segunda-feira, 30 de abril de 2012

Meu Brasil brasileiro


O Brasil é um país, no mínimo, estranho. Em 1992, depois de grande mobilização nacional e de uma comissão parlamentar mista de inquérito (CPMI) acompanhada diariamente pela população, o então presidente Fernando Collor de Mello teve o seu mandato cassado. Foi o primeiro presidente da República que teve aprovado um processo de impeachment no País. De acordo com os congressistas, o presidente foi deposto por ter cometidos crimes de responsabilidade. Collor foi acusado de ter articulado com o seu antigo tesoureiro de campanha, Paulo César Farias, um grande esquema de corrupção que teria arrecado mais de US$ 1 bilhão. Acabou absolvido pelo Supremo Tribunal Federal por falta de provas. Passados 20 anos, o mesmo Fernando Collor, agora como senador por Alagoas, foi indicado por seu partido, o PTB, para compor a CPMI que se propõe a investigar as ações de Carlinhos Cachoeira. Deixou a posição de caça e passou a ser um dos caçadores.Quem mudou: Collor ou o Brasil? Provavelmente nenhum dos dois. Algo está profundamente errado quando um país não consegue, depois de duas décadas, enfrentar a corrupção. Hoje, diferentemente de 1992, as denúncias de corrupção são muito mais graves. Estão nas entranhas do Estado, em todos os níveis, e em todos os Poderes. Não se trata - o que já era grave - simplesmente de um esquema de corrupção organizado por um grupo marginal do poder, recém-chegado ao primeiro plano da política nacional.
Ao longo dos anos a corrupção foi sendo aperfeiçoada. Até adquiriu status de algo natural, quase que indispensável para governar. Como cabe tudo na definição de presidencialismo de coalizão, não deve causar admiração considerar que a corrupção é indispensável para a governabilidade, garante estabilidade, permite até que o País possa crescer - poderia dizer algum analista de ocasião, da turma das Polianas que infestam o Brasil.
Parodiando Karl Marx, corruptos de todo o Brasil, uni-vos! Essa poderia ser a consigna de algum partido já existente ou a ser fundado. Afinal, a nossa democracia está em crise, mas não é por falta de partidos. É uma constatação óbvia de que o Brasil não tem memória. O jornalista Ivan Lessa escreveu que a cada 15 anos o Brasil esquecia o que tinha acontecido nos últimos 15. Lessa é um otimista incorrigível. O esquecimento é muito - mas muito - mais rápido. É a cada 15 dias. Caso contrário não seria possível imaginar que Fernando Collor estivesse no Senado, presidisse comissões e até indicasse diretores de empresas estatais, como no caso da BR Distribuidora. E mais: que fosse indicado como membro permanente de uma CPMI que visa a apurar atos de corrupção. Indo por esse caminho, não vai causar nenhuma estranheza se o Congresso Nacional revogar o impeachment de 1992 e até fizer uma sessão de desagravo ao ex-presidente. Como estamos no Brasil, é bom não duvidar dessa possibilidade.
Em 1992 muitos imaginavam que o Brasil poderia ser passado a limpo. Ocorreram inúmeros atos públicos, passeatas; manifestos foram redigidos exigindo ética na política. Até surgiu uma "geração de caras-pintadas". Parecia - só parecia - que, após a promulgação da Constituição de 1988 e a primeira eleição direta presidencial - depois de 29 anos -, a tríade estava completa com a queda do presidente acusado de sérios desvios antirrepublicanos. O novo Brasil estaria nascendo e a corrupção, vista como intrínseca à política brasileira, seria considerada algo do passado.
Não é necessário fazer nenhum balanço exaustivo para constatar o óbvio. A derrota - de goleada - dos valores éticos e morais republicanos foi acachapante. Nos últimos 20 anos tivemos inúmeras CPIs. Ficamos indignados ouvindo depoimentos em Brasília com confissões públicas de corrupção. Um publicitário, Duda Mendonça, chegou mesmo a confessar - sem que lhe tivesse sido perguntado - na CPMI do Mensalão que havia recebido numa conta no exterior o pagamento pelos serviços prestados à campanha do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva. A bombástica revelação foi recebida por alguns até com naturalidade. O que configurava um crime de responsabilidade, de acordo com a Constituição, além de outros delitos, não gerou, por consequência, nenhum efeito. E, vale recordar, com a concordância bovina - para lembrar Nelson Rodrigues - da oposição.
A aceitação de que política é assim mesmo foi levando à desmoralização da democracia e de seus fundamentos. Hoje vivemos um simulacro de democracia. Ninguém quer falar que o rei está nu. Democracia virou simplesmente sinônimo de realização de eleições, despolitizadas, desinteressadas e com um considerável índice de abstenção (mesmo com o voto obrigatório). Aqui, até as eleições acabaram possibilitando expandir a corrupção.
Na política tradicional, a bandeira da ética é empunhada de forma oportunista, de um grupo contra o outro. Na próxima CPI os papéis podem estar invertidos, sem nenhum problema. É um querendo "pegar" o outro. E muitas vezes o feitiço pode virar contra o feiticeiro.
E as condenações? Quem está cumprindo pena? Quem teve os bens, obtidos ilegalmente, confiscados? Nada. O que vale é o espetáculo, e não o resultado.
O Brasil conseguiu um verdadeiro milagre: descolou a política da economia. O País continua caminhando, com velocidade reduzida, por causa da má gestão política. Mas vai avançando. E por iniciativa dos simples cidadãos que desenvolvem seus negócios e constroem dignamente sua vida. Depois, muito depois, vão chegar o Estado e sua burocracia. Aparentemente para ajudar, mas, como de hábito, para tirar "alguma casquinha", para dizer o mínimo. E a vida segue.
Não vai causar admiração se, em 2032, Demóstenes Torres for indicado pelo seu partido para fazer parte de uma CPI para apurar denúncias de corrupção. É o meu Brasil brasileiro, terra de samba e pandeiro.Por: Marco Antonio VILLA - HISTORIADOR; É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS (UFSCAR) - O Estado de S.Paulo

