segunda-feira, 19 de maio de 2014

A POLÍTICA PETISTA DO SALÁRIO MÍNIMO E O PROBLEMA DA PRODUTUVUDADE

Não existe riqueza produzida por decreto.


Na semana passada a imprensa, especialmente a televisiva, enfim começou a tocar no óbvio que tenho exaustivamente avisado desde há muito: os sucessivos aumentos do salário mínimo (SM), completamente desvinculados de um crescimento real da economia e da produtividade do trabalho, estão indexando a economia e empurrando a alta da inflação.

Não estou reivindicando aqui os louros tais quais aqueles videntes que se dão bem no chute das suas previsões em época de virada de ano ou de copas do mundo. Também não é praga atirada contra quem está no poder, apostando no “quanto pior, melhor”. É apenas o exercício do velho bom-senso. Na verdade, soa-me um tanto cínico que apenas agora os grandes meios de comunicação estejam noticiando algo tão banal como se fosse a descoberta da roda.

Pra começar, o próprio conceito de salário mínimo é uma ficção socialista baseada no conceito marxista do “mínimo vital”, segundo o qual uma pessoa tem de receber como salário um valor que lhe permita usufruir um pacote de condições mínimas de existência. Seguindo a essência de tal raciocínio, torna-se legítimo exigir que a cada lance das redes capture-se uma quantidade mínima de peixes, ou que a cada semeadura vingue um percentual mínimo durante a colheita. E Deus que dê seu jeito...

Até a nossa própria constituição, cunhada por Ulisses Guimarães de “A Cidadã”, que eu rebatizei de “A Esquizofrênica”, lista um rol de nove necessidades ditas básicas que devem ser atendidas pelo salário mínimo, além de inventar outra bizarrice chamada de “piso salarial”, que é uma espécie de salário mínimo especial para determinadas categorias profissionais - deve ser porque há cidadãos “mais iguais” que outros, não é? Notem como o piso salarial é a própria revogação do salário mínimo, contrariando a ideia de igualdade de todos perante a lei que o caput do Artigo 5º encabeça:


Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;


O SM, como toda lei demagógica, assenta-se sobre uma redação bastante abstrata. Por exemplo: qual a qualidade mínima de todos estes itens para que sejam considerados satisfeitos? Mais: qual a composição de uma família? Ora, se há de haver um salário mínimo nacionalmente unificado, isto é, “igual para todos”, então o tamanho da família deverá ser também padronizado, ou haverá diferenças de renda entre famílias com diferente número de membros. Uma casa de sapê e uma alimentação à base de feijão e farinha de mandioca servem? Como estará satisfeito o item “lazer”? 

Com uma ida mensal ao cinema ou teatro, ou com uma viagem à Disneylândia? Outra: de quê maneira o SM deve atender a necessidades tais como educação, saúde e previdência social, se as duas primeiras são providas “gratuitamente” pelo estado e a terceira, compulsoriamente, pela contribuição previdenciária?

Há ainda disparidades de âmbito histórico e geográfico: As necessidades de um cidadão do século XXI envolvem claramente o custo com a energia elétrica e gás de cozinha, que não estava compreendido entre as necessidades de um cidadão do século XIX. No quesito espacial, será que um americano aceitaria o SM de um brasileiro, e este, o de um nigeriano? Ainda no Brasil, será que um SM em metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro vale tanto quanto no interior do Nordeste?

Todas estas questões remetem à conclusão de que o SM estipula um valor mínimo para o trabalho completamente convencional, que os governos adoram especular por ocasião da proximidade com as eleições, usando a ignorância do povo contra ele próprio.

Porém, o mais importante a revelar sobre o SM é que ele não garante nada, ao contrário do que afirma: não garante suprir as necessidades que arrola, nem que todos os cidadãos os receberão; apenas quem fará jus serão os trabalhadores com carteira assinada, de modo que, quanto mais alto for decretado seu valor e mais distante da produtividade econômica estiver, menos cidadãos serão formalmente empregados. Concluindo: o SM não é uma garantia e muito menos um maná, mas sim uma mera proibição, isto é, a proibição de contratar alguém por um valor menor do que o estipulado pelo governo.

Com efeitos, milhares ou milhões de pessoas que hoje dependem de uma despesa governamental, como o bolsa-família, ou que sobrevivem de bicos ou no comércio informal, poderiam estar empregadas por qualquer valor inferior ao atual, imediatamente transformando-se de problema em solução.

Se os contratos de trabalho fossem livres, virtualmente não existiria o desemprego, e uma maior taxa de emprego naturalmente empurraria o valor dos salários para cima, de acordo com a velha e boa lei econômica natural da oferta e da procura.

Ao estipular uma seqüência de reajustes para o valor para o salário mínimo superiores ao aumento da produtividade, o custo do trabalho aumenta, e por conseguinte, também os preços aos consumidores, que ora bolas, afinal de contas são os próprios trabalhadores. A conseqüência disto será um aumento de desempregados, para quem a inflação, digamos alegoricamente, é de 1000% ao mês.

Não existe riqueza produzida por decreto. Esta se produz com uma combinação equilibrada de poupança, trabalho e investimentos. Eis a razão pela qual um americano possui uma renda cinco vezes maior do que a do brasileiro: sua produtividade é proporcional ao seu salário, e o resultado feliz de uma economia livre se mostra por uma abundância de produtos mais baratos e salários que aumentam de poder aquisitivo progressivamente.

A atual política de reajustes indexados do SM fará com que a moeda sofra uma implosão (desvalorização) mais cedo ou mais tarde, trazendo o poder de compra dos trabalhadores a um nível ainda inferior ao de antes da implementação de tal funesta medida. Isto já está começando a ser verificado.
Por:  KLAUBER CRISTOFEN PIRES | 07 MAIO 2014 


domingo, 18 de maio de 2014

PRIVATIZARAM A PETROBRÁS

Dilma Rousseff falou grosso. Declarou que considera “inadmissível” a privatização da Petrobras. Com toda a bravura do seu gesto, a presidente, infelizmente, está atrasada. A Petrobras já foi privatizada.


A maior empresa brasileira pertence hoje, majoritariamente, a um consórcio de franco-atiradores que prosperaram no seio do governo popular. Se não, vejamos: uma empresa que, numa única transação, transfere a terceiros mais de 500 milhões de dólares, a fundo perdido, de patrimônio público, é uma empresa dos brasileiros?

Poderia ser. Mas, e se essa empresa perde metade do seu valor de mercado sob um governo que asfixia seus preços para mascarar a inflação? Considerando-se que, em tal manobra, essa empresa foi utilizada por um grupo partidário para se perpetuar no poder, ela está servindo aos brasileiros? Quais brasileiros?

E se um grupo de fornecedores e intermediários investigados pela Polícia Federal, com contratos suspeitos com essa empresa, faturou mais de 30 bilhões de reais nos últimos dez anos? Você ainda acha que essa empresa é sua? Tudo bem, talvez você ache que o Land Rover do Silvinho Pereira também é seu. Aliás, agora você tem também o Land Rover do ex-diretor da empresa Paulo Roberto Costa, presente do doleiro Alberto Youssef. Pode escolher com qual dos dois você não levará sua mãe para passear no dia dela.

