terça-feira, 13 de novembro de 2012

TEMPOS SOMBRIOS, TEMPOS PETISTAS

Luiz Inácio Lula da Silva está calado. O que é bom, muito bom. Não mais repetiu que o mensalão foi uma farsa. Também, pudera, após mais de três meses de julgamento público, transmitido pela televisão, com ampla cobertura da imprensa, mais de 50 mil páginas do processo armazenadas em 225 volumes e a condenação de 25 réus, continuar negando a existência da "sofisticada organização criminosa", de acordo com o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, seria o caso de examinar o ex-presidente. Mesmo com a condenação dos seus companheiros - um deles, o seu braço direito no governo, José Dirceu, o "capitão do time", como dizia -, aparenta certa tranquilidade.


Como disse o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), Lula é "um sujeito safo". É esperto, sagaz. Conseguiu manter o mandato, em 2005, quando em qualquer país politicamente sério um processo de impeachment deveria ter sido aberto. Foi uma manobra de mestre. Mas nada supera ter passado ao largo da Ação Penal 470, feito digno de um Pedro Malasartes do século 21.

Mas se o silêncio público (momentâneo?) de Lula é sempre bem visto, o mesmo não pode ser dito das articulações que promove nos bastidores. Uma delas foi o conselho para que Dilma Rousseff não comparecesse à posse de Joaquim Barbosa na presidência do STF. Ainda bem que o bom senso vigorou e ela vai ao ato, pois é presidente da República, e não somente dos petistas. O artífice de diversas derrotas petistas na última eleição (Recife, Belo Horizonte e Campinas são apenas alguns exemplos) continua pressionando a presidente pela nomeação de um "ministro companheiro" na vaga aberta pela aposentadoria de Carlos Ayres Brito. E deve, neste caso, ser obedecido.

O ex-presidente quer se vingar do resultado do julgamento do mensalão. Nunca aceitou os limites constitucionais. Considera-se vítima, por incrível que pareça, de uma conspiração organizada por seus adversários. Acha que tribunal é partido político. Declarou recentemente que as urnas teriam inocentado os quadrilheiros. Como se urna fosse toga. Nesse papel tem apoio entusiástico do quarteto petista condenado por corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Eles continuam escrevendo, dando entrevistas, participando de festas e eventos públicos, como se nada tivesse acontecido. Ou melhor, como se tivessem sido absolvidos.

O que os petistas chamam de resistência não passa de um movimento orquestrado de escárnio da Justiça. José Dirceu, considerado o chefe da quadrilha por Roberto Gurgel, tem o desplante de querer polemizar com o ministro Joaquim Barbosa, criticando seu trabalho. Como se ele e Barbosa estivessem no mesmo patamar: um não fosse condenado por corrupção ativa (nove vezes) e formação de quadrilha e o outro, o relator do processo e que vai assumir a presidência da Suprema Corte. Pior é que a imprensa cede espaço ao condenado como se ele - vejam a inversão de valores da nossa pobre República - fosse uma espécie de reserva moral da Nação. Chegou até a propor o financiamento público de campanha. Mas os petistas já não o tinham adotado?

Outro condenado, João Paulo Cunha, foi recebido com abraços, tapinhas nas costas e declarações de solidariedade pelos colegas na Câmara dos Deputados. Já José Genoino pretende assumir a cadeira de deputado assim que abrir a vaga. E como o que é ruim pode piorar, Marco Maia, presidente da Câmara, afirmou que a perda de mandato dos dois condenados é assunto que deve ser resolvido pela Casa, novamente desprezando a Constituição.

O julgamento do mensalão desnudou o Partido dos Trabalhadores (PT). Sua liderança assaltou o Estado sem pudor. Como propriedade do partido. Sem nenhum subterfúgio. Os petistas poderiam ter feito uma autocrítica diante do resultado do julgamento. Ledo engano. Nada aprenderam, como se fossem os novos Bourbons. Depois de semanas e semanas com o País ouvindo como seus dirigentes se utilizaram dos recursos públicos para fins partidários, na semana que passou Dilma (antes havia se reunido com o criador por três horas) recebeu no Palácio da Alvorada, residência oficial, para um lauto jantar, líderes do PT e do PMDB. A finalidade da reunião era um assunto de Estado? Não. Interessava apenas aos dois partidos. Fizeram uma analise das eleições municipais e traçaram planos para 2014. Ninguém, em sã consciência, é contrário a uma reunião desse tipo. O problema é que foi num prédio público e paga com dinheiro público. Imagine o leitor se tal fato ocorresse nos EUA ou na Europa. Seria um escândalo. Mas na terra descoberta por Cabral, cujas naus, logo vão dizer, tinham a estrela do PT nas velas, tudo pode. E quem protesta não passa de golpista.

Nesta República em frangalhos, resta esperar o resultado final do julgamento do mensalão. As penas devem ser exemplares. É o que o STF está sinalizando na dosimetria do núcleo publicitário. Mas a Corte sabe que não será tarefa nada fácil. O PT já está falando em controle social da mídia, nova denominação da "censura companheira". Não satisfeito, defende também o controle - observe o leitor que os petistas têm devoção pelo Estado todo-poderoso - do Judiciário (qual, para eles, deve ser a referência positiva: Cuba, Camboja ou Coreia do Norte?). Nesse ritmo, não causará estranheza o PT propor que a Praça dos Três Poderes, em Brasília, tenha somente dois edifícios... Afinal, "aquele" terceiro edifício, mais sóbrio, está criando muitos problemas.

O País aguarda o momento da definição das penas do núcleo político, especialmente do quarteto petista. Será um acerto de contas entre o golpismo e o Estado Democrático de Direito. Para o bem do Brasil, os golpistas mensaleiros perderam. Mais que perderam. Foram condenados. E serão presos.

MARCO ANTONIO VILLA - HISTORIADOR; É PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS (UFSCAR) - O Estado de S.Paulo

QUEM SEREMOS NO FUTURO?

Acabo de assistir uma palestra do inventor e futurista Ray Kurzweil, que está passando uns dias na minha universidade nos EUA. Kurzweil ficou famoso por suas várias invenções, desde sintetizadores que podem simular sons de piano e outros instrumentos, até um software para cegos que transforma texto em voz. Escreveu vários best-sellers, onde explora como o avanço exponencial da tecnologia transformará profundamente a sociedade, redefinindo não só o futuro mas a própria noção do que significa ser humano.


Segundo Kurzweil, a revolução não só já começou como avança rapidamente em direção a um ponto final, "a Singularidade", quando máquinas e seres humanos formarão uma aliança que poderá nos tornar seres super-humanos. Ele prevê que chegaremos lá em 2045.

Segundo Kurzweil, em 2020 computadores serão poderosos o suficiente para simular o cérebro humano. Baseando seus argumentos numa lei empírica chamada "Lei dos Retornos Acelerados", em 25 anos o progresso da internet, a velocidade de processamento de dados, o acesso a bancos de dados, criarão tecnologias bilhões de vezes mais poderosas do que as que temos hoje. Por exemplo, os computadores da década de 70 eram um milhão de vezes mais caros e mil vezes menos eficientes do que o que temos hoje em nossos celulares, totalizando um aumento de bilhões de vezes em eficiência de computação por real. Ele prevê que em 2029 teremos entendido o funcionamento do cérebro humano, ao menos o suficiente para simularmos seu funcionamento em computadores que, à esta altura, serão bem mais poderosos do que nossos cérebros.

A singularidade, no caso da física dos buracos negros, de onde Kurzweil tomou sua inspiração, é um ponto além do qual não sabemos o que pode ocorrer. É onde as leis que usamos para descrever as propriedades da matéria, do espaço e do tempo deixam de fazer sentido. Isto não significa que é impossível compreender a singularidade, mas apenas que não temos as ferramentas teóricas para fazê-lo.

Já no caso da inteligência artificial, fica bem mais difícil prever o que poderá ocorrer. Toda tecnologia pode ser usada para o bem ou para o mal. Se, como Kurzweil, somos otimistas e vemos que a humanidade, em média, tem se beneficiado com o avanço tecnológico (vivemos mais e matamos melhor; mas matamos menos), a singularidade trará uma nova era na evolução da inteligência, onde o corpo será supérfluo: o que importará será a informação que nos define. Afinal, somos matéria arranjada segundo um plano, e este plano é uma sequência de instruções, ou seja, um programa.

Se podemos armazenar estas instruções, em princípio podemos recriá-las em qualquer máquina, como numa realidade virtual superavançada. Imagine um personagem do videogame Sims que é tão sofisticado que se considera vivo. Seremos ele. A realidade, tal qual a percebemos, pode ser simulada; basta mais informação, mais detalhes, mais velocidade de processamento. Se é este o nosso futuro, é bom começarmos a pensar nas suas várias consequências. E nos certificar que nossa informação terá um backup que não falhará ou poderá ser destruído por forças malignas. Por: Marcelo gleiser

A "PRIMAVERA ÁRABE" E O INIMIGO ISRAELENSE

Será que os ataques israelenses do passado se equiparam às atuais atrocidades cometidas por alguns estados árabes contra seu próprio povo?



