terça-feira, 2 de abril de 2013

O CHIPRE REVELA A REALIDADE DO SISTEMA BANCÁRIO


Durante a semana passada, analistas financeiros, economistas, políticos e correntistas bancários ao redor de todo o mundo se mostraram ultrajados com o fato de que os líderes europeus — mais especificamente os alemães, que atualmente comandam as principais decisões tomadas em Bruxelas e Frankfurt — pudessem se mostrar tão politicamente temerários, tão economicamente ignorantes e tão emocionalmente insensíveis a ponto de violar a santidade dos depósitos bancários a fim de financiar um pacote de socorro para o Chipre.

Esse coro de condenações pode ter sido decisivo em dar ao parlamento cipriota a confiança necessária para rejeitar de forma unânime as medidas impostas, na esperança de que Berlim ou a Rússia — país natal de boa parte dos correntistas dos bancos cipriotas — iriam se apressar em conceder o pacote de socorro sem exigir contrapartidas.

A decisão de tributar em 10% os depósitos acima de €100.000 e em 7% os depósitos menores que €100.000 — desta forma, infligindo dor tanto nos correntistas mais ricos quanto nos mais pobres — foi descrita quase que universalmente como uma trapalhada histórica. No entanto, e curiosamente, o erro foi justamente o fato de os burocratas da União Europeia terem optado por fazer as coisas de modo aberto e explícito, de uma maneira que não fosse camuflada por truques financeiros. Em vez de optarem pela inflação monetária ou por simplesmente tomar dinheiro de uns para repassar para outros, optaram por uma tributação que incide diretamente sobre aqueles que estão sendo socorridos.

Como escreveu Detlev Schlichter,

A maioria das pessoas nos países desenvolvidos já se acostumou a não se preocupar com a saúde de seu sistema bancário. Elas foram, ao longo de décadas, condicionadas a acreditar que todos os bancos, por serem regulados pelo estado, são também protegidos pelo estado. Sim, mas tal proteção ocorre justamente para que os bancos possam incorrer em ainda mais riscos e se tornarem ainda mais alavancados. A "proteção" garantida pelo estado criou em todos os países um sistema bancário monstruoso que está engolindo os recursos do próprio estado. É impossível encarar os eventos no Chipre como uma surpresa chocante em pleno 2013.

Perdoem-me, mas minha empatia pelos correntistas cipriotas é bastante limitada. Se você é correntista de um banco cipriota, independentemente de seus depósitos serem maiores ou menores que €100.000, quem você acha que estava garantindo seus depósitos? A Fada Madrinha? Você realmente pensou que em um país tão minúsculo e com um sistema bancário tão bizarramente inchado — um sistema bancário que por anos, e de forma muito pública, vinha adquirindo títulos do governo grego! —, seu governo teria os recursos necessários para proteger todos os correntistas? O socorro dos dois maiores bancos do Chipre está estimado em 60% do PIB do país! E depois do que ocorreu na Grécia, você realmente pensou que os alemães estariam dispostos a continuar pagando sozinhos as contas de todos os outros países?

Se isso que está sendo proposto ao Chipre fosse realmente uma expropriação, como muitos estão dizendo, então o ato de se abster dessa expropriação — isto é, o expropriador simplesmente não fazer nada — significaria que a 'vítima' estaria mantendo sua propriedade, certo? O problema é que se a União Europeia não fizesse nada nesta situação, a maioria dos correntistas, inclusive aqueles que têm menos de €100.000, seriam totalmente dizimados. A escolha dos cipriotas, portanto, não é entre manter tudo ou pagar uma 'taxa', mas sim entre pagar uma 'taxa' ou perder praticamente tudo.

A realidade é que os correntistas do Chipre já estão pagando e continuarão pagando por todos os tipos de pacotes de socorro e de estímulos. Seja por meio de uma baixa taxa de juros sobre seus depósitos, seja por meio de inflação monetária, de maiores impostos, de maiores custos para empréstimos, ou pelo acúmulo de uma insustentável dívida pública, os cipriotas arcarão com o fardo de sua prodigalidade incorrida no passado. Não há como escapar. O problema é que o plano de socorro criado para o Chipre foi transparente demais, simples demais e direto demais para sobreviver em um mundo dependente do engano, da fraude e da ofuscação. Ele já estava morto antes mesmo de ter sido criado.

Ao redor de todo o mundo, os bancos centrais estão ativamente buscando metas de inflação propositadamente altas. Ora, não seria a inflação monetária — que permite aos governos cobrir parte de seus déficits por meio da criação de dinheiro, medida essa que transfere poder de compra dos poupadores para os tomadores de empréstimo — uma espécie de imposto sobre depósitos? No Reino Unido, por exemplo, os britânicos estão vivendo há três anos com uma taxa de inflação de preços de 3% e juros sobre seus depósitos de praticamente 0%. Espera-se que tal situação continue por pelo menos mais dois anos. Ninguém protesta. No entanto, um imposto de 6,75% no Chipre, a ser cobrado uma só vez sobre os depósitos, é visto como um ato de suprema traição?

[Aqui vale um parênteses para fazermos um comparativo com a situação brasileira. Um brasileiro comum que colocou seu dinheiro na poupança ganhou, de maio até hoje, 5,35%. Se ele tiver deixado o dinheiro parado na conta-corrente, ele não ganhou nada. Se ele for do tipo que tem de transacionar diariamente com dinheiro vivo — como fazem, por exemplo, trabalhadores informais —, ele também não ganhou nada.

Neste mesmo período, o INPC (que mensura a inflação para as famílias mais pobres) foi de 6,77%, os alimentos subiram 19,20%, os serviços encareceram 8,75%, e o IGP-M (que reajusta o aluguel e outros serviços, como TV a cabo) subiu 8,29%. 

Conclusão: aquele coitado que deixou o dinheiro na conta-corrente ou aquele que precisa de grandes quantias de dinheiro vivo diariamente (porque é informal) perdeu 19,20% do seu poder de compra em termos de alimentação, 8,29% em termos de aluguel, e 8,75% em termos de serviços.]

Muitos estão lamentando o fato de que, sendo o Chipre membro da zona do euro, seu governo não pode inflacionar e desvalorizar sua moeda para sair desta enrascada. Mas por que tal medida seria moralmente superior? Perder uma parte de seus depósitos não é diferente de perder poder de compra por meio da desvalorização monetária e da inflação. Ambas as medidas resultam em perda do poder aquisitivo. Pedir para um correntista abrir mão de parte de seu dinheiro é uma atitude que ao menos lida com o problema de forma honesta e imediata. 

A mesma dinâmica é válida para os fundos de um pacote de socorro. Suponha que a União Europeia aceite conceder mais dinheiro para socorrer os bancos do Chipre. A consequência disso é que os cipriotas, no futuro, terão de pagar os juros e a amortização dessa dívida. Portanto, ao aceitarem um pacote de socorro hoje, eles irão sobrecarregar as gerações futuras com um fardo cuja criação não foi responsabilidade delas. Como isso seria justo e moralmente aceitável?

No que mais, não é correto dizer que os correntistas dos bancos cipriotas — muitos deles cidadãos russos em busca de um paraíso fiscal — são totalmente inocentes e não foram cúmplices neste comportamento imprudente de seus bancos. Segundo relatos da Bloomberg, ao longo dos últimos cinco anos, os depósitos em euros nos bancos cipriotas apresentaram um rendimento cumulativo superior a 24%, quase o dobro do rendimento proporcionado por contas bancárias equivalentes na Alemanha. Os bancos do Chipre foram capazes de oferecer tais retornos porque se expuseram a ativos de alto risco (como os títulos do governo grego). O que há de tão errado em pedir que aqueles que incorreram em altos riscos com o intuito auferir retornos maiores aceitem perder algo quando suas decisões se revelam erradas?

Os cidadãos do Chipre, como membros da União Europeia, tinham a opção de colocar seus depósitos em qualquer banco da União Europeia. Mesmo se pagarem as taxas propostas no pacote de socorro, os correntistas do Chipre — ao menos os mais antigos, aqueles que mantiveram seu dinheiro nos bancos do Chipre por um longo período de tempo — terão ganhado mais dinheiro por terem mantido sua poupança em aplicações de alto retorno nos bancos do Chipre do que se tivessem depositado nos bancos alemães, cujo retorno é bem menor. Sendo assim, que Rubicão é esse que estamos atravessando?

O temor internacional que predominou na semana passada não era de que o cidadão comum do Chipre não mais fosse capaz de conseguir se sustentar, ou de que mafiosos russos fossem perder parte de suas questionáveis fortunas, mas sim de que uma corrida bancária no Chipre fosse levar a pânicos similares na Grécia, na Espanha ou no mundo em geral. Como resultado, os problemas vivenciados por uma insignificante economia estão sendo vistos como uma ameaça a todo o edifício financeiro global. Este é apenas mais um sinal de que nosso sistema financeiro atual se baseia exclusivamente na confiança — algo que, no final, pode ser totalmente efêmero.

Não obstante os insuperáveis desafios matemáticos que aqueles países extremamente endividados têm de enfrentar, os investidores seguem tendo a confiança de que os bancos centrais serão capazes de engendrar um retorno ao crescimento econômico sustentável sem criar uma inflação galopante e sem desencadear uma nova recessão por meio de um prematuro aperto monetário. Isso, mesmo na melhor das circunstâncias, já seria uma tarefa vultosa. Mas se um pequeno problema como o Chipre foi capaz de abalar toda essa confiança, quão robusta ela realmente é?

No final, este episódio do Chipre deixa ainda mais evidente o quão deletéria é a existência de seguros governamentais sobre depósitos bancários. Ao oferecer a ilusão de segurança sistêmica aos depósitos bancários, as garantias governamentais acabam por encorajar a imprudência tanto dos bancos quanto dos depositantes. Se você é um banqueiro e sabe que o governo irá proteger os depósitos de seus correntistas, qual o seu estímulo em ser prudente e não fazer apostas arriscadas no mercado? Se você é um correntista e sabe que o governo está protegendo seu dinheiro, qual o seu estímulo em procurar se informar sobre as atitudes de seu banco? Qual o seu estímulo em procurar bancos prudentes e em evitar bancos arrojados? Mais ainda: qual o estímulo de um banqueiro ser prudente em vez de arrojado?

Seguros sobre depósitos fornecem aos bancos os mesmos incentivos que um seguro federal contra enchentes fornece a imobiliárias que querem construir em zonas suscetíveis a inundação. Aversão ao risco e preferência dos consumidores são poderosas forças que poderiam trazer uma extremamente necessária disciplina ao sistema bancário. No atual arranjo, o banco que for mais prudente e honesto perderá mercado para os imprudentes e desonestos, pois estes poderão por algum tempo oferecer retornos maiores.

