terça-feira, 18 de setembro de 2012

DE CIRCOS, FICÇÕES E REALIDADE


O CIRCO


Desde o início do julgamento do ‘mensalão’ denunciei-o como um espetáculo circense para, como na antiga Roma, desviar a atenção da população de seus reais problemas. Minha opinião não mudou com algumas vitórias dos gladiadores togados contra o outro time. Muito embora haja grandes diferenças entre o que sucedia na Roma das Sete Colinas com a nova Roma Planaltina. Na primeira, Cidade Eterna, berço de um dos maiores Impérios da Antiguidade e desde então Sé Católica, era a plebe que era enganada. Na atual, triste caricatura criada por um Presidente megalômano desatinado em conluio com um arquiteto comunista, cuja existência é absolutamente desnecessária, senão maléfica, são os letrados (sic) que assistem com mais atenção ao espetáculo, riem e aplaudem efusivamente o Gigante Núbio que quer abater todos os adversários, e apupam o Leão Polonês que luta com menos furor. Igualzinho aos antigos Romanos que se enfureciam quando o Imperador ou as Vestais levantavam os polegares, salvando os perdedores, pois queriam ver muito sangue. A plebe mesmo, além de enfrentar as mazelas do transporte público para ganhar minguados trocados que os togados faturam em alguns segundos do sua confortável “faina”, está interessada no Brasileirão – Flamengo cai ou não para a ‘segundona’? – na luta entre Carminha e Ritinha e o futuro do Tufão, do Max e do Jorginho ‘Batata’, e nos programas do Ratinho, do Huck e do Faustão.


A FICÇÃO 


Além deste circo começa a tomar corpo uma obra de ficção Hollywoodiana para aterrorizar a Humanidade como um todo, mas particularmente aos brasileiros: a invenção gerada pela ONU sem nenhuma evidência científica de uma futura falta d’água potável no mundo e a necessidade de proteger nosos ‘aquíferos’ dos “alienígenas”.


Há muitos anos, aficionado por ficção científica, assisti a um filme sobre um planeta nos confins do Universo onde a água estava acabando. Como eram povos altamente desenvolvidos possuíam avançada tecnologia interplanetária e mandaram naves gigantescas para procurar água em outros planetas. A Terra, obviamente foi um dos escolhidos. Naves enormes se postaram sobre o Atlântico e o Pacífico e sugavam toda água. Finalmente, os terráqueos conseguem ganhar a parada, comandados por aqueles heróis que sempre surgem.


Na falta de alienígenas de outros planetas, servem os do Norte deste aqui mesmo, despertando a obsessão antiamericana subjacente na mente da comunalha e infelizmente de nossos nacionalistas, militares e civis, como já expressei anteriormente. Pretende-se com esta desculpa impedir a decisão soberana do Paraguai de assinar convênio com os EUA permitindo a instalação de uma base no território paraguaio do Chaco.


Em 28 de agosto o Notícias Terra relatou: Analistas geopolíticos da América do Sul estão apreensivos com a situação do Paraguai, principalmente pela relação do país latino com os Estados Unidos. A intensificação de atividades rotuladas como "humanitárias" e de "cooperação" da embaixada americana em Assunção e a regularidade de visitas de militares ianques de alta patente ao país são dois dos principais motivos. Um professor (sic) argentino levantou a velha arenga nacionalisteira ao declarar que os EUA "têm interesse na manutenção de sua hegemonia na região, em detrimento de uma integração latino-americana e o estabelecimento da suposta base permitiria maior proximidade com os países sul-americanos e respostas imediatas na hipótese de confrontos, devido a sua localização geográfica estratégica.


A Embaixada Americana em Assunción revela que a pista foi concluída ainda no governo Stroessner e por paraguaios e nada tem a ver com apoio atual ao governo de Federico Franco. Que os EUA queiram vigiar de perto a Tríplice Fronteira, o narcotráfico e os grupos terroristas islâmicos que indubitavelmente atuam por lá, deveriam merecer agradecimentos dos três países, mas eis que surge a paranóia dos ‘aquíferos’, pois ali se encontra o Guarani. São invasores que pretendem roubar nossa água, como se dela precisassem: no Meio Oeste dos Estados Unidos situam-se a Grande Bacia Artesiana com 1.7 km2 e o aquífero Ogallala (452 mil m2) somando 2.152 km2 maiores do que a soma dos dois aquíferos brasileiros, o Guarani (1.2 km2) e do Alter do Chão (437 mil km2)=1.637 km2, sendo que o primeiro ainda é dividido com outros três países [i]! Além do que a própria Embaixada responde à pergunta que eu fiz: ao afirmar que os EUA não têm interesse no Aquífero, diz que não haveria meio possível de transportar tal quantidade de água. Os EUA não possuem naves gigantescas com tal capacidade!
A TRISTE REALIDADE DO PAÍS




Enquanto preocupam-se com as condenações de mensaleiros e acalentam uma guerra – suicida – contra os “invasores do norte”, a realidade é bem outra. A degeneração moral da agenda Fabiano-Marxista (no Brasil: tucano-petista) segue impávida. O País está infestado de vadias, vagabundas, gays e drogados de toda espécie só esperando que o projeto ONU-SOROS-FHC-GAVÍRIA de liberação das drogas seja aprovado. A “educação sexual” através do kit gay, iniciada nos anos FHC e aprofundada nos petistas é de uma criatividade destrutiva – se me permitem o paradoxo – imensa, como o terrívelEncontrando Bianca (Bianca é um travesti gay)[i]. Podem estar certos: a liberação da pedofilia virá a reboque através de um projeto, que já existe, de “direitos da criança à plena satisfação sexual”. Falta pouco para ser introduzido do já nefasto ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Num país de dinheiristas só se pensa na corrupção financeira – o Circo – e não na corrupção moral e da alma. Ora, deixa pra lá, põe o Dirceu na cadeia e ficaremos todos felizes! Como já dizia o poema de e. e. cummings:

Everybody happy?

WE-WE-WE

& to hell with the chappy

Who doesn’t agree

Do estado da economia, das greves incontroladas e das mentiras da PresidAnta escrevo outra hora. Por: Heitor de Paola


Para publicação no Jornal Inconfidência, Belo Horizonte, MG


EDUCAÇÃO NO BRASIL E NO PRIMEIRO MUNDO



O Brasil investe em educação um percentual do PIB de Primeiro Mundo e colhe um resultado de Terceiro. É dinheiro que falta? Não! É competência mesmo! Mas não se diga isso na era petista…



Ainda ontem, com o rosto — e, possivelmente, o pensamento — paralisado pelo botox, Carlos Giannazi, candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PSOL (o partido em que Caetano & Chico vão votar no Rio), defendia, num debate, que o governo passe a investir 10% do PIB em educação… É uma boçalidade! As coisas são simples assim: esse dinheiro não existe. Se existisse, dada a atual estrutura, seria o mesmo que jogá-lo pela janela. Aliás, é bem provável que, nessa hipótese, ele fosse mais bem aproveitado.

O Brasil é a sétima economia do mundo e investe na área 5,7% do PIB. É muito dinheiro. Só que é mal aproveitado, e o resultado é pífio. Entre outras razões, há um permanente boicote a todo e qualquer esforço feito em favor da qualidade. Em São Paulo, o então governador José Serra instituiu um sistema de promoção de professores por mérito e de qualificação dos profissionais. A Apeoesp, comandada pelo PT, foi à greve. Opôs-se até mesmo à definição de um currículo mínimo para as escolas. Livros foram queimados em praça pública. Os esquerdopatas querem mais salário, mas recusam qualquer programa que avalie seu desempenho. Os prejudicados são os alunos.

Aí aparecem, então, as soluções miraculosas — as “chalitices” e “mercadantices” da vida, como “escola em tempo integral”, “escola da família”, “escola com tablet”… Só não se fala numa escola com professor capacitado e submetido a uma avaliação constante do seu trabalho, que premie a competência e puna a incompetência, como em qualquer área da vida. Os sindicatos, tomados por petistas e esquerdistas ainda piores, não deixam.

Pois bem. Reproduzo abaixo uma nota publicada na Exame.com. Em relação à porcentagem do PIB, o Brasil investe em educação mais do que muitos países superdesenvolvidos. Mas está lá atrás na fila da qualidade. Leiam.
*
Tramita no Congresso Nacional uma proposta para fazer o volume de recursos para a educação chegar a 10% do PIB nacional. Hoje, o Brasil investe 5,7% — um dos índices mais altos entre os 42 países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a frente de Reino Unido, Canadá e Alemanha, por exemplo. Na semana passada, a organização lançou um relatório sobre os gastos em educação de várias nações. Investir um décimo de toda a riqueza produzida no país deixaria o Brasil em primeiro lugar no ranking, acima da Islândia, que investe assombrosos 7,8% do PIB em educação hoje.