Segundo a Polícia Federal, o esquema centralizado por Costa, que está preso, funciona desde 2004. Era o segundo ano do governo Lula, e a nova presidente do Conselho de Administração da Petrobras era Dilma Rousseff. Nesses dez anos, floresceram os negócios do doleiro Youssef, regendo uma formidável orquestra de contratos superfaturados, propinas e dinheiro de graça para políticos amigos do povo. Um deles era André Vargas, que o PT de Dilma tirou do anonimato e aninhou na vice-presidência da Câmara dos Deputados, nada menos. O governo popular sabe valorizar um bom engenheiro de prospecção de dólares. O petróleo é deles.

Aí vem a oposição pedir a CPI da Petrobras. Pura inveja. Choro de quem não participou desse bem-sucedido processo de privatização. Muitos não entenderam por que, em meio às revelações sobre lucrativos negócios privados com esse doce de mãe que é a Petrobras, Dilma veio falar que não admite a privatização da empresa. Alguns acharam até que a presidente estivesse esclerosada, respondendo a coisas que ninguém perguntou. Nada disso. Pensando bem, a lógica de Dilma está perfeita: é inadmissível privatizar algo que já foi privatizado.

Lula e Dilma escalaram Renan Calheiros para barrar a CPI da Petrobras, ou, pelo menos, sabotá-la. É a pessoa certa no lugar certo. O presidente do Senado entende dessa matéria de prospecção de vantagens privadas à sombra do Estado (já provou que um eficiente servidor da nação não deixa ex-namorada sem pensão). E o cenário político é o melhor possível para barrar essa tentativa de fuxicar a petrolífera dos companheiros. Os novos manifestantes e revolucionários urbanos, que, segundo se lê por aí, vieram vocalizar um poderoso anseio de mudança, não estão nem aí para a CPI da Petrobras. O governo popular está cozinhando o assunto há dois meses, tranquilo, sem nenhum ninja, mascarado ou tranca-rua para lhe causar nem um sorriso amarelo.

O Brasil está satisfeito com o padrão petista de concubinato estatal (em comunhão de bens). A privatização do Banco do Brasil pelo valerioduto, por exemplo, encheu o PT de dinheiro público e foi saudada pela nação com a reeleição de Lula. A entrega do PAC à conexão Delta-Cachoeira foi chancelada com aprovação recorde a Dilma em 2012. A CPI do Cachoeira, aliás, não levou às ruas um gato pingado com cartolina de protesto. A mulher do bicheiro virou musa, e a farra dos superfaturamentos no Ministério dos Transportes retornou no ano seguinte, nova em folha. A CPI da Copa, que trataria da privatização do BNDES na jogada dos estádios bilionários, foi engavetada pelo Congresso — sem nenhuma alma penada gritando que não vai ter Copa.

É claro que, com todas essas privatizações estatais do governo popular, está ficando difícil fechar as contas públicas (mesmo com a maquiagem contábil). Mas não tem problema. O ministro da criatividade fazendária, Guido Mantega, já anunciou que pode haver um aumento de impostos sobre bens de consumo. Perfeito. O contribuinte precisa ser chamado a completar o caixa, porque os sócios de Youssef não podem morrer de fome.

Agindo assim, o governo Dilma está em consonância com a coqueluche mundial dos progressistas, o best-seller “O capital no século XXI” — obra de mais um autor da bondosa esquerda francesa. Basicamente, ele propõe mais impostos para quem consegue juntar dinheiro. É isso aí. Preservem Youssef, Rousseff e demais companheiros do povo. Como diria Thatcher, o socialismo será eterno enquanto durar o dinheiro dos outros.
Por: Guilherme Fiuza é jornalista. Publicado em O Globo


PAREM DE TENTAR MUDAR O MUNDO!

“O mundo seria melhor se não houvesse tanta gente prometendo melhorá-lo”.


Karl Marx teria dito que o importante não era compreender o mundo, mas transformá-lo. Assim, da juventude irresponsável mal escapamos e já somos cooptados em universidades e outros locais muito respeitáveis a nos dedicarmos a única coisa considerada realmente importante na vida: mudar o mundo. É como se todos os erros e misérias do mundo estivessem ali, durante milênios, esperando apenas por nós para serem submetidos às nossas elegantes soluções. Não, nada do bom e velho senso comum, cheio de seus preconceitos tacanhos, nem das experiências tradicionais consagradas pelos séculos. O que são essas coisas diante do ímpeto a serviço de um mundo melhor?

Convictos que há algo muito errado nas engrenagens do cosmos, os revolucionários arremetem por aí contra as muralhas dos costumes acumulados sem se perguntar a quem interessa toda essa revolução. Para que conhecer a realidade se podemos mudá-la?

Um exemplo desse ímpeto. Logo nos primeiros dias de aula do meu curso de Direito, um professor de filosofia usou um método aparentemente inocente para “estimular o pensamento crítico”. Disse que estava ali para trocar conhecimentos conosco, para participar e que não era professor nem nada. Pediu-nos que fizéssemos um círculo com nossas cadeiras, coisa mais apropriada ao “debate” e disparou: “me digam, o que vocês acham da situação do mundo?”, ou alguma coisa assim. Os jovens alunos saíram um a um a apontar as coisas mais absurdas, e a notar como o mundo precisava mesmo ser corrigido.

No entanto, se repararmos bem, mudar o mundo não é coisa assim tão simples. A história está repleta de episódios mostrando alterações programadas com essa finalidade e seus resultados desaguaram invariavelmente no agravamento dos mesmos problemas, e até na criação de inúmeros outros. Isso porque a engenharia social, nome da técnica dessa quimera, é usada pelos revolucionários sempre com uma camada extra de verniz de bons propósitos, escondendo o objetivo real que é a destruição da civilização como a conhecemos.

Basta ver exemplos recentes das propostas progressistas e bem-intencionadas: todas produziram resultados infinitamente piores que a opressão a qual visavam eliminar:

1. Combater a criminalidade violenta foi a desculpa usada para adoção do estatuto do desarmamento, uma campanha nacional que criminalizou de forma mais dura o porte ilegal de armas, instituindo um intenso programa de desarmamento voluntário da população. “De que forma?”, perguntavam atônitos todos que até concordavam que diminuir a criminalidade violenta seria necessário (quem poderia contrariar isso?). “Ora, os bandidos conseguem armas roubando-as de você, pessoa de bem. Se vocês não tiverem armas não as dão aos bandidos, já que usá-las é muito perigoso”. Qual foi o grande resultado da campanha do desarmamento? A criminalidade diminuiu? Não. Pelo contrário, a cada ano 50 mil pessoas morrem para confirmar a suspeita que somos o povo mais assassino do planeta. Os responsáveis pela engenharia do desarmamento sabiam disso, é claro. Sabiam que bandidos não compram armas em lojas e que num assalto dificilmente conseguem os fuzis e metralhadoras que tanto adoram, mas não podiam dizer claramente que seu objetivo era o desarmamento da população civil. Não admitiríamos jamais que o desarmamento nada tem a ver com criminalidade, mas com aumento do controle do estado sobre as famílias e indivíduos.

