segunda-feira, 2 de julho de 2012

UMA BREVE HISTÓRIA DO PLANO REAL, AOS SEUS 18 ANOS


Uma breve história do Plano Real, aos seus 18 anos
por , sábado, 30 de junho de 2012



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Gustavo Franco, um dos principais mentores do Plano Real
Quando Itamar Franco assumiu interinamente a Presidência da República no dia 29 de dezembro de 1992, imediatamente após a renúncia de Fernando Collor, a inflação acumulada em 12 meses estava em 1.119%.  Em 1991, ela havia sido de 472%.  Em 1990, de 1.621%.  Com o país mergulhado em uma crise política e com a economia em frangalhos, não havia a menor perspectiva entre a população de que houvesse qualquer arrefecimento na inflação de preços.
Também em decorrência da recessão, a arrecadação tributária não era suficiente para cobrir as despesas.  Como consequência, o governo apenas ordenava ao Banco Central — que, na época, podia comprar títulos diretamente do Tesouro — que imprimisse o dinheiro necessário para fazer frente às despesas.  O resultado era um moto-perpétuo inflacionário. 
Eis o gráfico do singelo crescimento da base monetária — variável totalmente sob o controle do Banco Central — durante o governo Collor.  (É preciso dividir o gráfico em dois, pois um aumento de 28.380% não cabe em apenas um só gráfico).
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Gráfico 1: evolução da base monetária, março de 1990 a julho de 1991
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Gráfico 2: evolução da base monetária, julho de 1991 a dezembro de 1992
Tal prática de imprimir dinheiro para fazer frente às despesas governamentais não cobertas por impostos já era tradicional na economia brasileira; porém, no início da década de 1990, ela havia chegado ao ápice.  Em abril de 1990, por exemplo, a inflação acumulada em 12 meses foi de 6.821%, recorde até hoje absoluto em nossa história.
Após mais de uma década com inflação de preços anual acima dos 100% — a média de inflação de preços anual entre 1980 e 1992 foi de incríveis 694% —, uma solução definitiva era urgente.
O problema da hiperinflação
Além de toda a distribuição de renda às avessas que a inflação monetária gera — a qual foi a responsável pela explosão da disparidade de renda no Brasil na década de 1980 —, ela também provoca dois problemas adicionais que inviabilizam qualquer chance de crescimento econômico sustentável:
1) A inflação gera uma falsificação contábil que faz com que as empresas sobrestimem seus lucros e, consequentemente, incorram em um involuntário consumo do capital próprio.  Isto ocorre porque, durante a hiperinflação, a depreciação dos bens de capital continua sendo computada em termos de seus custos históricos e não em termos de seus reais custos de reposição (necessariamente mais altos).  Esta subestimação da depreciação gera uma superestimação dos lucros, o que consequentemente fará com que a empresa consuma um capital que não possui.
2) Adicionalmente, a hiperinflação impossibilita que os empreendedores sejam capazes de antecipar — mesmo que aproximadamente — quais serão os preços dos bens dali a alguns meses.  Logo, qualquer investimento de longo prazo se torna inviável.  Os empreendedores passam a se concentrar em projetos de curto prazo, projetos visando ao futuro mais imediato — por exemplo, no setor de serviços, nos setores de atacado e varejo, e até mesmo em empreendimentos que lidam com a especulação de vários de tipos de commodities. 
Assim, quando o processo de estimativa empreendedorial se torna incapaz de calcular com alguma exatidão quais recursos podem ser empregados lucrativamente em projetos de longo prazo, a estrutura de produção da economia é radicalmente "encurtada" e deixa de estar de acordo com as preferências dos consumidores, tanto presentes quanto futuras.  O caos calculacional impera.
Esta situação gera um círculo vicioso.  A hiperinflação contrai a estrutura de produção da economia, o que a deixa menos produtiva.  Uma economia menos produtiva significa menos produtos no mercado em relação à demanda.  Menos produtos no mercado em conjunto com um acentuado aumento da oferta monetária significam preços maiores.  Esta contínua inflação monetária exacerba a hiperinflação de preços, a qual contrai ainda mais a estrutura de produção da economia, reiniciando o ciclo. 
Daí a baixa qualidade de vida da maioria da população brasileira durante a década de 1980 e na primeira metade da de 1990.
O início
Estava claro, portanto, que esta situação não poderia perdurar.  Os velhos paliativos de trocar o nome da moeda e cortar três zeros já haviam se comprovado um redundante fracasso.  E não era necessário ser nenhum gênio monetário — tampouco seguidor da Escola Austríaca — para entender que uma hiperinflação contínua e crescente levaria à total destruição do sistema monetário, destruindo por completo a divisão do trabalho (a qual é possibilitada justamente pela existência do dinheiro) e retornando a economia ao estado do escambo.
Vários planos heterodoxos já haviam sido tentados desde meados da década de 1980:  Plano Cruzado (I e II) em 1986; Plano Bresser em 1987; Plano Verão em 1988/1989; e Plano Collor (I e II) em 1990 e 1991, respectivamente.  Todos envolviam congelamento de preços (alguns deles, cortes de zeros das moedas).  O governo congelava os preços, mas continuava imprimindo dinheiro impavidamente, o que significa que os geniais burocratas restringiam a oferta mas estimulavam a demanda.  Ao final de cada plano, a inflação de preços ressurgia com vigor redobrado.  E ninguém entendia por quê.
Em maio de 1993, partindo para o tudo ou nada, Itamar Franco nomeou Fernando Henrique Cardoso — então Ministro das Relações Exteriores — para o Ministério da Fazenda.  Naquele mês, a inflação de preços acumulada em 12 meses já estava em 1.348%. 
Por gozar de grande prestígio e por ter reconhecida capacidade intelectual, a indicação de FHC foi recebida com entusiasmo.  Vislumbrava-se pela primeira vez alguém com genuína capacidade de apresentar um plano econômico que ao menos reduzisse sensivelmente a inflação.
Embora sempre houvesse admitido não entender nada de economia, Fernando Henrique ao menos possuía bons contatos no mundo acadêmico, principalmente junto a um grupo de economistas da PUC do Rio de Janeiro.  E foi a eles que FHC delegou a tarefa de debelar em definitivo a inflação.
A equipe de economistas encarregada desta espinhosa função era composta por Gustavo Franco, Pedro Malan, André Lara Resende, Persio Arida, Edmar Bacha e Winston Fritsch.
O Plano
Embora repleto de jargões técnicos à primeira vista indecifráveis, o Plano Real na verdade era como um livro de John Grisham: uma trama aparentemente complexa encobrindo um enredo totalmente simples.  O objetivo da reforma monetária era lançar uma moeda cujo valor fosse, senão atrelado, pelo menos muito próximo ao dólar.  Na prática, o objetivo era fazer uma dolarização da economia, mas sem que houvesse uma dolarização de fato, algo que ofenderia nossos brios nacionalistas.
Como iremos ver mais abaixo, fazer uma dolarização da economia — isto é, simplesmente passar a utilizar o dólar como a moeda oficial do país (exatamente como fez o Panamá) — teria sido algo mais eficaz, muito pouco custoso e, principalmente, mais propício à liberdade do fatigado e espoliado povo brasileiro.  Porém, tanto por questões nacionalistas quanto por motivos estatais, preferiu-se o caminho mais complexo, que foi a criação e emissão de (mais uma) nova moeda.  Afinal, utilizar uma moeda estrangeira significa que o governo não mais teria capacidade de imprimir dinheiro para financiar seus déficits, passando a depender exclusivamente de impostos e empréstimos para cobrir seus gastos.  E, como sabemos, um governo só aceita vestir uma camisa-de-força se ela tiver um zíper na frente.  Logo, a opção pela criação de (mais) uma moeda foi uma esperta manobra do governo para manter intacto seu poder de imprimir dinheiro, não obstante todos os estragos que já haviam sido causados em decorrência da hiperinflação por ele gerada.
O Plano Real dependia de cinco fatores essenciais:
1) Zerar o déficit público — justamente o fator que gerava a emissão de dinheiro.  Para isso, haveria um aumento de cinco pontos percentuais em todos os impostos federais e privatizações de estatais, principalmente dos bancos estaduais;
2) Desindexar a economia — isto é, acabar com as correções automáticas de preços e salários, que eram reajustados automaticamente de acordo com a inflação passada (prática essa determinada por lei).  Em termos técnicos, isso ficou conhecido como "acabar com a inércia inflacionária";
3) Reindexar a economia de acordo com a taxa de câmbio — isto é, fazer com que preços e salários variassem de acordo com o dólar.  Na prática, o dólar se tornava o novo indexador.
4) Abrir a economia por meio da redução das tarifas de importação — tudo era válido para combater qualquer escalada preços (bons tempos);
5) Aumentar acentuadamente as reservas internacionais — isto é, o governo deveria comprar dólares continuamente, acumulando-os até o momento da introdução da nova moeda.  Quanto mais dólares o governo tivesse em suas reservas, maior seria a confiança dos investidores internacionais na seriedade e na robustez do plano, e menores seriam as chances de um ataque especulativo e de uma fuga de capitais.
Uma vez cumpridas estas cinco medidas, a nova moeda nasceria com um valor praticamente igual ao dólar.
As etapas
No dia 1º de agosto de 1993, houve a primeira medida, embora de efeito apenas cosmético: mudou-se, mais uma vez, o nome da moeda, e cortou-se três zeros.  A moeda deixava de se chamar Cruzeiro e passava a se chamar Cruzeiro Real.  A inflação de preços continuava em forte ascensão: seria de 33% só no mês de agosto e de 1.730% no acumulado de 12 meses. 
Esta ascensão inflacionária decorria do fato de que, além de imprimir dinheiro para saldar o seu déficit, o governo também imprimia para comprar dólares, algo que ele continuaria fazendo até o dia da introdução do real. 
No dia 7 de dezembro de 1993, finalmente foi apresentado o plano de estabilização especificando os cinco itens elencados acima.  Veja aqui um curto vídeo de uma reportagem do Jornal Nacional.
A mudança seguinte — e a mais importante — ocorreria só em 28 de fevereiro de 1994: a introdução da URV, Unidade Real de Valor.  (A inflação de fevereiro foi de 40,3% e a acumulada em 12 meses já estava em 3.025%).
A URV foi apenas um nome técnico tupiniquim para se evitar a palavra 'dolarização'.  Na prática, a URV nada mais era do que a cotação do dólar do dia anterior.  A taxa de câmbio do final de cada dia era estabelecida como sendo o valor da URV do dia seguinte.  Este valor serviria de indexador para todos os valores da economia.  Assim, os bens e serviços precificados em Cruzeiro Real deveriam ser divididos pela URV (taxa de câmbio determinada no dia anterior) para se encontrar os preços em Real.   
Veja aqui um exemplo aleatório: no dia 28 de março de 1994, a URV foi determinada em CR$895,03.  Isto significa que, no dia 29 de março, os preços em Cruzeiro Real deveriam ser divididos por 895,03 para se obter o preço em Real.  Este processo era repetido diariamente.  Dizia-se, assim, que a economia estava "urvizada". 
O objetivo desta indexação em URV era, paradoxalmente, o de desindexar toda a economia, apagando aquilo que era chamado de "memória inflacionária".  Todos os contratos e negociações salariais deveriam ser urvizados.  A intenção era fazer com que, no dia da transição do Cruzeiro Real para o Real (a moeda só entraria em circulação no dia 1º de julho), os preços fossem exatamente aqueles do dia anterior, de modo a não gerar sobressaltos e nem confusão.  Veja aqui uma curta reportagem do Jornal Nacional, ainda em junho, ensinando as pessoas a como fazer esta conta básica, já as preparando para o dia da transição.