Trinta e nove anos atrás, no dia 6 de outubro de 1973, estourou a terceira dentre as guerras mais importantes entre os árabes e Israel. A guerra durou apenas 20 dias. Os dois lados estiveram engajados em duas outras importantes guerras, a de 1948 e a de 1967.

A guerra de 1967 durou apenas seis dias. Mas essas três guerras não foram as únicas confrontações entre árabes e israelenses. Desde 1948 até nossos dias, muitos confrontos têm ocorrido. Alguns deles foram pequenos embates e muitos deles foram batalhas graves, mas não houve guerras tão importantes quanto as três citadas acima. O conflito árabe-israelense é o conflito mais complicado que o mundo já experimentou. No aniversário da Guerra de 1973 entre árabes e israelenses, muitas pessoas no mundo árabe estão começando a fazer muitas perguntas sobre o passado, o presente e o futuro, com respeito ao conflito árabe-israelense.

Umas das perguntas feitas agora é: qual foi o verdadeiro custo dessas guerras para o mundo árabe e seu povo? E a pergunta intrigante que nenhum cidadão árabe quer fazer é: qual foi o verdadeiro custo do não-reconhecimento de Israel em 1948 e por que os estados árabes não gastaram seus recursos com educação, cuidados com a saúde e com infraestrutura em vez de gastá-los em guerras? Mas, a pergunta mais difícil de todas, que nenhum cidadão árabe quer ouvir, é se Israel é o verdadeiro inimigo do mundo árabe e do povo árabe.

Decidi escrever este artigo depois que vi fotografias e li relatos sobre uma criança morrendo de fome no Iêmen, sobre o incêndio de um antigo mercado em Aleppo, na Síria, sobre o Sinai subdesenvolvido no Egito, sobre carros-bomba no Iraque e prédios destruídos na Líbia. As fotos e as reportagens foram mostradas na rede de comunicações Al-Arabiya, que é o sistema de notícias mais assistido e mais respeitado no Oriente Médio.

O que há de comum entre todas as coisas que vi é que a destruição e as atrocidades não são cometidas por um inimigo externo. A fome, a matança e a destruição nestes países árabes são cometidas pelas mesmas mãos que deveriam proteger e edificar a unidade desses países, além de salvaguardar os povos dessas nações. Portanto, a pergunta agora é: Quem é o verdadeiro inimigo do mundo árabe?

O mundo árabe gastou centenas de bilhões de dólares e perdeu dezenas de milhares de vidas inocentes lutando contra Israel, o qual considerava seu inimigo jurado de morte, um inimigo cuja existência nunca reconheceu. O mundo árabe tem muitos inimigos e Israel deveria estar no fim da lista. Os verdadeiros inimigos do mundo árabe são a corrupção, a falta de uma boa educação, a falta de bons cuidados com a saúde, a falta de respeito pela vida humana, e, finalmente, o mundo árabe teve muitos ditadores que usaram o conflito árabe-israelense para subjugar seu próprio povo.

As atrocidades desses ditadores contra seu próprio povo são muitíssimo piores do que todas as guerras árabe-israelenses juntas.

No passado, conversamos sobre os motivos pelos quais alguns soldados israelenses atacam e maltratam os palestinos. Também vimos aviões e tanques israelenses atacarem os países árabes. Mas, será que esses ataques se equiparam às atuais atrocidades cometidas por alguns estados árabes contra seu próprio povo?

Na Síria, as atrocidades estão além da imaginação de qualquer pessoa. E, não são os iraquianos que estão destruindo seu próprio país? Não foi o ditador da Tunísia que teve a coragem de furtar 13 bilhões de dólares dos pobres tunisianos? E como pode uma criança morrer de fome no Iêmen, se aquela é a terra mais fértil de todo o mundo? Por que os grandes cérebros iraquianos iriam embora do Iraque, um país que ganha mais de 110 bilhões de dólares em exportação de petróleo? Por que os libaneses fracassam em governar um dos menores países do mundo? E o que foi que fez os estados árabes começarem a afundar no caos?

No dia 14 de maio de 1948, foi declarado o Estado de Israel. E apenas um dia depois, em 15 de maio de 1948, os árabes declararam guerra contra Israel para tomar de volta a Palestina. A guerra terminou em 10 de março de 1949. Ela durou nove meses, três semanas e dois dias. Os árabes perderam a guerra e a chamaram de Nakbah (guerra catastrófica). Os árabes não ganharam nada e os palestinos se tornaram refugiados.

E, em 1967, os árabes, liderados pelo Egito sob o governo de Gamal Abdul Nasser, entraram em guerra contra Israel e perderam mais terra palestina e fizeram mais refugiados palestinos, que agora estão à mercê dos países que os hospedaram. Os árabes chamaram a essa guerra de Naksah (revés). Os árabes nunca admitiram a derrota nessas duas guerras e a causa palestina tornou-se ainda mais complicada. E agora, com a interminável "primavera árabe", o mundo árabe não tem tempo para os refugiados palestinos ou para a causa palestina, porque muitos árabes são, eles mesmos, refugiados e estão debaixo de constantes ataques de suas próprias forças armadas. Os sírios estão indo embora de seu país, não porque os aviões israelenses estão soltando bombas sobre eles. É a Força Aérea Síria que os está bombardeando. E agora, os muçulmanos árabes iraquianos, os mais inteligentes cérebros, estão indo embora do Iraque para o Ocidente. No Iêmen, a mais triste tragédia humana do mundo está sendo escrita pelos iemenitas. No Egito, o povo do Sinai está abandonado.

Finalmente, se muitos dos estados árabes estão em tal desordem, o que aconteceu ao inimigo jurado deles (Israel)? Israel tem hoje as instalações para pesquisas mais avançadas, as melhores universidades e a mais avançada infraestrutura. Muitos árabes não sabem que a expectativa de vida dos palestinos que vivem em Israel é muito maior que a de muitos países árabes e que eles gozam de muito mais liberdade social e política do que muitos de seus irmãos árabes. Mesmo os palestinos que vivem sob a ocupação israelense na Margem Ocidental e na Faixa de Gaza desfrutam de mais direitos políticos e sociais do que em alguns lugares no mundo árabe. Um dos juízes que mandou o ex-presidente israelense para a cadeia não era israelense-palestino?

A "primavera árabe" mostrou ao mundo que os palestinos são mais felizes e estão em melhores condições do que seus irmãos árabes que lutaram para libertá-los dos israelenses. Agora é a hora de parar com o ódio e as guerras e começar a criar melhores condições de vida para as futuras gerações árabes. (www.arabnews.com - www.Beth-Shalom.com.br)

Por: Abdulateef Al-Mulhim é um comodoro da reserva da Marinha Saudita que vive na Arábia Saudita. Publicado na revista Notícias de Israel.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A COR DO GATO



“Não importa se o gato é preto ou branco, desde que cace os ratos”. A linha célebre, pronunciada em 1961 por Deng Xiao-ping, produziu um gato furta-cor, que exerce efeitos ideológicos hipnóticos sobre a direita ultraliberal e a esquerda pós-soviética. Milton Friedman enxergou na China (e no Chile de Pinochet) um laboratório de ensaios para a doutrina da liberdade econômica absoluta, não limitada pela teia de direitos sociais e prerrogativas sindicais tecida no Ocidente. A esquerda irreformável, por sua vez, enxerga na China uma nova alternativa ao capitalismo, um contraponto aos Estados Unidos e um modelo ideal de concentração de poder nas mãos do Estado. Hoje, o gato chinês encontra-se diante de uma encruzilhada histórica: para continuar a caçar os ratos, ele precisa reinventar-se, frustrando seus admiradores nos dois pólos do espectro político.

A economia é o desafio número um. A fórmula do capitalismo de Estado propiciou um salto impressionante do PIB per capita, de cerca de US$ 1.000 em 1992 para quase US$ 8.400 em 2011, inscrevendo a China entre os países de média renda e resgatando milhões de camponeses da esfera da miséria. Contudo, o “milagre” realizou-se a partir de um patamar inicial muito baixo e na moldura favorável da expansão global financiada à base de crédito e endividamento. O ciclo da “acumulação primitiva” está se fechando no compasso do aumento dos custos do trabalho. Fábricas começam a se transferir das províncias litorâneas para o interior, em busca de mão-de-obra mais barata. As economias americana e europeia não são capazes de continuar a absorver o excedente chinês de poupança produtiva. Na China, encerrou-se a era do crescimento anual de dois dígitos e, para evitar uma trágica retração, a liderança que assume o poder tem a missão arriscada de buscar um novo equilíbrio por meio do estímulo à demanda interna.

A demografia é o segundo desafio. Sob a “política do filho único”, a China desviou-se da curva normal de transição demográfica. Nas últimas quatro décadas, a política antinatalista reduziu o incremento populacional em 300 milhões de pessoas. Em termos absolutos, a população chinesa começará a declinar antes de 2030. A idade média dos chineses aproxima-se de 35 anos. A proporção de idosos, com mais de 60 anos, saltará de 12,5% em 2010 para 20% em 2020. Na ausência de um sistema abrangente de seguridade social, o fenômeno gera poupança familiar compulsória, improdutiva e de longo prazo, comprimindo o consumo potencial. Jamais, na história, um país envelheceu antes de enriquecer. A redução da população ativa já se iniciou e experimentará aceleração. Verifica-se oferta insuficiente de mão-de-obra em algumas regiões e, de modo geral, a tendência ao envelhecimento contribui para o aumento dos custos do trabalho.


