quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

O ARCO, A FLECHA E O AVIÃO

Dois índios nus, pintados de urucum, arcos retesados, apontam suas flechas para o avião que os fotografava. A força magnética daquela imagem, divulgada em 2008, deriva de suas ressonâncias culturais, que tocam nos nervos do binômio natureza/civilização, o núcleo pulsante da narrativa romântica ocidental. Eis a Amazônia, sussurra uma voz dentro de nós. A voz está errada. Aqueles índios isolados existem, mas a Amazônia é outra coisa: o fruto do encontro entre ondas migratórias recentes e indígenas deslocados por quatro séculos de colonização. O conflito étnico em Humaitá, ponta emersa de tensões explosivas e difusas, decorre da decisão política de rejeitar a história em nome do mito.


Esqueça a lenda do paraíso isolado: a economia-mundo englobou a Amazônia no sistema de intercâmbios globais desde que Manaus tornou-se um porto de navios oceânicos, no anoitecer do século 19. Esqueça a lenda dos "povos da floresta": a Amazônia foi ocupada por pioneiros do Nordeste e do Centro-Sul em dois ciclos sucessivos, entre 1880 e 1920 e de 1942 em diante. Esqueça a lenda das tradições imemoriais: as festas folclóricas da região, surgidas décadas atrás, refletem as extensas mestiçagens entre os colonos e deles com os povos autóctones. A pureza está na foto, o vislumbre de uma relíquia, um instantâneo vestigial. Os Tenharim, conta-nos o repórter Fabiano Maisonnave, são evangélicos, moram em casas de madeira com eletricidade, deslocam-se em motos, torcem pelo Flamengo e pelo Corinthians. Por que traçar uma fronteira étnica intransponível separando-os dos demais habitantes de Humaitá?

Quem é índio? De acordo com o Retrato Molecular do Brasil, de Sérgio D. Pena, 54% dos "brancos" da Região Norte apresentam linhagens maternas ameríndias. O Censo 2010 registrou taxas espantosas de crescimento anual da população indígena do Acre (7,1%), de Roraima (5,8%) e do Amazonas (4,1%), interpretadas pelo IBGE como "etnogênese" ou "reetinização": o resultado de mudanças em massa na opção de autodeclaração étnica estimuladas pelas políticas raciais. Na Amazônia, redefinir-se como indígena tornou-se uma estratégia destinada a obter segurança fundiária, cotas preferenciais e privilégios extraordinários (como o de cobrar pedágios em rodovias federais). Os caboclos amazônicos, que são meio-índios, reagem declarando-se inimigos dos índios. Aí estão as raízes políticas da "guerra de Humaitá".

Quem é índio? Telma Tenharim, mulher do cacique cuja morte acendeu a faísca das violências em Humaitá, "uma mulher miúda com poucos traços indígenas", é filha do primeiro branco que teria entrado em contato com o grupo, nos anos 1940. Segundo a clássica definição de Darcy Ribeiro, índio é o indivíduo "reconhecido como membro por uma comunidade pré-colombiana que se identifica etnicamente diversa da nacional" e, ainda, "considerado indígena pela população brasileira com quem está em contato". A política indígena oficial, capturada por ONGs racialistas e entidades missionárias, é uma pedagogia de "reetinização" que se nutre das carências sociais e fabrica o conflito étnico.

"Em nenhum momento a gente falou que meu pai foi assassinado. A gente viu que ele caiu da moto." As palavras de Gilvan, filho do cacique morto, confirmam as conclusões da perícia policial, mas contrastam com o texto do coordenador regional da Funai, Ivã Bocchini, postado no blog do órgão, que sugeria a hipótese de assassinato. O cacique "era como um chefe de Estado", escreveu Bocchini, exigindo que "seja apontada a verdadeira causa da morte" e celebrando "a luta do povo Tenharim".

Um "chefe de Estado" com o arco retesado e a flecha apontada para o avião dos intrusos "brancos": nessa imagem falsa, construída pelas políticas estatais de raça, encontram-se as sementes do ódio entre caboclos-índios e índios-caboclos. 
Por: Demétrio Magnoli Folha de SP

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

MÉRITO? NÃO É AQUI

Velhos marinheiros dos sete mares contam até hoje, geralmente em voz baixa, a história do Flying Dutchman. Não é uma história confortável. O Flying Dutchman, ou Holandês Voador, levantou âncora das docas de Amsterdã em 1751, rumo a Java, e depois de uma tormenta no Cabo da Boa Esperança nunca mais foi visto; naufrágio com perda total da carga e da tripulação, publicou-se nos boletins marítimos da época. O grande problema é que, alguns anos depois, o navio holandês foi visto outra vez, velejando a todo o pano, o leme firme, como se estivesse rumando para um lugar preciso, e com a mais perfeita ordem no tombadilho; não era, de jeito nenhum, um barco que tinha afundado e depois, por algum fenômeno natural, voltado à tona. Outro problema, já bem maior, é que não havia nenhum ser vivo (ou morto) ali dentro. Os tripulantes do barco que tinha feito a descoberta subiram a bordo e minutos depois, aterrorizados, chisparam de volta a seu navio e sumiram no horizonte. Desde então a lenda insiste que o Flying Dutchman continua aparecendo nos oceanos, sempre em noites de tempestade; é a famosa “nau sem rumo”. Foi cometida a bordo, explicam os velhos marujos, alguma abominação prodigiosa, tão horrível que nem o demônio tem coragem de tocar no assunto. Tudo o que se sabe é que o navio foi amaldiçoado ─ e a alma de seus tripulantes condenada a navegar eternamente pelo mar sem fim.


E se em lugar de Flying Dutchman falassem de “um país chamado Brasil”? Em 1º de janeiro de 2003, sob o comando do almirante de esquadra Lula da Silva, ele levantou ferros do Lago Paranoá falando em vencer mares nunca dantes navegados e em edificar um novo reino social. Hoje, onze anos após a partida e já sob o comando da imediata Dilma Rousseff, a nau continua a procurar o reino que tinha prometido. Ao contrário do barco holandês, o navio brasiliense está abarrotado de gente; só de ministros são quase quarenta, e contando os subs, mais os subs dos subs, a coisa vai para a faixa dos milhares de tripulantes. Mas está na cara que os fantasmas do Flying Dutchman levam o seu barco muito melhor que os humanos de Dilma; pelo menos sabem o que estão fazendo.

Já o nosso navio ─ bem, é certo que algo deu fabulosamente errado com ele. Não navega para lugar nenhum. A tripulação não sabe distinguir proa de popa, e acha que o contrário de bombordo é mau bordo. A nau não perdeu o rumo ─ na verdade, nunca chegou a saber que rumo era esse. Como poderia saber alguma coisa, se a esta altura da viagem o presidente do Senado, Renan Calheiros, ainda requisita um avião militar para levá-lo de Brasília ao Recife, onde foi implantar 10 000 fios de cabelo numa clínica para carecas? O problema, é óbvio, não está com Renan; ele é assim mesmo. O problema é de quem manda nos aviões ─ a cadeia de comando da Aeronáutica, que só em 2013 já deixou o senador lhe passar a perna duas vezes.

Nesta última, foi ao extremo de soltar uma nota oficial dizendo que não iria avaliar “o mérito” da viagem, e que sua função se limita a fornecer “a aeronave” solicitada. Como assim? Se os senhores brigadeiros não avaliam o mérito ─ e a legalidade ─ de seus próprios atos, que raio estão fazendo nos seus postos? Estamos falando da Força Aérea Brasileira, santo Deus. A lei diz que os aviões da FAB só podem ser utilizados por autoridades em atos de serviço, questões de segurança e emergência médica. Em qual caso se encaixariam, aí, os 10 000 fios de cabelo do senador?

A lei diz também que desrespeitar essa norma é “infração administrativa grave”, passível de punições “civis e penais”. O comandante da FAB que serviu de piloto particular para Renan poderia perfeitamente ter pedido ao senador, com toda a educação, que lhe fizesse uma curta descrição por escrito, assinada embaixo, contando que serviço iria fazer no Recife ─ “mera formalidade, doutor, só isso””. Por que não agiu assim? Porque tem certeza, como toda a tripulação, de que está numa nau sem rumo onde cumprir a regra só dá confusão.

O navio Brasil está precisando de muita coisa. Uma delas é um oficial macho, que tenha entre os seus valores a decência comum, e que um belo dia diga algo assim: “Sinto muito, Excelência, mas a lei me impede de atender à sua solicitação”. Iríamos ver, aí, quem entre os seus superiores hierárquicos teria a coragem de prendê-lo por “insubordinação”, enquanto Sua Excelência ficaria livre, contando vantagem do tipo “comigo ninguém brinca”. Nesse dia abrirá falência o Táxi Aéreo FAB ─ e nosso navio, talvez, comece a encontrar seu rumo.

Publicado na edição impressa de VEJA

Por: J. R. GUZZO

BRASIL PERDE 14 POSIÇÕES EM RANKING DE LIBERDADE ECONÔMICA

O Brasil perdeu 14 posições no ranking de liberdade econômica da Heritage Foundation, centro de pesquisa americano de orientação conservadora que faz esse levantamento há 20 anos.


O país aparece na 114ª posição, em um grupo de 178 classificados. Em 2013, o Brasil ocupava a 100ª colocação.

Na avaliação do instituto, o país é considerado "mostly unfree" (quase limitado) em relação à liberdade econômica. No relatório divulgado ontem, a nota do Brasil foi de 56,9 pontos, uma queda de 0,8 em relação à avaliação feita no ano passado (57,7).