Finalmente, no dia 29 de junho de 1994, uma quarta-feira, a taxa de câmbio encerrou o dia com o dólar valendo CR$2.750,00.  Portanto, no dia 30 de junho, quinta-feira, todos os valores em Cruzeiro Real deveriam ser divididos por 2.750 para se obter os valores em Real.  Todas as contas bancárias, todas as aplicações e investimentos foram automaticamente convertidos em Real.  CR$2.750 foi, portanto, a paridade estabelecida entre o Cruzeiro Real e o Real.  Morria o Cruzeiro Real e, na sexta-feira, dia 1º de julho, nascia o Real, valendo exatamente 1 dólar (pelo menos naquela sexta-feira).  Toda a base monetária foi trocada de acordo com esta paridade de CR$2.750,00 para cada R$1,00.  Quem estivesse em posse de cédulas de Cruzeiro Real deveria trocá-las nos bancos por cédulas e moedas de Real.
Em junho de 1994, a inflação de preços foi de 47,43% e a inflação acumulada em 12 meses foi de 4.922%.
Alguns gráficos
A seguir, veja o gráfico da variação da base monetária desde 1º de agosto de 1993, quando surgiu o Cruzeiro Real, até 30 de junho de 1994, quando ele morreu.  Em menos de um ano de existência, ela aumentou 3.100%.
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Gráfico 3: evolução da base monetária do Cruzeiro Real, de agosto de 1993 a junho de 1994
Este aumento foi majoritariamente para a compra de dólares para se acumular reservas internacionais.  Veja abaixo a cotação diária do dólar para este mesmo período.  Como era de se imaginar, observe a incrível desvalorização ocorrida no período, decorrente desta enorme impressão de dinheiro.
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Gráfico 4: taxa de câmbio do Cruzeiro Real, de 1º agosto de 1993 a  29 de junho de 1994.
Agora, o gráfico da variação das reservas internacionais desde janeiro de 1980.  Observe que elas começaram a crescer em definitivo a partir do final de 1991, sob a gestão de Marcílio Marques Moreira no Ministério da Fazenda, indicando que já havia um plano esboçado desde aquela data.
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Gráfico 5: evolução das reservas internacionais, janeiro de 1980 a junho de 1994
E o gráfico da taxa de inflação acumulada em 12 meses desde 1987.  A queda acentuada se deveu ao Plano Collor, que envolveu sequestro de poupança e congelamento de preços e salários.  Porém, tão logo os ativos confiscados foram sendo desbloqueados, os preços voltaram a disparar.
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Gráfico 6: IPCA acumulado em 12 meses, de janeiro de 1987 a junho de 1994
Transição sem susto
A transição do Cruzeiro Real para o Real, na sexta-feira, 1º de julho de 1994, foi sem susto e sem tumultos.  Obviamente, em um país acostumado a confiscos, congelamentos e tabelamentos, houve quem remarcasse os preços de maneira mais "abusada", justamente tentando se precaver contra estas possíveis surpresas, algo que obviamente irritou o governo.  Porém, fora estes incidentes localizados, a transição se deu de maneira suave e tranquila.  A inflação de preços, que havia sido de 47,43% em junho, passou para 6,84% em julho, 1,86% em agosto, 1,53% em setembro, 2,62% em outubro, 2,81% em novembro e 1,71% em dezembro.
Câmbio fixo?
Um dos maiores mitos que persistem até hoje é aquele que afirma que o Plano Real baseou-se um uma "âncora cambial" ou em um "câmbio fixo".  Isso é falso.  O câmbio nunca foi fixo, sequer por um dia.  Já no primeiro dia útil após a transição — segunda-feira, 4 de julho de 1994 — a taxa de câmbio passou a flutuar.  A partir daí, seu valor foi sendo determinado ora pelo mercado ora pela pura intervenção do Banco Central.  O BACEN se limitava a, diariamente, estabelecer um piso e um teto para a taxa de câmbio — algo tecnicamente chamado de 'banda cambial' —, mas estes valores aumentavam diariamente (ver gráfico 7).  E assim permaneceu até o "fim" daquilo que se convencionou chamar de "primeira fase" do Plano Real, no dia 13 de janeiro de 1999. 
Obviamente, houve períodos de intervenção intensa, principalmente no segundo semestre de 1998 e no início de 1999, quando o BACEN se esforçou — leia-se 'vendeu reservas internacionais' — para tentar manter um determinado valor para o câmbio (detalhes mais abaixo).  Mas câmbio genuinamente fixo nunca houve.  A seguir, um gráfico com as cotações diárias do câmbio, de 1º de julho de 1994 a 12 de janeiro de 1999.
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Gráfico 7: taxa de câmbio diária, de 1º de julho de 1994 a 12 de janeiro de 1999
Por que o Real foi aceito
Adeptos da teoria austríaca sabem que uma moeda só é imediatamente aceita após o seu surgimento caso ela já possua um histórico como meio de troca.  Se você criar uma moeda de papel hoje, do nada, é muito provável que ninguém irá aceitá-la.  Da mesma forma, um país que troque o seu sistema monetário, introduzindo uma nova moeda, pode até ser capaz de fazer — por meio da força, da coerção e das leis de curso forçado — com que seus cidadãos a utilizem; porém, dificilmente conseguirá fazer com que investidores estrangeiros confiem nesta moeda.  Tampouco os governos de outros países.
Por isso, caso o Brasil simplesmente trocasse o nome da sua moeda, é bastante provável que ela não fosse levada a sério pela comunidade internacional — principalmente levando-se em conta nosso histórico nada favorável de libertinagem monetária.  Logo, apenas a criação de uma nova moeda não seria capaz de fazer com que, logo em seus primeiros meses, ela se apreciasse como o Real se apreciou, indo de uma taxa de câmbio de R$1/US$ para R$0,84/US$.  Portanto, qual foi o segredo?
O segredo é aquilo que pode ser chamado de "qualidade da moeda".  A qualidade da moeda é determinada ou pelos ativos que a lastreiam ou pelos ativos pelos quais ela pode ser trocada sob demanda e sem restrição.  No caso do Real, o segredo estava justamente no tamanho das reservas internacionais em dólares.
Ao final de julho de 1994, a quantidade de reais em poder do público e em contas-correntes (ou seja, o M1) era de R$10,687 bilhões.  Já a quantidade de reservas internacionais era de US$43,09 bilhões
Isso significa que mesmo se todos os reais em circulação na economia brasileira fossem convertidos em dólares, ainda sobrariam (muitos) dólares.  Em outras palavras, na eventualidade de uma crise econômica mundial que assustasse os investidores estrangeiros e os levasse a retirar todos os seus investimentos do Brasil, eles não teriam por que se preocupar em não conseguir converter reais em dólares.  Havia dólares sobrando.  Foi justamente esta "qualidade do Real" — o fato de estar lastreado abundantemente em dólares — que garantiu a confiança dos investidores, levando à sua imediata apreciação logo após o seu surgimento.
E foi exatamente neste lastro em dólares que o Real manteve boa parte da sua credibilidade desde seu lançamento.  Enquanto as reservas internacionais fossem maiores que o M1, os investidores estrangeiros estariam seguros de que não haveria perigo de não conseguirem converter reais em dólares.  Mais ainda, eles estariam seguros de que o governo não recorreria — como já fizera várias vezes no passado — às maxidesvalorizarções cambiais para evitar que uma repentina fuga de dólares gerasse um total esgotamento das reservas internacionais. 
As reservas em dólares foram toda a base do Plano Real.  Daí a importância das compras de dólares iniciadas ainda no final de 1991.
Porém, manter estas reservas internacionais não era fácil, principalmente levando-se em conta que a balança comercial e de serviços (tecnicamente chamada de 'Transações Correntes') tornou-se negativa a partir de outubro de 1994 (e assim permaneceu até o fim da "primeira fase" do Plano Real).  Dado que havia esta saída de dólares por meio deste déficit nas transações correntes, o país tinha de manter juros elevados para atrair capital externo (via investimentos em títulos do governo, no mercado financeiro e em investimentos diretos; em terminologia contábil, diz-se que esses dólares estão entrando na conta capital e financeira) para mais do que compensar esta saída de dólares.
E esta foi justamente a "mácula" da primeira fase do Plano Real: a necessidade de manter juros altos para atrair dólares e, com isso, manter a confiança da comunidade internacional no Plano.  Não bastasse isso, o governo ainda apresentava um déficit orçamentário de aproximadamente 7% do PIB (não havia sequer superávit primário).  Tamanha necessidade de financiamento contribuía ainda mais para a elevação dos juros.
Eis um gráfico das taxas de juros determinadas pelo Banco Central para garantir este influxo contínuo de dólares via conta capital (Obs: dados disponíveis apenas a partir de julho de 1996, data da criação do COPOM).
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Gráfico 8: taxa de juros do determinada pelo Banco Central, de 1º julho de 1996 a 31 de dezembro de 1998
Observe a disparada dos juros em outubro de 1997, em decorrência da crise asiática, que gerou uma fuga de capitais ao redor do mundo, e em novembro de 1998, quando a primeira fase do Plano Real começou a desabar, pelos motivos que serão vistos logo abaixo.
A boa fase
Como explicado acima, a genuína âncora do Plano Real e da sua estabilidade era o volume de suas reservas internacionais.  Enquanto o volume de dólares fosse maior do que o M1, toda e qualquer conversão de reais em dólares estava garantida, o que trazia tranquilidade aos investidores, que assim não precisavam se preocupar com desvalorizações cambiais repentinas para impedir o esgotamento das reservas internacionais.
Enquanto esta estabilidade fosse garantida, o real desfrutaria do status de moeda forte e segura.  Justamente para garantir que o volume de reservas internacionais fosse maior que o M1, a expansão monetária era contida.  Isso trouxe uma substancial redução na inflação de preços, que caiu de 916% em 1994 para 1,65% em 1998 (o menor valor em toda a história do real).  Eis o gráfico da inflação de preços acumulada em 12 meses (a partir de julho de 1995, exatamente um ano após a introdução do real):
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Gráfico 9: IPCA acumulado em 12 meses, de julho de 1995 a dezembro de 1998
Para ajudar neste controle da inflação de preços, a economia passou por um processo de modernização.  Além da privatização de empresas estatais ineficientes, houve também a extremamente importante privatização de bancos estaduais, genuínas usinas de expansão monetária, pois eram utilizados por seus respectivos governos como fonte fácil e farta de financiamento.  Estes bancos operavam praticamente sem lei e sob ordens de seus governos estaduais, criando meios de pagamento a rodo apenas para financiar seus descalabros.  Os desvalidos de todo o resto do país pagavam a conta
Os melhores exemplos eram o Banespa e o BANERJ.  A dupla Quércia-Brizola punha fogo nessas instituições, fazendo-as conceder empréstimos para apaniguados políticos, para estatais deficitárias e, principalmente, para seus vorazes governos estaduais, ao mesmo tempo em que esses próprios bancos incorriam em déficits vultosos.  E quem socorria esses bancos era o Banco Central, que injetava dinheiro neles sempre que necessário, aumentando tanto a base monetária quanto o M1.  Não à toa, a inflação só passou a ser menor após esses bancos terem sido tirados da órbita de seus governos estaduais.
Mas a Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil, o Banco Meridional, o Banco da Amazônia, o Banco do Nordeste, o os bancos estaduais de Santa Catarina, Ceará, Goiás, Pará, Alagoas, Minas Gerais, Mato Grosso, Bahia, Acre e Maranhão não ficavam atrás.  Todos aprontavam e recebiam vultosas injeções do Banco Central.  Os bancos estaduais não tinham de prestar contas a ninguém.  Sua gerência política fazia a farra com os recursos, o Banco Central imprimia o dinheiro para cobrir a farra e o resto da população sofria as consequências da libertinagem.
