quinta-feira, 12 de julho de 2012

O PRECIPÍCIO FISCAL AMERICANO


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A mídia americana está atualmente fixada com uma característica aparentemente nova da economia dos EUA: um "precipício fiscal" no qual os EUA irão cair em janeiro de 2013.  Ela vê um perigo surgindo da simultânea implementação dos US$2 trilhões em cortes automáticos de gastos (os quais ocorrerão ao longo de 10 anos) — acordados na votação da elevação do teto da dívida do ano passado — e a expiração dos cortes de impostos feitos durante o primeiro governo Bush.  Os economistas que a maioria dos jornalistas entrevista alertam que o impacto conjunto de redução nos gastos do governo e aumento dos impostos irá desacelerar a "recuperação" e talvez jogar a economia americana de volta para a recessão.  Embora de fato haja muito com o que se preocupar na economia americana, este precipício em particular não deve figurar no topo da lista.
Grande parte do medo advém da falsa premissa de que gastos governamentais geram crescimento econômico.  As pessoas tendem a esquecer que o governo só pode adquirir dinheiro por meio da tributação, do endividamento ou da simples impressão da moeda.  Absolutamente nada que o governo gasta vem de graça, de modo a não prejudicar ninguém e beneficiar a todos.  O dinheiro que é tributado ou tomado via empréstimo é retirado do setor privado, onde ele poderia ter sido utilizado mais produtivamente.  Já o dinheiro que é criado do nada pelo Banco Central serve apenas para criar inflação de preços e ciclos econômicos.  Sendo assim, os cortes automáticos de gastos, caso eles realmente sejam implementados (o que é duvidoso), tendem a estimular o crescimento econômico, e não a impedi-lo.  Mesmo vários economistas mais liberais tendem a aceitar o boato de que gastos governamentais podem ajudar a economia em geral.  Cortes de gastos afetam apenas aqueles setores que cresceram acostumados a estes subsídios e que irão corretamente encolher quando a mordomia for cortada.
O único motivo de existir este mecanismo de corte automático de gastos é o fato de o Congresso americano não ter tido a capacidade de identificar e implantar cortes específicos.  Mas tenha a certeza de que o Congresso irá inventar outra saída de emergência tão logo se descubra novamente emparedado.  Acabar com os cortes de gastos antes de eles sequer serem implementados tornará risível qualquer plano subsequente de redução do déficit.  Mas políticos sempre irão preferir a frustração da inação à fúria de seus eleitores, os quais podem ser afetados em decorrência de decisões reais.  De qualquer forma, apenas uma fatia extremamente pequena dos cortes está agendada para 2013.  E se o Congresso americano se mostrar incapaz até mesmo de cumprir sua promessa de corte ínfimo de gastos para apenas um ano, como é que ainda existirá gente capaz de acreditar que o Congresso cortará gastos durante dez anos?
Já o impacto do fim dos cortes de impostos da era Bush é bem mais difícil de estimar.  Os efeitos adversos de um aumento de impostos poderiam ser contrabalançados pelos benefícios da redução dos empréstimos tomados pelo governo (desde que os impostos de fato resultassem em um aumento da receita).  Porém, considerando-se os incentivos negativos criados por um aumento das alíquotas do imposto de renda, particularmente no que concerne ao seu impacto na poupança e no investimento, um aumento de impostos pode na realidade resultar em menos receita, desta forma ampliando o déficit orçamentário.
A realidade é que a economia americana passará por caminhos extremamente tortuosos e perigosos independentemente de qual seja a decisão do Congresso.  O verdadeiro "precipício fiscal" está nos encargos da dívida que os EUA terão enfrentar quando os juros subirem.  E, infelizmente, ninguém está falando sobre isso.
A atual dívida pública dos EUA é de aproximadamente US$16 trilhões (e este valor diz respeito apenas à fatia do orçamento que possui receita específica.  Quando se considera todo o passivo para o qual não há receita específica, como os programas assistencialistas Medicare e Medicaid, o passivo pode chegar a estratosféricos US$144 trilhões já em 2015).  Os EUA ainda estão conseguindo pagar o serviço desta espantosa dívida simplesmente porque as taxas de juros sobre os títulos da dívida do governo estão em níveis historicamente baixos (hoje abaixo dos 2%).  Tal nível de juros faz com que o atual serviço da dívida seja de "apenas" US$300 bilhões por ano, um valor relativamente controlável.
Caso mantenha sua atual trajetória, a dívida pública dos EUA provavelmente chegará a US$20 trilhões em alguns anos.  Se, quando isto ocorrer, as taxas de juros voltarem a apresentar algum semblante de normalidade — por exemplo, uma taxa de 5%, que sempre foi seu valor histórico —, somente o pagamento de juros desta dívida será de US$1 trilhão por ano.  Esta quantia representa quase 40% do total de receitas do governo federal em 2012!
Além de tornar o serviço da dívida totalmente ingovernável, taxas de juros maiores irão deprimir a atividade econômica, consequentemente reduzindo as receitas tributárias do governo.  Ao mesmo tempo, juros maiores levam a maiores gastos do governo, justamente por causa do serviço da dívida.  Isto elevaria ainda mais os déficits do governo, gerando ainda mais pressão de alta nas taxas de juros.
Hipotecas mais caras e desemprego ascendente irão renovar a pressão baixista sobre os preços dos imóveis, talvez levando a mais uma grande onda de execução de hipotecas e arresto de imóveis.  Meu palpite é que apenas as perdas nas hipotecas seguradas pelo governo podem acrescentar várias centenas de bilhões de dólares aos déficits orçamentários anuais. 
Quando todos estes fatores são levados em conta, é possível enxergar déficits orçamentários anuais se aproximando rapidamente dos US$3 trilhões (atualmente o déficit é de US$1 trilhão).  Tudo isso deve estar nas estimativas caso as taxas de juros voltam ao seu patamar historicamente normal de 5%.
Se toda esta volumosa perspectiva de endividamento finalmente começar a preocupar os credores dos EUA, taxas de juros de 5% podem rapidamente subir para 10%.  A este novo valor, o custo anual dos juros sobre a dívida pública pode ser igual a toda a receita do governo.  Se isto ocorrer, o governo americano ou terá de cortar gastos generalizadamente (inclusive cortar benefícios politicamente sensíveis), elevar impostos significativamente sobre os pobres e a classe média (bem como sobre os ricos) e dar o calote em sua dívida, ou irá imprimir dinheiro e com isso subjugar toda a população ao prolongado impacto da alta inflação.  Isso, sim, é um precipício fiscal.
Ao continuar se endividando desvairadamente agora que os juros estão baixos, o governo americano está levando toda a sua economia para este precipício, ao mesmo tempo em que mantém os olhos firmemente fixados no espelho retrovisor (assim como o novo governo francês parece estar fazendo).  Por anos, alertei que uma crise financeira seria desencadeada pelo estouro da bolha imobiliária.  Meus alertas foram rotineiramente ignorados e ridicularizados, pois a mídia se apegava à suposição quase universal de que preços de imóveis jamais caem.  Meus alertas sobre o real precipício fiscal também estão sendo ignorados por causa de uma similarmente falsa premissa de que as taxas de juros jamais podem voltem subir.  No entanto, se a história pode nos servir de guia, deveríamos olhar o atual período de taxas de juros extremamente baixas como sendo a exceção, e não a regra.