Esse número considera, além dos investimentos nas instituições de ensino, gastos governamentais com bolsas e programas de apoio aos alunos. Apesar do investimento brasileiro ser próximo da média dos países da OCDE, o país se encontra somente em 53º lugar — de um total de 65 — no Pisa, um programa de avaliação da qualidade da educação da mesma organização.

Ou seja, maiores investimentos não necessariamente acompanham, na mesma proporção, uma melhora no desempenho dos estudantes. O Brasil é o 15º que mais investe o PIB na área na lista da OCDE. Os lanternas no ranking foram Indonésia (investimento de 3% do PIB), Índia (investimento de 3,5%), Japão (3,8%), Eslováquia (4,1%) e República Tcheca (4,4%).

Os investimentos em educação de 20 países


Por Reinaldo Azevedo

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

TERCEIRA LIÇÃO



Dez lições de economia austríaca - Terceira lição: ação, tempo e conhecimento
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Rascunhamos na aula anterior o conceito de ação e podemos agora defini-lo:ação, para a Escola Austríaca de Economia, é qualquer ato executado voluntariamente com o objetivo de aumentar a satisfação de quem o executa. Como vimos na aula anterior, os agentes — isto é, aqueles que agem, sejam eles consumidores, produtores, investidores, poupadores, exportadores, importadores etc. — quando o fazem o fazem por meio deescolhas, considerando que os fins sempre suplantem os meios, ou seja, que as escolhas são feitas em meio àescassez.

Toda a ação nos mercados pressupõe, então, uma escolha feita em um determinado momento, tendo o agente a posse de alguns meios e tendo em vista determinado(s) fim(s). A teoria econômica supõe, com toda a razão, que todas as ações são realizadas com a expectativa de que, caso sejam concretizadas, venham a aumentar a satisfação (ou utilidade, na linguagem dos economistas) dos agentes. Ninguém age para piorar, é isso o que queremos dizer.

Agora uma pergunta que pode parecer complicada: e uma pessoa que decida que vai suicidar-se pulando de um edifício alto? Essa pessoa estará agindo da forma como definimos, isto é, pensando que se suicidar vai aumentar a sua satisfação? A resposta é sim! Porque seus sentimentos subjetivos estão tão abalados que ela pensa que a morte é a melhor solução. É claro que ela está errada, mas no momento em que decide tirar a própria vida ela não percebe isso.

Da mesma forma São Francisco de Assis, quando mandou distribuir os bens de seu pai, um rico comerciante, aos pobres, praticou aquela ação porque achou, de acordo com sua valoração subjetiva, que aquela ação lhe proporcionaria uma satisfação muito grande. O postulado da ação humana, portanto, é universal! Toda ação é executada no intuito de se aumentar o estado de satisfação.

Podemos refinar agora um pouco: toda ação é executada porque quem a executa acha que se a executar sua satisfação vai aumentar. O agente pesou e repesou meios e fins, considerou suas valorações e decidiu-se por aquela ação — por exemplo, comprar um tênis da marca X. Mas pode acontecer que, depois de ter praticado a ação, ou seja, depois de ter comprado o tênis, ele venha a perceber que a qualidade o mesmo não era boa, ou que poderia ter pagado um preço bem menor pelo mesmo modelo em outra loja. Em outras palavras, como o nosso conhecimento de todos os fatores que devem ser considerados ao se fazer as escolhas sempre é incompleto, além de estar distribuído desigualmente entre os agentes, ocorre que as ações acontecem na imensa maioria das vezes em ambiente de incerteza, o que significa que a ocorrência de erros costuma ser comum.

A economia do mundo real, portanto, nada mais é do que o conjunto de todas as ações — compras, vendas, empréstimos, decisões de produção, de poupança, de investimento etc. — realizadas sob a forma de transações econômicas, que envolvam escolhas.

Acontece, porém, que essas escolhas não são fixas no tempo! Imagine que você não suporta ouvir músicas sertanejas, mas que um belo dia começa a namorar a filha de um rico fazendeiro do interior de São Paulo. Sua valoração quanto às músicas sertanejas muda: você, influenciado por fatores não econômicos, como a paixão, passa a comprar CDs e DVDs de todas as duplas sertanejas que encontra nas lojas. Seis meses depois, vocês terminam o namoro. Muito provavelmente, você jogará no lixo todos os CDs e DVDs que comprou enquanto estava apaixonado. Portanto, sua escala de valores alterou-se duas vezes em poucos meses. E isso acontece com boa parte dos bens e serviços que temos que valorar ao longo de nossas vidas (felizmente, porque senão a vida será mais entediante).

A passagem do tempo, portanto, tende a afetar sensivelmente e de maneira muitas vezes imprevista as nossas escolhas. O tempo pode ser definido como um fluxo permanente e contínuo de novas experiências: é como se o nosso estoque de conhecimentos e de interpretação desses conhecimentos estivesse armazenado em um tanque e o tempo fosse algo como uma torneira despejando novos conhecimentos e novas interpretações a esse estoque, que vai, então, se modificando permanentemente; e isso influencia as ações ao longo do tempo. Por exemplo, se você gosta muito de chocolate e come de uma vez só duas barras daquelas maiores, provavelmente vai sentir dores na barriga. Na próxima vez, dificilmente você comerá duas barras de uma só vez.

Outro exemplo: quando você tinha cinco anos, o valor subjetivo que atribuía a um velocípede certamente era maior do que o que atribui hoje a ele, porque o tempo passou e suas perspectivas, sua memória, sua antecipação foi alterando o seu conhecimento e a maneira de interpretar esse conhecimento também se alterou.

Vamos refazer nossa definição de economia, então: a economia do mundo real, portanto, nada mais é do que o conjunto de todas as ações — compras, vendas, empréstimos, decisões de produção, de poupança, de investimento etc. — realizadas sob a forma de transações econômicas, que envolvam escolhas ao longo do tempo. 

Por fim, temos que considerar que, como ensinou o grande economista austríaco Hayek, o nosso conhecimento (aquele necessário para decidirmos as ações econômicas que escolheremos) possui duas características: primeira, ele é incompleto; e segunda, ele está espalhado de maneira desigual entre os participantes dos mercados.

Ora, se nosso conhecimento é incompleto, ele é insuficiente, então, para que possamos tomar todas as decisões envolvendo uma ação com certeza absoluta de que serão as decisões corretas. E se ele está distribuído desigualmente entre os participantes dos mercados, isso significa que alguns terão informações mais apuradas do que outros, o que irá com certeza afetar o grau de acerto/erro das decisões. Por fim, observe que, mesmo se todos os participantes em um mercado tivessem exatamente as mesmas informações, o mesmo conhecimento, cada um deles interpretaria essas informações e conhecimentos de maneira absolutamente única, individual, porque somos racionais, temos gostos e preferências próprias, valorizamos a posse de dinheiro de maneiras diferentes, somos influenciados por fatores externos diferentes, somos, para resumir, diferentes.

A conclusão disso é que sempre vai existir uma incerteza característica ao processo de escolher quais as melhores ações, tanto no campo da economia como nos outros campos da vida humana. Essa incerteza que está presente na ação humana, por mais racional que esta possa ser, não é uma incerteza que se pode medir com números, como, por exemplo, quando dizemos que a probabilidade de dar "cara" quando lançamos uma moeda para o ar muitas vezes será de 0,5. No caso da ação humana nos mercados, trata-se de uma incerteza que chamamos de incerteza genuína, à qual não podemos associar números nem estimativas. O corolário da incerteza genuína é a ignorância: temos que admitir que, por mais estudados que possamos ser, sempre seremos ignorantes de algumas condições específicas (de momento ou não) e que seriam relevantes para que a nossa ação não contenha erros.

Podemos agora finalizar nossa definição de economia, escrevendo: a economia do mundo real, portanto, nada mais é do que o conjunto de todas as ações — compras, vendas, empréstimos, decisões de produção, de poupança, de investimento, etc. — realizadas sob a forma de transações econômicas, que envolvam escolhas ao longo do tempo, realizadas em ambiente de incerteza genuína. 

O erro, a incerteza genuína, a ignorância, o fato de que nossas valorações mudam com o tempo e outros fatores muito complexos e que não se restringem apenas à economia fazem com que tenhamos que considerar que estudar economia não é o mesmo que estudar uma ciência natural. Por isso, temos que ter muito cuidado quando usamos a matemática para descrever o comportamento econômico, pois a economia não se presta a isso: nenhum modelo matemático poderá explicar porque você preferiu comprar uma camisa do seu clube de futebol, ao invés de comprar a de um clube rival.

A Escola Austríaca rejeita o uso da matemática na economia porque usa o critério hipotético dedutivo (e não o indutivo) e porque adota o falsificacionismo, em que formulamos uma teoria com base em argumentos lógicos e consideramos que essa teoria será correta enquanto não for falsificada pelos fatos do mundo real. Isso é diferente do método das outras correntes do pensamento econômico, que usam modelos matemáticos para descreverem o comportamento das pessoas no mundo real.