Toda esta depravação, felizmente, foi interrompida durante a segunda metade da década de 1990.  Sem esta medida, dificilmente a inflação de preços cairia para menos de um dígito.
Por que o Plano Real acabou
As coisas vinham aparentemente bem até o segundo semestre de 1998, quando começaram a degringolar.  E no dia 13 de janeiro de 1999, o Plano Real, ao menos como havia sido originalmente concebido, acabou.
Por quê?
O gráfico a seguir mostra a variação das reservas internacionais e a variação do M1, de julho de 1994 a janeiro de 1999.
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Gráfico 10: reservas internacionais (linha azul, eixo da direita) vs. M1 (linha vermelha, eixo da esquerda)
Observe que, enquanto as reservas internacionais (linha azul) se mantiveram acima do M1 (linha vermelha), a situação se manteve relativamente tranquila. 
Já no segundo semestre de 1997, as reservas caíram US$10 bilhões (de US$62,5 para US$52,5 bilhões) em decorrência da crise asiática.  Consequentemente, o Banco Central deu uma pancada nos juros, elevando-os de 18,75% para 46%, como mostrado no gráfico 8.  Isso não apenas estancou a fuga de capitais, como ainda foi eficaz em atrair um volume ainda maior de capital estrangeiro.  Em abril de 1998, o país atingiria um volume até então recorde de reservas internacionais: US$74,656 bilhões, com um M1 na casa dos R$ 42 bilhões.  O câmbio, como mostra o gráfico 7, estava por volta de R$ 1,13.  Ou seja, mesmo se todo o M1 fosse convertido em dólares, ainda sobraria uma enormidade de reservas internacionais.  Logo, o cenário parecia tranquilo.
Até que no dia 17 de agosto de 1998, a coisa voltou a degringolar.  A Rússia entrou em crise financeira, e o governo russo anunciou uma forte desvalorização do rublo seguida de uma moratória.  Adicionalmente, a retomada dos confrontos na Chechênia e o início de uma nova guerra entre os separatistas e o governo russo pioraram ainda mais o humor dos investidores estrangeiros, que ainda estavam abalados pela crise asiática.  Houve uma maciça fuga para o dólar.
Em julho, as reservas internacionais do Brasil estavam em US$70,2 bilhões.  Em novembro, elas já haviam despencado para US$41,2 bilhões.  E no início de janeiro de 1999, continuaram caindo para US$36 bilhões.  Simultaneamente, o M1 havia crescido de R$42 bilhões para R$49 bilhões. 
Por que as reservas internacionais despencaram assim tão maciçamente?  Porque o Banco Central queria impedir de qualquer maneira a inevitável apreciação do dólar, ainda que ela fosse apenas momentânea.  A explicação é a seguinte:
A crise asiática no segundo semestre de 1997 havia gerado fortes desvalorizações no baht tailandês, no novo dólar taiwanês, na rúpia indonésia, no ringgit malaio, no won sul-coreano, no peso filipino e no dólar cingapuriano.  O dólar de Hong Kong, que opera sob um Currency Board, conseguiu manter sua taxa de câmbio intacta.
Com a crise russa, um ano depois, Hong Kong voltou a ser atacada por especuladores.  As autoridades monetárias do país venderam, em duas semanas, US$15 bilhões de suas reservas de US$96,5 bilhões.  A âncora cambial se manteve.  Com isso, o Brasil se tornou a bola da vez.  Especuladores e investidores desconfiavam que o Banco Central não fosse capaz de manter sua política de venda de dólares a fim de manter o câmbio relativamente inalterado (na Ásia, apenas Hong Kong havia obtido sucesso).  O crescente endividamento do governo prenunciava calotes.  Temerosos quanto a este calote e quanto a uma iminente desvalorização do real, investidores estrangeiros começaram a tirar seus dólares do Brasil.  Paralelamente, os especuladores também atacaram.
Durante todo este período de grande demanda por dólares, houve obviamente uma forte tendência de valorização da moeda americana, algo que, deixada à lei da oferta e da demanda, poderia mandar o câmbio para valores "indesejados" pelo governo.  Ato contínuo, para evitar esta desvalorização do real, o Banco Central vendeu maciçamente os dólares de suas reservas internacionais, justamente para impedir essa valorização da moeda americana.  US$34 bilhões foram queimados apenas para evitar que o câmbio se alterasse mais acentuadamente (algo nada bom às vésperas de uma eleição presidencial).  Daí a redução de US$70,2 bilhões para US$36 bilhões de dólares nas reservas internacionais em menos de seis meses.  E o gráfico 7 mostra que o Banco Central obteve êxito: até o final de 1998, a trajetória de valorização do dólar se manteve exatamente dentro da tendência histórica.
Porém, tal política obviamente era insustentável.  Chegaria um momento em que as reservas internacionais estariam em um ponto crítico.  Se a tendência se mantivesse, elas poderiam ser totalmente aniquiladas.  Por outro lado, caso o BACEN nada tivesse feito, o dólar realmente se valorizaria acentuadamente.  De novo, em época eleição presidencial, isto não seria tolerável.
Até que, no dia 13 de janeiro de 1999, com as reservas na metade de onde estavam em abril de 1998, o Banco Central simplesmente desistiu de vender dólares para segurar o câmbio.  Simplesmente deixou que ele flutuasse. 
Veja o completo histórico cambial do real.
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Gráfico 11: taxa de câmbio diária, de 1º de julho de 1994 a 29 de junho de 2012
A segunda fase do real
O Plano Real original, portanto, acabou no dia 13 de janeiro de 1999.  Dali em diante, foi adotado o famoso tripé macroeconômico que conhecemos: câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário.  Nenhum destes conceitos existia no Plano Real.
Ao menos em termos de inflação de preços, é muito difícil dizer que o atual arranjo, no qual o Banco Central tem total liberdade para imprimir dinheiro, seja superior ao arranjo anterior, no qual, embora também houvesse liberdade para se imprimir dinheiro, o BACEN ao menos tinha de se preocupar com as reservas internacionais e com a taxa de câmbio.
Veja a evolução da inflação de preços acumulada em 12 meses.  Ao passo que havia uma nítida tendência de queda durante a primeira fase do real, a coisa desandou bastante na segunda fase.
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Gráfico 12: IPCA acumulado em 12 meses, de janeiro de 1996 a maio de 2012
Durante o Plano Real, a menor taxa de inflação de preços obtida foi de 1,65%.  Na segunda fase do real, foi de 3%.
Adicionalmente, o atual arranjo monetário é mais propício à formação de bolhas e ciclos econômicos, justamente pela maior liberdade do Banco Central em imprimir dinheiro e por ele poder manipular os juros sem, ao menos em teoria, ter de levar em conta qual será o efeito na taxa de câmbio.
O que poderia ter sido feito
O processo de transição para o real, com a implementação da URV, foi muito bem feito.  Somente o fato de não ter havido congelamentos, confiscos e tabelamentos já torna o Plano Real merecedor de grandes elogios.
No entanto, o inevitável desejo de se criar uma nova moeda própria subtrai muito do brilhantismo do plano.  Se, no dia 30 de junho de 1994, todas as cédulas de Cruzeiro Real, bem como todos os depósitos em conta-corrente, fossem simplesmente convertidos em dólar (e havia dólares de sobra para isso, como ilustrado no gráfico 10), de modo que a moeda americana se tornasse a moeda corrente do Brasil, a situação teria sido bastante diferente.
Para começar, não teria havido maiores confusões na precificação de bens, serviços e salários, pois os próprios valores destes nos EUA já nos serviriam de base.  Adicionalmente, não haveria motivos para reclamações sobre taxas de câmbio sobrevalorizadas.  Indústrias que quisessem exportar mais teriam apenas de reduzir seus preços.  Não haveria alternativas artificiais.  Não haveria como o governo selecionar vencedores e perdedores.  Não haveria como o setor exportador fazer lobby para manipulações na taxa de câmbio.
Do ponto de vista da inflação de preços, também certamente estaríamos, até hoje, em melhor situação.  A oferta monetária no Brasil — isto é, a oferta de dólares — iria variar de acordo com a demanda dos brasileiros por moeda.  Não haveria uma política monetária doméstica: a oferta de dólares iria variar automaticamente de acordo com as variações no balanço de pagamentos (transações correntes mais conta capital e financeira).  Se houvesse um aumento na demanda por dólares, isto faria com que empresas e famílias gastassem menos, o que reduziria a demanda por bens e serviços não monetários.  Seus preços inevitavelmente cairiam, o que tornariam suas exportações mais atraentes no mercado internacional.  Este aumento nas exportações geraria um superávit no balanço de pagamentos, trazendo mais dólares para o Brasil.  Este aumento na oferta monetária faria com que os preços voltassem a subir, restaurando o equilíbrio inicial no balanço de pagamentos.  E se houvesse uma redução na demanda por dólares, de modo que os brasileiros aumentassem seus gastos, os preços subiriam, as importações ficariam mais atraentes, dólares seriam enviados para fora, isto aumentaria a demanda por dólares e reduziria os gastos dos brasileiros, os preços voltariam a cair e o equilíbrio de antes seria restaurado.  É justamente assim que uma economia funciona também sob um padrão-ouro.
Adicionalmente, houvéssemos nós adotado o dólar, que é a moeda internacional de troca, certamente teríamos atraído muito mais investimentos estrangeiros, os quais não precisariam se preocupar com desvalorizações cambiais.  Consequentemente, os investidores não teriam de planejar fugas repentinas.  Ataques especulativos como os de 1997 e 1998 não teriam ocorrido. 
Outro fator importante é a taxa de juros: operando diretamente com dólares — e não com uma moeda dependente do dólar —, não haveria necessidade de se elevar artificialmente os juros apenas para se manter uma elevada reserva de dólares.  Sem estes juros artificialmente elevados — que restringem os investimentos —, a economia poderia ter se desenvolvido muito mais.
Os gastos do governo também seriam bem mais contidos.  Sem o poder de imprimir dinheiro para financiar seus gastos, o governo brasileiro só poderia se financiar via impostos e via empréstimos.  O primeiro método é impopular, e possui um limite natural de crescimento.  E caso recorresse majoritariamente ao segundo método, os juros se tornariam inviáveis, pois o governo simplesmente não teria como ficar pegando empréstimos ad eternum da população.  Tal esquema de endividamento contínuo só funciona bem quando o governo detém a impressora de dinheiro, pois assim ele pode imprimir dinheiro não apenas para pagar parte do serviço de sua dívida, como também para manipular os juros da sua própria dívida.  Sem essa impressora, o governo é forçado a se manter estritamente dentro de um orçamento.  Com gastos governamentais contidos, a expansão do estado é restringida.  A liberdade da população aumenta.
Sim, hoje sabemos que o dólar não mais é o que era na década de 1990.  Porém, naquela época, só havia esta opção.  Ademais, a adoção do dólar não implicaria a obrigatoriedade do seu uso; moedas paralelas deveriam também ser liberadas, sejam elas estatais (como euro, iene, franco suíço, iuane) ou privadas (que poderiam ser emitidas tendo como lastro metais preciosos, por exemplo).  A conversão para outra moeda qualquer (tanto de outros países quanto privada) ou para um padrão-ouro seria muito mais fácil neste ambiente.  O exemplo do Panamá, que utiliza o dólar como moeda corrente, que não possui Banco Central, e que por isso é o único país da América Latina que nunca passou por uma crise financeira, é uma boa mostra prática desta teoria.
Portanto, a criação do real, embora bem executada, foi uma pirotecnia desnecessária.  No final, foi apenas um estratagema que permitiu ao estado manter — agora sem o descontentamento popular gerado pela hiperinflação — sua principal fonte de financiamento, aquela instituição que garante a ininterrupta expansão do seu tamanho e do seu poder: o Banco Central.
Perdemos, em 1994, uma ótima chance de termos nos tornado muito mais livres.