domingo, 29 de abril de 2012

Golpes de Estado


A palavra "golpe" hoje circula no Brasil em todos os ambientes. O tema tem alcance histórico. O moderno poder político é movido por golpes canhestros ou eficazes. Basta consultar a crônica da Europa para verificar que todos os modos legítimos de mando foram violentados por golpistas de várias tendências. Assim se afirmou o poder de Luís XI e de Henrique IV, o mesmo ocorrendo com Robespierre e, depois, com a família de Napoleão. Pétain e Laval encerram a fieira do golpismo. Na Inglaterra, a ditadura de Cromwell afastou monarquistas e liberais (Levellers) da Revolução. Em Portugal, o golpe determinou a luta de Pedro IV, o nosso Pedro I, contra o seu irmão Miguel. O século 20 português conheceu golpes continuados. O fascismo italiano foi uma série de golpes, o mesmo na Espanha. Na Alemanha e na Rússia do século 20, regimes virulentos dominaram o Estado à força de golpes. No Brasil, temos os golpes do imperador, dos regentes, dos oficiais que derrubam a monarquia, de Getúlio, que instalou uma ditadura feroz, dos civis e militares erguidos contra a ordem estabelecida em 1961 e 1964. Depois, o golpe dentro do golpe no Ato Institucional n.º 5 (AI-5), o golpe do chamado Pacote de Abril, etc. Setores das esquerdas falam hoje da imprensa golpista, no mesmo passo em que as direitas bradam contra o revanchismo. É preciso não banalizar a noção de golpe, cujo fim é impedir a força de adversários no Estado e nas sociedades. Eles são propositivos se buscam impor formas de pensamento e suspendem os mecanismos jurídicos das anteriores formas de poder. Por não terem origem nas urnas, os seus atores se legitimam invocando a urgência (o Estado estar-se-ia corrompendo) ou a necessidade. Foi assim no AI-1: "A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma". O golpe aposenta o voto, cassa mandatos, fecha partidos. Importante estudo vem de Gabriel Naudé nas Considerações Políticas sobre os Golpes de Estado (1640). O texto pode ser lido online na Biblioteca Gallica. Naudé situa o golpe no campo da prudência. Ele critica a divisão tríplice daquela virtude feita por Justo Lipsio: a leve - dissimulação e desconfiança na ordem política; a sórdida, que consiste "em adquirir amizades e serviços de uns enganando outros por falsas promessas e mentiras, presentes e outros meios"; e a virulenta, "que se afasta totalmente da virtude e das leis". Segundo Naudé, tal fracionamento é inútil, pois todas as prudências dependem de uma só, ilustrada por Luís XI, o "Rei Aranha", cuja máxima era: "Quem não sabe dissimular não sabe governar". A regra dos governos reside na desconfiança universal e na dissimulação, que consiste ou em omitir - pretender que nada foi visto pelos poderosos - ou "na ação e na comissão, o ganho de alguma vantagem para atingir alvos por meios encobertos". Omissões e comissões nutrem os poderosos e fornecem "os diversos meios, razões e conselhos usados pelos príncipes para manter sua autoridade e a situação do público" sem "parecer transgredir o direito comum e causar suspeita de fraude e injustiça". Um golpista indicado por Naudé é Dionísio, tirano de Siracusa. Querendo impedir as reuniões dos opositores, agendadas para a noite, ele afrouxava sem alarde as penas dos assaltantes... Golpes incluem o segredo das ações "extraordinárias que os príncipes são levados a executar nos assuntos difíceis e desesperados, contra o direito comum, sem mesmo guardar alguma ordem ou forma de justiça, prejudicando o interesse do particular em benefício público". Rapidez, quebra de costumes e de jurisprudência integram os golpes. Neles "vemos cair a tempestade sem ter ouvido os trovões (...), as Matinas são entoadas antes de o sino tocar, a execução precede a sentença. Fulano recebe o golpe que pensava aplicar, sicrano morre, imaginando estar seguro". Truque jurídico golpista: "O processo é instruído após a execução". A nova ordem livra-se das "pequenas formalidades exigidas pela Justiça". Naudé profetiza os regimes sangrentos do século 20. O golpe (similar ao cometa e ao terremoto), afirma ele, deve ser tido como exceção. (Carl Schmitt tem muito a dizer sobre esse assunto.) Nele o político precisa ser visto "como o pai que cauteriza um membro do filho para salvar a sua vida". O golpe justifica-se ao abolir "privilégios, direitos, franquias, usufruídos por alguns governados em prejuízo da autoridade principesca". Os golpes devem ser radicais como os "cirurgiões competentes que, ao abrir uma veia, tiram o sangue para limpar os corpos de seus humores nocivos". Segundo Naudé, eles precisam ser fulminantes e despercebidos. Não existe ação eficaz se os planos golpistas são publicados. Jamais ocorreu golpe sem a purga dos "membros apodrecidos": o golpe é intolerante e ignora "as pequenas formalidades da Justiça". O que produz a defesa dos golpes em maquiavélicos como Naudé? As guerras dinásticas e de religião na Europa. Mas o golpe, longe de sanar as guerras civis, as perpetua, levando-as ao plano internacional. Quem deseja o convívio político segue as "pequenas formalidades" jurídicas. Sem elas ninguém está seguro, nem mesmo os golpistas, pois os regimes não são eternos e o golpista de hoje é a vítima do golpe, amanhã. A democracia exige simultaneidade irredutível das diferenças ideológicas, nela não existem inimigos, como propõe Carl Schmitt, somente adversários que merecem respeito e jamais ataques fratricidas. Qual o terreno fértil dos golpes? A desconfiança, a dissimulação, os ódios espalhados pelos golpistas que empesteiam e sufocam a vida política. Tais são os primeiros e últimos obstáculos a serem vencidos. Por Roberto Romano

sábado, 28 de abril de 2012

Sarkozy, o destruidor de mundos



Demétrio Magnoli - Instituto Millenium
“Imagine a França, durante uma crise, sendo liderada pelo triunvirato Mélenchon-Joly-Hollande”, bradou o presidente Nicolas Sarkozy, referindo-se às indicações de voto de Jean-Luc Mélenchon, da Frente de Esquerda, e de Eva Joly, dos Verdes, em favor de François Hollande, o desafiante do Partido Socialista. A visão, talvez perturbadora, nem se aproxima, porém, da perspectiva de uma França na qual a direção da oposição se transferirá para a Frente Nacional de Marine Le Pen. Entretanto, esse é um desenlace provável do ciclo eleitoral em curso, que abrange o segundo turno da disputa presidencial e as eleições parlamentares de junho. A responsabilidade cabe a Sarkozy – e à crise do euro.
Na sua campanha triunfante de 2007 o presidente aprendeu um truque político simples, que só demanda o desprezo pelos princípios sobre os quais se sustenta a democracia francesa. A artimanha consiste em reproduzir, um tom abaixo, o hino ultranacionalista da Frente Nacional, cantando as glórias da “França católica”, articulando as noções de “identidade nacional” e “singularidade francesa”, costurando sentenças trançadas em torno dos termos “imigrantes”, “segurança” e “terrorismo”. A operação funcionou cinco anos atrás, transferindo-lhe eleitores seduzidos pela extrema direita. Repetida nos últimos meses com alarido ainda maior, revelou-se inútil: Le Pen obteve 18% dos votos, superando o recorde histórico de seu pai, Jean-Marie, alcançado em 2002. A Frente Nacional concentrou sua campanha na promessa de ruptura com o euro e com a União Europeia, relegando a xenofobia a patamar secundário.
Pela primeira vez na História da Quinta República Francesa o presidente que busca a reeleição viu escapar a dianteira no turno inicial. Sob o impacto da crise do euro, o posto ficou com Hollande, que recebeu 28,6% dos votos, ante os 27,2% de Sarkozy. A diferença parece insignificante, ainda mais quando se compara o desempenho de Mélenchon com o de Le Pen: a Frente de Esquerda obteve 11% dos sufrágios, muito longe do que indicavam as pesquisas – e de sua meta de superar a extrema direita, recuperando o antigo eleitorado comunista. No domingo os estrategistas presidenciais adicionaram os votos de Le Pen aos de Sarkozy, chegando à soma de 45%, maior que o total do “triunvirato” da esquerda, de 42%. Segundo a aritmética, tudo dependeria do comportamento dos 9% de eleitores do candidato centrista François Bayrou. Política, contudo, não é aritmética.
O primeiro turno sugere somas mais pertinentes. A Frente Nacional e a Frente de Esquerda, linhas paralelas extremas da política francesa, encontram-se no pátio da rejeição à União Europeia (a “Europa libertina” de Le Pen, que é a “Europa neoliberal” de Mélenchon). Somados, Le Pen e Mélenchon representam 29% dos eleitores, mais que Hollande ou Sarkozy. A adição é eleitoralmente irrelevante, mas evidencia as dimensões da crise política emanada do tufão que se abate sobre a zona do euro.
A soma dos sufrágios do “triunvirato” da esquerda também tem sentido, pois Mélenchon e Joly indicaram o voto em Hollande. A missão do candidato social-democrata no segundo turno não é trivial: para atrair os eleitores da Frente de Esquerda, que rejeitam a “Europa neoliberal”, ele se inclinará um pouco à esquerda, desenhando no ar a quimera de uma reforma da União Europeia. Na hipótese provável de sucesso, enfrentará como presidente o dilema insolúvel de se equilibrar entre os imperativos categóricos da Alemanha de Angela Merkel e as doces promessas que vendeu aos franceses.
A soma dos sufrágios de Sarkozy e da Frente Nacional é um exercício contábil impertinente
A soma dos sufrágios de Sarkozy e da Frente Nacional é um exercício contábil impertinente. O partido da extrema direita, grande vitorioso do primeiro turno, consolidou as bases populares e operárias que no passado votavam nos comunistas, mas foram atraídas pelo ultranacionalismo de Jean-Marie após a queda do Muro de Berlim. Marine Le Pen, ao contrário de Mélenchon, classificou como equivalentes os dois rivais do turno final. Sua estratégia, proclamada publicamente, é alçar-se à condição de “chefe da oposição”. Nas hostes de Le Pen nenhum dirigente oculta o desejo de assistir à falência política de Sarkozy e à fragmentação da coalizão de centro-direita.
Corretamente, Sarkozy interpretou o cenário do primeiro turno como “um voto de crise”. Agora, sob o signo da crise, ele está condenado a radicalizar a estratégia que fracassou no turno inicial, caçando os eleitores de Le Pen com o laço da xenofobia. Na democracia, contudo, política é sobretudo linguagem. A renúncia a uma linguagem em nome de outra, estranha às próprias tradições, geralmente tem custos intoleráveis. Os sábios que cercam o presidente começam, tarde demais, a aprender essa lição, bem conhecida pelo ex-presidente Jacques Chirac, antecessor de Sarkozy no comando da centro-direita francesa.
Há uma década um desastre eleitoral tirou o socialista Lionel Jospin do segundo turno, provocando um embate direto entre Chirac e Jean-Marie Le Pen. Então Chirac se recusou a debater com o rival e concluiu com o Partido Socialista o acordo tácito do “cordão sanitário”, pelo qual ambos rejeitariam alianças eleitorais com a extrema direita. O acerto funcionou: a Frente Nacional jamais conseguiu representação parlamentar e a centro-direita conservou suas credenciais democráticas.
Chirac foi o segundo herdeiro político de Charles de Gaulle. A complexa tradição gaullista tem um forte componente nacionalista, mas não combina com os impulsos quase fascistas da Frente Nacional. Sarkozy, o terceiro herdeiro, engajou-se no jogo perigoso da mistura, apropriando-se de elementos fundamentais da linguagem da extrema direita. Tudo indica que pagará o preço dessa opção. Entretanto, a fatura recairá também sobre o sistema político da democracia francesa e, em última análise, sobre as engrenagens fragilizadas da União Europeia.Por: Demétrio magnóli
Fonte: O Estado de S. Paulo, 26/04/2012

