domingo, 24 de novembro de 2013

DIÁRIO DA EUROPA

Ah, a Europa: contada ninguém acredita. Confesso que li e ri com o artigo de J.R. Guzzo na "Veja" sobre o projeto "euroflush". O que é isso? 


Simples: a Comunidade Europeia gastou 100 mil euros para determinar que todas as privadas dos países membros só poderão gastar 5 litros nas descargas geradas em caixas. Nos mictórios, será 1 litro. E nas meias-descargas, 3 litros. 

Isso, para Guzzo, é o retrato de um mundo infantil onde, parafraseando Churchill, nunca tantos dependeram de tão poucos para tanta coisa nas suas vidas. 

Mas existe um lado menos hilariante do "projecto europeu": a forma abusiva como Bruxelas, hoje, detém poderes impensáveis há uns anos para determinar o que os estados-membros podem ou não inscrever nos seus orçamentos. 

Espanha e Itália, aliás, foram recentemente repreendidas por não respeitarem os limites de dívida e de défice nos seus orçamentos para 2014. Curioso: eu julgava que essas matérias eram discutidas primeiro nos respectivos parlamentos nacionais. Depois, e só depois, Bruxelas poderia meter o nariz. 

Engano. Antes dos parlamentos, Bruxelas tem direitos especiais que suplantam a soberania das nações. Donde, para que servem os parlamentos nacionais? 

Não admira que, perante esse cenário, a Frente Nacional de Marine Le Pen e o Partido da Liberdade do holandês Geert Wilders tenham anunciado a intenção de formarem uma "aliança histórica" no Parlamento Europeu depois das eleições europeias de 2014. 

A Frente Nacional e o Partido da Liberdade, escusado será dizer, são dois partidos de extrema-direita com elevada popularidade em França e na Holanda - e que podem mesmo conquistar 1/3 dos lugares. E com um objetivo político claro: "destruir o monstro de Bruxelas" por dentro, avisou o sr. Wilders com a moderação que o caracteriza. 

Vem nos livros: em época de crise e quando a soberania das nações é atropelada por burocratas sem rosto, a Europa sempre foi pródiga em produzir estes monstrinhos. 

2. 

Dizem que o mais difícil em literatura é escrever uma boa cena de sexo. Só em literatura? No cinema é a mesma coisa: como filmar o ato sem cair no clichê sentimental - ou na "grotesquerie" pornográfica? 

Abdellatif Kechiche ensina como no seu "La Vie d'Adèle", Palma de Ouro em Cannes em 2013. Assisti ao filme no Lisbon & Estoril Film Festival e pasmei com a inteligência de Kechiche: através de uma história de amor entre duas mulheres - Adèle e Emma - o diretor não apenas revisita os andamentos clássicos de qualquer história de amor (primeiros encontros, primeiros medos, primeiras experimentações) como oferece duas personagens inteiras que, apesar de mundos sociais distintos, se encontram no mesmo mundo do desejo. 

Semanas atrás, escrevi nesta folha um réquiem ao cinema "mainstream" americano por comparação com as séries de tv "Atrações de feira". Gostaria de acrescentar que o réquiem não se estende ao cinema que a velha Europa ainda oferece de vez em quando. 

3.
Portugal joga amanhã com a Suécia. "Jogo importante?", pergunto eu na tabacaria do bairro onde compro jornais todos os dias. Só para provocar, fazer piada, meter conversa. 

O vendedor olha para mim com cara séria. Faz-se um silêncio sepulcral em volta. "Jogo importante?", responde o vendedor, incrédulo, como se eu tivesse insultado a mulher dele. "É para o Mundial, homem", esclarece ele, com um esgar de profunda e indisfarçável náusea. 

Pois é: parece que amanhã, em Estocolmo, o país saberá se, em 2014, vai estar na Copa do Brasil. Porque não estar é já considerado o maior vexame nacional desde, pelo menos, 1808, ano em que a família real fugiu dos exércitos franceses para o Rio de Janeiro. 

As perspectivas não são totalmente más: depois de vencer por 1 a 0 em Lisboa, Portugal só precisa de não perder em Estocolmo. Mas nem isso convence o delicioso fatalismo dos lusos, que dedicam ao assunto uma gravidade digna de um assunto de Estado. 

Então eu pergunto, meio a sério, meio a brincar, o que seria de Portugal se os portugueses dedicassem aos assuntos de Estado propriamente ditos a mesma exigência fanática que devotam à seleção nacional. Sobretudo quando o país quase faliu em 2009, antes de ser salvo pelo FMI. 

O vendedor, uma vez mais, tem resposta pronta para mim: "O mal da nossa política é não ter lá um Cristiano Ronaldo." 

Falou e disse. 

Por: João Pereira Coutinho Folha de SP

"FASCISMO"

A linguagem política e ideológica vive de lugares-comuns, cuja significação é indefinida. Em agrupamentos nos quais imperam os slogans, o discurso é sempre equívoco. Nos debates jornalísticos e acadêmicos dos últimos dias, um signo retorna com força. Refiro-me ao apelativo "fascismo". Antes, faço uma pequena digressão.

Os slogans importam porque integram as técnicas de poder. Como enuncia uma psicanalista, "toda prática linguística repetitiva veicula uma potência de hipnose que leva o indivíduo rumo a comportamentos sociais ou mentais estereotipados" (Shoshana Felman). A cultura política conhece a fina observação de Thomas Hobbes: na maioria das pessoas "o costume tem um poder tão grande que, se a mente sugere uma palavra inicial, o resto das palavras segue-se pelo hábito, e elas não são mais seguidas pela mente. É o que ocorre entre os mendigos quando rezam seu paternoster.

Eles unem tais termos com os que aprenderam de suas babás, companhias ou professores e não têm imagens ou concepções na mente para responder às palavras que enunciam. Como aprenderam, ensinam a posteridade" (The Elements of Law).

A ética expõe formas de pensamento e de ação que se tornaram automáticas. Uma vez prescrito e interiorizado, certo modo de ser é repetido sem maiores reflexões. Caso a pedagogia se fundamente em valores positivos, a vida pública se beneficia. Se ocorre o contrário e o ensino segue parâmetros corruptos, os indivíduos e associações que os assumem arruínam a sociabilidade. Gritar um lugar-comum entra no rol dos automatismos éticos desprovidos "de imagens ou concepções".

Com o domínio do slogan, um religioso grita "fascismo" sempre que prerrogativas ou privilégios de sua grei são postos em dúvida. Se um conservador enfrenta críticas sobre as tradições a que se apega, logo ergue o grito de "fascismo" contra os oponentes. Quando as esquerdas não conseguem controlar setores opostos aos seus alvos, a palavra que vem aos lábios dos militantes é... fascismo. E assim por diante.

George Orwell, atacado por todas as facções políticas de sua época, tem um instrutivo escrito sobre o tema. Ele inicia com o mais óbvio: "A leitura atenta da imprensa mostra que, praticamente, nenhuma categoria de indivíduos deixou de ser qualificada de fascista". O mais relevante, no meu entender, encontra-se na seguinte tese do autor: "Mesmo os que lançam a palavra 'fascista' para todos os ventos lhe atribuem, no mínimo, um significado emocional. Por 'fascismo' eles entendem, grosso modo, algo cruel, sem escrúpulos, arrogante, obscurantista, antiliberal e contrário à classe operária".

Termina Orwell indicando ser impossível encontrar uma definição do fato que seja aceita por todos. "É impossível definir o fascismo de modo satisfatório sem admitir certas coisas que nem os próprios fascistas, nem os conservadores, nem os socialistas de todas as cores estão dispostos a admitir. Tudo o que podemos fazer, agora, é usar a palavra com certa circunspecção, e não, como se faz geralmente, rebaixá-la ao nível da injúria" (What is Fascism?, 1944).

Pouco antes, os intelectuais da França alertaram os europeus contra o terror fascista. E fizeram um diagnóstico preciso do fenômeno. O fascismo, disseram, "suprime todas as liberdades; retira dos indivíduos toda possibilidade legal de exprimir livremente sua opinião. As liberdades de reunião, de associação são anuladas. Não mais existe liberdade de ensino nem de imprensa. Tais liberdades não são respeitadas por nenhuma ditadura. Mas a fascista se caracteriza por uma técnica aperfeiçoada de opressão, completa, metódica e implacável.

Nos primeiros tempos da ditadura os golpes, os assassinatos, o terror são os principais meios de controle. Mas os meios legais rapidamente se desenvolvem, sempre sancionados, aliás, por uma repressão ignóbil" (O que é o Fascismo?, Manifesto de intelectuais em 1935. O documento original pode ser lido em Gallica.bnf.fr/).

Orwell e os intelectuais franceses, embora empenhados na luta contra o terror fascista, refletiram sobre ele sem cair na repetição automática do nome, à guisa de exorcismo ou injúria. As coisas "que nem os próprios fascistas" e seus adversários admitiriam vieram com o Holocausto, a morte industrializada sob comando de burocratas movidos por slogans. O fascismo, até no seu nome de batismo, é ameaça demasiado terrível e não deve ser admitido na luta política democrática. A banalização do uso atenua a sua essência, dissimula seu advento.

No Brasil, em vésperas de eleição decisiva para todos nós (em todos os matizes ideológicos), ensaiemos a forma e o conteúdo democráticos. Não existem, numa sociedade civilizada, inimigos políticos a serem perseguidos ou injuriados, mas seres que refletem e divergem quanto aos fins e aos meios na edificação do bem comum.