Leandro Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.

BOLCHEVIQUE "TRAVECO"

A esquerda é uma praga da qual não nos livramos. Egressa da tradição judaico-cristã messiânica, traz consigo a tara do fanatismo daquela. Mas ela tem várias faces. No Brasil, após a ditadura, a esquerda tinha o absoluto controle da universidade e, por tabela, de muitas das instâncias de razão pública, como escolas de nível médio, mídia, tribunais e escolas de magistratura. Coitadinha dela. Neste caso, do aparelho jurídico, sente-se o impacto quando vemos a bem-sucedida manobra da esquerda em fazer do Código Penal uma província ridícula do politicamente correto, para quem, como diz a piada, entre matar um fiscal do Ibama e um jacaré, é menos crime matar o fiscal. Com a crise da Europa e a Primavera Árabe, a esquerda se sente renovada. Interessante como, no caso árabe, ela flerta com os movimentos islamitas. A razão é, antes de tudo, sua ignorância completa com relação ao Oriente Médio. A esquerda sempre foi provinciana. Ela confunde o fanatismo islamita com o fanatismo revolucionário. Lá, não existe “povo em busca de igualdade democrática”, mas sim fiéis em busca de tutela absoluta. Antes de tudo, devo dizer que há uma forma de esquerda que respeito: os melancólicos de Frankfurt. Para estes, como Adorno e Horkheimer, vivemos o “échec” (impasse, fracasso) da modernidade, devido à mercantilização das relações. Para mim, isso é um fato. E, enfim, a melancolia sempre me encanta. Os melancólicos têm razão. Desde Deleuze, Derrida e Foucault (três chifres da mesma cabra), a esquerda assumiu ares de revolução de campus universitário, que encampa desde movimentos como o engodo do Maio de 68, passando pela crítica da gramática como forma de opressão (risadas…), até a ideia boba de que orientação sexual seja atitude revolucionária. Que tal sexo com pandas? Por falar em pandas… Outra forma é a esquerda-melancia. Verde por fora, vermelha por dentro. Essa se traveste de preocupação com os pandas para querer roubar o dinheiro e o esforço alheios, além de refundar a união das Repúblicas Socialistas Soviéticas, mas com obrigação de comida orgânica no cardápio. Existe também a esquerda “de classe executiva” que vai a jantares inteligentes. O mais perto que ela chega de qualquer coisa vermelha é do vinho que gosta de discutir, marca de sua falsa “finesse”. Nada mais “fake” do que falar de vinhos como modo de elegância afetada. Há também a religiosa, que se divide em duas. A budista “light”, aquela que acha que o budismo é uma espiritualidade “progressista”. A outra, a católica, pensou que Marx precisava de um Che Jesus e se deu mal. Nem a esquerda a leva a sério, nem a igreja a considera mais. Claro, não podemos esquecer do feminismo, aquele que acha que o patriarcalismo é responsável por todos os males e afirma que Shakespeare era uma menina vestida de menino. Outra forma é a esquerda multicultural. Essa confunde o mundo com uma praça de alimentação étnica de um shopping center de classe média, achando que “culturas” (esse conceito “pseudo”) se misturam como molhos. Outra forma é a esquerda “aborígene”, aquela que entende que a vida pré-descoberta da roda é a forma plena de habitar o cosmo. Há também a esquerda da psicologia social, composta basicamente de psicólogas, pedagogas e assistentes sociais a favor da educação democrática e da ideia de que tudo é construído no diálogo. Essas creem que se pode dialogar com serial killers, culpando a escola, o capital e a igreja pelas mulheres que eles cortam em pedaços nas redondezas. Todos esses tipos têm um traço em comum: são todos frouxos, como diria Paulo Francis. Mas existe uma outra esquerda, a bolchevique “traveco”. Os bolcheviques eram cabras que gostavam de violência e a praticaram em larga escala. Hoje, para a esquerda, pega mal pregar violência. Ela sofre com um problema que é a imagem de si mesma como um conjunto de seres puros, dóceis e pacíficos. Então, para os simpatizantes da violência revolucionária bolchevique, a saída é se travestir de gente dócil e falar em “violência criadora”. O amor e a violência são os mesmos, mas a saia confunde.Por: Luiz Felipe Pondé, Folha de SP

CRISE FINANCEIRA DA CIDADE DE SÃO PAULO


Próxima Crise Financeira Será da Cidade de São Paulo - 250 Bilhões

Divida de sao pauloA Prefeitura de São Paulo por alguma razão, se descontrolou na administração financeira de sua dívida, que em 3 gestões passou de 10 bilhões para 60 bilhões.
Crescimento foi basicamente juros sobre juros, fruto de descontrole inicial. 
Como agora se tornou impossível de pagar, mais 9 anos de juros sobre juro a dívida poderá tranquilamente chegar a R$ 200 bilhões, especialmente considerando as dívidas adicionais que serão contraídas devido a Copa e as Olimpíadas. 
Para os moradores de São Paulo isto significa mais impostos, menos investimentos, menos possibilidades de emprego diante da futura debandada de empresas que mudarão para cidades mais bem administradas do que São Paulo, e que tem mais do que dívidas para oferecer.
Como nada foi feito quando a dívida era ainda de R$ 7, 10, 12, 15 bilhões, como todos os gestores envolvidos preferiram ignorar o problema, apesar da Lei de Responsabilidade, temos um mega problema. 
Leiam a CPI de 2001, quando o problema já fora alertado e diga-se de passagem (mal) analisado, mas mesmo assim nenhuma medida foi feita. 
As soluções eram fáceis e óbvias e é impressionante que nenhuma foi tomada, e nenhuma medida corretiva foi oferecida pelos especialistas ouvidos pela CPI, a não ser aumentar os impostos. 
"Foram ouvidas 22 pessoas, colhidos documentos relevantes, reunidos em 10 volumes, assim como 46 volumes distribuídos em 14 anexos muitos deles contendo vários volumes."
Velha ideia entre acadêmicos que volume é prova de boa análise.
Se você quer saber como a nossa prefeitura é administrada, leia estes dois relatórios por inteiro, faça as devidas anotações e postem os seus comentários.
É uma aula de como deixaram problemas se acumularem transformando um problema de 7 bilhões em outro de 250 bilhões, que vocês jovens paulistanos irão pagar. Com mais IPTU. Por:  

domingo, 1 de julho de 2012

É BRASILEIRO SIM


É brasileiro sim

  • 1 de julho de 2012|
  •  
  • 19h52|
  • Por Claudia Silveira
Por Jorge Mariano
Luiz Horta durante a degustação com vinhos nacionais e europeus (Foto: Nilton Fukuda/AE)
Na última degustação realizada durante o 6º Paladar – Cozinha do Brasil, Luiz Horta, colunista de vinhos do Estadão, desafiou os participantes. Foram dez vinhos, entre nacionais e europeus, degustados às cegas para testar as habilidades de todos os que estavam na sala. “Nas degustações que fizemos aqui, muitos vinhos nacionais foram confundidos com vinhos estrangeiros”, disse Horta. A ideia, era mostrar que a produção nacional acompanha a cultura do vinho mundial sem deixar de lado suas características próprias.
O vinhos Villa Francioni Joaquim 2009, Quinta do Seival Castas Portuguesas 2008, Don Laurindo Tannat Reserva 2005, Pizzato DNA 99 Merlot 2005, Miolo Merlot Terroir 2009, Lidio Carraro Elos 2008, Dom Cândido Documento Merlot 2009 e Marco Luigi Cabernet Sauvignon 1999, representaram o País no painel. Os vinhos europeus ficaram por conta dos franceses Chateau Turon de La Croix 2009 e o Barons de Rothschild-Lafite Bordeaux Réserve Spéciale 2009.
“A gente mudou de patamar na vinicultura nacional. Em qualidade e ousadia”, falou Horta. Foi merlot virando cabernet, varietal passando por vinho de corte, francês com sotaque gaúcho. Poucos foram os que conseguiram acertar o que era servido nas taças. Tudo isso demonstra as qualidades únicas do Brasil para a produção de vinhos. As vinícolas estão conseguindo extrair notas antes impensáveis por aqui. E Horta reafirmou a fala de José Luiz Pagliari, de que o vinho brasileiro é uma bebida gastronômica. “Seria bom se tivéssemos alguns quitutes para acompanhar”, disse durante a aula.
Os sons de surpresa eram comuns durante a aula e muitos mostraram-se impressionados com as bebidas. O próprio Luiz Horta mostrou-se intrigado com algumas notas encontradas e feliz pela qualidade de tudo que estava provando. “Não que o Brasil seja o melhor produtor do mundo, mas comparado há 20 anos, quando os vinhos eram motivo de piada, hoje são perfeitamente competitivos no mercado”, falou.

AS CLASSES MÉDIAS NA BERLINDA

Desde abril até agora viajei bastante, saindo e voltando ao Brasil. Fui aos Emirados Árabes, ao México, ao Japão, à China e, na semana passada, ainda fui a Buenos Aires. Sempre participando de seminários ou fazendo conferências. Lia, naturalmente, os jornais locais que tinham edição em inglês. Por toda parte, um assunto dominante: a crise econômica. Em alguns países, mesmo com regimes políticos muito diferentes, como China e Brasil ou Argentina, alguma preocupação com a corrupção. Nessa mesmice, li com prazer em Buenos Aires, no La Nación, um artigo de Marcos Aguines, O orgulho da classe média, reproduzido no dia seguinte em O Globo. 

Aguines desacredita da visão, que predominava nos círculos de esquerda, de que a classe média - a pequena burguesia, como era chamada - seria a Geni da História. Fascinados pelo papel revolucionário e liberador da revolução proletária e, mais tarde, pelo ímpeto das massas ascendentes, os ideólogos de esquerda - e não só eles, pois a moda pegou - não viam mais do que atraso e mesquinhez na classe média, os "desvios" pequeno-burgueses e a tibiez que lhe tiravam o ímpeto para transformar a sociedade. Provavelmente, em certas conjunturas históricas, especialmente na velha Europa, era assim que as classes médias agiam. Basta ler os romances de Balzac como Eugénie Grandet ou O Pai Goriot para sentir que essas camadas ficavam apequenadas, mesquinhas, diante da burguesia vitoriosa ou da nobreza decadente aliada à mesma. Entretanto, terá sido essa a posição das classes médias nas Américas e nos países de imigração? 

Dou a palavra a Aguines: na Argentina, tanto no campo como nas cidades, as classes médias se expandiram e começaram a construir valores que deram suporte para três culturas, "a cultura do trabalho, a cultura do esforço e a cultura da honestidade". O mesmo, acrescento, terá ocorrido na Austrália ou no Canadá e, de outra maneira, nos Estados Unidos. E no caso brasileiro, terá sido distinto? Esmagadas entre a escravidão e o senhorio rural, agraciadas aqui e ali com algum título não hereditário durante o Império, as classes médias urbanas, compostas por profissionais liberais, funcionários públicos, militares, professores e poucas categorias urbanas mais, no que se iriam apoiar para manter as distinções e realizar algo na vida? Basicamente, na escola e nos valores familiares que levam ao trabalho. Tudo com muito esforço. 

Com a chegada dos imigrantes, à medida que estes, motivados pelas necessidades de trabalhar, "faziam a América", do mesmo modo se incorporaram às classes médias trilhando os caminhos do estudo e buscando ostentar a "boa moral". No percurso dessa camada de imigrantes se viu a formação de algo que poderia se aproximar de uma "burguesia pequena", ou pequena burguesia: sua base econômica, em maior número do que no caso das populações brasileiras mais antigas, provinha de um pequeno negócio. Ainda assim sua inserção na sociedade e sua gradação social eram dadas pelas mesmas virtudes das antigas classes médias, a valorização do trabalho, o estudo "para subir na vida", a honestidade. 

A própria base operária brasileira, a camada dos trabalhadores, usando outros instrumentos de ascensão social, como os sindicatos, e mantendo o ideal de trabalhar por conta própria, não fugiu deste padrão: escola-trabalho-decência. Obviamente, quando a sociedade se massifica, quando os meios de comunicação, TV à frente e, agora, a internet, dão os compassos da dança, o quadro é menos nítido. Já não se vê com clareza que valores guiam as chamadas classes médias emergentes. Mesmo que haja exagero na insistência com que se repete que milhões e milhões de brasileiros estão ingressando nas "novas classes médias", pois por enquanto se trata de novas categorias de renda, mais do que propriamente de uma nova "classe social", a transformação da renda em classe é questão de tempo: esta vai se formando. Seus membros pouco a pouco irão frequentar escolas razoáveis, criar uma teia de relações com acesso aos mesmos clubes e gozar das mesmas facilidades de recreação, trajar-se mais ou menos de modo igual (o que já ocorre), desenvolver uma cultura de trabalho qualificado e, de novo, comportar-se valorizando a decência e a honestidade. 

Como se comportarão essas classes emergentes na política, quando se transformarem numa categoria social com características, anseios e valores próprios? É provável que se juntem, nas formas de comportamento e nos valores, às classes médias preexistentes. Estas, no momento, se sentem um tanto desconectadas da instituição que, sem ser a única, lhes abrigou e deu influência: o governo, o Estado. Justamente porque a política vem sendo percebida cada vez mais como um jogo de vale-tudo, onde a moral conta menos do que o resultado. 