é o presidente da Euro Pacific Capital e autor dos livros The Little Book of Bull Moves in Bear MarketsCrash Proof: How to Profit from the Coming Economic Collapse e How an Economy Grows and Why It Crashes.  Ficou famoso por ter previsto com grande acurácia o atual cataclisma econômico.  Veja o vídeo.  Veja também sua palestra definitiva sobre a crise americana -- com legendas em português 
Tradução de Leandro Roque

LEÃO ABOCANHA R$ 800 BI MAIS CEDO



Rogério Amato, da ACSP e da Facesp: a tendência é que no último dia do ano alcancemos R$ 1,6 trilhão em tributos./ Paulo Pampolin-Hype

A arrecadação tributária registrada pelo Impostômetro atinge, hoje, por volta das 13 horas, a marca de R$ 800 bilhões. O volume de dinheiro representa o total de tributos pagos pelos brasileiros aos governos federal, estaduais e municipais, desde o início de 2012. O montante foi alcançado 11 dias antes em relação ao ano passado. Isso acontece em um momento de economia considerada fraca.
O Impostômetro estima a arrecadação em tempo real. O painel está instalado na fachada da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) desde abril de 2005. As medições feitas por ele também podem ser acompanhadas pela internet, por meio do site www.impostometro.com.br.  
Para Rogério Amato, presidente da ACSP e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp), o volume de impostos arrecadados é incompatível com o retorno proporcionado pelo poder público. "A tendência é que no último dia de 2012 alcancemos R$ 1,6 trilhão, um valor elevado demais para um País que ainda precisa melhorar muito a qualidade dos serviços públicos", diz Amato.
Em 2005, ano em que o Impostômetro foi lançado, no dia 11 de julho o painel apontava a arrecadação de R$ 380 bilhões. Isso mostra que em sete anos a arrecadação tributária cresceu 210%. Além disso, caso o valor de R$ 1,6 trilhão realmente seja alcançado no final do ano, ele será R$ 100 bilhões maior do que o registrado ao longo do ano passado.
Vale destacar que o contribuinte brasileiro trabalhou do início do ano até o final do mês de maio unicamente para pagar impostos. Foram exatamente 150 dias para matar a fome do Leão. O cálculo é do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT). O contribuinte brasileiro é um dos que mais trabalha para encher os caixas dos governos. Na França, por exemplo, se trabalha 149 dias. Nos Estados Unidos, 102 dias, na Argentina, 92 dias.
De todo o rendimento, o brasileiro destinou, na média, 40,98% em 2012 para pagar os tributos. Esse percentual é resultado da elevada carga tributária do País, que está em 36,02% do Produto Interno Bruto (PIB), sendo que, nos últimos dez anos, ela avançou 5,9 pontos percentuais.
Além de elevada, a tributação onera em especial o consumo. Há uma série de tributos embutidos no preço dos produtos e serviços, como o Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto sobre Serviços (ISS). Há ainda os tributos incidentes sobre o patrimônio, como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU).
O brasileiro pode ter uma posição mais ativa e crítica com relação à carga tributária do País. No hotsite www.horadeagir.com.br, o contribuinte pode tornar pública sua opinião a respeito do tema.
É uma forma também de pressionar os deputados federais – com o envio de mensagens por meio de um link – para que coloquem em votação e aprovem o Projeto de Lei nº 1.472/2007, que determina que o valor dos tributos seja discriminado nas notas ou cupons fiscais.

ENGASGOU



O tombo inesperado do consumo nacional em maio, conjugado com a forte expansão do calote, parece mostrar que a atual estratégia de política econômica do governo, baseada no estímulo ao consumo, está fracassando. O problema é que a opção é puxar pelo investimento, algo que o governo não vem conseguindo fazer.
O consumo em maio caiu 0,8% em relação a abril, um mês carregado de feriados e, portanto, em princípio, comercialmente mais fraco.
Ainda é cedo para concluir que esse desempenho ruim aponta para uma tendência firme de desempenho também medíocre no segmento que até agora vinha bem.
No entanto, esse recuo vem acompanhado de prolongada estagnação da indústria. E, agora se sabe, o indicador da Serasa Experian indica uma alta na inadimplência de nada menos que 19,1% no primeiro semestre deste ano em relação ao primeiro semestre do ano passado.
Na média, analisa a Serasa, "cada inadimplente carrega quatro dívidas não honradas e 60% dos inadimplentes têm dívidas acima de 100% da renda".
Essas agravantes sugerem que a expansão do crédito, instrumento fortemente acionado pelo governo para empurrar o consumo nessa conjuntura de crise global, esbarra em pronunciadas limitações técnicas. O governo Dilma já se deu conta de que os nove pacotes anticíclicos, destinados a estimular as vendas, não vêm reativando a produção e podem já não ter capacidade para puxar a demanda. Por isso, entendeu que devesse atuar na ponta dos investimentos. A Petrobrás está sendo cobrada para tocar mais agressivamente seu programa de negócios e o próprio governo, informa a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, se prepara para acionar os investimentos.
O problema é que esta administração vem dando demonstrações seguidas de deficiência gerencial. Como o jornalista Rolf Kuntz mostrou na sua coluna de ontem no Estado, os desembolsos do Tesouro no primeiro semestre deste ano corresponderam a apenas 21% do total previsto no Orçamento.
O PAC continua empacado, excessivamente concentrado em programas habitacionais. E a Petrobrás, de quem se esperam investimentos de US$ 236,5 bilhões nos próximos quatro anos, reconhecidamente vem se apresentando como contumaz furadora de cronogramas. Afora isso, o governo vem sendo incapaz de dar agilidade à concessão de licenciamentos ambientais.
Esses e tantos outros indicadores mostram que sobram dúvidas sobre a eficiência de uma provável mudança de ênfase nas políticas de estímulo, do consumo para o investimento.
O biólogo francês do século 19 Jean Lamarck se notabilizou por enunciar a tese evolucionista segundo a qual "a necessidade cria o órgão".
Pois o governo Dilma enfrenta inadiável necessidade de mostrar serviço na área econômica e ainda tem tempo de virar o jogo adverso.
Quem sabe essa cobrança possa ajudar a mudar a direção e, sobretudo, a qualidade de sua administração. Por: Celso Ming - O Estado de S.Paulo

OBAMA E O BRASIL


A reeleição de Obama é boa para o Brasil? Alex Ribeiro

Valor Econômico - 11/07/2012
 
O presidente Barack Obama é mais popular no Brasil do que nos Estados Unidos. Uma pesquisa de opinião recente do Pew Research Center, um centro de estudos de Washington, mostra que 72% dos brasileiros torcem para que Obama ganhe um segundo mandato nas eleições de novembro, enquanto 16% acham melhor que seja outro. Os americanos estão bem divididos, em virtude sobretudo da crise econômica que afeta o país. Ontem, o jornal "The Washington Post" publicou pesquisa que dá empate com 47% das intenções de voto para Obama e para o seu virtual oponente republicano, o ex-governador de Massachusetts Mitt Romney.

E para a economia brasileira, quem é o melhor candidato? Os lobistas que defendem interesses de empresas brasileiras em Washington têm uma queda por Romney. Os republicanos são, em geral, mais favoráveis à abertura da economia, enquanto os democratas costumam ser mais protecionistas. Os acordos de livre comércio dos Estados Unidos com Coreia do Sul, Colômbia e Panamá, por exemplo, demoraram a ser aprovados, devido à resistência de parlamentares democratas com fortes ligações com sindicatos. Romney critica Obama por não ter se esforçado mais para abrir a economia.

Muito da agenda comercial americana é determinada pelos interesses paroquiais, como o dos produtores de algodão do Sul ou de milho no Meio-Oeste, que não têm fronteiras partidárias. Mas os lobistas veem maior disposição para negociar temas econômicos de mútuo interesse na Camara, dominada pelos republicanos, do que no Senado, cujo controle é dos democratas.

Conservadorismo fiscal pode acirrar a "guerra de moedas"

Sem a onda conservadora que tomou o Partido Republicano, que defende um forte ajuste fiscal, teria sido mais difícil extinguir as barreiras contra as exportações brasileiras de álcool combustível. Muitos desses radicais republicanos, agora, pressionam para derrubar de forma definitiva os subsídios concedidos aos produtores americanos de algodão, que foram alvo de uma reclamação brasileira na Organização Mundial do Comércio (OMC).

O Brasil, em tese, pode também se beneficiar da linha mais dura que Romney pretende adotar contra a China. Fontes do Tesouro americano sempre lembram que Brasil e Estados Unidos têm interesses comuns nessa área, pois sofrem um processo semelhante de desindustrialização causado pelas exportações chinesas.