Peter Schiff é o presidente da Euro Pacific Capital e autor dos livros The Little Book of Bull Moves in Bear Markets, Crash Proof: How to Profit from the Coming Economic Collapse e How an Economy Grows and Why It Crashes. Ficou famoso por ter previsto com grande acurácia o atual cataclisma econômico. Veja o vídeo. Veja também sua palestra definitiva sobre a crise americana -- com legendas em português 


Tradução de Leandro Roque

O "ACORDO DO CHIPRE"E O DESENLACE DO SISTEMA BANCÁRIO DE RESERVAS FRACIONÁRIAS


O "acordo do Chipre" — que é como o arranjo tem sido amplamente rotulado pela mídia — pode representar o penúltimo ato do colapso que está ocorrendo em câmera lenta do sistema bancário de reservas fracionárias. Este colapso começou, na prática, com a implosão das instituições de poupança e empréstimo dos EUA no final dos anos 1980. 

[N. do T.: as Savings and loan association são instituições financeiras americanas que captam fundos — e pagam juros aos seus investidores — para investi-los principalmente em hipotecas, e que podem também oferecer depósitos em conta-corrente e outros serviços bancários. A crise desse setor começou em 1986 e só acabou em 1995].

Esta tendência continuou com as crises monetárias do México em 1994, do Sudeste Asiático em 1997, da Rússia em 1998 e da Argentina em 2001, crises estas nas quais o sistema bancário de reservas fracionárias teve um papel decisivo. O deslindamento do sistema bancário de reservas fracionárias se tornou visível até mesmo para correntistas comuns dos países desenvolvidos durante o colapso financeiro de 2008, o qual desencadeou algumas corridas bancárias a algumas das maiores e mais veneradas instituições financeiras do mundo (Northern Rock, Countrywide Financial, Bear Stearns, Lehman Brothers, Merrill Lynch, Fannie Mae, Freddie Mac, Washington Mutual, Wachovia, Citigroup e AIG). O colapso total só foi evitado porque o Federal Reserve concedeu um pacote de socorro multitrilionário (US$16 trilhões) aos bancos americanos e também aos estrangeiros.

No entanto, de uma forma ainda mais intensa do que a inédita crise financeira de 2008, os recentes eventos no Chipre podem ter desferido o golpe moral no sistema bancário de reservas fracionárias. Um sistema bancário de reservas fracionárias só pode continuar operando normalmente enquanto seus correntistas tiverem a plena confiança de que, independentemente das agruras financeiras que venham a acometer o banco no qual seu dinheiro está "depositado", eles sempre poderão retirar todo o seu dinheiro deste banco, a qualquer momento e sem nenhuma perda. Em um sistema de reservas fracionárias, sistema este em que bancos operam tecnicamente insolventes (pois nunca têm dinheiro para honrar todos os seus compromissos), a confiança é tudo. Se a confiança se esvair, o sistema entra em colapso.

Desde a Segunda Guerra Mundial, os seguros governamentais sobre depósitos bancários, lastreados pelos poderes de criação de dinheiro do banco central, passaram a ser vistos como a inabalável garantia que sanciona esta confiança. Com efeito, por causa desta 'garantia', o sistema bancário de reservas fracionárias passou a ser visto pelos correntistas como sendo, na prática, um sistema bancário com 100% de reservas — afinal, desde a criação dos seguros para os depósitos, os correntistas passaram a agir com a tranquilidade de quem acredita que seu dinheiro de fato está "lá no banco". "Na pior das hipóteses", pensam eles, "os bancos centrais irão simplesmente criar o dinheiro do nada".

Perversamente, as várias crises envolvendo o sistema bancário de reservas fracionárias que citei acima apenas reforçaram esta crença entre os correntistas, pois os bancos que apresentavam problemas sempre foram prontamente socorridos — especialmente os grandes e menos estáveis. Daí surgiu a doutrina do "grande demais para quebrar".

Por causa desta doutrina, correntistas cujos depósitos estavam acima do valor garantido pelo governo — bem como pessoas que compraram títulos emitidos por bancos que querem se recapitalizar — quase sempre foram integralmente restituídos quando algum grande banco falia, pois era senso comum que a confiança em todo o sistema bancário era algo frágil e evanescente, que se quebraria e se dissiparia completamente mesmo que somente uma grande instituição falisse.

Voltando ao acordo do Chipre. De um ponto de vista pró-livre mercado, ele está longe do ideal. A solução livre-mercadista não envolveria restrições a saques (€300 por dia), não imporia controles de capital fascistas sobre residentes domésticos (pessoas estão sendo revistadas nos aeroportos, pois não se pode sair do país com mais de €3.000) e investidores estrangeiros, não limitaria o uso do dinheiro (transações totais com qualquer tipo de cartão será limitadas a €5.000 por mês) e não obrigaria os pagadores de impostos do restante da zona do euro a contribuir com o pacote de socorro de €10 bilhões para os bancos do Chipre. 

Não obstante, o acordo de fato transmite uma salutar mensagem para os correntistas e credores de bancos de todo o mundo. Tal mensagem está em obrigar tanto os correntistas cujos depósitos estão acima do valor segurado (acima de €100.000) quanto os compradores de títulos bancários a arcarem com parte do custo do pacote de socorro.

Estes credores que compraram títulos dos dois maiores bancos do Chipre perderão tudo, e já foi anunciado que os grandes correntistas do banco estatal Laiki (que foi liquidado) poderão também perder absolutamente tudo. Já os grandes correntistas do Banco do Chipre perderão algo entre 30 e 60% de seus depósitos. Os pequenos correntistas de ambos os bancos, cujas contas estão totalmente seguradas — pois são menores que €100.000 — não perderão nada.

O bom resultado de tudo isso é que os correntistas, tanto os segurados quanto os não-segurados, na Europa e ao redor do mundo, irão se tornar muito mais cautelosos ou até mesmo mais desconfiados ao lidar com bancos de reservas fracionadas. Eles estarão bem mais propensos a correr aos bancos e sacar seu dinheiro ao mais mínimo sinal ou rumor de instabilidade. Isso irá induzir os bancos a alterar radicalmente as fontes de financiamento que eles utilizam para conceder empréstimos. A esperança é que eles diminuam a criação de dinheiro (que, em última instância, utiliza o dinheiro depositado em depósitos à vista por correntistas) e passem a utilizar mais a emissão de títulos e até mesmo seu capital próprio.

Como foi relatado na terça-feira, tal mudança de postura já vem sendo esperada por muitos analistas:

Uma possível consequência do acordo de ontem é a reação em cadeia que pode ser gerara sobre a maneira como os bancos se financiam, disseram analistas. Bancos tipicamente se financiam por meio de alguma combinação entre depósitos de correntistas, lançamento de ações, e emissão de diversos tipos de títulos, os quais são lastreados por um conjunto de ativos de alta qualidade que vão para o balancete do financiador do banco.

A consequência do socorro ao Chipre pode ser a de que os bancos passarão a ser mais propensos a utilizar títulos condicionalmente conversíveis — contingent convertible bonds, os CoCos — para levantar dinheiro, dado que sua capacidade de sobrecarregar ativos emitindo títulos poderá ultrapassar os limites estipulados pelas regulamentações, disse Chris Bowie, da Ignis Asset Management Ltd de Londres.

"É de se esperar algumas fugas de depósitos e uma mudança no padrão de financiamento, o qual passará a ser formado por uma combinação entre títulos, capital próprio e ações", disse Bowie, que é chefe do departamento de administração de carteira de crédito da Ignis, a qual gerencia aproximadamente US$ 110 bilhões.

Se isso de fato ocorrer, será uma mudança significativa e um passo rumo a um sistema financeiro mais de acordo com os princípios do livre mercado; um sistema financeiro no qual o radical descasamento entre o prazo de maturação de ativos e de passivos — como ocorre quando os bancos utilizam depósitos a vista para financiar empréstimos de longo prazo — é eliminado de uma vez por todas.

Algumas crises bancárias a mais na zona do euro — especialmente uma em que os correntistas segurados sejam obrigados arcar com o socorro — irão provavelmente fazer com que a fé nos seguros governamentais dos depósitos se evapore por completo, levando junto a confiança no sistema bancário de reservas fracionárias. E então pode ser que surja naturalmente no mercado um sistema em que títulos, ações e genuínos depósitos a prazo que não podem ser sacados antes do prazo de maturação se tornem as fontes exclusivas de financiamento para empréstimos bancários. Depósitos à vista, movimentáveis ou não por meio de cheques ou cartão de débito (conta-corrente e poupança), seriam segregados e mantidos em depósitos bancários que realmente mantenham 100% de reservas e realizem toda uma gama de serviços de pagamento, de caixas eletrônicos a cartões de débito.

Embora esta conjectura possa soar excessivamente otimista, é fato que hoje estamos muito mais próximos de tal arranjo do que antes do "acordo do Chipre" ter sido efetivado. É claro que estaríamos ainda mais perto se não houvesse nenhum pacote de socorro e se todo o ônus de uma quebra bancária recaísse exclusivamente sobre os credores e correntistas dos bancos falidos (em vez de ser socializado com os pagadores de impostos). Caso isso ocorresse — isto é, caso todo o ônus ficasse para credores e correntistas —, a real natureza do sistema bancário de reservas fracionárias seria explicitada de modo que qualquer leigo entenderia.
Joseph Salerno é o vice-presidente acadêmico do Mises Institute, professor de economia da Pace University, e editor do periódico Quarterly Journal of Austrian Economics.

Tradução de Leandro Roque

segunda-feira, 1 de abril de 2013

DETESTO LUCRO... DOS OUTROS

É comum se ouvir no Brasil a expressão “sem fins lucrativos” como um qualificativo para a instituição referida. A lógica nos leva (ou aos ignorantes) a crer que aquele que tem lucro não presta. Na verdade, quase sempre é o contrário. Até poderiam usar algo como “não distribui dividendos a ninguém” para algumas ONGs se mostrarem mais simpáticas a seus pretensos patrocinadores.


Lucro é como mulher bonita. Quem não tem, quer a do vizinho. Trabalhar, progredir, ganhar mais, comprar um carro, uma casa, uma aliança, viajar, são desejos humanos atávicos. Imutáveis. A mesma roupa e o sapato recomendados por Mao não resistiram a dois dias de liberdade. Todos foram para o lixo e as grifes encheram as ruas de Shanghai.

