segunda-feira, 1 de outubro de 2012

ALEMANHA NÃO É O PROBLEMA

A primeira fase do projeto de união europeia teve sucesso nos três eixos principais: fazer contraponto à predominância americana, consolidar uma zona única de comércio e usar a unificação econômica para evitar reincidência de conflitos históricos.


O problema começou na segunda fase, de união monetária. Ela estabeleceu limite de deficit nas contas nacionais logo desrespeitado pelas potências centrais, Alemanha e França. Isso abriu as portas ao desrespeito generalizado dos acordos, raiz dos problemas atuais.

Além disso, mercados e investidores cometeram o erro de ver a moeda comum como padronizadora de riscos macroeconômicos, pressupondo que o risco dos países do sul da Europa estava garantido pelos do norte. Os juros do sul europeu se aproximaram das taxas do norte, e aí começaram as diferenças.

Ao contrário de outros países do euro, a Alemanha fez reformas duras para elevar a competitividade e consolidar as finanças públicas, como o aumento das idades de aposentadoria e a redução de direitos trabalhistas.

Mas o problema de união monetária sem união fiscal, previdenciária, trabalhista, bancária e outras é que países de competitividade diferente passam a ter a mesma moeda.

Exemplo dos problemas decorrentes é comparar a inflação de Espanha e Alemanha. Com a mesma moeda, a inflação espanhola superou a alemã em todo o período, elevando os custos espanhóis em relação aos alemães e outros concorrentes. O deficit externo espanhol aumentou e foi financiado por empréstimos com a suposição de que as garantias seriam similares às alemãs. Não eram.

Quando chegou a hora da verdade, sem a possibilidade de seguir elevando a dívida, a Espanha entrou num círculo vicioso, com cortes de despesas e investimentos do governo e do setor privado seguidos de redução da atividade econômica, queda da receita pública e privada, diminuição do emprego.

Outros países que adotaram moedas de terceiros, como a Argentina com o dólar, saíram desse ciclo via desvalorização cambial, opção de custos econômicos e políticos imprevisíveis na zona do euro. A solução agora será mais difícil, o ajuste levará anos.

A solução "fácil", de ajuda da Alemanha sem as reformas estruturais, só aumentaria o problema, pois colocaria os alemães no mesmo caminho do endividamento excessivo.

O ponto positivo da união monetária é a existência de um banco central comum com poder de fogo para manter o sistema econômico funcional enquanto exige a adoção de reformas que aumentem a competitividade. É uma solução lenta e penosa, mas possível. Ou, parafraseando Churchill, é a pior das soluções, tirando todas as outras.

HENRIQUE MEIRELLES escreve aos domingos nesta coluna.

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