quinta-feira, 25 de agosto de 2016

O PAPA E A GUERRA SANTA

- O Ocidente que eles ora aterrorizam deixou-se enfraquecer. Uma combinação de correção política, medo de ofender, medo de lutar e a relutância em perturbar a estabilidade ilusória têm levado a uma incrível série de oportunidades para os jihadistas.


- Baixamos a nossa guarda e nos afastamos. Não porque não dispomos de forças de segurança. Dispomos sim. É porque muitas vezes não dirigimos nossos olhos para as coisas certas: os textos e sermões que promovem a radicalização.

- O Nobre Alcorão nomeia os muçulmanos como guardiões da humanidade, que ainda não atingiu sua maioridade, e lhes concede os direitos de suserania e domínio sobre o mundo a fim de realizar esta sublime tarefa. ... Chegamos à conclusão de que é nosso dever estabelecer a soberania sobre o mundo e guiar toda a humanidade aos legítimos preceitos do Islã e seus ensinamentos..." -- Hassan al-Banna, fundador da Irmandade Muçulmana.

Na manhã de 26 de julho, o Padre Jacques Hamel de 85 anos de idade foi assassinado no altar a facadas, enquanto celebrava a missa, por um dos dois devotos do Estado Islâmico que haviam invadido a igreja. O assassino cortou sua garganta e poderia muito bem tê-lo decapitado, como é o costume de muitos carrascos jihadistas. Os seguidores de uma fé que glorifica os assassinos como mártires (shuhada') criaram um mártir de fé completamente diferente.

Tanto em grego quanto em árabe, os termos "mártir" e shahid significam exatamente a mesma coisa: "testemunha". O Padre Hamel foi o mártir mais recente em uma longa lista de mártires cristãos que foram mortos por homens da violência, teoricamente para dar provas da verdade absoluta de sua fé. Muitos mártires muçulmanos morreram dessa mesma forma, e muitos mais ainda deram suas vidas travando a guerra da (jihad) com o objetivo de conquistar territórios para o Islã. [1]

Na bandeira do estado islâmico está escrito o seguinte: "la ilaha illa'llah, Muhammadun rasulu'llah". Estas palavras querem dizer: "não há outro Deus a não ser Alá; Maomé é o Profeta de Alá". Estas duas frases são conhecidas como a shahada, prestar testemunha. Hoje em dia é possível ouvi-la em todos os lugares, na Síria, de novo na França ou no Reino Unido. Shahada também significa martírio. E martírio durante um ato de violência é que os assassinos de um homem de Deus, inocente, alcançaram naquele dia quando policiais armados os encontraram e os mataram fora da igreja que eles haviam profanado.

No dia seguinte, o Líder da Igreja Católica Papa Francisco, emitiu um comunicado sobre o acontecido e por um momento parecia que ele finalmente tinha feito a coisa certa. Ele disse que o mundo estava em guerra. Décadas depois da guerra ter começado, estávamos diante de um líder religioso e político que parecia ter despertado para o fato de que os países ocidentais foram involuntária e ineficazmente deixando de travar a guerra contra o radicalismo islâmico. Ou talvez seja mais correto dizer que o radicalismo islâmico está travando uma guerra contra nós.

Aí ele estragou tudo. O que ele disse foi o seguinte:

"é guerra, não temos que ter medo de dizer que é guerra... uma guerra de interesses, por dinheiro, por recursos naturais. Eu não estou falando de uma guerra de religiões. As religiões não querem guerra. Os outros querem a guerra."

O que? Matar um padre em seu altar está ligado a "interesses, dinheiro e recursos naturais"?. Os assassinos foram movidos por um anseio de justiça social, por mais dinheiro, por acesso a mais recursos naturais? Eles acreditavam que a morte violenta de um padre inofensivo lhes traria alguma dessas coisas? Eles não foram lá roubar objetos valiosos da mesa do altar, os incensários, os castiçais, o crucifixo, o ostensório. Os assassinos gritavam "Allahu akbar", literalmente "Deus é Grande" (em relação e, acima de tudo, especialmente para os muçulmanos, significa a Trindade Cristã, supostamente não monoteísta e a Igreja). Como já estamos cansados de saber, "Allahu akbar" é uma frase religiosa que os muçulmanos usam com frequência. É o início da chamada para a oração, adhan, repetida seis vezes, cinco vezes por dia, precedida e seguida pela shahada. A frase ressoa nos ouvidos ocidentais toda vez que muçulmanos na Europa e na América do Norte cometem ataques ou como prenúncio de um ataque suicida. É exatamente porque os muçulmanos acreditam que seu Deus (chamado em árabe de Alá) é superior a todos os outros deuses, porque para eles o Islã é a maior de todas as religiões e, por último, porque o Islã está destinado a conquistar o mundo, seja pela conversão seja por meio da violência.

O que o Papa Francisco quis dizer com: "as religiões não querem a guerra. Os outros querem a guerra"? O Papa é um homem que tem acesso interminável a faculdades de estudiosos, de acadêmicos de todo o mundo, especialistas em Islã e Oriente Médio. Simplesmente não é verdade. Para começar, quem são esses "outros"? Pessoas não religiosas? Ateus? Agnósticos? Protestantes?

Para vencer uma guerra é preciso ser capaz de identificar o inimigo, entender seus motivos, descobrir o que exatamente faz com que seus soldados arrisquem suas vidas em combate, saber por qual causa mães e esposas enviam seus maridos e filhos à luta, sabendo que podem nunca mais voltar. Ignore tudo isso, invente motivos falsos que conduzem o inimigo ou deixe de saber qual seu objetivo final e a guerra estará perdida. "Se você souber quem é seu inimigo e conhecer a si mesmo, não terá porque temer o resultado de cem batalhas", disse o grande general chinês Sun Tzu, em A Arte da Guerra.

Um dia depois daquele comentário, o Papa lamentavelmente expôs ainda mais a sua ignorância. Um comunicado na revista católica Crux esclarecia:

O Papa disse que em todas as religiões há pessoas violentas, "um pequeno grupo de fundamentalistas," inclusive no catolicismo.

"Quando o fundamentalismo chega ao extremo de assassinar... é possível matar com a língua e também com a faca," disse ele.

"Eu acredito que não é justo igualar o Islã com a violência. Não é justo e não é verdade," continuou ele, acrescentando que teve uma longa conversa com o Grande Imã de Al-Azhar, a Universidade islâmica do Cairo, frequentemente descrita como o Vaticano do mundo sunita.

"Eu sei o que eles pensam. Eles querem a paz, a convergência" ressaltou ele. (Itálico adicionado pelo autor)

Lamentavelmente é evidente que o Papa (assim como centenas de políticos e líderes religiosos no Ocidente, exceto em Israel) não sabe absolutamente nada sobre seu inimigo. Se o Papa acha que "as religiões não querem a guerra", fica claro que ele nunca estudou o Islã nem recebeu nenhuma orientação confiável a seu respeito de ninguém. Eis porque.

Os últimos capítulos do Alcorão contêm dezenas de versos, que exortam os crentes a saírem para lutar na jihad ou usarem seus recursos para pagar outros a lutarem em seu lugar. O objetivo da jihad é "o fortalecimento do Islã, a proteção dos crentes e o fim da falta de fé na terra". [2]

De acordo com um especialista em jihad, contemporâneo nosso, "o Alcorão... apresenta justificativas religiosas bem articuladas para empreender guerras contra os inimigos do Islã". [3]

O Islã não é apenas uma religião, é um sistema de governança. Veja o que diz Hassan al-Banna, fundador da onipresente Irmandade Muçulmana:

O Islã é um sistema abrangente que lida com todas as esferas da vida. É um estado e uma pátria (um governo e uma nação). É moralidade e poder (misericórdia e justiça); é uma cultura e uma lei (conhecimento e jurisprudência). É substância e riqueza (ganho e prosperidade). É um empenho e um chamamento (um exército e uma causa). E por fim, é culto e adoração verdadeiros. [4]

O que isto significa para aqueles que não são muçulmanos? Banna novamente deixa isso bem claro:

isso significa que o Nobre Alcorão nomeia os muçulmanos como guardiões da humanidade, que ainda não atingiu sua maioridade, e lhes concede os direitos de suserania e domínio sobre o mundo a fim de realizar esta sublime tarefa. Portanto é nossa preocupação não a do Ocidente e isso diz respeito à civilização islâmica, não à civilização materialista. Chegamos à conclusão de que é nosso dever estabelecer a soberania sobre o mundo e guiar toda a humanidade aos legítimos preceitos do Islã e seus ensinamentos, sem os quais a humanidade não terá condições de alcançar a felicidade.[5]

Papa Francisco (direita), disse recentemente: "eu não estou falando de uma guerra de religiões. As religiões não querem guerra", e "eu acredito que não é justo igualar o Islã com a violência. Não é justo e não é verdade". Hassan al-Banna (esquerda), fundador da Irmandade Muçulmana, escreveu que "o Nobre Alcorão nomeou os muçulmanos como guardiões da humanidade, que ainda não atingiu sua maioridade, e lhes concede os direitos de suserania e domínio sobre o mundo a fim de realizar esta sublime tarefa."

A literatura da tradição islâmica encontrada em seis coleções canônicas apresenta descrições da jihad e instruções de como lutar em nome dela. Não se deixe enganar por repetidos ofuscamentos, "a maior jihad é a luta consigo mesmo, uma guerra espiritual". Não há nenhuma menção a este conceito nos textos clássicos. [6] Durante séculos, a jihad significou guerra física. Até as místicas irmandades Sufi se envolveram nessa luta totalmente física. [7]

O profeta islâmico Maomé liderou seus homens em batalhas em inúmeras ocasiões e enviou tropas de assalto em cerca de 100 ataques e expedições. [8] Seus sucessores, os califas, fizeram o mesmo. Meio século depois da morte de Maomé em 632 d.C., forças muçulmanas já tinham conquistado metade do mundo conhecido. As guerras santas (Jihad) continuaram a ser travadas anualmente por todos os grandes impérios islâmicos, sem nenhuma exceção.