O indicador avalia dez fatores qualitativos e quantitativos agrupados em 4 pilares: eficiência regulatória, abertura comercial e financeira, tamanho do Estado (arrecadação e gastos do governo) e legislação (em que se analisa o combate à corrupção e o direito à propriedade).

A coleta de informações foi feita no período entre o segundo semestre de 2012 e o primeiro de 2013.

A Heritage afirma que o Brasil havia avançado no ranking na primeira metade dos anos 2000 para a categoria "moderadamente livre" (países com nota acima de 60 pontos). Mas desde 2007 retrocedeu de status.

"A ausência de progresso na direção de uma maior liberdade econômica desencorajou o crescimento do setor privado e impede que a economia cresça segundo seu potencial".

VIZINHOS

Segundo James Roberts, analista do instituto, o Brasil aparece mais próximo de países como Venezuela e Argentina no ranking, do que de Chile e Colômbia. Os dois primeiros foram considerados "repressed" (limitados), em relação à liberdade econômica.

Já Chile e Colômbia encabeçam a lista dos mais bem avaliados da América Latina. Entre 29 países avaliados da região, o Brasil ficou em 20º colocado.

Ele citou uma frase publicada pelo jornal "The Wall Street Journal", atribuída a um especialista brasileiro não identificado, que diz: "o Brasil está virando a Argentina, a Argentina está virando a Venezuela e a Venezuela está se transformando no Zimbábue".

"Mesmo o México saltou à frente neste ano, o Brasil recuou e provou mais uma vez que não consegue se desfazer das políticas nacionalistas e protecionistas que têm atrasado o seu potencial econômico por gerações", afirmou Roberts.

Ele criticou o aumento dos gastos sociais do governo, considerados por ele como "excessivos e insustentáveis". E condenou a primazia da Petrobras na exploração de recursos naturais. Na sua opinião, a estatal é pouco eficiente e afeita às decisões políticas do governo.

"O crescimento econômico sustentável e o aumento da produtividade podem ser alcançados de forma mais eficaz, com reformas focadas na liberdade econômica, como privatizações, a liberalização do ambiente regulatório e harmonização da tributação de Estados e da União", disse Roberts. Publicado na Folha de SP

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

A FUNÇÃO SOCIAL DOS LUCROS


Lucros são cruciais para um sistema capitalista. A existência de lucros informa se uma determinada empresa está utilizando seus fatores de produção de forma efetiva e eficaz.

Frequentemente vemos e ouvimos pessoas afirmarem que a obtenção de lucros é evidência da ganância e da cobiça do ser humano, e que isso é algo moralmente condenável. Deixando as questões puramente econômicas de lado, a realidade é que a obtenção de lucros não pode, por si só, ser classificada de ganância. O fato de uma determinada empresa ser lucrativa, por si só, não nos diz nada de moralmente relevante. Afinal, lucro é simplesmente o nome que a contabilidade atribui a uma situação em que a receita é maior que os custos. 

Em outras palavras, uma empresa que aufere lucros está simplesmente vivenciando uma situação em que o dinheiro que entra em seu caixa é maior do que o dinheiro que ela gasta para cobrir todos os seus custos, principalmente com materiais, imóveis, mão-de-obra e impostos. 

O contrário de lucro é prejuízo. Uma empresa que esteja perdendo dinheiro — isto é, gastando mais do que recebe — não pode sobreviver por muito tempo. E sua falência significará o desemprego de várias pessoas. Portanto, sob circunstâncias normais, lucros não apenas são uma condição necessária para o sucesso e a continuidade de um empreendimento, como também são moralmente justos, pois garantem a renda e o emprego de várias pessoas.

No entanto, há sim distorções neste arranjo, e tais distorções sempre são criadas pelo governo. Por exemplo, o governo pode conceder privilégios a determinadas empresas, seja por meio de subsídios, seja por meio de protecionismo, seja por meio de agências reguladoras que fecham o mercado e protegem as empresas da concorrência externa. Em todos estes casos, um empreendimento está sendo privilegiado à custa dos consumidores e pagadores de impostos, e seus lucros não são moralmente defensáveis.

Porém, algo deve ser enfatizado: este arranjo protecionista e mercantilista só pode existir e se manter se outras empresas não protegidas pelo governo estiverem apresentando lucros. Em outras palavras, o governo só pode socorrer e ajudar empresas ineficientes — empresas que não apresentariam lucros em situação de concorrência de livre mercado — se outras empresas da economia estiverem auferindo lucros, os quais serão tributados e utilizados para financiar tanto o aparato regulatório quanto os subsídios para as empresas ineficientes. 

Portanto, a sustentação de arranjos protecionistas — algo bastante caro àquelas pessoas contrárias ao livre mercado — depende inteiramente da existência de lucros capitalistas em outros setores da economia.

É óbvio que, quanto mais intenso e volumoso for este arranjo protecionista, mais inquietações ele gerará entre os genuínos empreendedores. Quanto mais privilégios o governo conceder a pessoas e empresas não-lucrativas, mais as pessoas e empresas lucrativas e eficientes começarão a questionar por que afinal estão trabalhando tanto. Simplesmente não é justo trabalhar duro e ver seus proventos serem confiscados para sustentar incapazes. 

Uma empresa não ser lucrativa é sinal de que algo está errado com ela: talvez seus métodos de produção sejam ineficientes, ou suas despesas gerais estejam excessivamente altas, ou seus produtos precisam passar por uma renovação, ou quaisquer outras inúmeras deficiências. Um apoio estatal a esta empresa irá simplesmente suprimir todo e qualquer incentivo para se aprimorar, postergando reformas necessárias para colocar a empresa novamente no caminho da sanidade econômica.

A história é repleta de exemplos de empresas ineficientes e problemáticas que foram socorridas pelo governo. Atualmente, várias grandes empresas são protegidas e privilegiadas pelo governo. Isso representa um triplo golpe contra o público consumidor: ele se torna privado dos benefícios que uma empresa mais eficiente, operando sob livre concorrência, traria para o mercado; ele é obrigado a abrir mão de parte de seu dinheiro, via impostos, para ajudar compulsoriamente as finanças destas empresas ineficientes; e, ainda pior, ele é obrigado a pagar mais caro por produtos de pior qualidade. Afinal, não fosse o protecionismo, os subsídios e a cartelização do mercado implementados pelo governo, haveria mais opções de produtos, tanto importados quanto produzidos no mercado interno pela livre concorrência.

Já em um livre mercado, não obstruído por privilégios e protecionismos estatais, empresas lucrativas são aquelas que descobriram uma maneira de criar e de fornecer produtos e serviços a preços altos o suficiente para cobrir seus custos, mas baixos o suficiente para fazer com que os consumidores os considerem atraentes. Uma empresa lucrativa, em outras palavras, é aquela que prospera criando e entregando bens de valor.

Neste arranjo, lucros e prejuízos são ferramentas que possibilitam entender a saúde de uma empresa. Lucros indicam que os recursos estão sendo utilizados sabiamente por uma empresa; prejuízos sugerem que eles estão sendo alocados de forma ineficaz. Embora lucros e prejuízos não sejam o elemento essencial de uma empresa, eles são indicadores cruciais de quão efetivamente as necessidades e desejos dos consumidores estão sendo atendidos.

Dado que vivemos em um mundo de escassez — o que significa que nada existe em abundância —, os desejos humanos sempre serão maiores do que a oferta de recursos necessários para se atender a todos estes desejos. Isso significa que é extremamente necessário haver na sociedade algo que direcione racionalmente a alocação destes recursos escassos. Algo ou alguém tem de informar se a água será utilizada majoritariamente para ser bebida ou para irrigar lavouras, e se o minério de ferro será utilizado para se fabricar automóveis ou para se produzir tratores. O mesmo raciocínio se aplica a todos os recursos sociais. Mesmo o tempo, que também é um recurso escasso, requer alguma ferramenta que estimule sua alocação sensata.

Uma solução já tentada para esse problema da alocação de recursos escassos foi a de controlar centralizadamente todas as decisões tomadas no mercado, bem como todos os recursos existentes no mercado. Esta é exatamente a estratégia defendida pelo socialismo em suas variadas formas. Como a humanidade aprendeu amargamente, um dos problemas com essa estratégia de alocação de recursos é que ela concentra enormes poderes em poucas mãos. Poder excessivo tende a estimular coisas sórdidas na natureza humana. 

Mas há um outro problema com essa estratégia: o problema do conhecimento. Mesmo que a elite política que eventualmente estivesse no controle da economia fosse moralmente perfeita, ela ainda assim seria incapaz de coletar todas as informações necessárias para alocar de maneira eficaz e racional todos os recursos humanos e materiais. Adicionalmente, há também o problema da impossibilidade do cálculo econômico em uma economia em que os bens de capital não são propriedade privada. Se os meios de produção pertencem exclusivamente ao estado, não há um genuíno mercado entre eles. Se não há um mercado entre eles, é impossível haver a formação de preços legítimos. Se não há preços, é impossível fazer qualquer cálculo de preços. E sem esse cálculo de preços, é impossível haver qualquer racionalidade econômica — o que significa que uma economia planejada é, paradoxalmente, impossível de ser planejada.

Estes três problemas obstruíram e reverteram todas as economias centralmente planejadas da história.

Felizmente, há uma estratégia alternativa para a alocação de recursos escassos: a rede de preços que emerge naturalmente quando compradores e vendedores efetuam trocas voluntárias no mercado. Neste arranjo, as leis da economia entram em cena. Uma redução de preço para um determinado bem sinaliza uma relativa abundância; pessoas podem comprar mais daquele bem. Já um aumento de preço sinaliza uma relativa escassez, obrigando as pessoas a pouparem mais caso queiram adquirir aquele bem. 