O candidato republicano diz que, no primeiro dia no cargo, irá declarar que a China manipula a sua moeda, abrindo o caminho para a adoção de retaliações comerciais. Pode ser que não dê certo. Medidas desse tipo podem ser questionadas na OMC, e há o risco de a China desencadear uma guerra comercial. Obama tem preferido a negociação. A estratégia linha-dura, porém, funcionou contra o Japão e a Alemanha da década de 1980, que só sentaram para negociar depois que o Congresso americano aprovou uma lei que permitia taxar as exportações de países com moeda subvalorizada. No fim, o chamado Acordo de Plaza levou à desvalorização do iene e do marco alemão.

O problema com Romney é a sua política macroeconômica, que poderá ter efeitos negativos no mundo todo. Seu programa de governo prevê um forte ajuste fiscal no ano que vem, numa estratégia que ele chama de "corte, limite e equilibre". O propósito é fazer um forte corte de gastos para recolocar a dívida pública numa trajetória sustentável, limitar os gastos a 20% do Produto Interno Bruto (PIB) e aprovar uma emenda constitucional que obrigue o governo a zerar o déficit público. Para gastar mais do que arrecada, só em caso de guerra, nunca para estimular a economia.

Todas alas políticas concordam que é preciso controlar a crescente dívida pública, que chegou a 103% do PIB em 2011, com viés de alta. Obama tem pregado uma estratégia mais gradual de ajuste fiscal, reduzindo o déficit de 9% do PIB em 2011 para 8,5% do PIB em 2012 e 5,5% do PIB em 2013. Mesmo assim, sua estratégia fiscal recebeu ressalvas do Fundo Monetário Internacional (FMI), que preferia algo ainda mais suave.

O FMI prevê que, neste ano, o ajuste fiscal ficará um ponto percentual do PIB mais forte do que o anunciado por Obama, fazendo o déficit público cair a 7,5% do PIB em 2011. O organismo quer que Obama vá mais devagar, fixando uma meta de 6,25% do PIB para 2013, em vez de 5,5% do PIB.

Para o Brasil, a política fiscal americana é a peça mais importante da chamada "guerra cambial". Contração fiscal nos Estados Unidos, por definição, contribui para a depreciação do dólar ante outras moedas do mundo - e o real brasileiro é uma das que mais sofrem. Já está ruim com Obama, e promete ficar pior se Romney for reeleito. A falta de ação fiscal também sobrecarrega o Federal Reserve (Fed, o banco central americano), obrigando-o a promover mais expansões monetárias. Ruim de novo para a moeda brasileira.

Apesar do empate nas pesquisas, Obama ainda é considerado favorito para vencer as eleições. Os Estados Unidos têm um sistema eleitoral bizarro, em que nem sempre os votos de cada cidadão têm o mesmo peso. Obama lidera nos Estados considerados cruciais para vencer a eleição. O cenário mais provável, porém, é que ele não faça a maioria no Congresso. Os republicanos devem continuar com o controle da Câmara e têm boas chances de fazer a maioria simples no Senado.

Do ponto de vista prático, isso significa um alto grau de polarização nas decisões políticas. Há algumas decisões importantes que os Estados Unidos devem tomar entre o fim deste ano e começo do próximo. Sem ação, em janeiro entram em vigor US$ 4 trilhões em cortes de gastos e aumentos de impostos, conhecidos como "abismo fiscal".

Pelos cálculos do FMI, se essa armadilha não for desarmada, a economia americana irá crescer menos do que 1% no próximo ano. O organismo alertou que outros países do mundo podem ser atingidos, sem dizer exatamente como. É bem provável que uma contração fiscal dessa magnitude leve a novas rodadas de desvalorização do dólar.

Alex Ribeiro é correspondente em Washington

A CUT TENTA INTIMIDAR O STF


A CUT tenta intimidar o STF - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADÃO - 11/07

Não engana a ninguém o recuo do presidente da Central Única dos Trabalhadores ( CUT ) , Vagner Freitas , prestes a ser empossado , da sua estrepitosa ameaça ao Supremo Tribunal Federal ( STF ) , a propósito do mensalão. " Não pode ser um julgamento político. Se isso ocorrer , nós questionaremos , iremos para as ruas ", afirmou , segundo a Folha de S. Paulo de segunda - feira. Estampado o desafio e de certo repreendido por algum grão - mensaleiro , alertado por sua vez pelos seus advogados , Freitas deu uma aparente guinada. " Não temos dúvida nenhuma de que teremos um julgamento técnico " , entoou , magnânimo , aproveitando para cobrir o Supremo de elogios. " Era isso o que eu gostaria de ter dito. "
Faltou combinar com o ainda titular da central , Artur Henrique Santos. Em discurso no 11.º congresso da entidade que ele chamou , sem corar , de " independente e autônoma " - mas no qual as estrelas da festa eram os réus " companheiros " José Dirceu , o ex-ministro de Lula , e Delúbio Soares , o ex - tesoureiro do PT , além do candidato petista à Prefeitura paulistana , Fernando Haddad - , Henrique fez um paralelo entre a denúncia do mensalão e o afastamento do presidente paraguaio Fernando Lugo. Fiel à versão de Lula para o escândalo , devidamente adotada pelo PT , o sindicalista disse que o impeachment de Lugo " foi o que tentaram fazer neste país em 2005 " , com a revelação , a seu ver fabricada , do esquema da compra de votos de deputados em benefício do governo petista.
Até aí , nada de mais. Faz tempo que jaz em camadas profundas o perdão que Lula pediu aos brasileiros , no momento de fraqueza em que também se declarou traído. O ponto é que , enquanto o bancário Vagner Freitas fingia abafar o repto ao STF , o eletricitário Artur Henrique o inchava. Fazendo praça do fato sabido de que a CUT toma partido na política , embora , como as congêneres , seja subsidiada pelo imposto sindical - todas poupadas por Lula de prestar contas dos milhões embolsados - , Henrique avisou que a organização sairá às ruas " para impedir o retrocesso e a volta da direita ". Ele se referia às próximas eleições municipais , mas não seria necessário ostentar a credencial de " petista histórico ", como diz a companheirada , para entender que o objeto oculto da falação era o Supremo.
O silogismo é elementar : se o desvendamento do mensalão foi uma tentativa de golpe, o mesmo vale para as suas consequências : a peça do procurador - geral da República, acolhida pela Corte , expondo , um a um , os membros da " sofisticada organização criminosa " responsável pela lambança , e as eventuais condenações dos réus petistas , a começar do expresidente da sigla José Dirceu. Veredictos " técnicos " , como disse Freitas na sua falsa retratação , serão os que absolverem os mensaleiros. Sentenças condenatórias serão necessariamente políticas , golpistas - merecedoras , antes até que se consumam , da justa ira do " povo trabalhador " , como Lula gosta de dizer.
Mas de que " golpe " se trata ? Excluída , por insana , a derrubada da presidente Dilma Rousseff , será a possível eleição do tucano José Serra em São Paulo ? Ou a reeleição do aecista Márcio Lacerda em Belo Horizonte ? Assim como os terrores de que padecem os paranoicos , a teoria conspiratória cutista tem um fundo de verdade.
Perdas eleitorais importantes para o PT este ano - que a sigla tratará de atribuir ao julgamento no STF - poderiam ter efeitos adversos para a reeleição de Dilma , apesar dos seus estelares índices de popularidade. O destino pessoal da presidente por quem a CUT morre cada vez menos de amores é , em si , secundário. O desejo cutista que não ousa dizer o nome é a candidatura Lula já em 2014. Nada deve pôr em risco a perpetuação no poder da sigla de que emana.
A soberba, como se sabe , cega. A truculência também. Imaginam os dirigentes da CUT que o Supremo se deixará intimidar por seus arreganhos ? Ou que a organização tem meios de criar no País um clima de convulsão capaz de " melar " o julgamento que tanto temem ? Em outras palavras , por quem se tomam ? Mas , no seu primarismo, as investidas do pelegato petista servem para lembrar à opinião pública a medida do seu entranhado autoritarismo e de sua aversão à democracia.