Os dois primeiros grandes impérios islâmicos, o dos Omíadas (de 661 a 750) e de seus sucessores, sob a nova dinastia de califas e os abássidas (de 750 a 1258) que empreenderam expedições anuais (geralmente duas ou mais por ano) contra o Império Bizantino (sediados em Constantinopla). Estes ataques constituíam uma tradição baseada nas primeiras jihads (guerras santas) tanto no Ocidente quanto no Oriente. Os ataques nunca eram improvisados e sim muito bem planejados. Normalmente havia duas campanhas de verão, muitas vezes seguidas por expedições de inverno.

As jihads de verão eram geralmente compostas de dois ataques separados. Uma investida era chamada de "expedição da esquerda". Ela era lançada das fortalezas da fronteira da Sicília cujas tropas eram em sua maioria de origem síria. A "expedição da direita", a maior, era lançada da província oriental anatoliana de Malatya, onde se posicionavam as tropas iraquianas. Estas expedições da jihad atingiram o seu auge no terceiro grande império, o dos otomanos, que conquistaram Constantinopla em 1453, pondo um fim ao Império Bizantino. Constantinopla recebeu o nome de Istambul e a sua principal Basílica, Hagia Sophia, foi transformada na mesquita imperial dos otomanos.

As organizações jihadistas de hoje, do Estado Islâmico, al-Qaeda, os talibãs, Jihad Islâmica, Jabhat al-Nusra, Boko Haram, Hamas à al-Shabaab e centenas de outras, estão simplesmente empreendendo, em um contexto maior, as guerras da jihad do século XIX. [9]

Ao que tudo indica os jihadistas preferem a guerra ao trabalho missionário (embora haja grupos como os Tablighi Jamaat, paquistaneses, que fazem esse tipo de trabalho), porque essas guerras os remetem aos dias de Maomé e seus companheiros, as três primeiras gerações belicistas. O termo salafista, hoje usado para designar a maioria dos grupos islâmicos mais radicais, vem de salaf que significa "ancestral", mas com um significado próprio das primeiras três gerações do Islã. Maomé, seus primeiros seguidores, seus filhos e netos. Os jihadistas adotam essa postura porque, tendo perdido a força militar a partir do colapso do Império Otomano em 1918, parecem ainda se sentir compelidos a lutar contra o poder do Ocidente, o triunfo dos cristãos (ou em Israel, dos judeus). Alá, aos seus olhos, prometeu aos seus seguidores, os muçulmanos, que um dia eles governarão o mundo,[10] e por muitos séculos os muçulmanos podem ter até acreditado que isto estava realmente acontecendo. Então essas esperanças foram por água abaixo. Impérios ocidentais começaram a conquistar, colonizar e governar estados muçulmanos, como por exemplo o norte da Índia, Argélia, Egito, Sudão, Líbia e outras regiões -- um retrocesso totalmente inimaginável.

Para contra-atacar, os jihadistas optaram por usar a melhor arma à sua disposição: o terrorismo. Pior do que isso, o Ocidente que eles ora aterrorizam deixou-se enfraquecer. Uma combinação de correção política, medo de ofender, medo de lutar e a relutância em perturbar a estabilidade ilusória têm levado a uma incrível série de oportunidades para os jihadistas.

Por exemplo, o jovem islamista que assassinou o padre na França, foi preso duas vezes por tentar viajar para a Síria a fim de lutar ao lado do Estado Islâmico. Quando do assassinato, as gentis autoridades o haviam forçado a usar uma tornozeleira eletrônica para que ele fosse monitorado -- mas ele deveria ficar em casa apenas durante a noite. Durante o dia ele tinha autorização de perambular livremente pelas ruas. Naquela manhã fatídica, ele resolveu entrar com o seu companheiro em uma igreja próxima e satisfazer sua ânsia pelo martírio e de matar um cristão.

Lamentavelmente, o Papa Francisco não poderia estar mais equivocado. Uma religião queria travar guerras desde a sua concepção. Tivemos que nos proteger delas por mais de 1400 anos até quando o Império Otomano foi barrado nas portas de Viena em 1683. Agora baixamos a nossa guarda e nos afastamos. Não porque não dispomos de forças de segurança. Dispomos sim. É porque muitas vezes não estamos atrás das coisas certas: os textos e sermões que promovem a radicalização.

Por qual motivo jovens muçulmanos normais se tornam recrutadores de extremistas? Cristãos, hindus, judeus, budistas e baha'is jovens não seguem o mesmo caminho. Será que isso acontece porque um número considerável de jovens muçulmanos, primeiro nos países islâmicos e agora no Ocidente, são doutrinados desde cedo que o Islã tem como meta a dominação, que a jihad não é um mal e sim uma expressão de sua fé, que eles sofrem por serem vítimas da "islamofobia", que as mulheres ocidentais são imorais e que outras religiões são falsas?

É hora de acordar. Gostemos ou não, estamos realmente em guerra. Leon Trotsky disse o seguinte: "você pode não estar interessado na guerra, mas a guerra está interessada em você".

Nosso inimigo é uma versão extremista do Islã que precisa passar por uma reforma, versão esta que remete os muçulmanos, não de volta ao século VII, mas os leva ao século XXI e provavelmente mais para a frente.

O Dr. Denis MacEoin, sediado na Inglaterra, é especialista em Islã.

[1] "O conceito de martírio no Islã foi elaborado de forma diferente do que no cristianismo ou no judaísmo. O martírio no Islã tem um sentido muito mais ativo: o mártir em potencial é induzido a procurar situações em que o martírio pode ser alcançado. " David Cook em Understanding Jihad, University of California Press, 2015, p. 26.

[2] Rudolph Peters Islam and Colonialism: The Doctrine of Jihad in Modern History, Haia, 1979, pág. 10

[3] Cook, pág. 11.

[4] Hasan al-Banna, Message for Youth, trans. Muhammad H. Najm, Londres, 1993, pág. 6

[5] Wendell Charles (trans), The Five Tracts of Hasan Al-Banna (1906-1949), University of California Press, 1978, págs. 70 a 73.

[6] "Tradições que indicam que a jihad tinha o significado de guerra espiritual... estão totalmente ausentes de qualquer texto canônico oficial (exceto a al-Tirmidhi, que cita: 'o combatente é aquele que combate suas paixões'; elas aparecem com mais frequência nas coleções de textos ascéticos ou nos provérbios." Cook, pág. 35.

[7] "Este paradigma persistiu em tempos medievais, onde encontramos por diversas vezes grupos sufistas combatendo os inimigos do Islã. Por exemplo, depois de derrotarem os cruzados liderados por Guy de Lusignan na Batalha dos Chifres de Hattin (1187), o líder muçulmano Salah al-Din al-Ayyubi (Saladino) (1169-1191) entregou os cruzados capturados a vários de seus regimentos sufistas para serem massacrados. "Cook, pág. 45.

[8] Uma lista abrangente, detalhada com observações e comentários encontra-se disponível na Wikipedia.

[9] Para obter mais detalhes, consulte Rudolph Peters, trechos.

[10] "Ele (Alá) foi quem enviou seu Mensageiro (Maomé) trazendo a orientação e a Verdadeira Religião para fazer com que o Islã seja dominante sobre todas as outras religiões" (Alcorão 09:33). O quinto verso da mesma surata é conhecido como o "Verso de Espada", porque é o primeiro a encorajar ataques físicos contra os não muçulmanos.

Por:  Denis MacEoin   11 de Agosto de 2016
Original em inglês: The Pope and Holy War
Tradução: Joseph Skilnik Do site: https://pt.gatestoneinstitute.org/8677/papa-guerra-santa

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

A BUSCA PELO LUCRO...

A busca pelo lucro é uma benção para a humanidade - mas há uma ocasião em que a crítica é aceitável


O que é o lucro? E por que ele é tão importante para todos, não só para empreendedores e comerciantes?

Comecemos pelo básico: quando você gasta $ 300 em um par de sapatos, o proprietário da loja fica com esses $ 300 integralmente para ele?

A resposta óbvia é não.

Esse comerciante tem de pagar por todos os custos do seu empreendimento: os salários e os encargos sociais e trabalhistas de seus empregados, o aluguel da loja, seus fornecedores, seus estoques, o frete da transportadora que traz seus produtos, que todos os impostos, a faxineira, a conta de luz, a conta de telefone, aluguel das máquinas de cartão de crédito e de débito etc. Aquilo que sobrar depois de tudo isso é o seu lucro.

O lucro seria a remuneração pelo tempo e pelo dinheiro que ele gastou, bem como o risco em que incorreu, para manter seu empreendimento funcionando.

Desnecessário enfatizar que, se ele não tivesse lucros, não haveria como ele reinvestir na empresa: não haveria como ele expandir seus negócios, contratar mais pessoas, ofertar mais bens no mercado, ou mesmo conceder aumentos salariais aos seus funcionários. Não houvesse lucros, nenhum novo emprego assalariado seria criado.

Como surge o lucro

A definição dada acima sobre o lucro foi intencionalmente simplista. Em termos puramente econômicos, a definição de lucro é mais sofisticada. Economistas veem o lucro de uma maneira mais profunda. 

O que possibilita o surgimento do lucro é a ação empreendedorial em um ambiente de incerteza. Um empreendedor, por natureza, tem de estar sempre estimando quais serão os preços futuros dos bens e serviços por ele produzidos. Ao estimar os preços futuros, ele irá analisar os preços atuais dos fatores de produção necessários para produzir estes bens e serviços futuros. Caso ele avalie que os preços dos fatores de produção estão baixos em relação aos possíveis preços futuros de seus bens e serviços produzidos, ele irá adquirir estes fatores de produção. Caso sua estimação se revele correta, ele auferirá lucros.

Portanto, o que permite o surgimento do lucro é o fato de que aquele empreendedor que estima quais serão os preços futuros de alguns bens e serviços de maneira mais acurada que seus concorrentes irá comprar fatores de produção a preços que, do ponto de vista do estado futuro do mercado, estão hoje muito baixos. 

Consequentemente, os custos totais de produção — incluindo os juros pagos sobre o capital investido — serão menores que a receita total que o empreendedor irá receber pelo seu produto final. Esta diferença é o lucro empreendedorial.

Por outro lado, o empreendedor que estimar erroneamente os preços futuros dos bens e serviços irá comprar fatores de produção a preços que, do ponto de vista do estado futuro do mercado, estão hoje muito altos. Seu custo total de produção excederá a receita total que ele irá receber pelo seu produto final. Esta diferença é o prejuízo empreendedorial.

