sexta-feira, 29 de março de 2013

EMPREENDER É UMA ARTE OU CIÊNCIA?




Professor já mudou algumas de suas crenças sobre empreendedorismo


Empreendedorismo é uma palavra nova no Brasil. Apareceu nos dicionários na década de 2000. Alguns livros publicados no país já utilizam o termo na década de 1980 e 1990. Antes disso, o termo entrepreneur era traduzido como empresário e empreendedorismo, às vezes, aparecia como empresarização como ocorreu no livro Prática da Administração de Empresas de Peter Drucker publicado pela primeira vez no Brasil em 1955.

Mas até hoje, o uso do termo ainda gera debates polêmicos. Só porque o sujeito abriu um negócio, é empreendedor? É possível ser empreendedor mesmo sendo empregado? Há empreendedorismo por oportunidade e por necessidade? É possível “fabricar” empreendedores em salas de aula? A pessoa “nasce” empreendedora? Empreendedorismo é uma ciência? Ou é uma arte?

Há respostas que concordam e discordam para todas estas questões, daí o debate! Há muita pesquisa e muito achismo sobre o assunto, daí a polêmica. Eu também tenho as minhas convicções e os meus achismos sobre o empreendedorismo e já mudei algumas das minhas crenças diante de algumas constatações.
No campo da ciência, de tempos em tempos aparece algo que muda a crença vigente. Thomas Kuhn chamou isto de quebra de paradigma, termo que depois de popularizou e virou sinônimo de qualquer tipo de alteração de parâmetro.

Mas uma quebra de paradigma kuhneriana no campo do empreendedorismo foi a proposição da Teoria do Effectuation proposto pela Professora Saras em 2001. O Effectuation questionou a abordagem vigente daquele empreendedor que planeja tudo antes, identifica a melhor oportunidade de negócio, mede o risco e o retorno detalhadamente. É claro que este empreendedor existe (em número cada vez maior), mas a imensa maioria das pessoas começa um negócio a partir daquilo que ela é, quem ela conhece e o que sabe fazer. Este é a primeira parte do ciclo do Effectuation. Quando escolhe algo que sabe fazer, passa a interagir com pessoas do seu relacionamento.

Eventualmente, estas duas primeiras etapas podem ocorrer de forma simultânea, quando alguém da sua rede de relacionamento pede algo que você sabe fazer. Mas o negócio passa, literalmente, a ganhar corpo quando pessoas conhecidas ou conhecidas das conhecidas passam a fazer pedidos. Mais pessoas entram em contato com o seu produto ou serviço e pessoas totalmente desconhecidas tornam-se clientes. O Effectuation tende a ser algo óbvio e pode não explicar tudo, mas foi uma contribuição científica para avançarmos o conhecimento do empreendedorismo. Novas abordagens como Lean Startup e Customer Development se alinham ao Effectuation.

Mas o empreendedorismo também pode ser uma arte, uma expressão da genialidade individual que, muitas vezes, a ciência ainda não consegue explicar. E a arte empreendedora está associada a muitas capacidades como empatia, visão, execução, design, simplicidade, entre outras.

Nesta semana, meus colegas empreendedores blogueiros postaram dilemas e desafios que podem ser discutidos a partir da ciência ou da arte empreendedora. Pedro Chiamulera da ClearSale falou da importância de uma tecnologia simples e amigável para os clientes e citou sua inspiração na Teoria do Fluxo proposto pelo psicólogo de sobrenome impronunciável , Mihály Csíkszentmihályi. A Teoria do Fluxo, apesar de não ser muito conhecida no Brasil, tem influenciado muitas pessoas no Vale do Silício, inclusive David Kelley, o celebrado fundador da Ideo.

Juliana Motter da Maria Brigadeiro apresentou um exemplo de “telefone sem fio” na sua empresa, uma situação em que ela fala algo que é compreendido de forma totalmente diferente pelos seus colaboradores. Como fazer com que os colaboradores entendam o que o empreendedor realmente disse? Há muitas teorias sobre comunicação eficaz, mas aqui pode entrar um pouco da arte empreendedora, mais especificamente a sabedoria empreendedora.

Bernardo Hees, quando ainda era presidente da América Latina Logística, implementou a Regra dos 7 na qual, qualquer comunicado para os colaboradores deveria ser simples e direta a ponto de uma criança de 7 anos entender. Alberto Saraiva, do Habib’s, foi mais direto: criou um sistema de provas em que todos os colaboradores, incluindo os diretores, deveriam prestar. Assim garantiu que todos estudassem e demonstrassem seu conhecimento sobre a empresa.

Adriane Silveira da Nanny Dog apresentou suas reflexões obtidas durante o primeiro ano de vida da sua empresa. E reconheceu que a empresa tem muitos pontos fortes, mas precisa melhorar a capacidade de planejamento. É uma ótima constatação! Muitos empreendedores começam pela lógica do Effectuation, mas depois se dão conta de que precisam planejar formalmente o negócio. É o momento em que o empreendedor se vê na necessidade de ter capacidades de gestor.

Em alguns casos, o empreendedor se torna um bom gestor, mas quando isto não ocorre, é preciso ter um sócio ou colaborador que execute muito bem esta função. Material para ajudar o empreendedor nesta situação não falta. No Brasil, Vicente Falconi é um dos grandes pensadores (e executores) do planejamento estratégico. Seu livro O Verdadeiro Poder pode ser muito útil para empreendedores que estão se tornando gestores.

Por fim, o desafio que considero o mais difícil e narrado pelo Renato Steinberg da Fashion.me. Como ter bons colaboradores na sua empresa? Jim Collins, um dos poucos que conseguem alinhar ciência e arte da administração, expande este questionamento colocando outros: Quantas pessoas certas vocês têm na sua empresa? Quantas estão nos cargos-chave? Quantos cargos-chave existem na companhia? São questionamentos que acompanharão o empreendedor durante toda a sua trajetória profissional. E no final descobrirão que o que realmente importa é o foco e as pessoas que o ajudaram a atingir seus objetivos.

Mas o questionamento do Renato ainda permanece sem uma boa resposta para boa parte dos empreendedores. Por mais que haja muita teoria sobre o recrutamento de pessoas, ainda me alinho, humildemente, ao que defende Beto Sicupira, empreendedor da AB/Inbev e de tantas outras empresas: “Contrate pessoas melhores do que você, com qualidades e conhecimentos diferentes dos seus!”. Para empreendedores chegarem a esta consideração, precisam antes ter a sabedoria de reconhecer e apostar em talentos que sabem que não têm.

Por: Marcelo NaKagawa, Insper    O Estado de SP

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