É hora, por isso mesmo, de reforçar, e não de menosprezar, os valores fundamentais ditos "de classe média" - estudo, trabalho, honestidade. Valores culturais não se impõem por lei, são modelos de conduta aos quais se juntam sentimentos positivos. Só a exemplaridade e a repetição enaltecida deles (na escola, na família, na mídia e na vida pública) vão aos poucos inculcando na mentalidade geral as formas que definem o que é bom, o que é ruim. Minha aposta é a de acreditar, como crê Aguines, que a velha e boa classe média, que já contribuiu para a formação da nação, ainda pode ter papel relevante e será capaz de contagiar com seus valores as camadas emergentes, pois estas a eles já são predispostas: melhoraram a renda com esforço e trabalho. 

É certo que o descaso em nossa vida pública pelos valores básicos das classes médias diminui as chances de que eles venham a prevalecer. Há oportunidades, entretanto, para reforçá-los. O julgamento do mensalão é uma delas. Seja qual for o resultado, se o Supremo Tribunal Federal se comportar institucionalmente, sem medo de condenar ou de absolver, desde que explicando o porquê e sendo transparente, pode ajudar a demarcar os limites do inaceitável. Nem só de pão vive o homem. A decência e a honestidade são partes da vida. Convém reforçar os comportamentos que se inspiram nelas.Por: FERNANDO HENRIQUE CARDOSO O Estado de S.Paulo

DÍVIDA PÚBLICA FEDERAL

Dívida pública federal cresce 2,2% em maio e atinge R$ 1,92 trilhão

A dívida pública federal, que inclui os endividamentos interno e externo, cresceu 2,21% em maio, na comparação com abril, ficando em R$ 1,92 trilhão (ante R$ 1,88 trilhão no mês anterior). Os dados foram divulgados nesta segunda-feira (25) pela Secretaria do Tesouro Nacional.
A dívida interna registrou um aumento de 2,14% em maio, para R$ 1,83 trilhão, ante R$ 1,79 trilhão, em abril. Já a dívida externa registrou crescimento de 3,7%, para R$ 88,91 bilhões, em maio. A dívida externa é o resultado da emissão de bônus do tesouro no mercado mundial.
Segundo relatório do Tesouro, a participação da dívida interna subiu de 95,44%, em abril, para 95,37%, em maio. Em contrapartida, a dívida externa teve sua participação ampliada de 4,56% para 4,63%.
No dia 12 deste mês, o Tesouro Nacional promoveu uma troca de títulos do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), para reduzir a parcela dos títulos públicos atrelados à taxa básica de juros (Selic) em poder do mercado.
Em maio, caiu a participação dos títulos que são remunerados pela taxa básica de juros (Selic), de 26,12% para 25,77%. Já os títulos com rendimento pré-fixado tiveram sua fatia aumentada de 37,59% para 38,13%. Os remunerados por índice de preços foi de 31,99% para 31,62%.
A operação, informou o Tesouro, faz parte de uma estratégia para diminuir a participação da Selic na dívida, que prejudica a atuação da política monetária, já que, ao aumentar juros para controlar a inflação, o Banco Central tem que avaliar o impacto desse aumento nas despesas do governo com a remuneração dos investidores.
Além disso, essa redução dá mais previsibilidade à gestão da dívida, já que aumenta a participação de papéis com rendimento prefixado ou baseado na inflação, para a qual existe uma meta oficial.
A valorização do dólar também influencia na alta da dívida porque o governo tem títulos atrelados à moeda americana.


ENTENDA


A dívida pública federal representa o quanto o governo deve para outros governos, instituições nacionais ou internacionais e a sociedade. Ela é composta pela dívida pública mobiliária federal interna (credores nacionais) e dívida pública federal externa (credores internacionais).
Parte da dívida pública federal, chamada mobiliária, está em poder de investidores. Esses investidores compram títulos do governo, como o Tesouro Direto, por exemplo. Essa é a maneira encontrada pelo Estado de financiar suas operações sem ter de pegar dinheiro emprestado no mercado, a juros altos.
Grosso modo, o governo vende sua dívida à vista e paga em prazos predeterminados, com juros variáveis, mas também preestabelecidos. Os títulos brasileiros mais recorrentes são atrelados a taxa Selic e à inflação oficial.Por:

LORENNA RODRIGUES DE BRASÍLIA


MÁIRA TEIXEIRA DE SÃO PAULO

sábado, 30 de junho de 2012

O EXAGERO DO CRÉDITO PESSOAL

O maior endividamento de muitos brasileiros levou a inadimplência mais grave do que previam os analistas 

Tenho chamado a atenção do leitor da Folha sobre as mudanças estruturais que vêm ocorrendo no Brasil nos últimos seis anos. São alterações importantes no metabolismo de nossa economia de mercado, criadas por um longo período de estabilidade e de crescimento. 

Reportei também os efeitos positivos que ocorrem em países emergentes quando a gestão macroeconômica correta por vários anos acaba afetando as expectativas dos consumidores e de empresas produtoras de bens e de serviços. 

Em outras palavras, quando o futuro passa a ser previsível e confiável, o chamado "espírito animal" do homem é liberado e entra-se em um período econômico virtuoso. Vivemos no Brasil esse cenário, principalmente no segundo mandato de Lula. 

Mas, como o grande Keynes nos ensinou há muito tempo, o "espírito animal" leva também a exageros e a desequilíbrios negativos que passam a ocorrer devido aos riscos excessivos assumidos pelos agentes econômicos. Vivemos nestes dois primeiros anos do mandato da presidenta Dilma Rousseff, no caso do consumidor, um exemplo clássico dessa situação. 

O crescimento vertiginoso do crédito ao consumo fez com que, em curto período de tempo, o endividamento do brasileiro com o sistema bancário passasse de 6% do PIB para mais de 16%. Esse aumento do endividamento de parcela importante dos brasileiros, tanto na chamada nova classe média como nos segmentos de renda mais baixa, criou uma situação de inadimplência mais grave do que previram os analistas mais atentos às questões microeconômicas. 

Os pagamentos de dívidas chegaram a superar 40% da renda de muitos brasileiros, levando a uma parada súbita no ritmo do consumo, principalmente de bens de consumo. 

O impacto sobre o crescimento foi imediato. Neste primeiro semestre, o PIB praticamente não cresceu, o que provocou revisão generalizada das previsões para o ano. Antes dessa freada do consumidor -agravada pelo recuo dos bancos na oferta de crédito-, as previsões apontavam para crescimento entre 3% e 3,5%. Hoje, os números mais realistas estão no intervalo entre 1,5% e 2% para o ano inteiro. 

Mas é preciso olhar para a frente com cuidado. A massa total de salários está crescendo no Brasil há alguns meses a taxas reais próximas de 12% ao ano, o que vai facilitar os ajustes dos devedores mais ousados. 

No segundo semestre, a inadimplência do consumidor vai se reduzir e, na virada para 2013, os gastos vão voltar a crescer. Apenas uma situação de colapso na Europa -cenário no qual não acredito- pode mudar esse curso das coisas. Os economistas da Quest projetam crescimento do PIB da ordem de 4,5% a 5% entre o quarto trimestre deste ano e o primeiro de 2013, o que deve acalmar os mercados e fazer com que os empresários normalizem seus planos de investimento. 

Na volta do consumidor às compras, a queda dos juros, que vem ocorrendo há alguns meses, vai servir como estímulo adicional, reforçando esse cenário de recuperação. Por outro lado, os juros reais, da ordem de 3% ao ano nas aplicações financeiras, devem alterar o equilíbrio entre poupança e consumo nas classes de renda mais elevada. Mas só o tempo pode nos levar a essa situação mais favorável. 

Nessas condições, aconselho a equipe econômica a ter paciência e a evitar sinais de desespero que aparecem com os chamados "pacotes de estímulos" em cascata. A economia brasileira é hoje muito maior do que o valor desses estímulos, e apenas setores específicos podem reagir a eles. Mas, no agregado e com capacidade de mudar o crescimento do PIB, apenas mudanças estruturais no gasto e no investimento podem ter alguma influência. 

Redução do risco sistêmico com a Europa, normalização do crescimento chinês depois de um longo período de ajustes e estabilização da vida financeira dos consumidores são eventos que não dependem do ativismo do governo brasileiro. E sem eles as ações do governo serão sempre de pouco efeito sobre a economia. Por: LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS FOLHA DE SP - 29/06

NÃO EXISTE LEGÍTIMA DEFESA?

O anacronismo da legislação penal e processual penal do País vem gerando situações absurdas, levando cidadãos inocentes, que reagiram a criminosos que os assaltavam à mão armada, a serem processados por crime de homicídio doloso triplamente qualificado. 

Só este mês, ocorreram três casos semelhantes. Um aconteceu numa joalheria de Porto Alegre, onde o proprietário, reagindo a um assalto no momento em que abria o estabelecimento, baleou um dos criminosos, que acabou morrendo. 

Outro caso aconteceu numa tarde de sábado no centro da cidade de Caxias do Sul. Surpreendida em seu apartamento por um ladrão que a ameaçava com uma faca de cozinha, uma senhora de 86 anos tirou da gaveta um revólver calibre 32 que pertencera a seu marido e que estava sem uso há mais de 30 anos e o matou com três disparos. 

O terceiro caso aconteceu na região de Cidade Dutra, na zona sul de São Paulo. Rendido em sua loja por dois assaltantes e levado até um banheiro, um comerciante de produtos de informática aproveitou um momento de distração dos bandidos, sacou uma pistola Glock 380 que guardava na mochila e disparou contra os bandidos. Um deles também disparou um revólver calibre 32. Os bandidos foram feridos e morreram logo após dar entrada no Pronto-Socorro do Grajaú. A loja já havia sido assaltada oito vezes nos últimos três anos. 

Apesar de terem agido em legítima defesa, nos três casos as vítimas dos assaltantes podem se converter em réus de ações criminais, correndo o risco de serem condenadas a penas privativas de liberdade a serem cumpridas em prisões de segurança máxima, o que representa uma absurda inversão de valores. 

Por não ter registro de arma, por exemplo, a idosa de Caxias do Sul está sendo indiciada por crime de homicídio doloso - quando há intenção de matar. Pela legislação processual penal em vigor, explicou o delegado responsável pelo caso, sua tarefa é apenas elaborar o inquérito criminal e enviá-lo para a Justiça. A propositura de uma ação penal cabe ao Ministério Público e o acolhimento do pedido e a posterior condenação ou absolvição da acusada são de responsabilidade de um juiz criminal. 

Já os proprietários da joalheira de Porto Alegre e da loja de informática de São Paulo tinham suas armas registradas pela polícia, como manda a Lei do Desarmamento. Apesar disso, os delegados responsáveis pelo inquérito criminal deixaram-se levar por um formalismo que parece exagerado. 

No caso do comerciante paulista, por exemplo, o delegado colocou em dúvida a tese de legítima defesa e, alegando indícios de "reação excessiva" e "excesso doloso", pois um dos assaltantes era menor de idade, prendeu o comerciante na carceragem da delegacia. As testemunhas relataram que os assaltantes agiram com violência e que, após o tiroteio, o comerciante esperou a chegada da polícia, apresentou a arma e prestou depoimento. "Quanto à possibilidade do reconhecimento da legítima defesa, submeto à apreciação do Poder Judiciário, ouvindo representantes do Ministério Público", disse o delegado responsável pelo inquérito. 

Ficou evidente que a idosa e os comerciantes apenas reagiram, defendendo seu patrimônio e sua vida. Como imputar exagero na reação que tiveram ao ter a vida ameaçada? Por que indiciá-los e convertê-los em réus, obrigando-os a gastar a poupança de uma vida para contratar advogados de defesa, uma vez que eram pessoas honestas colocadas sob risco em suas residências e locais de trabalho? Apesar de serem obrigados a observar a legislação processual penal, que tem mais de 70 anos, por que os delegados de polícia se deixaram levar por tanto formalismo? 

A falta de bom senso na interpretação das leis propicia, assim, um cenário surrealista, no qual têm direitos os bandidos, devendo as vítimas de atos criminosos curvar-se à vontade de seus algozes. E quem se defende dentro de sua própria casa vai para a cadeia por ter ferido um criminoso. Não existe mais legítima defesa?EDITORIAL O ESTADÃO O Estado de S.Paulo - 30/06

O GOLPE DO MERCOSUL E DO FORO DE SÃO PAULO


Articulistas de opinião brasileiros que só reconheciam o Paraguai como o país da muamba e da falsificação, hoje falam como grandes conhecedores do que se passa no país vizinho com uma intimidade e um respeito hipócrita que só merecem desprezo.