O assalto - só por uns dias



Carlos Alberto Sardenberg
A queda real dos juros depende de uma mudança de comportamento
Bancos ganham dinheiro, mas muito dinheiro com o cheque especial. E contam para isso com a falta de educação financeira do brasileiro e uma certa tolerância com taxas elevadas, que deve ser ainda herança da superinflação.
Em circunstâncias normais, ninguém toparia pagar uma taxa de juros de 185% ao ano, sabendo, como todo mundo sabe, que a inflação roda na casa dos 5% a 6%. Reparem bem: 185% ao ano! Imagine o que você diria se o gerente do banco oferecesse essa taxa para um empréstimo pessoal. Agressão seria quase legítima defesa.
Acrescente que pessoas bem informadas deveriam saber que os bancos pagam 9% pelo dinheiro. Isso mesmo, tomam a 9% e emprestam a 185%. Não faz sentido.
Mas um número imenso de brasileiros paga essa taxa, efetivamente. Em março, por exemplo, a taxa média de juros caiu, menos a do cheque especial. As pessoas continuaram sacando no vermelho, normalmente, mesmo sabendo disso. Sim, é possível que o cliente comum não conheça exatamente o tamanho da taxa, os 185% ao ano. Mas certamente sabe que é um absurdo.
Como topam pagar?
Porque é só um diazinho, não é mesmo? Vá lá, uns três ou quatro dias. O salário vai cair na conta na próxima terça, hoje ainda é quinta, o saldo já era, mas tem aquele jantar… Cheque especial é para isso mesmo, certo? Resultado: você entra e paga os juros mais escorchantes do mundo por cinco dias.
Agora multiplique os cinco dias por milhões de clientes e entenderá por que os bancos adoram o cheque especial e fazem o possível para atrair o freguês. Lembra aquelas propagandas que oferecem cinco dias sem juros no cheque especial? Pois é, da próxima vez verifique quanto vai pagar no sexto dia no vermelho.
No movimento de redução de juros, forçado pelo governo, todos os bancos anunciaram queda nas taxas para o cheque especial. Atenção, porém. Há pisos e tetos, estes ainda escorchantes. E quem consegue os níveis mais baixos?
Conforme têm mostrado as reportagens do “Globo”, a taxa mínima vai para os clientes que mantêm um bom saldo em conta-corrente, fazem aplicações, pagam taxas de administração, têm seguro, talvez um plano de capitalização e que, por isso mesmo, nunca usam o especial.
Para o cliente que está sempre ali apertado, todo mês faltando alguns dias no fim do salário, ou seja, para quem precisa do especial, a taxa vai lá para cima. Se você está nesse caso, vá ao banco tentar saber os seus juros.
Os brasileiros não podem aceitar esses juros, nem que seja por um dia
Na avaliação geral dessa história, será preciso observar as taxas médias efetivamente aplicadas.
A queda real e duradora das taxas depende de uma mudança de comportamento. Os brasileiros não podem aceitar esses juros, nem que seja por um dia. Sim, muitas pessoas enfrentam dificuldades inesperadas – uma doença, perda de emprego, batida de carro -, mas a maioria utiliza o cheque especial porque não consegue suspender ou ao menos adiar um jantar, um vestido novo. Isso dá para mudar.
Quando a tentação vier, pense nisso: 185% ao ano!
NO VAREJO E NO ATACADO
São contratos de milhões de reais, a soma passando do bilhão nesses negócios do grupo Cachoeira com as diversas instâncias de governo. Naturalmente, as negociações em torno disso envolvem empresários, parlamentares e funcionários do governo.
Pois não é que Cachoeira recorreu à mesma teia de contatos para um, digamos, varejinho? Mobilizou dois senadores, um deputado federal, um ex-prefeito e um secretário de Estado, em pelo menos sete telefonemas, para colocar sua prima num emprego no governo de Minas, com salário de dois mil reais. E ainda tiveram que afastar o funcionário que estava lá, para abrir a vaga.
O senador Aécio Neves, que patrocinou o emprego a pedido do senador Demóstenes Torres, este agindo a pedido de Cachoeira, não viu nada de mais na nomeação. Qual o problema? O senador Demóstenes, na época, era um paladino da ética, seu pedido era qualificado. Depois, quando soube que o padrinho era o Cachoeira e que Demóstenes era o outro, Aécio sentiu-se traído.
É, pode ser. O governo está aí mesmo para empregar o pessoal dos correligionários, certo?
Mas se mobilizam tudo isso por um emprego de dois mil, com quem seria preciso falar para o contrato de uma superobra? Por:  Carlos Alberto Sardenberg
Fonte: O Globo, 26/04/2012

Decadência moral ou saudosismo idealizado?

Em artigo na Folha hoje, a senadora Kátia Abreu culpa o crescente ateísmo pela crise que assola os Estados Unidos e a Europa. Segundo a senadora, a crise não é do capitalismo em si (o que concordo), mas sim de um capitalismo mais hedonista, materialista e ateu (o que discordo). Ao retirar Deus da história, diz ela, os valores morais se perderam e tudo entrou em decadência. Sem Deus, tudo é permitido! Não creio que os dados empíricos corroboram com tal visão. A crise não seleciona de acordo com a fé. Ataca países de todos os tipos. Por outro lado, os países asiáticos seguem em melhor situação, e tampouco creio que seja por causa da fé em Deus (muito menos por causa do cristianismo). Não consta também que os muçulmanos, repletos de fé religiosa (até demais), naveguem em um mar de prosperidade. Também questiono se há de fato este hedonismo todo nesse mundo moderno e mais laico, quando vejo tanta gente abraçando novas formas de fé na "imortalidade", postergando os prazeres do momento em nome de uma vida (qual vida?) sempre mais longa. As cruzadas anti-tabagistas e contra o açúcar e fritura ilustram bem isso. Tem muita gente com medo de viver o presente! Mas o que eu gostaria de questionar aqui é se há mesmo uma decadência moral em curso, para começo de conversa. Sim, eu não posso negar que vejo certos valores em declínio, valores estes que eu respeito e admiro. Só que nem tudo é decadência moral. Os hábitos e costumes mudam, e muitas vezes temos dificuldade de adaptação. Quando tais mudanças ocorrem em ritmo muito acelerado, esta aceitação fica ainda mais difícil. Portanto, eu já colocaria em xeque a principal premissa da senadora (e de muitos conservadores): há mesmo este declínio moral ou estamos diante de novidades que incomodam, mas que não necessariamente vão tornar o mundo um lugar pior? Nesse meu artigo, falo mais dessa questão dos "saudosistas". Acho que devemos tomar muito cuidado com este julgamento precipitado de que tudo vai de mal a pior com o mundo moderno. Creio que o cético David Hume, que não pode ser acusado de ingênuo e esperançoso, colocou o dedo na ferida quando disse: "O hábito de culpar o presente e admirar o passado está profundamente arraigado na natureza humana". Em seu novo livro "Civilization: The West and the Rest", Niall Ferguson arrisca uma boa explicação para este fenômeno tão comum, principalmente entre pessoas com mais idade. Ele afirma que a idéia de que estamos "fritos", que o declínio é inevitável, que as coisas só podem piorar, está altamente conectada à noção de mortalidade que temos. Como vamos degenerar enquanto indivíduos, então, de forma instintiva, nós sentimos que as civilizações em que vivemos devem seguir o mesmo destino. Longe de mim apresentar um quadro muito esperançoso e otimista, ignorando os enormes riscos existentes e até mesmo os aspectos que considero degenerados de fato em nosso mundo atual. Mas eu iria com menos fervor neste diagnóstico e prognóstico. O crescimento da riqueza mundial pode representar simplesmente a ascensão de uma classe média, e comparar seus gostos (sempre medíocres por definição) com as preferências aristocráticas do passado é uma injustiça (Michel Teló x Mozart, por exemplo). Não acho, portanto, que exista esse declínio moral todo e que ele se deve ao ateísmo. Até porque, como dizia Humboldt, "A moralidade humana, até mesmo a mais elevada e substancial, não é de modo algum dependente da religião, ou necessariamente vinculada a ela". Eu concordo, e vejo isso no dia a dia. Pessoas com profunda fé espiritual que não são ícones de moralidade, e ateus ou agnósticos que se mostram pessoas rigorosamente corretas. O capitalismo depende mesmo da fé religiosa? Eu penso que não. Por fim, e para ilustrar com um bom exemplo o alerta de Hume, segue uma constatação feita pelo jesuíta espanhol Baltasar Gracián, em "A Arte da Prudência". Detalhe: o livro foi escrito em 1647! Muitos valores vieram a parecer antiquados: falar a verdade, manter a palavra. Os bons parecem pertencer aos velhos bons tempos, embora sejam sempre queridos. Se é que ainda há alguns, são raros, e nunca são imitados. Que triste época essa, quando a virtude é rara e a maldade está no cotidiano. Será que o mundo fica cada vez pior mesmo, ou será que são nossos olhos, nosso saudosismo de um passado idealizado, nossa insegurança diante das novidades, que criam esta imagem sombria do presente e futuro? Deixo com o leitor a resposta.Por: Rodrigo Constantino