Por meio deste sistema, em que os preços dos bens e serviços estão constantemente em fluxo, os consumidores podem equilibrar suas necessidades em relação à disponibilidade dos vários bens e podem saber a qualquer momento qual a quantidade de cada bem que eles podem comprar e utilizar. Já os produtores, por sua vez, podem saber em qual quantidade um bem deve ser produzido e vendido. Os preços nos ajudam a determinar se um bem ou serviço está sendo desperdiçado — e, por isso, não deveria estar sendo produzido —, ou se ele é amplamente desejado — e, por isso, deveria ter sua produção aumentada. 

Por exemplo, quando empreendedores descobriram como prospectar, armazenar, refinar e utilizar petróleo, o produto se tornou mais barato do que o óleo de baleia. Consequentemente, a participação do óleo de baleia no mercado desabou e, com isso, houve menos pressão para se matar baleias em busca de sua gordura.

O lucro também pode ser entendido como um tipo de preço que emite sinais. Auferir lucro indica que uma empresa está realizando suas tarefas de uma maneira que um determinado segmento do público consumidor aprova — não apenas conceitualmente, como em opiniões coletadas por uma pesquisa, mas principalmente por meio da decisão voluntária de abrir mão de seu suado dinheiro em troca dos bens e serviços fornecidos por esta empresa. Já os prejuízos informam aos empreendedores, proprietários e administradores que eles têm de realizar ajustes em seu processo produtivo. Caso contrário, será melhor se dedicar a outros objetivos, desta forma fazendo com que recursos sociais não sejam desperdiçados. 

Desta forma, os sinais emitidos pelos lucros e prejuízos atendem a uma insubstituível função econômica. A lucratividade serve como uma força motivadora, mas também — e ainda mais importante — sinalizam um trabalho bem-feito.

Por último, um adendo moral: as obrigações sociais das empresas não se resumem a fornecer bens e serviços de maneira lucrativa. As empresas têm também de atuar honestamente, honrando seus contratos, servindo aos consumidores com ética e estando sempre atentas às dimensões morais do processo empreendedorial. O sistema de preços não assegura magicamente um comportamento moral. Para dar um exemplo doloroso mas bastante realista, o sistema de preços em uma sociedade depravada pode sinalizar que o mais valioso uso de mulheres jovens oriundas de famílias pobres é transformá-las em prostitutas. A confusão surge quando as pessoas veem tais perversidades e erroneamente concluem que abolir o livre mercado irá magicamente resolver esse problema de alguma forma. 

Uma pequena reflexão já basta para revelar o erro desta lógica. Adotar uma economia controlada e planejada não revoga a lascívia e o egoísmo do coração humano. Esses vícios, ao contrário, irão prosperar e se tornar ainda mais intensos. A diferença é que agora eles serão alimentados e protegidos por algum braço armado do estado — com o problema adicional de que as famílias mais pobres terão agora ainda menos alternativas econômicas, pois a economia controlada retirou de seu alcance vários empreendimentos moralmente preferíveis.

Embora o sistema de preços em uma economia livre não forneça uma fundação moral para a sociedade, e embora ele também não remova automaticamente as oportunidades para ganhos imorais, ele facilmente supera todas as formas de socialismo no que diz respeito a fornecer opções morais e socialmente beneficentes para se escapar da pobreza.

Por: Robert Sirico  fundador e presidente do Acton Institute. Padre e mestre em teologia, ele também é membro da Mont Pèlerin Society, da Academia Americana de Religião e da Philadelphia Society, além de ser conselheiro do Instituto Cívico de Praga.

O "FUNDAMENTALISMO DO INVESTIMENTO" E AS ARMADILHAS DA CARIDADE


Quer me empobrecer? Dê-me uma Ferrari. Sério. Só não me deixe vendê-la ou trocá-la. As despesas com impostos, seguro, revisão, peças e manutenção generalizada seriam tão altas que limpariam minha conta bancária.

Propriedade é responsabilidade. Temos a ideia de que receber equivale a enriquecer. Mas dar um passivo não é a mesma coisa que dar um ativo. E muitas vezes o passivo se passa por ativo.

Quando Gana se tornou o primeiro país africano a ganhar sua independência do Reino Unido em 1957, "toda a nação parecia compartilhar de um entusiasmo quanto ao desenvolvimento econômico", conta William Easterly em O Espetáculo do Crescimento. Como economista do Banco Mundial, Easterly morou em Gana no final dos anos 1960, depois que o governo havia criado o maior lago artificial do mundo para alimentar a represa Akosombo, construída com dinheiro dos governos dos Estados Unidos e do Reino Unido. Essa hidrelétrica iria prover energia suficiente para movimentar toda uma indústria de alumínio. Como explica Easterly:

A nova fundição de alumínio iria processar óxido de alumínio vindo de uma nova refinaria que, por sua vez, iria processar bauxita de novas minas. Ferrovias e uma nova planta de soda cáustica iriam completar um dinâmico complexo industrial.

Sabe quantas vezes você bebeu de latas metálicas produzidas em Gana sem nem se dar conta? A não ser que você ande bebendo de latas de ouro, nunca. Quinze anos mais tarde, em 1982, "não existe mina de bauxita nem refinaria de alumínio, nem planta de soda cáustica nem ferrovias", notava o economista ganense Agyei Frempong,

As pessoas que moram perto do lago, incluindo as 80 mil que tiveram suas casas velhas inundadas, sofriam de doenças transmitidas pela água, como a cegueira do rio, ancilostomíase, malária e esquistossomose.

Os economistas chamam de fundamentalismo do capital acreditar que basta um país montar um parque industrial e construir infraestrutura para que a economia cresça e floresça.

Crescimento econômico depende da acumulação de capital, é verdade, mas adicionar aviões sem aumentar o número de pilotos não aumenta o poder de uma força aérea. Pode até enfraquecê-la se, para evitar a depreciação das aeronaves, aumentam-se os gastos com manutenção.

Não-economistas podem ser acusados de uma crença parecida, o fundamentalismo do investimento: se a gente jogar dinheiro num problema, o problema desaparece. Quantas vezes você mesmo não pensou dessa maneira? "As pessoas não têm acesso a atendimento médico, aumente o investimento em saúde." "Os alunos não estão aprendendo a ler e a escrever, tem que aumentar o investimento em educação."

Os investimentos não são iguais. Uma das tragédias do século XX foi a quantidade de ajuda externa despejada na África subsaariana enquanto a região ficava mais e mais pobre. Assim como as notas em testes padronizados nos Estados Unidos não melhoraram apesar do aumento contínuo de investimento público em educação.

Um dos problemas é combinar com propriedade os investimentos. Uma escola com apenas uma sala de aula não será capaz de ensinar mais e melhor contratando uma dúzia de professores. Assim como uma escola com apenas um professor não fará muito progresso construindo uma dúzia de salas de aula. 

Mas escolas não têm apenas salas e professores, e nem salas e professores são iguais. Melhoras na educação dependem de uma combinação fantástica de fatores existentes e a serem criados, que vão do papel (ou dos pixels) do livro texto à localização geográfica e ideológica da escola. Não é qualquer investimento que gera crescimento. Você não dobra o tamanho de um bolo dobrando a quantidade de apenas um ingrediente.

Diferente de receitas culinárias, o grande bolo da civilização humana não vem com uma lista de ingredientes e medidas prontas a serem copiadas. Cabe ao empreendedor a missão de analisar a demanda para ver quais combinações de investimentos e em que dosagem as pessoas precisam. Vários desses investimentos irão fracassar, alguns irão suceder. É desse processo competitivo de tentativas e erros que aprendemos como transformar capital em educação, saúde, moradia, lazer etc.

Propostas mais próximas do capitalismo para os pobres preferem subsidiar a demanda e deixar a oferta nas mãos dos empreendedores. O dinheiro gasto com contratação e salário de professores, com construção e manutenção de escolas, seria mais bem aplicado se fosse transferido diretamente para alunos pobres. Suas famílias teriam assim o poder de consumo para escolher qual escola oferece a melhor educação. E as escolas passariam a competir para melhor investir nesses alunos.

O fundamentalismo do investimento ainda é capaz de gerar um efeito culatra. Empresas pagam empregados de acordo com seu desempenho a fim de castigar a ineficiência e aumentar a produtividade dos seus funcionários. Governos que financiam agências e escolas de acordo com sua necessidade estão castigando o desenvolvimento das capacidades e recompensando a multiplicação de necessidades. Quanto pior for o desempenho das escolas, maior será sua necessidade e, portanto, mais acesso ela terá a verbas públicas.

Depois que as ambições industriais de Gana deram errado, o país passou a receber mais ajuda externa, não menos. Nos anos 1970, os ganeses estavam passando fome.

Por: Diogo Costa  presidente do Instituto Ordem Livre e professor do curso de Relações Internacionais do Ibmec-MG. Trabalhou com pesquisa em políticas públicas para o Cato Institute e para a Atlas Economic Research Foundation em Washington DC. Seus artigos já apareceram em publicações diversas, como O Globo, Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo. Diogo é Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Petrópolis e Mestre em Ciência Política pela Columbia University de Nova York. Seu blog: http://www.capitalismoparaospobres.com

OS DONOS DA VERDADE

Um dos fenômenos mais interessantes (e perigosos) da atualidade brasileira é a incapacidade dos atores políticos, inclusive jornalistas engajados, de aceitar a possibilidade de que os adversários possam eventualmente ter razão, ou no mínimo tenham boas intenções. O objetivo do debate, aparentemente, não é provar suas teses, mas demonstrar que as do adversário estão erradas ─ de preferência, por estar ele vendido ou mal-intencionado; nem vencer a discussão, mas tentar desmoralizar o adversário. E, quando o objetivo não é atingido, bate a fúria e parte-se para o insulto.