Ao falar do fascismo no prefácio do amaríssimo Animal Farm, o mesmo Orwell proclama: "Se a liberdade tem algum sentido, ela significa o direito de dizer ao povo o que ele não quer ouvir". Assim opera o pensamento político. O uso da propaganda para exterminar inimigos é a via reta para os fascismos. Os povos dominados por aqueles movimentos e partidos só ouviram os seus mestres. As sociedades desfeitas pelas injúrias foram tragadas pelas palavras imprudentes ou por slogans gastos nas batalhas pelo poder.

O fascismo não admite distinções entre esquerda e direita, pois exige obediência absoluta às palavras de ordem do partido único. Quem perde a liberdade de enunciar "o que o povo não quer ouvir" é visto como besta-fera a ser perseguida. Fantasmas invocados costumam atender às preces dos aprendizes de feiticeiro, trazendo pesadelos coletivos.

Circunspeção diante da palavra e da coisa!

Por: Roberto Romano Publicado em O Estado de S. Paulo

sábado, 23 de novembro de 2013

JUSTIÇA? ONDE?

Parte da nação se regozija, neste fim de semana, com a prisão de dez dos condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no processo do mensalão, decretada em data emblemática, a da proclamação da República. De uns tempos para cá, a palavrinha república andou ganhando prestígio. Foram os petistas que a trouxeram à baila, enchendo a boca com expressões como “valores republicanos”.

Como se valores republicanos quisesse dizer alguma coisa. Até 1991, tivemos a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, ditadura que durou três quartos de século. Ainda temos, sob o tacão da Partido Comunista, a República Popular da China. Isso sem falar na República Democrática Popular da Coréia, que vem sendo governada por “ presidentes” da mesma família desde sua fundação em 1948.

Parte da nação se regozija, dizia. Pois há outra parte que não. A nação está dividida desde 1964, quando os comunistas tentaram reeditar a intentona de Prestes, com apoio da URSS, China e Cuba. Há quem pense que os militares foram os vencedores da luta contra a guerrilha. Nada disso. Os vencedores foram os derrotados. 

Derrotadas na luta armada, as esquerdas venceram a luta política. Tanto que uma guerrilheira é hoje a presidente do Brasil.

Foram derrotados os comunistas? O que vemos são seus líderes em prosa e verso cantados, na literatura e no ensino nacionais, ostentando aura de heróis, dando nomes a salas, ruas e rodovias e gozando de gordas aposentadorias. Os militares, que se pretendem vencedores, foram jogados à famosa lata de lixo da História e relegados ao papel de vilões.

Enquanto o Exército não tinha verba sequer para pagar o rancho de recrutas e sua Força Aérea desfilava a pé, aos vitoriosos de 64 Fernando Henrique Cardoso conferiu honras, glória e gordas aposentadorias.

Nada mais natural, pois, que os quadrilheiros tenham se entregue à polícia brandindo punhos e a auréola dos justos, jogados ao cárcere pelas elites do país. O Supremo Tribunal Federal foi relegado, pelos “heróis”, à condição de um monumento à iniqüidade. Nada de espantar em uma nação que venera como heróis celerados como Che Guevara, Marighella e Lamarca.

As prisões tiveram ampla repercussão na imprensa internacional. Segundo The Economist, “não haverá mais jabuticabas jurídicas para os mensaleiros”, depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou protelatórios os recursos da maioria dos réus que entraram com segundos embargos durante a sessão da última quarta-feira. Para o The New York Times, “problemas burocráticos” atrasaram o envio dos condenados no processo para a prisão, e, no Brasil, “é raro políticos brasileiros de alto-escalão condenados por crimes cumprirem pena na prisão”. Para o Washington Post, as prisões dos condenados dispersam especulações de que os envolvidos no esquema encontrariam brechas jurídicas para fugir de suas penas. Já a BBC classificou o mensalão como o “maior caso de corrupção” do Brasil e destacou o ato do ex-presidente do PT José Genoino que, ao se entregar à Polícia Federal ontem, ergueu seu punho e gritou “viva o PT”. 

Glória ao país que decidiu pôr atrás das grades a cúpula do partido que hoje detém o poder. Restam algumas perguntinhas. Os líderes da negociata, seus autores intelectuais, foram condenados a penas significativas, mas no fundo simbólicas. Alguns ficaram alguns aninhos no cárcere, a maioria em regime de prisão aberta. Só quatro cumpriram a pena em regime fechado. 

Quanto aos operadores, mandaletes de fim de linha, todo o rigor da lei. O empresário Marcos Valério, o principal operador do esquema de compra de votos no Congresso Nacional, foi condenado a 40 anos, quatro meses e seis dias de prisão a ser cumprida no regime fechado em presídio de segurança máxima. Os seis dias denotam a preocupação dos ministros em medir com precisão microscópica a justeza da pena. Mas nem tudo é tragédia na vida do mais castigado pelo STF. 40 anos, em verdade, são pouco menos de sete anos.

Qui prodest? A pergunta é velha mas se impõe. A quem beneficiou a compra de votos? Il capo di tutti i capi está livre como um passarinho e ainda ousa se pronunciar cinicamente, em apoio aos condenados: “estamos juntos”. Domínio de fato só vai até Zé Dirceu. Daí não passa. Lula sabe disso. “Quando a gente começa a mentir, não pára mais" - disse o presidente, em admirável confissão de autoconhecimento. A bicicleta precisa continuar andando. Não são bandoleiros os condenados. Mas heróis injustiçados pela suprema corte.

Zé Dirceu alega inocência e seus relevantes serviços prestados à nação. Por que então saiu voando de seu cargo. Não foi nenhum político de oposição que ordenou "Sai rápido daí, Zé!". Foi Roberto Jefferson, presidente de partido aliado do PT. Sua ordem não admitiu tergiversações. Não passaram 48 horas e o Zé se esvanecia como fumaça ao vento. Bastaram quatro palavrinhas para demitir a Eminência Parda do governo. É óbvio que atrás das quatro palavrinhas havia uma mensagem cifrada, cujo sentido, a nós, pobres mortais, não foi dado entender. Só o presidente e seu todo-poderoso ministro o captaram. E o captaram rapidinho.

Por quatro vezes, os congressistas rejeitaram a taxação dos aposentados e pensionistas, por considerá-la afrontosa a princípios jurídicos como o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Mas a carne é fraca. Na quinta vez, o Congresso não resistiu e inclusive obteve do mandalete gaúcho instalado no STF a autorização definitiva para implantar a taxação da velharada indefesa.

Considera-se que pelo menos uma centena de deputados foram comprados. É um punhado considerável de prostitutas, capaz de virar qualquer votação. Esses deputados não cometeram crime algum? Permanecerão impunes posando de vestais no Congresso? Da centena de implicados, 25 foram condenados e dez foram em cana. E a turma toda dos vendidos?

Resta outra pergunta mais grave, que fiz há oito anos: voto comprado vale? Venalidade pode criar legislação? Pode derrubar cláusulas pétreas e extinguir direitos adquiridos? Se cassados estes deputados, não seria o caso de cassar também seus votos passados?

Dez réus passarão alguns meses no cárcere, em celas isoladas e com a segurança necessária para continuar “trabalhando”. O país continuará sendo regido pelas leis que promulgaram a soldo do governo. 

É a isso que a imprensa chama fazer justiça?


Por: Janer Cristaldo Do site http://cristaldo.blogspot.com.br/

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

YANKEES, DONT"T GO HOME


Os marines estão chegando

Natural que em um desastre natural como este tufão nas Filipinas, a intervenção humanitária americana seja imediata. Os EUA têm uma história de afinidade no país (inclusive de colonização) e uma tradição de assistência global nestas circunstâncias que é compatível com seus recursos militares e logísticos. Os marines desembarcaram nas Filipinas e navios, inclusive um porta-aviões, aportaram para a missão de assistência. Aviões americanos despejam suprimentos e não bombas. E no solo, bandeiras americanas não são queimadas e não se escutam os gritos deyankees, go home. Por que ocorreria isto? Na quarta-feira, aviões militares americanos puderam distribuir 25 toneladas de biscoitos para sobreviventes famintos na devastada cidade de Tacloban.

Sem dúvida que esta assistência de emergência americana gera boa vontade e pontos políticos em países afligidos, pobres e ricos, mais ou menos hostis aos EUA. Apenas para ficar nas vizinhanças das Filipinas, foi assim no tsunami que atingiu a Indonésia em 2004 e no terremoto no Japão em 2011. E este empenho dos EUA acontece em meio a pressões por cortes orçamentários do Pentágono e pendores isolacionistas mesmo em casos de ajuda humanitária ou de um SOS.

De novo, não podemos ser ingênuos ou sentimentais. A corrida para ajudar tem impacto estratégico. Basta ver que no Japão houve a suavização da retórica contra as bases americanas no país. Afinal, este aparato foi crucial para ajudar depois do desastre em Fukushima. Nas Filipinas, em 1991, os americanos abandonaram uma imensa base naval na esteira de uma ferrenha mobilização nacionalista e a assistência agora no tufão deve reforçar o ímpeto para a presença militar dos EUA no país, em particular no combate a insurgentes islâmicos.

E vale lembrar que muitos outros países também estão dando uma mão. Por exemplo, equipes médicas da Bélgica, Noruega e Israel estão em ação. Em contraste ao vigor assistencialista dos EUA e demais países, existe o minimalismo chinês. Tudo bem, os chineses ainda são pobres, mas gostam de bravatear a segunda colocação no ranking de economias mundiais e seu impulso para o status de superpotência. Pequim, no entanto, se limitou a oferecer US$ 100 mil de ajuda às Filipinas. Em parte, é vingança pela posição mais desafiadora dos bem mais pobres e mais fracos filipinos para encararem os chineses em disputas por águas territoriais (atualização: na quinta-feira, os chineses anunciaram o incremento da ajuda).