Assim, lucros e prejuízos são gerados pelo sucesso ou pelo fracasso de se ajustar as atividades produtivas de acordo com as mais urgentes demandas dos consumidores.

Lucros e prejuízos são fenômenos que só existem constantemente porque a economia está sempre em contínua mudança, o que faz com que recorrentemente surjam novas discrepâncias entre os preços dos fatores de produção e os preços dos bens e produtos por eles produzidos, e consequentemente haja a necessidade de novos ajustes.

Ao contrário do que pensava Marx, o capital não "gera lucro". O capital empregado, por si só, não garante lucro nenhum. Bens de capital são objetos sem vida que, por si sós, não realizam nada. Se eles forem utilizados de acordo com uma boa ideia, haverá lucros. Se eles forem utilizados de acordo com uma ideia equivocada, haverá prejuízos ou, na melhor das hipóteses, não haverá lucros. 

É a decisão empreendedorial o que cria tanto lucros quanto prejuízos. É dos atos mentais, da mente do empreendedor, que os lucros se originam, essencialmente. O lucro é um produto da mente, do sucesso de se saber antecipar o estado futuro do mercado. É um fenômeno espiritual e intelectual.

Um empreendimento sem lucros é socialmente destrutivo

Imagine que você adquiriu um material que, em seu estado bruto e inalterado, vale $100. Ato contínuo, você altera essa matéria-prima, adiciona sua criatividade e sua mão-de-obra, e gera um produto final que as pessoas irão voluntariamente querer adquirir por $150. Você gerou valor para a sociedade. Você acrescentou valor para a sociedade e auferiu um lucro por causa disso. 

Agora, imagine que você adquire esse mesmo material, que em seu estado bruto e inalterado vale $100, altera-o à sua maneira e gera um produto final valorado em apenas $50 pelas pessoas. Você não apenas não auferiu lucro nenhum, como na realidade subtraiu riqueza da sociedade. A sociedade ficou mais pobre por sua causa. Como isso pode ser considerado algo virtuoso? 

É exatamente por isso que empresas que geram prejuízos são deletérias para uma sociedade. Elas consomem recursos e não entregam valor. Elas, na prática, subtraem valor da sociedade. Uma empresa que opera com prejuízo é uma máquina de destruição de riqueza. 

Adicionalmente, condenar qualquer lucro como sendo 'excessivo' pode levar a situações tão absurdas quanto aplaudir uma empresa que, outrora muito lucrativa, passou a desperdiçar capital e a produzir ineficientemente a custos mais altos. Esta redução na eficiência e, consequentemente, nos lucros logrou apenas fazer com que os cidadãos fossem privados de todas as vantagens que poderiam usufruir caso os bens de capital desperdiçados por esta empresa fossem disponibilizados para a produção de outros produtos.

Os lucros são uma bênção

Os lucros são uma bênção para a humanidade. Os lucros motivam as pessoas a trabalharem mais, a serem mais criativas, a mais bem servirem seus clientes, e a realmente se preocuparem com o bem-estar destes.

Sem o incentivo dos lucros, por que alguém iria querer se arriscar, gastar sua poupança ou se endividar, trabalhar arduamente horas a fio, e enfrentar todas as incertezas do mercado apenas para fornecer um bem ou serviço às pessoas? Ninguém faria isso.

Pense em um pecuarista interiorano que enfrenta condições inclementes de temperatura para alimentar seu gado, mantê-lo protegido e bem cuidado, fazendo enormes sacrifícios pessoais apenas para que as pessoas da cidade grande possam se sentar confortavelmente em um restaurante e comer uma suculenta picanha.

Por que o pecuarista se presta a isso? Será que é porque ele ama aqueles metropolitanos que ele nunca viu na vida? Óbvio que não. O pecuarista faz todo esse esforço porque ele quer ter mais recursos para si próprio e para sua família. Ele quer aumentar seu padrão de vida. Ele, em suma, quer lucros.

Igualmente, você pode ir a um supermercado a qualquer dia da semana à procura de carne e você encontrará. Se você quer batatas, também encontrará. Ovos, açúcar, sal, morangos, laranjas, bananas, pasta de amendoim — tudo estará nas prateleiras. Esse é um conforto que todos nós já consideramos como corriqueiro, uma comodidade que consideramos um fato consumado e garantido. E, ainda assim, deveríamos nos maravilhar com isso. 

Cada um desses itens está nas prateleiras graças a uma coisa: a busca pelo lucro.

O mesmo é válido para o aparelho em que você está lendo este artigo — seja um computador, um notebook, um smartphone ou um tablet. E o mesmo também é válido para todos os componentes que formam esses aparelhos. 

Com efeito, apenas olhe ao seu redor, neste local em que você está agora. Se você está dentro de um imóvel, observe o mobiliário à sua volta, o próprio edifício em que você está, o computador (ou o tablet ou o smartphone) que você está utilizando, a internet que está lhe permitindo acesso ao mundo, as roupas que você está utilizando. Você realmente acredita que todos esses itens surgiram e estão à sua disposição porque alguém queria perder dinheiro (ou aceitou trabalhar em troca de nada) apenas para tornar a sua vida mais confortável? Perdoe-me a sinceridade, mas você não é tão importante assim para o resto do mundo.

Tudo isso só existe e está à sua disposição porque alguém imaginou que poderia lucrar ao inventar todas essas coisas. As pessoas que produziram essas coisas não acordaram cedo, trabalharam diuturnamente e se sacrificaram apenas por algum impulso caritativo. Elas fizeram isso porque queriam melhorar a vida delas próprias. E, para melhorar a vida delas próprias, elas buscaram o lucro. E, ao buscarem o lucro, elas melhoraram a sua vida e a vida da sua família.

Acabe com o lucro e tudo deixará de ser produzido.

Quando o lucro realmente pode ser condenado

Quando uma determinada empresa surge no mercado com um produto novo ou altamente aprimorado, satisfazendo desejos e demandas dos consumidores, os lucros que ela passa a auferir com esse produto podem, à primeira vista, parecer enormes. Só que, quanto maiores forem esses lucros, mais eles atrairão novos concorrentes, os quais aumentarão a oferta desse produto. Ato contínuo, a maior oferta fará com que os altos lucros da empresa se evaporem. 

Olhando em retrospecto, torna-se evidente que os altos lucros funcionaram como um sinal enviado aos outros produtores: "Ei, olhem para cá! As pessoas realmente querem esse produto; querem mais desse produto!".

E é exatamente para evitar o surgimento dessa concorrência — a qual reduz os lucros — que várias empresas já estabelecidas recorrem ao governo para que este restrinja o mercado e impeça o surgimento de novos concorrentes por meio de burocracias e regulamentações onerosas. 

É daí que surge o capitalismo de estado ou o capitalismo de compadrio, em que o governo fornece subsídios e privilégios especiais para as empresas já existentes ao mesmo tempo em que impõem regulamentações e burocracias que inviabilizam o surgimento de concorrentes. 

Um exemplo clássico dessa ação estatal em prol de empresas já estabelecidas e contra o surgimento de concorrentes pode ser visto na criação de agências reguladoras. E também quando o governo concede subsídios ou empréstimos subsidiados para determinadas empresas. Ou quando ele simplesmente impõe tarifas de importaçãopara impedir que produtos estrangeiros entrem no mercado nacional e concorram com as empresas já estabelecidas no país.

Ter o governo ao seu lado — por meio de regulamentações especiais, protecionismo, subsídios — significa que uma empresa pode ser muito menos dedicada aos desejos dos consumidores. O governo poderá mantê-la operante mesmo que isso vá contra a vontade dos consumidores. 

Os lucros auferidos desta maneira podem, e devem, ser condenados. 

Curiosamente, este arranjo protecionista e intervencionista — que garante altos lucros para as empresas protegidas — é exatamente aquele defendido pela esquerda, que ao mesmo tempo condena os lucros. Não dá para entender.

Conclusão

A hostilidade direcionada ao lucro, seja ela motivada ou pela inveja ou pela ignorância ou pela demagogia, é irracional. Ela só é aceitável quando uma determinada empresa aufere seus lucros em decorrência de suas conexões políticas com o governo — que garante a ela subsídios, ou que a protege da concorrência externa via tarifas protecionistas, ou que impede o surgimento de concorrentes via agências reguladoras.

Fora isso, em um mercado livre, lucros representam muito mais do que a saúde financeira de uma empresa: eles indicam que a empresa está utilizando recursos escassos de maneira sensata e está satisfazendo os desejos dos consumidores; indicam que a empresa está genuinamente criando valor para a sociedade e está aprimorando a qualidade de vida e o progresso.

Lucro é aquilo que todos nós buscamos quando, ao tentar melhorar nosso bem-estar, acabamos por melhorar o bem-estar de terceiros por meio de transações comerciais pacíficas e voluntárias.

Lucro não é evidência de comportamento suspeito. Comportamento suspeito, isso sim, é fazer acusações infundadas contra o lucro.

Atualmente, há no mundo um regime voltado exclusivamente para se certificar de que nenhum indivíduo esteja auferindo qualquer tipo de lucro: a Coreia do Norte marxista. Como consequência, não há nem sequer luz elétrica para a sua população.


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Ludwig von Mises, líder da Escola Austríaca de pensamento econômico, um prodigioso originador na teoria econômica e um autor prolífico.  Os escritos e palestras de Mises abarcavam teoria econômica, história, epistemologia, governo e filosofia política.  Suas contribuições à teoria econômica incluem elucidações importantes sobre a teoria quantitativa de moeda, a teoria dos ciclos econômicos, a integração da teoria monetária à teoria econômica geral, e uma demonstração de que o socialismo necessariamente é insustentável, pois é incapaz de resolver o problema do cálculo econômico.  Mises foi o primeiro estudioso a reconhecer que a economia faz parte de uma ciência maior dentro da ação humana, uma ciência que Mises chamou de "praxeologia".
Walter Williams, professor honorário de economia da George Mason University e autor de sete livros.  Suas colunas semanais são publicadas em mais de 140 jornais americanos.
Do site: http://www.mises.org.br/

terça-feira, 23 de agosto de 2016

A APOTEOSE DO FINGIMENTO HISTÉRICO

Subsidiado por patrocínios bilionários, o fingimento histérico brasileiro fez da abertura da Olimpíada a sua mais vistosa apoteose


“O camponês da Bavária e de Baden que não consegue enxergar para além do campanário da sua igreja local, o pequeno produtor francês de vinho que é levado à bancarrota pelos capitalistas de grande escala que adulteram vinho, e o pequeno plantador americano depenado por banqueiros e congressistas e jogado para longe da corrente maior do desenvolvimento, são convocados, no papel, a assumir a direção do Estado pelo regime da democracia política. Mas, na realidade, em todas as questões básicas que determinam os destinos dos povos, quem toma as decisões pelas costas da democracia parlamentar são as oligarquias financeiras.”

