domingo, 16 de setembro de 2012

ULTRACONSERVADORES


A imprensa brasileira sempre se refere aos Republicanos americanos como “ultraconservadores”. Quando Paul Ryan foi escolhido como vice na chapa de Mitt Romney, o destaque em nossa mídia foi o mesmo em todo lugar: um “ultraconservador” fora apontado para satisfazer os anseios da direita radical do “Tea Party”. Os membros deste movimento chegaram a ser chamados de “fascistas” pelo colunista Arnaldo Jabor em artigo recente.

Faz sentido usar este rótulo? O que defende, via de regra, o Partido Republicano? Quais são as ideias de Paul Ryan? Há alguma semelhança entre tais ideias e o fascismo, cujo ícone máximo foi Mussolini?

Antes de entrar na questão, vale dizer que não nutro muita simpatia pelos conservadores americanos. Considero-me um liberal, não no sentido americano, cuja esquerda “progressista” usurpou até mesmo o termo, que em seu conceito clássico quer dizer mais liberdade individual (entendida como ausência de coerção estatal). E os liberais clássicos possuem importantes divergências com os neoconservadores americanos, que ignoram em boa parte a tradição conservadora inglesa, que data de Edmund Burke.

Dito isso, quais são as principais bandeiras conservadoras nos Estados Unidos hoje? Se dependesse de nossa imprensa, a imagem pintada seria a de um neandertal. Nossos colunistas e jornalistas olham para a direita americana como se esta fosse formada basicamente por fundamentalistas religiosos, saudosistas da era medieval, que adorariam puxar suas mulheres pelo cabelo e manter escravos negros.

Naturalmente, uma pequena parcela da ala mais reacionária pode até se encaixar neste estereótipo, mas não faz nenhum sentido generalizar desta forma. Seria como dizer que todos os Democratas são comunistas que sonham com o modelo soviético, porque eles sem dúvida existem no partido.

Portanto, quando nossos “especialistas” pintam este quadro medonho, de criacionistas que abominam a ciência e de individualistas insensíveis que não ligam para os pobres, podemos estar certos de que se trata de uma caricatura absurda e injusta, feita deliberadamente ou por ignorância. Ao colocarem todos no mesmo saco, pretendem contaminar uma direita legítima com os excessos de um extremo numericamente insignificante.

E o que prega a direita então? Podemos usar até mesmo os radicais do “Tea Party” como exemplo. Sim, há gente extremista ali, manipulada por populistas de plantão. Mas, na essência, a mensagem libertária do movimento não guarda absolutamente nenhuma similaridade com aquilo que poderia ser chamado de “ultraconservador”, muito menos “fascista”. Na verdade, trata-se da antítese do fascismo!

Ora, o “Tea Party” defende muito menos estado, até mesmo um estado mínimo, que interfere muito pouco na vida dos indivíduos. O que há em comum com o fascismo, onde tudo é dentro do estado, para o estado? A visão autoritária, que trata cidadãos como súditos incapazes que necessitam da tutela estatal, está justamente representada pela esquerda democrata americana, cada vez mais intervencionista, a ponto de alguns falarem em “fascismo de esquerda”. Lembremos que o próprio Mussolini foi socialista.

Tentando resumir as principais bandeiras da direita americana, sabendo que vou pecar pelo simplismo, elas seriam: maior autonomia individual, sem tanto controle paternalista estatal; livre mercado, sem tantos resgates e subsídios por parte do governo; uma visão de papel predominante dos Estados Unidos como nação que lidera o mundo pelo exemplo (e pela força, quando necessário); o resgate de valores familiares tradicionais.

O resumo acima é muito reducionista e não abrange a complexidade da política americana. Mas acredito ter abordado os principais pontos, e justamente aqueles que tanto incomodam a nossa esquerda. Você é contra a tentativa de Obama de criar o SUS americano? Você acha que o estado não deve ser empresário nem arrecadar quase a metade do que é produzido pela iniciativa privada em nome da “justiça social”? Você rejeita o aborto e não acha legal ter um filho gay, ainda que respeite as escolhas no âmbito individual? Você não abraça o multiculturalismo sem restrições, por considerar que os valores da civilização Ocidental são superiores ao do Islã? Você é contra a legalização de todas as drogas?

Então parabéns: você é um “ultraconservador” pela ótica de nossa imprensa. Claro que é possível discordar de parte dessas crenças conservadoras sem ser um socialista. Eu mesmo tenho discordâncias com algumas posturas da direita americana, como já disse. Mas isso é bem diferente de rotular alguém de “ultraconservador” só porque não aderiu ao credo politicamente correto dos “progressistas”, defensores de altos impostos, tutela paternalista do estado e total relativismo moral.

Temo o dia em que uma pessoa que discorda da ideia “progressista” de que manter um harém de meninas, meninos e até cabras, ou de tirar à força 75% do ganho dos mais ricos, seja tachado por nossa mídia de “ultraconservador”. O termo perdeu totalmente seu sentido.
Por: Rodrigo Constantino

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