A questão da liberdade é o fio subterrâneo que interliga os desafios da economia, da demografia e da ecologia. Em 1989, a Primavera de Pequim, na Praça da Paz Celestial, foi suprimida a bala. Em seguida, com o relançamento das reformas econômicas, Deng Xiao-ping conseguiu firmar um contrato social temporário por meio do qual os chineses trocaram a demanda de liberdade pela expectativa de aumento sustentado dos níveis de renda e consumo. Hoje, quase um quarto de século depois, o intercâmbio tornou-se inviável, pois a liberdade converteu-se em condição tanto para a estabilidade quanto para a prosperidade.O terceiro desafio é ambiental – ou, precisamente, socioambiental. A matriz energética chinesa baseia-se no carvão mineral, responsável por 66% do consumo total. A queima de carvão em termelétricas tradicionais provoca elevadas emissões de gases de estufa e contamina o ar das cidades e regiões industriais. Nas periferias urbanas e nas áreas de extração mineral, a contaminação dos cursos fluviais e dos solos atinge níveis alarmantes. A construção de hidrelétricas, rodovias e ferrovias causa remoções em massa de populações e acende fogueiras de desespero. A imagem lendária de coesão social e disciplina confuciana nunca correspondeu à realidade chinesa. Atualmente, porém, o país conhece extensiva turbulência fragmentária, que se manifesta na forma de milhares de motins locais.

Greves operárias riscam, ano após ano, o cenário da China. Mais recentes são os protestos da nova classe média, que é o atual alicerce social do Partido Comunista. Na cidade portuária de Ningbo, jornadas de revolta provocaram o congelamento de um projeto de expansão de um complexo químico. Antes, em julho, manifestações de massa bloquearam a construção de uma refinaria de cobre em Shifang e de um duto de esgoto em Qidong. Na era das mídias sociais, os microblogs perfuram a muralha da censura estatal e descerram o véu que recobre a corrupção desenfreada no círculo interno do poder. Há três meses, sites oficiais republicaram um relatório destinado a altos dirigentes do Partido que alerta para a hipótese de “tumultos sociais generalizados ou revolução violenta”.

A expressão “armadilha da renda média” circula nos textos analíticos dos acadêmicos ligados à elite dirigente. Superada a etapa da “acumulação primitiva”, a China só evitará uma prolongada estagnação se engendrar um ciclo de expansão baseado no consumo interno, no investimento privado doméstico, na concorrência e na inovação. Tudo isso depende de segurança jurídica, direitos de propriedade, redes de proteção social, mecanismos de fiscalização do governo e vigência das liberdades públicas básicas. No fundo, o Partido está diante do supremo desafio de sabotar o sistema totalitário que assegura sua hegemonia.

O ex-primeiro-ministro Zhu Rongji, um visionário, pediu a realização de eleições competitivas para a direção do Partido. Ele sabe que já é hora de subverter a lição de Deng: a cor do gato tem importância crucial. Por: : Demétrio Magnoli Fonte: O Globo, 08/11/2012

A IMPORTÂNCIA DE UMA VISÃO DE FUTURO

"Nosso maior problema como prisioneiros de guerra", diz Viktor Frankl no seu livro "O Significado da Vida", "era não ter uma visão de futuro". 


Ao contrário de presos comuns, não havia para o prisioneiro de guerra uma data certa para a liberdade. 

Isto gerava consequências trágicas. 

Muitos prisioneiros de guerra achavam que seriam libertados antes do Natal de 1944, porque as Forças Inglesas e Americanas já haviam desembarcado na Normândia. 

Mas o Natal passou e a guerra somente acabaria em Junho de 1945. 

Decepcionados e desiludidos, centenas de prisioneiros morreram logo depois do Natal, sem explicação, numa frequência duas vezes o estatisticamente normal. 

Simplesmente desistiram de viver por acharem que não tinham mais futuro. Erraram por alguns meses. 

Nos últimos 30 anos, nossos filhos têm sido bombardeados pelos nossos intelectuais, imprensa e professores universitários que nosso país não tem futuro. 

Nos inúmeros textos escritos por intelectuais para as comemorações dos 500 anos do Descobrimento em vez de olharmos para um futuro a fazer, usaram a ocasião para mostrar que nem passado tínhamos. 

Intelectuais nos lembraram que somos um país de corruptos por termos sido colonizados por desterrados e criminosos, mas nunca revelam que nossas Universidades Públicas contratam mais professores de Sociologia e Política do que professores de Auditoria e Fiscalização. 

A USP tem um único professor de Auditoria e dezenas de professores de Filosofia e Sociologia, um que virou até Presidente do Brasil. 

Perdemos a nossa Visão de Futuro em 1964, quando imperava que a visão de futuro era a do administrador, do advogado, do engenheiro, do empresário, do empreendedor. 

Para estes, o futuro é para ser feito, com suor, lágrimas e trabalho, não simplesmente previsto com "modelos estatísticos". 

O futuro é nosso para ser criado da forma que desejamos, não "esperado" num Deus que o dará pela bola de cristal. 

Mas a Revolução de 1964 colocou no poder mais de 600 acadêmicos especializados em previsões, que controlam o país até hoje. 

O Japão e a Alemanha do pós guerra não pautaram sua reconstrução em previsões econométricas porque sequer tinham mais uma economia para ser prevista. 

Decidiram construir seu novo futuro ao ponto que suplantaram seus vencedores, a Inglaterra e os Estados Unidos, tal o poder desta postura perante o futuro. 

Precisamos resgatar a visão de futuro dos engenheiros, dos carpinteiros, empreendedores, advogados e administradores e rejeitar de vez a visão niilista dos previsores do futuro, que preveem o futuro da volatilidade, do câmbio, do juro para poder especular, e das previsões de curto prazo que levam a nada. 

Ficamos tão preocupados com as marolas que esquecemos de ver as ilhas do horizonte. 

Administradores muitas vezes quebram a cara não conseguindo fazer o que pretendiam, nem sempre criam empresas de sucesso como gostariam. 

Mas a favor dos administradores, eles têm o mérito de ter pelo menos tentado. 

Tentado fazer, em vez de simplesmente tentado prever, sentados em cátedras acadêmicas com suas redomas de vidro. 

Única forma de devolver aos nossos filhos um sentido para suas vidas é mostrar que existe uma outra visão de mundo, de ação construtiva e não de especulação que gerou a enorme crise de 2008. 

Afinal, o futuro é para ser feito não para ser previsto. Por: Stephen Kanitz



QUEM MANDA NO MUNDO?

Nas minhas leituras de juventude, mais de quatro décadas atrás, poucas perguntas me impressionaram como aquela que dá título à segunda parte de La Rebelión de las Masas, de José Ortega y Gasset: “Quién manda en el mundo?”

O filósofo não a formulava em sentido metafísico, onde poderia ser respondida por algo como “Deus”, “o acaso”, “a fatalidade”, mas em sentido geopolítico, e chegava à conclusão de que era uma lástima a Europa ter perdido seu posto de liderança, cedendo a vaga para a Rússia e os Estados Unidos.

A resposta parecia deslocada da pergunta. Estados, nações, governos e continentes não mandam. Quem manda são os indivíduos e grupos que os controlam. Antes da geo-política vem a política tout court. E aí tudo se complica formidavelmente. É fácil perceber quais Estados ou países predominam sobre os outros. Mas descobrir quem realmente manda num Estado ou país – e através dele manda nos outros -- é um desafio intelectual mais atemorizante do que o pode imaginar o analista político usual.

O verbo “mandar” vem do latim manus dare: quem manda empresta os seus meios de ação (sua “mão”) para que outros realizem algo que ele pensou. Um governante dá ordens a seus subordinados, mas, examinando bem, você verá que só raríssimos governantes, na História – um Napoleão, um Stálin, um Reagan –, foram eles próprios os criadores das idéias que realizaram. Os primeiros teóricos do Estado moderno acertaram na mosca quando inventaram a expressão “poder executivo”: em geral o homem de governo é o executor de idéias que ele não concebeu nem teria a capacidade – ou o tempo -- de conceber. E os que conceberam essas idéias foram os mesmos que deram a ele os meios de chegar ao governo para realizá-las. Quem são eles?

Aplicando a pergunta ao caso específico dos Estados Unidos, o sociólogo Charles Wright Mills, um dos mentores daNew Left, publicou em 1956 o livro que viria a se tornar um clássico: The Power Elite, “A Elite do Poder”. A resposta que ele encontrou tomava a forma de uma trama complicadíssima de grupos, famílias, empresas, serviços secretos oficiais e extra-oficiais, seitas, clubes, igrejas e círculos de relacionamentos pessoais ostensivos e discretos, incluindo amantes e call girls. A classe política, que culminava na pessoa do governante nominal, aparecia aí como a espuma na superfície de águas obscuras. Mills estava, obviamente, na pista certa. Mas ele morreu em 1962 e não teve a ocasião de presenciar um fenômeno que ele mesmo ajudou a produzir: a New Left tornou-se ela própria a elite do poder e perdeu todo interesse em “transparência”. Ao contrário: esmerou-se na opacidade ao ponto de colocar um completo desconhecido na presidência do país mais poderoso do mundo e cercá-lo de um muro de proteção que bloqueia toda tentativa de descobrir quem ele é, o que fez, com quem anda e que interesses representa. Se você quer ter uma idéia do que anda fazendo a elite do poder nos EUA, tem de buscar informação na outra ponta do espectro ideológico: os conservadores são os atuais herdeiros da tradição de estudos inaugurada por Wright Mills.