Esse parágrafo consta daquilo que foi provavelmente o discurso mais decisivo do século XX: as palavras de Leon Trotski no ato de fundação do Comintern em 1919, que determinariam em linhas gerais a estratégia do comunismo mundial por mais de meio século e, de algum modo, continuam a inspirá-lo até hoje.

Como descrição da realidade, essas palavras continuam válidas: decorrido um século, o povo trabalhador e pagador de impostos continua tentando melhorar o curso das coisas por meio do voto, sendo constantemente ludibriado e frustrado pelas oligarquias financeiras e políticas que burlam o processo legislativo e impõem suas decisões por meio de tratados internacionais, decretos de presidentes, portarias de ministérios, regulamentos de repartições, de prefeituras, de administrações regionais e uma infinidade de outros artifícios, obrigando todo mundo a obedecer leis que nem mesmo existem.

Só o que mudou, nesse ínterim, foi a identidade ideológica dos personagens. A minoria bilionária age em parceria com a esquerda internacional -- isto é, com os herdeiros de Trotski -- para impor a populações estupefatas, por vias transversas que neutralizam o processo legislativo, as mudanças socioculturais mais artificiosas e contrárias às crenças e valores do povo: feminismo, gayzismo, desarmamento civil, multiculturalismo, liberação das drogas, sexualização prematura das crianças nas escolas, dissolução das identidades nacionais por meio da imigração forçada, anticristianismo militante etc. etc.

O povão simples apega-se cada vez mais aos seus valores antigos, cristãos e patrióticos, esperando fazê-los triunfar por meio de candidatos como Donald Trump, Jair Bolsonaro ou Nigel Farage, sendo por isso estigmatizado pela grande mídia de esquerda (a única que existe) como fascista, nazista, racista, assassino de gays, negros e mulheres etc. etc.

A aliança mundial de globalistas e esquerdistas é o fenômeno mais geral e importante da nossa época, e não há um só fato da vida cultural ou política ocidental que não seja, em mais ou em menos, determinado por ela.

À troca de papéis corresponde, pari passu, a inversão não só do conteúdo, mas da própria função do discurso público: a classe dominante rouba as palavras do povo para condená-lo e intimidá-lo como se ele fosse ela, e ela o povo. 

Intelectuais, artistas, jornalistas e publicitários pagos generosamente pela elite governante bilionária fazem-se de defensores da população ludibriada para poder continuar a ludibriá-la e a acumular poder e dinheiro sob os pretextos mais sedutores e hipnoticamente populistas que uma mendacidade ilimitadamente inventiva já logrou conceber.

Esse discurso meticulosamente invertido é uma invenção, já velha, de engenheiros sociais que, é claro, não se deixam enganar pelo seu próprio ardil. 

Mas, quando a moda se dissemina no baixo clero do show business, das universidades e da mídia, ela modifica profundamente a psique de multidões inteiras de idiotas úteis, que sentem – e sentem com muita emoção – estar dizendo a mais pura verdade no instante mesmo em que repetem chavões que sua própria experiência direta desmente da maneira mais flagrante. 

É a síndrome da autopersuasão histérica que, como já explicava o dr. Andrew Lobaczewski, se espalha entre pessoas de mente fraca quando colocadas sob a influência de psicopatas astutos.

Exemplos dessas mentes fracas não faltam. As redações, as cátedras universitárias, o cast inteiro dos canais de TV estão repletos deles. 

Escolho um a esmo, só porque é desta semana. Com aparente sinceridade, o sr. Fernando Meirelles, publicitário responsável pelo show de abertura das Olimpíadas, escreve no seu Twitter (reproduzo com as execráveis grafias originárias):

“Bolsanaro vai odiar a cerimônia. Trump também. Pelo menos nisso acertamos. A cerimônia de hoje terá índios, empoderamento dos negros e das mulheres, transgêneros e um alerta contra os riscos do uso de petróleio.”

Os pobres e oprimidos são aí representados pelos índios, negros, mulheres e transgêneros. 
Os ricos opressores, pelos srs. Trump e Bolsonaro. Por meio do show, o sr. Meirelles, os patrocinadores do espetáculo e o governo aparecem como advogados dos primeiros contra a prepotência reacionária dos segundos, vagamente identificados, de passagem, como ligados de algum modo aos interesses da macabra indústria do petróleo.

Mas quem não sabe que, para montar o espetáculo, o sr. Meirelles recebeu R$ 270 milhões de um bilionário esquema público-privado que jamais deu ou daria um tostão a políticos como Trump e Bolsonaro, aos quais odeia tanto quanto o povão os ama?

Quem não sabe que o “empoderamento dos índios, negros e mulheres” é a Leitmotiv do discurso propagandístico de uma elite globalista que continua – para usar as palavras de Trotski – “jogando para longe da corrente maior do desenvolvimento” os trabalhadores, os pequenos plantadores, os microempresários e, por isso mesmo, uma multidão de “índios, negros e mulheres”?

E quem não sabe que os donos do petróleo são ainda os árabes, os maiores assassinos de gays e mulheres que já existiram no mundo, contra os quais o show do sr. Meirelles não ousaria nem ousou dizer uma palavrinha incômoda sequer?

Em que mundo, em que fração do universo imaginário o sr. Trump fez algum dano a gays e mulheres, que pelo menos fosse comparável ao que essas criaturas sofrem nas mãos dos muçulmanos sob aplausos frenéticos e incondicionais da esquerda internacional à qual o sr. Meirelles indiscutivelmente pertence e à qual mostrou descarada fidelidade por meio do símbolo comunista do punho esquerdo cerrado?

E em que planeta do mundo da fantasia o sr. Bolsonaro, um modesto capitão da reserva que jamais foi visto sequer ao lado de um bilionário, faz parte da elite opressora?

Sem dúvida o sr. Meirelles acredita no que diz. Mas não acredita pelos meios normais do conhecimento humano e sim por meio da autopersuasão histérica que desmente de maneira brutal e ostensiva tudo o que ele vê, tudo o que ele sabe, tudo o que lhe chega pelos cinco sentidos. 

O sr. Meirelles não raciocina a partir da sua própria experiência, mas da sua própria voz. 
Indo da boca para o ouvido, sua alma se entrega toda mole-mole nos braços de um discurso auto-hipnótico que lhe dá, como compensação automática, um prêmio de 270 milhões e a ilusão de fazer bonito.

Com isso não quero dizer que o sr. Meirelles, só por expressar francamente o seu sentimento, seja honesto ou veraz. 

Se o tipo de sinceridade do fingidor histérico se distingue da mentira deliberada por não saber que é mentira, ela distingue-se das palavras do observador honesto porque não tem nada, absolutamente nada a ver com a categoria da veracidade. 

Constitui-se de sentimento apenas, e a nada o sentimento é mais obediente do que a imaginação. O fingidor histérico imagina alguma coisa na hora, sente em conformidade com ela, e diz o que sente. 

A distinção entre o verdadeiro e o falso nem lhe passa pela cabeça. E, se você lhe diz que o discurso dele é falso, ele entende que você apenas sente diferente dele, que tudo não passa de um confronto de emoções opostas, de uma disputa de poder entre dois corações – naturalmente, um malvado – você – e um bonzinho – ele.

A histeria – sempre é bom lembrar – nada tem a ver com chiliques, gritinhos e crises de nervos, embora às vezes recorra a esses instrumentos expressivos quando a crença na mentira começa a falhar e tem de ser reforçada pela mise-en-scène. 

A histeria é eminentemente fingimento auto-hipnótico, tanto mais forte quanto mais tranqüilo e sereno em aparência.

Aquilo que, na mente do manipulador psicopata, começou como uma mentira concebida friamente para tais ou quais propósitos práticos se torna, na mente passiva e servil dos seus imitadores, um modo de ser, um habitus profundamente arraigado e difícil de remover.

A personalidade do psicopata não é afetada pelas suas mentiras, concebidas para uso alheio. A do fingidor histérico é transfigurada e remoldada pela mentira, até que o poder de persuasão da própria voz se sobrepoõe ao apelo dos sentidos, da memória e da razão. O ser humano normal acredita no que vê, no que experimenta e no que sabe. O fingidor histérico, naquilo que aprendeu a dizer.

Como bem observou o dr. Lobaczewski na sua Ponerologia – com certeza o livro mais importante de ciência política das últimas décadas –, numa sociedade dominada por criminosos psicopatas, o fingimento histérico se espalha como uma epidemia, que, se não controlada em tempo, acaba por se tornar o estado de espírito geral e permanente de amplas camadas sociais, especialmente aquelas que encontram nisso um modo de vida, como por exemplo os professores, os jornalistas, os publicitários e os artistas do show business, classes que, por definição, e mesmo em circunstâncias normais, vivem de repassar discursos aprendidos.

Subsidiado por patrocínios bilionários, o fingimento histérico brasileiro fez da abertura da Olimpíada a sua mais vistosa apoteose. 
Por: Olavo de Carvalho Publicado originalmente no Diário do Com;ercio

domingo, 21 de agosto de 2016

UMA EUROPA CHAMADA ROMA


Da próxima vez que o estrépito de um atentado nos distrair dos Pokémons, em vez de desabafarmos no facebook será mais útil ir estudar os romanos. O imperador Honório e a sua galinha Roma andam por aí,


Isto não acontece num país longínquo. Acontece aqui. Num país da NATO. Ao nosso lado.

Horas antes do golpe na Turquia tivera lugar em França mais um atentado e mais uma vez o Presidente francês dissera que a França era forte. E os jornais escreviam que “um camião matou”, como se o camião se tivesse posto em marcha sozinho.