Como era previsível, o ex-bispo Fernando Lugo, conhecido como “pai da pátria” por seus incontáveis filhos ilegítimos ainda quando era bispo, foi defenestrado do cargo de presidente da República do Paraguai, após um legítimo e constitucional julgamento político.
Fernando Lugo foi o candidato do Foro de São Paulo (FSP) e, como tal, tinha uma plataforma política estabelecida pelos ditames dos encontros anuais. Em seu mandato, a primeira providência foi romper o acordo sobre Itaipú obrigando o Brasil a pagar pela energia consumida, ferindo de morte o contrato feito na época de sua criação. Como todo comunista apátrida, o então presidente Lula advogou pelo seu camarada do FSP em detrimento dos direitos legais e prejuízos brasileiros.

Lugo-destitudo
Após conhecer o resultado do julgamento, Lugo faz uma declaração pública aceitando sua destituição. Dias depois, insuflado pelos camaradas do FSP, alega não ter tido direito à defesa, afirma ter sido "vítima de um golpe de Estado" e cria um ministério paralelo.
Adepto da malfadada “teologia da libertação”, Lugo levou esses quatro anos de mandato governando apenas para seus camaradas de ideologia, os “Carperos” (Acampados - similares ao MST brasileiro) e os terroristas do Exército do Povo Paraguaio (EPP). O EPP surgiu na década dos 70-80 e se havia extinguido, porém não totalmente. Seus cabeças vivem hoje como anistiados políticos no Brasil, e daqui do território nacional brasileiro coordenaram, junto com as FARC, o seqüestro e assassinato de Cecilia Cubas, filha do ex-presidente Raúl Cubas. Com Lugo na presidência esses bandos terroristas se fortaleceram pois, em vez de combatê-los, oferecia-lhes total apoio, impunidade e apadrinhamento, levando a população ao caos e à insegurança com seus novos atos de terrorismo e bandidagem.
No último dia 15 de junho, as Forças de Segurança foram vítimas de uma emboscada, quando Lugo as enviou para resolver um conflito com ditos “carperos” totalmente desarmadas. Ao tentar uma negociação, os policiais foram atacados com tiros deixando de imediato 6 deles mortos. O restante pediu reforço e no confronto 11 agressores foram mortos, deixando ao final mais 30 feridos. Lugo não foi ao velório de nenhum deles mas imediatamente determinou que se desse assistência às famílias dos que assassinaram os policiais. O encarregado de cumprir fielmente a traiçoeira operação, determinada por Lugo, ascendeu ao posto de Comandante da Polícia Nacional.
E isto foi a gota d’água para causar revolta na população paraguaia que, respeitando o que reza a Carta Magna, o Congresso realizou uma sessão ordinária, garantindo-lhe o devido processo (Leiam aqui o “Libelo Acusatório” na íntegra), onde por maioria absoluta Lugo foi destituído do cargo por “mal desempenho de suas funções”, sentença que ele aceitou de imediato mas, insuflado pelos camaradas do Foro de São Paulo da Venezuela, Argentina, Bolívia, Equador, Uruguai e Brasil, passou a chamar de “golpe de Estado”.
Os países-membros do Mercosul reuniram-se na Argentina entre os dias 25 e 29 de junho e, ferindo os procedimentos legais e o devido processo (sem dar direito de ampla defesa), decidiram não permitir a participação do Paraguai no encontro, uma vez que não reconhecem o novo governo. Entretanto, esta decisão foi tomada em conjunto com países “convidados” que não têm direito a voz nem voto, como Chile e Venezuela. E qual era o objetivo que jazia por trás desta decisão? Como se sabe, o Paraguai era, até o momento, o único país a se opor ao ingresso da Venezuela no bloco pois, com sobradas razões, alegava que lá não existe democracia. Pois bem, sem o Paraguai nesse encontro a Venezuela foi admitida oficialmente e passou a fazer parte do Mercosul! Era isso o que desejava esta organização desde sempre e eles sim, acabam de dar um golpe na democracia!
Sinto em relação a este caso a mesma repugnância que senti no caso de Honduras, pois articulistas de opinião brasileiros que só reconheciam o Paraguai como o país da muamba e da falsificação, hoje falam como grandes conhecedores do que se passa no país vizinho com uma intimidade e um respeito hipócrita que só merecem desprezo. O Paraguai é um país pequeno e pobre mas sua gente é patriota e majoritariamente católica, como o novo presidente Federico Franco. Seus parlamentares sabem o que é honra, dignidade e respeito às leis, daí terem tomado esta atitude absolutamente constitucional. Ademais, os que hoje clamam para que se faça o mesmo no Brasil esquecem - ou desconhecem - que em nossa Carta Magna não existe um artigo dizendo que se poderá destituir o presidente por “mal desempenho de suas funções”. Reforme-se a Constituição, aprenda-se a votar em gente decente antes de ficar invejando aqueles que antes eram vistos como escória da região.

Escrito originalmente para o Jornal Inconfidência de Minas Gerais

A FALSA PROMESSA DA DEMOCRACIA

Pessoas ao redor do mundo estão lutando contra regimes autocráticos em nome da liberdade e da democracia. Elas estão certas em lutar pela liberdade, mas estão erradas em lutar pela democracia. Os libertários deveriam tentar esclarecer a estas pessoas que o caminho democrático não os levará a mais liberdade, mas sim a mais escravidão. Não há dúvidas de que a maioria dos libertários simpatiza com os protestos corajosos feitos por pessoas comuns contra os regimes autoritários ao redor do mundo. Ao contrário dos neoconservadores ou liberais, os libertários não ficam preocupados quando os manifestantes ameaçam a "estabilidade" de um país que é um mero protetorado dos EUA no Oriente Médio. Eles sempre advertiram que o apoio a ditaduras sempre gera um efeito contrário ao desejado, o tiro sempre sai pela culatra, uma vez que geralmente os povos oprimidos se revoltam não apenas contra os seus opressores, mas também contra os seus apoiadores ocidentais. A história do pós-Segunda Guerra Mundial está cheia de exemplos disso. Mas o que os libertários deveriam pensar sobre o fato de que os manifestantes estão geralmente lutando por (mais) democracia? Afinal, não se pode negar que os dissidentes em países autoritários, como a Rússia, a China, o Egito, a Tunísia e os países do Golfo Pérsico exigem democracia ("eleições livres") acima de tudo. Para os libertários, isto representa um dilema. Por certo, desde que Hans-Hermann Hoppe publicou seu famoso livro Democracy — The God That Failed, em 2001, muitos libertários tornaram-se cada vez mais críticos de toda a idéia de democracia. Você poderia dizer que, graças a Hoppe, muitos libertários têm redescoberto o fato de que a democracia é, em um certo sentido muito básico, totalmente incompatível com a liberdade. Como Hoppe e outros demonstraram, democracia ("governo pelo povo") não é de modo algum o mesmo que liberdade ("liberdade do indivíduo"). Em um sistema em que "o povo" governa, todas as decisões importantes sobre todos os aspectos da sociedade são tomadas pelo "povo", ou seja, pelo governo democraticamente eleito que supostamente representa o povo, isto é, pelo estado. Em tal sistema, as pessoas naturalmente recorrem ao estado para resolver os seus problemas ou para lidar com todos os males da sociedade. Como consequência — e dado que uma intervenção sempre leva novas intervenções — o poder do estado está em constante expansão. Isto é exatamente o que aconteceu, na prática, em países democráticos. O advento da democracia, em vez de fortalecer, subverteu as liberdades e os direitos que as pessoas até então desfrutavam nos países ocidentais. O poder do estado tem crescido constantemente nos últimos 100—150 anos, sempre em linha com o crescimento contínuo dos princípios democráticos do governo. Como demonstrado neste artigo, desde o século XIX até ao início da Primeira Guerra Mundial, os gastos dos governos ocidentais em relação ao seu PIB eram ínfimos comparados a hoje, exceto em épocas de guerra. Imposto de renda não existia. Mas à medida que a democracia foi se aprofundando, o poder dos governos foi aumentando de forma constante. Os gastos dos governos passaram de cerca de 10% do PIB em 1870 para 47% em 2010, segundo dados do "The Economist" (ver tabela do artigo). O endividamento está totalmente fora de controle na maioria dos países ocidentais, pois, para sustentar estes gastos maciços, apenas a arrecadação de impostos não é suficiente. O número de leis com as quais os governos ocidentais controlam seus cidadãos tem crescido assustadoramente, para além de qualquer nível que teria sido tolerável no início do século XX. As regulamentações atuais estipulam regras para tudo que seja imaginável, desde como uma pulseira de relógio deve ser construída até como os anéis de cebola devem ser preparados nos restaurantes. Milhões de pessoas apodrecem nas penitenciárias ao redor do mundo, tendo suas vidas destruídas pelo simples fato de terem comercializado substâncias que os governos consideram impróprias para consumo. Ninguém está a salvo dos agentes da lei nos dias de hoje, e não apenas no que tange à questão das drogas: qualquer indivíduo pode hoje ser preso por qualquer pretexto, pois ele sempre estará, inevitavelmente, violando um dos milhares de regulamentos e leis criados irrefreavelmente pelos governos, sobre os quais o cidadão comum não possui o mínimo controle. Nenhum "direito" é sacrossanto, nem o direito à liberdade de expressão, nem o direito à propriedade privada. E não há nenhum sinal de que as coisas estejam melhorando. A cada dia que passa, nossos mercados estão menos livres, nossa propriedade está menos segura, nossas leis ficam mais arbitrárias e nossos "representantes" se tornam mais corruptos. E o ideal de liberdade se torna, cada vez mais, apenas uma memória distante. Rebelião e revolução No entanto, este não é o modo como esses manifestantes olham para a democracia. Eles associam a democracia à liberdade. Não é difícil entender por quê. Mesmo em estados ditatoriais, o que as pessoas provavelmente querem acima de tudo são duas coisas: um padrão de vida decente e o controle sobre suas próprias vidas — sobre seu ambiente, suas carreiras, sua vida social. Atualmente, elas não têm nenhuma influência sobre as leis que regem suas vidas. Elas não têm controle sobre seus bens ou sobre o ambiente que as cerca. Elas não podem abrir uma empresa sem permissão de burocratas corruptos. Elas não têm nenhum poder de decisão sobre se a represa que será construída na sua vizinhança e que irá varrer sua aldeia do mapa poderá ou não ser construída, ou sobre se a construção de uma fábrica poluente que irá destruir as suas culturas poderá ser impedida. Elas simplesmente não têm seus direitos de propriedade reconhecidos. E elas não têm nenhuma maneira de remover os seus governantes que violam diariamente suas propriedades, exceto por meio da rebelião e revolução. A democracia, portanto, se torna uma maneira por meio da qual elas imaginam poder remediar todos esses males. Elas acreditam que a democracia irá lhes conceder os meios para escolher seus próprios governantes, para ajudar a formular as leis que os regem, e para que possam recorrer a tribunais independentes quando seus direitos são violados. E elas acreditam sinceramente que a democracia irá torná-las mais prósperas. Estas crenças são perfeitamente compreensíveis. Afinal, nos países democráticos ocidentais, as pessoas ainda têm algum controle sobre suas vidas. Elas são capazes, em certa medida, de eleger seus governantes ou de se desfazer deles por meio do voto. Elas têm tribunais relativamente independentes aos quais podem recorrer se acreditarem que seus direitos estão sendo violados. Elas são, até certo ponto, livres para se movimentar, procurar um outro emprego ou tentar uma vida melhor em outro lugar se assim o desejarem (pelo menos dentro de seus próprios países). E elas tendem a ter um nível de vida relativamente elevado. Estas são as promessas que a democracia oferece aos povos oprimidos ao redor do mundo. No entanto, o que essas pessoas oprimidas não conseguem entender é que a liberdade e a riqueza que as pessoas usufruem nos países mais ricos do Ocidente não se devem ao fato de esses países serem democracias, mas sim ao fato de que seus sistemas democráticos foram construídos sobre fundamentos liberal-clássicos. Por exemplo, todas as liberdades que os americanos modernos usufruem (ou usufruíam) — propriedade privada, liberdade de circulação, liberdade de expressão, tribunais independentes, poderes limitados dos governantes — foram estabelecidas pelos Pais Fundadores após a revolução americana (em parte tendo por base as tradições clássico-liberais inglesas). Isso ocorreu antes do advento da democracia tal como a conhecemos hoje. E o mesmo ocorreu em outros países ocidentais. Primeiro veio a liberdade individual; só mais tarde é que veio o estado nacional democrático. Em países que estão em vias de adotar a democracia, como o Egito, a Tunísia, a Líbia, e até mesmo, quem sabe, a China, onde não há nenhuma tradição de liberalismo clássico, não há motivos para crer que o advento da democracia levará a (mais) liberdade. Ao contrário: o "povo" dessas novas democracias irá exigir que o estado tome medidas para satisfazer seus desejos. Isso provavelmente levará à criação de ditaduras socialistas, nacionalistas ou religiosas. Nas primeiras eleições livres no Egito, os partidos liberais-seculares que instigaram a revolta da Praça Tahrir conseguiram apenas 7% dos votos. A Irmandade Muçulmana e outros partidos islâmicos radicais foram os partidos mais votados. Ocorreu o mesmo fenômeno na Tunísia. No que diz respeito aos islâmicos, parece ser algo completamente fora de suas tradições falar sobre uma sociedade genuinamente livre. O mais provável é que elas façam exatamente o oposto e sujeitem toda a sociedade à lei da sharia. E este não é um problema exclusivamente árabe ou islâmico. Em países como a Venezuela, a Tailândia e a Hungria, os líderes eleitos têm pouca intenção de estabelecer sociedades libertárias. Também na China, se este país alguma dia se tornar democrático, partidos altamente nacionalistas poderão chegar ao poder. Portanto, embora os defensores ocidentais da democracia estejam corretamente saudando o movimento Primavera Árabe como sendo uma vitória da democracia, é muito provável que tal movimento (talvez com algumas exceções) não se transforme em uma vitória da liberdade. É claro que alguém pode perguntar: pessoas como a Irmandade Muçulmana não teriam o direito de controlar suas próprias vidas? De viver de acordo com a lei sharia, por exemplo, se assim o desejarem? É claro que sim. O problema é que, em uma democracia — em um estado-nação democrático —, essas pessoas não governam apenas suas próprias vidas; elas também estendem seu domínio sobre todas as outras pessoas que vivem em sua sociedade. Afinal, é exatamente assim que o sistema democrático funciona. O que, então, deveríamos dizer, como libertários, a essas pessoas corajosas que enfrentam armas e tanques em sua luta para serem mais livres? Não os estaríamos desencorajando se lhes disséssemos que não devem lutar pela democracia? Não. Não estaríamos os desencorajando se lhes explicássemos que eles devem lutar não por democracia, mas sim por liberdade. E que isso significa que elas não deveriam tentar substituir seu estado autoritário por um estado nacional democrático, mas sim tentar romper completamente com o estado. Elas deveriam tentar criar a sua própria sociedade descentralizada e livre. É claro que a maioria não iria deixá-las criar esta sociedade, pois a maioria sempre depende de uma minoria para ser explorada. Mas, dependendo das circunstâncias, quem sabe? Por que não tentar? Pensando bem, não é exatamente isso que nós também deveríamos estar tentando fazer aqui no mundo ocidental? Tradução de Fernando Manaças Ferreira Karel Beckman é coautor, com Frank Karsten, de uma nova e fulminante análise libertária sobre a democracia. No livro Beyond Democracy: Why democracy does not lead to solidarity, prosperity and liberty but to social conflict, runaway spending and a tyrannical government (Além da democracia: por que a democracia não conduz à solidariedade, à prosperidade e à liberdade, mas sim a conflitos sociais, gastos exagerados e tirania governamental), eles mostram, em termos simples e por meio de 13 mitos, o que há de errado com o sistema democrático e por que a democracia é fundamentalmente oposta à liberdade. Beyond Democracy pode ser encomendado na Amazon em formato papel e Kindle, em inglês. Edições em alemão, polaco e italiano estão programadas para 2012.