Já foi pecado ter lucro. Hoje a Igreja reza e luta para que seus euros e ouros sejam bem empregados a fim de fugir do prejuízo destruidor. Entrar no céu era privilégio dos pobres. Hoje está mais compreensível, para a alegria dos listados na Forbes.

Os que se intitulam de “esquerda” por sua vez, adoram dizer: “Eles só pensam em lucro.” Mas querem salários maiores, às vezes, até dezessete por ano, e reclamam, aos gritos, quando não recebem dividendos de suas ações da estatal de seu coração ou de algum banco mais lucrativo.

A simples e ideológica posição contra o lucro, na maior parte das vezes, traduz a incapacidade do indivíduo de gerar resultados ou, pior ainda, movida pela inveja (na definição clássica do Zuenir Ventura) daqueles que, por profissionalismo, o fazem.A geração legítima de lucros – significando o resultado positivo da atividade econômica, sem ajudas e apadrinhamentos oficiais, contando apenas com a capacidade empresarial de disputar o mercado, com produtos onde preço, qualidade e serviço são definidores das escolhas do consumidor – é o motor principal da sociedade moderna e globalizada.

Arguir contra o lucro, sobre o qual incidem impostos que devem ser aplicados corretamente em benefício da população, também serve para o discurso falso e oportunista destinado a agradar, enganando as multidões com linguajar incendiário contra os “empresários gananciosos” e aqueles que “só pensam em lucros” Mas a história tem dado às nações que respeitam, estimulam e engrandecem os que são capazes de gerar lucros posições de liderança e, a seus povos, mais dignidade. Por: Antenor Barros Leal Fonte: O Globo, 28/03/2013

LENTA PIORA NA SITUAÇÃO MACROECONÔMICA

As condições macroeconômicas vêm piorando lenta e firmemente no Brasil. Minha percepção é de que isso vai se consolidar ainda mais ao longo do ano. Os gráficos acima ilustram o que foi dito. Comecemos pelo setor externo: a balança comercial vem se enfraquecendo repetidamente, pois de um saldo de quase US$ 50 bilhões em 2007, atingimos US$ 14 bilhões para os 12 meses terminados em fevereiro.


Na MB, projetamos um número de US$ 7,5 bilhões para o ano de 2013, decorrente da ampliação do déficit do petróleo (inclusive por conta de mais de US$ 4 bilhões em compras internadas no ano passado, mas só registradas neste exercício), do contínuo enfraquecimento das exportações de manufaturados (que caíram 19% em fevereiro frente o mesmo período do ano passado) e de uma expansão mais modesta da receita da venda de produtos básicos ao exterior, em razão de menores cotações.

O possível colapso cambial da Argentina, a difícil situação da Venezuela na área externa e a significativa piora no cenário europeu reforçam nossa percepção, inclusive reduzindo o estímulo ao crescimento do PIB. Ao mesmo tempo, o déficit de conta corrente vem piorando significativamente, como se vê no gráfico 1. Nos 12 meses terminados em fevereiro, o déficit já atingiu US$ 63,5 bilhões e o próprio Banco Central projeta US$ 68 bilhões para este ano.

Nós, na MB, trabalhamos com um déficit de US$ 72 bilhões. Certamente esse número ainda é financiável sem grandes dificuldades, mas, pela primeira vez, o déficit não será coberto pela entrada de investimento direto, que projetamos encerrar o ano com US$ 55 bilhões, inferior aos US$ 63,7 bilhões apurados nos 12 meses encerrados em fevereiro. O enfraquecimento contínuo da nossa competitividade e a menor atratividade do País como o destino de investimentos levam a essa situação.

A segunda área onde a tendência de piora é evidente é a da inflação. O gráfico número 2 mostra a contínua elevação dos preços desde meados do ano passado, tendo o IPCA-15 em 12 meses atingido 6,4% em março. Pior que isso é a contínua elevação do índice de difusão, segundo o qual 75% das 365 categorias de preços e serviços tiveram elevação neste mês. E não é uma elevação qualquer, pois nada menos que 30% de todas as categorias de preços subiram mais de 10% nos últimos 12 meses. Ou seja, estamos falando de uma elevação generalizada de preços.

Finalmente, a política fiscal é cada vez mais expansionista e mais opaca. O festival de truques contábeis já passou há muito tempo do razoável, e é responsável, por exemplo, por uma ressalva no balanço no BNDES, exigido pelos auditores, como mostrou o Estadonesta semana. Ao mesmo tempo, o verdadeiro orçamento paralelo em que se transformaram os restos a pagar do Tesouro Nacional tornam de muito pouco valor a estatística do resultado primário como indicador válido da política fiscal. É por isso que, como muitos outros analistas, olhamos para a evolução da dívida bruta como indicador da sanidade das finanças e, neste caso, há uma piora evidente, como se vê no gráfico número 3.

Não é de surpreender que a confiança do consumidor esteja francamente em baixa há vários meses, a despeito da reduzida taxa de desemprego que temos até agora. Do lado da produção, a confiança da indústria também não decola (gráfico 4). É por isso que a perspectiva de elevação dos investimentos é cada vez menor, exceto pela forte recuperação da demanda de caminhões em virtude da grande safra agrícola atual. O teto para o crescimento do PIB continua em 3%.

A qualidade da política econômica vem caindo, assim como a da regulação. É bastante evidente que a antecipação da campanha presidencial recém-ocorrida só piora esta trajetória, uma vez que todas as ações de política econômica passarão antes pelo critério de impacto eleitoral. Dois exemplos dão abundantes evidências dessa proposição, a saber, a política anti-inflacionária e a questão das tarifas de energia elétrica.

A administração de preços passou a ser o centro da política anti-inflacionária e depois da cesta básica parece que virão medidas tentando evitar elevação das tarifas de ônibus. Ora, no ambiente de alta mais ou menos generalizada de preços e custos, essas medidas são claramente inócuas no que tange à redução da inflação.

Os cigarros representam um caso que vale a pena observar: no IPC do IGP-M de fevereiro, o item despesas diversas subiu 17% (em 12 meses), resultado de uma elevação de 30% dos cigarros no período. Apenas para lembrar, essa elevação deveria ter ocorrido em dezembro de 2011, mas não ocorreu para evitar que a inflação do ano ultrapassasse os 6,5%.

Mesmo no caso de reduções de impostos que sejam definitivas, a desoneração tem um efeito limitadíssimo sobre a dinâmica dos preços, pois ocorre uma vez só e, em geral, não é totalmente repassada ao varejo. Isso porque as empresas têm enfrentado uma elevação generalizada de custos e uma redução persistente de margens, algo que todas as análises de balanço de empresas abertas e fechadas revelam. Dessa forma, a redução de imposto é rapidamente compensada por alguma elevação de custos recentemente ocorrida.

É por isso que a frenética sucessão de pacotes administrando preços não produz efeitos significativos sobre a inflação. É o fracasso de uma visão "contábil" da inflação, ilustrada num artigo recente de um entusiasmado analista que disse que, se não fosse o choque agrícola do ano passado, a depreciação do real em relação ao dólar e os aumentos de 25% a 40% nos fretes rodoviários, a inflação de 2012 teria ficado abaixo de 4,5%!

A questão dos preços de energia elétrica ilustra a perda de qualidade na política econômica, pois, para evitar o repasse dos custos decorrentes do uso das térmicas (que levaria a uma elevação de algo como 12% nas tarifas, com potenciais problemas eleitorais), as autoridades de área estão fazendo barbaridades regulatórias, tão bem ilustradas no recente artigo de Claudio Sales aqui no Estado (10/03).

Em suma, estamos mesmo presos a uma armadilha de crescimento baixo, à qual tenho me referido mais de uma vez neste espaço. Por: José Roberto Mendonça de Barros O Estado de SP

domingo, 31 de março de 2013

A MEDIOCRIDADE SATISFEITA

O crescimento brasileiro acelerou visivelmente entre 2003 e 2010, atingindo uma velocidade média de 4% ao ano, ante 2,5% ao ano nos oito anos anteriores.


Voltamos, porém, a patinar em 2011 e 2012, crescendo a menos de 2% ao ano. Mesmo que observemos a aceleração esperada para este ano (3%) e para o próximo (3,5%), estaremos de volta ao patamar anterior. Trata-se de desaceleração cíclica ou de reflexo de um problema mais profundo?

Não resta dúvida acerca do diagnóstico do governo.

Na sua visão, a piora do desempenho é tratada como questão cíclica, provavelmente causada pela crise internacional, assim como pela menor disponibilidade de crédito, um mini “replay” da crise de 2009, que mereceria, portanto, o mesmo tipo de resposta: juros mais baixos, aumento da disponibilidade de crédito por meio dos bancos públicos e, por fim, uma política fiscal mais frouxa, expressa na redução (“anticíclica”) do superavit primário.

Há apenas um problema com esse diagnóstico: não encontra o menor amparo na realidade.

Para começar, é difícil justificar que a crise internacional teria causado uma redução no crescimento brasileiro ao mesmo tempo em que vários países da região, até mais dependentes de commodities do que o Brasil, tenham registrado aceleração no período.

Afora isso, em 2009 observamos piora no mercado de trabalho e redução expressiva da inflação.

Tais observações são consistentes com uma economia que, em vez de enfrentar uma desaceleração cíclica, parece operar próxima ao seu potencial, como expresso na menor taxa de desemprego observada desde o início da série do IBGE.Agora, ao contrário, o desemprego continuou a cair, e a inflação, após breve queda (em boa parte devido às mudanças metodológicas no IPCA), voltou a acelerar, a ponto de forçar até o relutante BC a recuar de sua promessa de manter “a estabilidade das condições monetárias por um período de tempo suficientemente prolongado”.

Da mesma forma, diferentemente do observado em 2009, quando a velocidade de crescimento dos salários nominais caiu de valores próximos a 11%-12% ao ano para algo em torno de 4%-5% ao ano, estes se expandem hoje a 9%-10% ao ano, também um sintoma de aquecimento no mercado de trabalho.

Aliás, dado que o crescimento da produtividade teima em permanecer ao redor de 1%-1,5% ao ano, bem inferior à expansão salarial, não é difícil concluir que o custo por unidade produzida venha aumentando e, portanto, pressionando a inflação, em particular nos segmentos em que a concorrência internacional é escassa (por exemplo, serviços).

O comportamento do mercado de trabalho, salários e preços aponta, portanto, para uma conclusão desanimadora. A queda de desempenho não se deve principalmente a questões cíclicas, mas, sim, como finalmente o BC parece ter reconhecido, “a limitações no campo da oferta”, ou seja, gargalos no mercado de trabalho (e também infraestrutura) que impedem o crescimento mais vigoroso.