Face ao atentado de Nice repetia-se que havia que compreender os motivos do homem que praticara tal acto sendo que neste contexto o verbo compreender não é sinónimo de adquirir conhecimento para melhor agir sobre o agressor mas sim para aceitar com maior resignação o papel de vítima.

Como sempre o facebook encheu-se de vídeos virais em que os likes fazem as vezes das convicções e o máximo da decisão passa por pintar a Torre Eiffel com as cores da bandeira francesa. Desta vez já nem houve muitas velas nas ruas, talvez para não atrapalhar as corridas atrás dos Pokémons.

De repente, o drama desta Europa, uma Europa que foi capaz de garantir ao maior número de cidadãos um conjunto mais alargado de direitos mas que se condenou a si mesma à decadência, parece-me decalcado desse outro drama vivido por outra civilização extraordinária – o império romano. Um drama que simbolicamente terminou numa noite de Agosto de 410 dC, em Ravena. Nessa noite um mensageiro (há sempre uma mensagem e um mensageiro, o tempo apenas muda a natureza do mensageiro) entrou a correr no palácio de Ravena onde o imperador Honorio estava retirado para escapar ao cerco que o rei visigodo Alarico montara em torno de Roma. A notícia é tão grave que os presentes resolvem acordar Honorio: Roma caíra às mãos do invasor.

Perante a notícia, o imperador Honorio declara consternado “Ainda há pouco comeu da minha mão”. O desalento desconcertante da resposta do imperador leva um dos presentes a esclarecer Honorio: Roma, a sua galinha preferida, estava bem. Fora sim a capital do seu império e não a sua preferida que caíra perante o invasor. Honorio terá suspirado de alívio pois por momentos pensara que fosse a sua galinha e não a cidade a soçobrar.

Há oito séculos que Roma era inviolável. Mas nesse Agosto de 410 dC, o rei visigodo Alarico atravessara a Porta Salaria e entrara em Roma à frente dos seus homens. O saque começou. A própria irmã do imperador, Gala Placidia, estava cativa de Alarico, um chefe militar que soube tirar partido das fraquezas do outrora grande império.

Valha a verdade que o saque de Alarico foi apenas o primeiro – e nem sequer o pior – dos vários que reduzirão a orgulhosa Roma a um símbolo da decadência. A dado momento os romanos antecipar-se-ão até aos invasores e antes que estes montem mais um cerco abrem-lhes as portas da cidade para que no momento do inevitável saque se mostrassem mais misericordiosos (não mostraram).

A história da reacção de Honório ao saber do saque de Roma foi muito provavelmente romanceada mas tem servido para ilustrar o que bondosamente designamos como decadência do império romano. Perante essa fabulosa civilização que se condenou a si mesma à derrota poucas coisas ilustrarão melhor o comportamento das elites romanas do que esse imperador a chorar a sua galinha e não a sua cidade.

Neste século XXI, Honorio, a sua cidade e a sua galinha andam por aí. Simplesmente Roma agora chama-se Europa. E os europeus, tal como o imperador Honorio, desdenham dos aliados, não resolvem o essencial, assistem abúlicos aos ataques de que são alvo e perante a catástrofe fazem de conta que não a vêem. Ou apenas vêem a morte da sua galinha – com quantas causas fúteis se entretêm semanalmente os parlamentos da Europa? – e não a queda da sua cidade.

Enquanto escrevo os presos na Turquia contam-se aos milhares e a purga na justiça e entre os militares é profunda. Nas televisões europeias confunde-se apoio e bandeirinhas nas redes sociais com legitimidade. Erdogan entretanto avisa que quem estiver com os rebeldes, está “em guerra com a Turquia”, sendo que o conceito de “estar com os rebeldes” é muito lato. Por exemplo, não entregar à Turquia os oito militares turcos que pediram asilo político à Grécia é sinónimo de estar com os rebeldes? E como vai daqui em diante a Turquia usar os seus controlos fronteiriços para pressionar a Europa a deixar de “estar com os rebeldes”, queira isso dizer o que queira? E o que fazem os líderes europeus caso Erdogan, com menos folclore, mais racionalidade e umas forças armadas purgadas mas bem treinadas, entre na espiral de confronto-amizade-chantagem como durante anos fez Kadafi? Telefonam para Washington e esperam que o presidente norte-americano, seja ele qual for, mobilize os nascidos no Ohio ou no Kansas para reforçarem a presença militar nas bases norte-americanas na Europa, precisamente aquelas contra as quais não houve estudante europeu que não achasse de bom tom manifestar-se?

Na escola aprendíamos como os romanos fizeram o seu império. Na verdade devíamos ter estudado mais como o desfizeram. Porque Honorio e a sua galinha não aconteceram por acaso. Eles são o resultado de uma sociedade que se derrotou a si mesma antes de ser derrotada pelos outros. De um império que acabou a ter de pagar para não ser atacado por aqueles a quem antes pagara para que o defendessem.

Da próxima vez que o estrépito de um atentado nos distrair dos Pokémons, em vez de desabafarmos no facebook será bem mais útil ir estudar os romanos. Honorio e a sua galinha fazem parte do nosso passado e nós já estivemos mais longe de nos refugiarmos em Ravena.
Por: Helena Matos Do site: http://observador.pt/

sábado, 20 de agosto de 2016

O ISLAMISMO SE LEVANTA A PARTIR DO SECULARISMO DA EUROPA

- Na França, o governo socialista impôs uma "carta de secularismo" em todas as escolas banindo o cristianismo do sistema educacional. Certos municípios já mudaram o formulário de inscrição para crianças em idade escolar, eliminando as palavras "pai" e "mãe", substituindo-as por "gestor legal 1" e "gestor legal 2". É a "Novilíngua" de George Orwell.


- Após dois ataques terroristas de grandes proporções em 2015, a França, em vez de promover uma "jihad" cultural baseada em valores ocidentais, respondeu ao fundamentalismo islâmico com um ridículo "Dia do Secularismo" a ser comemorado todo dia 9 de dezembro.

- Esse secularismo tacanho também impediu a França de apoiar abertamente os cristãos orientais oprimidos pelos islamistas.

A igreja Oude Kerk do século XIII de Amsterdã, ora vazia, é usada para exposições e pode ser alugada para jantares de gala. Do outro lado da rua fica o "Sexyland", apresentando "shows de sexo ao vivo", uma "coffee shop" para venda de drogas e um "supermercado erótico" para a venda de vibradores. Por sete euros é também possível visitar a igreja.

Em outubro de 2000, na ensolarada cidade francesa de Nice, a Convenção Europeia com 105 membros esboçou a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Elaborada pela comissão do ex-presidente francês Valéry Giscard d'Estaing, o documento se referia apenas ao "patrimônio cultural, religioso e humanista da Europa". O Parlamento Europeu rejeitou uma proposta de Membros Democratas Cristãos do Parlamento Europeu e do Papa João Paulo II de incluir no texto as "raízes judaico-cristãs" da Europa.

Na Carta de 75.000 palavras não há sequer uma menção ao cristianismo. Desde então, uma onda de secularismo agressivo tem permeado todas as políticas da UE. Por exemplo, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos pediu a retirada dos crucifixos das salas de aula: eles eram hipoteticamente uma ameaça à democracia.

A cidade de Nice -- onde há exatamente 16 anos os governantes da Europa decidiram eliminar as raízes judaico-cristãs da Constituição da UE (nunca aprovada) -- acabaram de testemunhar a sangrenta manifestação de outra religião: o Islã radical. "A natureza abomina o vácuo": esta é a verdade que nossas elites não querem ouvir; o islamismo se levanta a partir do que William McGurn, autor de discursos de George W. Bush, chamava de "secularismo irresponsável da Europa".

Isto é possível ver não só nas igrejas da Europa, três quartos delas vazias, e no crescimento vertiginoso da conversão dos europeus ao Islã, mas também no que está acontecendo nas escolas da Europa. Essas tendências não dão suporte à visão de Viktor Orbán de uma Europa cristã.

Há alguns dias, a Bélgica que recentemente foi alvo de ataques terroristas, decidiu que as aulas de religião nas escolas de língua francesa de ensino fundamental e médio serão cortadas pela metade a partir de outubro de 2016 e substituídas por uma hora de "aulas de cidadania": lições de secularismo. Em Bruxelas, 50% das crianças em escolas públicas já optaram por frequentar aulas sobre o Islã.

Na França, o governo socialista impôs uma "carta de secularismo" em todas as escolas banindo o cristianismo do sistema educacional. A carta é o manifesto da "révolution douce" ("revolução adocicada"), melhor dizendo: secularismo extremo da França. É uma tentativa de eliminar qualquer asserção de identidade. A quipá judaica, a cruz cristã e o véu islâmico são tratados da mesma maneira. O secularismo é o que tem sido corretamente definido como "o ponto cego da esquerda em relação ao Islã".

Além de tudo é um secularismo que endoidou. A título de exemplo a escola de ensino fundamental Yves Codou, que fica no vilarejo de La Môle, comemorou o "Dia dos Pais" em vez do Dia das Mães, a fim de não causar dissabores aos casais gays. Certos municípios já mudaram o formulário de inscrição para crianças em idade escolar, eliminando as palavras "pai" e "mãe", substituindo-as por "gestor legal 1" e "gestor legal 2". É a "Novilíngua" de George Orwell.

Após dois ataques terroristas de grandes proporções em 2015, a França, em vez de promover uma "jihad" cultural baseada em valores ocidentais, respondeu ao fundamentalismo islâmico com um ridículo "Dia do Secularismo" a ser comemorado todo dia 9 de dezembro.

Não é que o secularismo "exacerbou" essas tensões culturais como afirmam muitos liberais. É que este secularismo afastou a cultura francesa dos ideais que criaram o Ocidente. O afastamento fez com que esta cultura ficasse cega em relação à incompatibilidade do islamismo com os valores seculares. Após o massacre na redação da revista satírica Charlie Hebdo, a professora francesa Isabelle Rey ressaltou que

"muitos dos nossos estudantes não compartilham da nossa consternação em relação aos acontecimentos. Podemos fingir que há consenso, mas a realidade é que uma parcela significativa da população acredita que os jornalistas mereceram o fim que tiveram ou que os irmãos Kouachi (os assassinos) morreram como heróis".