2. Soa elegante dizer que os adolescentes estão numa condição peculiar de desenvolvimento e, por isso, antes de puni-los por seus crimes, é necessário educá-los. A adoção do ECA foi celebrada como uma dessas grandes leis que transformaria a realidade de crianças e adolescentes em situação de risco. Passados alguns anos, nunca adolescentes foram tão assediados pelo crime como hoje, servindo a toda sorte de propósitos maléficos, chegando ao ponto de, em razão da completa irresponsabilidade, poderem se dar o direito de filmarem homicídios e crimes hediondos como troféus de sua genialidade. E o que fazem os defensores desse projeto fracassado? Alguém bateu no peito e disse mea culpa? Alguém ficou ao menos ruborizado? Na verdade não: o ECA é um sucesso, e o próximo passo, que vai resolver tudo é a proibição de pais aplicarem castigos físicos como forma de disciplina.

3. Os movimentos de sem-terras, responsáveis por boa parte da violência no campo no passado recente, tiveram destinados milhares e milhares de reais para reforma agrária. Nunca tantas fazendas foram desapropriadas. Nunca tantos assentamentos criados. E isso numa situação em que a esmagadora maioria da população brasileira já não vive mais no campo. A violência no campo diminuiu? Não, ao contrário: dissidências do próprio movimento agora afirmam que é hora de corrigir as desigualdades nas cidades, e que invasões em prédios urbanos passarão a fazer parte dos “meios de luta”. Nenhuma palavra foi ouvida dos defensores da reforma agrária.

4. Os cubanos desfrutavam de um país com uma das melhores economias das Américas e produziam uma literatura das melhores. Sob o pretexto de livrar Cuba da exploração externa e instaurar um regime de justiça social, os comunistas conseguiram transformar a ilha num gigantesco presídio, com níveis de miséria inigualáveis. Basta lembrar que as famílias possuem “libretas” para anotar a distribuição miserável, mas igualitária, de arroz e papel higiênico. Algum revolucionário arrependido? Não. A miséria antes provocada pela exploração americana agora é causada pelo embargo comercial. Das contradições óbvias ninguém se dá conta, pois o que importa é a luta por um mundo melhor.

Esses são breves exemplos, e dos mais leves, do problema da transformação da realidade por meio da engenharia social. Não é necessário mencionar que as maiores atrocidades dos dois últimos séculos foram cometidas em nome de um mundo melhor. Em todos os casos não se chegou a nenhuma solução, somente se avançou muito na produção de novos problemas, que demandarão, por sua vez, mais soluções e, assim, numa torrente viciosa, a sociedade vai sendo gradativamente destruída e transformada em outra coisa pior, conforme advertira Russell Kirk: “os ideólogos que prometiam a perfeição do homem e da sociedade converteram grande parte do mundo no século XX em um inferno terreno”.

Por isso, quando alguém lhe sugerir aquele conselho de Marx, responda com os dizeres de Olavo de Carvalho: “O mundo seria melhor se não houvesse tanta gente prometendo melhorá-lo”.
Por:  ODINEI DRAEGER 

FICÇÃO FAZ FALTA?

Como imprensa que ousa fazer oposição, Veja cumpre sua missão. Faz melhor trabalho que os partidos ditos de oposição, que mal ousam criticar Dilma e alimentam um medo sagrado de perder votos se criticam Lula. Pena que a revista, como meio de divulgação cultural, seja um desastre.

Já não lembro quando Veja fez a crítica de um filme que mereça ser visto. A redatora do setor, Isabela Boscow, prima por comentar o pior que o cinema produz, best-sellers idiotas tipo Batman, Homem Aranha, Superman, X-Man e bobagens outras transpostas dos quadrinhos.

Literatura, idem. Haja best-sellers ianques para enfiar na goela do leitor. Em sua penúltima edição, a revista traz um discutível ensaio sobre as excelências da ficção. No fundo, um gancho para divulgar “o maior fenômeno da atual literatura para jovens”, a um tal de John Green, ao qual dedica cinco páginas, que está em primeiro lugar em sua lista de mais vendidos e já vendeu 1,2 milhão de exemplares no Brasil. Quer dizer, não pode ser leitura que preste. Não o li nem vou ler. Em primeiro lugar, não leio best-sellers instantâneos, fabricados ao gosto do público. Curiosamente, as cinco páginas da reportagem citam obras do autor, mas nada dizem sobre nenhuma delas. Ficamos no escuro.

Em segundo lugar, desde jovem tomei distância dessa próspera indústria chamada literatura infanto-juvenil. Ou melhor, não que tomasse distância. Em meus dias de jovem, essa colossal indústria praticamente não existia. O mercado era suprido por gibis que, confesso, li com prazer. De certa forma, aprendi a ler com eles. Mas jamais deixei de lado o livro. Se gostava de ler Tarzan em quadrinhos, mais me interessavam os livros de Edgar Rice Burroughs, que deixavam espaço à imaginação. Muito viajei pelos pântanos de Par-Ul-Don e muitas vezes vibrei com o homem-macaco gritando kriagh bandolo tarmangani: matar o homem branco.

Vamos ao ensaio. Segundo Veja, a ciência comprova que a arte da ficção não é supérflua: está, ao contrário, profundamente arraigada na natureza humana e é necessária a ela. Até aí, nada a discordar. A humanidade repousa em ficções. A começar pela mais bem sucedida de todos os tempos, a idéia de Deus. É o personagem de ficção mais universal e conhecido já criado pela literatura. É invocado tanto por sábios e como por analfabetos. Seu nome está na boca de reis, governantes, como na de príncipes da Igreja ou criadores de seitas. É uma ficção peculiar, que sobrepaira a literatura e, ao contrário desta, que apenas propõe caminhos, é normativa e gera dogmas, leis e mesmo ética.

Outra coisa são as ficções não-religiosas, que não pretendem dominar as mentes de nenhum leitor. “não é mistério saber por que informações verdadeiras importam para nossa sobrevivência. Mas é bem mais desafiador, para a ciência, entender por que nos importamos com os dramas de mentirinha de personagens inventados”, diz Jonathan Gottschall, autor de The Storytelling Animal. Gottschall complica. Não é preciso apelar à ciência para encontrar explicações. Nos importamos com os dramas de mentirinha porque eles são bem melhor tecidos que a vida. A vida está cheia de momentos de monotonia, que são eliminados na ficção. (Não falo de Kafka ou Joyce, bem entendido). Todo grande personagem é tão bem construído que fascina – ou causa repulsa – bem mais que o homenzinho real.