Aliás, naquela região existe um clamor por proteção americana contra o tufão geopolítico chinês.
Por: Caio Blinder



quinta-feira, 21 de novembro de 2013

SÍMBOLOS

Há muitos simbolismos nesse processo do mensalão, que vão se revelando no transcorrer do caso, mas nenhum deles é assumido, apenas sutilmente insinuado. Quando o então procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza apresentou sua denúncia, eram 40 os acusados. Viu-se no número redondo a intenção de relacionar o caso com a história de Ali Babá e os 40 ladrões e, mais que isso, de insinuar que o então presidente Lula não estava indiciado por questões políticas.


No decorrer do processo, petistas tentaram impedir que a mídia se referisse ao caso como “mensalão”, mas o máximo que conseguiram foi que o noticiário oficial, tanto do Governo quanto do Supremo Tribunal Federal passasse a se referir ao caso como a Ação Penal 470.
Agora, ao serem expedidas as primeiras ordens de prisão, atribui-se ao ministro Joaquim Barbosa a intenção de marcar a comemoração da Proclamação da República com as prisões de José Dirceu e companhia. Seria nada além de uma jogada de marketing de Barbosa, já se preparando, quem sabe, para uma futura carreira política.

Mesmo que a intenção tenha sido a de marcar a “refundação” da República brasileira, nada a criticar no presidente do Supremo Tribunal Federal, pois nenhum trâmite legal foi atropelado para que a coincidência se desse.

O criticável será se nos próximos meses o relator do mensalão sair do STF para se candidatar, pois, como todos os magistrados, ele tem um prazo mais largo para se filiar a um partido político. Será inevitável que todos os seus passos como relator do mensalão, e mesmo suas indignações cívicas, sejam confundidas com ações políticas, o que nublaria suas decisões. Mais simbolismos a serem decifrados.

Quando Barbosa apareceu com nada de novo sobre o mensalão na quinta-feira, houve uma espécie de decepção, e logo críticas foram feitas a ele, que prometera divulgar a lista dos presos naquela sessão. Houve até quem desconfiasse de que alguma coisa acontecia nos bastidores, mas o que realmente aconteceu é que Joaquim Barbosa trabalhou até de madrugada, e ontem no feriado, para poder expedir as ordens de prisão sem cometer erros técnicos que as invalidassem.

Não ter expedido as ordens de prisão imediatamente após a sessão de quarta-feira foi, aliás, uma demonstração de que Barbosa, e o STF que preside, não estavam ávidos por uma vingança.

A própria presidente Dilma veio em socorro indireto a Barbosa na mensagem que enviou pelo twitter para saudar a Proclamação da República. Ela afirmou que a origem da palavra República “nos ensina muito”, vem do latim e significa ‘coisa pública’. Sendo assim ser a presidente da República significa “zelar e proteger a ‘coisa pública’, cuidar do bem comum, prevenir e combater a corrupção”.

Nada mais adequado, portanto, para comemorar a República do que colocar na cadeia os condenados por tentar desmoralizar suas instituições, superdimensionando o poder do Executivo pela submissão do Legislativo através da compra de apoio político.

Nessa nossa República democrática, surge agora a figura dos “presos políticos”, sejam os componentes dos Black blocs, sejam os mensaleiros que assim querem ser identificados. Assim como não existe Caixa 2 com dinheiro público, como definiu o STF, não há presos políticos em uma democracia.

José Genoino provavelmente não reconhece a existência de presos políticos em Cuba, ou não manteria seu apoio ao regime ditatorial cubano. Mas se considera um “preso político” na democracia dirigida por seu partido há 11 anos.

Além de insistir na teoria da conspiração de que houve uma “operação midiática inédita na história do Brasil” para condená-lo, Genoino acusou ontem o julgamento do Supremo de ter sido “marcado por injustiças e desrespeito às regras do estado democrático de direito”.

Esse processo “de exceção” teria ocorrido num Supremo Tribunal Federal (STF) de um regime democrático, cuja maioria dos ministros foi nomeada pelo ex-presidente Lula e pela presidente Dilma, ambos do PT, partido que José Genoino presidia quando o mensalão aconteceu. Durma-se com um barulho desses.

Por: Merval Pereira

CRIANDO HISTORIA

Vivemos em uma cultura que permite que vigaristas exerçam sua enganação impiedosa sobre pessoas desinformadas, confiantes e bem intencionadas.

O mundo se torna suscetível a mentiras quando fica mais enamorado com prazeres e distrações do que com o estudo sério dos fatos.

As artimanhas têm existido desde sempre, mas agora a mentira atingiu novos patamares. Mesmo os mais indecentes prevaricadores dos séculos passados não tomaram a iniciativa de alterar a história do povo judeu, sua ligação com a Terra Santa, ou sua fidelidade à cidade de Jerusalém.

Tudo isso mudou quando Yasser Arafat, o falecido líder palestino, instituiu uma estratégia de criar uma nova "verdade". Sua primeira asserção foi vista como digna de riso: Jesus, disse ele, foi, de fato, um palestino que lutava pela liberdade, batalhando contra os romanos da mesma forma que Arafat e sua laia estavam lutando contra os judeus "ilegais" que ocupam a chamada terra árabe de Israel.

Sua declaração bizarra de reivindicação anterior e do roubo praticado por Israel começaram uma nova tendência sobre como trazer uma solução final para a presença judaica no Oriente Médio. Assim como o propagandista nazista Joseph Goebbels, Arafat astuciosamente plantou mentiras que finalmente produziram uma farta colheita de "fatos" fictícios. Essas mentiras mascaradas como verdades não apenas têm subvertido a história verdadeira, mas têm vagarosamente criminalizado o Estado de Israel.

O plano de Arafat, na verdade, não tinha nada a ver com os fatos. Tudo dizia respeito a mudar as percepções. Considerando que pouquíssimas pessoas no Ocidente sabem a verdadeira história do Oriente Médio, a fantasia poderia muito bem passar por fato e, a seu devido tempo, mudar inteiramente o jogo.

Mudar as percepções sobre ele mesmo e sobre os palestinos foi algo que Arafat provou saber fazer extremamente bem. Sendo um dos maiores terroristas do mundo, ele orquestrou atividades terroristas contra Israel a partir de todas as partes do mundo, inclusive o seqüestro do navio de cruzeiro Achille Lauro, no dia 7 de outubro de 1985. Para o horror de todos, os palestinos subiram a bordo do navio e mataram o passageiro judeu Leon Klinghoffer, que estava sentado indefeso em sua cadeira de rodas. Depois, eles lançaram o seu corpo ao mar. Menos de dez anos mais tarde, Arafat ganhava o Prêmio Nobel da Paz.

Assombrosamente, o absurdo se tornou a norma em muitos círculos; e é a base lógica para se desalojar os israelenses e reconfigurar o Estado judeu em um feudo palestino. Quem teria acreditado que viria o dia em que a argumentação de que o povo judeu nunca existiu como presença no Oriente Médio seria tomada seriamente? Ou de que não havia nenhuma evidência física de que os templos judeus existiram no monte Moriá em Jerusalém?

Quem teria imaginado que alguém acreditaria que os judeus refugiados, que chegaram ao país depois da Segunda Guerra Mundial, eram invasores fugindo de um Holocausto que nunca existiu? E quem teria sonhado em defender a noção de que o povo judeu tramou a idéia do Holocausto para ludibriar o mundo e angariar simpatias para si mesmo?

Vivemos em uma cultura que permite que vigaristas exerçam sua enganação impiedosa sobre pessoas desinformadas, confiantes e bem intencionadas. Anualmente, fraudes e promessas mesquinhas de enormes recompensas enganam milhões e roubam deles suas economias ganhas a duro custo. Todavia, nenhum charlatão pode se igualar ao que tem sido praticado pelos inimigos de Israel. Eles odeiam o Estado judeu e farão qualquer coisa para causar sua destruição.

O sucesso deles é o resultado direto do fracasso da sociedade em propagar os fatos e em confrontar as mentiras com a inatacável verdade. O padrão que precisamos seguir está exposto em Deuteronômio 6.6-7:

"Que todas estas palavras que hoje lhe ordeno estejam em seu coração. Ensine-as com persistência a seus filhos. Converse sobre elas quando estiver sentado em casa, quando estiver andando pelo caminho, quando se deitar e quando se levantar".

O antídoto para o erro é a verdade. E não existe campo de batalha na terra que esteja mais em risco. O mundo se torna suscetível a mentiras quando fica mais enamorado com prazeres e distrações do que com o estudo sério dos fatos.

Por esta razão, estamos tentando colocar as coisas em ordem -- bíblica e historicamente -- a fim de ajudar a esclarecer a verdade sobre Israel.

Um dos motivos pelos quais decidimos divulgar esses fatos é o volume de perguntas feitas a nós por pessoas que estão buscando a verdade. Existe uma fome por informação e validação bíblica do que tem sido ensinado através de milênios, porque tantos estão agora distorcendo a história com a esperança de destruir, não apenas um país, mas a fé sobre a qual repousa nossa esperança.

Jesus disse que a verdade nos libertará (João 8.32). A verdade também nos manterá livres.

Elwood McQuaid é editor-consultor de The Friends of Israel - www.foi.org
Publicado na revista Notícias de Israel – www.Beth-Shalom.com.br
Tradução: Ingo Haake






quarta-feira, 20 de novembro de 2013

AFINAL, QUEM SÃO OS RACISTAS?

Será tão difícil entender, mesmo com todos os exemplos históricos, que o progresso não pode ser alcançado por meio de líderes raciais ou étnicos?