Ação, tempo e conhecimento, eis o universo da economia, caro aluno. Convido você a mergulhar nesse mundo fascinante!



Sugestões de leitura:

Iorio, Ubiratan J. Ação, tempo e conhecimento: a Escola Austríaca de Economia, Instituto Mises Brasil, 2011, São Paulo, Introdução e caps.1e 2






Sugestões para reflexão e debate:

1. Por que toda ação é uma escolha?

2. A definição de ação é válida sempre ou admite exceções?

3. Qual a importância da incerteza para as escolhas que caracterizam a ação?

4. Comente: "tempo é conhecimento, tempo é experiência".

5. Defina economia em função dos três conceitos apresentados.



Ubiratan Jorge Iorio é economista, Diretor Acadêmico do IMB e Professor Associado de Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Visite seu website.


"MENSALEIROS NO TRIBUNAL"


Depois de longa espera, finalmente o Supremo Tribunal Federal vai julgar o processo do Mensalão. A demora é só mais uma demonstração de quão ineficiente é o Judiciário. A lentidão é a maior característica do poder que devia ser célere, eficiente e, principalmente, justo. E não é por falta de recursos. Não. Basta observar as folhas de pagamento que, com muita dificuldade e depois de muita pressão do Conselho Nacional de Justiça, estão sendo divulgadas.

Os poderes Executivo e Legislativo estão maculados pela corrupção até a medula. Não há dia sem que apareça uma denúncia sobre o desvio de recursos públicos ou ao favorecimento de interesses privados. Os olhos do cidadão acabam, em um movimento natural, se dirigindo para o Judiciário. É um gesto de desespero e de impotência. Porém….

Não há otimismo que consiga reverter este quadro, ao menos a curto prazo. Vivemos um dos momentos mais difíceis da história republicana. Daí a enorme responsabilidade do STF no julgamento do Mensalão. Em 2005 fomos bombardeados por reportagens e entrevistas sobre o caso. O mais triste para os valores republicanos foram as sessões da CPMI dos Correios. Muitos depoimentos foram transmitidos ao vivo. Foi estarrecedor ouvir depoentes que tratavam de desvios de recursos públicos, de pagamento de campanhas eleitorais (como a presidencial de 2002) e da compra de apoio político no Congresso, com enorme tranquilidade, como se toda aquela podridão fizesse parte do jogo político em qualquer democracia. E quem agisse de forma distinta não passaria de um ingênuo. Em resumo, a ideia propagada pelos depoentes era de que política sempre foi assim.

Contudo, no decorrer dos trabalhos da CPMI, o clamor da opinião pública foi crescendo. A crise política se instalou. Alguns parlamentares do PT, envergonhados com a revelação do esquema de corrupção, saíram do partido. O presidente Lula foi à televisão e pediu, em rede nacional, desculpas pela ação dos dirigentes partidários. Disse desconhecer que, nas antessalas do Palácio do Planalto, tinha sido planejado o que ficou conhecido como Mensalão. Falou até que tinha sido traído. Não disse por quem e nem como.

O relatório final da CPMI pedindo o indiciamento dos responsáveis foi encaminhado à Procuradoria Geral da República. A aprovação foi comemorada. Em sinal de triunfo, o relator foi carregado pelos colegas. Para a oposição, o presidente Lula estava nas cordas, à beira de um nocaute. Caberia, disse, na época, um dos seus líderes, levá-lo sangrando até o ano seguinte para, então, vencê-lo facilmente nas urnas. Abrir um processo para apurar o crime de responsabilidade colocaria em risco o país. Estranha argumentação mas serviu para justificar a inépcia oposicionista, a falta de brio republicano e uma irresponsabilidade que só a história poderá avaliar.

Em 2007 o STF aceitou a denúncia. Foi uma sessão bizarra. Advogados se sucediam na tribuna defendendo seus clientes, enquanto os ministros bocejavam, consultavam seus computadores, conversavam, riam e ironizavam seus colegas. Dois deles ─ Ricardo Lewandovsky e Carmen Lúcia ─ chegaram a trocar mensagens especulando sobre os votos dos ministros e tratando outros por apelidos. Eros Grau foi chamado de “Cupido” e Ellen Gracie de “Professora”. O ministro Cupido, ou melhor, Eros Grau, chegou ao ponto de mandar um bilhetinho para um advogado, um velho amigo, e que estava defendendo um dos indiciados. Teve advogado que falou por tempo superior ao regimental e, claro, como não podia deixar de ser, fomos quase sufocados pelo latinório vazio, a erudição postiça, tão típica dos nossos bacharéis. Em certos momentos, a sessão lembrou um animado piquenique. Pena, que ao invés de um encontro de amigos, o recinto era da nossa Suprema Corte.

Apesar do clima descontraído, a denúncia foi aceita. E o processo se arrastou por um lustro. Deve ser registrado que, inicialmente, eram quarenta acusados e foram utilizados todos os mecanismos ─ que são legais ─ protelatórios. No final do ano passado, o ministro Joaquim Barbosa entregou ao presidente do STF o processo. De acordo com o regimento foi designado um ministro revisor. A escolha recaiu em Ricardo Lewandovski, o mesmo que, na noite da aceitação da denúncia, em 2007, foi visto e ouvido ─ principalmente ouvido ─ ao celular, em um restaurante de Brasília, falando nervosamente que a tendência dos ministros era “amaciar para José Dirceu”, um dos acusados. Mas que, continuou o advogado de São Bernardo, a pressão da mídia teria impedido o “amaciamento” (curioso é que nessas horas a linguagem é bem popular e o idioma de Virgílio é esquecido). O mesmo Lewandowski ficou seis meses com o processo. Foi uma das mais longas revisões da história. Argumentou que o processo era muito longo. Mas isto não impediu que realizasse diversas viagens pelo Brasil e para o exterior durante este período.

Depois de muita pressão ─ e foi pressão mesmo ─ , o ministro revisor entregou seu relatório. Só que, dias antes, o presidente Ayres Brito reuniu os ministros e estabeleceu o calendário do julgamento. Registre-se que Lewandovski não compareceu à reunião, demonstrando claramente sua insatisfação. O ápice das manobras de coação da Corte foram as reuniões de Lula com ministros ou prepostos de ministros. Se o Brasil fosse um país sério, o ex-presidente ─ que agora nega o que tinha declarado em 2005 sobre o Mensalão ─ teria sido processado. Mas, diria o otimista, ao menos, teremos o julgamento público do maior escândalo de corrupção da história recente.Por: Marco Antonio Villa

O DOMÍNIO DOS FATOS

Às vésperas da primeira parte em que políticos petistas e outros, de partidos aliados, serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal pela acusação de compra de votos em troca de apoio político, a revista Veja traz este fim de semana um relato, atribuído ao lobista Marcos Valério, incriminando o ex-presidente Lula no mensalão. 

Já condenado a muitos anos de prisão, e sendo provável que até o final do julgamento deva ser condenado a outros tantos por novos crimes, Valério já tem a certeza de que ficará na cadeia por longo tempo, e estaria revoltado com o abandono a que seus amigos do PT o relegaram. 

Segundo o relato, Valério acusa Lula de ser o verdadeiro chefe da trama criminosa, e dá detalhes de quem viveu por dentro a intimidade dos palácios presidenciais. 

De concreto, em termos do julgamento, nem essas revelações nem as acusações anteriores de advogados dos réus têm o condão de incluir o ex-presidente no rol dos acusados nesta Ação Penal 470. Mas os estragos políticos são devastadores, e nada impede que uma denúncia seja feita contra Lula mais adiante. 

No próprio julgamento, o advogado Luis Francisco Barbosa, que defende Roberto Jefferson, acusou o ex-presidente Lula de ser o verdadeiro mandante dos crimes. 

Ele se baseou na tese do “domínio final do fato”, que levou o Procurador-Geral a acusar o ex-ministro José Dirceu como o “chefe da quadrilha”. “Não só sabia como ordenou o desencadeamento de tudo isso que essa ação penal escrutina. Aqueles ministros eram apenas executivos dele”, garantiu o advogado, referindo-se a José Dirceu, Luiz Gushiken e Anderson Adauto. 

Pelo menos um deles, José Dirceu, disse certa vez que não fazia nada sem o conhecimento de Lula. Para provar sua tese, Barbosa fez um relato muito semelhante ao do Procurador-Geral, ligando fatos e consequências, apelando para o bom-senso dos juízes, pois não tem “atos de ofício” que provem sua acusação. 

E acusou Roberto Gurgel de prevaricação por ter “sentado em cima” de um pedido formal para incluir Lula entre os réus do mensalão. 

Anteriormente, em setembro de 2011, o advogado Marcelo Leonardo afirmou, nas alegações finais apresentadas ao Supremo Tribunal Federal na defesa de Marcos Valério, que faltava alguém no banco dos réus. 