Esse secularismo tacanho também impediu a França de apoiar abertamente os cristãos orientais oprimidos pelos islamistas. O conjunto musical "The Priests" planejava anunciar a próxima apresentação em Paris com uma faixa no poster dizendo que haverá arranjos em apoio à causa dos cristãos perseguidos no Iraque e na Síria -- mas a empresa que opera o sistema metroviário em Paris inicialmente proibiu o anúncio, alegando que considerava a faixa uma violação ao secularismo.

Suécia, um dos países europeus onde há mais infiltração do islamismo radical, é considerada a nação "menos religiosa" do Ocidente. De acordo com a agência Statistics Sweden, apenas 5% dos suecos são religiosos praticantes e um em cada três casais se casam somente no civil. Como é que a Suécia chegou a esse ponto? Há muitos anos o governo sueco proibiu qualquer atividade religiosa nas escolas, exceto aquelas diretamente relacionadas às aulas de religião.

Como se isso não fosse o bastante, o secularismo também não tem respostas para a questão de como lidar com o terrorismo; além disso o secularismo deixa os europeus inseguros sobre o que vale a pena lutar, matar e morrer. Se você acredita, como os secularistas acreditam, que os nossos valores são meros acidentes da história e que o bem maior é o conforto, então você não irá dar a mínima pelo futuro da civilização.

O símbolo deste 'euro-secularismo' é a igreja Oude Kerk, uma das igrejas mais famosas de Amsterdã, datada do século XIII. A igreja, ora vazia, é usada para exposições e pode ser alugada para jantares de gala. Do outro lado da rua fica o "Sexyland", apresentando "shows de sexo ao vivo", uma "coffee shop" para venda de drogas e um supermercado "erótico" para a venda de vibradores. Por sete euros é também possível visitar a igreja.


O símbolo desse 'euro-secularismo' é a igreja Oude Kerkem em Amsterdã, A igreja ora vazia é usada para exposições e pode ser alugada para jantares de gala. Do outro lado da rua fica o "Sexyland", apresentando "shows de sexo ao vivo", uma "coffee shop" para venda de drogas e um supermercado "erótico" para a venda de vibradores. (Imagem: Wikimedia Commons)


Bem-vindo a Amsterdã, onde a religião mais praticada é a do Islã.
Por: Giulio Meotti, Editor Cultural do diário Il Foglio, é jornalista e escritor italiano.Original em inglês: Islamism Rises from Europe's Secularism
Tradução: Joseph Skilnik  Do site: https://pt.gatestoneinstitute.org


quarta-feira, 17 de agosto de 2016

10 MENTIRAS QUE SEU PROFESSOR DE HISTÓRIA CONTOU E VOCÊ SEMPRE ACREDITOU

“Se a versão é melhor do que os fatos, publique-se a versão.”

A icônica frase do filme de John Ford – O Homem que Matou o Facínora – foi dita em outro contexto, mas sua precisão em relação ao modo como a imprensa age tratou de torná-la famosa. Narrar um fato, seja ele jornalístico ou histórico, quase nunca é uma tarefa fácil. Em boa parte das vezes, é possível deparar-se com versões conflitantes. Em outras, uma espécie de “telefone sem fio” toma conta da história, e distingui-la da verdade torna-se quase impossível. Leve esta dificuldade para áreas onde o interesse em fomentar um espírito crítico é parte fundamental, como o ensino da História, e não é difícil imaginar que certos enganos não sejam tão inocentes assim.

Sherlock Holmes jamais disse “Elementar, meu caro Watson” nos livros escritos por Conan Doyle. Maria Antonieta por sua vez não foi a autora da infame frase “Pois que comam brioches”, em resposta à ausência de pão na França pré-revolução. Seja por que a frase dita por William Gillete em sua apresentação teatral conseguiu sintetizar perfeitamente a relação entre Sherlock e seu parceiro Watson, ou por que interessava aos revolucionários franceses passar a imagem de uma rainha distante do povo e pouco preocupada com eles, ambas as máximas tornaram-se hoje quase indistinguíveis da realidade a que pertencem.

No entanto, nenhum dos pecados que cometemos ao analisar a história, nem mesmo nossa constante tentação de enquadrá-la num imaginário que pertence à modernidade, se equipara à ideia hollywoodiana de que podemos reduzir a história sempre a dois lados, o dos mocinhos e o dos vilões. Tão complexo quanto os próprios seres humanos que participam da narrativa, o contexto histórico é, quase sempre, ignorado.

Sob o título de “história crítica”, estas novas versões, ou versões parciais da história, tomam as salas de aula. Abaixo, selecionamos 10 exemplos de como a história pode ser contada visando muito mais do que o simples aprendizado.

#1. O VELHO OESTE NÃO ERA TÃO VIOLENTO QUANTO OS FILMES DÃO A ENTENDER.

A imagem de conflitos e duelos constantes é provavelmente a imagem mais difundida sobre o oeste americano no século XIX, o chamado “Velho Oeste”. A ideia parece simples: durante a migração americana em direção ao Oeste, o número de pessoas portando armas era bastante alto, ao mesmo tempo em que a presença de forças policiais ou do próprio sistema judiciário, quase mínimo. Bandidos como Billy the Kid deitavam e rolavam em um pedaço quase anárquico dos Estados Unidos.

A realidade dos números, porém, mostra que a fama de pessoas como Billy não era tão justificada assim. Quando a fonte para os crimes do bandido não é ele próprio, o número de suas vítimas se limita a apenas 4, longe das dezenas que ele encorajava que se propagasse.

Não é difícil entender por que a fama dos bravos e valentes habitantes do Velho Oeste chegou onde chegou. A quem interessaria, por exemplo, retratar um filme onde a vítima de um crime denunciaria o agressor por meio de uma carta escrita a um jornal ou fazendo uma queixa à polícia? Como cidades pequenas na região conseguiriam atrair aventureiros sem exagerar em seus contos e causos? Imagine você ter de contar a realidade sobre o quão precárias eram as armas fabricadas na época (o que tornava quase irrelevante a velocidade do saque do revólver)?

Quantas mortes você acredita terem ocorrido na mais violenta cidade do Oeste americano em 1 ano? Cem? Pouco mais do que isso? Muito longe disso. Cidades como Tombstone não registraram nunca um número maior do que 5 mortes. Na média, a taxa de homicídios na região não era muito distinta da atual.

Pela média de 1,5 homicídios por 100 mil habitantes, registrada na mesma Tombstone, você teria ao menos 20 vezes mais chances de ser assassinado na Porto Alegre de 2016, e quase 50 vezes mais chances em Fortaleza hoje, do que no anárquico velho Oeste.

#2. WILLIAM WALLACE NÃO ERA UM PLEBEU E JAMAIS USOU KILT.


O revolucionário escocês William Wallace, interpretado nos cinemas por Mel Gibson, tornou-se sinônimo de valentia e resistência contra os invasores britânicos que teimavam em dominar a Escócia. Em Hollywood, Wallace virou um símbolo de liberdade.

Para apimentar a história, o revolucionário é constantemente citado como um plebeu, ou um fazendeiro extremamente humilde, cujo respeito de seus compatriotas veio por meio da valentia em campo de batalha. A realidade, no entanto, é um pouco diferente: Wallace era um dos nobres da região, possuindo terras, e portanto servos.

Para piorar – ou não – a situação, o tradicional saiote escocês só viria a ser inventado séculos após a luta de Wallace. A famosa cena do filme em que os guerreiros escoceses mostram a bunda para os ingleses é tão ou mais improvável do que a história de um revolucionário clássico, daqueles que ascendem apenas pelas idéias e valentia.

#3. CUBA NÃO ERA UM PAÍS MISERÁVEL ANTES DA REVOLUÇÃO.

Fulgêncio Batista em pouco se diferenciava de outros ditadores, tão comuns na América Latina. Tinha pouca ou nenhuma vontade de realmente fazer o seu país se desenvolver. Estava mais interessado em lucrar com o poder, custasse o que custasse. Em um caso pitoresco, Fulgêncio recebeu da companhia americana AT&T um telefone de ouro para celebrar um acordo que traria a empresa para operar em Cuba.

As relações entre Estados Unidos e Cuba nesse tempo foram quase sempre bastante próximas. Partiu dos Estados Unidos, por exemplo, a iniciativa de combater o domínio espanhol sobre a ilha do Caribe. Para os EUA, o domínio de um país europeu sobre um país latino-americano contrariava a noção de que deveriam ser eles, e não os europeus, a grande nação a influenciar a região.

Ao contrário do que se tornou comum pensar, porém, Cuba não era um destino abandonado e utilizado como um “cabaré” americano. Por décadas a relação entre ambos os países se estreitou, e bilhões de dólares em investimento americano foram despejados no país, ajudando a construir inúmeras usinas de açúcar – o que colaborou para fazer de Cuba um dos 3 países mais ricos do continente. A renda per capita de um cubano equivalia em 1959 a US$ 11,3 mil dólares em valores atualizados, quase 10% maior do que a renda atual, e semelhante à renda de um britânico no mesmo período.

O país era o quinto do mundo em número de televisões per capita. A maior taxa de telefones da América Latina (2,6 por 100 habitantes), a segunda maior taxa de veículos, atrás apenas da Venezuela, e números de mortalidade infantil menores do que os registrados nos Estados Unidos e Canadá. Ainda em 1958, o país registrava o 8º maior salário industrial do mundo.

Durante o período da revolução, os Estados Unidos não mais apoiavam o governo de Fulgêncio, fato que levou Fidel a tentar apoio dos próprios americanos para sua revolução. Foi apenas em 1961 que Cuba alinhou-se à União Soviética.

#4. BIN LADEN NÃO FOI O PRIMEIRO TERRORISTA A ATACAR OS EUA EM SEU TERRITÓRIO.

Depois de passar por duas guerras mundiais sem ter de enfrentar inimigos no próprio território, os Estados Unidos são constantemente considerados como um dos poucos países na história a não ter encarado adversários bélicos dentro de suas fronteiras. Este seria, segundo alguns, um dos motivos pelos quais o ataque orquestrado pela Al-Qaeda provocou tamanho impacto. Nem mesmo Hitler conseguiu causar tantos danos quanto Bin Laden.