Não se trata, quero deixar claro, de afirmar que houve necessariamente redução do nosso ritmo de crescimento potencial nos últimos anos, mas de algo até mais sério.

É bastante possível que sempre tenha sido baixo; tendo saído, porém, de uma situação de desemprego muito elevado no começo da década passada, pudemos crescer acima do potencial pela utilização da mão de obra então disponível, reduzindo o desemprego ao longo do processo.

Essa estratégia enfrenta suas óbvias limitações, no entanto, quando a disponibilidade de mão de obra se esgota.

Assim, como não preparamos a transição para um crescimento baseado na produtividade, na prática abandonando o processo de reforma que se estendeu de 1995 a 2006, esses limites se traduzem em crescimento baixo e inflação alta.

Já a persistência da estratégia atual de política econômica sugere que o governo está mais do que satisfeito com essa mediocridade. Por: Alexandre Schwartsman  Fonte: Folha de S.Paulo, 27/03/2013

O AÇÚCAR COMO VENENO

Leio na Zero Hora: O consumo de refrigerantes, sucos industrializados e outras bebidas açucaradas pode estar associado a cerca de 180 mil mortes por ano no mundo, de acordo com uma pesquisa apresentada recentemente no congresso da Associação Americana de Cardiologia.

Os autores usaram dados do estudo The Global Burden of Disease (literalmente, O Peso Global da Doença), de 2010, e relacionaram a ingestão de bebidas açucaradas a 133 mil mortes por diabetes, 44 mil mortes por doenças cardiovasculares e 6 mil mortes por câncer. Cerca de 80% dessas mortes ocorreram em países de renda média ou baixa.

Os pesquisadores calcularam as quantidades consumidas dessas bebidas por idade e sexo, os efeitos desse consumo na obesidade e no diabetes e o impacto das mortes relacionadas a essas doenças. A Associação Americana de Bebidas afirmou que o estudo traz "mais sensacionalismo do que ciência".

Já comentei o assunto no século passado, em 1989. Não que a descoberta fosse minha. Mas de Carson Ritchie, cujo ensaio Food in Civilization - How History Has Been Affected by Human Tastes alerta para os efeitos danosos do açúcar. O livro foi publicado em 1981.

Ritchie um dia convidou alguns amigos a um bom restaurante. Jantaram à la farta e tudo transcorreu muito bem, pelo menos até o momento da dolorosa. Ritchie puxou a carteira e nela não encontrou dinheiro suficiente. Teve de apelar aos amigos que convidara para jantar. Passado o episódio, considerou que a história da alimentação em algo se parece com esta anedota: quando chega o momento de pagar o banquete, podemos descobrir que aquilo que desfrutamos custa bem mais do que estávamos dispostos a pagar quando nos sentamos à mesa. Terá sido talvez esta gafe o que deu origem a seu livro. 

"O açúcar para adoçar o chá e o café europeu - escreve Ritchie - foi cultivado às custas da escravidão negra. Os peles vermelhas foram expulsos sem piedade das pradarias onde caçavam para que o homem branco pudesse cultivar trigo e milho, e seus búfalos foram exterminados para dar lugar a grandes rebanhos vacuns. Os escritores norte-americanos responsabilizaram as grandes multinacionais fruticultoras pelo caos das economias centro-americanas, construindo ferrovias ilegais, sonegando impostos, manipulando os baixos salários da mão-de-obra não qualificada (já por si suficientemente baixos), expropriando as terras dos camponeses e exaurindo a fertilidade do solo. E tudo isso para que os norte-americanos tivessem bananas como sobremesa!"

Ao debruçar-se sobre os efeitos dos alimentos na História, Ritchie descobre que foram os conceitos errôneos de alimentação e não os corretos, os que demonstraram ter maior influência. "Crenças em que as especiarias aumentavam a virilidade, que o açúcar era essencial para a saúde, ou que para ser forte devia-se beber muita cerveja, condicionaram mais os destinos da humanidade que as autênticas e consolidadas leis da ciência da alimentação".

Mas como convencer minha Cristina de que seu vício não passa de um hidrato de carbono sem nenhum valor alimentício? Se os europeus, para açucarar suas tardes, destruíram homens e culturas, na África e nas ditas Índias Ocidentais, como queixar-me de minha faxineira?

Já vi universitários e professores universitários se lambuzando com sorvetes, que além de açúcar contém algo mais nocivo, o sal. (Isso até que não é tão grave: há universitários que acreditam em Deus). Pior ainda, já vi muitos destes senhores que, por uma questão de ofício possuem, ou deveriam possuir, noções de bem comer, dando sorvetes a seus filhos. Assim sendo, sempre tenho em casa um açucareiro cheio para saciar os instintos primários de Cristina e de eventuais formigas que já descobriram o mapa da mina. Sem falar que, quando o café é forte, tipo exportação, não me furto a ajuntar-lhe uma colherinha de veneno.

Pois este hidrato tão prestigiado, que no fundo só serve para produzir cáries, obesidade e doenças cardíacas, produziu mais estragos na trajetória do ser humano do que o próprio sal, que pelo menos tem a virtude de conservar as carnes, fator aparentemente banal mas decisivo na caminhada do Homo sapiens, seja rumo ao combate, seja rumo a descobertas. E já fez levas de jovens do mundo todo partirem em revoadas rumo àquela ilha tanto amada por Paulo, Cardeal Arns, para cortar cana em prol da revolução.

Pois a cana-de-açúcar deve ser colhida rapidamente quando madura e Castro, preocupado em seguir as diretrizes de Moscou, mandou para Angola a juventude cubana, onde, em vez de ceifar cana, ceifaram vidas alheias e muitas vezes perderam as suas. Mas Estados Unidos, Europa, América Latina e mesmo o Brasil, pronto supriram a falta de mão-de-obra. Milhares de jovens, que jamais haviam visto de perto um canavial, bravamente acorreram, de machete em punho, em apoio à ditadura cubana. 

O açúcar foi introduzido no mundo mediterrâneo por Dario, o rei dos persas, trazido da Índia após suas conquistas por lá. Difundiu-se pela Europa e passou ao Novo Mundo graças aos colonizadores espanhóis. Hernán Cortez introduziu a cana-de-açúcar no México. O Caribe proporcionava ao açúcar o clima mais adequado que seu próprio lugar de origem, a Índia, pois lá chovia muito mais. Acontece que os espanhóis jamais iriam trabalhar se encontrassem alguém que o fizesse por eles.

A tarefa foi delegada, se assim se pode dizer, aos índios caribes e arawaks, culturas que logo foram exterminadas. Tendo de buscar mão-de-obra em outra parte, os colonizadores das "Índias Ocidentais" deram uma piscadela de olhos aos portugueses. Estes, tendo observado que os índios, não se adaptando ao trabalho duro, morriam na colheita de açúcar, os deixaram de lado e foram buscar escravos na África.

"Já que espanhóis e portugueses haviam começado a desenvolver suas plantações de cana com a colaboração dos escravos negros, todos os demais pensaram que tinham de seguir seu exemplo. Se assim não faziam, expunham-se a produzir um açúcar mais caro, sem saída no mercado. Resulta irônico comprovar a que ponto haviam chegado os primeiros colonos franceses e ingleses no Caribe: homens idealistas, freqüentemente perseguidos por suas crenças religiosas, e muitas vezes indivíduos de princípios elevados que queriam viver de uma forma mais livre da qual lhes era permitido viver na Europa". Pois estes senhores, diz-nos Ritchie, tornaram-se escravocratas nas Índias Ocidentais. Para satisfazer o paladar europeu.

Outro subproduto da cana, o rum, serviu para incrementar o tráfico de escravos. Quando surgem as primeiras campanhas abolicionistas, seus líderes implantam o primeiro boicote ao comércio infame, adoçando o café com nata em vez de açúcar, e pedindo conhaque francês em lugar de rum. Para ajudá-los a propagar suas idéias, lady Henderson, comerciante em Londres, vende açucareiros com gravado em letras douradas: "Açúcar das Índias Orientais, não produzido por escravos". 

Ritchie considera que se o açúcar fosse descoberto hoje seria classificado como droga. Droga que já produziu mais estragos em sua trajetória – acrescentemos – do que a maconha ou cocaína. Por: Janer Cristaldo

SOBRE O ASSALTO CIPRIOTA


Até o último fim de semana, a abordagem básica da União Europeia para socorrer países endividados era repassar a eles dinheiro que os tornasse capazes de honrar o pagamento de suas dívidas e de outras despesas correntes, dentre elas os maciços programas de bem-estar social de sua população. Em troca deste dinheiro, ficava estipulado que o governo reduzisse algumas despesas e aumentasse impostos. Adicionalmente, pedia-se àqueles que haviam comprado títulos da dívida do governo que sofressem algumas perdas.

Porém, com o Chipre, as coisas tomaram um rumo distinto. Para evitar ter de cortar gastos e aumentar impostos, o presidente do Chipre anunciou que o governo iria simplesmente expropriar o dinheiro que seus cidadãos haviam depositado nos bancos daquele país. Aqueles que tivessem depósitos acima de €100.000 teriam 10% do seu dinheiro confiscado. Aqueles com depósitos menores que €100.000 teriam aproximadamente 7% do seu dinheiro confiscado.

Embora tal medida ainda tenha de ser aprovada pelo parlamento do Chipre, a decisão de implantá-la foi tomada por burocratas da zona do euro em uma reunião fechada. Caso o governo cipriota recuse esta proposta, a zona do euro não irá fornecer um pacote de €10 bilhões para socorrer os insolventes bancos do Chipre.

Os bancos do Chipre se tornaram insolventes após os líderes da zona do euro terem decidido que os títulos da dívida grega seriam "reestruturados" — leia-se "parcialmente caloteados". Como os bancos do Chipre haviam comprado vários destes títulos, eles tiveram perdas substanciais.

A história está sendo amplamente coberta pela mídia mundial, e por um bom motivo. Os eurocratas sempre disseram que as contas bancárias eram sacrossantas. Eles sempre prometeram que não tocariam nelas. Com o anúncio desta medida a ser adotada no Chipre, os eurocratas estão dizendo "nós mentimos". No entanto, estes mesmos eurocratas estão assegurando a todos os correntistas da zona do euro que isso não acontecerá novamente, que se trata de uma medida excepcional, a ser implementada uma única vez. "Confiem em nós".