Alguns anos atrás, uma pessoa disse que, de acordo com as leis da aerodinâmica, um abelhão não pode voar. Mas os abelhões, alheios às leis da aerodinâmica, vão em frente, contrariam os dizeres dos especialistas, e voam assim mesmo.

Algo semelhante ocorre entre as pessoas. Enormes e tediosos estudos acadêmicos, bem como melancólicos e sombrios editoriais de determinados jornais, são produzidos às pencas lamentando o fato de que a maioria das pessoas pobres e negras não consegue ascender socialmente, e que isso seria uma fragorosa demonstração de discriminação. 

O curioso é que, em vários países ao redor do mundo, inclusive naqueles países chamados de terceiro mundo, vários imigrantes extremamente pobres, principalmente oriundos da Ásia, não apenas conseguem prosperar mesmo sendo de uma cultura totalmente distinta, como também conseguem enriquecer sem jamais recorrer a favores especiais e a políticas de ação afirmativa.

Normalmente, estes imigrantes asiáticos chegam a um novo país praticamente sem nenhum dinheiro, sem nenhum conhecimento do novo idioma e sem nenhuma afinidade cultural. Eles frequentemente começam trabalhando em empregos de baixa remuneração. Mas trabalham muito. A norma é trabalharem em mais de um emprego. Trabalham tanto que conseguem poupar e, após alguns anos, utilizam esta poupança para empreender. Muitos abrem um pequeno comércio, no qual continuam trabalhando longas horas e ainda continuam poupando, de modo que se tornam capazes de mandar seus filhos para a escola e para a faculdade. Seus filhos, por sua vez, sabem que seus pais não apenas esperam, como também exigem, que eles sejam igualmente disciplinados, bons alunos e trabalhadores.

Vários intelectuais já tentaram explicar por que os imigrantes asiáticos são tão bem-sucedidos tanto em termos educacionais quanto em termos econômicos. Frequentemente chega-se à conclusão de que eles possuem algumas características especiais. Isso pode ser verdade, mas seu sucesso também pode ser atribuído a algo que eles não têm: "líderes" e autoproclamados porta-vozes lhes dizendo diariamente que são incapazes de prosperar por conta própria, que o sistema está contra eles, que eles não têm chance de ascender socialmente caso não sigam os slogans repetidos mecanicamente por estes líderes e sociólogos, e que por isso devem se juntar sob o rótulo de "vítimas do sistema" e exigir políticas especiais e tratamento diferenciado.

Vá a qualquer país, seja ele rico ou em desenvolvimento, e pesquise sobre a existência de "líderes" e de grupos de interesse voltados para a promoção de políticas de ação afirmativa para os asiáticos. Você não encontrará. Você não encontrará sociólogos dizendo que os imigrantes asiáticos, por serem minoria e por estarem culturalmente deslocados, estão em desvantagem e que por isso o governo deve criar leis de cotas para ajudá-los a ascender socialmente.

Infelizmente, é exatamente esta linha de raciocínio, só que em relação aos negros, que vem sendo diariamente propagada por acadêmicos e sociólogos irresponsáveis. Eles são a versão humana das leis da aerodinâmica, que dizem precipitadamente que determinadas pessoas não podem ascender e prosperar a menos que haja um empurrão do governo.

Aquelas alegações morais que foram feitas no passado por gerações de genuínos líderes negros — alegações que acabaram por tocar a consciência de várias nações e que viraram a maré em prol dos direitos civis para todos — hoje foram desvalorizadas e apequenadas por uma geração de intelectuais, sociólogos e autoproclamados "líderes" de movimentos raciais que tratam os negros como seres abertamente incapazes de prosperar sem a ajuda destes pretensos humanistas, os quais agem abertamente de acordo com uma agenda política de escusos interesses próprios.

O que é perfeitamente perceptível é que, ao longo das gerações, as pessoas que dizem falar em prol do "movimento negro" sofreram uma mutação de caráter: se antes possuíam uma alma nobre, hoje não passam de charlatães descarados. Após a implantação definitiva de políticas de ação afirmativa nos EUA, esses charlatães perceberam que era muito fácil ganhar dinheiro, poder e fama ao redor do mundo ao simplesmente se dedicarem à promoção de ações e políticas raciais que são totalmente contraproducentes aos interesses das pessoas que eles próprios dizem liderar e defender.

No passado, vários outros grupos de imigrantes também representavam minorias que tinham tudo para ser consideradas oprimidas e discriminadas, pois chegavam a outros países quase sem nenhum dinheiro, com pouquíssima educação e com total desconhecimento da cultura local, mas que não obstante ascenderam por conta própria, muito provavelmente porque não foram "privatizadas" por líderes raciais. Imigrantes e outras minorias que nunca tiveram "porta-vozes" e "líderes" raramente dependeram de subsídios do governo e quase sempre apresentaram altos níveis educacionais obtidos com o esforço próprio.

Grupos que ascenderam da pobreza à prosperidade raramente o fizeram por meio de líderes étnicos ou raciais. Ao passo que é fácil citar os nomes de vários líderes do "movimento negro" ao redor do mundo, tanto atuais quanto os do passado, quantos são os lideres étnicos que defendem os interesses dos asiáticos ou dos judeus em países em que eles são a minoria?

Ninguém pode negar que há anti-semitismo e que já houve discriminação aos asiáticos. Sempre houve. Mas eles nunca seguiram "líderes" cujas mensagens e atitudes serviram apenas para mantê-los presos à condição de bovinos.

Essa postura de dizer aos seus "seguidores" que eles são mais atrasados, tanto econômica quanto educacionalmente, por causa de outros grupos "opressores" — e que, portanto, eles devem odiar estas outras pessoas — tem paralelos na história recente. Essa foi a mesma motivação utilizada pelos movimentos anti-semitas no Leste Europeu no período entre-guerras, pelos movimentos anti-Ibo na Nigéria na década de 1960, e pelos movimentos anti-Tamil, que fizeram com que o Sri Lanka, outrora uma nação pacífica e famosa por sua harmonia intergrupal, se rebaixasse, por influência de intelectuais, à violência étnica e depois se degenerasse em uma guerra civil que durou décadas e produziu indescritíveis atrocidades.

Será tão difícil entender, mesmo com todos os exemplos históricos, que o progresso não pode ser alcançado por meio de líderes raciais ou étnicos? Tais líderes possuem incentivos em demasia para promover atitudes e políticas polarizadoras que são contraproducentes para as minorias que eles juram defender e desastrosas para o país. Eles se utilizam das minorias para proveito próprio, atribuindo a elas incapacidades crônicas que supostamente só podem ser resolvidas por políticas que eles irão criar. Eles são os verdadeiros racistas.

Por: Thomas Sowell, um dos mais influentes economistas americanos, é membro sênior da Hoover Institution da Universidade de Stanford. Seu website: www.tsowell.com.

Publicado no site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.

Tradução: Leandro Roque

SEM FUTURO NO PARAÍSO

O prof. Lessa tem algum futuro na sociedade burguesa. No comunismo, nenhum. Quanto menos resistência haja ao comunismo, mais inimigos imaginários o governo comunista vai matar. 

No livreto Abaixo a família monogâmica, que circula na internet sob o patrocínio de um "Instituto Lukács", o sr. Sérgio Lessa, criador dessa entidade e professor de uma universidade federal onde ensina os horrores do capitalismo e as belezas do comunismo, escreve: "Os comunistas não propõem a poligamia, do mesmo modo como não defendem a monogamia. Não defendemos o descompromisso afetivo e pessoal que caracteriza algumas propostas de 'amor livre', assim como recusamos o moralismo monogâmico hoje predominante. Estamos propondo que as relações amorosas devam ser pautadas apenas e tão somente pelas decisões livres, emancipadas, das pessoas."

Qual a diferença entre o "amor livre" e "relações amorosas pautadas tão somente por decisões livres"? Talvez seja a diferença entre um triângulo e uma figura plana de três lados, mas não é isso o que interessa no momento.

O que interessa é que o professor Lessa, com a sua idealização do paraíso amoroso socialista, é o protótipo do "verdadeiro crente", que não sobrevive por muito tempo num regime comunista de verdade. 

Os que esperam do comunismo um jardim dos prazeres estão sempre entre as vítimas do novo regime quando ele sai do papel para a realidade. Isso aconteceu na URSS, na China, em Cuba, no Vietnam, no Camboja, etc. Só não acontecerá aqui se Deus for brasileiro – o que é algo impossível tanto para os crentes quanto para os ateus.

Lessa repete quase "ipsis litteris" o ideário de Karl Radek, um dos pioneiros da Revolução Russa e, sob certos aspectos, um grande cérebro. Sob certos aspectos, mas não naquele que o assemelha ao Prof. Lessa. Por inspiração de Radek, o Estado soviético dos primeiros anos fomentou de tal modo a destruição da família monogâmica que, decorrida uma geração, a massa de adolescentes sem pais identificáveis que se espalhou pelas ruas de Moscou, assaltando e matando, passou a ser designada popularmente como "os filhos de Karl Radek".

Quando o homem caiu em desgraça, Stálin teve o requinte de mandá-lo para um presídio de delinquentes juvenis, onde o velho bolchevique morreu esmurrado e pisoteado por aqueles mesmos jovens dos quais fora o avô espiritual.

O professor Lessa pode imaginar, talvez, que o stalinismo seja um episódio encerrado da história do comunismo; entretanto, muita gente não acredita que seja assim e fará todo o possível para que não seja assim. 