Graças a eles é que hoje a elite globalista fabiana, núcleo vivo do poder por trás de praticamente todos os governos do Ocidente, se tornou visível na sua composição e em detalhes do seu modus operandi ao ponto da quase obscenidade, tornando involuntariamente cômica a insistência de alguns em chamá-la de “poder secreto”. Clique no Google as expressões “Council on Foreign Relations”, “Bilderberg”, “Trilateral” e similares, e obterá mais informações do que seus neurônios poderão processar pelos próximos dez anos -- informações cujo nível de credibilidade varia desde a prova científica até a rematada invencionice.

Em compensação, pouco ou quase nada se sabe das fontes profundas do poder na Rússia, na China e nos países islâmicos. Mesmo as descrições que temos da classe dirigente visível nessas regiões do globo são esquemáticas e superficiais, sem comparação possível com o meticuloso Who’s Who da elite ocidental. Isso explica-se facilmente pela diferença de acesso às fontes de informação. Uma coisa é pesquisar em arquivos e bibliotecas ocidentais, sob a proteção das leis e instituições democráticas, podendo até, nos EUA, furar a barreira da má-vontade oficial por meio do Freedom of Information Act. Coisa totalmente diversa é tentar adivinhar o que se passa por trás das muralhas impenetráveis do establishment russo-chinês.

Nem a KGB nem os serviços secretos da China jamais deram acesso a pesquisadores independentes. Mesmo os arquivos do Partido Comunista da URSS voltaram a fechar-se após um breve período de tolerância, motivado não por algum súbito amor à liberdade, mas pela convicção ilusória, logo desmentida, de que os pesquisadores ocidentais eram majoritariamente simpáticos ao regime soviético.

No mundo islâmico, por baixo da classe dirigente e da barafunda de grupos terroristas estende-se uma rede inabarcável de organizações esotéricas, algumas milenares, cujo poder de influência é enormemente variado de país para país e de época para época. Essas organizações, que constituem o núcleo espiritual do Islam, a garantia profunda da sua unidade civilizacional e, a longo prazo, a condição de possibilidade da expansão islâmica mundial, continuam perfeitamente desconhecidas pelos analistas políticos ocidentais, jornalísticos ou mesmo acadêmicos.

A diferença de visibilidade entre os grandes esquemas globalistas em disputa é fonte de erros catastróficos na descrição do conflito de poder no mundo. Em artigos vindouros explicarei alguns desses erros. 
Por Olavo de Carvalho Publicado no Diário do Comércio.

domingo, 11 de novembro de 2012

CONSCIÊNCIA É A PALAVRA DE ORDEM PARA GASTAR O DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO




O fim do ano está chegando e com ele o décimo terceiro salário também. É nesta época do ano que os consumidores se empolgam e gastam mais do que deveriam. A consequência do consumo não pensado são os endividamentos. Para não começar 2013 com dívidas, algumas orientações são indispensáveis. Conforme o economista Dimas Estevam, uma dica crucial para que o consumidor tenha controle do dinheiro é sempre anotar aquilo que gastou, está gastando ou vai gastar.



“É como orientação de uma nutricionista, na qual você come aquilo que você colocou no prato, sem direto a repetição. Com o dinheiro também deve ser assim, a população tem que gastar aquilo que está no orçamento, o que está no papel. Assim o consumidor tem maior controle e uma boa visualização do gasto”, ensina.

Dimas explica que a população peca na compra de pequenos artigos. “Para comprar uma casa, um carro, por exemplo, o pessoal acaba se planejando. Já na compra pequena as pessoas não têm noção, eles vão comprando uma coisa aqui, outra ali. São gastos menores de R$ 10, R$ 50 reais, mas que no fim do mês pesam”, ressalta.

Estes gastos, na maioria das vezes, são destinados para artigos supérfluos, que não há necessidade de compra. Estevam chama atenção para o consumismo imposto sempre nos fins de ano. “As pessoas têm a ideia de comprar, comprar e quanto mais caro o artigo comprado mais o presenteado vai ficar feliz. Outra questão é em relação ao dia-a-dia corrido, que as pessoas enfrentam na atualidade, ou seja, a ausência de um amigo para com o outro, ou mesmo de um pai para um filho é justificado com um presente”, destaca. 

O 13º salário é visto como um dinheiro a mais, de acordo com o economista, quando o conceito deveria ser outro. “Este dinheiro é para ser poupado e utilizado com consciência e responsabilidade já que janeiro e fevereiro são dois meses de muitos gastos, como IPTU, IPVA, matrículas de escolas, compra de materiais escolares, entre outras contas”, pontua. O economista alerta para um dos grandes vilões da atualidade, o cartão de crédito. “Há quem consiga se controlar, e há quem não. Como é um dinheiro virtual, as pessoas só vão gastando, com o pagamento em dinheiro as pessoas sentem mais no bolso e são mais precavidas. O ideal mesmo é anotar tudo para manter o controle e não se perder nas contas”, reforça. 

Anotar não é o costume da assistente administrativo de Sandra Volpato. "Neste período gasto um terço com presentes e o resto uso para as festas de fim de ano e não anoto nada. Mesmo assim consigo ficar tranquila com as minhas finanças”, garante. Por: Douglas Saviato

sábado, 10 de novembro de 2012

QUEM REALMENTE ARCA COM O FARDO DOS IMPOSTOS INDIRETOS


inndignados-governo-povo-impostos-indiretos.jpg
O senso comum nos assegura que um imposto sobre a renda é "justo" porque tira dinheiro apenas dos ricos ao passo que impostos sobre bens de consumo penalizam majoritariamente os consumidores pobres, pois os empresários gananciosos repassam integralmente tais impostos ao preço final destes bens. Será mesmo? É realmente possível as empresas repassaram os impostos que incidem sobre bens de consumo totalmente para os consumidores na forma de um preço final mais elevado?

O fato de impostos sobre a renda acabarem prejudicando também os mais pobres já foi devidamente abordado em outros artigos (aqui e aqui), de modo que neste artigo irei me debruçar exclusivamente sobre a questão de impostos sobre bens de consumo. 

Para entendermos claramente o mecanismo de uma transmissão de impostos para os consumidores, e verificarmos se tal transmissão realmente é possível em termos econômicos, comecemos do início. 

Imagine que o mercado esteja funcionando normalmente sem um imposto sobre bens de consumo. Assim, todos os preços vigentes são aqueles determinados pela interação entre a oferta de bens — o estoque de bens disponíveis para serem vendidos — e a demanda por esses bens. E então vem o governo e impõe uma taxa de 20% sobre o valor de todos os bens de consumo da economia. O que irá ocorrer?

Em primeiro lugar, todos os varejistas sofrerão um imediato aumento de 20% em seus custos de vendas. Se a receita era de $100, eles agora ficarão com apenas $80. Eles podem aumentar os preços para compensar este custo adicional? Difícil. Afinal, os preços, em todo e qualquer momento, tendem a já estarem estipulados em um valor que traga o máximo possível de receita líquida para cada vendedor. Se os vendedores pudessem simplesmente repassar o aumento de 20% em seus custos para os consumidores, então por que já não haviam feito isso antes? Eles não são gananciosos? Por que tiveram de esperar que o governo estipulasse um imposto sobre bens de consumo para que então elevassem seus preços?

Preços já estão em um valor que traga o máximo possível de receita líquida para cada empresa. Qualquer aumento nos custos, portanto, terá de ser absorvido pela empresa; tal aumento não pode ser repassado diretamente para os consumidores. A imposição de uma taxa sobre a venda de bens de consumo não alterou o estoque de bens que já haviam sido produzidos e que estavam à disposição dos consumidores. E a demanda dos consumidores não foi alterada só porque o governo criou um imposto. Se o governo criar um imposto sobre as vendas, os consumidores não irão alterar suas curvas de demanda de modo a repentinamente aceitarem um preço maior para os bens de consumo. Por isso, se as empresas repassarem o imposto para o preço final de seus, elas simplesmente perderão receitas, pois menos consumidores comprarão seus produtos (assumindo aqui que a quantidade de dinheiro na economia não se alterou). 

Logo, como a oferta e a demanda não se alteraram, os preços também não irão se alterar. Os custos dos impostos serão absorvidos pelas empresas. [Isso explica por que era ingenuidade imaginar que os preços cairiam por causa da extinção da CPMF ou por causa da abolição da sacola plástica nos supermercados].

Este exemplo abordou a criação de um imposto uniforme sobre todos os bens de consumo da economia. Analisemos agora o que ocorreria caso este mesmo imposto incidisse apenas sobre bens específicos.

