terça-feira, 16 de outubro de 2012

HORA DE COLOCAR O TIME EM CAMPO



Com a Copa das Confederações programada para 2013 no Brasil, o mundo poderá avaliar melhor as condições em que se realizará aqui, em 2014, a Copa do Mundo. O ano de 2013 vai ser um teste importante rumo a 2014 também na economia, mas aqui o desafio será outro: como segurar a inflação. A alta dos preços pode se tornar uma dor de cabeça bem pior do que se imagina. O risco é a inflação ultrapassar o teto oficial de tolerância de 6,5% no próximo ano, e se aproximar da marca de 7%. O consenso entre os analistas tem ficado emperrado perto de 5,5% por um bom tempo. O centro da meta oficial é de 4,5%.

Vários fatores conspiram para empurrar a inflação para cima em 2013. 

- Primeiro, os salários estão crescendo velozmente, acima de qualquer estimativa razoável de ganhos de produtividade, em um mercado de trabalho apertado, com desemprego perto das mínimas históricas. 

- Segundo, as expectativas de inflação estão desancoradas da meta oficial de 4,5%. 

- Terceiro, há o fim de alguns fatores temporários que ajudaram a segurar a inflação em 2012. 

- Quarto, os preços elevados de commodities (alimentos) no mercado internacional. 

- Quinto, não se pode mais contar com muita valorização cambial para conter a inflação, pelo menos enquanto o governo estiver engajado em uma "guerra cambial" contra a valorização do real.

Para começo de conversa, o quadro atual de inflação já não é lá grande coisa. Em sua menor marca recente, a inflação desacelerou para 4,9% em junho. Mesmo no nível mais baixo, a alta ainda corre acima do centro da meta oficial de 4,5%, apesar do crescimento fraco no primeiro semestre e da ajuda de fatores pontuais específicos (redução de IPI sobre automóveis e bens duráveis e a mudança favorável nos critério de pesos para composição da cesta do IPCA).


Em outras palavras, o dilema entre crescimento e inflação parece pior do que o governo gostaria. Entre os fatores a serem avaliados, o agravamento desse dilema pode ser reflexo de uma queda da taxa de crescimento potencial da economia - um tema mais amplo, que não se limita a apenas ao Brasil. Na verdade, como o banco central americano, o Federal Reserve (Fed) disse recentemente, o ritmo moderado da recuperação dos EUA pode estar apontando para uma redução mais substancial na própria trajetória do produto potencial. Em particular, segundo alguns diretores do Fed, esperava-se que a inflação tivesse caído mais nos últimos anos, se a folga aberta pelo desvio da atividade econômica abaixo do "potencial" tivesse sido tão grande como as medidas usuais sugerem. Ou seja, talvez o potencial de crescimento da economia (sem inflação) não seja tão alto hoje em dia como antes se supunha.

Em economias desenvolvidas, como a dos EUA, e em mercados emergentes, como o brasileiro, um tema comum é que a inflação não caiu tanto quanto a desaceleração do crescimento poderia sugerir. Olhando para frente, a lenta recuperação global e a ampla ociosidade nas economias desenvolvidas sugerem que ainda pode demorar algum tempo antes que a inflação se torne uma questão importante para os bancos centrais de mercados desenvolvidos.

No entanto, em mercados emergentes, menor ociosidade na utilização dos recursos da economia e a recuperação mais rápida da economia sugerem que a inflação pode se tornar uma preocupação maior bem antes do que muitos esperam. Esse é o caso do Brasil, temo. Com a economia ganhando fôlego nos próximos trimestres, a tendência subjacente da inflação dificilmente cai muito. Pelo contrário, o risco é a alta dos preços se tornar uma questão mais espinhosa do que se imagina.

O que está errado com o consenso? A projeção praticamente unânime entre os analistas para a inflação de 2013 tinha subido, já há algum tempo, para 5,5%, descolando da previsão inicial de 4,5% que se imaginava inicialmente. Parece ter se difundido a percepção (correta ou não), de que o governo estaria satisfeito com a inflação em algum lugar na banda superior do intervalo de tolerância. Ou seja, em algum lugar entre o centro da meta de 4,5% e o teto de tolerância de 6,5%. A marca de 5,5% fica exatamente no ponto médio dessa banda superior. 

Assim, não é por acaso que o consenso tenha mirado nesse número, como a verdadeira nova meta de inflação na prática, pelo menos na percepção do mercado. Entretanto, o risco pela frente parece ser de inflação maior, a julgar por modelos de projeção sob determinadas hipóteses, assumindo preços de commodities em alta, taxa de câmbio relativamente estável, recuperação forte do crescimento doméstico, mercado de trabalho apertado, e expectativas de inflação ainda acima do centro da meta. Mas e as reduções de impostos, como o corte do custo de energia elétrica, não podem reduzir a inflação? Um problema com esse tipo de medida é que isso certamente ajuda a mitigar temporariamente a medida oficial de inflação, mas não resolve as pressões latentes de inflação. Aspirinas aliviam sintomas, mas não curam doenças.

O foco do mercado financeiro no Brasil deve mudar nos próximos trimestres. Se o tema de 2012 foi "crescimento baixo", talvez o tema em 2013 seja "inflação alta". Ou seja, as preocupações com crescimento fraco na primeira metade de 2012 cada vez mais podem dar lugar a preocupações sobre inflação no ano que vem.

Em resumo, na economia como no futebol, 2013 será um teste importante. Em ambos os casos, será hora de colocar o time em campo.
Marcelo Carvalho é economista-chefe para a América Latina do Banco BNP Paribas.

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