GOOGLE EM CAMPANHA CONTRA HOMOFOBIA


A mega-empresa de busca Google, famosa por apoiar o homossexualismo e o “casamento” de mesmo sexo, anunciou uma nova campanha no final de semana cujo foco será forçar sua ideologia homossexual em países que o Google descreve como “homofóbicos”.
Mark Palmer-Edgecumbe, diretor de diversidade do Google, fez o anúncio oficial durante a Cúpula Mundial do Ambiente de Trabalho LGBT em Londres em 7 de julho, e indicou que a iniciativa seria chamada de “Legalizem o Amor”.
“A iniciativa ‘Legalizem o Amor’ promoverá direitos humanos e atacará a discriminação no ambiente de trabalho em países que têm leis contra o homossexualismo”, o Google disse numa declaração escrita, de acordo com a CNN.
A campanha eventualmente se expandirá para todos os países em que o Google tem um escritório, disse Palmer-Edgecumbe, mas primeiro “focará em países com cultura homofóbica, onde existem leis contrárias ao homossexualismo”.
De acordo com o site Dot429, a estratégia do Google envolve “desenvolver parcerias entre empresas e organizações para apoiar campanhas de base”.
Entre os palestrantes da Cúpula Mundial do Ambiente de Trabalho LGBT constavam Bob Amnnibale, do conglomerado financeiro internacional Citigroup, e Claire Lucas, da Agência Americana de Desenvolvimento Internacional, organização do governo dos EUA (conhecida pela sigla USAID) que louvou a campanha do Google.
Claire disse: “O que vemos é que uma parceria entre empresas e o governo dos EUA tem muito poder. O governo dos EUA está trabalhando com algumas ONGs e algumas empresas numa parceria homossexual mundial. As empresas, juntamente com o governo dos EUA, estão financiando essas ONGs no mundo inteiro”. A USAID é famosa por forçar a contracepção, o aborto legal e a esterilização nos países em desenvolvimento em seus programas de controle populacional.
Bob Amnnibale, executivo do Citigroup assumidamente homossexual, disse: “O fato de que o Google é muito virtual e tem um apelo muito amplo, principalmente entre jovens, significa que o Google poderá espalhar a campanha muito, muito rapidamente”. Outro executivo, Harry Gaskell, comentou que as empresas ricas podem forçar seu influente peso financeiro nos países pequenos.
“Se estamos tentando mudar algo, os governos podem exercer poder diplomático, as ONGs podem avançar informações e argumentos, mas as empresas têm poder econômico para avançar tudo. Com essa força, até os países mais passivos darão atenção”, ele disse na cúpula, segundo o site Dot429.
Dot429 havia declarado em sua cobertura original que a campanha “Legalizem o Amor” foi lançada pelo Google “com a intenção de inspirar países a legalizar o casamento para lésbicas, gays e bissexuais no mundo inteiro”.
Subsequentemente, o Google divulgou uma correção, dizendo que a reportagem do Dot429 não é “precisa” e que a campanha não tem como alvo específico legalizar o “casamento” gay.

Para entrar em contato com o Google nos EUA:

Eric Schmidt, Chairman of the Board and Chief Executive Officer 
Google Inc. 
1600 Amphitheatre Parkway 
Mountain View, CA 94043 
Phone: +1 650-253-0000 
Email: via website (http://www.google.com/contact/)

Mark Palmer-Edgecumbe
Head of Diversity, Talent and Inclusion at Google
Zürich, Switzerland




Tradução e adaptação: Julio Severo


BURRICE AMERICANA


                        

Tudo aquilo que no Ocidente se vendeu, se louvou e se criticou sob o nome de “anticomunismo” nunca passou da resposta fraca e tardia de vítimas atônitas a uma estratégia abrangente e de longo prazo, cujo alcance mal chegavam a vislumbrar.

Se há uma coisa óbvia, é que a narrativa predominante na mídia, no show business e nos meios intelectuais, quando não determina desde já o curso dos acontecimentos políticos, terminará por determiná-lo mais dia menos dia.

Nos EUA, há pelo menos três décadas essa narrativa reproduz ponto por ponto, sem citar a fonte nem, é claro, imitar-lhe o estilo, o discurso da propaganda anti-americana posta em circulação desde o fim da II Guerra pelo governo da URSS.
Não há acusação, não há mito depreciativo, não há estereótipo difamatório comprovadamente comunista que não tenha sido absorvido pelas grandes agências formadoras de opinião na América e repassado à população como autêntico produto made in USA, dado do senso comum ou crença espontânea das pessoas de bem. Dos episódios McCarthy, Alger Hiss e Rosenberg em diante, não houve mentira soviética que não fosse alegremente subscrita pelo establishment, só para acabar sendo desmentida por provas documentais irrefutáveis trinta ou quarenta anos depois, tarde demais para que seus efeitos políticos pudessem ser revertidos (v. Ronald Radosh, The Rosenberg File, 1997; E. Stanton Evans, Blacklisted by History, 2007; Christina Shelton, Alger Hiss: Why He Chose Treason, 2012).
Como a matéria-prima desses engodos aparece sempre remodelada em linguagem local e adaptada aos sentimentos usuais do público americano, ninguém ou quase ninguém se lembra de rastrear-lhe a origem. Quem o fizesse teria de acabar concordando com aquilo que disse Malachi Martin: que ao longo do último século só houve uma força agente no cenário internacional – a URSS. Os personagens em torno não tiveram iniciativa própria: limitaram-se a adaptar-se, às pressas e desastradamente, a situações criadas pelos diretores de cena soviéticos, cujos cálculos antecipavam suas reações e tiravam proveito delas.
Tudo aquilo que no Ocidente se vendeu, se louvou e se criticou sob o nome de “anticomunismo” nunca passou da resposta fraca e tardia de vítimas atônitas a uma estratégia abrangente e de longo prazo, cujo alcance mal chegavam a vislumbrar.
Poucas coisas ilustram a noção de “resposta passiva” tão claramente quanto a política americana de “contenção”, que pretendeu traçar limites à expansão do Império soviético, política que na época a caipirice ocidental enalteceu como um primor de genialidade estratégica e a hipocrisia comunista, mal contendo o riso, condenou como o suprassumo da intrusão imperial ianque. Tudo o que ela conseguiu fazer foi limitar a ação do próprio Ocidente, enquanto a URSS espalhava livremente seus tentáculos pela Ásia, pela África, pela America Latina e, é claro, pelas altas esferas intelectuais e midiáticas dos EUA.
Mas talvez a obra-prima da impotência patética tenha sido a insistência dos governos ocidentais na falsa esperteza de jogar contra a URSS os “anticomunistas de esquerda”. Faziam isso na alegada esperança de dividir as hostes comunistas, quando na verdade tudo o que aqueles esquerdistas democráticos propunham já estava antecipadamente integrado nos planos soviéticos para a grande farsa da “queda da URSS”, que em menos de uma década viria a transfigurar a morte aparente do movimento comunista numa ressurreição triunfal e numa sucessão de vitórias espetaculares (v. Jean-François Revel, La Grande Parade: Essai sur la Survie de l’Utopie Socialiste, 2000), aí incluída, logo depois, a eleição de um de seus mais fiéis servidores para a presidência dos EUA.
Até os mais legítimos conservadores insistem em enxergar as transformações esquerdizantes da sociedade e da política americanas como resultados de processos autóctones, da ação dos seus execrados liberals, sem querer admitir que estes últimos nunca, nunca tiveram a iniciativa intelectual desses processos, limitando-se a ecoar e repassar, na linguagem tradicional da democracia, os slogans e chavões da propaganda comunista internacional. Hipnotizada por uma espécie de patriotismo cognitivo, a nata do conservadorismo americano imagina residir no seu país a fonte criadora de tudo o que de bom e de mau acontece no mundo, e assim acaba por lançar sobre os genuínos autores do enredo um manto de invisibilidade protetora. Obsessivamente empenhados, sobretudo, em escapar à pecha de “teóricos da conspiração”, aqueles devotos guardiões do americanismo apegam-se às explicações que pareçam mais verossímeis ao público geral, isto é, precisamente aos menos qualificados para opinar em matérias tão complexas e labirínticas. Por medo de tornar-se objeto de riso dos ignorantes, rebaixam-se propositadamente ao nível da estupidez mediana, sacrificando sua inteligência num ritual de autocastração ante o altar das aparências respeitáveis.
Querem outro exemplo? Depoimentos e mais depoimentos, documentos e mais documentos comprovam que o radicalismo muçulmano não brotou espontaneamente da sociedade islâmica, da cultura islâmica, mas foi criado pelos serviços de inteligência soviéticos e é ainda alimentado e monitorado por agentes russos (leiam Ion Mihai Pacepa em http://www.nationalreview.com/articles/218533/ russian-footprints/ion-mihai-pacepa e Claire Berlinski em http://www.tabletmag.com/ jewish-news-and-politics/103576/the-cold-wars-arab-spring). Apesar disso, o governo americano continua tratando Vladimir Putin como parceiro confiabilíssimo, enquanto os intelectuais conservadores produzem toneladas de retórica piedosamente cristã para lançar a culpa do terrorismo em tradições corânicas de quatorze séculos, ajudando a ação da KGB-FSB a recobrir-se da camuflagem islâmica que, precisamente, estava nos seus planos desde o início.
 ESCRITO POR OLAVO DE CARVALHO | 11 JULHO 2012
 INTERNACIONAL - ESTADOS UNIDOS