Imagine que o governo impõe uma taxa de 20% sobre um determinado bem — por exemplo, produtos cítricos. Tal imposto faria com que as empresas que vendem laranjas, limões, pomelos, sucos de laranja e limão, picolés, saladas de frutas etc. inicialmente tivessem de lidar com um aumento em seus custos de produção e, consequentemente, uma redução em seus lucros.

Como consequência, as pequenas empresas que operam marginalmente nesta indústria poderão sofrer prejuízos e falir, ao passo que as empresas mais eficientes irão cortar custos e reduzir sua produção, de modo a provocar uma redução na oferta de produtos cítricos no mercado. Ao fazerem isso, a redução na oferta levará a um aumento dos preços e a uma queda na demanda, mas os lucros não serão afetados, pois houve também uma redução na produção. Portanto, a taxa de 20% não pôde simplesmente ser repassada para os preços. Se as empresas fizessem isso e não alterassem seus custos de produção, o aumento dos preços levaria uma queda na demanda. E por não ter havido redução na produção, os lucros cairiam. 

Portanto, é justamente o efeito destrutivo do imposto sobre os lucros da empresa o que afeta a relação de oferta e demanda, levando a uma redução da oferta e a um consequente aumento dos preços para os consumidores.

Adicionalmente, dado que os consumidores podem, e irão, alterar suas preferências, passando a consumir outros tipos de frutas e sucos assim que os preços dos cítricos subirem, as empresas de cítricos não poderão aumentar os preços de seus produtos em exatos 20%. Tudo vai depender da oferta de produtos da concorrência. Dependendo dessa disponibilidade de substitutos e da elasticidade das curvas de demanda dos consumidores, o aumento percentual no preço dos cítricos pode acabar sendo bem menor do que 20%.

Até aqui, essa análise austríaca é bastante semelhante à análise neoclássica padrão. O diferencial vem agora.

No longo prazo — e este é o ponto distintivamente austríaco —, o fardo do imposto será jogado para os proprietários dos fatores de produção voltados especificamente para o setor de frutas cítricas — no caso, os cultivadores de frutas cítricas e donos de pomares. O valor de seu capital — sua terra e sua mão-de-obra — irá cair acentuadamente como consequência da queda na demanda por produtos cítricos. Os trabalhadores destes setores terão seus salários reduzidos. Caso não aceitem tal redução, serão demitidos e terão de procurar empregos em outras áreas. Esta maior oferta de mão-de-obra irá deprimir os salários destas outras áreas da economia.

E é assim que os consumidores serão prejudicados por este imposto indireto: como os cultivadores menos eficientes terão parado de produzir simplesmente porque não eram capazes de cobrir seus custos salariais, passa a haver uma maior escassez de produtos cítricos no mercado. E isso leva a um aumento nos preços para os consumidores. 

É desta forma, portanto, que impostos indiretos levam a aumentos nos preços. Eles não são simplesmente repassados; há toda uma distorção na cadeia de produção que leva a este aumento de preços. Quanto maior o imposto, maior será este efeito. 

Um famoso exemplo prático dessa teoria — e se tornou famoso justamente porque foi amplamente visível — ocorreu nos EUA no início da década de 1990, com a indústria de iates. Para combater uma queda nas receitas decorrente da recessão da época, o governo aprovou um imposto de 50% sobre 'artigos de luxo', como aviões, automóveis e barcos que custassem mais de US$100.000. Mas a demanda por estes itens de luxo era tão elástica que as compras de iate despencaram de 400 unidades em 1990 (ano anterior à criação do imposto) para 10 unidades em 1992.

Quase todos os construtores de iates foram à falência e vários trabalhadores desta indústria — uma mão-de-obra muito especializada — foram demitidos e tiveram de aceitar salários muito menores como pescadores de caranguejos, pilotos de barcos de turismo etc. Os consumidores tiveram de lidar com altos preços até o imposto ser finalmente abolido em 1993.

O governo quis aumentar suas receitas mas acabou apenas gerando desemprego. 

Como bem explicou Frédéric Bastiat, na economia há aquilo que se vê e o que não se vê. Um economista tem de ser igualmente versado nas duas artes. Nenhum imposto é neutro ao mercado; todo e qualquer imposto gera consequências inesperadas e não-premeditadas.

Joseph Salerno  é o vice-presidente acadêmico do Mises Institute, professor de economia da Pace University, e editor do periódico Quarterly Journal of Austrian Economics.

Tradução de Leandro Roque 

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

A ÉTICA PETISTA

Será que devemos condenar todo o Partido dos Trabalhadores pelos erros de alguns de seus membros? Não resta dúvida de que muita gente aderiu ao PT com a melhor das intenções. Mas confesso não entender quem ainda insiste no erro.


A bandeira da ética não foi rasgada hoje pelo PT. No fundo, o partido nunca teve muito apreço por ela. O que ele fazia era monopolizar o discurso da ética. Ao se colocar como seu único bastião, o PT enganou muitas pessoas ingênuas; mas seu objetivo sempre foi o poder pelo poder.

O discurso petista é sensacionalista e demagógico. Ele usa a velha tática de dividir para conquistar. Negros contra brancos, mulheres contra homens, pobres contra ricos, empregados contra empresários: o PT sempre soube chacoalhar as árvores para colher os frutos; o que nunca soube fazer foi plantar boas sementes.

Enquanto oposição, o PT sempre adotou postura destrutiva, contra os interesses nacionais. Foi contra Tancredo, não quis aprovar a Constituinte, lutou contra o Plano Real que derrotou a inflação, fez campanha contra as privatizações que modernizaram a economia, sempre de olho apenas no poder.

A estratégia de marketing do PT em 2002 mostrava a bandeira brasileira sendo comida por ratos, e o texto dizia: “Ou a gente acaba com eles ou eles acabam com o Brasil”. A realidade se mostrou diferente. O próprio PT era uma ratazana disfarçada de caça-roedores.

O caso envolvendo Waldomiro Diniz já era um alerta e tanto. Afinal, tratava-se de um homem da confiança de José Dirceu, que foi pego em gravação cobrando propina do bicheiro Carlinhos Cachoeira. O esquema contava com a participação dos bingos, e o PT fez de tudo para sepultar a “CPI dos Bingos” na época, como fez agora no caso da Delta, a principal construtora do Programa de Aceleração do Crescimento do governo Dilma (que não cresce).

A ligação do partido com o jogo do bicho vinha de longa data. O ex-governador Olívio Dutra esteve sob a mira de investigações por denúncias de ligações com o jogo ilegal. Uma fita gravada pelo ex-tesoureiro do partido, Jairo Carneiro, relatava o financiamento da campanha petista pelos contraventores.

Um dos casos mais escabrosos diz respeito ao assassinato do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel. O irmão da vítima, que teve de sair do país para se proteger, garante ter ouvido de Gilberto Carvalho a afirmação de que ele próprio entregava dinheiro das propinas a José Dirceu. Várias testemunhas do caso também morreram. A família nunca aceitou a versão de crime comum.

Existem outros escândalos, mas o leitor já entendeu o ponto: o PT jamais abraçou a ética de verdade. Da mesma forma que a própria democracia nunca foi vista com muita simpatia pelo partido. Tanto que ele sempre flertou com regimes autoritários, como a ditadura cubana, até hoje reverenciada por muitos, e o modelo socialista de Chávez.

Forçando um pouco a barra, podemos engolir a tese de que milhares de membros do partido ignoravam o que se passava por baixo dos panos. Não sabiam dos detalhes sórdidos, ainda que divulgados pela imprensa. A alienação permitia a manutenção da ilusão.

Mas como usar a ignorância como escusa agora, depois que o STF condenou parte da cúpula do PT por corrupção e formação de quadrilha? Os “delinqüentes”, termo usado pelo decano do STF, tentaram dar um golpe em nossa democracia. E não estamos falando de peixe pequeno, mas sim dos mais graúdos dentro do PT.

Para adicionar insulto à injúria, qual a reação dos lideres do partido, incluindo o maior deles, o ex-presidente Lula? Revolta contra os culpados que esgarçaram totalmente a bandeira ética do PT? Nada disso! O partido decide passar a mão na cabeça dos culpados e atacar o próprio STF, que tem a maioria dos ministros apontada pelo próprio PT, assim como a imprensa livre do país. Eles adorariam que o Brasil fosse Cuba.

A melhor defesa que um petista tem hoje é a de que seu partido é “apenas” tão ruim quanto os demais. Isso, por si só, já seria patético para quem sempre tentou monopolizar as virtudes. Mas há um detalhe: é mentira. O PT é muito pior! Justamente por se colocar acima de todos, ele sempre adotou a máxima de que seus fins “nobres” justificam os mais nefastos meios. A reação ao julgamento do STF comprova que o PT em nada mudou.

Com isso em mente, será que quem permanece filiado ao PT, de certa forma, não é cúmplice de uma quadrilha? É possível ter vergonha na cara e permanecer no partido? Alguns podem considerar isso muito radical. Mas não seria mais radical continuar petista depois de tudo que o PT aprontou? Por: Rodrigo Constantino

PEQUENOS ASSASSINATOS


"Falar mal do governo é tão bom que não deveria ser privilégio só da oposição"
Milton Campos, governador de Minas Gerais entre 1946 e 1950.