Além disso, ao enfrentar uma ficção, o leitor tem de aceitar a convenção proposta pelo autor, a de que o personagem é alguém existente. Por exemplo, os romances de Tomas Mann ou Dostoievski. Hans Kastorp ou Settembrini, o príncipe Mishkin ou Rodion Romanovitch Raskolnikov não são pessoas que você vai encontrar no boteco da esquina. Suas intervenções são verdadeiros ensaios, que nada têm de um diálogo descompromissado. Se você não aceita a premissa de que tais digressões sejam naturais, você não entra na obra. 

Os personagens são hipóstases do autor, como diz Ernesto Sábato, e só um grande autor criará grandes personagens. Em um de seus ensaios sobre a condição do escritor, o escritor argentino apoia-se em Donne, quando este diz que ninguém dorme na carroça que o leva da prisão ao patíbulo e, no entanto, todos dormimos desde a matriz até a sepultura, ou pelo menos não estamos totalmente acordados. “Uma das grandes funções da literatura: despertar o homem que viaja rumo ao patíbulo”.

"A literatura, como toda arte, é uma confissão de que a vida não basta", escreveu Fernando Pessoa. A literatura pode nos fazer chorar ou rir, nos inspira solidariedade e sentimentos nobres, como também repulsa ou horror. A vida de homens como Alexandre, Schliemann, Fernão de Magalhães também. Mas quando lemos uma biografia destes vultos, estamos lendo uma espécie de ficção, na qual foram selecionados seus melhores momentos. 

Sim, a arte da ficção não é supérflua, como diz a reportagem de Veja. Só faltou dizer algo: a grande ficção, a boa literatura. Porque a ficção que a revista tem divulgado não faz falta nenhuma à humanidade.
Por Janer Cristaldo Do site: http://cristaldo.blogspot.com.br/


sexta-feira, 16 de maio de 2014

QUEM FICOU RICO COM OS PREJUÍZOS DA PETROBRÁS?

A 36 dias da abertura da Copa do Mundo, o futebol vai se tornando o assunto predominante no Brasil, embora as pesquisas de opinião pública sobre a disputa da Presidência continuem em voga. Então, talvez não seja de mau alvitre recorrer a lúcidos ensinamentos do futebol para aplicar na campanha eleitoral. Este é o caso da máxima dos treinadores que mais ganham campeonatos seguindo uma lição simples: "Em time que está ganhando não se mexe". Mas, com a importância cada vez maior dada ao marketing político nas democracias ocidentais, convém não esquecer o lema que está por trás de toda publicidade, seja comercial, seja religiosa, seja política, atribuído a Joseph Goebbels, o mago da propaganda do nazismo: "Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade".


Candidata obstinada à própria reeleição, a presidente Dilma Rousseff pode até não ter pensado nas duas sentenças, mas, na certa, as aplicou quando repetiu o mantra com que seu antecessor, padrinho e agora pedra no sapato Luiz Inácio Lula da Silva derrotou Geraldo Alckmin, em 2006, e ela própria adotou para manter José Serra à distância, em 2010. Há oito anos, aparentemente debilitado pela denúncia do mensalão, o ex-presidente foi ajudado por uma campanha subliminar insinuando que os tucanos privatizariam a Petrobrás. O efeito deletério da patranha em seu desempenho fez o oponente vestir uma jaqueta com logomarcas de estatais, entre elas a Petrobrás. Em vão: teve menos votos no segundo do que no primeiro turno e deu-se a reeleição. Há quatro anos, a falácia levou Serra às cordas e o poste de Lula venceu.

A decisão do eleitor diante da urna depende de muitas motivações e as vitórias petistas não podem ser atribuídas apenas à mentira que, de tão repetida, passou a ser dada como verdadeira. Mas, por via das dúvidas, em Minas, berço dela mesma e de seu maior empecilho à permanência no poder, Aécio Neves, a presidente assumiu como sua a profecia de que a oposição privatizará a Petrobrás ou trocará seu nome.

O problema dela e do Partido dos Trabalhadores (PT) é que o contexto mudou significativamente nesta eleição. Nas duas disputas anteriores, o salário-família para os mais pobres e a bonança econômica para os abonados amplificavam bastante a fé popular na pregação governista. E a Petrobrás propagava ótimas notícias e, consequentemente, excelentes razões para o eleitor não permitir alterações profundas na gestão da maior empresa do Brasil. A fantasia dos Emirados Árabes do Brasil tinha prefixo, hífen e nome: pré-sal - o sonho de mil e uma noites, que Sheherazade não tinha tido a ideia de contar ao rei persa Shariar, de um país disposto a gastar petrodólares em educação e saúde para o povo.

Sete anos após a revelação do sonho, o petróleo extraído da camada do pré-sal no fundo do Atlântico brasileiro continua sendo uma miragem. E, 60 anos depois do delírio de "o petróleo é nosso", a pérola mais preciosa do colar da rainha das estatais, com sua fortuna enterrada em subsolo brasileiro, chafurda na lama de chiqueiros ocupados por figurões do PT e seus aliados, suspeitos de terem dilapidado um patrimônio bilionário em "nebulosas transações". E pior: a pérola jogada aos porcos se desvalorizou vertiginosamente. No palanque em que tenta recuperar o prestígio perdido nas pesquisas de intenção de votos, a "gerentona" de Lula se apega ao truísmo de que a empresa vale hoje mais do que valia no tempo de Fernando Henrique. Este desocupou o trono há mais de 11 anos e continua sendo o parâmetro universal do PT.

Essa comparação sem lógica feita pela candidata não elimina, porém, duas constatações assustadoras de fiasco: em seu mandato, a empresa teve o patrimônio reduzido à metade e desabou do 12.º para o 120.º lugar no ranking do Financial Times. Ou seja: a contabilidade da petroleira foi ao fundo do mar, até o pré-sal, mas não extraiu petróleo para vir à tona.

A princípio, pensava-se que a gigante estatal seria vítima apenas da ingerência política que sangrou seus cofres mantendo o preço de derivados abaixo do custo para evitar a má influência da inflação na medição da preferência eleitoral pela chefe do governo em outubro que vem. Essa má gestão causou, segundo O Globo, um rombo de R$ 13 bilhões em outra estatal, a Eletrobrás, para permitir que a candidata à reeleição baixasse demagogicamente o preço da tarifa de luz.

Mas este não foi o único "malfeito", para usar o termo favorito da beneficiária número um do aparelhamento das empresas públicas pelo PT. A Polícia Federal (PF), que, pelo visto, não foi totalmente submetida ao aparelhamento amplo, geral e irrestrito dos companheiros, constatou na Operação Lava Jato que houve bandalheira. Ao que se saiba até hoje, a desventura em Pasadena, Texas, custou ao cidadão brasileiro, proprietário da Petrobrás, um prejuízo de US$ 2 bilhões. Dez vezes este "troco de pinga" sumiram na obra faraônica da Refinaria Abreu e Lima, bancada pelo público para agradar ao tirânico compadre venezuelano Hugo Chávez.