Nos quase três séculos de história americana, porém, em outros 3 momentos o país sofreu ataques externos. No primeiro e mais antigo, a sede do governo, a Casa Branca, chegou a ser incendiada, quando britânicos tomaram Washington na guerra de 1812. Na segunda vez, em 1916, Pancho Villa cruzou a fronteira entre o México com os EUA para atacar a cidade de Columbis. Por último, há o ataque a Pearl Harbor, durante a Segunda Guerra Mundial, onde japoneses atacaram a base militar americana com o intuito de destruir a frota do pacífico.

Pancho Villa, o revolucionário mexicano, chegou a trabalhar como ator em Hollywood, onde interpretou a si mesmo. Villa vendeu os direitos autorais de seus filmes para financiar parte de suas batalhas na revolução mexicana (o filme original gravado com Villa foi refilmado em 2003, tendo Antonio Banderas no papel principal).

#5. OS PAÍSES NÃO SÃO RICOS PORQUE TIVERAM COLÔNIAS OU POBRES PORQUE FORAM EXPLORADOS.

Tentar descobrir a causa da riqueza das nações foi o que fez Adam Smith ficar conhecido como “pai da economia”. Para Smith, um país enriquece não pelo acúmulo de ouro e prata, mas pela divisão do trabalho dentro da economia. Sua defesa tinha um ponto claro: combater o mercantilismo e suas idéias de que um país seria rico apenas exportando e acumulando ouro.

Ainda hoje, estas ideias são bastantes comuns. É muito provável que você já tenha ouvido que os ingleses são ricos graças ao ouro brasileiro, ou coisas do tipo. Na realidade, no entanto, o lucro que os ingleses obtiveram com o ouro brasileiro foi bem diferente daquilo que comumente se pensa. Para acabar com o ouro, os ingleses não precisaram roubá-lo, e nem mesmo minerá-lo no Brasil. Bastou que desenvolvessem uma manufatura capaz de produzir aquilo que os portugueses desejam comprar.

Aqueles que exploravam o ouro no Brasil tornaram-se pobres em pouco tempo, pois não produziam por meio do trabalho a riqueza. Não foram construídas fábricas em Portugal com o ouro obtido por aqui.

Não restam dúvidas de que o colonialismo europeu tenha feito a África ter dificuldades para se desenvolver, mas a forma como isso ocorreu vai além de uma análise simples de que “riquezas foram roubadas”. O grande entrave gerado pela colonização européia foi aumentar conflitos políticos locais e impedir que instituições verdadeiramente livres se desenvolvessem nestes países.

Países como Suécia ou Suíça não tiveram colônias. Outros como a Dinamarca colonizaram apenas locais inóspitos como a Groenlândia. Na Etiópia, por sua vez, não houveram colônias – a monarquia perdurou até o final da década de 60, quando o país sofreu uma revolução comunista. Ainda assim, mesmo sem esse passado, ainda é um país pobre. No caso de Botswana, por exemplo, houve o efeito contrário: mesmo tendo sido colônia, o país acabou desenvolvendo instituições sólidas, capaz de resistir à tentação das inúmeras ditaduras que assolaram o continente africano.

#6. O ESCALPELAMENTO NÃO FOI INVENTADO PELOS ÍNDIOS AMERICANOS.


A luta americana contra os índios nativos é constantemente tema de livros e filmes. O massacre promovido por generais no intuito de “pacificar” territórios é mais do que conhecido. Ao contrário da América Central e da América do Sul, onde doenças fizeram parte do trabalho de exterminar os povos indígenas, nos Estados Unidos esta tarefa coube quase exclusivamente ao exército.

Para colaborar com a imagem de selvagens atribuída aos índios, a ideia de que eles eram responsáveis por cortar o escalpo de suas vítimas (retirar o couro cabeludo) se espalhou rapidamente. O problema com esta história é justamente a inversão que ela carrega. Cortar o escalpo foi uma tradição introduzida inicialmente por franceses, seguida por holandeses, mexicanos e americanos. O motivo era simples: com o escalpo indígena em mãos, um soldado poderia provar que matou de fato um indígena, e assim receber alguma recompensa.


#7. A ESCRAVIDÃO NA ÁFRICA NÃO FOI IMPOSTA PELO IMPERIALISMO EUROPEU.

Ao longo dos séculos, poucas práticas configuraram-se tão mortíferas quanto a escravidão. Condições degradantes e desumanas foram impostas a centenas de milhões de seres humanos, por inúmeros países. Se na Europa a escravidão era guardada aos tempos antigos e períodos de guerra (como os escravos de Roma, por exemplo), na África a prática manteve-se por muito mais tempo.

Quando se aventuraram no mar e começaram a invadir outras terras, países como Portugal estabeleceram bases comerciais em determinados países africanos. Por meio destas bases, milhões de negros foram levados em direção ao novo mundo – o continente americano.

Ao contrário do que se pensa, porém, capturar os escravos não era uma tarefa feita por portugueses, mas por outros africanos. Capturar e vender povos inimigos como escravos era algo bastante comum no continente africano, muito antes de os europeus pensarem nesta ideia.

Ao contrário do tráfico de escravos para o Atlântico, o tráfico para o oriente não era feito em navios, mas em caravanas. Milhões de indivíduos eram sequestrados em suas aldeias e forçados a caminhar em direção ao Oriente Médio. Apenas nesta rota, 18 milhões de pessoas morreram, contra 8 milhões dos mortos na travessia do Atlântico.

Sob o sol escaldante do Saara, os povos árabes levavam milhões de africanos para servirem como escravos em seus países, sempre com a benção de reis e chefes locais.

Nem Ford, nem Rockefeller. O homem mais rico da história é um africano, Mansa Musa, imperador do Mali. Muçulmano, Mansa fez sua peregrinação a Meca em 1324, levando consigo uma comitiva que incluía 60 mil homens e 12 mil escravos. Na comitiva, iam ainda 80 camelos carregados com 50 kg de pó de ouro cada, algo que foi distribuído pelas cidades onde o imperador passou.

A riqueza de Mansa, estimada hoje em US$ 400 bilhões, teve como base a exploração de ouro no continente, mas especialmente o tráfico de escravos para o oriente.

#8. NÃO HAVIA PRESOS POLÍTICOS NA BASTILHA DURANTE A REVOLUÇÃO FRANCESA.

A Bastilha, antiga prisão política no centro de Paris, é usualmente reconhecida como um dos maiores símbolos do regime absolutista derrubado pela revolução. A data de tomada da prisão é considerada ainda hoje como a data oficial da Revolução Francesa, o 14 de julho de 1789.

Segundo a versão mais comum, a tomada da prisão representaria o fim da perseguição política promovida pelo imperador. Só há um problema com esta história: não havia de fato presos políticos na época em que a prisão foi tomada. Apenas oito prisioneiros estavam no local, a maioria por crimes de honra (como matar alguém em um duelo). Dentre eles, o Marquês de Sade.

Na Bastilha, porém, estava o estoque de pólvora detido pelo imperador, que deveria suprir as tropas enviadas do interior para conter a rebelião na capital. Sua tomada foi, portanto, muito mais relevante militarmente do que politicamente. Apesar de não existir mais hoje, o prédio da antiga prisão ainda persiste como marco histórico francês.

#9. MARCO POLO NÃO FOI O RESPONSÁVEL POR LEVAR A MASSA ATÉ A ITÁLIA.

Marco Polo foi um dos mais conhecidos aventureiros em toda a história. Filho de um mercador, conviveu durante anos na corte do imperador mongol Kublai Khan, neto de Gengis Khan. Por lá, aprendeu inúmeros costumes e tradições chinesas, uma vez que Kublai, o “imperador chinês”, construiu sua capital em território chinês (Kublai foi o primeiro a conseguir unificar a China, antes dividida em três impérios).

Em suas mais de duas décadas viajando sob ordens de Kublai, Marco percorreu quase 25 mil km’s, além de dezenas de nações distintas. Já no retorno a Veneza, relatou suas viagens em um livro que lhe tornou conhecido posteriormente.

Dentre aquilo que é atribuído a Marco Polo, porém, a introdução do macarrão na Itália é considerado um “exagero”, uma vez que a massa já era conhecida no país séculos antes, em função dos fenícios.

Durante séculos, chineses foram responsáveis por criar boa parte das inovações até então conhecidas. O arado (atribuído erroneamente aos ingleses), o papel, a moeda, a pólvora. Daí a importância atribuída aos relatos de Marco, considerado o maior explorador da idade antiga.

#10. CRISTÓVÃO COLOMBO NÃO DESCOBRIU A AMÉRICA, E NEM PEDRO ÁLVARES CABRAL, O BRASIL.

Sob o comando de três navios, Cristóvão Colombo aportou no Caribe em 12 de outubro de 1492. Esta, segundo a história oficial, foi a primeira vez que povos do continente americano fizeram contato com povos europeus.

Segundo o próprio Colombo, no entanto, a descoberta não teria sido uma novidade. Para ele, que não havia se dado conta de ter chegado em um novo continente, sua embarcação havia aportado em um local anteriormente descrito por Marco Polo. Segundo especulações, quase dois séculos antes de Colombo, Polo teria desembarcado no continente americano. Para outros autores, no entanto, a descoberta estaria a cargo dos chineses, que em 1421 empreenderam uma grande expedição ao redor do mundo, em navios dezenas de vezes maiores que as caravelas portuguesas.

Relatos de exploradores nórdicos, como o islandês Leif Ericson, mostram que os vikings estiveram no continente americano quase cinco séculos antes de Colombo.

No Brasil, a história ainda fica “dentro de casa” para os portugueses. Segundo sabe-se hoje, dois anos antes de Cabral chegar por aqui, o explorador Duarte Pereira Pacheco teria explorado a foz do rio Amazonas, além do Estado do Maranhão. Para evitar conflitos com a coroa espanhola, porém, os portugueses mantiveram a história em segredo. Em outros relatos, o explorador espanhol Vicente Pinzon teria chegado ao Ceará três meses antes de Cabral, em janeiro de 1500, portanto.Por:  Do site: http://spotniks.com/

terça-feira, 16 de agosto de 2016

REPETINDO ALGUMAS LIÇÕES BÁSICAS DE ECONOMIA

Repetindo algumas lições básicas de economia - que, inexplicavelmente, seguem sendo ignoradas

N. do E.: o artigo a seguir foi acrescido de temas econômicos com o intuito de torná-lo mais próximo da realidade brasileira


Entender de economia é saber reconhecer as consequências secundárias e nem sempre perceptíveis de uma política econômica. Entender de economia é entender as consequências gerais de tudo. 