O governador mineiro, se vivo fosse, estaria frustrado em ver que sua frase não faz muito sentido nos dias atuais. Afinal, mal existe uma oposição, e aqueles que se intitulam “oposição”, pelo visto, não gostam de falar mal do governo. Já que a oposição não faz o que tem que fazer, os bolsistas do andar de baixo (bolsa família) também não e tão pouco os bolsitas do andar de cima (bolsa BNDES). Sobra para nós, os “sem bolsa”, essa deliciosa tarefa. Vamos a ela.

O objetivo desta carta é sair um pouco da análise de curto prazo da política econômica e dos mercados e olhar um pouco mais atentamente para outros direcionamentos do governo, que, no momento, não impactam o seu bolso, mas no futuro irão afetar a sua vida e a de seus filhos também.

Vamos começar pelo conceito de meritocracia, algo bem simples como: conquista-se coisas na vida de acordo com seu esforço e mérito. Aquele que usa os finais de semana para estudar tende a conseguir as melhores vagas nas universidades (e depois no mercado de trabalho) do que aquele que fica fiscalizando a natureza na praia, certo? Não mais. Desde a criação de um programa eleitoreiro de compra de votos, o bolsa família (sem a famosa porta de saída), passando pelo sistema de cotas e terminando no balcão dos amigos do BNDES, o que vemos é um sistema perverso que não estimula mais o esforço próprio e a busca pela superação.

O atual sistema de incentivos estimula o "coitadismo", a troca de votos por migalhas e, no caso do empresariado, de que mais valem bons contatos em Brasília do que a equação de cérebro afiado mais trabalho duro. Tudo aponta para uma sociedade onde a tônica é a "servidão voluntária" ao estado babá. De onde se pode esperar crescimento de longo prazo advindo de uma sociedade de zumbis? De onde virá a inovação?

Analisando o sistema de cotas, sancionado pela presidente Dilma Rousseff, que reserva 50% das vagas nas universidades públicas para alunos que cursaram todo o ensino médio em escolas públicas. Desse total, a metade será voltada para estudantes com renda familiar de até um salário e meio por pessoa. A outra metade para alunos negros, pardos e índios de acordo com a proporção dessas populações em cada estado, segundo o IBGE.

Há aí uma meia verdade que se transforma numa falácia. Que os alunos vindos das escolas públicas são precariamente formados, isto é um fato; porém não é correto correlacionar este fato à baixa renda. Afinal, pelo ensino público ser tão fraco academicamente é que as famílias de renda um pouco melhor buscam as escolas particulares. Basta o governo prover um serviço educacional digno, que haverá alunos de todas as classes sociais nas escolas públicas. O atual governo, em vez de endereçar o problema, ataca de forma populista as suas consequências. O resultado é que os cotistas se formarão em bem mais tempo do que os outros alunos, se é que se formarão. 

O input do sistema educacional está dado, mas alguém já parou para pensar no output deste monstrengo? Deve haver um aumento na evasão de alunos, um menor número de formandos e uma qualidade deteriorada dos novos profissionais. Se juntarmos essa previsão com a informação de uma taxa de desemprego bem perto do que chamamos de pleno emprego, podemos projetar uma economia de baixa produtividade e custo alto. Em resumo, uma economia com competitividade ainda pior do que temos hoje.

Outro conceito a ser abordado é a estabilidade de regras. Começando pela mais tenra idade, sabemos que a criança criada com regras estáveis dentro de casa crescerá de maneira mais saudável do que a criança em cuja casa os pais mudam a regra do jogo toda hora. A criança do lar instável tenderá a ficar mais insegura e, no futuro, repetirá o comportamento de seus pais. O mesmo se aplica a economia. 

Vamos ver o exemplo da fabricante coreana Kia Motors, que se instalou no Brasil trazendo uma proposta de alta qualidade com preço acessível. Rapidamente, chegou a 80 mil unidades vendidas, com uma boa rede de concessionárias e já caminhava para 100 mil carros vendidos por ano quando o governo, atendendo ao pleito dos simbióticos sindicalistas e montadoras, instalou um imposto de 30% sobre o automóvel importado. Da noite para o dia, o que acontece com o investimento de centenas de empresários e com a vida de milhares de funcionários que saíram de suas atividades anteriores para seguirem o Projeto Kia? Esse é o exemplo dos coreanos, mas poderia ter sido outro qualquer. Com o atual governo, quem é o louco de alocar tempo e dinheiro no Brasil? Somente se for muito bem conectado com Brasília, tiver uma ligação direta com o BNDES (quem sabe um apreço pela letra "X"). Mesmo com tudo isso, não há garantia de lucratividade.

A estabilidade de regras é crucial quando entendemos que governo não gera crescimento (a despeito do que até alguns vencedores de prêmio Nobel acreditam), ele apenas redireciona os recursos de A para B. No Brasil, além disso, entre A e B há o pit stop em C. Quem gera o crescimento são as entidades privadas. Se elas não tem regras estáveis de onde virá o estímulo ao crescimento?

O mais dramático de tudo, é que nossa infraestrutura está bem apertada e sucateada frente ao tamanho que chegamos. O governo demorou a reconhecer que o estado não pode e nem consegue construir o que necessitamos, mesmo assim ele quer ditar o quanto podem ganhar os operadores. Diga-se de passagem, bem pouco frente aos riscos. O resultado disso é que teremos investidores de segunda classe interessados. A concessão das estradas em 2007, e seu resultado pífio, demonstram bem isso. A dos aeroportos vai pelo mesmo caminho e o trem bala tem tudo para ser a "transamazônica" dos petistas.

É claro que ainda estamos em situação bem melhor do que estivemos na década de 80, porém nos preocupa ver que os pequenos assassinatos institucionais vão aos poucos erodindo as conquistas e reformas dos anos 90 e nos levando de volta para o passado. Tudo isso em nome de um esquerdismo anacrônico, autoritário e de resultados pífios pelo mundo. Afinal o que é a economia senão a psicologia aplicada à sistemas de incentivos corretos? Para nossa tristeza, os sistemas de incentivo corretos estão sendo destruídos diuturnamente.
Carta da MP Advisors

A MÍSTICA DO BOM SELVAGEM

comunaseindios



O trabalho feito por organizações ambientalistas e indigenistas de viés progressista – amplamente financiadas por organizações “filantrópicas” internacionais – está longe de ser a solução para esses problemas. Ao contrário: elas são justamente a causa desses problemas.


Jean-Jacques Rousseau, um dos grandes inspiradores dos ideais que culminaram na sangrenta Revolução Francesa de 1789, acreditava piamente naquilo que se chama “bom selvagem”. Rousseau defendia que o homem era naturalmente bom, e que era a sociedade que o corrompia, deformando sua essência em algo vil e perverso. Para impedir esse processo de mutilação do homem, era necessário destruir a sociedade tal como era, substituindo-a por uma sociedade que resgatasse a natureza benévola inerente ao ser humano. O processo pelo qual essa nova sociedade – e, por conseguinte, o novo homem – deveria surgir passava necessariamente pela demolição dos valores sobre os quais a velha sociedade estava alicerçada; todas as instituições que trabalhavam para a manutenção da velha sociedade – a Igreja, a família, a Coroa, o ensino, a cultura, as artes – deveriam necessariamente ruir para que o homem voltasse àquela Era de Ouro há muito perdida e ansiada.

O que motivou o surgimento do mito do “bom selvagem” foi o impacto que o contato com tribos nativas no continente americano e na região do Pacífico causou no imaginário literário europeu da época, sobretudo nos séculos XVII e XVIII. Vistos literalmente como descendentes de Adão e Eva que pareciam não terem sido atingidos pelo pecado original, os povos indígenas eram idealizados como ajuntamentos de pessoas puras, inocentes, cujo isolamento da civilização as manteve à salvo de deturpações em sua conduta e deformações em sua alma. Sua vida seria marcada por uma perfeita integração com a natureza, venerada pelos povos nativos como algo tão sagrado que qualquer interferência humana era considerada sacrílega e abominável, dependendo unicamente da prodigalidade da Mãe Terra para tirarem seu sustento.

Exatos 250 anos após a publicação de sua obra “Do Contrato Social” (1762), o pensamento revolucionário de Rousseau e a errônea concepção do índio como uma criatura pura, inocente (e, acima de tudo, indefesa) são mais fortes do que jamais foram. Quando se toca na questão indígena, sobretudo no Brasil, existem determinados traços paradigmáticos: 1) o índio deve ser protegido como um indivíduo parcialmente incapaz, que não possui faculdades mentais nem aptidões humanas suficientes para fazer suas próprias escolhas; 2) sua cultura tradicional deve ser preservada a qualquer custo, mesmo que muitos índios a abandonem espontaneamente; e 3) seus comportamentos são ontologicamente imunes a qualquer crítica que o “homem branco” possa fazer, uma vez que eles são dotados daquela sabedoria natural intrínseca à natureza humana que foi perdida por todos aqueles contaminados pela mácula da civilização. Esse estranho dueto de infantilização e sacralização tem provocado algumas bizarrices verdadeiramente assustadoras.