A perversidade da diversidade

As expressões 'ação afirmativa', 'representação paritária', 'tratamento preferencial' e 'cotas raciais' não possuem grande apelo entre a população. Sabendo disso, a elite intelectual, a mídia, o governo e todos os demais entusiastas criaram o termo 'diversidade', uma palavra aparentemente benigna que funciona muito bem para encobrir políticas racialmente discriminatórias. Via de regra, tais políticas exigem que as universidades, as empresas privadas e as burocracias do governo formem seus quadros de acordo com a proporção de cores e etnias existentes no país. Por exemplo, se os negros formam 20% da população, então eles devem formar 20% dos estudantes universitários, 20% dos professores, 20% dos gerentes de empresas e 20% dos funcionários públicos. Por trás dessa visão de justiça está a ignara noção de que, não fosse a discriminação, todas as cores e etnias estariam igualmente distribuídas em termos de renda, educação, ocupação e outros critérios. Não há absolutamente nenhuma evidência, em nenhum lugar do mundo, de que a proporcionalidade estatística seja a norma. Ainda assim, grande parte de nossas leis, de nossas políticas públicas e do nosso modo de pensar partem do princípio de que a proporcionalidade é a norma. Vejamos agora algumas diferenças raciais e vamos pensar sobre suas causas e possíveis curas. Nos EUA, ao passo que 13% da população é formada por negros, estes representam 80% dos jogadores profissionais de basquete e 65% dos jogadores profissionais de futebol americano, sendo que, em ambos os esportes, os negros são os jogadores mais bem pagos. Em contraste, os negros representam apenas 2% dos jogadores profissionais da liga americana de hóquei sobre o gelo. Logo, não há diversidade racial no basquete, no futebol americano e nem no hóquei. Tais esportes em momento algum atendem aos critérios de 'igualdade racial'. Mesmo no que diz respeito a conquistas esportivas, a diversidade racial está ausente. No baseball, quatro dos cinco recordistas de home-runs são negros. Desde que os negros entraram nas principais ligas de baseball, das 8 vezes em que houve mais de 100 bases roubadas em uma temporada, todas foram feitas por negros. Por outro lado, o Departamento de Justiça americano recentemente ordenou que o departamento de polícia de cidade de Dayton, no estado de Ohio, diminuísse a nota mínima de aprovação nas provas escritas para que assim mais negros pudessem entrar na força policial. O que o Procurador Geral da Justiça dos EUA, senhor Eric Holder, deveria fazer a respeito da falta de diversidade racial nos esportes? Por que as elites intelectuais não protestam? Será que é porque os proprietários desses multibilionários times profissionais de basquete, futebol e baseball são pró-negros ao passo que os proprietários dos times da liga de hóquei e os donos das grandes empresas são racistas relutantes em colocar negros em altas posições e com altos salários? Dentre as questões de diversidade étnica, há uma que foi completamente varrida para debaixo do tapete: os judeus americanos representam menos de 3% da população do país e somente 0,2% da população mundial. Todavia, entre 1901 e 2010, esses judeus ganharam 35% de todos os prêmios Nobel que foram concedidos a americanos, o que significa que eles ganharam 22% do todos os prêmios Nobel já distribuídos. Se, para a turma que advoga a diversidade, a sub-representação é uma "prova" de que há discriminação racial, o que eles sugerem fazer para os casos de sobre-representação? Afinal, se uma raça está sobre-representada, então isso pode significar que um grupo de pessoas está se apossando daquilo que, "por direito", pertence a outra raça. Há outras questões de representação para as quais talvez seja necessário alguém começar a dar mais atenção, para poder criar políticas públicas corretivas. Por exemplo, os asiáticos repetidamente obtêm as maiores pontuações na seção de matemática do SAT, ao passo que os negros obtêm as menores. Os homens são 50% da população, assim como as mulheres; entretanto, os homens são atingidos por raios em uma frequência seis vezes maior do que as mulheres. As estatísticas populacionais para os estados americanos de Dakota do Sul, Iowa, Maine, Montana e Vermont mostram que a população negra desses estados não chega nem a 1%. Por outro lado, em estados como Geórgia, Alabama e Mississippi, os negros estão sobre-representados em relação à sua porcentagem na população geral dos EUA. Há outros exemplos globais de desproporcionalidade. Por exemplo, durante a década de 1960, a minoria chinesa da Malásia recebeu mais diplomas universitários do que a maioria malaia. Somente na engenharia, foram 400 diplomas para chineses e apenas quatro para malaios, não obstante o fato de que os malaios dominavam o país politicamente. No Brasil, no estado de São Paulo, mais de dois terços das batatas e 90% dos tomates produzidos foram cultivados por pessoas de ascendência japonesa. O moral da história é que não há, em nenhum lugar do mundo, evidências de que, não fosse a discriminação, as pessoas estariam divididas ao longo de todas as atividades produtoras de acordo com suas porcentagens na população. Diversidade é um termo elitista utilizado para dar respeitabilidade a atos e políticas que, em outros contextos, seriam consideradas racistas.Por: Walter Williamas        

Congresso exagera no remédio contra ativismo judicial


Propostas de Emenda à Constituição em discussão na Câmara dos Deputados tentam esvaziar atuação do Supremo Tribunal Federal. Reação de parlamentares é até legítima, mas um erro não justifica o outro

Valmar Hupsel Filho
Torres do Congresso Nacional vistas através da chama simbólica da Pira da Pátria na Praça dos Três Poderes, em Brasília
Torres do Congresso Nacional vistas através da chama simbólica da Pira da Pátria na Praça dos Três Poderes, em Brasília (Ueslei Marcelino/Reuters)
"Parece que os poderes não sabem suas atribuições constitucionais. Isso é descabido"
Marco Antonio Villa, historiador e professor da UFSCar
Se pusesse os olhos no sistema político brasileiro, o filósofo e pensador iluminista francês Charles de Montesquieu talvez desistisse da sua mais famosa teoria, refletida na estrutura da maior parte das democracias modernas. Presente na obra O Espírito das Leis, de 1749, a teoria da separação de poderes defende a formação do estado com três esferas independentes e harmônicas. Cabe ao Legislativo a elaboração das leis, o julgamento ao Judiciário e a execução ao Executivo. Na teoria, a democracia brasileira segue estes preceitos. Na prática, o que se vê são poderes pisando nos calcanhares um do outro.
A mais recente iniciativa partiu da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Por unanimidade, os integrantes da comissão surpreenderam o meio jurídico ao confirmar, na última quarta-feira, a admissibilidade de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que, se aprovada em plenário, dará ao Legislativo o poder de sustar atos normativos dos outros poderes (leia-se Judiciário). Em outras palavras, se estivesse valendo, a PEC permitiria ao Congresso suspender decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF), como a liberação de abortos para fetos anencéfalos ou a liberação de união civil de casais homossexuais. 
"No caso do aborto ou da união homoafetiva, não existe lei. É preciso questionar democraticamente quando isso acontece. O Congresso tem que anular a decisão do Judiciário para o bem da democracia", argumenta o deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), autor da PEC. Empolgado com a aprovação unânime de sua proposta na CCJ, o parlamentar já prepara uma nova investida com o mesmo objetivo: restringir as atribuições do Judiciário. Tramita na mesma comissão outra PEC, também de sua autoria, que propõe aumentar a quantidade mínima de votos de magistrados para declarar uma lei inconstitucional, condicionar o efeito vinculante de súmulas aprovadas pelo STF à aprovação pelo Poder Legislativo e submeter ao Congresso Nacional a decisão sobre a inconstitucionalidade de Emendas à Constituição.
A reação dos parlamentares se explica. O Judiciário tem, de fato, promulgado sentenças nas quais, de certa forma, se põe no lugar do Legislativo. Os episódios citados acima são dois exemplos. Tanto no caso da permissão de abortos de fetos anencéfalos quanto na liberação da união civil para homossexuais, os ministros do Supremo, mais do que apenas interpretar a Constituição ou cobrir uma lacuna que punha em risco a integridade do ordenamento jurídico, criaram novas figuras legais: uma terceira hipótese para permitir o aborto, não prevista no Código Penal, e a união estável entre casais do mesmo sexo. Mas, se os parlamentares estão corretos em seu diagnóstico, exageram no remédio - e põem em risco todo o jogo das instituições.