O BUFÃO DA AMÉRICA


Entrevista: Marco Antonio Villa
O bufão da américa
Historiador diz que Hugo Chávez, presidente da
Venezuela, é perigoso por ser ambicioso e imprevisível

Duda Teixeira
Roberto Setton
"Se Lula tivesse sido presidente
na República Velha, o Acre seria
dos bolivianos e Santa Catarina,
dos argentinos"
O historiador Marco Antonio Villa já escreveu 21 livros, com temas que variam da Idade Média à Revolução Mexicana. Ao investir contra mitos da história nacional em suas obras e artigos, esse professor da Universidade Federal de São Carlos colecionou polêmicas e fez dezenas de inimigos. Sete anos atrás, tornou-se persona non grata no estado de Minas Gerais ao sustentar que Tiradentes foi um herói construído pelos republicanos. Mais tarde, causou comoção ao escrever que o presidente João Goulart, deposto pelos militares em 1964, preparava o próprio golpe de estado para obter a reeleição. "Os historiadores costumam ter receio de polêmicas, mas é com elas que se transforma a visão de mundo de uma sociedade", diz Villa, que tem 52 anos. Estudioso da diplomacia brasileira, ele vê com preocupação o sumiço da linha de diplomacia cunhada pelo barão do Rio Branco. "O barão profissionalizou o Itamaraty, que passou a atuar em busca dos interesses do país, e não de um governo ou partido." Em sua casa na Zona Norte de São Paulo, o historiador deu a seguinte entrevista a VEJA.
Veja – Como o senhor avalia a atual diplomacia brasileira?
Villa – Nossa diplomacia se esquiva de defender os interesses nacionais na América Latina. Teima sempre em chegar a um acordo e, como não consegue, acaba cedendo aos vizinhos. Se Lula tivesse sido presidente na República Velha, o Acre seria hoje dos bolivianos e Santa Catarina, dos argentinos. Por aqui se pensa que o Brasil não pode ter interesses nacionais ou econômicos na América do Sul, uma vez que estamos em busca de uma integração regional. É um equívoco. Os interesses do Brasil não são os mesmos da Argentina. Os objetivos do Paraguai não são os do Brasil. A linguagem amena, educada, usada pelos nossos diplomatas apenas tem fortalecido os caudilhos da região, como o venezuelano Hugo Chávez e o boliviano Evo Morales, que se acham com autoridade para falar ainda mais grosso e aumentar as exigências.
Veja – A diplomacia brasileira não era assim no passado?
Villa – Não. No fim do século XIX, a Argentina reivindicou o oeste do Paraná e de Santa Catarina. Não fazia o menor sentido. O presidente Prudente de Moraes, com a ajuda do barão do Rio Branco, resolveu a questão e evitou a doação da área. Não perdemos um hectare de terra. O barão sabia quais eram os interesses nacionais e os defendia. Além disso, profissionalizou o Itamaraty, que passou a coordenar uma política em nome do país, e não de um governo ou partido. Hoje, precisamos urgentemente que o barão do Rio Branco se incorpore no ministro das Relações Exteriores.
Veja – O Brasil cede sempre?
Villa – Só não o fazemos quando é impossível. Em negociações recentes com a argentina Cristina Kirchner e com Evo Morales, a Petrobras recusou-se a fornecer gás para a Argentina, que vive sob ameaça de um apagão. Se cedesse, o Brasil teria um grave desabastecimento. Nos outros casos, somos sempre fregueses. O Brasil já sofreu no passado uma invasão de produtos argentinos e ninguém reclamou. Quando a situação se inverteu e a balança comercial tornou-se superavitária para o Brasil, os argentinos chiaram e conseguiram o que queriam. Com a Bolívia, aceitamos uma indenização simbólica pelas refinarias nacionalizadas, a um valor muito aquém do que foi investido pela Petrobras. Com Hugo Chávez, falamos sempre "não" na primeira hora, depois dizemos "sim". Éramos contra o Banco do Sul. Hoje somos a favor. Fazemos o oposto do que recomendava Vladimir Lenin, para quem era preciso dar um passo atrás e depois dois para a frente. A diplomacia nacional dá um para a frente e dois para trás.
Veja – Deportar turistas espanhóis é uma resposta inteligente à repatriação de brasileiros que tentavam ir para a Espanha?
Villa – Foi um exagero. A política externa não é para ficar a cargo de um funcionário da Polícia Federal. As cenas dos espanhóis sendo deportados no aeroporto de Fortaleza são absurdas. Uma coisa é um turista que vai para Jericoacoara, outra é um brasileiro que, supostamente ou não, deseja trabalhar na Espanha. Quando faz diplomacia com a Europa, os Estados Unidos ou a Ásia, o Brasil tem sido muito agressivo. É como se o esforço para se afirmar como país, uma vez que não se realiza na América Latina, fosse todo desviado para os fóruns em outros continentes. Ser duro com um turista espanhol é fácil. Quero ver ser duro com Hugo Chávez.
Veja – Chávez é o grande líder da América Latina?
Villa – Quando se olha o que ocorre com os mais de vinte países da região, não há dúvida disso. Com a alta do preço do petróleo, Chávez construiu uma sólida rede de alianças. Foi uma sucessão de vitórias. Tem o apoio de Cuba, Nicarágua, Equador, Bolívia, Argentina. Quem está do lado do Brasil? Ninguém. Chávez é um ator que faz um monólogo. Eventualmente alguém da platéia sobe no palco e participa. O show é dele. Ele determina o que vai ser discutido e como. Os outros só correm atrás. Os países que estão se aproximando do Brasil, como Paraguai e Peru, fazem isso apenas porque não tiveram ainda um estabelecimento de relações com a Venezuela. A história talvez comece a mudar agora. Não por obra de Lula, evidentemente, e sim de Álvaro Uribe, o presidente colombiano. Graças a ele, Chávez teve sua primeira derrota em política externa. A reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA), que colocou panos quentes na discussão que se seguiu à morte do terrorista Raúl Reyes, pode sinalizar um futuro diferente.
Veja – Por que o senhor considera que Chávez perdeu?
Villa – Chávez é um caudilho e, como tal, precisa de um palanque para discursar. Quando reagiu com firmeza à morte de Raúl Reyes no Equador, ganhou um palco considerável. Só que durou pouquíssimo tempo. A solução rápida e eficaz do problema pela OEA, que estava sumida do mapa, tirou essa oportunidade dele. Chávez resignou-se porque a maioria dos países apoiou a resolução final, que condenava a invasão territorial no Equador e ao mesmo tempo acusava a presença das Farc naquele país. Uribe, ao pautar as negociações que esfriaram o conflito, mostrou que é possível dar um basta a Chávez. Sua atitude terá um impacto pedagógico até mesmo dentro da Venezuela, onde o povo tem aceitado as precárias condições internas do país ao ver que, externamente, seu presidente só obtém vitórias. Chávez teve sua primeira grande derrota no referendo constitucional. Agora, teve a segunda derrota, dessa vez em política externa.
Veja – Por que o discurso é tão importante para um caudilho?
Villa – Um caudilho não vive sem a oratória. O programa dominical Aló Presidente é o que vitamina Chávez. Fidel Castro adora discursar por horas. O mexicano Antonio López de Santa Anna foi ditador várias vezes, afundou seu país e, ferido e pensando que ia morrer, ditou suas últimas palavras. Foram quinze páginas. No fim, sobreviveu com uma perna amputada, que sepultou com honras militares. A oratória é uma tradição latino-americana, que ocorre paralelamente à dissociação entre discurso e prática. Para esses homens e para as suas platéias, é como se as palavras, sozinhas, tivessem um poder de mudar a realidade. Pura bobagem. Não existe tal mágica. Lula também aposta nesse artifício. Acha que ao divulgar o programa do PAC pode transformar o Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, em um bairro residencial em seis meses. Para os sucessores, a herança desse tipo de comportamento é terrível.