Nos últimos anos, à medida que a esquerda consolida seu poder hegemônico e não deixa espaço para nenhum risco de contestação, as cobras, sentindo-se seguras, vêm saindo das tocas e silvando alto e bom som aquilo que antes só ousavam cochichar no escuro: a apologia de Stálin ressoa por toda parte no mundo bloguístico nacional, e ela não é um movimento espontâneo de opinião – é a expressão uniforme de uma militância organizada, decidida e feroz.

À luz da História, é insensato imaginar que, nas fases mais adiantadas da implantação do comunismo, a "linha dura" stalinista não acabará por prevalecer, como sempre, sobre os sonhadores e utopistas de toda sorte, e por dar a eles o destino que deu a Karl Radek.

A matança comunista intensifica-se quando, não havendo mais oposição política ou militar organizada, o regime se defronta com a resistência passiva que a natureza das coisas oferece à implantação de uma economia impossível.

Nada excita mais a fúria do governo comunista como esse inimigo difuso, sem rosto, incontrolável e, a rigor, invencível. Aí a sociedade inteira – incluindo os mais apolíticos e inocentes – passa a ser vista como um depósito inesgotável de traidores, de sabotadores, de "agentes da burguesia". E é preciso matar todos.

Entre eles, obviamente, têm prioridade os tagarelas incômodos que cobram de uma economia de misérias a produção mágica de um paraíso erótico repleto de "relações amorosas pautadas por decisões livres".

O prof. Lessa tem algum futuro na sociedade burguesa. No comunismo, nenhum. Quanto menos resistência haja ao comunismo, mais inimigos imaginários o governo comunista vai matar. Isso é da natureza mesma do comunismo. A fase da tomada do poder jamais é tão mortífera quanto a "construção do socialismo" que vem em seguida. 

As grandes matanças na URSS, na China, no Camboja ou em Cuba aconteceram quando já não havia resistência organizada. E em parte alguma o comunismo terá encontrado tão pouca resistência organizada quanto no Brasil.

Quem pensa que odeio comunistas é louco. Sei que, quando vier o comunismo, noventa por cento deles sofrerão como cães. Desejar poupá-los disso é ódio? Combater o comunismo é um ato de caridade para com os próprios comunistas. Ninguém matou tantos deles quanto Stálin, Mao Dzedong e Polpot.

Qualquer comunista que não fosse um hábil puxa-saco, carreirista abjeto e delator de companheiros estaria mais seguro na Itália de Mussolini ou na Espanha de Franco do que na URSS, na China Comunista ou no Camboja. Uso o exemplo da Itália e da Espanha só para enfatizar, com casos reais, o quanto o comunismo é perigoso para os comunistas. Mais do que qualquer regime fascista. Nem falo da segurança e bem-estar que os comunistas desfrutam nas democracias ocidentais. Não pode ter sido coincidência, nesse sentido, que o pensamento marxista se desenvolvesse muito mais no Ocidente do que nos países comunistas. O fundador de um instituto com o nome de Georg Lukács deveria pensar nisso. 

No mundo soviético o autor de História e Consciência de Classe só escapou de coisa pior porque, já em idade avançada, aceitou a humilhação, curvando-se ao beija-mão oficial. Na atmosfera ocidental de livre discussão, tornou-se pai de uma tradição de pensamento que dura até hoje.
Por: Olavo de Carvalho Publicado no Diário do Comércio.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

DIFAMAÇÃO PURA

Em qualquer país decente, a direita e a esquerda repartem mais ou menos equitativamente os meios de difusão. No Brasil, quando a direita salta dos dois por cento para os cinco por cento, já é o alarma geral, em tons sinistros de quem anuncia um golpe de Estado. 

Meu artigo “Nem um pouquinho” veio com um erro: o colunista Rodrigo Constantino não entrou na Folha, mas no Globo e na Veja. Quem foi para a Folha junto com o Reinaldo Azevedo foi o Demétrio Magnoli. Qualquer que seja o caso, a observação que fiz sobre as reações indignadas dos mandarins da esquerda foi exata, apenas incompleta. Esqueci de enfatizar que essas reações não se voltavam contra isto ou aquilo que os articulistas tivessem escrito, mas contra a sua simples presença na mídia. Não se tratava de refutar opiniões, mas de cortar cabeças.

Também deixei de observar que os apelos à guilhotina não vieram todos de fora, mas alguns apareceram nos próprios jornais onde os novos colunistas estreavam. Nunca, nunca, em toda a história da mídia brasileira, se viu uma pressão coletiva de jornalistas pela expulsão de algum colega socialista ou comunista da redação de qualquer jornal, estação de rádio ou canal de TV. 

A solidariedade de classe entre os jornalistas brasileiros é só para os comunistas e seus companheiros de viagem. Até os direitistas correm para protegê-los, como se viu tantas vezes no tempo dos militares. Mas o infeliz liberal ou conservador, pego em flagrante delito de escrever artigos para a grande mídia, não tem perdão. É abandonado até pelos seus correligionários.

É verdade que os jornalistas da direita vêm ganhando algum espaço, mas no Brasil a esquerda está tão acostumada a mandar sozinha na mídia, que se escandaliza e espuma de raiva com isso. Em qualquer país decente, a direita e a esquerda repartem mais ou menos equitativamente os meios de difusão. No Brasil, quando a direita salta dos dois por cento para os cinco por cento, já é o alarma geral, em tons sinistros de quem anuncia um golpe de Estado. Um dos indignados, o indefectível Paulo Moreira Leite, mente como um vendedor de terrenos submarinos ao dizer: "Quem estava no centro foi para a direita. Quem estava à direita foi para a extrema-direita." Constantino, Azevedo e Magnoli, desde que estrearam como colunistas, não mudaram de convicções em absolutamente nada. Foram os censores esquerdistas, como o próprio Moreira Leite, que, estreitando cada vez mais a área do direitismo permitido na mídia, passaram a rotular simples liberais de "extremistas de direita", tentando criminalizá-los. Moreira Leite confunde maquiavelicamente a régua com o objeto medido.

Mais obsceno ainda é Antonio Prata, da própria Folha, que, imaginando fazer sátira, escreve: “Como todos sabem, vivemos num totalitarismo de esquerda. A rubra súcia domina o governo, as universidades, a mídia, a cúpula da CBF e a Comissão de Direitos Humanos e Minorias, na Câmara” – uma descrição bem exata e literal do estado de coisas. Tanto que vários leitores levaram a afirmativa a sério e a aplaudiram. O autor teve de avisar, “ex post facto”, que pretendera fazer piada. No meu tempo de ginásio, quem quer que ignorasse que não se satiriza a verdade tiraria zero de redação. Mas, para expulsar os liberais e conservadores da mídia, vale até um colunista se expor ao ridículo. Tudo pela causa.

Voltando ao sr. Moreira Leite, sei que é inútil tentar levar alguém como ele a um debate sério, mas, para dar aos leitores uma idéia de quanto o uso atual do rótulo de “extrema direita” na mídia é abusivo, notem esta distinção, que toda a ciência política do mundo confirma: a diferença de esquerda e extrema esquerda é de graus e de meios, a de direita e extrema direita é de natureza, de fins e de valores.

O esquerdista torna-se extremista quando quer realizar, por meios revolucionários e violentos, o mesmo que a esquerda moderada busca fazer devagar e pacificamente: a expansão do controle estatal na economia, visando à debilitação e, no fim, à extinção da propriedade privada dos meios de produção.

Totalmente diversa é a relação entre direita e extrema direita. Ser de direita, ou liberal, é ser a favor da economia de mercado, das liberdades civis e da democracia constitucional (a versão conservadora defende essas mesmíssimas políticas, mas o faz em nome da tradição judaico-cristã, que para o liberal não significa grande coisa). Se por extrema direita se entende aquilo que o vocabulário corrente e a esquerda em especial designam por esse nome, isto é, o fascismo e o nazismo, o fato que estou assinalando salta aos olhos da maneira mais clara e inequívoca: ser de extrema direita não é querer mais economia de mercado, mais liberdades civis, mais democracia constitucional -- é querer acabar com essas três coisas em nome da ordem, da disciplina, da autoridade do Estado, às vezes em nome do anticomunismo, do combate à criminalidade ou de qualquer outro motivo. Não houve um só governo conhecido como de extrema direita que não fizesse exatamente isso. A conclusão é óbvia: passar da esquerda à extrema esquerda é somente uma intensificação de grau na busca de fins e valores que permanecem idênticos em essência. Passar da direita à “extrema direita” é mudar de fins e valores, é renegar o que se acreditava e, em nome de alguma urgência real ou fictícia, empunhar a bandeira do que se odiava, se desprezava e se temia. Constantino, Azevedo, Magnoli não fizeram isso. São odiados precisamente porque defendem o que sempre defenderam. Por isso o único meio de difamá-los é trocá-los de classificação, alistá-los à força no exército dos seus inimigos, identificá-los com tudo o que abominam e combatem.

Eis aí por que uma frase como a do sr. Paulo Moreira Leite – “passaram da direita à extrema direita” – é um expediente difamatório apenas, não uma afirmação séria, pensada, digna de um intelecto respeitável.

Por: Olavo de Carvalho Publicado no Diário do Comércio.

'O VILÃO DA INFLAÇÃO É TAMBÉM O DA ESTAGNAÇÃO"

Esqueçam o tomate, a carne e as passagens aéreas. Não falem mal das leguminosas, dos hortigranjeiros ou dos salões de beleza. O vilão da inflação nunca será encontrado na lista de bens e serviços comprados pelos consumidores. A imagem usada pela imprensa é mera repetição de uma velha metáfora criada lá pelos anos 80 ou pouco antes. Ninguém deve entender literalmente essa figura de linguagem. O vilão existe, sim, mas é de outro tipo. É o mesmo da estagnação econômica, da irresponsabilidade fiscal e da erosão das contas externas. Em uma palavra, é o governo, embora esse nome pareça um tanto inadequado para designar a presidente Dilma Rousseff e a trupe espalhada por 39 ministérios, uma porção de estatais e outros órgãos da administração indireta.