É a atitude basicamente antijornalística; mas não faz mal, o importante, como no caso das torcidas organizadas de times de futebol, é brigar. É matar e morrer pelas cores de seus políticos favoritos; é negar aos infiéis até o direito a ter uma posição própria. Se não é vermelho é azul, pronto; e é triste ver jornalistas se comportando como os burros e cavalos da Animal Farm (a Revolução dos Bichos, de George Orwell), batendo os cascos no chão e gritando em uníssono slogans como “quatro pernas bom, duas pernas ruim”.

Isso vale para militantes histéricos dos dois partidos que até agora polarizaram o debate político brasileiro, o PSDB e o PT. Petista se recusa a discutir dólares na cueca, tucano se recusa a discutir investigações sobre cartel de metrô e trens urbanos; petista jura que o Supremo perseguiu os mensaleiros (mesmo considerando-se que Dilma e Lula nomearam oito ministros em onze, e que outros dois foram nomeados por presidentes que apoiam o Governo), tucano gostaria de ver os mensaleiros presos submetidos a um regime mais rígido ─ celas subterrâneas, talvez, e nada de luxos como tomar banho de sol no pátio da prisão.

É pena; o Brasil é mais complexo, mais multifacetado, politicamente muito mais rico do que faz supor esse dualismo barato de seitas inimigas. Isso incomoda os xiitas e os xaatos, que insultam ministros do Supremo, desrespeitam aliados de até há pouco tempo como Eduardo Campos (PSB, ex-aliado dos petistas) e Gilberto Kassab (PSD, ex-aliado dos tucanos), referem-se unicamente com palavrões a cidadãos de cujas ideias discordem. Aliás, não usam unicamente palavrões: usam também expressões como “kkkkk” e “uahuahuahuahua” que devem querer dizer alguma coisa. Não é a primeira vez que o país entra nesse clima de divisão, de guerra sectária, de disputa futebolística; e, se conseguir ultrapassá-lo sem importantes perdas políticas, será a primeira vez em que isso acontece.

Quanto aos meios de comunicação, que pena! As portas estão abertas para o Fla x Flu, mas a mais eficiente arma jornalística tem sido abandonada: a reportagem. O antigo secretário nacional da Justiça do Governo Lula, delegado Romeu Tuma Jr., publicou um livro em que há uma série de denúncias contra a administração de que fez parte. Boa parte dessas denúncias têm como testemunhas exclusivas o próprio autor do livro e seu falecido pai, o delegado Romeu Tuma, e não há como verificá-las. Mas um bom número de acusações pode ser comprovada ou desmentida por bons repórteres, que disponham de tempo e recursos.

Até agora, este colunista não soube de nenhum grande veículo de comunicação, desses que dispõem de pessoal competente e de bons recursos, que esteja pesquisando o que foi publicado no livro. Outro livro, recém-publicado pelo repórter Rubens Valente, tem como temas o banqueiro Daniel Dantas e a Operação Satiagraha. Espera-se que neste caso o livro não fique à mercê de opiniões favoráveis e desfavoráveis: que os jornalistas busquem boas fontes e deixem claro com fatos quem tem e quem não tem razão, e em que pontos.

Publicado no Observatório da Imprensa

Por: CARLOS BRICKMANN

domingo, 26 de janeiro de 2014

JANGO E O REALISMO FANTÁSTICO

Era um cardiopata. E de longa data. No México, em 1962, assistindo a uma exibição do balé folclórico, teve um ataque cardíaco


O Brasil é um país fantástico. Mais ainda, é um país do realismo fantástico, onde ficção se mistura com história e produz releituras ao sabor dos acontecimentos. A última tem como tema a morte do ex-presidente João Goulart, o Jango, na Argentina.

A Câmara dos Deputados fez uma investigação, ouviu dezenas de testemunhas e elaborou um longo relatório. Concluiu que não havia indícios de assassinato. Em entrevista a Geneton Moraes Neto, publicada no livro “Dossiê Brasil: as histórias por trás da História recente do país”, a senhora Maria Tereza Goulart descartou qualquer suspeita de assassinato do seu marido: “Eu estava ao lado de Jango o tempo todo, nos últimos dias. Jango morreu do coração. Tinha feito um regime violento e mal controlado. Chegou a perder 17 quilos em dois meses. E estava fumando muito. O médico já tinha dito que ele não poderia fumar.”

Jango era um cardiopata. E de longa data. No México, a 10 de abril de 1962, em visita oficial, assistindo a uma exibição do balé folclórico mexicano, no Teatro Belas Artes, o presidente teve um ataque cardíaco. Ficou desfalecido por um minuto. Atendido por médicos mexicanos, ficou impossibilitado de continuar a cumprir a agenda presidencial, sendo substituído por San Tiago Dantas. No retorno ao Brasil, o grande assunto era o estado de saúde de Jango e a possibilidade de que renunciasse à Presidência. Afinal, era o segundo ataque cardíaco em apenas oito meses. Dois meses depois, quando da recepção em palácio da seleção brasileira que partiria para a Copa do Mundo no Chile, Pelé manifestou preocupação com a saúde do presidente: “Presidente, como vão estas coronárias?” E Jango respondeu: “Estão boas, mas não tanto quanto as suas.”

Às vésperas do célebre comício da Central (13 de março de 1964), seu estado de saúde inspirava cuidados. Foi advertido que poderia ter sérias complicações com o coração. Jango desdenhou e manteve seu ritmo costumeiro de vida sedentária, alimentação inadequada, excesso no consumo de bebidas e vivendo em permanente estresse. No exílio uruguaio, também devido aos problemas com o coração, foi atendido pelo dr. Zerbini. Na França, onde esteve várias vezes, foi cuidar do coração e chegou a tentar uma consulta com o dr. Christian Barnard, na África do Sul, médico que dirigiu a equipe que fez o primeiro transplante de coração.

A transformação de Jango em um perigoso adversário do regime militar — tanto que o seu assassinato teria sido planejado pela Operação Condor — não passa de uma farsa. No exílio uruguaio, especialmente nos anos 1970, não tinha qualquer atuação política.

Tudo não passa de mais uma tentativa de mitificação, da hagiografia política sempre tão presente no Brasil. O figurino de democrata, reformista e comprometido com os deserdados foi novamente retirado do empoeirado armário. Agora pelos seus antigos adversários, os petistas. Mero oportunismo. É que a secretária dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, pretende ser candidata ao Senado pelo Rio Grande do Sul. E, como boa petista, não se importa de reescrever a história ao seu bel-prazer.

O cinquentenário dos acontecimentos de março/abril de 1964 é uma boa oportunidade para rever o governo Jango. O início dos anos 1960 esteve marcado pela agudização das mais variadas contradições. O esgotamento do ciclo econômico que alcançou seu auge na presidência JK era evidente. A grande migração tinha criado uma sociedade urbana e novas demandas que os governos não sabiam como atender. A tensão gerada pela Guerra Fria azedava qualquer conflito, por mais comezinho que fosse.

É nesta conjuntura que Jango tentou governar. E foi um desastre. Raciocinava sempre imaginando algum tipo de ação que significasse o abandono da política, do convencimento do adversário. Era tributário de uma tradição golpista, típica da política brasileira da época.

Nunca fez questão de esconder seu absoluto desinteresse pelas questões mais complexas da administração pública, distantes da politicagem do dia a dia. Celso Furtado, nas suas memórias (“A fantasia desorganizada”), relatou que entregou o Plano Trienal — que buscava planejar a economia nos anos 1963-1965 — ao presidente depois de exaustivas semanas de trabalho. Jango mal passou os olhos pela primeira página. Em entrevista à revista “Playboy”, em abril de 1999, Furtado foi direto: Jango “era um primitivo, um pobre de caráter”.

No polo ideológico oposto, o embaixador Roberto Campos, também nas suas memórias (“A lanterna na popa”), contou que escreveu um documento de 30 páginas relatando os contenciosos do Brasil com os Estados Unidos, em 1962, quando da visita do presidente a Washington. San Tiago Dantas, ministro das Relações Exteriores, pediu ao embaixador que reduzisse ao máximo a extensão do texto, pois com aquele volume de páginas o presidente não leria. Obediente, o embaixador sintetizou os problemas em cinco páginas, que foram consideradas excessivas. Diminuiu para três páginas. Mesmo assim, segundo Campos, Jango não leu o documento.

As reformas de base, palavra de ordem repetida à exaustão naqueles tempos, nunca foram apresentadas no seu conjunto. A definição — ainda que vaga — apareceu somente na mensagem presidencial encaminhada ao Congresso Nacional quando do início do ano legislativo, a 15 de março de 1964. E lembrar que foram apresentadas como soluções de curto prazo — mesmo sendo mudanças estruturais — durante três anos…

Deixou um país dividido, uma economia em estado caótico e com as instituições desmoralizadas. E abriu caminho para duas décadas de arbítrio.

Por: Marco Antonio Villa é historiador

sábado, 25 de janeiro de 2014

A LIÇÃO DE ARIEL SHARON

Morre Ariel Sharon. Há festejos na Faixa de Gaza. Fato: não esperava que os palestinos chorassem a morte de um homem que fez da segurança de Israel a sua eterna paixão.