Governo e oposição acionaram o Supremo Tribunal Federal (STF) para resolver o impasse que adia a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o tema: esta exige uma comissão mista e aquele não abre mão de circunscrevê-la ao Senado para controlá-la. A presidente da petroleira, Graça Foster, oscila entre o "mau negócio", pondo o mico nas costas do antecessor, José Sérgio Gabrielli, e o "bom negócio à época", quando lembrada que a empresa é gerida por petistas e aliados há 12 anos. Investigar será o único jeito de saber quem embolsou o lucro, além do barão belga Frère, da Astra Oil. As compras de altíssimo risco das refinarias de Pasadena e Okinawa, os custos estratosféricos da de Abreu e Lima e as suspeitas associações na operação de três termoelétricas são a parte exposta do iceberg. Quem ficou podre de rico com o rombo dos prejuízos que a Petrobrás teve - eis a questão submersa.
Por: José Nêumanne é jornalista, poeta e escritor. Publicado em O Estado de S. Paulo


quinta-feira, 15 de maio de 2014

MULHERES VALEM U$ 12 NA NIGÉRIA

O Islã avança rumo a uma religiosidade cada vez mais pura e próxima às fontes. No norte da Nigéria, um homem que se diz líder do Boko Haram assume sequestro de mais de 200 adolescentes no norte da Nigéria. A organização – cuja tradução é “a educação ocidental é um pecado” - deseja fundar Estado islâmico no país e já teria matado mais de 3.000 pessoas. Segundo os jornais, os puros e duros islâmicos do grupo reivindicaram ontem o sequestro de 276 meninas de Chibok, no norte do país, ocorrido no dia 14 de abril. Em vídeo, o movimento prometeu tratar as adolescentes como escravas, vendê-las em países vizinhos e forçá-las a casar.


A mensagem foi lida por um homem que se identificou como Abubakar Shekau, líder do grupo radical. "Eu capturei suas meninas. Nós vamos vendê-las no mercado, por Alá. Alá diz que eu devo vendê-las. Ele me ordenou que as venda. Vou vender mulheres. Eu vendo mulheres". 

No vídeo, ele aparece usando uniforme militar e de pé diante de um veículo blindado e duas camionetes com metralhadoras. 

"Eu disse que a educação ocidental deve parar. Vocês, meninas, devem deixar a escola e se casar", acrescentou Shekau, que indicou manter as jovens como "escravas". 

Alguém ainda lembra de Malala Yousufzai? Aconteceu há pouco mais de um ano. As celebridades criadas pela mídia são tão fugazes que até eu, que escrevi sobre o assunto, não mais lembrava. 

Malala foi aquela estudante paquistanesa, de 16 anos, atacada com tiros na cabeça pelos talibãs por defender o direito de educação das meninas, que ganhou projeção mundial ao defender o óbvio. Em julho passado, foi aplaudida de pé na sede da ONU, onde pediu aos líderes mundiais que proporcionem educação compulsória e gratuita para todas as crianças. 

Ora, quem não quer educação gratuita e compulsória para as crianças? A fortuna de Malala foi viver em um país dominado por fanáticos muçulmanos e ter sido alvejada na cabeça. Suas conclamações nada têm de novo ou original. Até parece o papa pedindo preces pela paz. A ONU declarou a data de seu aniversário, 12 de julho, como Dia de Malala.

Ao discursar para líderes jovens de mais de 100 países, ela pediu "uma luta global contra o analfabetismo, a pobreza e o terrorismo". "Vamos pegar nossos livros e canetas", disse ela. "Eles são nossas armas mais poderosas. Uma criança, um professor, um livro e uma caneta podem mudar o mundo. Educação é a solução". 

Só que a fama súbita parece ter subido à cabeça da menina e inspirado sandices. Malala inaugurou em setembro passado, na Inglaterra, a maior biblioteca pública da Europa, na região central de Birmingham.

Com a mosca azul zumbindo sobre sua cabecinha adolescente, Malala desatou a dizer bobagens. “Não há arma mais poderosa do que o conhecimento nem maior fonte de conhecimento do que a palavra escrita. Canetas e livros são armas que derrotam o terrorismo”, disse Malala, que vive na cidade inglesa desde outubro, após ter sobrevivido ao atentado praticado por militantes do Talibã.

Que educação é a solução, isto não se discute. Que canetas e livros sejam armas que derrotam o terrorismo, isto é solene bobagem de jovem que melhor teria feito se inaugurasse a biblioteca em silêncio. Afinal, é um livro que está a base da opressão islâmica, da mesma forma que um livro oprime judeus e cristãos até hoje. Não por acaso, árabes, judeus e cristãos são chamados de povos do Livros. Livros libertam, sim. Mas podem muito bem oprimir. Todo movimento terrorista tem em sua base um livro.

Terrorismo não é achado de homens incultos, muito antes pelo contrário. Em meados do século XIX, surgiu na Rússia tzarista um pequeno manifesto intitulado O Catecismo do Revolucionário, escrito na Suíça e assinado por dois revolucionários russos, Serguei Guennadovich Netchaiev e Mikhail Bakunin. Este panfleto tem sido até hoje a cartilha que inspirou todo terrorismo do século seguinte, desde Lênin, Stalin, Yasser Arafat, George Habash, Wadi Haddad, Carlos, o Chacal, Che Guevara, Aloysio Nunes Ferreira, Lamarca, Marighella e Fernando Gabeira, etarras ou OLP. Entre milhares de outros, bem entendido. 

O atentado contra a menina provocou protestos ao redor do mundo, incluindo críticas da ONU e de potências ocidentais, assim como uma mobilização popular dentro do próprio Paquistão, ultrapassando as barreiras étnicas, religiosas e políticas do país. Malala foi indicada a premiações internacionais e recebeu o Prêmio Nacional da Paz, concedido pelo governo paquistanês, no ano passado.

Hoje, quem lembra de Malala? Mas o Islã avança, dizia. Há exatamente uma semana, eu comentava o projeto de lei que quer legalizar o casamento das meninas e o estupro conjugal no Iraque. Um de seus artigos permite que as crianças se divorciem a partir dos nove anos, o que significa que podem se casar antes desta idade. Outro prevê que uma mulher seja obrigada a ter relações sexuais com seu marido quando ele pedir. 

Tudo muito coerente com o Islã. Maomé – abençoado seja seu nome – não se casou com Aisha quando ela tinha seis e consumou o casamento aos nove? Se o profeta pode, por que não poderiam os crentes?

Os opositores ao projeto afirmam que representa um retrocesso em matéria de direitos da mulher e que pode agravar as tensões entre diferentes confissões do país. Os partidários do projeto de lei afirmam que o texto apenas regula práticas que já existem.

Segundo a imprensa nigeriana, Abubakar Shekau vendeu algumas das estudantes seqüestradas como esposas em mercados na fronteira com o Chade e Camarões, a US$ 12 (R$ 26). Perguntinha que me parece pertinente: qual mulher não é vendida no mundo árabe? Ou alguma muçulmana pode escolher namorado ou marido? Só que 12 dólares me parece muito barato. 