Explicar e justificar uma sucessão de números muito ruins tem sido, há algum tempo, uma das principais atividades desse pessoal. Mas nenhuma retórica disfarça o péssimo desempenho fiscal de setembro, quando até o resultado primário foi negativo, ou a aceleração contínua da inflação mensal desde agosto. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, ainda classificou como bom resultado a alta de 0,57% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no mês passado. Não há nada de bom nesse número, nem se pode – ao contrário da afirmação do ministro – considerá-lo normal para esta época do ano.

Só se pode falar de normalidade em outro sentido: esgotado o efeito dos truques com as tarifas de transporte e as contas da energia, o recrudescimento da alta de preços foi absolutamente natural. Que mais poderia ocorrer, quando há um desajuste inegável entre a demanda, principalmente de consumo, e a capacidade de oferta da indústria nacional? Esse desajuste, é bom lembrar, é alimentado principalmente pela política oficial, marcada pela gastança e pelos estímulos ao consumo e reforçada pela expansão do crédito.

Sem esses fatores, nenhum aumento do preço do tomate ou da carne bovina produziria um impacto tão amplo sobre todos os mercados. Além disso, o efeito da depreciação cambial seria muito menos sensível, como tem sido em outras economias emergentes. Aquelas, como a da Índia, com problemas graves de inflação, têm também, como o Brasil, sérios desajustes fiscais e limitações importantes do lado da oferta.

O efeito da demanda é também evidente na evolução dos preços dos serviços, com alta de 0,52% em outubro e 8,74% em 12 meses. No caso dos bens, o aumento de preços tem sido atenuado, em parte, pela importação crescente, mas essa é uma solução inviável quando se trata de aluguel residencial, conserto de automóvel, consultas médicas ou serviços de manicures, para citar só alguns itens de uma lista muito ampla de atividades. O mesmo desequilíbrio entre a demanda crescente e a capacidade de oferta muito limitada reflete-se também no déficit comercial de US$ 1,83 bilhão acumulado de janeiro a outubro. Nesse período, o valor exportado, US$ 200,47 bilhões, foi 1,4% menor que o de um ano antes, pela média dos dias úteis, e o gasto com importação, US$ 202,3 bilhões, 8,8% maior.

O aumento das compras de petróleo e derivados – diferença de US$ 6,64 bilhões de um ano para outro – foi um fator importante, mas o total da importação foi determinado principalmente por outros fatores. A elevação de US$ 17,29 bilhões na despesa com bens estrangeiros refletiu acima de tudo os desajustes internos e especialmente a perda de eficiência da economia nacional.

Não há como disfarçar a redução da produtividade e do poder de competição, resultante principalmente de uma coleção de falhas da política econômica. A agropecuária ainda é produtiva em grau suficiente para compensar os problemas sistêmicos da economia brasileira e conquistar espaços no mercado internacional. A maior parte da indústria tem sido incapaz de vencer esses obstáculos. Os mais comentados são as deficiências de infraestrutura e a tributação irracional, mas a lista é ampla e um dos mais importantes, embora nem sempre lembrado, é o despreparo da mão de obra.

Há pouco tempo a Confederação Nacional da Indústria divulgou pesquisa sobre a escassez de trabalhadores qualificados para o setor de transformação. Outra sondagem, nesta semana, tornou o quadro ainda mais dramático: 74% das empresas de construção consultadas indicaram dificuldades para encontrar pessoal aproveitável. Quase todo esse grupo – 94% – reclamou da escassez de trabalhadores preparados até para serviços básicos, como os de pedreiro e ajudante.

Em outros tempos, a construção exercia, entre outras, a função estratégica de absorver pessoal de baixa qualificação. Isso mudou. As construtoras progrediram tecnologicamente e a educação ficou para trás, principalmente nos níveis fundamental e médio. Pessoas um pouco mais atentas apontaram a má escolha do objetivo, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu cuidar prioritariamente do acesso a faculdades, por meio de bolsas, cotas e maior oferta de vagas. O País paga caro, hoje, por essa decisão obviamente demagógica e eleitoreira.

Ninguém deve esperar grandes avanços na política educacional em curto prazo. No Rio Grande do Sul, nesta sexta-feira, a presidente Dilma Rousseff repetiu, como se fosse algo muito bom, uma ameaça muito ouvida nos últimos tempos: por meio dos recursos do petróleo, a educação será transformada no “caminho fundamental” do desenvolvimento. Essa é uma assustadora conversa mole. O Brasil precisa de educação há muito tempo, é preciso cuidar do assunto imediatamente e há recursos mais que suficientes para isso. Apostar no hipotético dinheiro do pré-sal equivale a encontrar mais uma desculpa vergonhosa para nada fazer de sério pela educação. Por: Rolf Kunz Estadão

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

DEPREDANDO CARAVELAS

Que bom que os excluídos do mercantilismo, a primeira globalização, não decidiram depredar as caravelas gritando "uhu", "uhu"! O único mídia-ninja presente ao evento, em espírito ao menos, era Camões, caolho e meio marginal. Em "Os Lusíadas", ele ouve o "outro lado". Quem conhece o poema sabe que o Velho do Restelo advertiu os portugueses: "Vai dar tudo errado!" Sempre há um reacionário para rosnar pessimismos.


Depois de flertar com os black blocs, o Planalto anuncia a disposição de enfrentá-los. Sem muita convicção. É que alguns pensadores estão convencidos de que os mascarados representam a reação humanista à atual fase de dominação do capital. Marginalizados pelo processo, eles desafiariam com a sua destruição criativa o economicismo sem rosto da nova globalização. Depois que o socialismo acabou, restou às esquerdas a luta sem classes. Para elas, as vanguardas de opinião, não mais a extinta classe operária, é que portam o futuro, organizadas segundo "ismos" de suposto valor universal. Marxistas de fato morrem de tédio.

O capital incorporou e sustenta a militância. O "sedizente" neomarxista Slavoj Zizek pode até emprestar algumas prosopopeias e metáforas aos "ativistas", mas quem financia as causas, aqui e mundo afora, é o multibilionário George Soros. É fato, não teoria conspiratória. Há esquerdistas em penca nos institutos culturais dos grandes bancos, por exemplo, mas não em Pequim.

A guerra promovida pelas minorias organizadas se dá na esfera dos valores, é cultural. Seu campo privilegiado de batalha são as redes sociais. Já os "black blocs" --que, segundo Caetano Veloso, "fazem parte" (sei lá do quê)-- são admirados por sua prontidão para o confronto físico, por seu muque, por sua descrença nas palavras. A truculência desorganizada das ruas seria uma resposta à violência institucional do Estado. Nesse novo mundo, pode-se ser "fascista" por comer um bife, mas não por rachar cabeças; por se opor às cotas raciais, mas não por depredar o Parlamento; por admitir o uso de animais em laboratórios, mas não por considerar "coisa" o feto humano.

Na quarta-feira, o Instituto Royal, o dos "simpáticos beagles", anunciou o fechamento das portas. Militantes não querem mais que estudantes de medicina treinem traqueostomia em porcos. Médicos teriam de praticá-la, pela primeira vez, em humanos. Na nova ordem, o homem é o porco do homem. Nem George Orwell foi tão longe.

Pululam na imprensa candidatos a Jean-Paul Sartre desse humanismo estrábico. Falam de certo "malaise" social, de um mal-estar subterrâneo, de que os baderneiros seriam a manifestação visível. São obcecados pela tese de que o crime é um sintoma indesejável, mas fatal, da luta por justiça e de que o bandoleiro é só a expressão primitiva do libertador. Marcola seria, então, um Lênin que cometeu os crimes errados. Voltam-se até contra o PT, mas não por abrigar falanges da intolerância, financiadas com dinheiro público. Ao contrário! O partido, advertem, não teria avançado o bastante na agenda dos ditos vanguardistas. Cobram ainda mais intolerância.

Alguém indagaria: "Mas por que o país não pode ser entregue às vanguardas de opinião? Que mal há nisso?" Quem disse que não? Era o que Robespierre tinha na cabeça.

Caravelas... Globalizaram a escrita, a matemática, a astronomia, a física... "Mas também a gripe, a sífilis, a fé, a lei e o rei", gritam os justos. Ora, também sou justo. O pecado original foi sair da caverna. Uhu. Por: Reinaldo Azevedo  Folha de SP

domingo, 17 de novembro de 2013

STF: AINDA NÃO ACABOU

O STF decidiu que as penas impostas aos condenados do mensalão podem ser executadas imediatamente, excetuando-se as partes que suscitaram embargos infringentes ainda pendentes ou que motivaram embargos de declaração acolhidos. Oito anos e cinco meses depois da denúncia de Roberto Jefferson, o país verá alguns culpados na cadeia, em regime fechado ou semiaberto --que também é fechado. Deu-se um passo contra a impunidade. Delúbio Soares errou. Nem tudo acabou em piada de salão. Ele vai em cana. Aplauda-se o certo, descartem-se falácias e se façam advertências.

É falaciosa a tese de que, nesse julgamento, ignorou-se o suposto fundamento constitucional do duplo grau de jurisdição. O que a Constituição garante, no artigo 5º, é o direito ao contraditório e à ampla defesa, e isso houve. Também é improcedente a afirmação de que o julgamento viola o Pacto de San José da Costa Rica, que prevê o "direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior". Quem é o Supremo do Supremo? O Senhor Deus? A ser assim, extingam-se as ações penais de competência originária dos tribunais superiores.