Primeiro, combatendo nas principais guerras que o país travou desde 1948. E, depois, elegendo a Organização para a Libertação da Palestina (e Arafat) como inimigo número um —um ódio pessoal que o levou à invasão do Líbano em 1982 e aos massacres nos campos de refugiados de Sabra e Shatila. Sharon não ordenou essas matanças de palestinos?

Novo fato. Mas não é preciso ser um gênio militar para perceber que, depois do assassinato de Bashir Gemayel, o líder dos cristãos do Líbano, haveria vingança pesada dos Falangistas sobre os palestinos que eles consideravam responsáveis pelo homicídio. Fechar os olhos a essas atrocidades é também uma forma de cumplicidade lamentável.

Acontece que os festejos em Gaza soam estranho quando nenhum outro premiê israelense fez no território exatamente aquilo que os palestinos reclamavam: retirada unilateral do exército de Israel.

Hoje, quando se fala dos "territórios ocupados", a Cisjordânia e os Montes Golã (na Síria) fazem parte do pacote. Mas a Faixa de Gaza, desde 2005, pertence aos palestinos porque Ariel Sharon decidiu terminar com uma ocupação de quase 40 anos, desmantelando milhares de colonos judeus na região.

Os motivos não foram beneméritos. A ocupação representava um desgaste internacional para Israel. Mas a principal razão era pragmática: Sharon entendeu que o "processo de paz" chegara ao fim.

Cinco anos antes, em Camp David, Israel estava disposto a concessões históricas impensáveis: o reconhecimento de um Estado palestino independente em Gaza e na Cisjordânia; a divisão de Jerusalém como capital dos dois Estados; e até o retorno de uma parcela de refugiados palestinos a Israel e compensações financeiras para os restantes (que viveriam, logicamente, no futuro Estado palestino).

Arafat, em gesto dificilmente classificável, exigiu o retorno de todos os refugiados a Israel (4 milhões), uma forma elegante de convidar o estado judaico a suicidar-se demograficamente (Israel tem uma população de 8 milhões, com 6 milhões de judeus e 1,5 milhões de árabes).

Depois do fracasso de Camp David, seguiu-se Ariel Sharon —uma escolha democrática que representa bem a desilusão da sociedade israelense com as negociações de paz.

E Sharon limitou-se a seguir a velha recomendação do general Yigal Alon, que depois da Guerra dos Seis Dias de 1967 alertara para os perigos de uma ocupação sem fim em Gaza e na Cisjordânia. Melhor seria controlar os territórios (de fora) sem governar milhões de palestinos hostis (por dentro). Ninguém o escutou. Só Sharon, 40 anos depois.

Dito e feito: Israel se retira de Gaza em 2005 e, no ano seguinte, o Hamas vence as eleições no território. Na imprensa "mainstream", o Hamas é apresentado como um grupo que luta contra a ocupação israelense. É uma forma de ver as coisas.

Outra é dizer simplesmente que se trata de um grupo terrorista que nega a existência da "entidade sionista"; que passou a usar Gaza como rampa de lançamento de "rockets" para o interior de Israel a partir de 2005; e que, também a partir desse ano, elegeu a Autoridade Palestina da Cisjordânia como "inimiga" fraternal. Tudo por causa da "traição" de Mahmoud Abbas em dialogar com Israel.

Hoje, não existe mais uma Palestina. Existem, pelo menos, duas: uma em Gaza, outra na Cisjordânia. Falar de um Estado palestino independente é uma piada de mau gosto quando os próprios palestinos não se entendem entre si.

Contas feitas, o que fica na morte de Sharon? Sim, um legado militar com páginas notáveis (lembrar a campanha do Sinai em 1967 contra o Egito) e as páginas negras (os massacres de Sabra e Shatila).

Mas, depois da retirada unilateral de Gaza, Sharon mostrou ao mundo que o conflito israelense-palestino não é territorial; é puramente ideológico. E que é inútil trocar terra por paz quando o interlocutor nem sequer reconhece o nosso direito à existência.

Os festejos de Gaza expressam isso mesmo: os palestinianos já têm um território autônomo, que poderia ser a base de um futuro Estado palestino. Mas o problema central continua o mesmo: o fato de os judeus também terem o seu Estado ali ao lado. Por: Joãp Pereira Coutinho Folha de SP

UMA DOENÇA FRANCESA

Em 2013, um historiador francês, militante da extrema-direita, entrou na Catedral de Notre-Dame, em Paris. Junto ao altar, apontou a arma à cabeça. Disparou. Explicações para o ato?


O casamento gay, leu-se em mensagem do suicida, escrita antes do "happening". A República Francesa tinha aprovado uma lei sobre a matéria e Dominique Venner (eis o nome) considerou a heresia o último prego no caixão da França. Espalhar os miolos em Notre-Dame pareceu-lhe uma forma razoável de defender as suas ideias.

Nos dias seguintes, escreveram-se toneladas de artigos sobre o caso. Todos eles batiam na mesma tecla analfabeta: como é possível explicar que a França - pátria da "tolerância" e da "Revolução Francesa" - ofereça tais espetáculos de radicalismo?

Ri muito com a sabedoria dos articulistas. Primeiro, porque usar as palavras "tolerância" e "Revolução Francesa" na mesma frase é um "gag" digno do pessoal da Porta dos Fundos.
Mas será que o mundo já esqueceu que, em matéria de extremismo político, a França é um caso historicamente patológico?

Sim, a trilogia "liberdade, igualdade, fraternidade" é excelente para encher a boca dos poetas. Mas a Revolução Francesa, e sobretudo o período do Terror entre 1792 e 1794, foi um carnaval de violência e desumanidade que nenhuma pessoa letrada pode contemplar com cara séria.

Sim, a França garantiu a emancipação dos judeus no século 18, integrando-os na vida nacional como poucos países europeus o fizeram.

Mas será preciso lembrar que tanta "tolerância" converteu-se num dos mais infames fenômenos de antissemitismo quando um oficial francês de origem judaica, Alfred Dreyfus (1859 - 1935), foi injustamente acusado de passar segredos militares para os alemães e condenado a prisão perpétua na Ilha do Diabo, na Guiana Francesa?

A terra da "liberdade, igualdade, fraternidade" é também um país com uma tradição antissemita forte. Uma tradição partilhada pela extrema-direita clássica (bastará ler os textos Charles Maurras ou as proclamações tonitruantes da Frente Nacional da família Le Pen) a que se junta agora o "humorista" (peço desculpa pelo abuso do termo) Dieudonné M'Bala M'Bala.

O caso é conhecido: Dieudonné, que tem em seu repertório piadas negacionistas do Holocausto e um gesto que consiste em fazer a saudação nazista invertida (o chamado "quenelle"), teve vários dos seus shows cancelados em prefeituras de França por decisões judiciais. Parece que Dieudonné incita ao ódio racial com suas tiradas antissemitas e representa um perigo para a ordem pública.

Como é evidente, o "humorista" converteu-se em "mártir" nacional - e a "quenelle" passou a ser gesto disseminado pelo país inteiro. Como se fosse um cumprimento informal entre amigos.
Ponto de ordem: sou contra limitações à liberdade de expressão, mesmo que essa liberdade nos soe ofensiva e grotesca. Proibir Dieudonné de fazer os seus shows aberrantes é conceder-lhe uma importância que normalmente não dedicamos a um delinquente vulgar.

Mas o mais inquietante da história não está nos shows de Dieudonné. Está nos milhares de franceses que, de norte a sul, imitam os seus gestos como se o nazismo ou as câmaras de gás fossem matéria de dúvida ou escárnio. Em que outro país da Europa ocidental essa espécie de "antissemitismo chic" seria praticado com tanto sucesso?

Da próxima vez que escutar a trilogia "liberdade, igualdade, fraternidade", tenha cuidado: depois das guilhotinas, pode haver alguém por perto a fazer a saudação nazista invertida

Por: João Pereira Coutinho Folha de SP

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

FOI UM DESASTRE


Nenhum historiador, nenhum leitor informado pode conceber a grande literatura da primeira metade do século 20 sem os nomes de G. K. Chesterton, Léon Bloy, T. S. Eliot, François Mauriac, Julien Green, Flannery O’Connor, Georges Bernanos, Paul Claudel, Miguel de Unamuno, Gerard Manley Hopkins, Graham Greene, Evelyn Waugh, Charles Péguy, Hugo von Hoffmansthal, Hermann Broch, Gertrud von Le Fort, Giovanni Papini, Giuseppe Ungaretti, Henrik Sienkiewicz, José Maria de Pereda.Que há de comum entre esses autores? Eles são todos escritores católicos, não só porque se assumiam publicamente como membros da Igreja, mas porque suas obras refletem os temas e preocupações mais tipicamente caros à alma católica, especialmente o pecado e a Graça.

Por meio de seus livros, esses temas entravam na cultura superior da sua época e nas conversações pessoais de milhões de leitores tão naturalmente quanto os temas marxistas entravam por meio de Górki ou Brecht, os esotéricos de Hermann Hesse e W. B. Yeats, os psicanalíticos de Arthur Schnitzler, James Joyce ou Tennessee Williams, e assim por diante.

Não há exagero em afirmar que durante esse meio século a experiência católica foi uma das principais, senão a principal força inspiradora da criatividade literária em todo o mundo Ocidental.