Veja – Por que os latino-americanos possuem o vício da oratória? 
Villa – Em parte, há na América Latina uma forte tradição do bacharelismo. Muitos dos presidentes passaram por faculdades de direito. No Brasil, Getúlio Vargas e Jânio Quadros são exemplos. Epitácio Pessoa era chamado de "A Patativa do Norte", em referência a uma ave cantora. Fidel Castro foi advogado. O argentino Juan Domingo Perón não era, mas a maioria dos seus auxiliares, sim. Para um advogado, o que importa não é a legitimidade da causa, mas o nível de retórica do advogado para defender seu acusado. Somos muito marcados por isso.
Veja – Qual é o maior perigo de Chávez para o resto da América Latina? 
Villa – Ele está armando seu Exército e sua população. Compra fuzis, caças e faz acordos com o Irã. Ninguém parece levar isso a sério. A diplomacia brasileira sabe disso e vai contornando a situação. Uma hora Chávez vai invadir a Guiana. Ele reivindica quase dois terços do território desse país. Para Chávez, a Guiana é uma aventura fácil. E quem vai defendê-la? O que a Guiana conta na América do Sul? Nada.
Veja – Chávez reagiu ao ataque colombiano às Farc no Equador com um discurso em defesa da soberania nacional. Ele invadiria a Guiana?
Villa – Chávez é um bufão. Ele construiu um personagem. É um militar de boina vermelha que se emociona, chora e canta em público. Em um momento é simpático. No minuto seguinte, aparece totalmente irado. O bufão é isso. Nunca se podem prever suas atitudes. Pode abraçar um crítico ou mandá-lo para a prisão. Suas atitudes não se regem pelo mundo racional. O bufão trabalha em outro universo.
Veja – Por que Chávez defende as Farc?
Villa – Seu objetivo é enfraquecer Álvaro Uribe. Chávez vê de forma simplista a conjuntura latino-americana. O mundo para ele se divide de uma maneira muito primária: os que estão com ele e os que estão com os Estados Unidos. Considera que o presidente da Colômbia é um agente imperialista na América do Sul. O combate às Farc tem sido uma das mais fortes bandeiras de Uribe.
Veja – É legítimo usar grupos armados ou políticos de outros países para causar instabilidade?
Villa – Há uma incompatibilidade em defender a soberania e apoiar materialmente um movimento terrorista em um país vizinho. No Brasil, tivemos uma história parecida. No governo de João Goulart, as Ligas Camponesas tinham meia dúzia de campos guerrilheiros e contavam com o apoio financeiro cubano. Quando se descobriram os campos, foi um escândalo. Vivíamos um regime democrático e o governo brasileiro manifestava-se contrário à expulsão de Cuba da OEA, enquanto Cuba violava a soberania brasileira apoiando um movimento guerrilheiro que rompia com a legalidade constitucional. A defesa da soberania só valia para os cubanos. Eu imaginava que essa prática de violação da soberania fosse página virada da história latino-americana. Ledo engano.
Veja – Chávez foi o grande pacificador do conflito entre Colômbia e Equador, como disse Lula?
Villa – Não há nenhum fato que comprove isso. Os documentos que estavam no computador do guerrilheiro Raúl Reyes ainda mostram que Chávez apoiava financeiramente as Farc e também recebia ajuda dos narcoterroristas. Isso não tem nada a ver com paz. Lula não tinha por que falar isso. Diz essas asneiras porque está em um momento especial. A economia vai muito bem, o que levou Lula a entender que ganhou um salvo-conduto para reescrever a história do Brasil. Discursou homenageando Severino Cavalcanti, que renunciou quando se comprovou que ele recebia um mensalinho de 10 000 reais para deixar um restaurante funcionando na Câmara dos Deputados. Dois dias depois, defendeu sua amizade com Renan Calheiros, que teve suas contas pessoais pagas por um lobista. Quando falou de Chávez, Lula disse que ele era um ex-guerrilheiro. Lula sabe que essas coisas não são verdade. Não é ingênuo e é bem assessorado. Mas fala como se fosse um iluminado. É um líder messiânico em plena campanha eleitoral. Os professores de história devem estar arrepiados.
Veja – Qual é a importância do Foro de São Paulo na condução da política externa brasileira?
Villa – O Foro de São Paulo é um clube da terceira idade. Basta ver as fotos. São senhores em idade provecta, como se dizia antigamente. São provectos também no sentido ideológico. Suas idéias pertencem ao passado. Não creio que tenham uma estratégia revolucionária para a América Latina tal como foi a Internacional Comunista. Durante o período da União Soviética, os partidos comunistas espalhados pelo mundo eram braços da política externa soviética. O Foro de São Paulo não tem esse poder. Sua maior influência se dá pela pessoa de Marco Aurélio Garcia, assessor especial para assuntos internacionais da Presidência da República, que tem grande participação no Foro.
Veja – Qual é a relevância de Marco Aurélio Garcia nas relações externas?
Villa – Desde o início da República, não há registro de um assessor com tanto poder como ele. Garcia aparece nas fotos quase sempre atrás de Lula. Dá pronunciamentos em pé de igualdade com o ministro das Relações Exteriores ou o secretário-geral do Itamaraty. Marco Aurélio Garcia é considerado um grande acadêmico, um gênio, uma referência para qualquer estudo sobre relações internacionais na América Latina. Curioso é que não se conhece nenhuma nota de rodapé que ele tenha escrito sobre o tema. Fui procurar seu currículo na plataforma Lattes, do CNPq. Não há nada sobre ele. Marco Aurélio Garcia é o Pacheco das relações internacionais.
Veja – Quem é o Pacheco?
Villa – É um personagem de Eça de Queiroz que aparece no livro A Correspondência de Fradique Mendes. Pacheco era um sujeito tido como brilhante. No primeiro ano de Coimbra, as pessoas achavam estranho um estudante andar pela universidade carregando grossos volumes. No segundo ano, ele começou a ficar mais calvo e se sentava na primeira carteira. Começaram a achar que ele era muito inteligente, porque fazia uma cara muito pensativa durante as aulas e, vez por outra, folheava os tais volumes. No quarto ano, Portugal todo já sabia que havia um grande talento em Coimbra. Era o Pacheco. Virou deputado, ministro e primeiro-ministro. Quando morreu, a pátria toda chorou. Os jornalistas foram estudar sua biografia e viram que ele não tinha feito nada. Era uma fraude.
Veja – Que conseqüências a política externa do Brasil pode ter no futuro?
Villa – Pela primeira vez na história do país existe a possibilidade de a política externa tornar-se tema de eleição. Seria algo realmente inédito que, para acontecer, só depende de como Chávez vai agir nos próximos anos. As concessões dadas à Bolívia, os diversos acordos com Chávez e a recusa em classificar as Farc como um grupo terrorista estão provocando muita crítica dentro do Brasil e podem juntar-se em um único e potente tema central na próxima campanha presidencial.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