Vingança - Na opinião do historiador e professor de Ciências Sociais da Universidade de São Carlos (UFSCar) Marco Antonio Villa, a democracia se constrói por meio de uma relação harmônica entre os poderes e não com uma espécie de vingança de um poder contra o outro. Ele considera "extremamente problemática" a aprovação da PEC na comissão. "Não acredito que isso passe", diz. A PEC ainda precisa passar por uma comissão especial antes de ser apreciada em plenário.  "Este é um problema do país", afirma o historiador, autor de um livro sobre as Constituições brasileiras. "Parece que os poderes não sabem suas atribuições constitucionais. Isso é descabido. Sabemos muito bem onde poderemos chegar com isso".  
Professor-assistente do departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP), Rafael Neves considera que o Poder Legislativo não precisa lançar mão desse artifício. "Se eles não estão de acordo com uma decisão, podem discutir e elaborar novas leis. A criação de um poder de veto poderia ter efeitos colaterais muito ruins, como causar uma politização das decisões judiciais", diz Neves, classificando como uma "interferência indevida" a tentativa de se criar, no âmbito do Legislativo, o poder de se vetarem decisões do Judiciário. 
"É claro que estes poderes estão entrelaçados e podem atuar, em certa medida, no âmbito um dos outros", observa o advogado Paulo Muanis do Amaral Rocha, sócio do escritório Amaral Rocha Advogados. "Embora a essência do Judiciário não seja formular leis, é permitido a ele criar súmulas que acabam por regular o estado democrático de direito. Assim como o Executivo legisla por medidas provisórias. O que não pode ocorrer, entretanto, é uma enorme disparidade de funções como aconteceu no caso da união estável entre pessoas do mesmo sexo ou como propõe essa PEC". Para Amaral Rocha, em casos como esses, a sociedade é a maior prejudicada: "Um dos alicerces da democracia é justamente a tripartição do poder", argumenta. "Caso este alicerce seja rompido, a democracia também poderá sofrer rupturas".
O vice-presidente de Assuntos Legislativos da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Diógenes Ribeiro, argumenta que a proposta de Fonteles viola preceitos constitucionais. Com a PEC, diz ele, o princípio da separação dos poderes seria atingido, uma vez que poderia haver a invasão das competências administrativas e financeiras do Poder Judiciário por ato do Legislativo, "um poder essencialmente político". E ele reage: "A regulamentação administrativa e financeira dos tribunais não pode ficar submetida à vontade do Poder Legislativo. Na remota hipótese de essa medida ser aprovada pelo Congresso Nacional, certamente nós da AMB proporemos uma Ação Declaratória de Inconstitucionalidade."
A palavra final, nesse caso, caberá ao Supremo.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL OFICIALIZA RACISMO NO BRASIL

Hoje, 26 de abril de 2012, é uma data histórica. Hoje, a suprema corte judiciária do país oficializou, por unanimidade, o racismo no país. Hoje, o STF revogou, com a tranqüilidade dos justos, o art 5º da Constituição Federal, segundo o qual todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza. A partir de hoje, oficializa-se a prática perversa instituída por várias universidades, de considerar que negros valem mais do que um branco na hora do vestibular. Parafraseando Pessoa: constituições são papéis pintados com tinta. Que podem ser rasgados ao sabor das ideologias. 

No que não vai nada de novo. Em maio do ano passado, o STF revogou de uma penada o § 3º do art. 226 da Carta Magna: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. Ao reconhecer a união estável para casais do mesmo sexo, o excelso pretório jogou no lixo a carta aprovada por uma Constituinte. Onde se lia homem e mulher, leia-se homem e homem, ou mulher e mulher e estamos conversados. A partir de hoje, onde se lia “todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza”, leia-se: todos são iguais perante a lei, exceto os negros, que valem mais. Simples assim.

Os considerandos a favor do racismo são vários. Segundo o ministro Cezar Peluso, “há graves e conhecidas barreiras institucionais do acesso aos negros às fontes da educação”. Como se não houvesse barreiras institucionais também para os brancos. Se o vestibular barra negros, barra também brancos, amarelos, verdes ou azuis. “É preciso desfazer a injustiça histórica de que os negros são vítimas no Brasil”, continuou o ministro. Como se os milhões de brancos que vivem na miséria não fossem vítimas de injustiças históricas.

Segundo o ministro Joaquim Barbosa, as ações afirmativas tentam neutralizar o que chamou de “efeitos perversos” da discriminação racial: “As medidas visam a combater a discriminação de fato, de fundo cultural, como é a brasileira. Arraigada, estrutural, absolutamente enraizada na sociedade. De tão enraizada as pessoas nem a percebem, ela se normaliza e torna-se uma coisa natural”.

Barbosa é aquele ministro negro, que chegou a mais alta corte do país e ainda continua se queixando de racismo. Como Lula, que continua denunciando as elites depois de virar elite, esqueceu de virar o disco. Barbosa empunha as ações afirmativas, recurso racista dos negros americanos para ganhar no tapetão na hora de entrar na universidade. As tais de ações afirmativas tiveram certo prestígio quando surgiram. Hoje, o sistema de cotas é ilegal nos Estados Unidos. Sempre na rabeira da História, o Brasil adota hoje o que nos Estados Unidos foi jogado na famosa lata de lixo da História.

Para Rosa Weber, o país precisa reparar, por meio de políticas públicas, os danos causados pela escravidão de negros no Brasil. “O fato é que a disparidade racial é flagrante na sociedade Brasileira”, disse. “A pobreza tem cor no Brasil: negra, mestiça, amarela”. Ora, a escravatura foi abolida há mais de século. Comentei ontem as famigeradas leis Jim Crow nos Estados Unidos, que constituíram a partir de 1880 a base legal da discriminação contra negros nos Estados do Sul, proibindo até mesmo um estudante passar um livro escolar a outro que não fosse da mesma raça. Só foram declaradas inconstitucionais pela Suprema Corte americana em 1954, isto é, há pouco mais de meio século. Nunca tivemos leis semelhantes no Brasil, nem nunca um negro foi proibido de entrar numa escola, ônibus ou bar com base em um documento legal.

Ao afirmar que a pobreza tem três cores no Brasil, a negra, a mestiça e a amarela, a ministra parece padecer de uma estranha espécie de cegueira, que não reconhece a cor branca. Para a ministra, os negros têm menos perspectivas na sociedade brasileira. “Se os negros não chegam à universidade, não compartilham, com igualdades de condições, das mesmas chances que os brancos”, afirmou. Esquece que, com a lei de cotas, milhares de brancos não compartilharão, com igualdades de condições, das mesmas chances que os negros.

Celso de Mello citou, em seu voto, convenções internacionais que estabelecem formas de se combater o preconceito e garantir condições de igualdade. "As ações afirmativas são instrumentos compensatórios para concretizar o direito da pessoa de ter sua igualdade protegida contra práticas de discriminação étnico-racial", disse. Pelo jeito, o arguto ministro não foi informado que as cotas hoje são ilegais no próprio país onde surgiram. “Uma sociedade que tolera práticas discriminatórias não pode qualificar-se como democrática”, continuou. Será democrática uma sociedade que discrimina em função da cor da pele?