Esse florescimento, incomum mesmo em épocas anteriores mais acentuadamente cristãs, foi possível porque, alimentado pelo advento da chamada "psicologia profunda", o interesse crescente das classes letradas pelo conhecimento da alma humana encontrava na disciplina tradicional do exame de consciência e da confissão um ambiente especialmente favorável.

Nada é mais indispensável ao escritor de ficção do que a conquista daquela voz própria, pessoal no mais alto grau, que fala desde as impressões individuais diretas, e que definha tão logo o senso da experiência concreta é sufocado pela intromissão dos e stereótipos e das "idéias gerais".

A prática do catolicismo consiste muito menos em aderir intelectualmente a doutrinas gerais do que em buscar, com a ajuda dessas doutrinas, um diálogo direto entre a alma do pecador e a única fonte possível da redenção.

Todo fiel católico sabe que só perante Deus a alma alcança aquele patamar de sinceridade perfeita que a convivência entre os homens busca em vão imitar. Daí a vivacidade incomum, o penetrante realismo com que a experiência católica se transmuta em representação literária da vida.

Isso explica também por que, nas décadas que se seguiram ao Concílio Vaticano II, a grande literatura católica praticamente desapareceu, e a mediana, que continua existindo, já não desempenha nem tem fôlego para desempenhar nenhum papel de relevo no mundo da alta cultura.

O Concílio, como se sabe, dividiu a Igreja. De um lado, os entusiastas do "aggiornamento", ansiosos de conquistar a simpatia do mundo, prostituíram-se a um bom-mocismo esquerdista que pode lhes valer algum aplauso da mídia, mas que no reino da criação literária, onde a "guerra contra o clichê", como a chamou Martin Amis, é o pão de cada dia, só pode resultar na autodestruição de todos os talentos.

O epitáfio do progressismo católico nas letras foi Monsignor Quixote (1982), no qual, levado pelo desejo de fazer da mediocridade pomposa de um bispo esquerdista um símbolo de santidade autêntica, Graham Greene, que se notabilizara nas suas obras de ficção pela veracidade psicológica dos personagens, apenas provou aquilo que todo leitor de romances já sabia: que os estereótipos da moda são a criptonita do gênio literário.

Do outro lado, os tradicionalistas, marginalizados, perseguidos, rejeitados pela autoridade mesma que professavam obedecer, fecharam-se num estado de espírito combatente e rancoroso, que pode inspirar belas tiradas polêmicas, mas seca na raiz a imaginação romanesca. A mais alta personalidade literária dessa facção ainda em atividade, o romancista canadense Michael O'Brien, não cessa de produzir obras dignas de atenção, mas quase sempre debilitadas por um impulso catequético demasiado ostensivo, que não catequiza ninguém precisamente porque não atrai os leitores não católicos.

O que subsiste de literatura católica no mundo entra na categoria dos "interesses especiais". É o mesmo que dizer: não tem voz no universo da alta cultura. Aos 92 anos, Eugenio Corti, o único grande escritor católico vivo que se ombreia com os citados no começo deste artigo, dificilmente é lido fora dos círculos de fiéis. Outro raro sobrevivente, Walker Percy, nascido em 1919, falecido em 1990, pertence mais à época pré-conciliar.

É verdade que um dos ficcionistas de maior sucesso nas últimas décadas foi um autor católico: J. R. R. Tolkien. Mas ele é um escritor da primeira metade do século 20, apenas descoberto tardiamente pelo público geral.

Examinado na escala menor e local do Brasil, o processo torna-se ainda mais visível, a queda mais vertiginosa e deprimente. Sem mencionar pensadores e doutrinários, ficando só na área de poesia e ficção e contando apenas os maiores, tínhamos Augusto Frederico Schmidt, Manuel Bandeira, Jorge de Lima, Murilo Mendes, Octavio de Faria, Lúcio Cardoso, Cornélio Penna, Alphonsus de Guimaraens Filho. Tudo literatura católica. E hoje? Desde a morte de Bruno Tolentino, o nada seria infinitamente preferível ao que ainda circula com esse rótulo.

Se é verdade que 'pelos frutos os conhecereis' e que algo do estado de coisas na sociedade se pode apreender pelos altos e baixos da criação literária, então é preciso dar alguma razão aos tradicionalistas e reconhecer: o Concílio Vaticano II foi um desastre.
Por: Olavo de Carvalho é jornalista, ensaísta e professor de Filosofia Publicado no Diário do Comercio


COVARDIA CHIQUE

Sabemos todos das críticas comuns ao capitalismo. Injustiça social, viramos mercadoria. Sonhamos com um mundo no qual todos terão praia sem trânsito, com areia e água igual para todos. Mulheres e homens se amariam sem ciúmes e também amariam outros animais e plantas de forma igualitária e com respeito. Um mundo no qual todos viveriam numa mistura de Islândia e França, com clima italiano.


Vulcões não engoliriam civilizações, tsunamis não invadiriam a terra, jacarés respeitariam os direitos humanos. Mulheres não desejariam mais de um vestido, homens não teriam medo da impotência. Todos integrados num sistema autorregulativo de paz e amor. Críticas de uma mente infantil.

A melhor crítica à sociedade de mercado foi feita por seu maior defensor, Adam Smith (século 18). Tradutor de Rousseau, Smith discutiu com ele a corrupção do caráter causada pelo sociedade comercial.

Rousseau entendia que a corrupção era política e seria resolvida com remédios políticos: revolução, destruição da cultura e técnica, frutos do mundo baseado em trocas comerciais, uma nova pedagogia que deixasse a harmonia e beleza da natureza humana inata se manifestar de novo na sua integração com a harmonia e beleza da natureza a nossa volta. E, assim sendo, de novo, voltaríamos ao mundo no qual o homem acordaria, caçaria de manhã, almoçaria ao meio-dia, escreveria um livro à noite, sem um tsunami ou inveja sequer.

Para Smith, a corrupção é moral, e não política. Interessante ver como aquele para quem a sociedade comercial era um trunfo humano a ser preservado, será o mesmo homem para quem o risco dessa mesma sociedade será muito mais difícil de curar do que para nosso filósofo da vaidade, Rousseau.

Smith temia que a sociedade de mercado causasse um enfraquecimento das virtudes heroicas. A perda dessas virtudes (coragem, disciplina e força), causada por uma vida baseada na produção de riquezas materiais e consequente riqueza de bens imateriais (hoje materializados em leis luxuosas sobre direitos, desejos e liberdades numa sociedade baseada em escolhas individuais contra sociedades que esmagam esta escolha sob a bota de modelos coletivistas tradicionais, religiosos ou marxistas), apareceria na covardia generalizada e no vício do bem-estar, material e imaterial.

Se a URSS tivesse ganho a Guerra Fria, seriamos todos pobres e ninguém teria esses luxos materiais e imateriais. O capitalismo deixou todo mundo frouxo.

Logo, o enriquecimento produz homens e mulheres covardes em larga escala porque produz demandas de luxo generalizado.

Para Smith, o homem moderno poderia vir a ser um covarde viciado em seus pequenos luxos. No entendimento do nosso iluminista escocês (o iluminismo britânico é infinitamente mais sofisticado do que o francês, o único ensinado no Brasil tacanho de nosso dia a dia), somos capazes de benevolência e empatia (ou simpatia), e buscamos uma certa imparcialidade em nossos julgamentos morais por percebermos como ela é importante para o convívio racional.

Entretanto, a virtude heroica da sociedade de mercado, pensava ele, era a autonomia, não a pura kantiana, mas a capacidade de assumirmos nossas decisões morais na vida alimentada por nosso desejo de sermos donos de nossa vida material, na medida do possível.

Ele bem sabia o quão duro é ser assim. Sempre foi. Mas a corrupção do caráter, baseada nos ganhos materiais e imateriais do bem-estar, nos tornaria uns frouxos. E isso aconteceu. E esta frouxidão se materializa numa demanda interminável de facilitação da própria vida.

Logo, vamos exigir a abolição do trabalho como direito. Ganhar a vida com o suor do rosto sem garantia de retribuição será considerado contra os direitos humanos.

O novo crescimento do socialismo rosa-choque, inclusive em lideres como Obama, é fruto dessa corrupção. Smith previu as bases para o surgimento do pensamento de Marx e Gramsci: a corrosão do caráter causada pelo enriquecimento das sociedades e suas demandas de supressão das condições reais da vida como dor, luta e trabalho sem garantias.