Não menos falsa é a suposição de que se condenou sem provas, especialmente por corrupção passiva e ativa. Basta ler o caput dos artigos 317 e 333 do Código Penal para constatar: a expectativa ou a promessa de benefício indevido em razão de cargo ou função já constitui ato de ofício. E não! A Teoria do Domínio do Fato não é novidade no Brasil. Como já demonstrou em artigo a professora Janaina Paschoal, da USP (is.gd/2it4Zv), aplicaram-se os fundamentos do "concurso de agentes", de sólida tradição no nosso direito. Claus Roxin, o alemão, se ocupou da Teoria do Domínio da Organização Criminosa, que é outra coisa. No geral, o STF andou bem. Não porque tenha ouvido a voz das ruas, mas porque ouviu a voz das leis.

O patético, no entanto, teve lugar. Na quarta, Ricardo Lewandowski decidiu afrontar os números naturais. Por 7 a 4, o plenário recusou um dos embargos de declaração, mas o ministro aconselhou que se acatasse a vontade da minoria. Não menos especiosa foi a divergência aberta por Teori Zavascki, vitoriosa por 6 a 5! Para ele, quaisquer embargos infringentes obstam o trânsito em julgado da condenação, mesmo quando improcedentes porque não originados por quatro votos divergentes.

E o mais tenso está por vir: os embargos infringentes que podem resultar na diminuição das penas de José Dirceu, José Genoino, Delúbio e João Paulo Cunha. Nesta quarta, em voto quase todo sensato, Luís Roberto Barroso voltou a observar que a corrupção é um mal que atinge a todos os partidos. Não faz tempo, ao negar provimento a um recurso de Genoino, exaltou a biografia do condenado. Referia-se ao guerrilheiro que tentou instaurar uma ditadura comunista no Brasil.

Tem-se a impressão, às vezes, de que o STF é um tribunal vigiado por um olho externo, por um ente de razão que não é, à diferença do que se diz, a opinião pública. Quando um Natan Donadon é preso, ninguém sente a necessidade, ainda bem!, de condenar toda a política para condenar um político. Quando os réus são do PT, sempre aparece alguém para lembrar as culpas de todos nós. Tão ruim quanto um Supremo que cedesse ao alarido das ruas seria um Supremo que cedesse a cochichos ideológicos. Fiquem atentos. O julgamento ainda não acabou.

reinaldo azevedo
Reinaldo Azevedo, jornalista, é colunista da Folha e autor de um blog na revista "Veja". Escreveu, entre outros livros, "Contra o Consenso" (ed. Barracuda), "O País dos Petralhas" (ed. Record) e "Máximas de um País Mínimo" (ed. Record). Escreve às sextas-feiras.

BOM DIA, TRISTEZA

Acordei anteontem sob o impacto da notícia da expedição de mandados de prisão para os condenados do “mensalão”. Uma tristeza, inicialmente indefinível, tomou conta de mim. Sim: eles devem ser presos, em nome da democracia e da justiça. Sim: a prisão deles é um sinal de que a igualdade perante a lei ainda tem uma chance na nossa pobre república habitada por tantas figuras “mais iguais” que as demais. Por que, então, a tristeza?

Os integrantes do núcleo político do “mensalão” foram condenados sem provas, por um recurso à teoria do domínio do fato, alegam ali (no PT, em sites chapa-branca financiados com dinheiro público) e aqui (neste espaço, por comentaristas que não se preocupam com a duplicidade de critérios morais), numa tentativa canhestra de confundir o público. A teoria do domínio do fato, amplamente utilizada nos tribunais brasileiros, não equivale a uma noção arbitrária de “responsabilidade objetiva”, que é coisa de tiranias, e não dispensa provas. Ela é uma ferramenta analítica destinada a identificar responsabilidades em crimes cometidos pelo concurso de agentes: no julgamento de uma quadrilha de assaltantes de banco, serão imputadas penas não só aos que empunharam armas, mas também aos planejadores da ação. Sobram provas nos autos do processo do “mensalão”. Não: a lenda do “julgamento político” não me comove nem um pouco.

A Ação Penal 470 é “um ponto fora da curva”, dizem alguns cínicos e incontáveis porta-vozes informais do governo. O diagnóstico é compartilhado por não poucos advogados de boa-fé que se habituaram às transações internas de nossa elite de fidalgos a ponto de confundirem impunidade com justiça. Talvez seja mesmo: o STF nem mesmo abriu processo contra Antonio Palocci, apesar dos indícios clamorosos de que o então ministro cometeu um crime de Estado, violando o sigilo bancário de uma testemunha sem posses ou poder. Mas, se assim for, que o “ponto” inaugure uma nova “curva”, traçada por um compasso que não reconheça privilégios derivados do convívio nos palácios. Não: o ineditismo real ou suposto da prisão de gente de “sangue azul” não é o que me entristece.

Na hora em que li a notícia da prisão iminente dos cérebros do “mensalão” veio-me à mente uma frase de Leon Trotsky, pronunciada perante uma maioria stalinista hostil que o isolava no Partido Comunista: “Em última análise, o Partido está sempre certo, porque é o único instrumento histórico que a classe trabalhadora tem para a solução de suas tarefas fundamentais. Só podemos ter razão com o Partido e através do Partido, porque a História não criou nenhuma outra forma para a realização do nosso direito. Os ingleses têm um lema: Meu país, certo ou errado’. Com muito maior justificação, podemos dizer: meu Partido, certo ou errado.” Dirceu, Genoino e Delúbio não são revolucionários, nem de longe, mas herdaram da tradição comunista a convicção de que o Partido possui direitos extraordinários, oriundos de uma aliança especial com a História. Por pensarem isso, agora se declaram “presospolíticos”. Sim, estou triste e sei por quê: eles não aprenderam nada, depois de um quarto de século de democracia.

Dirceu et caterva aparentemente não desviaram dinheiro público para formar patrimônios privados próprios, mas para estabilizar e reproduzir um sistema de poder. Eles fizeram o que fizeram em nome dessa ideia: a Verdade do Partido. É bom, muito bom, que a Corte diga-lhes que nossa República não reconhece nenhuma verdade transcendental. Não estou triste, mas feliz, com o triunfo da mensagem de que a corrupção em nome de uma causa, de um Partido ou da História, escrita assim com maiúscula, é um crime tão grave quanto a corrupção em nome do vil metal. Entristece-me, isso sim, a constatação inevitável de que nossa democracia, imperfeita mas real, não conseguiu civilizá-los.

Por: Demétrio Magnoli Fonte: Folha de S. Paulo

COM QUE ROUPA?

A um ano da eleição, a situação de Dilma Rousseff é muito menos confortável do que alardeia o PT. Mais Médicos, leilão do pré-sal, crédito para beneficiários do Minha Casa, Minha Vida, onipresença nas TVs, reação à suposta espionagem dos EUA, o que excita o ressentimento nacionalista de exaltação... Está na casa dos 40% das intenções de voto. A tibieza dos adversários, mais do que a força da petista, é que projeta um futuro. Quem é entusiasta de Dilma? Muita gente quer mudar. Mas com que roupa?, perguntaria o sambista. Eis o busílis.

Governos, a teoria não é minha, se impõem por um misto de consenso e coerção, ora se sobressaindo um, ora outro. FHC e Lula, a seu respectivo modo, criaram o primeiro. A Dilma, sem um Plano Real como redutor de diferenças ou uma conjuntura externa favorável, sobrou a segunda. A coerção, que é da natureza do Estado e dos governos, tem a sua eficácia, mas é de alcance limitado. É o consenso entre os pares, obra da política, que dá feição à gestão. E isso não há. O governo é medíocre. O momento é propício a mudanças.

Mas quais são as opções no mercado de ideias? O PSDB permitiu que sua história e suas notáveis conquistas fossem sequestradas pelo PT. Progressista demais para ser conservador e conservador o bastante para ser progressista, tenta conciliar paternalismo e administrativismo numa narrativa que, até agora, é ignorada por parcela considerável do próprio eleitorado de oposição. Por que os não-petistas que escolheram Dilma em 2010 deveriam escolher um tucano em 2014? Essa pergunta precisa de resposta.

Marina Silva e Eduardo Campos se oferecem como opção a quem quer outra "posição", mas não a "oposição". Com isso, pode-se abrir uma boa ONG de trocadilhos. Prometem o melhor de FHC com o melhor de Lula. E se o cruzamento fosse malsucedido e se desse o contrário? Em entrevista a esta Folha, o economista Eduardo Giannetti, um dos interlocutores de Marina, afirmou: "Crescer 7% destruindo patrimônio ambiental é muito pior do que se crescer 3% preservando patrimônio ambiental e, na medida do possível, melhorando as condições de vida. O crescimento em si não é o objetivo". No "Roda Viva", disse a líder da Rede: "Hoje, quando se fez a pesquisa do Datafolha perguntando se as pessoas preferiam pagar um pouco mais caro pelos alimentos em lugar de ver a floresta desmatada, cerca de 95% das pessoas disseram que sim".

Não se tomam aqui essas falas como programa de governo. Pensem, no entanto, no efeito devastador que podem ter em campanha. Na ponta, afrontam necessidades elementares dos mais pobres; na origem, vocalizam o velho contraste entre natureza e civilização. Mesmo fraca, Dilma só enfrenta "posições", sem oposição. Bom para ela. Ruim para o país.
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Eu, hein, Rosa!?