Os relatos são de que o presidente do Chipre, na reunião de domingo, implorou ao parlamento do país para que implantasse as taxas. O mais curioso é que, durante sua campanha eleitoral, ele havia prometido aos eleitores que jamais, em hipótese alguma, iria tributar suas contas bancárias. E ele reforçou este compromisso em seu discurso de posse: "Não será tolerada absolutamente nenhuma referência a tributação de depósitos ou calote parcial na dívida". Para se certificar de que havia sido perfeitamente claro, ele acrescentou: "Este assunto nem sequer está em discussão".

Tradução: sempre que um político promete enfaticamente que não fará algo, tenha a certeza de que esse algo já está em fase final de planejamento.

Os rumores de que este plano estava sendo analisado nos corredores do quartel-general da União Europeia já circulavam na imprensa havia mais de um mês. Os correntistas cipriotas poderiam ter transferido seus euros para bancos alemães. Eles poderiam ter sacado seu dinheiro. Mas o presidente havia dito que as contas bancárias eram sacrossantas. E as massas acreditaram. E ficaram quietas. 

É isso o que acontece quando você deixa seu bom senso de lado e aceita as promessas de políticos.

O parlamento cipriota decidirá a respeito das taxas na tarde desta terça-feira. Se o parlamento recusar, o presidente será um pato manco pelo resto de seu mandato.

O governo fechou os bancos para impedir que os correntistas movimentassem suas contas e sacassem dinheiro. A imprensa se refere a esta medida como um "feriado" bancário.

Caso o governo do Chipre postergue a imposição destes tributos, está claro o que qualquer cipriota racional deveria fazer: ligar para seu banco e transferir seus euros para um banco alemão assim que o "feriado" bancário acabar.

O governo pode abrir os bancos sem ainda ter aprovado os impostos. Boom! Haverá uma corrida bancária. Para evitar isso, ele terá de manter os bancos fechados. Mas isso irá paralisar a economia, podendo gerar uma depressão. Ou ele pode aprovar os impostos e só então abrir os bancos. Ainda assim, a tendência é que haja uma corrida bancária. "Engane-me uma vez, que vergonha para você. Engane-me duas vezes, que vergonha para mim." 

Os eurocratas que, em conjunto com o FMI, criaram este plano durante o fim de semana certamente sabiam que ele desencadearia uma corrida bancária. Se eles não previram isso, então eles são economicamente ignaros. Será que eles creem que o rebanho ficará quieto uma segunda vez, pacificamente esperando ser tosado? É difícil de acreditar.

Mas eles também não imaginavam que o governo fosse postergar a implantação dos impostos.

Minha opinião: creio que tudo isso é deliberado. Eles sabiam que toda essa reação, com ameaça de corrida bancária e tudo mais, iria ocorrer. Os eurocratas estão enviando um recado para todos os outros políticos dos PIIGS: "Salvem vocês os seus próprios bancos. Caso contrário, preparem-se para uma corrida bancária igual à do Chipre". O objetivo deles é justamente gerar uma corrida bancária no Chipre. Eles querem enviar uma mensagem para todos os outros governos da zona do euro que estão acomodados e tranquilos, operando sob a pressuposição de que a zona do euro irá sempre socorrer suas dívidas ou socorrer seus bancos. Não irá. Não tem como. Ela não tem o dinheiro. Os eleitores dos países mais solventes não permitirão que seus respectivos governos transfiram seu dinheiro para o governo dos países mais pródigos.

Os eurocratas escolheram o Chipre para servir de exemplo porque se trata de uma ínfima nação insular, responsável por apenas 0,2% do PIB europeu. Se os bancos do Chipre quebrarem, e daí? Se seus políticos resolverem sair da zona do euro, e daí? Uma crise bancária no Chipre é exatamente o que os banqueiros do norte precisam para enviar um recado: "Não haverá mais tolerância. Coloquem suas contas em ordem. Cuidem de seus bancos". Isso irá assustar os políticos mediterrâneos.

No entanto, é uma medida bastante arriscada. Ela pode ter o efeito colateral de deixar os correntistas da zona do euro ainda mais assustados que seus políticos. Isso pode desencadear corridas bancárias na Espanha, na Itália e em Portugal. Se eu tivesse dinheiro nos bancos de qualquer um destes países, transferiria para um banco alemão.

Mohammed El-Erian, CEO da Pimco, o maior fundo de investimentos do mundo voltado para títulos governamentais, disse o seguinte: "Na Europa, esta ocorrência pode perfeitamente solapar o até então tranquilo comportamento dos correntistas e dos credores em outras vulneráveis economias europeias — em particular na Grécia, na Itália, em Portugal e na Espanha. Não obstante as repetidas garantias dadas por burocratas europeus de que o caso do Chipre é 'excepcional' e de que as medidas adotadas são 'singulares', as políticas criadas neste fim de semana aumentaram o prêmio de risco sobre os títulos das dívidas destes países".

Foi um ato de desespero dos burocratas da zona do euro. Eles estão arriscando fomentar uma corrida bancária na Itália e na Espanha. Aqueles correntistas que não quiserem ser tratados como os cipriotas têm apenas uma saída: transferir seu dinheiro para bancos alemães.

Os burocratas da zona do euro têm de estar realmente muito desesperados para anunciar uma política tributária sobre contas bancárias que não pode ser impingida pela zona do euro, mas apenas pelos governos nacionais. Se um determinado governo deixar claro que irá obedecer, as corridas bancárias serão inevitáveis. Se ele disser que não irá obedecer, ainda assim pode haver corridas bancárias. Apenas se o sujeito for muito frio e confiar plenamente em seu governo é que ele deixará seu dinheiro no banco de seu país em vez de transferi-lo para um banco alemão.

Tudo isso mostra quão desesperados estão os líderes da zona do euro. Eles fingem que tudo está calmo. Eles pretendem que o sistema não está ruindo. E então eles fazem um anúncio que é racional apenas sob a hipótese de que a situação fiscal e bancária dos países europeus está em frangalhos. O estado de bem-estar social europeu está com seus dias contados.

Gary North , ex-membro adjunto do Mises Institute, é o autor de vários livros sobre economia, ética e história. Visite seuwebsite.

sábado, 30 de março de 2013

A VOLTA DO MERCADO

Quase não apareceu no noticiário, mas foi um sinal importante. Faz alguns dias, o governo americano informou que vendera mais um lote de ações da GM, papéis que havia adquirido em 2009 para capitalizar a companhia e, assim, impedir o colapso da indústria automobilística. A General Motors se tornara Government Motors, no feliz achado da revista “Economist”. Agora, está sendo reprivatizada, e isso depois de ter passado por uma dura reestruturação imposta pelo acionista então dominante, o governo.


Considerando que a administração federal também adquiriu ações de bancos e companhias seguradoras à beira da falência e sem esquecer que o Federal Reserve (Fed, o banco central) saiu comprando todo tipo de títulos, inclusive podres, não há dúvida: o governo interveio, gastou dinheiro do contribuinte e controlou a crise, que teria sido muito pior sem a intervenção estatal na economia.

Estão vendo? Eis a prova da falência do mercado bem no coração do capitalismo — foi o comentário comum na ocasião.

Segue a crise, passa o tempo e o que se passa? Hoje, quando se pergunta quem pode ameaçar a recuperação da economia americana, a resposta sai na hora: o governo ou, melhor, Washington na acepção ampla do conceito, incluindo a Casa Branca e o Congresso.

Durante meses, os políticos americanos deixaram o mundo em suspense. Sucederam-se datas fatais. Se o Congresso não votasse até amanhã esta ou aquela lei, o governo ou daria calote nos seus títulos da dívida, estocados nas reservas financeiras de todos os países; ou não poderia gastar um centavo a mais, e assim daria o cano nos funcionários e fornecedores; ou ainda entraria em vigor um drástico corte de gastos e aumento de impostos. Era o abismo fiscal, lembram-se?

É verdade que Congresso e Executivo nunca deixaram a coisa acontecer. No último momento, deputados e senadores, republicanos e democratas, mais os assessores do presidente Obama, conseguiam um arranjo. Foram tantas datas fatais superadas que o mundo até se acostumou.

Mas é verdade também que nada está resolvido. Foi tudo empurrado para mais uma data fatal. As questões estruturais, os crescentes e insustentáveis gastos públicos com aposentadorias e saúde, mal têm sido tocadas. Segue o impasse entre republicanos e democratas sobre como lidar com os contas governamentais.

Ainda recentemente, o Fed reduziu suas previsões de crescimento, citando a falta de um programa de ajuste de médio e longo prazo.

E entretanto, a economia americana continua apresentando o melhor desempenho entre os desenvolvidos. O Produto Interno Bruto se expande ao ritmo pouco acima de 2% ao ano, podendo alcançar 3% em 2014, com o desemprego em queda. Pode não ser brilhante, mas comparem com a Europa.

O que explica isso? “A América que funciona” — diz a capa da “Economist” da semana anterior.

O setor privado funciona. No meio dessa confusão toda, produziu, por exemplo, uma mudança drástica — a extração comercial de petróleo e gás das rochas de xisto. É um clássico do empreendedor privado: investimento em pesquisa, transformação de conhecimento em tecnologia efetiva e a capacidade de colocar o negócio para funcionar.

Isso já trouxe uma novidade global e, pois, geopolítica: a China ocupou o lugar dos EUA como a maior importadora mundial de óleo.

Outro fator da recuperação americana está nos governos estaduais e prefeituras. Como cita a reportagem de “Economist”, administrações locais tratam de ajustar suas contas e turbinar investimentos em infraestrutura. Alguns estados aplicaram reduções expressivas de impostos para atrair empresas e trabalhadores qualificados. Outros combinaram cortes e aumentos de impostos e tarifas (como pedágios e contas de água e luz). Para financiar investimentos, encontra-se de tudo: privatização direta, Parcerias Público Privadas e gasto estatal, ora com fundos privados, remunerados, claro, ora direto com o dinheiro do contribuinte.

Tem coisa que dá certo, coisa que não funciona, mas parece que o conjunto de iniciativas locais cria um movimento nacional no sentido de mais intensa atividade econômica.

Certamente, há questões estruturais que continuam dependendo da política de Washington, mas há uma lição a tirar do que já se viu. Primeiro, que o governo é decisivo em determinados momentos. Segundo, que é no setor privado que se encontra o tal “espírito animal”. E terceiro, que vale especialmente para o Brasil de hoje, o governo não pode querer dizer aos empresários quando, onde e como devem investir. Se os negócios dependem do governo, o empreendedor esquece essas coisas de inovação, risco, aplicação de capital próprio, para buscar o favor oficial. Não decola. Por:  Carlos Alberto Sardenberg

O GLOBO - 28/03

'AQUELA SENHORA ESTÁ TORNANDO IMPOSSÍVEL INVESTIR NO BRASIL'

Parceiro de George Soros nos anos 70, americano diz que não investe mais no País porque governo Dilma é contra o capital

O economista James B. Rogers ou Jim Rogers, como prefere ser chamado, é um dos emblemáticos investidores americanos das últimas décadas. Prestes a fazer 71 anos, Rogers se juntou ao amigo George Soros nos anos 70 para fundar o Quantum Fund. Fez fortuna, largou tudo e foi dar a volta ao mundo de moto. Pelas façanhas como viajante, entrou duas vezes para o Guinness Book.