Os festivais de camelo de Riad, Arábia Saudita, atraem todos os anos milionários empresários árabes que pagam até US$ 5 milhões por um camelo.
Por: Janer Cristaldo Do site: http://cristaldo.blogspot.com.br/


quarta-feira, 14 de maio de 2014

ADEUS, PT

Tudo tem um começo e um fim, como poderia dizer o Marquês de Maricá. E o fim está próximo


A cinco meses da eleição presidencial é evidente o sentimento de enfado, cansaço, de esgotamento com a forma de governar do Partido dos Trabalhadores. É como se um ciclo estivesse se completando. E terminando melancolicamente.

A construção do amplo arco de alianças que sustenta politicamente o governo Dilma foi, quase todo ele, organizado por Lula no início de 2006, quando conseguiu sobreviver à crise do mensalão e à CPMI dos Correios. Naquele momento buscou apoio do PMDB — tendo em José Sarney o principal aliado — e de partidos mais à direita. Estabeleceu um condomínio no poder tendo a chave do cofre. E foi pródigo na distribuição de prebendas. Fez do Tesouro uma espécie de caixa 1 do PT. Tudo foi feito — e tudo mesmo — para garantir a sua reeleição. Parodiando um antigo ministro da ditadura, jogou às favas todo e qualquer escrúpulo. No jogo do vale-tudo não teve nenhuma condescendência com o interesse público.

A petização do Estado teve início no primeiro mandato, mas foi a partir de 2007 que se transformou no objetivo central do partido. Ter uma estrutura permanente de milhares de funcionários petistas foi uma jogada de mestre. Para isso foram necessários os concursos — que garantem a estabilidade no emprego — e a ampliação do aparelho estatal. Em todos os ministérios, sem exceção, aumentou o número de funcionários. E os admitidos — quase todos eles — eram identificados com o petismo.

Desta forma — e é uma originalidade do petismo —, a tomada do poder (o assalto ao céu, como diria Karl Marx) prescindiu de um processo revolucionário, que seria fadado ao fracasso, como aquele do final da década de 60, início da década de 70 do século XX. E, mais importante, descolou do processo eleitoral, da vontade popular. Ou seja, independentemente de quem vença a eleição, são eles, os petistas, que moverão as engrenagens do governo. E o farão, óbvio, de acordo com os interesses partidários.

Se no interior do Estado está tudo dominado, a tarefa concomitante foi a de estabelecer um amplo e fiel arco de dependência dos chamados movimentos sociais, ONGs e sindicatos aos interesses petistas. Abrindo os cofres públicos com generosidade — e que generosidade! — foi estabelecido um segundo escudo, fora do Estado, mas dependente dele. E que, no limite, não sobrevive, especialmente suas lideranças, longe dos recursos transferidos do Erário, sem qualquer controle externo.

O terceiro escudo foi formado na imprensa, na internet, entre artistas e vozes de aluguel, sempre prontas a servir a quem paga mais. Fazem muito barulho, mas não vivem sem as benesses estatais. Mas ao longo do consulado petista ganharam muito dinheiro — e sem fazer esforço. Basta recordar os generosos patrocínios dos bancos e empresas estatais ou até diretamente dos ministérios. Nunca foi tão lucrativo apoiar um governo. Tem até atriz mais conhecida como garota-propaganda de banco público do que pelo seu trabalho artístico.

Mas tudo tem um começo e um fim, como poderia dizer o Marquês de Maricá. E o fim está próximo. O cenário não tem nenhum paralelo com 2006 ou 2010. O desenho da eleição tende à polarização. E isto, infelizmente, poderá levar à ocorrência de choques e até de atos de violência. O Tribunal Superior Eleitoral deverá ser muito acionado pelos partidos. E aí mora mais um problema: quem vai presidir as eleições é o ministro Dias Toffoli – como é sabido, de origem petista, foi advogado do partido e assessor do sentenciado José Dirceu.

Se a oposição conseguir enfrentar e vencer todas estas barreiras, não vai ter tarefa fácil quando assumir o governo e encontrar uma máquina estatal sob controle do partido derrotado nas urnas. As dezenas de milhares de militantes vão — se necessário — criar todo tipo de dificuldades para a implementação do programa escolhido por milhões de brasileiros. Aí — e como o Brasil é um país dos paradoxos — será indispensável ao novo governo a utilização dos DAS (cargos em comissão). Sem eles, não conseguirá governar e frustrará os eleitores.

Teremos então uma transição diferente daquela que levou ao fim da Primeira República, em 1930; à queda de Vargas, em 1945; ou, ainda, da que conduziu ao regime militar, em 1964. Desta vez a mudança se dará pelo voto, o que não é pouco em um país com tradição autoritária. O passado petista — que imagina ser eterno presente — terá de ser enfrentado democraticamente, mas com firmeza, para que seja respeitada a vontade das urnas.

É bom não duvidar do centralismo democrático petista. Não deve ser esquecido que o petismo é o leninismo tropical. Pode aceitar sair do governo, mas dificilmente sairá do aparelho de Estado. Se a ordem de sabotar o eleito em outubro for emitida, os militantes-funcionários vão segui-la cegamente. Claro que devidamente mascarados com slogans ao estilo de “nenhum passo atrás”, de “manter as conquistas”, de impedir o “retorno ao neoliberalismo”. E com uma onda de greves.

A derrota na eleição presidencial não só vai implodir o bloco político criado no início de 2006, como poderá também levar a um racha no PT. Afinal, o papel de Lula como guia genial sempre esteve ligado às vitórias eleitorais e ao controle do aparelho de Estado. Não tendo nem um, nem outro, sua liderança vai ser questionada. As imposições de “postes”, sempre aceitas obedientemente, serão criticadas. Muitos dos preteridos irão se manifestar, assim como serão recordadas as desastrosas alianças regionais impostas contra a vontade das lideranças locais. E o adeus ao PT também poderá ser o adeus a Lula.
Por: Marco Antonio Villa PUblicado em: O Globo


DOM SEBASTIÃO VOLTOU

Luiz Inácio Lula da Silva tem como princípio não ter princípio, tanto moral, ético ou político. O importante, para ele, é obter algum tipo de vantagem. Construiu a sua carreira sindical e política dessa forma. E, pior, deu certo. Claro que isso só foi possível porque o Brasil não teve – e não tem – uma cultura política democrática. Somente quem não conhece a carreira do ex-presidente pode ter ficado surpreso com suas últimas ações. Ele é, ao longo dos últimos 40 anos, useiro e vezeiro destas formas, vamos dizer, pouco republicanas de fazer política.


Quando apareceu para a vida sindical, em 1975, ao assumir a presidência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, desprezou todo o passado de lutas operárias do ABC. Nos discursos e nas entrevistas, reforçou a falácia de que tudo tinha começado com ele. Antes dele, nada havia. E, se algo existiu, não teve importância. Ignorou (e humilhou) a memória dos operários que corajosamente enfrentaram – só para ficar na Primeira República – os patrões e a violência arbitrária do Estado em 1905, 1906, 1917 e 1919, entre tantas greves, e que tiveram muitos dos seus líderes deportados do País.

