segunda-feira, 17 de setembro de 2012

O DOMÍNIO DOS FATOS

Às vésperas da primeira parte em que políticos petistas e outros, de partidos aliados, serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal pela acusação de compra de votos em troca de apoio político, a revista Veja traz este fim de semana um relato, atribuído ao lobista Marcos Valério, incriminando o ex-presidente Lula no mensalão. 

Já condenado a muitos anos de prisão, e sendo provável que até o final do julgamento deva ser condenado a outros tantos por novos crimes, Valério já tem a certeza de que ficará na cadeia por longo tempo, e estaria revoltado com o abandono a que seus amigos do PT o relegaram. 

Segundo o relato, Valério acusa Lula de ser o verdadeiro chefe da trama criminosa, e dá detalhes de quem viveu por dentro a intimidade dos palácios presidenciais. 

De concreto, em termos do julgamento, nem essas revelações nem as acusações anteriores de advogados dos réus têm o condão de incluir o ex-presidente no rol dos acusados nesta Ação Penal 470. Mas os estragos políticos são devastadores, e nada impede que uma denúncia seja feita contra Lula mais adiante. 

No próprio julgamento, o advogado Luis Francisco Barbosa, que defende Roberto Jefferson, acusou o ex-presidente Lula de ser o verdadeiro mandante dos crimes. 

Ele se baseou na tese do “domínio final do fato”, que levou o Procurador-Geral a acusar o ex-ministro José Dirceu como o “chefe da quadrilha”. “Não só sabia como ordenou o desencadeamento de tudo isso que essa ação penal escrutina. Aqueles ministros eram apenas executivos dele”, garantiu o advogado, referindo-se a José Dirceu, Luiz Gushiken e Anderson Adauto. 

Pelo menos um deles, José Dirceu, disse certa vez que não fazia nada sem o conhecimento de Lula. Para provar sua tese, Barbosa fez um relato muito semelhante ao do Procurador-Geral, ligando fatos e consequências, apelando para o bom-senso dos juízes, pois não tem “atos de ofício” que provem sua acusação. 

E acusou Roberto Gurgel de prevaricação por ter “sentado em cima” de um pedido formal para incluir Lula entre os réus do mensalão. 

Anteriormente, em setembro de 2011, o advogado Marcelo Leonardo afirmou, nas alegações finais apresentadas ao Supremo Tribunal Federal na defesa de Marcos Valério, que faltava alguém no banco dos réus. 

Usando o mesmo raciocínio que Veja atribui a Marcos Valério, segundo quem “apenas os mequetrefes” estão sendo condenados, escreveu o advogado na ocasião: “É um raríssimo caso de versão acusatória de crime em que o operador do intermediário aparece como a pessoa mais importante da narrativa, ficando mandantes e beneficiários em segundo plano. (...) Alguns, inclusive, de fora da imputação, embora mencionados na narrativa, como o próprio presidente Lula”. Relatos anteriores davam conta que Marcos Valério, deprimido, enviara diversas mensagens para seus interlocutores no PT, principalmente a Paulo Okamoto, ex-tesoureiro do PT e amigo íntimo de Lula, ameaçando revelar detalhes do envolvimento do ex-presidente no mensalão. 

Paulo Okamotto admitiu recentemente ter conversado com Marcos Valério em diversas ocasiões nos últimos tempos, mas ao contrário de acalmar o publicitário mineiro, as conversas tinham um motivo mais trivial do que chantagens, embora inverossímil: “Ele queria me encontrar porque às vezes queria saber como está a política, preocupado com essas coisas”. 

Lembrando que o próprio Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, acusou o esquema de ter sido tramado de dentro do Palácio do Planalto, o advogado de Jefferson disse que seria uma ofensa a Lula afirmar que ele não sabia de nada: 

"Claro que sua excelência (Gurgel) não pode afirmar que o presidente da República fosse um pateta, um deficiente, que sob suas barbas estivesse acontecendo tenebrosas transações e ele não soubesse nada", concluiu Luis Francisco Barbosa. 

Nas vezes anteriores em que deixou vazar ameaças contra seus parceiros petistas, o publicitário Marcos Valério recuou. Diante da situação concreta de se ver na cadeia por muito tempo, é possível que Valério tenha perdido a esperança de ser salvo, apesar das promessas que diz ter recebido. 

Os petistas garantiram a ele que adiariam o julgamento o mais que pudessem, e que as penas, em último caso, seriam brandas. A realidade tem sido bastante diferente. 

Alguns ministros do Supremo deixaram escapar, no início do julgamento, que pela tese do “domínio final do fato”, se a cadeia de comando não terminasse no ex-ministro José Dirceu, teria forçosamente que subir um patamar e atingir o ex-presidente Lula.Por: Merval pereira

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