A economia é a ciência que examina os efeitos de alguma política proposta ou existente, não apenas em relação a algum interesse especial, a curto prazo, mas também em relação ao interesse geral, a longo prazo.

Entendendo que a economia é a ciência que examina consequências, então, por definição, assim como a lógica e a matemática, a economia é a ciência que reconhece implicações inevitáveis.

Podemos ilustrar esse ponto por meio de uma elementar equação algébrica. Suponha que alguém diga que, se x é igual a 5, então x + y = 12. A "solução" dessa equação é que y é igual a 7. A equação não faz essa asserção diretamente, mas, inevitavelmente, indica isso.

O que é verdadeiro nessa equação elementar é também verdadeiro para as mais complicadas e abstrusas equações que se encontram na matemática. A resposta encontra-se na própria enunciação do problema. Ela tem de, é verdade, ser "calculada". O resultado, é verdade, pode às vezes chegar ao homem que resolve a equação como uma formidável surpresa. Pode ser ainda que ele tenha a sensação de estar descobrindo alguma coisa inteiramente nova, sensação semelhante à de "algum observador dos céus quando um novo planeta lhe surge à vista". Sua sensação de descoberta talvez seja justificada pelas consequências teóricas ou práticas da solução. Contudo, sua solução já se continha na formulação do problema. Apenas não fora reconhecida imediatamente, pois a matemática nos lembra que implicações inevitáveis não são, necessariamente, implicações óbvias.

Tudo isso é igualmente verdadeiro no que concerne a economia. A esse respeito, poderíamos também comparar a economia à engenharia. Quando um engenheiro tem um problema, ele deve em primeiro lugar determinar todos os fatos que com ele se relacionam. Se ele projeta uma ponte, para ligar dois pontos, ele deve primeiro conhecer a distância exata entres esses dois pontos, bem como sua precisa natureza topográfica, a carga máxima que a ponte estará destinada a suportar, a força de tensão e compressão do aço com que a ponte será construída e as vibrações e tensões a que será submetida. Boa parte dessas pesquisas factuais já foram feitas por outros.

Seus antecessores também já resolveram equações matemáticas complicadas pelas quais, conhecendo a resistência dos materiais e a tensão a que estes estão sujeitos, puderam determinar diâmetro, forma, número e estrutura das torres, cabos e vigas da ponte.

Igualmente, aquele economista a quem foi proposto um problema prático deve conhecer os fatos essenciais desse problema e as deduções válidas a serem tiradas desses fatos. O aspecto dedutivo da economia não é menos importante que o factual. Pode-se, sobre ele, dizer aquilo que George Santayana disse sobre a lógica (e que poderia, igualmente, ter dito sobre a matemática): "Ela investiga a radiação da verdade", de modo que "quando se sabe que um termo de um sistema lógico descreve um fato, todo o sistema ligado a esse termo torna-se, por assim dizer, incandescente".

Ora, poucas são as pessoas que reconhecem as necessárias implicações das declarações sobre economia que constantemente estão fazendo. 

Quando dizem que o governo deve estimular o crédito para salvar a economia, estão na realidade dizendo que a maneira de salvar a economia é aumentando o endividamento das pessoas. Crédito e dívida são nomes distintos para a mesma coisa, vista de lados opostos.

Quando dizem que o caminho para a prosperidade é aumentar os gastos do governo, estão na realidade dizendo que o governo deve ou tributar mais as pessoas ou incorrer em déficits ou imprimir dinheiro. 

A tributação retira renda (logo, capacidade de consumo e investimento) das pessoas e empresas. 

Déficits significam que pessoas e empresas estão emprestando para o governo, em vez de utilizarem esse dinheiro na própria economia. Significa também que os bancos, em vez de financiarem investimentos produtivos, estão financiando a folha de pagamento do governo. E significa também que haverá aumento de impostos no futuro para que o governo possa arcar com o serviço dessa dívida. 

E, por fim, a mera impressão de dinheiro gera inflação de preços, o que significa que as pessoas perdem poder de compra e as empresas ficam sem dinheiro suficiente para bancar os custos dos investimentos.

Portanto, aumentar os gastos do governo gera o contrário de prosperidade.

Quando dizem que o governo deve proteger a indústria nacional por meio de tarifas de importação, estão na realidade dizendo que o grande empresariado do país deve ser protegido das escolhas voluntárias dos consumidores, que agora ficam proibidos de comprar bens estrangeiros e acabam sendo obrigados a comprar bens nacionais mais caros e de menor qualidade deste baronato nacional. Proteção à indústria nacional significa criar uma reserva de mercado para grandes empresários e, com isso, garantir artificialmente seus lucros, à custa do bem-estar do povo, especialmente dos mais pobres, que agora estão proibidos de adquirir bens estrangeiros baratos e de qualidade. 

Quando dizem que o governo deve estimular a indústria nacional por meio de subsídios ou empréstimos subsidiados pelo governo, estão na realidade dizendo que o grande empresariado deve receber dinheiro de impostos do povo e, com isso, levar vantagem sobre os concorrentes menores. 

Quando dizem que o câmbio deve ser desvalorizado para estimular as exportações e frear as importações, estão na realidade dizendo que o poder de compra da moeda deve ser reduzido e a população deve ter seu bem-estar afetado apenas para garantir os lucros do grande empresariado nacional.

Quando dizem que as exportações devem ser aumentadas e as importações devem ser restringidas, estão na realidade dizendo que a quantidade de produtos à disposição da população nacional deve ser duplamente reduzida — gerando, no mínimo, mais carestia.

Quando dizem que as empresas devem ser controladas por agências reguladoras, estão na realidade dizendo que essas empresas devem operar dentro de um cartel protegido pelo estado, com preços garantidos e sem liberdade de entrada para potenciais concorrentes.

Quando dizem que os agricultores devem ter os preços de seus produtos elevados por programas de compras governamentais, estão na realidade dizendo que toda a população do país deve ter sua comida encarecida.

Quando dizem que todos têm direito a saúde, educação e transporte gratuitos, estão na realidade dizendo que toda a população deve dar mais dinheiro para burocratas do governo, os quais irão repassar esse dinheiro (retendo para si uma fatia) para outras pessoas, as quais irão então prover esses serviços de acordo com critérios especificados por burocratas e políticos, e não pelos consumidores.

Quando dizem que os salários — principalmente o salário mínimo — devem ser aumentados por decreto, estão na realidade dizendo que o segredo para a prosperidade econômica é aumentar os custos de produção.

Quando dizem que as empresas devem utilizar mais conteúdo nacional em seus produtos, estão na realidade dizendo que os fornecedores desse conteúdo nacional têm direito a uma reserva de mercado, podendo assim elevar seus preços e reduzir a qualidade de seus produtos despreocupadamente.

Quando dizem que um pouco mais de inflação gera mais crescimento econômico, estão na realidade dizendo que uma perda mais acentuada do poder de compra da moeda e uma maior incerteza quanto aos custos futuros estimulam mais empreendedores a fazerem investimentos produtivos de longo prazo.

Quando dizem que um pouco mais de inflação gera mais consumo e emprego, estão na realidade dizendo que um aumento no custo de vida estimula as pessoas a contratarem mais serviços (como empregadas domésticas) e a irem mais vezes aos shopping centers.

Quando dizem que mais gastos do governo estimulam o empreendedorismo, estão na realidade dizendo que a contratação de mais burocratas e a criação de mais burocracia, mais leis e mais regulamentações incentivam a produção e levam a mais geração de riqueza.

Conclusão

Para se fazer uma verdadeira análise econômica, ambas as faces da moeda devem ser consideradas, de modo que todas as implicações de uma proposta sejam devidamente entendidas e estudadas. E isso raramente é feito.

A análise dos exemplos acima nos mostra, incidentalmente, outra lição: quando estudamos os efeitos de várias propostas, não apenas sobre determinados grupos e a curto prazo, mas sobre todos os grupos e a longo prazo, as conclusões a que chegamos correspondem às do senso comum. Não ocorreria a pessoa alguma dizer que é economicamente estimulante ter vitrinas quebradas e cidades destruídas; que criar projetos públicos inúteis é uma boa maneira de gastar o dinheiro do povo; que as máquinas, que aumentam a produção e economizam o esforço humano, devem ser temidas; que obstruir a produção e o consumo aumenta a riqueza; que a nação se torna mais rica quando sua moeda perde poder de compra; que a prosperidade aumenta quando o comércio com os outros países é restringido; que poupar é algo prejudicial e que o consumismo e o endividamento trazem prosperidade.

"O que é prudência na conduta de toda família em particular" — disse o bom senso de Adam Smith em resposta aos sofistas de seu tempo — "dificilmente pode ser loucura na de um grande reino." Homens menores, entretanto, perdem-se em complicações. Não reexaminam seus raciocínios mesmo quando emergem com conclusões que se evidenciam absurdas. 

Dependendo de suas próprias crenças, o leitor pode ou não aceitar o aforismo de Bacon, segundo o qual "uma pequena filosofia inclina o espírito do homem para o ateísmo, ao passo que a profundidade na filosofia conduz seu espírito para a religião". É verdade, no entanto, que uma pequena noção de economia pode, facilmente, conduzir às conclusões paradoxais e ridículas que acabamos de expor, ao passo que a profundidade nessa noção fará com que o homem retorne ao bom senso. 

A profundidade, na economia, está em procurar todas as consequências de uma política, em vez de apenas dirigir o olhar para as que são imediatamente visíveis.

Henry Hazlitt 
(1894-1993) foi um dos membros fundadores do Mises Institute. Ele foi um filósofo libertário, economista e jornalista do The Wall Street JournalThe New York TimesNewsweek e The American Mercury, entre outras publicações. Ele é mais conhecido pelo seu livro Economia em uma Única Lição. Do site: http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=2491