O assunto da vez é a situação de 140 índios guarani-kaiowá que, há cerca de um ano, invadiram parte de uma fazenda nas proximidades de Iguatemi, cidade do interior do Mato Grosso do Sul. A invasão foi batizada de comunidade Pyelito Kue. O proprietário das terras invadidas entrou com um pedido de reintegração de posse junto à Justiça Federal de Navirai, que determinou a retirada dos indígenas da região. Em reação à ordem, a comunidade Pyelito Kue emitiu um comunicado dizendo que a decisão judicial “é parte da ação de genocídio e extermínio histórico ao povo indígena”, e completou:

Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação e extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais. Já aguardamos esta decisão da Justiça Federal. Decretem a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay e enterrem-nos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos daqui com vida e nem mortos.


O comunicado causou uma celeuma daquelas – coisa muito comum em um país onde as pessoas efetivamente perderam sua capacidade de perceber e valorar problemas de acordo com seu real significado –, sobretudo nas redes sociais: começou a se falar em suicídio coletivo, pipocaram manifestações no Facebook e congêneres, abaixo-assinados foram iniciados, enfim, um grande circo midiático se armou em torno desse fato. A pedido do Governo Federal, a Justiça Federal de MS cassou a decisão que determinava a desocupação da área, de modo que os índios poderão ficar na região até o fim do trabalho de pesquisa que visa à demarcação das terras.

Chamar a situação dos guarani-kaiowá de genocídio é, no mínimo, um exagero sentimentalóide e despropositado. No entanto, é verdade que a situação das populações indígenas no Brasil é bastante injusta. Diversas comunidades passam por situações de risco social considerável: desnutrição, violência, desemprego, alto índice de mortalidade infantil e de doenças, falta de escolaridade, ausência de tratamento de saúde, enfim, um sem-número de problemas. No entanto, o trabalho feito por organizações ambientalistas e indigenistas de viés progressista – amplamente financiadas por organizações “filantrópicas” internacionais – está longe de ser a solução para esses problemas. Ao contrário: elas são justamente a causa desses problemas.

Um exemplo emblemático que serve de base a essa conclusão é a situação atual da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Com aproximadamente 17.500 km² – maior, portanto, do que Líbano (10.400 km²), Irlanda do Norte (13.843 km²) e Timor-Leste (14.874 km²) –, a reserva teve a homologação de sua demarcação contínua confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 20 de março de 2009. Produtores rurais e comerciantes que residiam e trabalhavam dentro da área da reserva foram retirados com a promessa de indenização do governo federal. As indenizações não vieram para a grande maioria deles, e outros receberam um valor irrisório por suas propriedades. Segundo reportagem da revista Veja intitulada “Uma reserva de miséria”, da edição nº 2219 (1º de junho de 2011), esse é o caso do ex-pecuarista Wilson Alves Bezerra. Sua propriedade, em que criava 1.300 cabeças de gado, possuía 5 mil hectares. Tendo o valor das edificações da propriedade sido orçado em R$ 350 mil, e levando em consideração um valor de R$ 1.000,00 por hectare – o que equivale a 1/3 do valor mínimo médio do mercado brasileiro –, o Sr. Wilson Bezerra deveria ter recebido pouco mais de R$ 5 milhões de indenização do governo. O valor total que recebeu foi de R$ 72 mil, cerca de 1,44% do valor total. Na época da reportagem da revista, ele sobrevivia vendendo churrasquinhos no centro de Boa Vista, o que lhe rendia R$ 40,00 por noite.

wilsonbezerra
Empreendimentos rurais como o do Sr. Wilson Bezerra empregavam muitos habitantes da região, sobretudo indígenas. Sem emprego, sem opção de sobrevivência e sem respaldo governamental, muitos índios se viram obrigados a também ir para Boa Vista. Muitos deles sobrevivem em condições precárias, conseguindo uma renda ínfima da cata de lixo e materiais recicláveis. Se antes havia uma perspectiva de desenvolvimento econômico e social para essas pessoas, hoje essa perspectiva não é mais do que um sonho distante e improvável. E a que se deve isso? À parceria de organizações indígenas e ambientais financiadas com recursos de fundações internacionais com órgãos do governo federal, como a Funai, e o Ministério Público Federal. São distorções como essa que levam o estado de Roraima a ter o pior PIB dentre as UFs brasileiras: cerca de 70% de seu território são compostos por reservas ambientais e indígenas, lugares em que atividades econômicas de base não podem ser conduzidas, o que gera um subdesenvolvimento generalizado no estado.


Ronald Reagan costumava dizer que o governo não é a solução para os problemas, mas o próprio problema. Nesse caso, o problema não é o governo, as ONGs e outros grupos de pressão, mas aquilo que os impregna até a medula: a mística do “bom selvagem”. Parece que 250 anos de equívocos e barbaridades não bastaram para apagar essa sandice da nossa “elite pensante”.




A ideia aparentemente inabalável de que o índio é uma criatura toda pura, naturalmente cheia de boas intenções, inocente, meio bobinha, muito mansa e dotada de uma sabedoria excelsa que provém de seu íntimo contato com a “Mãe Terra” tornou-se um verdadeiro arquétipo jungiano nos tempos hodiernos. Se antes, no contexto brasileiro, essa imagem servia muito mais à literatura do que à política – vide a Trilogia Indianista do escritor José de Alencar, composta pelas obras “O Guarani” (1857), “Iracema” (1865) e “Ubirajara” (1874) –, hoje ela serve para justificar todo tipo de infâmia.


reunião
Reunião dos ministérios da Justiça e Direitos Humanos com representantes dos guarani-kaiowás.



Uma das falácias mais evidentes que compõem esse arquétipo está presente num texto recente de Luiz Martins da Silva, jornalista e professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília, publicado no portal da universidade. Em “O céu dos índios”, o prof. Luiz Martins escreve:

Contam cronistas que ao tempo dos primeiros exploradores os nativos até colaboravam na sobrecarga das naus, com madeiras e tudo o que queriam em grande quantidade, mas indagavam candidamente sobre os motivos de tanto acúmulo, se a madeira não ia acabar, se a floresta não ia desaparecer. Por que razão precisavam tanto de tudo e de uma só vez?

É possível que, “candidamente” encantado pelas historietas dos ditos cronistas, o autor do texto tenha se esquecido da altíssima carga de fantasia que embebiam a esmagadora maioria dos relatos de exploradores europeus em terras americanas. A tão alardeada consciência ecológica dos povos indígenas é, no mais das vezes, um delírio urdido por intelectuais que, incapazes de penetrar no mais essencial das culturas indígenas – ou, pior, ignorando-o de caso pensado, solenemente –, limitam suas análises ao assombro inicial causado pelo contato com o desconhecido. 

A ausência das noções de propriedade e de escassez torna desenfreada a utilização de determinado recurso limitado. E, ao contrário do que a nossa elite acadêmica pisa e repisa, a tragédia dos comuns não é algo cuja observância é limitada por diferenças culturais: ela faz parte da própria natureza humana. Aquilo que facilmente se obtém, que pode ser desfrutado sem limites e que não pertence a um indivíduo concreto, mas a uma abstrata coletividade, é explorado até a exaustão sem que haja ponderação acerca da durabilidade do bem e de seu melhor uso.

 indiotech
Camiseta da Holanda e câmera digital: manufaturas tradicionais?

Notem que não é necessário nem mesmo conhecer a história dos povos indígenas para intuir a falsidade dessa sacrossanta consciência ecológica nativa. Em “Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil”, Leandro Narloch coloca as coisas de maneira bastante clara quanto a esse assunto:


As tribos que habitavam a região da mata atlântica botavam o mato abaixo com facilidade, usando uma ferramenta muito eficaz: o fogo. No fim da estação seca, praticavam a coivara, o ato de queimar o mato seco para abrir espaço para a plantação, empregado até hoje. No início, a coivara é eficiente, já que toda a biomassa da floresta vira cinzas que fertilizam o solo. Depois de alguns anos, o solo se empobrece. Pragas e ervas daninhas tomam conta. Como não havia enxadas e pesticidas e ninguém sabia adubar o solo, procuravam-se outras matas virgens para queimar e transformar em roças. O historiador americano Warren Dean estimou que a alimentação de cada habitante exigia a devastação de 2 mil metros quadrados de mata por ano. [...]

A grande vantagem ao fogo era facilitar a caça. Criando fogueiras coordenadas, um pequeno grupo de pessoas consegue controlar uma área enorme da mata sem precisar de machados, serrotes ou alguma outra ferramenta de ferro. As chamas desentocam animais escondidos na terra, no meio de arbustos e nos galhos. Aves, macacos, veados, capivaras, onças, lagartos e muitos outros animais corriam em direção ao mesmo ponto, onde os índios os esperavam para capturá-los. Não e à toa que, assim como em todo o resto do mundo, nas florestas brasileiras só havia animais de grande porte, rápidos e agressivos os mais lentos foram logo extintos pelas populações nativas. Para caçar alguns poucos animais, eles destruíam uma área enorme da floresta.