Usando o mesmo raciocínio que Veja atribui a Marcos Valério, segundo quem “apenas os mequetrefes” estão sendo condenados, escreveu o advogado na ocasião: “É um raríssimo caso de versão acusatória de crime em que o operador do intermediário aparece como a pessoa mais importante da narrativa, ficando mandantes e beneficiários em segundo plano. (...) Alguns, inclusive, de fora da imputação, embora mencionados na narrativa, como o próprio presidente Lula”. Relatos anteriores davam conta que Marcos Valério, deprimido, enviara diversas mensagens para seus interlocutores no PT, principalmente a Paulo Okamoto, ex-tesoureiro do PT e amigo íntimo de Lula, ameaçando revelar detalhes do envolvimento do ex-presidente no mensalão. 

Paulo Okamotto admitiu recentemente ter conversado com Marcos Valério em diversas ocasiões nos últimos tempos, mas ao contrário de acalmar o publicitário mineiro, as conversas tinham um motivo mais trivial do que chantagens, embora inverossímil: “Ele queria me encontrar porque às vezes queria saber como está a política, preocupado com essas coisas”. 

Lembrando que o próprio Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, acusou o esquema de ter sido tramado de dentro do Palácio do Planalto, o advogado de Jefferson disse que seria uma ofensa a Lula afirmar que ele não sabia de nada: 

"Claro que sua excelência (Gurgel) não pode afirmar que o presidente da República fosse um pateta, um deficiente, que sob suas barbas estivesse acontecendo tenebrosas transações e ele não soubesse nada", concluiu Luis Francisco Barbosa. 

Nas vezes anteriores em que deixou vazar ameaças contra seus parceiros petistas, o publicitário Marcos Valério recuou. Diante da situação concreta de se ver na cadeia por muito tempo, é possível que Valério tenha perdido a esperança de ser salvo, apesar das promessas que diz ter recebido. 

Os petistas garantiram a ele que adiariam o julgamento o mais que pudessem, e que as penas, em último caso, seriam brandas. A realidade tem sido bastante diferente. 

Alguns ministros do Supremo deixaram escapar, no início do julgamento, que pela tese do “domínio final do fato”, se a cadeia de comando não terminasse no ex-ministro José Dirceu, teria forçosamente que subir um patamar e atingir o ex-presidente Lula.Por: Merval pereira

domingo, 16 de setembro de 2012

A ENGENHARIA DA DESORDEM



Na confusão geral das consciências, toda discussão racional se torna impossível e então, naturalmente, espontaneamente, quase imperceptivelmente, o centro decisório se desloca para as mãos dos mais descarados e cínicos.


Todo mundo sabe que a base eleitoral do ex-presidente Lula, bem como a da sua sucessora, está nas filas de beneficiários das verbas do Fome Zero. Embora a origem do programa remonte ao governo FHC, o embrulhão-em-chefe conseguiu fundi-lo de tal maneira à imagem da sua pessoa, que a multidão dos recebedores teme que votar contra ele seja matar a galinha dos ovos de ouro.

No começo ele prometia, em vez disso, lhes arranjar empregos, mas depois se absteve prudentemente de fazê-lo e preferiu, com esperteza de mafioso, reduzi-los à condição de dependentes crônicos.

O cidadão que sai da miséria para entrar no mercado de trabalho pode permanecer grato, durante algum tempo, a quem lhe deu essa oportunidade, mas no correr dos anos acaba percebendo que sua sorte depende do seu próprio esforço e não de um favor recebido tempos atrás. Já aquele cuja subsistência provém de favores renovados todos os meses torna-se um puxa-saco compulsivo, um servidor devoto do "Padim", um profissional do beija-mão.

O político que faz carreira baseado nesse tipo de programa é, com toda a evidência, um corruptor em larga escala, que vive da deterioração da moralidade popular. É impossível que o crescimento do Fome Zero não tenha nada a ver com o da criminalidade, do consumo de drogas e dos casos de depressão. Transforme os pobres em mendigos remediados e em poucos anos você terá criado uma massa de pequenos aproveitadores cínicos, empenhados em eternizar a condição de dependência e extrair dela proveitos miúdos, mas crescentes, fazendo do próprio aviltamento um meio de vida.

O assistencialismo estatal vicioso não foi, porém, o único meio usado pela elite petista para reduzir a sociedade brasileira a um estado de incerteza moral e de anomia.

Na mesma medida em que se absteve de criar empregos, o sr. Lula também se esquivou de dar aos pobres qualquer rudimento de educação, por mais mínimo que fosse, para lhes garantir a longo prazo uma vida mais dotada de sentido. Durante seus dois mandatos o sistema educacional brasileiro tornou-se um dos piores do universo, uma fábrica de analfabetos e delinquentes como nunca se viu no mundo. 

Ao mesmo tempo, o governo forçava a implantação de novos modelos de conduta – abortismo, gayzismo, racialismo, ecolatria, laicismo à outrance etc. –, sabendo perfeitamente que a quebra repentina dos padrões de moralidade tradicionais produz aquele estado de perplexidade e desorientação, aquela dissolução dos laços de solidariedade social, que desemboca no indiferentismo moral, no individualismo egoísta e na criminalidade. 

Por fim, à dissolução da capacidade de julgamento moral seguiu-se a da ordem jurídica: o novo projeto de Código Penal, invertendo a escala de gravidade dos crimes, consagrando o aborto como direito incondicional, facilitando a prática da pedofilia, descriminalizando criminosos e criminalizando cidadãos honestos por dá cá aquela-palha, choca de tal modo os hábitos e valores da população, que equivale a um convite aberto à insolência e ao desrespeito.

Só o observador morbidamente ingênuo poderá enxergar nesses fenômenos um conjunto de erros e fracassos. Seria preciso uma constelação miraculosa de puras coincidências para que, sistematicamente, todos os erros e fracassos levassem sempre ao sucesso cada vez maior dos seus autores.

Tudo isso parece loucura, mas é loucura premeditada, racional. É uma obra de engenharia. Se há uma obviedade jamais desmentida pela experiência, é esta: a desorganização sistemática da sociedade é o modo mais fácil e rápido de elevar uma elite militante ao poder absoluto. Para isso não é preciso nem mesmo suspender as garantias jurídicas formais, implantar uma "ditadura" às claras. Já faz muitas décadas que a sociologia e a ciência política compreenderam esse processo nos seus últimos detalhes. 

Leiam, por exemplo, o clássico estudo de Karl Mannheim, A estratégia do grupo nazista (no volume Diagnóstico do Nosso Tempo, ed. Zahar). A fórmula é bem simples: na confusão geral das consciências, toda discussão racional se torna impossível e então, naturalmente, espontaneamente, quase imperceptivelmente, o centro decisório se desloca para as mãos dos mais descarados e cínicos, aos quais o próprio povo, atônito e inseguro, recorrerá como aos símbolos derradeiros da autoridade e da ordem no meio do caos. Isso já está acontecendo. 

A ascensão dos partidos de esquerda à condição de dominadores exclusivos do panorama político, praticamente sem oposição, nunca teria sido possível sem o longo trabalho de destruição da ordem na sociedade e nas almas. Mas também não teria sido possível se o caos fosse completo. O caos completo só convém a anarquistas de porão, marginais e oprimidos. Quando a revolução vem de cima, é essencial que alguns setores da vida social, indispensáveis à manutenção do poder de governo, sejam preservados no meio da demolição geral. 

Os campos escolhidos para permanecer sob o domínio da razão foram, compreensivelmente, a Receita Federal, o Ministério da Defesa e a economia. A primeira, a mais indispensável de todas, porque não se faz uma revolução sem dinheiro, e ninguém jamais chegará a dominar o Estado por dentro se não consegue fazer com que ele próprio financie a operação. A administração relativamente sensata dos outros dois campos anestesiou e neutralizou preventivamente, com eficiência inegável, as duas classes sociais de onde poderia provir alguma resistência ao regime, como se viu em 1964: os militares e os empresários. Cachorro mordido de cobra tem medo de linguiça. 

Por: Olavo de Carvalho Publicado no Diário do Comércio.

ENTENDA O MARXISMO EM UM MINUTO


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Todo o evangelho de Karl Marx pode ser resumido em duas frases: Odeie o indivíduo mais bem-sucedido do que você. Odeie qualquer pessoa que esteja em melhor situação do que a sua. 

Jamais, sob qualquer circunstância, admita que o sucesso de alguém pode ser decorrente de seu esforço próprio, de sua capacidade, de seu preparo, de sua superioridade em determinada atividade. Jamais aceite que o sucesso de alguém pode advir de sua contribuição produtiva para algum setor da economia, contribuição essa que foi apreciada por pessoas que voluntariamente adquiriram seus serviços. Jamais atribua o sucesso de alguém às suas virtudes, mas sim à sua capacidade de explorar, trapacear, ludibriar e espoliar. 