"Liberdade é, apenas e exclusivamente, a liberdade dos que pensam de modo diferente." A frase já foi um clichê na boca de esquerdistas que se opunham ou à ditadura ou a supostos consensos que, na democracia, não eram do seu agrado. Poderia ter sido dita pela liberal-libertária Ayn Rand, mas a autora é a comunista Rosa Luxemburgo. Confrontava Lênin, que mandou às favas a Assembleia Constituinte. No seu equívoco, Rosa tinha a honestidade dos ingênuos, mas revoluções são conduzidas pelo cálculo dos cínicos. A liberdade perdeu. A múmia de Lênin fede. Seu cadáver ainda procria. Por: Reinaldo Azevedo  Folha de SP

sábado, 16 de novembro de 2013

'OS 178 BEAGLES"

As ruas, ente divinizado por covardes, pediram o fim do voto secreto para a cassação de mandatos. Boa reivindicação. O Congresso está a um passo de extinguir todas as votações secretas, o que poria o Legislativo de joelhos diante do Executivo. Proposta de iniciativa "popular" cobra o financiamento público de campanha, o que elevaria o volume de dinheiro clandestino nas eleições e privilegiaria partidos ancorados em sindicatos, cujas doações não são feitas só em espécie. Cuidado! O povo está na praça. Nome do filme dessa mímica patética: "Os 178 Beagles".

Povo não existe. É uma ficção de picaretas. "É a terceira palavra da Constituição dos EUA", oporia alguém. É fato. Nesse caso, ele se expressa por meio de um documento que consagra a representação, única forma aceitável de governo. Se o modelo representativo segrega e não muda, a alternativa é a revolução, que é mais do que alarido de minorias radicalizadas ou de corporações influentes, tomadas como expressão da verdade ou categoria de pensamento.

A fúria justiceira dos bons pode ser tão desastrosa como a justiça seletiva dos maus. Quem estava nas ruas? A imprensa celebrou os protestos como uma "Primavera Árabe" nativa. Nem aquela rendeu flores nem o Brasil é uma ditadura islâmica. Até houve manifestações contra o governo, mas todas foram a favor do "regime petista". O PSDB talvez tenha imaginado que aquele "povo" --sem pobres!-- faria o que o partido não fez em 11 anos: construir uma alternativa. Sem valores também alternativos aos do Partido do Poder, esqueçam.

Há 11 anos o PT ataca sistematicamente as instituições, quer as públicas, quer as privadas, mas de natureza pública, como a imprensa. Dilma ter sofrido desgaste (está em recuperação) não muda a natureza dos fatos. Da interdição do direito de ir e vir à pancadaria e ao quebra-quebra como forma de expressão, passando pela reivindicação de um Estado-babá, assistiu-se nas ruas a uma explosão de intolerância e de ódio à democracia que o petismo alimentou e alimenta. O Facebook não cria um novo ator político. Pode ser apenas o velho ator com o novo Facebook -como evidenciou a Irmandade Muçulmana no Inverno Egípcio.

Em política, quando o fim justifica os meios, o que se tem é a brutalidade dos meios com um fim sempre desastroso. A opção moralmente aceitável é outra: os meios qualificam o fim. Querem igualdade e mais Justiça? É um bom horizonte. Mas será o terror um instrumento aceitável, ainda que fosse eficaz? Oposição, governo e imprensa, com raras exceções, se calaram e se calam diante da barbárie que deseduca e que traz, volte-se lá ao primeiro parágrafo, o risco do atraso institucional.

O PSOL conduziu uma greve de professores contra o excelente plano de carreira proposto pela Prefeitura do Rio. Era a racionalidade contra a agenda "revolucionária". Luiz Fux, do STF, posando de juiz do trabalho, chamou os dois para conversar. É degradação institucional com toga de tolerância democrática.

O sequestro dos beagles, tratado com bonomia e outro-ladismo pelo jornalismo, é um emblema da ignorância dos justos e da fúria dos bons. Eles atrasaram em 10 anos o desenvolvimento de um remédio contra o câncer, mas quem há de negar que os apedeutas ilustrados têm um grande coração? Por: Reinaldo Azevedo Folha de SP

O GIGANTE CONTINUA ADORMECIDO

O gigante voltou a adormecer. Seis meses depois das manifestações de junho, o Brasil continua o mesmo. Nada mudou. É o Brasil brasileiro de sempre. Mais uma vez, os fatores de permanência foram muito mais sólidos do que os frágeis fatores de mudança.

As instituições democráticas estavam — e continuaram — desmoralizadas. Basta observar as instâncias superiores dos Três Poderes. O Supremo Tribunal Federal chegou ao cúmulo de abrir caminho para a revisão das sentenças dos mensaleiros. Mais uma vez — e raramente na sua história esteve na linha de frente da defesa do Estado Democrático de Direito — cedeu às pressões dos interesses políticos.

O ministro Luís Roberto Barroso — o “novato” — descobriu, depois de três meses no STF, que o volume de trabalho é irracional. Defendeu na entrevista ao GLOBO que o Supremo legisle onde o Congresso foi omisso. E que o candidato registre em cartório o seu programa, o que serviria, presumo, para cobranças por parte de seus eleitores. Convenhamos, são três conclusões fantásticas.

Mas o pior estava por vir: disse que o país não aguentava mais o processo do mensalão. E o que ele fez? Ao invés de negar a procrastinação da ação penal 470, defendeu enfaticamente a revisão da condenação dos quadrilheiros; e elogiou um dos sentenciados publicamente, em plena sessão, caso único na história daquela Corte.

O Congresso Nacional continua o mesmo. São os “white blocs.” Destroem as esperanças populares, mostram os rostos — sempre alegres — e o sorriso de escárnio. Odeiam a participação popular. Consideram o espaço da política como propriedade privada, deles. E permanecem fazendo seus negócios….

Os parlamentares, fingindo atentar à pressão das ruas, aprovaram alguns projetos moralizadores, sob a liderança de Renan Calheiros, o glutão do Planalto Central — o que dizer de alguém que adquire, com dinheiro público, duas toneladas de carne? Não deu em nada. Alguém lembra de algum?

E os partidos políticos? Nos insuportáveis programas obrigatórios apresentaram as reivindicações de junho como se fossem deles. Mas — como atores canastrões que são — fracassaram. Era pura encenação. A poeria baixou e voltaram ao tradicional ramerrão. Basta citar o troca-troca partidário no fim de setembro e a aprovação pelo TSE de mais dois novos partidos — agora, no total, são 32. Rapidamente esqueceram o clamor das ruas e voltaram, no maior descaramento, ao “é dando que se recebe.”

E o Executivo federal? A presidente representa muito bem o tempo em que vivemos. Seu triênio governamental foi marcado pelo menor crescimento médio do PIB — só perdendo para as presidências Floriano Peixoto (em meio a uma longa guerra civil) e Fernando Collor. A incompetência administrativa é uma marca indelével da sua gestão e de seus ministros. Sem esquecer, claro, as gravíssimas acusações de corrupção que pesaram sobre vários ministros, sem que nenhuma delas tenha sido apurada.

Tentando ser simpática às ruas, fez dois pronunciamentos em rede nacional. Alguém lembra das propostas? Vestiu vários figurinos, ora de faxineira, ora de executiva, ora de chefe exigente. Enganou quem queria ser enganado. Não existe sequer uma grande realização do governo. Nada, absolutamente nada.

As manifestações acabaram empurrando novamente Luiz Inácio Lula da Silva para o primeiro plano da cena política. Esperto como é, viu a possibilidade de desgaste político da presidente, que colocaria em risco o projeto do PT de se perpetuar no poder. Assumiu o protagonismo sem nenhum pudor. Deitou falação sobre tudo. Deu ordens à presidente de como gerir o governo e as alianças eleitorais. Foi obedecido. E como um pai severo ameaçou: “Se me encherem o saco, em 2018 estou de volta.”

Seis meses depois, estamos no mesmo lugar. A política continuou tão medíocre como era em junho. A pobreza ideológica é a mesma. Os partidos nada representam. Não passam de uma amontoado de siglas — algumas absolutamente incompreensíveis.

Política persiste como sinônimo de espetáculo. É só no “florão da América” que um tosco marqueteiro é considerado gênio político — e, pior, levado a sério.

A elite dirigente mantém-se como o malandro do outro Barroso, o Ary: “Leva a vida numa flauta/Faz questão do seu sossego/O dinheiro não lhe falta/E não quer saber de emprego/Vive contente sem passar necessidade/Tem a nota em quantidade/Dando golpe inteligente.”

Estão sempre à procura de um “golpe inteligente.” Mas a farsa deu o que tinha de dar. O que existe de novo? Qual prefeito, por exemplo, se destacou por uma gestão inovadora? Por que não temos gestores eficientes? Por que não conseguimos pensar o futuro? Por que os homens públicos foram substituídos pelos políticos profissionais? Por que, no Congresso, a legislatura atual é sempre pior que a anterior? Por que o Judiciário continua de costas para o país?

Não entendemos até hoje que a permanência desta estrutura antirrepublicana amarra o crescimento econômico e dificulta o enfrentamento dos inúmeros desafios, daqueles que só são lembrados — oportunisticamente — nas campanhas eleitorais.

O gigante continua adormecido. Em junho, teve somente um espasmo. Nada mais que isso. Quando acordou, como ao longo dos últimos cem anos, preferiu rapidamente voltar ao leito. É mais confortável. No fundo, não gostamos de política. Achamos chato. Voltamos à pasmaceira trágica. É sempre mais fácil encontrar um salvador. Que pense, fale, decida e governe (mal) em nosso nome.
Por: Marco Antonio Villa