Com suas gravatas borboletas coloridas e a língua afiada para críticas, Rogers é figura constante no noticiário econômico da TV e jornais dos Estados Unidos. Ele está pessimista em relação às perspectivas para os Estados Unidos, o Chipre e toda a zona do euro e mais crítico do que nunca em relação ao Brasil. "Aquela senhora está tornando impossível investir no Brasil", diz, referindo-se à presidente Dilma Rousseff.

Em entrevista por telefone concedida de Santiago, no Chile, Rogers disse que o Brasil poderia ser aquele país promissor que muitos imaginaram. Mas não é, por causa dos erros do governo, especialmente no que diz respeito a tentar controlar a entrada de capitais.

"Ela (Dilma) está tornando ilegal investir no Brasil", critica, dizendo ainda que não investe mais no País - nem pretende voltar a fazê-lo tão cedo.

Autor de várias obras, Rogers lançou este ano o livro Street Smarts: Adventures on the Road and in the Markets (em tradução livre, Os inteligentes das ruas: Aventuras nas Estradas e nos Mercados), ainda inédito no Brasil. No livro, ele fala de suas experiências em Wall Street e nos mercados asiáticos. Entusiasta das commodities, escolheu viver com a família em Cingapura em 2002 para que sua filha pudesse aprender chinês. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Que saída o Brasil tem para conseguir um bom desempenho econômico? O que nossa presidente pode fazer?

Ela poderia parar de impedir capital novo de entrar no País. Aquela senhora que governa o País está promovendo guerra cambial, tornando impossível investir no Brasil, tornando ilegal para os estrangeiros investirem no País. Ela coloca obstáculos para chineses e coreanos, aqueles que são grandes clientes do Brasil. Ela tem de tornar o País mais acessível! Ela tem de parar com o controle da moeda. Ela não está ajudando o Brasil, está prejudicando. Deveria haver uma abertura maior do País, uma abertura maior para o capital. Desse modo, o Brasil poderia ser um dos grandes países do mundo. Mas esta senhora é uma das muitas pessoas que têm impedido que o Brasil seja uma das principais economias do mundo.

O senhor não tem dinheiro no Brasil?

Não. Já tive, mas não tenho agora. Já houve tempos de investir no Brasil. Mas, quando você tem alguém que é contra expertise, contra capital, que ataca seus parceiros, alguém com esse tipo de atitude, não dá para investir no Brasil. Mas, se isso mudar, voltarei a colocar meu dinheiro aí.

Como vê o resgate do Chipre?

É ultrajante o que está acontecendo lá. As pessoas falam que vão colocar dinheiro no banco, porque é garantido. De repente, o governo está roubando o dinheiro deles. Espero que todos estejam mesmo preocupados com o que estão fazendo, pois isso cria um precedente. Na próxima vez que isso acontecer a outro país, eles vão dizer: o FMI, a União Europeia disseram que a gente pode tirar dinheiro dos bancos. É preciso muito cuidado, senão isso vai acontecer de novo e de novo.

Esse resgate vai evitar o contágio para outros países da zona do euro?

Claro que não. Isso não resolve o problema da zona do euro. Todos os países da Europa vão ter déficits maiores este ano do que tiveram no ano passado, e esses déficit vão continuar crescendo até que os problemas sejam resolvidos. Os problemas estão sendo postergados, mas não resolvidos.

Quem se beneficiaria com a saída do Chipre da zona do euro?

Ninguém se beneficiaria. Talvez alguns investidores espertos encontrassem modos de ganhar dinheiro às custas disso. Mas, se o Chipre deixar o euro, não será bom para o Chipre nem para a zona do euro. Isso só pioraria as coisas. Com certeza não ajudaria o Chipre. Ninguém vai querer investir no Chipre se estiver fora da zona do euro. Ninguém vai investir na moeda que eles tiverem.

Como vê a situação global?

Cada vez pior. A América está em declínio e a China será o país que mais impressionará nos próximo século.

Isso significa que vamos ter essa crise global por muito mais tempo do que se pensava?

Bom, no Japão a crise dura 23 anos. Sim, é claro que vai durar muitos anos.

Nos momentos de nervosismo nos mercados, os investidores continuam correndo para o dólar americano e o ouro. Eles ainda são um porto seguro?

Não existe isso de porto seguro. Gostaria de conhecer algo que fosse seguro e, se você souber, por favor, me diga. Mas, de qualquer modo, é para onde todo mundo vai e eu também tenho dólares no momento.

Quais serão as commodities mais promissoras?

Estou mais otimista em relação às commodities agrícolas do que todas as demais. Por: LUCIANA XAVIER - O Estado de S.Paulo

sexta-feira, 29 de março de 2013

EMPREENDER É UMA ARTE OU CIÊNCIA?




Professor já mudou algumas de suas crenças sobre empreendedorismo


Empreendedorismo é uma palavra nova no Brasil. Apareceu nos dicionários na década de 2000. Alguns livros publicados no país já utilizam o termo na década de 1980 e 1990. Antes disso, o termo entrepreneur era traduzido como empresário e empreendedorismo, às vezes, aparecia como empresarização como ocorreu no livro Prática da Administração de Empresas de Peter Drucker publicado pela primeira vez no Brasil em 1955.

Mas até hoje, o uso do termo ainda gera debates polêmicos. Só porque o sujeito abriu um negócio, é empreendedor? É possível ser empreendedor mesmo sendo empregado? Há empreendedorismo por oportunidade e por necessidade? É possível “fabricar” empreendedores em salas de aula? A pessoa “nasce” empreendedora? Empreendedorismo é uma ciência? Ou é uma arte?

Há respostas que concordam e discordam para todas estas questões, daí o debate! Há muita pesquisa e muito achismo sobre o assunto, daí a polêmica. Eu também tenho as minhas convicções e os meus achismos sobre o empreendedorismo e já mudei algumas das minhas crenças diante de algumas constatações.
No campo da ciência, de tempos em tempos aparece algo que muda a crença vigente. Thomas Kuhn chamou isto de quebra de paradigma, termo que depois de popularizou e virou sinônimo de qualquer tipo de alteração de parâmetro.

Mas uma quebra de paradigma kuhneriana no campo do empreendedorismo foi a proposição da Teoria do Effectuation proposto pela Professora Saras em 2001. O Effectuation questionou a abordagem vigente daquele empreendedor que planeja tudo antes, identifica a melhor oportunidade de negócio, mede o risco e o retorno detalhadamente. É claro que este empreendedor existe (em número cada vez maior), mas a imensa maioria das pessoas começa um negócio a partir daquilo que ela é, quem ela conhece e o que sabe fazer. Este é a primeira parte do ciclo do Effectuation. Quando escolhe algo que sabe fazer, passa a interagir com pessoas do seu relacionamento.

Eventualmente, estas duas primeiras etapas podem ocorrer de forma simultânea, quando alguém da sua rede de relacionamento pede algo que você sabe fazer. Mas o negócio passa, literalmente, a ganhar corpo quando pessoas conhecidas ou conhecidas das conhecidas passam a fazer pedidos. Mais pessoas entram em contato com o seu produto ou serviço e pessoas totalmente desconhecidas tornam-se clientes. O Effectuation tende a ser algo óbvio e pode não explicar tudo, mas foi uma contribuição científica para avançarmos o conhecimento do empreendedorismo. Novas abordagens como Lean Startup e Customer Development se alinham ao Effectuation.

Mas o empreendedorismo também pode ser uma arte, uma expressão da genialidade individual que, muitas vezes, a ciência ainda não consegue explicar. E a arte empreendedora está associada a muitas capacidades como empatia, visão, execução, design, simplicidade, entre outras.

Nesta semana, meus colegas empreendedores blogueiros postaram dilemas e desafios que podem ser discutidos a partir da ciência ou da arte empreendedora. Pedro Chiamulera da ClearSale falou da importância de uma tecnologia simples e amigável para os clientes e citou sua inspiração na Teoria do Fluxo proposto pelo psicólogo de sobrenome impronunciável , Mihály Csíkszentmihályi. A Teoria do Fluxo, apesar de não ser muito conhecida no Brasil, tem influenciado muitas pessoas no Vale do Silício, inclusive David Kelley, o celebrado fundador da Ideo.

Juliana Motter da Maria Brigadeiro apresentou um exemplo de “telefone sem fio” na sua empresa, uma situação em que ela fala algo que é compreendido de forma totalmente diferente pelos seus colaboradores. Como fazer com que os colaboradores entendam o que o empreendedor realmente disse? Há muitas teorias sobre comunicação eficaz, mas aqui pode entrar um pouco da arte empreendedora, mais especificamente a sabedoria empreendedora.

Bernardo Hees, quando ainda era presidente da América Latina Logística, implementou a Regra dos 7 na qual, qualquer comunicado para os colaboradores deveria ser simples e direta a ponto de uma criança de 7 anos entender. Alberto Saraiva, do Habib’s, foi mais direto: criou um sistema de provas em que todos os colaboradores, incluindo os diretores, deveriam prestar. Assim garantiu que todos estudassem e demonstrassem seu conhecimento sobre a empresa.

Adriane Silveira da Nanny Dog apresentou suas reflexões obtidas durante o primeiro ano de vida da sua empresa. E reconheceu que a empresa tem muitos pontos fortes, mas precisa melhorar a capacidade de planejamento. É uma ótima constatação! Muitos empreendedores começam pela lógica do Effectuation, mas depois se dão conta de que precisam planejar formalmente o negócio. É o momento em que o empreendedor se vê na necessidade de ter capacidades de gestor.

Em alguns casos, o empreendedor se torna um bom gestor, mas quando isto não ocorre, é preciso ter um sócio ou colaborador que execute muito bem esta função. Material para ajudar o empreendedor nesta situação não falta. No Brasil, Vicente Falconi é um dos grandes pensadores (e executores) do planejamento estratégico. Seu livro O Verdadeiro Poder pode ser muito útil para empreendedores que estão se tornando gestores.