No campo propriamente da política, a eleição, em 1947, de Armando Mazzo, comunista, prefeito de Santo André, foi irrelevante. Isso porque teria sido Lula o primeiro dirigente autêntico dos trabalhadores e o seu partido também seria o que genuinamente representava os trabalhadores, sem nenhum predecessor. Transformou a si próprio – com o precioso auxílio de intelectuais que reforçaram a construção e divulgação das bazófias – em elemento divisor da História do Brasil. A nossa história passaria a ser datada tendo como ponto inicial sua posse no sindicato. 1975 seria o ano 1.

Durante décadas isso foi propagado nas universidades, nos debates políticos, na imprensa, e a repetição acabou dando graus de verossimilhança às falácias. Tudo nele era perfeito. Lula via o que nós não víamos, pensava muito à frente do que qualquer cidadão e tinha a solução para os problemas nacionais – graças não à reflexão, ao estudo exaustivo e ao exercício de cargos administrativos, mas à sua história de vida.

Num país marcado pelo sebastianismo, sempre à espera de um salvador, Lula foi a sua mais perfeita criação. Um dos seus “apóstolos”, Frei Betto, chegou a escrever, em 2002, uma pequena biografia de Lula. No prólogo, fez uma homenagem à mãe do futuro presidente. Concluiu dizendo que – vejam a semelhança com a Ave Maria – “o Brasil merece este fruto de seu ventre: Luiz Inácio Lula da Silva”. Era um bendito fruto, era o Messias! E ele adorou desempenhar durante décadas esse papel.

Como um sebastianista, sempre desprezou a política. Se ele era o salvador, para que política? Seus áulicos – quase todos egressos de pequenos e politicamente inexpressivos grupos de esquerda -, diversamente dele, eram politizados e aproveitaram a carona histórica para chegar ao poder, pois quem detinha os votos populares era Lula. Tiveram de cortejá-lo, adulá-lo, elogiar suas falas desconexas, suas alianças e escolhas políticas. Os mais altivos, para o padrão dos seus seguidores, no máximo ruminaram baixinho suas críticas. E a vida foi seguindo.

Ele cresceu de importância não pelas suas qualidades. Não, absolutamente não. Mas pela decadência da política e do debate. Se aplica a ele o que Euclides da Cunha escreveu sobre Floriano Peixoto: “Subiu, sem se elevar – porque se lhe operara em torno uma depressão profunda. Destacou-se à frente de um país sem avançar – porque era o Brasil quem recuava, abandonando o traçado superior das suas tradições…”.

Levou para o seu governo os mesmos – e eficazes – instrumentos de propaganda usados durante um quarto de século. Assim como no sindicalismo e na política partidária, também o seu governo seria o marco inicial de um novo momento da nossa história. E, por incrível que possa parecer, deu certo. Claro que desta vez contando com a preciosa ajuda da oposição, que, medrosa, sem ideias e sem disposição de luta, deixou o campo aberto para o fanfarrão.

Sabedor do seu poder, desqualificou todo o passado recente, considerado pelo salvador, claro, como impuro. Pouco ou nada fez de original. Retrabalhou o passado, negando-o somente no discurso.

Sonhou em permanecer no poder. Namorou o terceiro mandato. Mas o custo político seria alto e ele nunca foi de enfrentar uma disputa acirrada. Buscou um caminho mais fácil. Um terceiro mandato oculto, típica criação macunaímica. Dessa forma teria as mãos livres e longe, muito longe, da odiosa – para ele – rotina administrativa, que estaria atribuída a sua disciplinada discípula. É um tipo de presidência dual, um “milagre” do salvador. Assim, ele poderia dispor de todo o seu tempo para fazer política do seu jeito, sempre usando a primeira pessoa do singular, como manda a tradição sebastianista.

Coagir ministros da Suprema Corte, atacar de forma vil seus adversários, desprezar a legislação eleitoral, tudo isso, como seria dito num botequim de São Bernardo, é “troco de pinga”.

Ele continua achando que tudo pode. E vai seguir avançando e pisando na Constituição – que ele e seus companheiros do PT, é bom lembrar, votaram contra. E o delírio sebastianista segue crescendo, alimentado pelos salamaleques do grande capital (de olho sempre nos generosos empréstimos do BNDES), pelos títulos de doutor honoris causa (?) e, agora, até por um museu a ser construído na cracolândia paulistana louvando seus feitos.

E Ele (logo teremos de nos referir a Lula dessa forma) já disse que não admite que a oposição chegue ao poder em 2014. Falou que não vai deixar. Como se o Brasil fosse um brinquedo nas suas mãos. Mas não será? Por: Marco Antonio Villa – O Estado de S.Paulo




terça-feira, 13 de maio de 2014

A UNIVERSIDADE É UM GALINHEIRO ONDE RAPOSAS VELHAS VÃO CAÇAR

Há pessoas com admirável poder de síntese. Frei Betto é um deles. Conseguiu resumir um amontoado de besteiras em uma curta frase, ao afirmar em um evento na UFRGS: “Não sei por que se fala do fracasso do socialismo na Europa e não se fala do fracasso do capitalismo no ocidente”. Em duas linhas, o frei consegue vários milagres:


1 – confunde social-democracia com comunismo;
2 – identifica Rússia e Leste europeu com Europa;
3 – exclui a Europa do Ocidente;
4 – equipara uma teoria utópica, totalitária e imposta por um Estado ditatorial com um sistema econômico que emerge espontaneamente em uma sociedade como resposta às suas necessidades.

Amontoado de besteiras, dizia eu. Melhor diria amontoado de safadezas. Frei Betto não é um jovenzinho imberbe de cabeça em cujo oco se joga qualquer lixo, mas raposa peluda, autor de mais de meia centena de livros, que sabe como seduzir galinhas.

Fracasso do capitalismo? Onde? A economia capitalista — ou neoliberal, como agora se convencionou chamar — vai bem, obrigado. Ou alguém pretende que a Europa seja socialista? Houve época em que, para enganar a clientela, os jornalistas de esquerda identificavam as sociais-democracias européias com o socialismo soviético. “A Europa caminha para o socialismo, é para lá que o mundo desenvolvido vai”, era o que pretendiam dizer. Mas antes que o jogo de palavras fizesse fortuna, a URSS afundou.

Depois da queda do Muro de Berlim, o Leste europeu virou Europa. Há mais de dez anos, um leitor de Estocolmo contestava uma de minhas crônicas, com veemência. Que na Europa há miséria, sim senhor: “a Romênia tem muitos meninos de rua, sem contar a Rússia, Albânia. Vi muita pobreza em Portugal, Espanha, Alemanha, Holanda, Bélgica, Inglaterra. Até aqui em Estocolmo tem mendigo”.

Vamos por partes. Há mais de vinte anos, havia uma Europa e um Leste europeu perfeitamente distintos. No Leste, universo socialista – ou seja, comunista – estavam os países da União Soviética onde, por definição, não havia desemprego nem greves ou conflitos trabalhistas. Muito menos miséria, mendigos, meninos de rua, estas mazelas decorrentes dos regimes capitalistas da velha Europa. Com a queda do Muro e o desmantelamento da URSS, a miséria oculta dos regimes socialistas veio à tona.