PARA A FIFA, SOMOS TODOS CORRUPTOS


Para a Fifa, população da América do Sul é corrupta como seus dirigentes





Eu, você, minha avó e mesmo um recem formado cheio de sonhos ainda. Para a Fifa, não há diferença. Somos todos corruptos e equivalentes a “Teixeiras” e “Havelanges”. Hoje, o Tribunal da cidade suíça de Zug publicou seu processo contra os cartolas brasileiros. R$ 45 milhões em subornos passaram por suas contas em oito anos. Mas o que mais surpreende no documento não são os valores ou a constatação da obviedade da corrupção que envolvia Havelange em seu reinado. Em um dos trechos, o tribunal relata como os advogados da Fifa tentavam convencer os juizes em uma audiência de que não viam problemas com a atitude de Teixeira e Havelange e alegavam que a proposta da Justiça de que os cartolas devolvessem US$ 2,5 milhões para os cofres da organização seria impossível de ser implementada. Entre os vários motivos para não pedir o dinheiro de volta, os advogados da Fifa apresentaram um argumento surpreendente: o de que a “maioria da população” de países da América do Sul e África tem nos subornos e propinas parte de sua renda “normal” Cito o trecho completo do argumento dos advogados da Fifa para não ficar dúvida: “Os representantes legais da Fifa são da opinião ainda de que implementar a devolução do dinheiro seria quase impossivel. Eles justificam isso, inter alia, com o argumento de que uma queixa da Fifa na América do Sul ou África dificilmente seria aplicada, já que pagamentos de subornos pertencem ao salário recorrente da maioria da população”. Ou seja, Teixeira não devolveria o dinheiro porque, em nossa suposta “cultura”, todos temos parte da renda completada por subornos. Não vamos confundir as coisas. A corrupção existe e é endêmica em nossa região e no Brasil, assim como na África. Mas também existe na civilizada Suíça, na gigante Siemens da Alemanha ou nos EUA. O que une a muitos hoje em nossa região não é o fato de que recebemos um pedaço de nosso salário em forma de subornos, como insinua a Fifa. O que nos une é hoje a indignação diante dessa realidade e o fato de estarmos exaustos de ver dinheiro público enriquecendo certas pessoas. Querer agora justificar a dificuldade em receber o dinheiro de volta alegando que somos todos assim não é apenas surpreendente como argumento legal, mas uma ousadia que o tribunal simplesmente não aceitou e chegou a ironizar. A entidade sempre soube da corrupção e mesmo Joseph Blatter era o braço direito de Havelange. E a única atitude que tomou foi a de abafar os casos cada vez que surgiam. Quando Jerome Valcke sugeriu que o Brasil recebesse um “chute no traseiro” pelos atrasos na Copa, ele tinha razão no conteúdo, mas não nas palavras usadas. Um vice-presidente do COI chegou a me dizer que a Fifa havia sido “racista” ao fazer o comentário do “chute no traseiro”, adotando um ar de superioridade. Na época, achei que ele exagerava e que não havia lugar para racismo escancarado assim. Mas lendo agora o comentário dos advogados diante de um tribunal, começo a pensar que ele poderia ter razão.

terça-feira, 10 de julho de 2012

INFRAESTRUTURA RUIM E CARA

Insuficientes, e em boa parte mal aplicados, os investimentos públicos em infraestrutura de transportes não estão conseguindo evitar o agravamento dos problemas enfrentados pelo setor produtivo para escoar suas mercadorias, o que impõe perdas cada vez maiores à economia brasileira e reduz ainda mais sua competitividade. 

Recente estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) estimou que as más condições das estradas, a pequena capacidade das ferrovias, a burocracia e o sucateamento dos portos e o custo de armazenagem impõem à indústria paulista gastos adicionais de R$ 17 bilhões por ano. Estudo mais amplo da Fundação Dom Cabral, abrangendo todo o País e todos os setores econômicos, concluiu que a falta de investimentos públicos em logística (transporte e armazenagem) provoca perdas anuais de US$ 80 bilhões para as empresas brasileiras. 

O valor, como lembrou o coordenador do Núcleo de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, em entrevista ao jornal Brasil Econômico (5/7), corresponde a 4% do PIB e, coincidentemente, ao volume de recursos que o Brasil precisa investir para eliminar os gargalos logísticos. Mas, como lembrou Resende, nos últimos 30 anos a média de investimentos ficou em apenas 1,5% do PIB. 

Outros países investem muito mais. Há algum tempo, o Estado mostrou - com base em estudo do economista Claudio Frischtak, de uma empresa privada de consultoria - que, entre 2003 e 2010, a China ampliou os investimentos em infraestrutura do equivalente a 7,3% do PIB para 13,4%. A Índia investe 6% do PIB, a Tailândia aplica cerca de 15% do PIB em logística há oito anos e o Vietnã investe 11%. 

Os investimentos no Brasil não são apenas inferiores às necessidades do País. São também mal aplicados. Uma de suas características é a forte concentração no setor rodoviário, que absorve mais da metade do total destinado pelo governo a transportes, e, assim mesmo, as estradas federais continuam muito ruins. Os outros modais, como ferrovias, metrô, aeroportos, portos e hidrovias, ficam com o que sobra. Mercadorias que poderiam ser transportadas a custos bem inferiores por ferrovias ou hidrovias circulam pelo País sobre caminhões. 

Além disso, a utilização dos recursos, sobretudo na esfera federal, tem sido marcada por frequentes denúncias de desvios, irregularidades ou corrupção. E, quando as normas da correta administração financeira são observadas com rigor, verifica-se, como lembrou Resende, que faltam projetos, o planejamento é ruim e as obras demoram para começar e, sobretudo, para terminar. O resultado é o atraso sistemático na execução dos projetos de infraestrutura. 

Uma simples comparação dá ideia de como os projetos são executados no Brasil e na China, que em pouquíssimo tempo ampliou sua infraestrutura logística para atender ao vertiginoso crescimento da sua economia nos últimos anos. Em três anos, o gigante asiático construiu uma ferrovia de 2 mil quilômetros em região montanhosa; no Brasil, a Ferrovia Norte-Sul, de 2,3 mil quilômetros (com a inclusão da Transnordestina e da Ferronorte), iniciada em 1987 e prometida pelo governo Lula para 2010, não tem data para conclusão. 

A Fundação Dom Cabral estima que, no Brasil, os gastos das empresas com transporte de cargas alcançam 12% do PIB, mais do que se gasta na China (8%) e na África do Sul (9%). Com os investimentos que estão sendo feitos nesses países, o custo deve cair para cerca de 7% do PIB. No Brasil, por causa da escassez de investimentos, há o risco de o custo chegar a 20% do PIB nos próximos anos. 

Por causa da falta de investimentos, a infraestrutura de transportes não evoluiu na mesma velocidade que a economia. Em termos relativos, é como se ela estivesse submetida a um processo ininterrupto de deterioração. Nessa área, o Brasil caminha para trás. 

Se a esses custos logísticos crescentes se somarem outros - como o da burocracia, dos impostos, de insumos como energia elétrica e os financeiros -, será possível entender melhor por que o Brasil vem perdendo competitividade e por que é cada vez mais difícil produzir no País. EDITORIAL O ESTADÃO O Estado de S.Paulo - 10/07

segunda-feira, 9 de julho de 2012

FIM DE UMA ERA

Retirada das incandescentes do mercado marca o fim de uma era



No último dia 30 de junho teve início a primeira etapa do processo que proibirá definitivamente a fabricação, importação e comercialização de lâmpadas incandescentes no Brasil, com conclusão prevista para 2016. É o fim de uma era. Os algozes do seu banimento atendem pelos nomes de sustentabilidade, economia e eficiência energética. A primeira lâmpada de incandescência foi patenteada em 1880 pelo americano Thomas Edison, com o mesmo desenho bojudo que apresenta até hoje. Ao longo de todo esse período, a única mudança significativa foi no seu filamento, o fio interno que emana luz e calor -, que no início era de carbono e, atualmente, de tungstênio.

Mas, depois de atravessar incólume todo o século XX, a lâmpada incandescente adentrou o XXI como o exemplo acabado de desperdício e ineficiência, uma vez que seu filamento emite apenas 10% de luz e gera 90% de calor. O Brasil não é o pioneiro nesse cuidado com a sustentabilidade, suspendendo as incandescentes como gastonas de energia elétrica. Outros países já aboliram ou estão em vias de acabar 100% com essas lâmpadas já neste ano, ao mesmo tempo em que o nosso país dá o seu pontapé inicial no processo. Cuba, por exemplo, vem restringindo as incandescentes desde 2007, e a União Europeia encerra o processo em setembro de 2012 (embora tenha iniciado em 2009 com a proibição da 100W). 