Jamais, sob qualquer circunstância, admita que você pode não ter se tornado aquilo com que sempre sonhou por causa de alguma fraqueza ou incapacidade sua. Jamais admita que o fracasso de alguém pode ser devido aos defeitos dessa própria pessoa — preguiça, incompetência, imprudência, incapacidade ou ignorância. 

Acima de tudo, jamais acredite na honestidade, objetividade ou imparcialidade de alguém que discorde de você. Qualquer um que discorde de você certamente é um alienado a serviço da burguesia e do "capital".

Este ódio básico é o núcleo do marxismo. É a sua força-motriz. É o que impele seus seguidores. Se você jogar fora o materialismo dialético, o arcabouço hegeliano, os jargões técnicos, a análise 'científica' e todas as inúmeras palavras presunçosas, você ainda assim ficará com o núcleo do marxismo: o ódio e a inveja doentia do sucesso, que são a razão de ser de toda esta ideologia.


(1894-1993) foi um dos membros fundadores do Mises Institute. Ele foi um filósofo libertário, economista e jornalista do The Wall Street Journal, The New York Times, Newsweek e The American Mercury, entre outras publicações. Ele é mais conhecido pelo seu livro Economia em uma Única Lição.

SOCIALISMO E RETROCESSO DA CIVILIZAÇÃO


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Nas páginas 33—35 do meu livro Socialism, Economic Calculation, and Entrepreneurship, faço uma análise do processo empreendedorial e explico como a divisão do conhecimento prático empreendedorial se aprofunda "verticalmente" e se expande "horizontalmente", processo esse que permite (e ao mesmo tempo requer) um aumento da população, que estimula a prosperidade e o bem-estar geral, e que ocasiona o progresso da civilização. Como indicado naquelas páginas, este processo de "verticalização" e "horizontalização" do conhecimento se baseia


1. na especialização da criatividade empreendedorial em campos cada vez mais específicos, com cada vez mais profundidade e detalhes;

2. no reconhecimento dos direitos de propriedade do empreendedor criativo, o que significa que ele tem o direito de manter para si os frutos de sua atividade criativa em cada uma destas áreas;

3. na troca livre e voluntária destes frutos gerados pela especialização de cada ser humano, uma troca que sempre será mutuamente benéfica para todos aqueles que participam do processo de mercado; e

4. no crescimento contínuo da população humana, o que torna possível "ocupar" e cultivar empreendedorialmente um crescente número de novas áreas de conhecimento criativo empreendedorial, o que enriquece a todos.



De acordo com esta análise, qualquer coisa que garanta a propriedade privada daquilo que cada indivíduo cria e contribui para o processo de produção, que defenda a posse pacífica daquilo que cada indivíduo cria ou descobre, e que facilite (ou não impeça) o processo de trocas voluntárias (os quais, por definição, sempre são mutuamente satisfatórios no sentido de que representam uma melhoria da situação de cada pessoa) irá gerar prosperidade, aumentar a população, e aprofundar o avanço quantitativo e qualitativo da civilização.

Da mesma forma, qualquer ataque à posse pacífica de bens e aos direitos de propriedade sobre estes bens; qualquer manipulação coerciva do livre processo de trocas voluntárias; em suma, qualquer intervenção estatal em uma economia de livre mercado sempre irá gerar efeitos indesejados, suprimir a iniciativa individual, corromper a moral e os hábitos de comportamento responsável, tornar o público imaturo, infantilizado e irresponsável, acelerar o declínio do tecido social, consumir a riqueza acumulada, e bloquear a expansão da população humana e o progresso da civilização, aumentando a pobreza geral.

Como ilustração, consideremos o processo de declínio e desaparecimento da clássica civilização romana. Embora suas características mais proeminentes possam ser facilmente extrapoladas para várias circunstâncias do nosso mundo contemporâneo, infelizmente a maioria das pessoas hoje já se esqueceu, ou ignora por completo, essa importante lição histórica; e, como resultado, elas são incapazes de ver os graves riscos que hoje nossa civilização enfrenta. Com efeito, como explico em detalhes em minhas aulas (e resumo em um vídeo gravado durante uma delas, sobre a queda do Império Romano [La Caída del Imperio Romano], o qual, para minha surpresa, já foi visto na internet por mais de 400 mil pessoas), e de acordo com estudos anteriores feitos por autores como Rostovtzeff (The Social and Economic History of the Roman Empire) e Mises (Ação Humana), "o que provocou a queda do império [romano] e a ruína de sua civilização não foram as invasões bárbaras, mas sim a desintegração dessa interdependência econômica".

Para ser mais exato, Roma foi vítima de um retrocesso na especialização e na divisão do processo comercial, uma vez que as autoridades políticas sistematicamente obstruíam ou impediam trocas voluntárias a preços de livre mercado. E faziam isso em meio a um aumento descontrolado nos subsídios, nos gastos públicos ("panem et circenses") e nos controles estatais sobre todos os preços de mercado. É fácil entender a lógica por trás destes eventos. 

Começando especialmente no século III, a compra de votos e de popularidade levou à disseminação da distribuição de subsídios para a população adquirir alimentos ("panem"). Tais subsídios eram financiados com dinheiro de impostos, política essa conhecida como "annona". Além destes subsídios, havia também uma contínua organização dos mais esbanjadores e opulentos jogos públicos para divertir a população ("circenses"). Em decorrência deste arranjo, não apenas os agricultores italianos ficaram arruinados, como também a população de Roma não parou de crescer até chegar a quase 1 milhão de habitantes. (Por que trabalhar exaustivamente em sua terra se os seus produtos não poderão ser vendidos a preços lucrativos, dado que o estado os distribui praticamente de graça em Roma?).

Sendo assim, a medida mais racional para os agricultores italianos seria deixar o campo e se mudar para a cidade e viver do assistencialismo. Mas tal política tem seus inevitáveis custos, e tais custos não poderiam ser cobertos eternamente pelo dinheiro de impostos. Consequentemente, a solução criada pelo governo para continuar sua política foi a inflação — mais especificamente, a redução do conteúdo metálico das moedas. A consequência foi inescapável: uma queda incontrolável no poder de compra do dinheiro, isto é, um aumento descontrolado dos preços, ao qual as autoridades responderam decretando que os preços fossem congelados aos seus valores anteriores, além de imporem sentenças extremamente rigorosas aos "infratores". 

A imposição deste controle de preços levou a desabastecimentos e a uma ampla escassez (uma vez que, aos baixos preços estipulados pelo governo, não mais era lucrativo produzir ou buscar soluções criativas para os problemas da escassez; ao mesmo tempo, o consumismo e o desperdício estavam sendo artificialmente estimulados). As cidades rapidamente começaram a ficar sem estoques, e a população começou a voltar para o campo e a viver em autarquia em condições muito mais penosas, em regime de mera subsistência, um regime que gerou as bases para o que mais tarde viria a ser o feudalismo.

Este processo de retrocesso da civilização (ou descivilização), o qual surgiu da ideologia demagógica socialista — típica do estado assistencialista e do intervencionismo estatal na economia —, pode ser ilustrada de uma maneira graficamente simples pela inversão da explicação do gráfico da página 34 do meu livro supracitado, Socialism, Economic Calculation, and Entrepreneurship, no qual descrevo o processo por meio do qual a divisão do trabalho (ou melhor, a especialização do conhecimento) se aprofunda e consequentemente a civilização avança.

Comecemos pelo estágio representado pela linha superior do gráfico (T1), o qual reflete o nível avançado de desenvolvimento espontaneamente alcançado pelo processo de mercado romano no início do século I, o qual, como demonstrou o estudioso Peter Temin ("The Economy of the Early Roman Empire" Journal of Economic Perspectives, vol. 20, no. 1, winter 2006, pp. 133?151), era caracterizado por um notável grau de respeito legal e institucional pela propriedade privada (o direito romano), e pela especialização e difusão das trocas voluntárias em todos os setores e mercados (particularmente no mercado de trabalho, uma vez que, como Temin demonstrou, o efeito da escravidão foi muito mais modesto do que sempre se acreditou até hoje). Como resultado, a economia romana daquele período alcançou um nível de prosperidade, desenvolvimento econômico, urbanização e cultura que só voltaria a ser visto no mundo em meados do século XVIII.

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As letras maiúsculas sob cada pessoa na figura acima indicam os fins a que cada indivíduo se dedica e se especializa. Ele então comercializa os frutos de sua criatividade e esforço empreendedorial (representados pela lâmpada que "acende") pelos frutos dos outros indivíduos, e todos se beneficiam dessa troca. No entanto, quando a intervenção estatal na economia aumenta (por exemplo, por meio de controle de preços), as trocas são obstruídas e diminuem, e as pessoas se descobrem no estágio representado pela linha do meio do gráfico. Elas são obrigadas a reduzir a amplitude de sua especialização, abandonando, por exemplo, os fins G e M e se concentrando apenas nos fins AB, CD e EF. Houve uma redução na divisão do trabalho e nas transações voluntárias, levando consequentemente a um menor grau de especialização, o que requer um maior número de cópias e reproduções, e um excesso de esforço. O resultado óbvio é uma queda na produção final de todo o processo social, e consequentemente um aumento na pobreza.