Para Luís Fux, a sociedade precisa reparar o dano causado aos negros diante do histórico de escravidão no Brasil. O ministro acredita que é preciso implementar políticas afirmativas que levem à integração social dos negros no meio acadêmico. De novo as políticas afirmativas, que no Primeiro Mundo já demonstraram não dar certo. Segundo o ministro, “a opressão racial dos anos da sociedade da escravocrata brasileira deixou cicatrizes que se refletem, sobretudo, no campo da escolaridade, revelando graus alarmantes de diferenciação entre alunos brancos e afrodescendentes. Por isso que, de escravos de um senhor, passaram a ser escravos de um sistema”. Pelo jeito, a opressão racial penetrou nos genes dos negros e hoje, mais de século após a abolição, continua se transmitindo de pai a filho. Se cicatrizes se refletem no campo da escolaridade, não será em função da escravatura, já que hoje qualquer negro recebe o ensino de qualquer branco. Negro pobre não tem acesso às melhores escolas? De fato, não tem. Mas branco pobre também não.

Quando entrei na universidade, nota de negro valia o mesmo que nota de branco. Tive colegas negros nos dois cursos que fiz, e aliás nem notava que eram negros. Imagine se eu prestasse vestibular hoje e fosse preterido em função das cotas. É claro que eu nutriria uma boa dose de hostilidade em relação àqueles que, por terem uma pele preta, tomaram meu justo lugar na universidade. Se alguém achava que o Brasil era um país racista, prepare-se para o que verá pela frente. A decisão do STF só vai estimular o ódio racial entre brasileiros.

Há mais de década venho afirmando que o sistema de cotas é uma armadilha. Antes das cotas, eu não teria restrição alguma em consultar um médico negro. Depois das cotas, não quero nem ver médicos negros perto de mim. Sei que entraram, de modo geral, pela porta dos fundos da universidade. E se entraram pela porta dos fundos, não será na porta da frente que serão barrados.

Negros honestos, que não querem favores na hora da competição, já estão sentindo o problema. Ainda hoje, recebi de mãos amigas o comentário de uma aluna negra do curso de engenharia eletrônica da UERJ: "Isso só vai nos prejudicar, a nós que enfrentamos o vestibular sem cotas. Quando alguém analisar o currículo e descobrir que sou negra, vai pensar: essa entrou na faculdade pelas cotas. Adeus emprego".

Cá entre nós, penso que devia constar de todos os diplomas, daqui pela frente, se o diplomado entrou pelo sistema de cotas ou se disputou lealmente sua vaga na universidade. No diploma dos negros que entraram na universidade por este sistema, que conste em letras garrafais:

ADMITIDO NA UNIVERSIDADE PELO SISTEMA DE COTAS

Afinal, se cotas é privilégio do qual nenhum beneficiado deve envergonhar-se, não deve ser infamante registrá-las no diploma.Por Janer Cristaldo

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Brasil à beira de um golpe de estado



Lula e seus asseclas já conseguiram calar a oposição. A CPI fajuta desviará a atenção da população não apenas com relação ao mensalão, mas também da PEC que liquida o Poder Judiciário e impõe uma fissura irreparável nos fundamentos da democracia, da segurança jurídica e, por fim, da liberdade.


Lula, o PT e seus sequazes nem sequer disfarçam. A CPI que é um recurso político da minoria, desta feita foi convocada pela maioria, isto é, pelo PT e seus asseclas, ou seja aquele bando de picaretas com assento no Congresso Nacional que atende pelo designativo de "base aliada". O mentor da CPI é Lula que, segundo matéria do site de O Globo, avisou que vale a pena correr riscos para alcançar os resultados: massacrar a oposição.

Em resumo: a Nação calada consente que o parlamento brasileiro seja utilizado como palco de um embuste, uma pantomima diabólica engendrada pelo cérebro de Lula que, provavelemente, foi afetado pela quimioterapia. O futuro dirá se isso é uma simples ilação. Lula pode ser daqueles que acham que por estar com o pé na cova podem fazer o que bem entendem.

Ora, uma CPI é uma providência no âmbito parlamentar que demanda tempo, mobilização de parlamentares, funcionários, assessores, técnicos e o escambau. Isto custa dinheiro aos cofres públicos. Se for uma coisa séria para valer, que investigará a roubalheira e a propinagem institucionalizada, diga-se de passagem, pela bandalha do PT, tudo bem. Mas se for apenas uma jogada político-eleitoral e com a finalidade precípua de criar as condições para desviar a opinião pública do crime do mensalão e promover a procrastinação de seu julgamento a Nação não está apenas sendo iludida, mas à beira de um golpe de Estado mais à frente. 

Notem por exemplo, que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou nesta quarta-feira, por unanimidade, uma proposta de emenda constitucional (PEC) que permite ao Congresso sustar decisões do Poder Judiciário. Atualmente, o Legislativo pode mudar somente decisões do Executivo. A proposta seguirá agora para uma comissão especial.

Essa proposta de emenda constitucional é mais um passo em consonância com as diretrizes do Foro de São Paulo, a organização comunista fundada por Lula, Chávez et caterva. Quanto a isso não há dúvida nenhuma. Caso esses tarados ideológicos do PT consigam aprovar essa afronta ao Estado de Direito Democrático, consuma-se um Golpe de Estado puro e simples. 

É que o Direito (dentro do Estado de Direito Democrático) tem sua funcionalidade e eficácia, ou seja, a segurança jurídica, dependente da estrita obediência às decisões judiciais. Essas decisões podem ser contestadas dentro dos parâmetros legais/processuais constitucionais, porém não podem sob nenhuma hipótese serem desobedecidas. Em outras palavras, a aprovação dessa PEC destrói o principal fundamento do Estado de Direito Democrático.

Em todos os países latino-americanos sob a direção do Foro de São Paulo, como a Venezuela, Bolívia, Equador, Nicarágua, Argentina, Paraguai e Uruguai assiste-se ao desmonte das instituições democráticas. O método aplicado é que é diferente de país para país, embora o objetivo seja o mesmo. Assim, diferentes estratégicas são aplicadadas para atingir o mesmo objetivo, a comunização do continente latino-americano. 

Essa CPI, por exemplo, criada pelo Lula, que é um dos principais articuladores do Foro de São Paulo, tem em mira abrir espaço para hegemonia política do PT. E isso acontece em todos esses países que mencionei, mas como disse, de forma diferente e adequada às situações locais.

Os comunistas do PT agem simultaneamente em várias frentes. Enquanto a CPI do Cachoeira é montada para esmagar lideranças oposicionistas, ao mesmo tempo corre silencioso pela Câmara a PEC - Proposta de Emenda Constitucional que emascula o Poder Judiciário.

As outras frentes de ataque do PT às instituições democráticas são levadas a efeito por um conjunto de novas regras de conduta social baseadas no pensamento politicamente correto. Estas podem parecer pontuais, estarem de acordo com um suposto avanço. Incluem-se aí coisas como o Kit Gay, a descriminalização do aborto, a liberalização dos entorpecentes, como a maconha e até mesmo a prosaica proibição de fumar em praça pública. Quanto ao uso do tabaco, essa campanha anti-fumo permite moldar as consciências de forma que o governo possa aumentar desmesuradamente os impostos do comércio de cigarros. Ninguém levanta a voz contra essa torrente de iniquidades que vem sendo transformada em lei. Até que não exista mais qualquer tipo de reação à intromissão do Estado na vida privada das pessoas. 

Na atualidade ainda se vive um resquicio dessa guerra de valores. Mais adiante não háverá mais nenhum tipo de resistência e os cérebros dos cidadãos já estarão completamente abduzidos pela lavagem cerebral consumada pela canalha ideológica que se adonou da Nação brasileira.

Ninguém reflete sobre tudo isso. Tanto é que Lula e seus sequazes continuam dando as cartas e conseguem, até mesmo, criar um CPI fajuta para a realização de suas ambições de poder absoluto, enquanto a massa de orelhudos fala à boca pequena que o PT não sai mais do poder. Ora, com essa atitude bovinamente alienada, oportunista e acrítica será isto mesmo que irá acontecer. 

A rigor, Lula e seus asseclas já conseguiram calar a oposição. A CPI fajuta desviará a atenção da população não apenas com relação ao mensalão, mas também da PEC que liquida o Poder Judiciário e impõe uma fissura irreparável nos fundamentos da democracia, da segurança jurídica e, por fim, da liberdade.

Com o aparelhamento ideológico da Ordem dos Advogados do Brasil, das universidades, das escolas em todos os níveis, das organizações estudantis, dos sindicatos e centrais sindicais - inclusive as patronais como a Conferação Nacional da Indústria (CNI), constata-se que a Nação está assim como "enfeitiçada" pelo canto de sereia dos comunistas, agora travestidos de ecologistas e de pseudos libertários, na verdade autênticos liberticidas. 