Por: Luiz Felipe Pondé Folha de SP

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

DECLARAÇÃO DE PRAGA SOBRE CONSCIÊNCIA EUROPEIA E COMUNISMO


A declaração clama:

1- Levar a toda Europa o entendimento de que os regimes totalitários nazista e comunista precisam ser julgados por seus próprios e terríveis méritos, isto é, por suas políticas destrutivas impostas mediante a aplicação sistemática de formas extremas de terror e a supressão de todas as liberdades civis e humanas, pela eclosão de guerras agressivas e — como parte inseparável de suas ideologias — pelo extermínio e deportação de nações inteiras e de grandes grupos populacionais; e por tudo isso tais regimes devem ser considerados os principais desastres que macularam o século 20;

2- O reconhecimento de que muitos crimes cometidos em nome do comunismo devem ser considerados crimes contra a humanidade, servindo portanto como um aviso para as gerações futuras, tal como os crimes nazistas foram considerados pelo Tribunal de Nuremberg;

3- A formulação de uma abordagem comum sobre os crimes dos regimes totalitários, nomeadamente dos Regimes Comunistas, e a ampliação em toda a Europa da consciência relativa a esses crimes comunistas, definindo claramente uma atitude comum para com eles;

4- A introdução de legislação que dê permissão aos tribunais para julgar e punir os perpetradores dos crimes comunistas e compensar suas vítimas;

5- Garantir o princípio da igualdade de tratamento e não discriminação das vítimas de todos os regimes totalitários;

6- A pressão europeia e internacional para a condenação efetiva dos crimes comunistas do passado e para a luta eficaz contra os crimes comunistas em curso;

7- O reconhecimento do comunismo como parte integrante e terrível da história comum da Europa;

8- A aceitação da responsabilidade pan-europeia nos crimes cometidos pelo comunismo;

9- O estabelecimento do dia 23 de Agosto, o dia da assinatura do pacto Hitler-Stalin, conhecido como o Pacto Molotov-Ribbentrop, como o dia de recordação das vítimas de ambos os regimes totalitários, os regimes nazista e comunista, tal como a Europa recorda as vítimas do Holocausto em 27 de janeiro;

10- Atitudes responsáveis dos Parlamentos Nacionais no que se refere ao reconhecimento dos crimes comunistas como crimes contra a humanidade, levando a uma legislação apropriada, e ao monitoramento parlamentar dessa legislação;

11- O debate público eficaz sobre o uso comercial e político indevido dos símbolos comunistas;

12- A continuação das audiências da Comissão Europeia sobre as vítimas de regimes totalitários, com vista à elaboração de uma comunicação da Comissão;

13- O estabelecimento em países europeus, que tenham sido governados por regimes comunistas totalitários, de comitês compostos por peritos independentes, com a tarefa de recolher e avaliar informações sobre as violações dos direitos humanos a nível nacional sob o regime comunista totalitário, com vistas a colaborar estreitamente com um comitê de especialistas do Conselho da Europa;

14- Assegurar um quadro jurídico internacional claro visando um acesso livre e irrestrito aos arquivos que contêm informações sobre os crimes do comunismo;

15- A criação de um Instituto da Memória e Consciência Europeias;

16- A organização de uma conferência internacional sobre os crimes cometidos pelos regimes comunistas totalitários, com a participação de representantes de governos, parlamentares, acadêmicos, especialistas e ONGs, com resultados a serem amplamente divulgados em todo o mundo;

17- O ajuste e revisão de livros de história da Europa para que as crianças possam aprender e ser alertadas sobre o comunismo e seus crimes, tal como são ensinadas a avaliar os crimes nazistas;

18- O debate amplo e minucioso em toda a Europa da história e do legado comunista;

19- A comemoração conjunta no próximo ano do 20º aniversário da queda do Muro de Berlim, do massacre da Praça Tiananmen e das mortes na Romênia;

A declaração cita a Resolução 1481 do Conselho da Europa, bem como “resoluções sobre os crimes comunistas adotadas por vários parlamentos nacionais”. A Declaração foi precedida pela Audiência Pública Europeia sobre Crimes Cometidos por Regimes Totalitários.

ESCRITO POR DECLARAÇÃO DE PRAGA

Tradução: Yuri Vieira

UM IMENSO MARANHÃO


Quase 13 milhões de jovens e adultos analfabetos, outros 30,5 milhões que já viram uma ou outra letra e nada compreendem; 43% dos domicílios sem o trio básico de saneamento – água encanada, esgoto e coleta de lixo; 50 mil homicídios ao ano, 25,8 por 100 mil habitantes, o que coloca o País no sétimo lugar entre os mais violentos do mundo.

Esse Brasil pobre e sem luz no fim do túnel é o mesmo que garante a mais perversa das equações: quanto mais ignorantes e miseráveis, mais votos depositam em salvadores da pátria.

Engana-se quem imaginar que isso se restringe ao Maranhão dos Sarneys. A indústria da miséria, que o PT urbano e intelectual dos anos 1980 combatia com unhas e dentes, continua a prosperar. E até com mais fôlego.

No Nordeste e no Norte, a aprovação da presidente Dilma Rousseff bate nos céus e os indicadores sociais afundam-se na lama. Os nordestinos respondem por 52% dos completamente analfabetos e 30,9% dos analfabetos funcionais do País.

Seus índices de morte matada são de guerra: 61,8 por 100 mil em Alagoas, 42,5 no Ceará, 40,7 na Bahia, 40 por 100 mil em Sergipe. No Norte, água, esgoto e coleta de lixo chegam só a 13% da população. Em 10 anos, os avanços nessa área foram de tímidos 2,1%.

Para esses que vivem à margem, até sem um vaso sanitário, há o Bolsa Família, hoje com 14,1 milhões de beneficiários. Dinheiro indispensável, mas que não deveria dispensar os investimentos em estruturas mínimas para, aí sim, começar a eliminar a miséria.

Não é por acaso que depois de chegar ao Planalto o PT substituiu o discurso combativo pelo peleguismo, pela política de resultados, pelo clientelismo. Com isso, o perfil de seu eleitor migrou das grandes para as pequenas cidades.

Dilma é imbatível no Norte e Nordeste entre os eleitores de baixa escolaridade e em municípios com até 50 mil habitantes. Encontra dificuldades em centros urbanos, até mesmo em São Luís, capital da terra do aliado Sarney.

Na cidade de São Paulo, onde poderia inverter essa lógica, o errático Fernando Haddad mais aterroriza do que anima o petismo. Nos maiores colégios eleitorais terá de enfrentar o favoritismo de Aécio Neves em Minas, as duas décadas dos tucanos em São Paulo e o descontente PMDB, que não vai facilitar a vida da presidente. Pior: sua base nordestina sofre baixas com a candidatura Eduardo Campos.

Quem sabe se com esses desconfortos cutucando o favoritismo de Dilma, a campanha eleitoral se volte não para a chatice das promessas sem lastro, do “nós versus eles”, mas para o apavorante e atrasado Brasil que não sabe ler e escrever, que não tem banheiro nem água, que vê seus jovens serem mortos sem saber por quê.

Por: Mary Zaidan, jornalista. Trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas. Atualmente trabalha na agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa'. Escreve aqui aos domingos. Twitter: @maryzaidan, e-mail: maryzaidan@me.com

RETRATOS DE FAMÍLIA

1. Fotografias: haverá coisa mais preciosa? Em tempos arcaicos, talvez. A minha avó costumava contar que o maior tesouro que trouxe da casa dos pais eram as fotos de família. Álbuns e álbuns com fotos em preto e branco, algumas coloridas (manualmente, claro) e impressas em cartão grosso. Todas elas insubstituíveis. Estranho tempo, esse, em que os retratos valiam tanto como ouro. Ou até mais que ouro.


Hoje vivemos o supremo paradoxo: nunca se tiraram tantas fotos; nunca elas tiveram tão pouco valor.

O jornal "Guardian" avisa que 2014 será o ano em que o mundo vai bater recordes no número de fotos tiradas: qualquer coisa como 3 trilhões. Esse excesso não pode ser coisa boa: a facilidade com que hoje se tiram fotos é diretamente proporcional à facilidade com que nos esquecemos delas.

Uma amiga, aliás, contava-me há tempos uma história instrutiva: em três anos de maternidade, ela acumulara mais de mil fotos do primogênito. Até descobrir que não tinha nenhuma para mostrar em papel ou em moldura -permaneciam todas na memória do laptop, ou na câmera, ou no celular. À espera de melhores dias.

Três trilhões de fotos para 2014, diz o "Guardian". E, no fim de contas, é como se o mundo não tirasse uma única foto que realmente importe.

2. Só existem dois tipos de pessoas que se preocupam genuinamente com Deus: os crentes e os ateus. Os primeiros por razões óbvias. E os segundos por razões ainda mais óbvias: a não crença, sobretudo quando levada a excessos de negação, converte-se sempre numa forma de crença e até de afirmação.

O escritor Kingsley Amis é um bom exemplo. Um dia perguntaram-lhe por que motivo ele não acreditava em Deus. Amis corrigiu a pergunta e ripostou: "Não é bem não acreditar; é mais detestá-lo". Haverá forma mais sofisticada de fé na transcendência?

Não admira por isso que já existam igrejas ateias nos quatro cantos do mundo ocidental. Leio que a moda começou em Londres, com a Assembleia de Domingo. A autora do artigo publicado no site Salon, Katie Engelhart, foi assistir a uma "celebração". E encontrou um mimetismo perfeito das celebrações religiosas tradicionais, com um "pastor", um "sermão", momentos de "oração" -no fundo, a busca de um sentido de "comunhão" para o rebanho ateu.

A coisa fez sucesso em Londres, espalhou-se pelo Reino Unido, emigrou para os Estados Unidos (e para a Austrália) e, palavra de honra, até já teve a sua primeira "reforma protestante": em Nova York, dissidentes da Assembleia de Domingo resolveram fundar a sua própria "igreja" por entenderem que a original não era suficientemente ateia.

Imagino que, no futuro, outras "igrejas" se seguirão, dispostas a espalhar a "palavra" (mas qual "palavra"?) em adoração ao "não-deus". O fenômeno é interessante e só confirma o que os clássicos da ciência política sempre escreveram sobre o assunto: a negação da religião estabelecida não liberta os homens da sua condição de "animais religiosos".

Que o diga o filósofo Raymond Aron, por exemplo, para quem o nazismo e o comunismo não eram mais do que "religiões seculares", dispostas a oferecer aos seus "fiéis" o Reino da Raça (ou do Proletariado) em substituição do Reino dos Céus.

As igrejas ateias, pelo menos, sempre me parecem mais inofensivas e até divertem na sua óbvia palhaçada.