Na Austrália, quase todos os modelos de incandescentes estão proibidos desde 2009, restando apenas as lâmpadas decorativas maiores de 40W e halógenas, cujo suspiro final deve acontecer em outubro de 2012. E até nossos vizinhos argentinos iniciaram o programa com mais antecedência, em 2008. A China, responsável pela fabricação de 70% das lâmpadas incandescentes de todo o mundo, anunciou no final do ano passado seu programa, propondo a extinção dos modelos iguais ou superiores a 100W a partir de outubro de 2012, chegando à de 60W no final de 2014 e à de 15W em 2016. Com isso, extinguirá o desperdício de energia gerado por cerca de 1 bilhão de incandescentes utilizadas no país. 

Datas marcadasDesde o dia 30, portanto, a lâmpada incandescente de 150W não pode mais ser fabricada nacionalmente ou importada. Todavia, os fabricantes e importadores que ainda tiverem estoques deste modelo têm autorização para comercializá-lo até o dia 30 de dezembro de 2012. E os lojistas, por sua vez, poderão vendê-lo para os consumidores até 30 de junho de 2013, quando o mesmo estará definitivamente banido. No Brasil, não existe lei determinando a proibição da fabricação ou importação e comercialização das incandescentes, como muitos acreditam.

O que existe é uma Portaria Interministerial de n° 1007, de 31/12/2010, na qual o Inmetro - Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia - estabelece a eficiência luminosa mínima para as lâmpadas incandescentes, em patamares muito altos, que inviabilizam sua fabricação. Estima-se que 350 milhões de incandescentes estejam em uso, hoje, no país, sendo responsáveis pela iluminação de 80% das residências. O principal modelo comercializado é o de 60W, que será proibido totalmente somente em junho de 2015. Com a saída gradual das incandescentes de tetos e abajures, a aposta é que o consumidor migrará para as lâmpadas chamadas de econômicas, ou seja, as compactas fluorescentes que consomem 80% menos energia elétrica.

Todavia, uma parte desse mercado irá também para a incandescente halógena – modelo de lâmpada com bulbo igual a atual incandescente de tungstênio, porém 30% mais eficiente. Mas ambas não devem fazer história pois, ao que tudo indica, serão rapidamente substituídas pelas lâmpadas com tecnologia LED (light emitting diode), as grandes vedetes da atualidade e que deverão representar 50% da iluminação mundial até 2015 e, segundo expectativas internacionais, ao redor de 80% em 2020.

A única certeza é que essa transição aumentará, e muito, a comercialização das 190 milhões de compactas fluorescentes que se estimam consumir anualmente, hoje, no Brasil, além dos outros tipos de lâmpadas. É uma oportunidade para as empresas sérias em iluminação e com marcas consagradas há anos no país, mas também uma porta aberta para aventureiros que imaginam que vão ganhar dinheiro fácil importando produtos de qualidade duvidosa. Sobre isso, fica a lembrança de 2007, época do “apagão”, quando proliferaram dezenas de marcas de lâmpadas completamente desconhecidas, que sumiram com a mesma rapidez com que se lançaram no mercado. Não sem antes, porém, deixar um rastro de consumidores enganados e frustrados com o desempenho dos produtos que compraram “baratinho, baratinho”.

Por: Gilberto Grosso é Lighting Professional, possui ampla experiência na área de iluminação e é atualmente Diretor Comercial da Avant, referência nacional em soluções para iluminação.

O PESO DE UMA PARTÍCULA


A descoberta do que os cientistas acreditam ser o bóson [partícula portadora de força] de Higgs – ou, como é popularmente chamado, a "partícula de Deus" –, mal foi anunciada e já começou a alvoroçar o mundo da ciência. Além de impactar inúmeras pesquisas e projetos científicos em andamento no mundo, na atualidade, a descoberta criou um dilema: quem levará o crédito histórico e o principal reconhecimento sobre a descoberta, isto é, o Prêmio Nobel de Física?

Segundo o jornal britânico The Guardian, a Academia Real das Ciências da Suécia, responsável por conceder o prêmio Nobel, deve premiar os cientistas que, há mais de 50 anos, trabalharam na elaboração da teoria sobre a existência da partícula. O problema é que a escolha desses nomes não é tão simples. Tradicionalmente, o Nobel de Física é concedido a, no máximo, três pessoas que contribuíram para um determinado estudo.

No caso do bóson de Higgs, um total de seis cientistas, de três grupos diferentes, se dedicaram à teoria. Todos apresentaram suas conclusões em artigos divulgados em 1964, com apenas alguns meses de intervalo entre cada publicação.

O primeiro grupo foi liderado por Robert Brout e François Englert, da Universidade Livre de Bruxelas. Como Brout morreu em 2011 e a regra da academia sueca é não conceder prêmios póstumos, Brout está excluído da premiação.

O segundo artigo é de Peter Higgs, primeiro físico a cogitar a existência de uma partícula que teria transferido sua massa para toda a matéria existente no universo. O terceiro trabalho é de três físicos, Dick Hagen, Gerry Guralnik e Tom Kribble. Peter Higgs certamente deve ser homenageado. O dilema agora é: quem serão os outros dois premiados?

Por que 'partícula de Deus'?

O nome oficial é bóson de Higgs, mas a partícula subatômica que os pesquisadores do CERN dizem ter detectado ganhou um apelido muito mais simpático: "partícula de Deus". Mas por que Deus? A explicação oficial é simples: concebida como uma partícula que transferiu sua massa para todas as outras existentes no universo, ela estaria em todos os lugares e em todas as coisas, como Deus. Mas, segundo a versão não oficial, o motivo é outro. Em 1993, o prêmio Nobel de Física Leon Lederman pretendia publicar um livro sobre o bóson de Higgs chamado A Partícula Maldita, pela dificuldade em provar sua existência. Mas o editor da obra temia que o título fosse ofensivo e o trocou para A Partícula de Deus.

50 anos de pesquisas

O alvoroço provocado pela descoberta da partícula que tem quase 100% de chance de ser o bóson de Higgs se explica por uma série de fatores. O primeiro: há pelo menos 50 anos, físicos e engenheiros buscam essa partícula. O trabalho envolveu milhares de cientistas e custou US$ 10 bilhões apenas para criar e manter, sob a fronteira da Suíça e da França, o Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês). Foi ali, no maior acelerador de partículas do mundo [foto à dir.], que, ao longo de três anos, os cientistas geraram 500 trilhões de colisões de partículas subatômicas em altíssima velocidade até conseguir detectar o bóson, com massa de 125 gigaelétrons-volts (GeV) e compatível com o Modelo Padrão descrito em 1964 por Peter Higgs. A descoberta da partícula é a chave para entender como a matéria de todas as coisas existentes funciona e, quem sabe, um dia, ajudar a responder por que estamos aqui.

CERN quer a adesão do Brasil

O Centro Europeu para a Pesquisa Nuclear (CERN), responsável pelas descobertas sobre o bóson de Higgs, quer ter o Brasil entre seus membros. A adesão só não aconteceu ainda, segundo o diretor-geral da instituição, Rolf Heuer, por lentidão das autoridades brasileiras. Em 2010, o País iniciou formalmente sua adesão ao centro. O Cern estipulou que o Brasil deve pagar US$ 10 milhões anuais pela adesão, 10% do que pagam os membros europeus. Mas diante do corte orçamentário do centro, devido à crise econômica na Europa, a quantia é relevante. Segundo Heuer, sem a adesão, empresas brasileiras não poderão participar das licitações que o centro abrirá nos próximos anos para a aquisição de tecnologia e peças para a atualização do LHC, o acelerador de partículas que possibilita as pesquisas. O Ministério de Ciência e Tecnologia formou uma comissão para estudar como obter os recursos para a adesão. Em Diário do Comércio