O ponto máximo do declínio econômico e da recessão ocorre no estágio mostrado na linha inferior do gráfico (T3). Neste estágio, em decorrência da crescente pressão intervencionista do estado, dos contínuos aumentos nos impostos, e das sufocantes regulamentações, as pessoas, com o único intuito de sobreviver (ainda que a um nível de pobreza até então inconcebível), são forçadas a abandonar quase que completamente a divisão do trabalho e os processos de transações voluntárias que constituem o mercado, a deixar as cidades e retornar ao campo para criar gado e cultivar seus próprios alimentos, fabricar seu próprio couro e construir suas próprias choupanas. Cada indivíduo irá desnecessariamente duplicar as atividades e os fins minimamente necessários para sobreviver (os quais foram marcados ABCD no gráfico). Logicamente, a produtividade irá sofrer uma acentuada queda, e todos os tipos de escassez surgirão, o que levará a uma redução da população em decorrência da falta de recursos. Neste ponto, o processo de desurbanização e descivilização estará completo.

Como Mises indicou,

A combinação de uma política de preços congelados com a deterioração da moeda provocou a completa paralisação tanto da produção quanto do comércio dos gêneros de primeira necessidade, e desintegrou a organização econômica da sociedade. ... Para não morrer de fome, as pessoas fugiam da cidade para o campo e tentavam produzir, para si mesmas, cereais, azeite, vinho e o de que mais necessitassem. ... As cidades, o comércio interno e externo, as manufaturas urbanas deixaram de exercer a sua função econômica. A Itália e as províncias retornaram a um estágio mais atrasado da divisão social do trabalho. A estrutura econômica da antiga civilização, que havia alcançado um nível tão alto, retrocedeu ao que hoje é conhecido como a organização feudal típica da Idade Média. ... [Os imperadores] reagiram de maneira infrutífera, sem atingir a raiz do mal. A compulsão e coerção a que recorreram não podiam reverter a tendência de desintegração social que, ao contrário, era causada precisamente pelo excesso de compulsão e coerção [da parte do estado]. Nenhum romano tinha consciência do fato de que o processo era provocado pela interferência do governo nos preços e pela deterioração da moeda.

Mises conclui,

Uma ordem social está fadada a desaparecer se as ações necessárias ao seu bom funcionamento são rejeitadas pelos padrões morais, são consideradas ilegais pelas leis do país e são punidas pelos juízes e pela polícia. O Império Romano se esfacelou por ter ignorado o liberalismo e o sistema de livre iniciativa. O intervencionismo e o seu corolário político, o governo autoritário, destruíram o poderoso império, da mesma forma que necessariamente desintegrarão e destruirão, sempre, qualquer entidade social.



A análise de Mises foi contínua e invariavelmente confirmada não somente em vários exemplos históricos específicos (processos de declínio e retrocesso da civilização, como, por exemplo, no norte e em outras partes da África; a crise em Portugal após a "Revolução dos Cravos"; a crônica doença social que afeta a Argentina, que era um dos países mais ricos do mundo antes da Segunda Guerra Mundial, mas que hoje, em vez de receber imigrantes, perde sua população continuamente; processos similares que estão devastando a Venezuela e outros regimes populistas na América Latina etc.), mas também, e acima de tudo, pelo experimento do socialismo verdadeiro, o qual, até a queda do Muro de Berlim, imergiu centenas de milhões de pessoas no sofrimento e no desespero.

Da mesma maneira, atualmente, em um mercado mundial totalmente globalizado, as forças descivilizadoras do assistencialismo, do sindicalismo, da manipulação monetária e financeira dos bancos centrais, do intervencionismo econômico, do aumento das regulações e da carga tributária, e da falta de controle das contas públicas estão ameaçando até mesmo aquelas economias que até então sempre foram consideradas as mais prósperas (os Estados Unidos e a Europa). Vivendo hoje uma encruzilhada histórica, estas economias estão lutando para se livrar das forças descivilizadoras da demagogia política e do poder dos sindicatos à medida que elas tentam retornar ao caminho do rigor monetário, do controle do orçamento, da redução de impostos e do desmantelamento da confusa e intricada rede de subsídios, intervenções e regulamentações que sufocam o espírito empreendedorial e infantilizam e desmoralizam as massas. Seu sucesso ou fracasso nesta empreitada irá determinar seu futuro e, mais especificamente, se elas irão continuar a liderar o avanço da civilização como fizeram até hoje, ou se, em caso de fracasso, elas deixarão a liderança da civilização para outras sociedades que, como as sociedades sino-asiáticas, se esforçam de maneira fervorosa e sem nenhum constrangimento para se tornarem as principais do novo mercado mundial globalizado.

É hoje evidente que a civilização romana não caiu em decorrência das invasões bárbaras: ao contrário, os bárbaros facilmente se aproveitaram de um processo social que já estava, por razões puramente endógenas, em marcante declínio e em estágio de avançado colapso.

Mises explicou desta maneira:

Os agressores externos simplesmente se aproveitaram de uma oportunidade que lhes foi oferecida pelo enfraquecimento interno do império. De um ponto de vista militar, as tribos que invadiram o império nos séculos IV e V não eram superiores aos exércitos que as legiões haviam derrotado facilmente algum tempo antes. Mas o império havia mudado; sua estrutura econômica e social tornara-se medieval.

Adicionalmente, o grau de regulação, estatismo e pressão tributária do império se tornou tão grande, que os próprios cidadãos romanos frequentemente preferiam se submeter aos invasores bárbaros por considerá-los um mal menor. Lactâncio, em seu tratado De Mortibus Persecutorum ("A morte dos perseguidores"), escrito no ano 314-315 d.C., afirma,

Chegou-se ao extremo de ser maior o número dos que viviam dos impostos do que o dos contribuintes, até que, por serem consumidos os recursos dos colonos pela enormidade dos impostos extraordinários, as terras foram abandonadas e os campos cultivados foram transformados em selvas. ... Numerosos governadores e subalternos oprimiam cada uma das regiões, inclusive quase a cada uma das cidades. Igualmente numerosos eram os funcionários do fisco, magistrados e substitutos dos prefeitos do Pretório, cuja atividade na ordem civil era escassa, mas intensa à hora de ditar multas e proscrições. As exações de todo tipo eram, já não direi frequentes, mas constantes, e os atropelos para levá-las a cabo, insuportáveis. (citado por Antonio Aparicio Pérez, La Fiscalidad en la Historia de España: Época Antigua, años 753 a.C. a 476 d.C., Madrid: Instituto de Estudios Fiscales, 2008, p. 313).

Claramente, esta situação se assemelha assombrosamente à atual situação mundial de várias maneiras, e uma legião de escritores já demonstrou como o atual nível de subsídios e regulamentações impõe um fardo desmoralizante e intolerável sobre o crescentemente molestado setor produtivo da sociedade. Com efeito, alguns poucos autores, como o espanhol Alberto Recarte, já tiveram a coragem de exigir uma redução "no número de funcionários públicos, particularmente aqueles cujo trabalho é regular, inspecionar e vigiar todas as atividades econômicas por meio da imposição de requerimentos legais custosos e extremamente intervencionistas" (El Desmoronamiento de España, Madrid: La Esfera de los Libros, 2010, p. 126). Sempre é necessário relembrar que todos nós dependemos da produção da atividade econômica privada. Sem ela, definhamos.

Em De Gubernatione Dei (IV, VI, 30), Salviano de Marselha escreve,

Enquanto isso, os pobres estão despojados, as viúvas gemem e os órfãos são pisados a pés, a tal ponto que muitos, incluindo gente de bom nascimento e de boa instrução, se refugiam junto aos inimigos para não perecer à perseguição pública. Eles vão procurar nos bárbaros a misericórdia dos romanos, uma vez que eles não mais toleram a inclemência bárbara que encontram nos romanos. São dife­rentes dos povos onde buscam refúgio; nada têm das suas manei­ras, nada têm da sua língua e, seja-me permitido dizer, também nada têm do odor fétido dos corpos e das vestes dos bárbaros; mas preferem sujeitar-se a essa dissemelhança de costumes a sofrer, entre os romanos, a injustiça e a crueldade. Assim, emigram para os Godos ou para os Bagaldos, ou para os outros bárbaros que em toda a parte dominam, e não se arrependem de sua expatriação, pois preferem viver livres sob a aparência da escravidão que de serem escravos sob a aparência da liberdade (citado em ibid., pp. 314?315).
Finalmente, em seu Historiæ adversum Paganos ("Histórias contra os Pagãos"), o historiador Paulo Orósio conclui,

Os bárbaros passaram a detestar suas espadas, trocaram-nas pelo arado e estão afetuosamente tratando o resto dos romanos como camaradas e amigos, de modo que agora, entre eles, podem ser encontrados alguns romanos que, vivendo com os bárbaros, preferem a liberdade com pobreza a pagar tributos e viver com ansiedade entre seus semelhantes.