Por fim, o desafio que considero o mais difícil e narrado pelo Renato Steinberg da Fashion.me. Como ter bons colaboradores na sua empresa? Jim Collins, um dos poucos que conseguem alinhar ciência e arte da administração, expande este questionamento colocando outros: Quantas pessoas certas vocês têm na sua empresa? Quantas estão nos cargos-chave? Quantos cargos-chave existem na companhia? São questionamentos que acompanharão o empreendedor durante toda a sua trajetória profissional. E no final descobrirão que o que realmente importa é o foco e as pessoas que o ajudaram a atingir seus objetivos.

Mas o questionamento do Renato ainda permanece sem uma boa resposta para boa parte dos empreendedores. Por mais que haja muita teoria sobre o recrutamento de pessoas, ainda me alinho, humildemente, ao que defende Beto Sicupira, empreendedor da AB/Inbev e de tantas outras empresas: “Contrate pessoas melhores do que você, com qualidades e conhecimentos diferentes dos seus!”. Para empreendedores chegarem a esta consideração, precisam antes ter a sabedoria de reconhecer e apostar em talentos que sabem que não têm.

Por: Marcelo NaKagawa, Insper    O Estado de SP

quinta-feira, 28 de março de 2013

"O BIGODE DE ANGELA MERKEL"

"Saia de nosso país", lia-se no cartaz, sob uma foto do rosto de Angela Merkel, ao qual se acrescentara um bigode à Hitler. Diante do Parlamento cipriota, em Nicósia, a manifestante - uma pacata senhora de meia-idade - repetia um gesto banalizado nas praças de Atenas, Lisboa, Madri e até Roma. Entre os manifestantes, a chefe de governo da Alemanha personifica a "Europa", essa entidade geopolítica ainda mais abstrata que um Estado-nação. A identificação esclarece as raízes da crise da União Europeia (UE).

Chipre é um caso singular, mas também uma lição eloquente sobre o que está em jogo. Seu setor financeiro, que faliu em decorrência da quebra grega, possuía ativos oito vezes maiores que o PIB e operava como lavanderia do dinheiro sujo das máfias russas. Por isso a UE se desviou dos modelos aplicados nos demais países endividados, exigindo como contrapartida do pacote de resgate um confisco parcial dos depósitos bancários no país. A solução original, contudo, implicava a violação da promessa solene, anunciada no início da crise do euro, de preservar os direitos dos depositantes, em valores inferiores a 100 mil euros. O precedente conta: se euros podem ser confiscados na ilhota do Mediterrâneo oriental, o que impede que sejam confiscados em Portugal ou na Espanha?

"Este é um ato indisfarçável de expropriação - em outras palavras, algo do arsenal da luta de classes dos bolcheviques, não da política econômica civilizada", reagiu o Moskovskiy Komsomolets. O jornal, um porta-voz quase explícito do Kremlin numa Rússia que realizou o sonho petista do "controle social da mídia", defendia cinicamente os interesses das máfias russas, mas tocava no nervo sensível da confiança.

Confiança é o outro nome do dinheiro: o verdadeiro lastro de todas as moedas do mundo. Em Chipre, o cristal da confiança no euro foi trincado pela segunda vez. A primeira, na Grécia, derivou da "expropriação" das instituições financeiras detentoras de títulos da dívida pública. No país insular, o plano original, rejeitado pelos parlamentares, era mais grave: atingia cidadãos comuns, junto com mafiosos estrangeiros. Já o plano definitivo, que expropria massivamente os grandes depositantes russos e nem mesmo foi submetido a voto no Parlamento, equivale à destruição do motor da economia cipriota. Nenhum investidor voltará a colocar dinheiro naquela ilha em futuro previsível - e muitos pensarão duas vezes antes de comprar ativos financeiros denominados em euros.

Angela Merkel maneja, de fato, o timão da "Europa" abalada pela crise do euro. Sua estratégia deflacionária de austeridade provoca implosões sucessivas nos pilares que sustentam o edifício europeu. O bigode de Hitler, contudo, não lhe cai bem: a "ditadura" exercida pela "troika" - UE, Banco Central Europeu (BCE) e FMI - sobre os governos nacionais eleitos não deriva da vontade da Alemanha, mas precisamente da frustração da vontade alemã na hora do tratado da união econômica e monetária.

O ano era 1990, meses depois da queda do Muro de Berlim e apenas semanas antes da reunificação alemã. Do presidente François Mitterrand emergira a proposta da união monetária, um preço que a Alemanha deveria pagar pela restauração da unidade nacional. Cedendo à posição francesa, o primeiro-ministro Helmut Kohl contrariou o BundesBank, o banco central de seu país, que não escondia o temor causado pela lendária irresponsabilidade fiscal dos países do Mediterrâneo. A moeda comum serviria para soldar os destinos alemães aos da "Europa", um objetivo geopolítico que valia a dolorosa renúncia ao marco.

Kohl conhecia os riscos e tinha uma solução. "A união política é a contrapartida essencial da união econômica e monetária", explicou numa sessão do Bundestag, o Parlamento alemão, em novembro de 1991, durante as negociações do Tratado de Maastricht. "A História recente, e não apenas da Alemanha, ensina-nos que é absurdo imaginar que se possa manter a união econômica e monetária, a longo prazo, sem uma união política". União política era sua senha para a criação de um organismo europeu de fiscalização e controle dos orçamentos dos governos nacionais. A ideia, todavia, quebrou-se de encontro ao rochedo da oposição de Mitterrand. A França almejava partilhar o controle sobre a moeda alemã, mas não contemplava a hipótese de ceder à Alemanha o controle sobre o orçamento francês. Do impasse nasceu o euro, uma "criança enferma", na expressão de Timothy Garton Ash, embalada no berço dos "critérios de convergência" de Maastricht, o nome pomposo de uma promessa vazia de responsabilidade fiscal.

O poder de emitir dinheiro é inseparável do poder de emitir dívida. O Tratado de Maastricht, porém, separou um do outro, entregando o primeiro ao BCE e conservando o segundo nas mãos dos governos nacionais. A cisão, que Kohl qualificava como "absurda", reflete a tensão entre o projeto supranacional da "Europa" e a persistência dos Estados nacionais europeus. A crise do euro, derivada daquela cisão, pode ser descrita como uma dupla recusa: a rejeição alemã a uma "união da dívida" e a rejeição dos demais países à cessão do poder soberano de emitir dívida.

A UE foi concebida em 1952, quando a Alemanha aceitou compartilhar a soberania sobre seus recursos siderúrgicos, e assumiu a forma atual em 1992, quando a Alemanha aceitou compartilhar a soberania sobre sua moeda. Os dois passos, separados por quatro décadas, obedeceram ao imperativo político de construir uma "Alemanha europeia", conjurando para sempre o espectro de uma "Europa alemã". Ironicamente, porém, o fruto final deles foi o surgimento de uma "Alemanha europeia" no timão de uma "Europa alemã". Desenhar um bigode em Angela Merkel pode não ser justo, mas expressa emblematicamente a frustração provocada por esse fruto inesperado do projeto supranacional europeu. Por: Demétrio Magnoli O Estado de SP

quarta-feira, 27 de março de 2013

SOBRE FALSOS HERÓIS

Que heróis são esses que ergueram massasPregando o fim de alheias propriedades?
Tramando golpes com base em mentiras,
Ideologias de falsa igualdade.

Que heróis fajutos, que com mil falácias
Organizaram hordas de iludidos.
Disseminando ódio entre as classes
Com seus conceitos falsos e falidos.

Que heróis de araque que até hoje guiam
Servos que travam inúteis contendas;
E assim militam por ruas e becos,
E cortam cercas pra invadir fazendas.

Que heróis bandidos que pregaram roubo
E caridade com dinheiro alheio.
Mas cujo os bolsos de seus seguidores
Não se abstende a se manterem cheios.

Legado tosco o destes heróis,
Que greves tolas vão influenciando.
Pelas escolas, poluindo livros;
Nas faculdades, mitos se tornando.

E os seguidores dos heróis de barro,
Que alcançando pleno poder,
Confiscam armas do povo que, assim,
Nem mais a vida pode defender.

Sagaz macabras as destes heróis,
Cujos ideais, pátrias degeneram.
Destroem jovens, corrompendo mentes
Com utopias que nunca prosperam.

São cultuados em todas as partes;
Cidades, campus e universidades.
E assim, aos poucos, seus servis soldados
Calam as vozes que falam verdades.

Triste destino o dos que lutaram
Nas intentonas dos heróis falsários.
Fortalecendo o perigo vermelho,
Feito de ódio e rancor proletário.

Pobre cabeça que acata as ideias
De um falso herói mal-intencionado.
Pobre do homem, que iludido entrega
Sua devoção aos heróis errados.

Letra da música; Sobre Falsos Heróis de José Fiqhera Salgado

PIB, OLHANDO PARA A FRENTE

Não se deve esperar medida mais heroica do governo no sentido de enfrentar os desafios estruturais


Em nosso encontro passado, chamei a atenção do leitor para o medíocre crescimento da economia em 2012 e fiz uma previsão de dias melhores para este ano. Os dados já disponíveis sobre o comportamento da economia neste primeiro trimestre caminham nessa direção.

O Banco Central divulgou recentemente que o PIB que mede mensalmente, relativo ao mês de janeiro passado, cresceu 1,3% em relação ao mês anterior. Embora a correlação entre esse número e o PIB calculado pelo IBGE tenha sido muito baixa no período recente, esse índice IBC-BR ainda faz parte de um grupo de indicadores utilizados pelo mercado para estimar o crescimento da economia.

Outros números que funcionam como indicadores antecedentes do PIB apontam também para um crescimento mais forte neste trimestre que se encerra. Dois deles me chamaram a atenção e devem ser destaques quando o número oficial for conhecido: o crescimento da produção agrícola e o da produção e da venda de caminhões.

Fernando Montero, um dos analistas que acompanho regularmente, prevê para 2013 um crescimento do PIB agrícola de 8%. Mas, para o primeiro trimestre, em razão da sazonalidade da agricultura, o crescimento pode chegar a 13% em relação ao mesmo período de 2012.

Como o peso da agricultura no PIB é da ordem de 5%, somente esse item deve gerar um crescimento de cerca de 0,6%.

Outro setor da economia que vem mostrando um crescimento elevado, neste início de ano, é o de caminhões, bom indicador da formação bruta de capital, nome complexo do investimento nas contas nacionais do IBGE.

Com isso, mantendo o crescimento do setor de serviços na faixa dos 2,5% ao ano e projetando uma recuperação da indústria da ordem de 3%, chegamos a um crescimento no trimestre -em relação ao trimestre anterior- da ordem de 1,3%, ou seja, 5,2% anuais.