A ideia de que os índios também são criaturas ingênuas, inocentes, crédulas, bondosas por natureza, possuidoras de uma dignidade quase beatífica reservada somente aos animistas e panteístas – de alguma forma, esses credos equivalem a um inquestionável atestado de superioridade moral, lavrado com toda pompa e circunstância nos cartórios ideológicos (vulgo universidades) do Brasil –, é igualmente absurda. 
Dois casos são bastante ilustrativos. O primeiro ocorreu em 2004 nas imediações de Espigão d’Oeste, município do estado de Rondônia. A reserva Roosevelt, que abriga uma das maiores jazidas de diamantes do mundo, é habitada por índios cintas-largas. No dia 7 de abril daquele ano, cerca de 60 índios capturaram um grupo de 29 garimpeiros. Os garimpeiros – que, apesar de exercerem atividade ilegalmente, não estavam armados – foram amarrados com cipós e mortos a tiros e golpes de borduna, tendo os corpos carbonizados em seguida (algumas fotos das vítimas podem ser encontradas na rede). Poder-se-ia argumentar que os índios estavam apenas protegendo sua propriedade de invasores que estavam depredando sua terra sagrada e, a partir daí, forçar alguma ideia de legitimidade para essa barbaridade. Mas quando se sabe que muitos dos próprios índios da reserva traficam pedras preciosas, isso tudo soa mais como eliminação de concorrência.

O segundo caso ocorreu em maio de 2008 na cidade de Altamira/PA. Por iniciativa da Arquidiocese de Altamira e diversas ONGS, foi realizada uma grande reunião pública para discutir o afamado projeto da usina de Belo Monte. Paulo Fernando Rezende, engenheiro da Eletrobrás, participou do evento para falar a respeito do projeto de construção da usina e defender a necessidade do empreendimento. A reação dos índios foi esta:


Comparemos, por um instante, o vídeo acima com as palavras finais do texto do prof. Luiz Martins:


Em meados dos anos 70, levantei um dado estatístico, na Funai: havia entre os índios brasileiros missões de 50 diferentes linhagens religiosas, todas, evidentemente, tentando salvar as almas dos índios e encaminhá-los para um Céu de beatitudes. Eu fico me perguntando se não teria de ser o inverso, os brancos indo aprender com os índios, como se pode viver no Paraíso, já, aqui e agora.


A depender dos caiapós que deram esse show de horrores na reunião, é de se esperar que esse Paraíso terrestre seja construído com gritos de guerra, golpes de facão e bordoadas. Pensando bem, não é muito diferente do que os jacobinos, ébrios do ópio rousseauniano, fizeram na França quando o século XVIII estava em seus estertores. Bom, no fim das contas, talvez Rousseau estivesse certo, não é?

Em tempo: 
Índios são pessoas. Índios são seres humanos exatamente como nós, os “homens brancos”. Eles possuem fraquezas, qualidades, virtudes, defeitos, interesses, enfim, eles compartilham a mesma natureza humana que nós, “homens civilizados”, possuímos. E, assim como nós, eles também são capazes de atrocidades vergonhosas, como, por exemplo, a prática do infanticídio que algumas tribos mantêm. No entanto, eles também são capazes de atos verdadeiramente heróicos e virtuosos: é só serem tratados como pessoas, nem mais, nem menos. Se quisermos de fato que situações como essas não ocorram mais, está na hora de pararmos de agir como se fossem criaturas angélicas de outra dimensão ou como seres subumanos que necessitam da tutela estatal para absolutamente tudo. Por: Felipe Melo

A MOEDA E O TECIDO SOCIAL



Os bancos centrais dos principais países desenvolvidos parecem disputar quem consegue anunciar maiores estímulos em menos tempo. O problema maior, causado pelo excesso de endividamento do setor privado e dos governos, não vai ser solucionado com mais dívida, mas ninguém deseja enfrentar os sofrimentos dos ajustes necessários. A ilusão monetária surge como a esperança de que é possível diluir tais ajustes no tempo. As dívidas seriam corroídas pela inflação mais alta. Os credores seriam forçados a transferir renda para os devedores.


Muitos keynesianos aplaudem os afrouxamentos monetários. Paul Krugman chega a acusar o Fed de ser muito tímido! Para Krugman, até os estragos causados pelo furacão Sandy são vistos como algo positivo para a economia, especialmente se o banco central imprimir mais para financiar os gastos de reconstrução. Mas esta não era a postura do próprio Keynes. Em seu livro As Consequências Econômicas da Paz, escrito em 1919 para criticar as punições impostas à Alemanha pelo Tratado de Versalhes, ele alerta de forma profética:

Atribuiu-se a Lênin a declaração de que a melhor maneira de destruir o sistema capitalista é destruindo a moeda. Com um processo contínuo de inflação os governos podem confiscar uma parte importante da riqueza dos seus cidadãos, secreta e furtivamente. Com esse método eles não só confiscam mas o fazem arbitrariamente; é um processo que empobrece a muitos mas na verdade enriquece uns poucos. Esse deslocamento arbitrário da riqueza fere não só a segurança mas a confiança na equidade da distribuição de renda. Aqueles a quem o sistema traz vantagens além do que merecem, e mesmo do que esperam ou desejam, passam a ser ‘aproveitadores’ – objeto de ódio da burguesia, que a inflação empobreceu, não menos do que o proletariado. À medida que a inflação se desenvolve, e o valor da moeda flutua de mês a mês, as relações permanentes entre credores e devedores, fundamento do capitalismo, se desorganizam até quase perderem o sentido. E o processo de aquisição de valor degenera em uma loteria de azar.

Keynes ainda acrescenta:

Não há dúvida de que Lênin tinha razão. Não há meio mais seguro e mais sutil de subverter a base da sociedade do que corromper a sua moeda – processo que empenha todas as forças ocultas da economia na sua destruição, de modo tal que só uma pessoa em cada milhão consegue diagnosticar.

Lord Keynes merece muitas críticas dos liberais. Mas ele, perto de seus herdeiros ideológicos que falam hoje em seu nome, parece até um liberal defensor da austeridade. Ele sabia como a impressão desenfreada de moeda representava o caminho mais rápido para a destruição da economia e, com isso, do próprio tecido social responsável pela manutenção do modelo capitalista. Este, para funcionar, precisa de confiança, pois interliga milhões de agentes de forma impessoal. O símbolo desta confiança é justamente a moeda sólida.

Quando esta é deliberadamente desvalorizada, com a expansão descontrolada do balanço do banco central, o principal impacto negativo é na moral. As pessoas perdem os valores, os beneficiados por esta política inflacionária se tornam alvo de revolta popular (Wall Street deveria tomar mais cuidado com movimentos como “Ocupem Wall Street”), a concentração de riqueza aumenta de maneira artificial, e todos são instigados a especular no curto prazo para obter algum sustento extra. A eutanásia do rentier é um tiro nos poupadores, que têm parte de sua riqueza confiscada pelo governo.

No afã de inflar o preço dos ativos e estimular o consumo no curto prazo, estas políticas acabam gerando efeito contrário: os indivíduos percebem que terão de poupar ainda mais para desfrutar da aposentadoria, agora sem retorno sobre o capital acumulado, e precisam então reduzir seus gastos correntes. Quando o capital não tem mais valor no tempo, isso significa que é preciso acumular muito mais dinheiro para viver da poupança depois. Quando foi que o mundo endoidou de vez a ponto de acreditar que a impressão de moeda gera prosperidade efetiva?

Vários indivíduos, desesperados, passam a especular em ativos improdutivos, como imóveis e ouro, em busca de rentabilidade extra. O afrouxamento monetário dos bancos centrais cria uma sociedade de day traders, de especuladores ligados nos preços dos ativos a cada momento, à espera da nova rodada de estímulos, tal como viciados vidrados na expectativa da próxima rodada de droga.

A História está repleta de casos que ilustram as desgraças dessas medidas inflacionárias. Um dos importantes fatores que levaram à queda do império romano foi justamente a desvalorização sistemática de sua moeda pelas autoridades. Mais recentemente, a República de Weimar assombrou o mundo com sua hiperinflação, uma das principais causas da ascensão de Hitler ao poder.

Em When Money Dies, Adam Fergusson relata passo a passo a destruição da moeda alemã e como isso impactou na degradação moral do país. O mais impressionante era o desejo de negar os fatos. Mesmo após a expansão descontrolada da quantidade de moeda em circulação, muita gente ainda culpava bodes expiatórios pelo aumento no custo de vida. Os alemães sofreram tanto por esta ignorância que aprenderam a lição, criando o banco central mais ortodoxo e disciplinado do mundo. O Bundesbank foi um pilar fundamental da reconstrução alemã no pós-guerra, e ainda hoje desfruta de excelente reputação.

O mundo deveria levar o alerta a sério, portanto, quando lideranças alemãs começam a falar até em trazer seu ouro estocado nos Estados Unidos de volta ao país. Estamos diante de um momento extremamente perigoso, em escala mundial. Banqueiros centrais partem para experimentos irresponsáveis que podem abalar as principais estruturas do capitalismo. Com a moeda não se brinca impunemente. Ela é o elo que serve de argamassa para o tecido social. Se as pessoas perderem a confiança nela, então o caos pode se instalar em boa parte do mundo.Por: Rodrigo Constantino