'CUSTO LULA"

Há menos de três anos, em 17 de setembro de 2009, o então presidente Lula apresentou-se triunfante em uma entrevista ao jornal Valor Econômico. Entre outras coisas, contou, sem meias palavras, que a Petrobrás não queria construir refinarias e ainda apresentara um plano pífio de investimentos em 2008. “Convoquei o conselho” da empresa, contou Lula. Resultado: não uma, mas quatro refinarias no plano de investimentos, além de previsões fantásticas para a produção de óleo. 

Em 25 de junho último, a Petrobrás informa oficialmente aos investidores que, das quatro, apenas uma refinaria, Abreu e Lima, de Pernambuco, continua no plano com data para terminar. E ainda assim, com atraso, aumento de custo e sem o dinheiro e óleo da PDVSA de Chávez. Todas as metas de produção foram reduzidas. As anteriores eras “irrealistas”, disse a presidente da companhia, Graça Foster, acrescentando que faria uma revisão de processos e métodos. Entre outros equívocos, revelou que equipamentos eram comprados antes dos projetos estarem prontos e aprovados. 

Nada se disse ainda sobre os custos disso tudo para a Petrobrás. Graça Foster informou que a refinaria de Pernambuco começará a funcionar em novembro de 2014, com 14 meses de atraso em relação à meta anterior, e custará US$ 17 bilhões, três bi a mais. Na verdade, as metas agora revistas já haviam sido alteradas. O equívoco é muito maior. 

Quando anunciada por Lula, a refinaria custaria US$ 4 bilhões e ficaria pronta antes de 2010. Como uma empresa como a Petrobrás pode cometer um erro de planejamento desse tamanho? A resposta é simples: a estatal não tinha projeto algum para isso, Lula decidiu, mandou fazer e a diretoria da estatal improvisou umas plantas. Anunciaram e os presidentes fizeram várias inaugurações. 

O nome disso é populismo. E custo Lula. Sim, porque o resultado é um prejuízo para os acionistas da Petrobrás, do governo e do setor privado, de responsabilidade do ex-presidente e da diretoria que topou a montagem. 

Tem mais na conta. Na mesma entrevista, Lula disse que mandou o Banco do Brasil comprar o Votorantim, porque este tinha uma boa carteira de financiamento de carros usados e era preciso incentivar esse setor. O BB comprou, salvou o Votorantim e engoliu prejuízo de mais de bilhão de reais, pois a inadimplência ultrapassou todos os padrões. Ou seja, um péssimo negócio, conforme muita gente alertava. Mas como o próprio Lula explicou: “Quando fui comprar 50% do Votorantim, tive que me lixar para a especulação”. 

Quem escapou de prejuízo maior foi a Vale. Na mesma entrevista, Lula confirmou que estava, digamos, convencendo a Vale a investir em siderúrgicas e fábricas de latas de alumínio. Quando os jornalistas comentam que a empresa talvez não topasse esses investimentos por causa do custo, Lula argumentou que a empresa privada tem seu primeiro compromisso com o nacionalismo. 

A Vale topou muita coisa vinda de Lula, inclusive a troca do presidente da companhia, mas se tivesse feito as siderúrgicas estaria quebrada ou perto disso. Idem para o alumínio, cuja produção exige muita energia elétrica, que continua a mais cara do mundo. Ou seja, não era momento, nem havia condições de fazer refinarias e siderúrgicas. Os técnicos estavam certos. Lula estava errado. As empresas privadas foram se virando, mas as estatais se curvaram. 

Ressalva: o BNDES, apesar das pressões de Brasília, não emprestou dinheiro para a PDVSA colocar na refinaria de Pernambuco. Ponto para seu corpo técnico. 

Quantos outros projetos e metas do governo Lula são equivocados? As obras de transposição do rio São Francisco estão igualmente atrasadas e muito mais caras. O projeto do trem bala começou custando R$ 10 bilhões e já passa dos 35 bi. 

Assim como se fez a revisão dos planos da Petrobrás, é urgente uma análise de todas as demais grandes obras. Mas há um outro ponto, político. A presidente Dilma estava no governo Lula, em posições de mando na área da Petrobrás. Graça Foster era diretoria da estatal. Não é possível imaginar que Graça Foster tenha feito essa incrível autocrítica sem autorização de Dilma. 

Ora, será que as duas só tomaram consciência dos problemas agora? Ou sabiam perfeitamente dos erros então cometidos, mas tiveram que calar diante da força e do autoritarismo de Lula? 

De todo modo, o custo Lula está aparecendo mais cedo do que se imaginava. Inclusive na política.por Carlos Alberto Sardenberg

sexta-feira, 29 de junho de 2012

NOTÍCIAS DE SEXTA FEIRA

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou ontem nova regra liberando a candidatura dos “contas-sujas”. A mudança se deu no julgamento de um recurso apresentado pelo PT. O ministro Dias Toffoli, o mais próximo ao partido, desempatou a votação. É o partido de Lula ajudando a sujar a democracia brasileira, seu “esporte” preferido. 

Mas como nem tudo é notícia ruim, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães decidiu renunciar ao cargo de alto representante-geral do Mercosul. Ele alegou falta de apoio político para tal decisão. Se for isso mesmo, trata-se de um ótimo sinal. Afinal de contas, Pinheiro Guimarães é o grande ideólogo “bolivariano” infiltrado no bloco, representando o “chavismo” no lado brasileiro. 

A postura do Itamaraty na questão paraguaia foi vergonhosa, e espera-se que os interesses da nação fiquem acima dos interesses ideológicos da turma alinhada ao Chávez. O Barão do Rio Branco, ao assumir em 1902 o ministério das Relações Exteriores, declarou: "Não venho servir a um partido político: venho servir ao Brasil, que todos desejam ver unido íntegro, forte e respeitado". Que falta faz um Barão do Rio Branco na diplomacia brasileira! 

De volta às notícias ruins, o “Obamacare” foi considerado constitucional ontem pela Suprema Corte. O governo poderá obrigar o cidadão a comprar seguro de saúde. Isso foi aprovado porque os juízes encararam tal seguro como um imposto. Logo, trata-se de uma vitória de Pirro para Obama. Ele consegue manter sua reforma no setor de saúde, mas somente evidenciando que o seguro representa um novo imposto para a classe média, algo que o presidente negava veementemente. 

Foi Thomas Sowell quem resumiu de forma brilhante a mentalidade esquerdista no caso: “É incrível como algumas pessoas acham que nós não podemos pagar médicos, hospitais e medicamentos, mas pensam que nós podemos pagar por médicos, hospitais, medicamentos e toda a burocracia governamental para administrar isso”. Se a saúde já é cara, espere até ela ficar “gratuita”! 