3. Antes de Saramago ou de Cristiano Ronaldo, e sabendo-se que Fernando Pessoa foi uma descoberta tardia da década de 1980, Portugal tinha dois nomes para oferecer ao século 20: Amália Rodrigues e Eusébio.

Amália, a única fadista que verdadeiramente transcende o fado, morreu em 1999. Não deixou herdeiros, apesar de talentos maiores como Carminho ou Camané.

Eusébio morreu agora, aos 71, e o país perdeu o segundo rosto que iluminava a vida dos lusos nos tristes anos da ditadura salazarista.

Logicamente, nunca vi Eusébio jogar. Mas recordo as lágrimas do meu pai sempre que ele relatava as lágrimas do próprio Eusébio depois da eliminação de Portugal nas semifinais da Copa de 1966 pela Inglaterra.

Pergunto honestamente se, hoje, existe algum jogador profissional que, perante uma eliminação idêntica, chore copiosa e sinceramente como Eusébio no Estádio de Wembley. Duvido. 
Por: João pereira Coutinho  Folha de SP

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

O MEU 2013

Animais - Depois de invadirem um laboratório em São Paulo, fanáticos da causa animal invadiram o meu e-mail com os insultos de praxe. Infelizmente, discutir os "direitos dos animais" implica saber primeiro se, em nome desses duvidosos "direitos", é legítimo parar a ciência e os inúmeros tratamentos médicos que dependem da experimentação com bichos. Não creio. Quem pensa o contrário deveria, por motivos de coerência, recusar toda a tecnologia (e toda a farmacologia) que passou por ratos, símios ou cachorros.


Camus, Albert - O centenário de Camus não teve o mesmo brilho que o de Sartre em 2005. Injusto. Camus é superior a Sartre, mesmo que a sua proposta "existencialista" seja difícil de engolir: aceitar o Absurdo como um Sísifo feliz pressupõe um nível de autossuficiência raríssimo em matéria humana tão frágil.

Francisco - Com a renúncia de Bento 16 —coisa invulgar em mais de 600 anos de história— o Espírito Santo foi buscar um papa no "fim do mundo". Rezam as crônicas que, depois de eleito, Francisco terá informado os colaboradores que "o Carnaval acabou". Que o mesmo é dizer: é hora de recentrar a mensagem evangélica na missão primordial de acorrer aos desvalidos, sem perder energias com "batalhas culturais" redundantes. Amém!

Livros - Alice Munro ganhou, e bem, o Nobel da Literatura. David Shields publicou a melhor autobiografia que li em 2013 ("How Literature Saved My Life"). O melhor livro brasileiro é produto desta Folha: "A Cozinha Venenosa", de Silvia Bittencourt, uma narrativa histórica sobre um pequeno jornal da Baviera que denunciou, desde a primeira hora, a ascensão de Hitler — primeiro, como um vulgar agitador nas cervejarias de Munique; finalmente, como líder nazista na Alemanha. Sei que esta coluna é lida por editores portugueses. Para eles, uma palavra: acordem!

Mandela, Nelson - A morte de Mandela mostrou o jornalismo moderno em toda a sua gloriosa preguiça: em tom caricatural, Mandela foi elevado a santo e a luta contra o "apartheid", transformada em obra de um homem só. Errado. Mandela foi sobretudo um político de gênio que entendeu as vantagens (midiáticas, internacionais) da "resistência passiva", ao mesmo tempo que dialogava com o regime. A queda da União Soviética e a sensatez de Frederik de Klerk (o último presidente branco da África do Sul, devidamente ignorado nas hagiografias que se escreveram sobre Mandela) fizeram o resto para derrubar a derradeira mancha moral do século 20.

O'Toole, Peter - O ano foi triste para os monstros das telas. James Gandolfini, que fez com Tony Soprano o mesmo que Jeremy Brett com Sherlock Holmes (uma fusão perfeita e lendária na TV) deixou-nos em junho. Peter O'Toole, fiel ao espírito boêmio, esperou pelas festividades natalinas. Indicado oito vezes ao Oscar, perdeu as oito quando provavelmente merecia ganhar nas oito. Depois disso, só leva a sério os prêmios de Hollywood quem tem falta de massa cinzenta.

Ricardo 3º - Em parque de estacionamento na Inglaterra, foram encontradas as ossadas do rei que Shakespeare imortalizou na peça homônima. O caso levou historiadores vários a tentar melhorar a reputação de Ricardo 3º — um monarca sensato, reformador, compassivo etc. Indiferente. Como alguém dizia, quando a lenda é superior aos fatos, imprima-se a lenda. O Ricardo que fica para a posteridade é aquele que, nas primeiras linhas da peça, despreza a paz que finalmente chegou à casa de York e se prepara para iniciar a sua busca pelo poder. A paz sempre valeu pouco para espíritos que não se encontram em paz.

"Selfie" - Aprendi essa palavra nova no ano que termina. São fotos que o próprio tira do próprio e depois partilha nas redes sociais. Exemplo extremo de narcisismo? Certo. Mas o narcisismo tem uma explicação cultural: longe vão os tempos em que a função da arte (e do retrato) era captar e reproduzir o mundo. Hoje, o crescente desinteresse pelo mundo (e, no limite, pelos outros) só poderia degenerar em monumentos fotográficos à nossa ridícula vaidade e indisfarçável solidão.

Thatcher, Margaret - Morreu aos 87. Nenhum premiê britânico despertou tantos ódios como Thatcher. Entendo. Thatcher não resgatou apenas o Reino Unido da falência econômica em que o país se encontrava em 1979. A "dama de ferro" deslocou o eixo político britânico definitivamente para a direita, enterrando o "socialismo" na pátria onde ele nasceu. É o seu epitáfio. 
Por: João pereira Coutinho Folha de SP

SETE DESEJOS DE ANO NOVO

1. As denúncias de Edward Snowden sobre a espionagem em massa das comunicações de cidadãos comuns deflagraram uma investigação oficial, que gerou um relatório de propostas de mudanças nos procedimentos da NSA. Faz sentido criminalizar o personagem que apontou as distorções, reconhecidas pelo próprio governo, de uma agência estatal descontrolada? Desejo que Obama anistie incondicionalmente o delator. Seria um sinal de vitalidade da democracia americana -e, de passagem, resgataria Snowden do abraço de urso de Putin.


2. A "maior Copa de todos os tempos", na frase de Dilma, é a Copa mais cara da história. A festa macabra da Fifa, bancada com dinheiro público, simboliza a inigualável soberba do lulismo. Que as pessoas voltem às ruas desde a hora do apito inicial e, no entorno das arenas bilionárias, até a cerimônia de encerramento, exponham ao mundo a desfaçatez dessa aliança profana entre os donos do negócio do futebol e os gerentes dos "negócios do Brasil". Que a polícia trate com urbanidade os manifestantes -e com a dureza da lei os vândalos mascarados.

3. Serra colou sua foto à de Lula na campanha presidencial de 2010 e tentou colar em todo o PT o rótulo infamante de quadrilha de corruptos nas eleições municipais de 2012. Que Aécio aprenda com tais precedentes a lição do que não se deve fazer. Oposição se faz com o bisturi afiado da crítica e com a bússola apontada para um rumo de mudança. Que o tucano combine radicalidade (de fundo) e civilidade (de forma).

4. "Vemos as filhas do Bolsa Família serem mães do Bolsa Família. Vamos assistir a elas serem avós do Bolsa Família?" Eduardo Campos revela a ousadia dos estadistas quando, desafiando a geleia geral brasileira, indica os limites dos programas de transferência de renda. Que ele desenvolva esse tema difícil sob o fogo da propaganda eleitoral. Que estraçalhe o véu atrás do qual se esconde o deplorável conservadorismo de um governo devotado à reprodução infinita do círculo de ferro da pobreza e da dependência.

5. Franklin Roosevelt governou por 12 anos, entre 1933 e 1945. Depois, para reforçar o princípio da alternância no poder, uma emenda constitucional impôs a regra de uma reeleição única. O provável triunfo de Dilma estenderia a presidência lulista a 16 anos, um intervalo longo o suficiente para converter um governo num regime. A eternização no poder de uma corrente política que tende a borrar as fronteiras entre Estado, governo e partido envenena as instituições democráticas. Nossa democracia não precisa de um Partido com inicial maiúscula. Que as urnas de outubro cortem o caminho do quarto mandato consecutivo do lulismo.

6. Suzana Singer qualificou Reinaldo Azevedo como "um rottweiler", dois dias depois da publicação do primeiro texto do novo colunista, que não continha nenhuma impropriedade, e revelou sua insatisfação com a chegada de outro colunista (este aqui), acusado do crime hediondo de ser um "crítico entusiasmado do PT". Há algo de muito errado no cenário do debate público quando a ombudsman do maior jornal do país faz tabelinha com as correntes difamatórias da internet financiadas pelo Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. Que Suzana recupere o prumo e a compostura.

7. Um relatório judicial entregue ao STF revelou que 59 presos foram assassinados na cadeia de Pedrinhas (MA), onde a tortura e o abuso sexual entre prisioneiros fazem parte do cotidiano. Nas cadeias do país, 500 mil presos amontoam-se em 300 mil vagas. Durante o julgamento do "mensalão", o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo crismou o sistema carcerário brasileiro como "medieval", uma incrível descoberta propiciada pelo espectro da condenação definitiva de seus companheiros petistas. Que, 12 anos depois da ascensão de seu partido ao poder, Cardozo supere o hiato entre a palavra e a ação. Por: Demétrio Magnoli Folha de SP