre colossal, para um poço sem fundo, está a empurrar-nos para um abismo de onde não há regresso.

Não consigo assistir calado a este espectáculo de estupidez lamentável que estamos a presenciar. Se é este o caminho que estes senhores nos têm para oferecer, então que se vão embora e que venha alguém que saiba o que tem de ser feito e o faça. Não acredito que não existam em Portugal portugueses mais competentes do que estes, para nos ajudarem a sair deste buraco. É isto que eu penso, neste dia em que faço 45 anos, dia em que gostava de me sentir mais optimista, porque gosto muito do meu país e é nele que quero continuar a tentar, todos os dias, ser feliz. Por: Domingos Amaral

EU E O LÁPIS