Finalmente, a grande mídia dá a contribuição definitiva para que toda a verdade seja substituída pela repetição da mentira até que esta se torne - pasmem - uma verdade incontestável. Prestam-se, como lacaios de Lula, do PT e seus sequazes, os jornalistas em sua maioria. Calculo que 99% dos jornalistas da grande imprensa brasileira fazem parte dessa legião de mentirosos e idiotas de todos os matizes.

Eu sei o que estou afirmando. Estou no jornalismo há mais de 40 anos e trabalhei em jornais diários. Também sou advogado inscrito na OAB, Mestre em Direito e também trabalhei durante vários anos na Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarinsa (FIESC). Conheço muito bem o ambiente político e empresarial, bem como os empresários brasileiros em nível nacional. 

Assim, acumulo um acervo de conhecimento e informação - sem qualquer modéstia - respeitável. Isto conjugado com a minha memória - sem modéstia também - estupenda, se transforma numa poderosa ferramenta para a produção de análises políticas, econômicas e sociológicas em níveis nacionais e internacionais.E, também sem qualquer falsa modéstia, escrevo sobre qualquer assunto.
Espero poder contribuir de alguma forma para melhorar o Brasil. Se é que o lixo ocidental possa sofrer algum tipo de mudança positiva. Por: Aluizio Amorim

Progressistas, reacionários, histeria e a longa marcha gramsciana


Para os comunistas, o objetivo era a estatização dos meios de produção, a erradicação da classe capitalista, e a tomada de poder pelo proletariado.  Já os social-democratas entenderam ser muito melhor um arranjo em que o estado socialista mantém os capitalistas e uma truncada economia de mercado sob total controle, regulando, restringido, controlando e submetendo todos os empreendedores às ordens do estado.  O objetivo social-democrata não é necessariamente a "guerra de classes", mas sim um tipo de "harmonia de classes", na qual os capitalistas e o mercado são forçados a trabalhar arduamente para o bem da "sociedade" e do parasítico aparato estatal.  Os comunistas queriam uma ditadura do partido único, com todos os dissidentes     sendo enviados para os gulags.  Os social-democratas preferem uma ditadura "branda" — aquilo que Herbert Marcuse, em outro contexto, rotulou de "tolerância repressiva" —, com um sistema bipartidário em que ambos os partidos concordam em relação a todas as questões fundamentais, discordando apenas polidamente acerca de detalhes triviais — "a carga tributária deve ser de 37% ou de 36,2%?".
Esta distinção nos objetivos — totalitarismo brando vs. radical — também é refletida na acentuada diferença entre as estratégias e dos meios utilizados.  Os comunistas, ao menos em sua clássica fase leninista, ansiavam por uma revolução violenta e apocalíptica que destruiria o estado capitalista e levaria à ditadura do proletariado.  Já os mencheviques — social-democratas ou neoconservadores —, fieis ao seu ideal "democrático", sempre se sentiram um tanto desconfortáveis com a ideia de revolução, preferindo muito mais a "evolução" gradual produzida pelas eleições democráticas.  O estado deve ser totalmente aparelhado por intelectuais partidários e simpatizantes, de modo a garantir a continuidade da longa marcha gramsciana da conquista das instituições culturais e sociais do país. 
Por que a esquerda sempre faz uma oposição histérica a toda e qualquer ínfima medida ou iniciativa que seja por ela tida como "antiprogressista" ou, pior ainda, "reacionária"?  Seja no quesito aborto, no quesito dos "direitos" dos homossexuais ("direitos", no linguajar esquerdista, nada mais são do que deveres impingidos aos pagadores de impostos), nos privilégios raciais e sindicais, no feminismo, no desarmamento e até mesmo em tímidas propostas de reformas assistencialistas, a esquerda progressista sempre reage com um furor frenético contra qualquer pessoa — seja político, comentarista político ou apenas alguém da mídia alternativa — que se atreva a fazer algo que leve a um pequeno recuo destes sagrados esquemas socialistas.

O frenesi progressista que vem varrendo o mundo começou realmente no final dos anos 1930.  Naquela época, vivendo em Nova York, minha família, meus amigos e meus vizinhos, todos esquerdistas, haviam chegado ao paroxismo do medo e da raiva por causa da contrarrevolução de Franco e da iminente derrocada do governo espanhol esquerdista durante a Guerra Civil Espanhola.  Superabundavam denúncias e vituperações lacrimosas contra Franco, além de contínuas exortações para que "alguma coisa fosse feita".  Houve a criação de organizações especializadas em enviar de tudo para a Espanha, desde leite até armas e soldados.  Era a "Brigada Internacional", criada para defender a esquerda espanhola (alcunhada de "Legalistas" pelo sempre simpatizante The New York Times e por outros veículos da mídia "respeitável").