Mas, com a sazonalidade da agricultura, a taxa de crescimento dos trimestres seguintes deve se reduzir para algo como 0,8%, ou seja, 3,2% ao ano. Com isso, o número final de crescimento do PIB em 2013 será -se suas avaliações estiverem corretas- de 3,3%, com os serviços crescendo 2,6%, a indústria, 3,0%, e a agropecuária, 8,3%.

Outro economista que acompanho nas avaliações de conjuntura de curto prazo é Fabio Ramos, da Quest Investimentos. Suas previsões estão na mesma direção de Fernando Montero, mas com uma velocidade de crescimento mais baixa. Seus números hoje são 1% de crescimento para o primeiro trimestre deste ano e 2,9% a 3,2% para o ano como um todo.

Se confirmadas essas previsões, dois comentários se impõem: o primeiro é que, dado o crescimento medíocre de 2012, esses números ainda mostram uma economia com extrema dificuldade de retomar a velocidade de crescimento do período de ouro de Lula.

A segunda observação é a que essa velocidade de crescimento será suficiente para manter a geração de emprego no nível mínimo necessário para perenizar o nível atual do desemprego.

Portanto, a correção dos salários nos próximos meses deve se manter acima da inflação, garantindo aumentos reais aos trabalhadores.

Como já entramos no radar das eleições presidenciais do próximo ano, não se deve esperar nenhuma medida mais heroica do governo no sentido de enfrentar os desafios estruturais que dominam a economia brasileira hoje. Essa velocidade de crescimento e a manutenção da situação de quase pleno emprego devem ser suficientes para garantir a reeleição da presidente.

Por isso vamos continuar a ver -e a conviver- por muito tempo ainda as filas absurdas de caminhões nos principais portos do país, bem como os atrasos de dias para que os navios possam embarcar suas cargas, onerando nossas exportações.

Também as pressões inflacionárias que começam a crescer em razão de descompassos de oferta em mercados importantes serão enfrentadas com medidas paliativas, como redução de impostos na ponta do consumo. Até mesmo a política de superavit fiscais primários, que têm permitido uma redução continuada da dívida pública, será imolada no altar da reeleição. Por: Luiz Carlos Mendonça de Barros Folha de SP

terça-feira, 26 de março de 2013

DEZ ANOS DE GUERRA DO IRAQUE


Kofi Annan da ONU cumprimenta Saddam Hussein

Dez anos de Guerra do Iraque. O que você "sabe" é que Bush mentiu para ir à guerra e terminar o serviço começado pelo pai, certo? O que você talvez não saiba é que Saddam Hussein ignorou o acordo de inspeção com a ONU após anos brincando de "gato e rato" com os inspetores; que Hans Blix foi feito de idiota e a ONU tinha a obrigação de agir para não ser desmoralizada; que Saddam abrigou o terrorista que atacou o WTC em 1993; que deu proteção a outros terroristas como Abu Abbas e Abu Nidal; que financiou ataques suicidas no Oriente Médio; que usou gás de mostarda contra população indefesa; que tinha esquema de corrupção com gente graúda da própria ONU (no programa “Oil for Food”); que o presidente Bill Clinton, antes de Bush, assinou a autorização para o país buscar remover Saddam do poder e substituí-lo por um regime democrático; que tal medida contou com aprovação maciça da maioria do Congresso, incluindo do Partido Democrata (157 a favor x 20 contra); que o governo Clinton efetivamente iniciou ação militar, ainda sob pressão pelo escândalo Monica Lewinsky, bombardeando intensamente por quatro dias instalações iraquianas na Operação Raposa do Deserto (na Wikipedia não aparece o nome do presidente Clinton!).


ISSO tudo você sabia? Mas a imagem que ficou foi a de um cowboy beligerante resolvendo issues familiares ou em busca do petróleo (e então, como anda a colonização no Iraque hoje?). Criticar a guerra é absolutamente legítimo. O que NÃO é legítimo é ignorar todo o contexto e acusar somente Bush sem entender o que estava em jogo. Vale notar que a reação estridente veio ANTES até da guerra do Afeganistão, essa sim, absolutamente justa pela ótica americana, quando lembramos que o Talibã dava guarida aos terroristas do ataque de 11 de setembro. Compare isso com a reação após Pearl Harbor em 1941! E entenda que a máquina de propaganda esquerdista tomou conta da América, em uma estranha e nefasta simbiose com os radicais islâmicos.

Leitura recomendada: Unholy Alliance: RadicalIslam And the American Left, de David Horowitz. Por: Rodrigo Constantino



O MITO DA PRESIDENTE WORKAHOLIC

Ao longo dos últimos dois anos, os propagandistas de Dilma Rousseff construíram vários figurinos, todos fracassados pela dura realidade dos fatos. O último foi o da presidente workaholic. Trabalharia diuturnamente, seria superexigente, realizaria constantes reuniões com os ministros, analisaria detidamente os projetos e cobraria impiedosamente resultados. Porém, os dados oficias da sua agenda, disponibilizados na internet, provam justamente o contrário.


Em agosto despachou com 17 ministros. Um terço deles, apenas uma vez (como Aldo Rebelo e Celso Amorim). Deu preferência a Paulo Sérgio Passos, Gleisi Hoffman e especialmente para Guido Mantega, recebido 9 vezes. Se a a maioria deles não teve um minuto de atenção da presidente, o mesmo não se aplica a Rui Falcão, presidente do PT, e até ao presidente da UNE, Daniel Iliescu, que foram ouvidos a 9 e 22 de agosto, respectivamente.

Dilma pouco se deslocou de Brasília. Numa delas foi a São Paulo, no dia 6. Saiu às 11h30m direto para o escritório da Presidência da República na capital paulista, à época ainda sob a responsabilidade de Rosemary Noronha. Dilma foi se encontrar com Lula. Passaram horas discutindo política. Às 18h40m, retornou a Brasília. Foi a única atividade do dia.

Em setembro recebeu 14 ministros. Os mais assíduos foram os que despacham no Palácio do Planalto (Miriam Belchior, Gleisi Hoffman e Ideli Salvatti; as duas últimas, quatro vezes, e a primeira, três) e Aldo Rebelo (Esportes), três vezes. Uma sequência de 12 dias com pouquíssima atividade chama a atenção. No dia 5 recebeu um ministro (Edison Lobão) às 9h e não há mais qualquer registro. No dia seguinte trabalhou das 10h às 12h. E só. No feriado compareceu ao tradicional desfile. Na segunda-feira, dia 10, só registrou duas audiências, uma às 10h e outra às 15h.

Dois dias depois, foi uma espécie de “quarta maluca”. A presidente teve apenas dois compromissos e nenhum administrativo: às 15h, recebeu o presidente do PCdoB, “o partido do socialismo”, Renato Rabelo, e uma hora depois, mostrando o amplo arco de apoio do governo – e haja arco! -, o megaempresário Jorge Gerdau. E mais nada. No dia seguinte compareceu à posse de um ministro e ao lançamento de um programa de incentivo do esporte de alto rendimento. Na sexta-feira (14), anotou na agenda às 10h um despacho interno e rumou, no início da tarde, para Porto Alegre, onde permaneceu o fim de semana e a segunda-feira – neste dia visitando dois estaleiros.

Nada mudou em outubro. Despachou com 19 ministros. Fez uma breve viagem ao Peru, visitou São Luís e São Paulo (duas vezes: uma delas novamente ao escritório da Presidência da República e para mais um encontro com Lula). Se muitos ministros, em três meses, não foram recebidos pela presidente, o mesmo não ocorreu com Renato Rabelo. O presidente do PCdoB teve mais uma audiência, a segunda em dois meses. Dilma teve tempo para ouvir Fernando Haddad, prefeito eleito de São Paulo, no dia 29, e, dois dias depois, o de Goiânia. Ambos do PT.

Curiosamente a agenda não registrou – caso único – onde a presidente esteve nos dias 27 e 28, fim de semana.

Dilma manteve em novembro sua estranha rotina de trabalho. Recebeu 15 ministros. Dois pela primeira vez, nos últimos 4 meses: Paulo Bernardo e Antonio Patriota. Concedeu duas audiências a prefeitos eleitos: de Niterói, Rodrigo Neves, do PT; e Curitiba, Gustavo Fruet, do PDT e apoiado pelo PT. Fez uma longa viagem à Espanha e uma breve à Argentina. Mas três dias se destacam pelas curiosas prioridades: 21, 22 e 23. Na quarta-feira (21), a presidente não recebeu nenhum ministro e não efetuou qualquer despacho administrativo. Dedicou o dia a José Sarney, Gim Argello, Eduardo Braga e ao seu vice-presidente, Michel Temer.

Como ninguém é de ferro, à noite assistiu o filme “O palhaço”. No dia seguinte, a agenda registrou três compromissos, um só com ministro (o dos Portos), a posse do presidente e vice-presidente do STF e um encontro com a apresentadora Regina Casé. E na sexta-feira? Somente duas audiências e no período da tarde.

Dilma incorporou o péssimo hábito de que o mês de dezembro é “de festas”. Fez duas viagens ao exterior (França e Rússia) e despachou com apenas 9 ministros. Antecipou o réveillon para o dia 28, suspendendo as atividades por 13 dias, até 9 de janeiro.

Iniciou o novo ano com a mesma disposição do anterior: pouquíssimos despachos, audiências ou reuniões de trabalho. Em janeiro, despachou com 11 ministros. Lobão foi o recordista: quatro vezes. E, por incrível que pareça, e sempre de acordo com a agenda oficial, concedeu pela primeira vez em um semestre uma audiência para o ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Melhor sorte teve o ex-jornalista Franklin Martins: esteve duas vezes, em apenas quatro meses, com Dilma.

Nesse semestre (agosto de 2012/janeiro de 2013), nove ministros – cerca de um quarto do ministério – nunca foram recebidos pela presidente: Marcelo Crivella, Aguinaldo Ribeiro, Garibaldi Alves Filho, Brizola Neto, Gastão Vieira, Maria do Rosário, Eleonora Menicucci, José Elito e Alexandre Tombini (presidente do Banco Central, mas com status de ministro). Outros não mais que uma vez. Uma reunião entre a presidente e alguns ministros de áreas correlatas nunca foi realizada. Em alguns dias (como a 16 de janeiro), não concedeu nenhuma audiência e nem efetuou despachos internos. Pior ocorreu duas semanas depois, a 30 de janeiro, uma quarta-feira: está sem nenhum compromisso. É uma agenda de uma workahloic? Por: Marco Antonio Villa O globo