Para fechar esta rodada de notícias de sexta-feira, nada como comparar FHC e Lula. FHC disse que vota em Serra, mas não faz campanha. Ele argumentou que pedir votos é um papel “indevido” a um ex-mandatário. E ainda alfinetou Lula: “Eu não sei morder canela. Não acho que seja apropriado ao ser humano”. Já Lula foi multado por fazer campanha antecipada para Fernando Haddad. Que abismo que separa a postura de FHC da de Lula!Por: Rodrigo Constantino

quinta-feira, 28 de junho de 2012

USO DE AGROTÓXICOS SEGUE DESCONTROLADO

As políticas públicas de fiscalização do comércio e uso consciente de agrotóxicos não estão atingindo o resultado desejado na agricultura brasileira. Apesar dos programas federal e estaduais para o controle do produto nas lavouras, o Brasil é o maior mercado de agrotóxicos do mundo. De acordo com informações da Associação Nacional de Defesa de Vegetal (Andef), que representa os fabricantes, o setor movimentou US$ 8,4 bilhões em 2011, crescimento de 16,3% em relação a 2010 – US$ 7,3 bilhões. O fator preocupante é que parte do comércio é inadequado e indiscriminado. Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), os índices de monitoramento do uso do agroquímico no país se mantiveram constante nos últimos anos. Cerca de 30% dos alimentos analisados apresentam indicações de que o produto foi utilizado fora das normas da bula. Além disso, em média, cinco mil pessoas apresentam intoxicação anualmente. Resultados que provam que as políticas públicas não estão atingindo os resultados desejados. Referência Paraná exporta software que controla emissão de receitas O Paraná, um dos estados que mais utiliza o produto, é exemplo nacional no controle na comercialização de agrotóxicos. O Sistema de Monitoramente do Controle e Uso de Agrotóxicos (Siagro) está sendo “exportado”, de forma gratuíta, para outros estados como Rondônia, Brasília e Ceará. O Mapa paga os custos de viagem, hospedagem e alimentação dos técnicos . “O software do Paraná é um exemplo e está sendo levado para outras partes do país”, afirma Luis Eduardo Pacifici Rangel, coordenador geral de agrotóxicos do Ministério. Implantado em janeiro de 2010, o programa permite que os fiscais da Seab façam o rastreamento do uso do produto nas 370 mil propriedades rurais do estado. “Se um produtor comprar agrotóxico para a soja fora da época saberemos e vamos mandar o fiscal para verificar se ele não vai usar o produto no alface”, adverte o fiscal João Miguel Tosato, da Seab. “As coisas não mudaram muito nos últimos anos. Durante o monitoramento, nós encontramos agrotóxicos não autorizados e acima da média nos alimentos”, lamenta Luis Eduardo Pacifici Rangel, coordenador geral de agrotóxicos do Mapa. “Estamos construindo novos programas com participação dos estados para punir o agricultor que utilizar de forma incorreta.” O coordenador aponta a enorme quantidade de propriedades rurais no país – oito milhões - como um dos principais desafios da fiscalização. “Nós não temos pessoal suficiente. Então, contamos com o processo de denúncia da sociedade”, aponta. Para o fiscal do Departa­men­­­to de Fiscalização Sa­­nitária (Defis) da Secretaria da Agricultura e do Abas­­tecimento (Seab) do Paraná João Miguel Tosato existe a necessidade imediata da padronização do sistema de fiscalização. Atualmente, cada um dos 27 estados tem uma forma distinta de realizar o controle da venda e uso do produto. “A discrepância é muito grande e os estados estão em descompasso”, diz o fiscal. Uso familiar 
 Apesar do grande número de propriedades rurais no Brasil, o problema do uso indevido dos agrotóxicos está concentrado nas pequenas lavouras, principalmente as familiares. De acordo com o coordenador do Mapa, os grandes agricultores, que consomem 80% do produto colocado no mercado, fazem de forma correta e consciente, até porque contam com a assessoria de profissionais e técnicos capacitados. “Cerca de 20% do mercado [pequenas propriedades] causam 70% do problema”, aponta Rangel.Por: CARLOS GUIMARÃES FILHO

quarta-feira, 27 de junho de 2012

CETICISMO SAUDÁVEL

Rótulos como “direita” e “esquerda” são sempre limitados e perigosos. Não é possível enquadrar todo o arcabouço de idéias políticas, sociais e econômicas em um único termo. Feita esta ressalva, há uma direita que eu considero digna de todo meu apreço e respeito. Ela está (muito bem) representada por pensadores como João Pereira Coutinho, Luiz Felipe Pondé e Denis Rosenfield.
Por isso recomendo a leitura do novo livro que os três lançaram em conjunto, explicando em curtos ensaios porque viraram à direita. A marca característica desta direita seria o ceticismo diante de toda utopia racionalista, de todo projeto revolucionário que oferece “um mundo melhor”, um sistema “justo” e acabado. Ser conservador, para eles, significa adotar postura cautelosa frente a esta arrogância.
Rousseau seria o pai do totalitarismo moderno de esquerda, ao adotar postura canalha e sentimentalista que falsifica a realidade. Incapaz de amar o próximo, incluindo seus filhos que foram abandonados, Rousseau se declarou um amante da Humanidade, abstração que não nos obriga a encarar as imperfeições e desencontros em qualquer relacionamento com outro ser humano de carne e osso. Com base nesta farsa, Rousseau passou a pregar um estado totalitário, retirando a responsabilidade dos indivíduos.
Coutinho lembra que há direitas e direitas, ou seja, uma ala da dita direita pretende igualmente desqualificar o presente imperfeito em prol de um passado idealizado. Conservador, para ele, não pode ser o mesmo que reacionário. Se este quer fugir da realidade, aquele aceita o mundo como ele é, de forma realista frente a toda complexidade que o define. Mentalidades radicais, de direita ou esquerda, preferem modelos simplistas e dogmáticos como rota de fuga.
A linhagem de céticos vem de longa data, com pensadores como Edmund Burke, David Hume, Michael Oakeshott, Isaiah Berlin, entre outros. O principal alerta deles seria contra modelos que pretendem redesenhar o mundo de uma hora para outra. Normalmente paridos em torres de marfim acadêmicas, tais modelos ignoram toda a complexidade da realidade, mascaram a natureza humana e depositam fé onipotente na razão.
Já os conservadores preferiam o caminho da cautela, do respeito às tradições sobreviventes por tentativa e erro em um processo muito maior do que cada um de nós pode compreender com sua limitada inteligência. Criticar os hábitos e costumes dos antigos que chegaram até nós, sim, mas com humildade, com ímpeto reformista e não revolucionário.
A vida em sociedade pressupõe limites, um convívio civilizado com pessoas que possuem valores diferentes dos nossos, muitas vezes incomensuráveis. Há que se ter o cuidado de não cair no extremo oposto, qual seja, o relativismo moral e cultural exacerbado, incapaz de julgar com qualquer objetividade os costumes de um povo. A esquerda que faz vista grossa aos atos bárbaros de regimes totalitários islâmicos cai nesta armadilha, por exemplo.
Mas adotar postura de tolerância diante da pluralidade de valores, eis uma bandeira conservadora respeitável. O ser humano é frágil perante um mundo muitas vezes sem sentido, e esta visão trágica da vida, presente em Pondé, por exemplo, faz com que devamos ficar alertas contra utopias que nada mais são do que máscaras para nossa vaidade e nosso orgulho.
Denis Rosenfield resgata sua experiência com o PT em Porto Alegre, para nos lembrar como estes impulsos totalitários podem vir embalados por nomes nobres e mentirosos. Quando o estado se torna o ente que vai realizar a busca desta perfeição terrena, o indivíduo sempre acaba sacrificado no altar da causa impossível.
O livrinho, que tem 110 páginas apenas, merece ser lido por todos. O investimento de alguns minutos será altamente recompensado.Por: Rodrigo Constantino

GUERRA CIBERNÉTICA E ROBÔS DE DEFESA

Os avanços tecnológicos vêm colocando enormes desafios para a paz e a segurança internacional. Quando Clausewitz, há quase 200 anos, fez a observação de que a guerra é a continuação da política por outros meios, não poderia imaginar que ela seria hoje tão atual. Estamos vivendo um período em que a guerra começa a operar por outros meios, não o convencional, como entendido até aqui, mas por instrumentos eletrônicos cada dia mais sofisticados. A guerra cibernética com objetivos militares ofensivos, com vírus nos computadores iranianos e a utilização de veículos aéreos não tripulados (Vants ou “drones”) na eliminação de líderes da Al-Qaeda, desafia as normas internacionais vigentes e coloca questões morais e políticas que deverão ser enfrentadas pela comunidade internacional. Os EUA e Israel, por meios cada vez mais sofisticados, atacaram os sistemas de computadores que administram as instalações iranianas de enriquecimento de urânio, ampliando significativamente o primeiro uso contínuo de armas cibernéticas. No contexto de uma operação denominada Jogos Olímpicos, um vírus, Stuxnet, desenvolvido nos EUA e em Israel, atacou as instalações em Natanz e depois desativou temporariamente quase mil das 5 mil centrífugas usadas pelo Irã para a purificação do urânio. Outra arma cibernética, o vírus Flame, teria atacado computadores de funcionários do governo iraniano, subtraindo informações estratégicas. Pouco mencionadas são as ações cibernéticas da China contra os EUA, e vice-versa. Os serviços de inteligência norte-americanos identificaram 20 grupos associados ao Exército e às universidades chinesas responsáveis pelos ataques ao Google, à RSA e a outros alvos americanos. Além dessa espionagem industrial, foram registradas invasões na rede de geração e transmissão de energia e em outras áreas de infraestrutura. Os EUA foram os primeiros a criar um Comando para a cibernética, o que, segundo os chineses, contribuiu para a militarização do sistema. A Agência de Segurança Nacional americana transfere informação reservada para mais de 20 empresas de defesa, para que sejam desenvolvidas formas ofensivas e defensivas para o resguardo dos interesses nacionais de Washington. EUA e China, no contexto do Diálogo Estratégico e Econômico e de contatos militares regulares, começaram em 2011 a discutir formas para impedir a escalada dos ataques cibernéticos e meios para a rápida comunicação entre suas capitais. EUA e Rússia mantêm esses contatos há algum tempo e estabeleceram uma linha vermelha para evitar incidentes graves, o que talvez possa se repetir com a China. Contatos regulares com Israel e com os países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) estão se intensificando. A utilização de arma cibernética tenderá a se acentuar, podendo causar enormes problemas para a população civil, caso energia, transporte e comunicações venham a ser afetados pela ação antagônica entre governos. A utilização de arma cibernética tenderá a se acentuar, podendo causar enormes problemas para a população civil Os robôs militares operam, atualmente, no mar, na terra e no ar. Os países que desenvolvem robôs para fins de defesa estão se equipando com todo tipo de forças de combate e serviços de inteligência cuja capacidade operacional está aumentando continuamente. As regras de conduta militar no teatro de operações determinam que a decisão do disparo de uma arma deve ser humana. Essa restrição começa a ser questionada com a multiplicação do uso militar dos robôs, porque já existe a possibilidade de os Vants de inteligência artificial aperfeiçoada, por exemplo, tomarem decisões letais de combate autônomas, baseadas nas informações de que dispõem. À medida que a tecnologia se desenvolve e permite maior autonomia dos robôs, a ideia de máquinas controladas a distância por computadores tomando decisões que põem o mundo diante questões morais é cada vez mais real e representa um grande desafio para a comunidade internacional. Essa questão desperta o debate sobre o que foi chamado pela revista “The Economist” de “a moral e a máquina”. A capacidade dos robôs de decidir entre o certo e o errado coloca dilemas como, por exemplo, o de aceitar ou não que um Vant deva disparar um míssil para eliminar um militante terrorista escondido em local onde se encontram também civis. Além do problema moral, o uso regular dos robôs está também desafiando as regras internacionais estabelecidas pelas Nações Unidas e o princípio da soberania dos Estados. Uma alta funcionária da ONU, recentemente, levantou sérias dúvidas sobre a legitimidade dos Vants perante a lei internacional e a violação dos direitos humanos, em vista dos assassinatos e ferimentos infringidos a civis indiscriminadamente. O secretário de Defesa dos EUA, em visita recente à Índia e ao Afeganistão, não se cansou de repetir que, apesar das reclamações do Paquistão pela violação do seu espaço aéreo, as operações com os Vants vão continuar a eliminar suspeitos de terrorismo em nome da defesa dos interesses dos EUA. A guerra ao terrorismo, iniciada por George W. Bush e continuada por Barack Obama, está, na prática, restrita hoje aos ataques dos Vants, que, segundo os últimos números, eliminaram 269 militantes no Paquistão e 38 no Iêmen, todos alegadamente da alta hierarquia da Al-Qaeda, com danos colaterais – um eufemismo para mortes não desprezíveis na população civil. E consta que Obama toma pessoalmente para si a última decisão sobre os membros da Al-Qaeda que devem ser eliminados. A comunidade internacional vai ter de responder ao desafio dessas questões morais, políticas e de soberania introduzidas pela utilização dos robôs e das armas cibernéticas de defesa ou de ataque. O Brasil não deveria ficar ausente do debate. Cabe participar das iniciativas que já surgiram para enfrentar o problema, como o Comitê Internacional para o Controle de Armas Robóticas, criado nos EUA. Por: Rubens Barbosa Fonte: O Estado de S. Paulo, 26/06/2012