Vale enfatizar que estas pessoas jamais — nem antes e nem durante — haviam demonstrado qualquer tipo de interesse pela história, cultura ou política espanhola.  Logo, por que repentinamente passaram a se preocupar com o país?  O historiador esquerdista Allen Guttman chegou até a documentar e celebrar esta histeria em relação à Espanha em seu livro A Ferida no Coração (o título já diz tudo).  Certa vez perguntei ao meu amigo Frank S. Meyer, que havia sido um proeminente comunista americano, a respeito deste enigma.  Ele deu de ombros: "Nós [os comunistas] nunca conseguimos entender o porquê.  Mas tiramos proveito do sentimentalismo progressista da questão".
A explicação ortodoxa dos historiadores é que os esquerdistas da época — cujo quartel-general, a fonte de financiamento, estava nos EUA — estavam especialmente temerosos quanto à "ameaça do fascismo", e defendiam freneticamente a esquerda espanhola porque viam a Guerra Civil daquele país como um prenúncio de uma inevitável Segunda Guerra Mundial.  Mas o problema com esta explicação é que, embora a esquerda progressista houvesse defendido entusiasmadamente a "boa" Guerra contra o Eixo, ela nunca realmente arregimentou a mesma emotividade, a mesma exaltação, o mesmo furor que demonstrava em relação a Franco contra Hitler, por exemplo.
Então, qual a verdadeira explicação para a atual postura da esquerda em relação a temas cultural e economicamente progressistas?
Creio que uma pista pode ser encontrada na mini-histeria que a esquerda demonstrou a respeito da contrarrevolução ocorrida contra o regime esquerdista da Salvador Allende no Chile, uma contrarrevolução que colocou o General Augusto Pinochet no poder.  A esquerda, até hoje, ainda não perdoou a direita chilena e a CIA por este golpe.  Allende ainda é considerado um mártir querido pela esquerda, e sua filha Isabel, um ícone (embora ainda percam para Che Guevara).  Seria esta raiva tão duradoura só porque um regime comunista foi derrubado?  Quase, mas ainda longe.  Afinal, a esquerda não demonstrou grandes emoções, não demonstrou nenhum desespero, quando os regimes comunistas entraram em colapso na União Soviética e no Leste Europeu.
Logo, sugiro que 'A Resposta' para este mistério é a seguinte: a esquerda é, em sua essência, "progressista", o que significa que ela acredita, à moda marxista ou Whig, que a história consiste de uma 'inevitável marcha ascendente' rumo à luz, rumo à utopia socialista.  A esquerda progressista acredita no mito do progresso inevitável; ela acredita que a história está ao seu lado, sempre conspirando a seu favor.  Sendo ela formada por social-democratas (mencheviques), primos dos comunistas (bolcheviques) — com quem vivem entre tapas e beijos —, a esquerda progressista possui um objetivo similar ao dos comunistas, mas não idêntico: um estado socialista igualitário, gerido totalmente por burocratas, intelectuais, tecnocratas, "terapeutas" e pela Nova Classe iluminada, geralmente em colaboração com — e sempre sendo apoiada por — credenciados membros de todos os tipos de grupos vitimológicos, aquela gente que se diz perseguida e que vive lutando por "direitos iguais" — sendo que o 'iguais' significa na verdade 'superiores'.  Estes grupos são formados por negros, mulheres, gays, deficientes, índios, cegos, surdos, mudos etc. 
A esquerda progressista acredita que a história está marchando inexoravelmente rumo a este objetivo.  Uma parte vital deste objetivo é a destruição da família tradicional, "burguesa" e composta de pai e mãe, que deve ser substituída por um sistema em que as crianças são criadas e educadas pelo estado e por sua Nova Classe de orientadores, tutores, terapeutas e demais "cuidadores" infantis.
A utópica marcha da história, objetivo dos social-democratas, também é similar à dos comunistas, mas não exatamente a mesma.  Para os comunistas, o objetivo era a estatização dos meios de produção, a erradicação da classe capitalista, e a tomada de poder pelo proletariado.  Já os social-democratas entenderam ser muito melhor um arranjo em que o estado socialista mantém os capitalistas e uma truncada economia de mercado sob total controle, regulando, restringido, controlando e submetendo todos os empreendedores às ordens do estado.  O objetivo social-democrata não é necessariamente a "guerra de classes", mas sim um tipo de "harmonia de classes", na qual os capitalistas e o mercado são forçados a trabalhar arduamente para o bem da "sociedade" e do parasítico aparato estatal.  Os comunistas queriam uma ditadura do partido único, com todos os dissidentes sendo enviados para os gulags.  Os social-democratas preferem uma ditadura "branda" — aquilo que Herbert Marcuse, em outro contexto, rotulou de "tolerância repressiva" —, com um sistema bipartidário em que ambos os partidos concordam em relação a todas as questões fundamentais, discordando apenas polidamente acerca de detalhes triviais — "a carga tributária deve ser de 37% ou de 36,2%?".
Liberdade de expressão, de imprensa e de ideias é tolerada pelos social-democratas, mas desde que ela se mantenha dentro de um espectro de opiniões pré-aprovadas.  Os social-democratas repelem a brutalidade dos gulags; eles preferem fazer com que os dissidentes padeçam da "suave" e "terapêutica" ditadura do politicamente correto, na qual eles forçosamente têm de aprender as maravilhosas virtudes de ser educado na "dignidade de estilos de vida alternativos", sempre submetidos a um intenso "treinamento de sensibilidade".  Em outras palavras, Admirável Mundo Novo em vez de 1984.  A "marcha ascendente da democracia" em vez da "ditadura do proletariado".
Também típica é a distinção, nas duas utopias, acerca de como lidar com a religião.  Os comunistas, como fanáticos ateístas, tinham o objetivo de abolir por completo a religião.  Já os social-democratas preferem uma abordagem mais suave: subverter o cristianismo de modo a fazer com que a religião se torne aliada da social-democracia.  Daí a sagaz cooptação da esquerda cristã pelos social-democratas: enfatizando o modernismo entre os católicos e o evangelicalismo esquerdo-pietista entre os protestantes — este último objetivando criar um Reino de Deus na Terra na forma de uma coerciva e igualitária "comunidade de amor". 
Trata-se de uma estratégia muito mais astuta: cooptar religiosos em vez de assassinar padres e freiras e confiscar igrejas — esta última feita pelo regime republicano espanhol e por seus partidários trotskistas e anarquistas de esquerda, algo que não gerou absolutamente nenhum grito de protesto por parte de seus devotos defensores progressistas e social-democratas ao redor do mundo.
Esta distinção nos objetivos — totalitarismo brando vs. radical — também é refletida na acentuada diferença entre as estratégias e dos meios utilizados.  Os comunistas, ao menos em sua clássica fase leninista, ansiavam por uma revolução violenta e apocalíptica que destruiria o estado capitalista e levaria à ditadura do proletariado.  Já os mencheviques — social-democratas ou neoconservadores —, fieis ao seu ideal "democrático", sempre se sentiram um tanto desconfortáveis com a ideia de revolução, preferindo muito mais a "evolução" gradual produzida pelas eleições democráticas.  O estado deve ser totalmente aparelhado por intelectuais partidários e simpatizantes, de modo a garantir a continuidade da longa marcha gramsciana da conquista das instituições culturais e sociais do país.  Daí a desconsideração pelos gulags e pela revolução armada.  Por isso o desaparecimento de seus primos (e concorrentes) bolcheviques não ter sido lamentado pelos social-democratas.  Muito pelo contrário: os social-democratas agora detêm o monopólio da marcha "progressista" da história rumo à Utopia.
O que me traz de volta à minha 'Resposta' sobre o porquê da histeria da esquerda progressista: ela se torna histérica sempre que percebe a ameaça de uma pequena reversão na Inevitável Marcha da História.  Ela se torna histérica quando visualiza alguns empecilhos e, principalmente, retrocessos nesta sua inexorável marcha, retrocessos estes que sempre são rotulados, obviamente, de "reações".  Na visão de mundo tanto de comunistas quanto de social-democratas, a mais alta — desde que "progressista" — moralidade é se mostrar não apenas um defensor, mas também, e principalmente, um entusiasmado fomentador da 'inevitável próxima fase da história'.  É ser a "parteira" (na famosa expressão de Marx) desta fase.  Da mesma forma, a mais profunda, se não a única, imoralidade é ser "reacionário", ser alguém dedicado a se opor a este inevitável progresso — ou, pior ainda, alguém dedicado a fazer retroceder a maré, a restaurar costumes enraizados, a "atrasar o relógio". 
Este é o pior pecado de todos, e ele gera todo este frenesi justamente porque qualquer retrocesso bem-sucedido colocaria em dúvida aquele que é o mais profundo e o mais inquestionavelmente aceito mito "religioso" da esquerda progressista: a ideia de que o progresso histórico rumo à sua Utopia é inevitável. 
Trata-se, no mais profundo sentido, de uma guerra não apenas cultural e econômica, mas religiosa.  "Religiosa" porque social-democracia/progressismo de esquerda é uma visão de mundo passional, uma "religião" no mais profundo sentido, pois guiada unicamente pela fé: trata-se da ideia de que o inevitável objetivo da história é um mundo perfeito, um mundo socialista igualitário, um Reino de Deus na Terra, seja este deus "panteizado" (sob Hegel e os adeptos do Romantismo) ou ateizado (sob Marx). 
Esta é uma visão de mundo em relação à qual não deve haver concessões ou clemência.  Ela deve ser contrariada e combatida veementemente, com cada fibra de nosso ser.
Quem vai vencer essa guerra?  Não se sabe.  De que lado está a maioria da população?  Certamente perdida, disponível para quem chegar primeiro.  A maioria está confusa, vagando de um lado para o outro, dividida entre visões de mundo conflitantes.  Ela pode pender para qualquer lado.  Durante suas inúmeras batalhas faccionárias dentro do movimento marxista, Lênin certa vez escreveu que há dois grupos batalhando, cada um formado pela minoria da população, sendo que a maioria está no centro, e é formada justamente pelas pessoas confusas, às quais ele se referiu como O Brejo.  A maioria da população hoje está confusa e constitui O Brejo; estas pessoas estão no terreno no qual a maioria das batalhas será disputada.  E a metáfora é corretamente militar.  A batalha iminente é muito mais ampla e profunda do que apenas discutir alíquotas de impostos.  Trata-se de uma batalha de vida e morte pelo formato do nosso futuro.  Daí se compreende o frenesi que acomete a esquerda sempre que uma medida "reacionária" parece ser favorecida pela sociedade.
A esquerda progressista não se importa muito com — na verdade, ela até gosta de — pequenos revezamentos de poder: uma década de governos abertamente progressistas, nos quais a agenda esquerdista é avançada, seguida de alguns anos de governo "oposicionista" ou "conservador", no qual há apenas uma consolidação ou simplesmente uma redução na velocidade do avanço.  O que ela realmente teme é a perspectiva do conservadorismo se tornar reacionário, no sentido de realmente fazer retroceder alguns ganhos "progressistas".  É isso que a apavora.  Daí a histeria em relação a Franco e a Pinochet; daí o linchamento de Joe McCarthy, que realmente ameaçou ser bem-sucedido em fazer recuar não apenas os comunistas, mas até mesmo os progressistas e social-democratas.  Ameace retroceder "direitos" obtidos por grupos de feministas, de gays, de negros, de desarmamentistas, de funcionários públicos, de sindicalistas ou de qualquer outro do ramo vitimológico, e você verá o que é uma fúria progressista.
Portanto, o combate requer, principalmente, coragem e nervos para não ceder e não se dobrar perante as totalmente previsíveis reações caluniosas e difamantes dos oponentes.  Acima de tudo, o objetivo não deve ser o de se tornar querido e bem aceito por progressistas ou pela Mídia Respeitável.  Tal postura irá gerar apenas mais rendição, mais derrotas.  Igualmente, o objetivo não é apenas o de fazer retroceder o estado leviatã, sua cultura niilista e estas pessoas que querem se apossar do estado e impor sua agenda sobre nós.  O objetivo tem de ser a eliminação completa e irreversível deste monstruoso sonho de um Perfeito Mundo Socializado gerido por "pessoas de bem".
Que a reação ocorra, que os "direitos" sejam retrocedidos, que esta gente recue, entre em órbita e finalmente perceba que, na realidade, sua religião é maléfica.

Murray N. Rothbard (1926-1995) foi um decano da Escola Austríaca e o fundador do moderno libertarianismo. Também foi o vice-presidente acadêmico do Ludwig von Mises Institute e do Center for Libertarian Studies.