Não sabemos se, no futuro, a civilização ocidental, que prosperou até hoje, será substituída pela civilização de outros povos que hoje podem ser considerados "bárbaros". No entanto, temos de estar certos sobre duas coisas: primeiro, em meio à mais severa recessão a assolar o mundo ocidental desde a Grande Depressão de 1929, caso fracassemos em aplicar as medidas essenciais — isto é, desregulamentação, especialmente no mercado de trabalho, redução nos impostos e no intervencionismo econômico, maior controle sobre os gastos públicos e a eliminação de subsídios e protecionismos —, corremos o risco de perder muito mais do que apenas o poder de compra da moeda; e segundo, se perdermos em definitivo a batalha da competitividade no mercado mundial globalizado, e entrarmos em um declínio crônico, tal derrota não terá sido por causa de fatores exógenos, mas sim em decorrência de nossos próprios erros, falhas, omissões e deficiências morais.


Não obstante tudo isso, gostaria de finalizar com uma nota de otimismo. É verdade que enfrentamos vários desafios, e é muito fácil nos tornarmos desanimados em decorrência da abundância de inimigos da liberdade que vicejam por todos os lados. Mas também é verdade que, contrariamente à cultura dos subsídios, da irresponsabilidade, da falta de princípios morais e da dependência do estado para tudo, há também, surgindo das cinzas entre vários jovens (e também entre aqueles de nós que já não são mais tão jovens), a cultura da liberdade empreendedorial, da criatividade, da assunção de risco e do comportamento baseado em princípios morais. Em suma, a cultura da maturidade e da responsabilidade (em oposição ao infantilismo ao qual nossas autoridades e políticos gostariam de nos restringir com o intuito de nos tornar cada vez mais servis e dependentes). Para mim, está claro quem possui as melhores armas morais e intelectuais, e que, por isso, são os donos do futuro. É por isso que sou um otimista.


professor de economia da Universidade Rey Juan Carlos, em Madri, é o principal economista austríaco da Espanha. Autor, tradutor, editor e professor, ele também é um dos mais ativos embaixadores do capitalismo libertário ao redor do mundo. Ele é o autor da monumental obra Money, Bank Credit, and Economic Cycles.

A AMEAÇA DA CONCENTRAÇÃO BANCÁRIA NO BRASIL



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Quais as ameaças geradas por instituições financeiras que se tornam "grandes demais para quebrar"?

Já estamos no quarto ano da grande crise financeira do novo milênio e os bancos "grandes demais para quebrar" se tornaram ainda maiores. Foram vários os casos de fusões forçadas, estatizações, aquisições de instituições insolventes — tudo sob a anuência, para não dizer a exigência, dos Bancos Centrais.

No dia 4 de novembro de 2011, o Financial Stability Board — órgão internacional que monitora e faz recomendações sobre o sistema financeiro global — publicou um relatório enumerando 29 instituições de importância global. Nenhum banco brasileiro entrou na lista. Em termos de ativos, nossos bancos não estão nem entre os cinquenta primeiros em nível global.

Isso, no entanto, não significa que não tenhamos nossos próprios "grandes demais para quebrar". Temos, sim. Mais ainda: nosso sistema bancário está perigosamente seguindo a mesma tendência internacional. Os bancos brasileiros se tornaram ainda maiores nos últimos quatro anos. Qualquer que seja a métrica utilizada para a análise, a inevitável conclusão é a de que o sistema bancário brasileiro está se tornando mais concentrado (ver gráfico 1); e, como uma indústria, sua fatia no PIB brasileiro vem crescendo rapidamente.

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Gráfico 1: ativos e depósitos bancários totais — Fonte: BACEN e VOGA

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Gráfico 2: ativos dos bancos e PIB — Fonte: BACEN e VOGA

A tendência desde a implantação do real


A introdução do real, em julho de 1994, e a consequente estabilização da inflação foram os principais motores da consolidação bancária ocorrida no final da década de 1990 e início da de 2000. Após várias privatizações, fusões, aquisições e liquidações de bancos públicos estaduais e federais, o número de bancos em operação no Brasil declinou de 248 para 133 em 2007 (esta cifra leva em conta bancos comerciais, de investimento e outros, com a exceção de cooperativas de crédito). Até o presente momento, este número segue inalterado. Embora a quantidade de instituições financeiras possa indicar o quanto o sistema bancário foi reduzido a alguns poucos grandes bancos, é necessário também analisar o percentual de ativos e depósitos controlados pelos principais bancos (gráfico 1, que não inclui o BNDES).

A tendência é clara: um pequeno número de bancos passou a concentrar um valor crescente de ativos e depósitos durante os últimos 17 anos. A fusão do Itaú com o Unibanco em 2008 — à época, o segundo e o sexto maiores bancos, respectivamente — provocou um salto significativo no gráfico, elevando o percentual de ativos dos cinco maiores bancos para quase 80%.

Entre as cinco maiores instituições temos o Banco do Brasil (BB), o Itaú-Unibanco, o Bradesco, a Caixa Econômica Federal (CEF) e o Santander. O primeiro e o quarto são bancos públicos. Repetindo o que foi dito neste artigosobre a reestatização do crédito no Brasil, "estas gigantescas instituições financeiras ainda moldam uma considerável fatia da economia brasileira atualmente."

Por controlarem uma enorme fatia de ativos — dentre eles, empréstimos para empresas e pessoas — e depósitos, estes bancos certamente podem ser definidos como "bancos domésticos sistemicamente importantes" de acordo com o termo técnico criado pelo Comitê de Supervisão Bancária da Basileia, um mero eufemismo para "grandes demais para quebrar".

O crescimento no tamanho do setor bancário como um todo é claramente visualizado pela proporção do total de ativos em relação ao PIB do país, como mostrado no gráfico 2. Se os bancos brasileiros já eram grandes e concentrados no passado recente, eles certamente estão maiores hoje, e bem mais concentrados.

À medida que a economia brasileira vai se tornando cada vez mais alavancada, com o crédito aumentando em relação ao PIB assim como o endividamento das famílias, o lado esquerdo dos balancetes dos bancos cresce a um ritmo mais acelerado do que o do restante da economia. E essa tendência de concentração do setor bancário não é um fenômeno restrito ao Brasil; com efeito, internacionalmente, esta é a regra e não a exceção.

Parece haver uma tendência de aumento contínuo no tamanho do setor bancário, levando a uma maior concentração nas mãos de poucas instituições. Embora economias de escala naturalmente exerçam uma função nestas tendências de consolidação, o moderno sistema bancário usufrui algumas características peculiares que o torna distinto de todas as outras indústrias da economia, características essas que são essenciais para consolidar esta tendência de concentração.

Por que os bancos crescem

Alguns economistas argumentam que a principal atividade dos bancos é saber gerenciar a maturação de seu portfólio, isto é, saber como tomar empréstimos de curto prazo e fazer empréstimos de longo prazo. A verdade é que um termo mais preciso para isso seria "maturação descompassada", que é o que ocorre quando o passivo dos bancos vence antes da maturação de seus ativos.

Tecnicamente, qualquer empresa pode praticar a maturação descompassada, seja ela uma siderúrgica ou uma mercearia. Mas o empreendedor tem de ter a certeza de que seu passivo não vencerá antas da maturação de seus investimentos. Uma restrição de liquidez pode se transformar em um problema de solvência caso os ativos tenham de ser rapidamente vendidos (o que tende a fazer com seus preços caiam) ou caso os passivos não possam ser rolados.

No entanto, as práticas do atual sistema bancário são caracterizadas não somente pela maturação descompassada, mas pela excessiva maturação descompassada. Como isso é possível? Por meio de um gracioso privilégio concedido aos bancos conhecido como reservas fracionárias. Como explicado neste artigo, "a maturação descompassada é uma especulação de risco. E a prática de reservas fracionárias é uma maturação descompassada em ampla escala." Para uma explicação mais detalhada desta prática, recomendo enormemente a leitura do artigo linkado.

Confiando na experiência dos banqueiros de que nem todos os correntistas demandarão a restituição em espécie de seus depósitos, os bancos, por meio das reservas fracionárias, fazem com que um depósito inicial seja utilizado para criar múltiplos empréstimos, empréstimos esses que utilizam dinheiro (no caso, meros dígitos eletrônicos) criado do nada, criado por meio de uma simples entrada contábil.

Em suma, a prática de reservas fracionárias permite que os bancos criem passivos de curto prazo (os depósitos de seus correntistas) ao mesmo tempo em que mantêm apenas uma pequena fração de ativos líquidos de curto prazo (dinheiro em caixa, também chamado de 'reservas'), sendo que o restante de seus ativos (a vasta maioria) está na forma de investimentos de longo prazo (empréstimos). Mas quanto os bancos geralmente mantêm em suas reservas?

Nos tempos atuais, determinar tal quantidade é uma tarefa de responsabilidade dos Bancos Centrais. É o Banco Central quem determina o nível de reserva que os bancos sob sua jurisdição devem manter. Quanto maior este requerimento de reserva (popularmente conhecido como "compulsório", o qual vamos designar pela letra "c"), menor a capacidade de o sistema bancário expandir o crédito.

No entanto, esta não é a única restrição à capacidade dos bancos de expandirem o crédito por meio da criação de novos empréstimos.

Quando o Banco A concede um novo empréstimo, o tomador do empréstimo utiliza este dinheiro recém-criado para, por exemplo, pagar seu fornecedor. Se este fornecer possuir uma conta no Banco B, assim que ele depositar o pagamento em seu banco, o Banco B irá requerer a transferência de fundos do Banco A. Ato contínuo, o Banco A verá o nível de suas reservas diminuir, o que irá restringir sua capacidade de criar novos empréstimos.

Logo, quanto maior a clientela de um banco, maior será a probabilidade de que os depósitos que ele criar na forma de empréstimos não diminuirão suas reservas. Colocando de outra forma, quanto maior o banco, menor a probabilidade de ele perder reservas em decorrência de pedidos de transferência de outros bancos. 

Chamemos de "k" a probabilidade de um tomador de empréstimo fazer pagamentos para outros clientes que possuem conta em seu mesmo banco. Sob um sistema bancário de reservas fracionárias, c e k possuem efeitos opostos sobre a capacidade de expansão do crédito: quanto maior o compulsório c, menor a capacidade dos bancos de criarem novos empréstimos; por outro lado, quanto maior o k maior será a capacidade expandir o crédito.

Nos principais países desenvolvidos, os Bancos Centrais estipularam o compulsório ("c") em níveis perto de 0%. Não havendo mais espaço para reduzir o c, a única maneira restante de aumentar a capacidade de criar novos empréstimos e depósitos é aumentando o k, isto é, a concentração dos bancos.

E como é no Brasil? Historicamente, o Banco Central sempre estipulou compulsórios altos para os depósitos em conta-corrente. Atualmente, a taxa do compulsório para estes depósitos é de mais de 40%, ao passo que, para os depósitos em poupança e a prazo, o compulsório é de 20%.

Em face desta significativa restrição à expansão do crédito, os bancos brasileiros estão sob ainda maior pressão do que seus congêneres europeus e americanos para fazerem fusões. A necessidade de se aumentar o k é muito maior no Brasil.

A prática de reservas fracionárias por parte dos bancos possui dois interessantes efeitos econômicos: de um lado, estimula os bancos a se fundirem, a se tornarem mais concentrados e, consequentemente, a se agigantarem; de outro, por meio da maciça expansão do crédito, permite que os bancos aumentem seus ativos, passando a representar uma fatia crescente do PIB, pelo menos até que haja uma crise bancária completa. O que nos leva à próxima seção.

Comparação com o resto do mundo

A Islândia é um exemplo característico que ilustra o último parágrafo. Em 2007, os três maiores bancos islandeses detinham praticamente 80% do total dos ativos bancários do país. E em termos de porcentagem do PIB, todos os ativos bancários totalizavam mais de 1.300% — ou seja, eram 13 vezes o valor do PIB do país.

Qualquer que seja o critério escolhido, esta cifra não é nada pequena. Os bancos islandeses cresciam ininterruptamente — até finalmente um colapso espetacular sacudir o país nórdico. Em 2011, as ativos bancários em relação ao PIB caíram para "meros" 521%, menos da metade do que eram quatro anos antes. Ainda assim, um número enorme quando comparado às outras nações desenvolvidas. Não obstante, uma contração impressionante. No Brasil, tal cifra é de 124%.
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Gráfico 3: ativos bancários em relação ao PIB — Fonte: Banco Mundial, BIS, Bancos Centrais e Voga


Outro exemplo de como os bancos vêm aumentando seu tamanho absoluto pode ser encontrado no Reino Unido.

Em um trabalho apresentado durante a 12ª Conferência Bancária Internacional realizada pela sucursal do Fed de Chicago, Andrew G. Haldane, do Banco Central da Inglaterra, analisou os balancetes dos bancos britânicos em relação ao PIB desde 1880. "A relação é permaneceu estável por quase um século, em aproximadamente 50%. Durante este período, os ativos bancários cresceram praticamente em linha com o PIB. Porém, a partir dos anos 1970, este padrão alterou-se acentuadamente. No início deste século, os balancetes dos bancos já eram mais de 5 vezes o PIB anual do Reino Unido. No espaço de uma geração, o setor bancário, com o apoio do governo, decuplicou seu tamanho", concluiu ele.

Por que os anos 1970? O autor não ofereceu nenhuma explicação. Mas há uma. E ela está diretamente relacionada ao fechamento da janela do ouro em 1971 pelo então presidente americano Richard Nixon.

Quando o sistema de Bretton Woods se esfacelou e o último elo do dólar ao ouro foi rompido, sumiram todas as amarras que impediam os Bancos Centrais de injetar liquidez no sistema bancário. Sem nenhuma ligação ao ouro, e com um papel-moeda puramente fiduciário, os Bancos Centrais agora são capazes de socorrer bancos insolventes em qualquer circunstância. Sob um padrão-ouro, tal resgate é impossível.

Quando comparados aos seus congêneres internacionais, os bancos brasileiros ainda representam uma fatia relativamente pequena do PIB doméstico. No entanto, ela está crescendo rapidamente. Ademais, o sistema financeiro do país está se tornando cada vez mais concentrado nas mãos de poucos bancos. Uma situação paradoxal, já que um sistema bancário mais concentrado reduz a probabilidade de crises sistêmicas. Mas, se elas ocorrerem, podem ser extremamente paralisantes.

Conclusão

Os problemas evidenciados pelo prejuízo de US$2 bilhões sofrido pelo JP Morgan com operações de derivativos, pelo escândalo da manipulação da taxa Libor e pela confissão do governo brasileiro de que havia identificado as supostas fraudes no banco Cruzeiro do Sul dois anos antes de sua intervenção mostram que a regulamentação e a supervisão governamental do setor bancário não garantem segurança alguma. Desnecessário relembrar o fracasso retumbante dos Acordos de Basileia II (tópico coberto em detalhes neste artigo).

Em vez de estimular fusões entre instituições financeiras, os Bancos Centrais deveriam promover medidas para reduzir a concentração bancária. No entanto, atacar somente a concentração bancária, sem levar em consideração as forças fundamentais que estimulam a concentração do setor — no caso, as reservas fracionárias — significa apenas sair criando mais regulamentação e mais supervisão governamental.

É, portanto, essencial entender que o estímulo à concentração bancária não advém apenas dos altos lucros gerados pela expansão do crédito, mas também do simples instinto de sobrevivência dos bancos.

Quando uma crise bancária se instala, fusões e aquisições são alternativas óbvias para as falências bancárias. Tais alternativas podem acabar produzindo uma maior concentração no setor, mas isso é preferível a uma quebra generalizada e um subsequente risco de colapso sistêmico.

Infelizmente, enquanto o sistema bancário de reservas fracionárias não for trazido para o centro do debate, todas as outras formas de contenção da crise financeira por meio de aumento de regulamentações estarão fadadas ao fracasso, uma vez que os bancos inevitavelmente sempre serão mais espertos que seus reguladores e supervisores.

Embora um sistema bancário altamente concentrado diminua o risco de falências bancárias isoladas, ainda assim, caso um banco de fato se torne insolvente, ele gerará um grande risco de colapso sistêmico. A própria natureza do sistema bancário de reservas fracionárias produz instabilidade sistêmica.

Apesar de os bancos brasileiros serem bem capitalizados e estarem auferindo altos lucros, qualquer problema de liquidez pode derrubar até mesmo um banco muito lucrativo e bem capitalizado em questão de dias, obrigando o BACEN a se apresentar para o socorro.

As autoridades políticas e monetárias brasileiras terão grandes problemas pela frente, já que elas terão de, de um jeito ou de outro, atacar as complicações geradas por bancos "grandes demais para quebrar", os quais estão continuamente se tornando cada vez maiores — especialmente os bancos públicos: altamente alavancados, altamente expostos ao mercado imobiliário e, ainda assim, abocanhando uma fatia cada vez maior do mercado por meio da "democratização" do crédito.

Fernando Ulrich formado em administração de empresas pela PUC-RS, concluiu em julho de 2010 o programa de mestrado em economia austríaca comandado por Jesús Huerta de Soto em Madri, Espanha.  Atualmente trabalha no mercado financeiro. 
O artigo  foi extraído do um boletim informativo mensal escrito para a empresa VOGA.