De repente, a Rússia, Albânia ou Romênia passaram a fazer parte da Europa. Há mendigos morrendo de frio em Moscou? FRIO MATA MENDIGOS NA EUROPA — dizem as manchetes. Quem só costuma ler as primeiras páginas nos quiosques ou zapear TV já passa a imaginar mendigos morrendo nas ruas de Paris, Londres, Berlim. Os jornalistas são hábeis em matéria de trocar sinais. As misérias herdadas de sete décadas de tirania socialista passam agora a ser debitadas à Europa. O mesmo faz frei Betto. O leitor menos avisado, que desconhece a arte de manipular conceitos, acaba caindo nos sofismas diariamente repetidos pela grande imprensa. Nesta época televisiva, ninguém mais lembra que Dostoievski passou a vida toda bradando, ao falar dos russos: não somos Europa.

O que é Europa? À primeira vista, a resposta é fácil. É aquele continente que de sul a norte vai da Grécia até a Escandinávia e de leste a oeste vai de Portugal à Áustria. É o que um dia chamamos de a Europa dos Quinze: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Grécia , Irlanda, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal, Reino Unido e Suécia. Há uns bons vinte anos, tive acirrada discussão com um desses jornalistas que quando vão ao Uruguai acham que já estão no estrangeiro. Ele, como bom comunista, defendia a tese de que a Rússia era Europa.

Ora, nada mais anti-europeu que a Rússia. Em um discurso em homenagem a Pushkin, Dostoievski já se perguntava: “O que tem feito a Rússia durante dois séculos senão servir mais à Europa do que a si mesma?” Durante toda sua vida, o escritor católico russo sustentou que “nós, russos, não somos europeus”. Mas e a plataforma continental européia? – insistia o jornalista. Ora, plataforma pertence à área da geografia. E a definição de Europa não é geográfica, mas política e cultural.

Antes de ser acidente geográfico, Europa é um conceito político, até hoje em construção. Juridicamente, a Europa era configurada pelo Acordo de Maastricht, que criou a União Européia, por sua vez baseada na Comunidade Européia. Neste espaço não se incluíam nem a finada União Soviética, nem os países do Leste Europeu, assim denominados justamente por não pertenceram ao que, politicamente, se considerava Europa. Isto é, a Europa dos Quinze. Que pressupunha democracia, sistema que a coitada da Rússia até hoje, mesmo após o desmoronamento da URSS, não conhece. Do tzarismo caiu no comunismo. Morto o comunismo, caiu nas mãos das máfias e de Putin.

Que mais não seja, diz-nos a Enciclopédia Britânica: “Geógrafos modernos tratam a antiga União Soviética como uma unidade territorial distinta, comparável a um continente, separada da Europa ao oeste e do resto da Ásia ao sul e ao leste. Esta distinção indubitavelmente deve ser mantida para a Rússia, que ocupa três quartos da União Soviética”.

Propus ao jornalista minha definição de Europa. No final dos 70, voltando de uma viagem da ex-Iugoslávia para a França, reservei um assento em uma cabina no trem Skopje/Belgrado. Escolhi uma cabina vazia e peguei assento na janela: se não dormisse, poderia praticar esse esporte que tanto me apraz, ver florestas, montanhas e neves desfilando ante meus olhos. Mal sentei, entrou o cobrador, seguido de uma prolífica família de iugoslavos. Junto com o cobrador, vinha um policial - acompanhado de um cão da mesma raça - com uma submetralhadora em punho. O cobrador mandou-me sair da cabina.

Ingênuo e indefeso, eu exibia meu bilhete, mostrava o número nele e no assento, tentava explicar em todas as línguas que conhecia que tinha direito àquele lugar. Lacônico, o homem da submetralhadora me indicou a porta com o cano da arma. Que fazer ante tão sólida argumentação? Evidentemente, eu não estava mais na Europa. Iugoslávia, já em seu étimo, quer dizer eslavos do Sul.

Ao falar de fracasso do socialismo na Europa e fracasso do capitalismo no ocidente, o frei exclui a Europa do Ocidente. Onde ficará então o Ocidente? Na Sibéria? Na Mongólia? É espantoso que um público universitário ouça uma sandice destas sem vaiar o palestrante. Se bem que quase nenhum universitário hoje, seja professor ou aluno, saiba dizer o que ocorreu em 9 de novembro de 1989.

Concluindo: o orgânico não precisa ser organizado. Não é permissível comparar um sistema artificial, distanciado do real, nascido de uma teoria utópica, com uma economia que surge espontaneamente, decorre da própria natureza humana e hoje é almejada por todos os países que um dia foram comunistas. Capitalismo não tem profeta, não tem livro nem é imposto, manu militari, por Estados ditatoriais. Há teorias sobre o capitaliso? Há. São teorias que tentam explicá-lo, não teorias que surgem do nada para criar um modelo de organização social. 

La universidad es un acuário, donde las nenas ván pescar – dizem os espanhóis. Chez nous, é um galinheiro onde raposas velhas vão caçar.
Por: Janer Cristaldo Dos site: http://cristaldo.blogspot.com.br/


segunda-feira, 12 de maio de 2014

PRONTUÁRIO DE INTERNAÇÃO

Tudo mundo declara ser uma cândida alma preocupada com a educação. É coisa linda de ver. Todavia, o que torna a situação esquisita é vermos que essas ilações de salão não apresentam fruto algum. E não dão porque essas encenações não passam de pose de bom-mocismo afetado de sujeitos que, no fundo, nunca tiveram nem mesmo apreço pela sua própria educação.

Se não, vejamos: façamos um breve exame de nossa ação educadora. Todos, gostemos ou não, somos pontos irradiadores duma conduta humana possível. Podemos até nos desagradar com essa idéia, porém, mesmo assim, a nossa maneira de viver é um ícone do que um infante deve fazer para ser reconhecido como um adulto.

Vale lembrar que tanto adultos como infantes, têm uma relativa dificuldade em concentrar-se numa contínua, ou fragmentária, exposição oral. Alguns se dedicam na ampliação dessa capacidade; outras tantos não estão nem aí para o borogodó. Até reconhecem a existência do problema, mas não têm coragem, nem vontade, de enfrentá-lo. Entretanto, os exemplos, tanto os dramáticos como os rotineiramente repetidos, calam, profundamente, em nossa alma tornando claras as questões que doutra forma teríamos dificuldade de aprender.

Dito isso, permitam-nos levantar uma magra lebre: imaginemos um indivíduo devidamente diplomado. Esse sujeito, por ventura, costuma ler com freqüência quando está em sua casa em seus momentos de lazer? Seus filhos, sobrinhos e demais pequenos de seu círculo de convívio, o flagram deitando suas vistas, alegremente, num livro? Será que ele tem o costume de ler para os seus?

Mesmo assim, provavelmente, o sujeito deve comprar livrinhos para os pequenos e cobrar deles o amor a leitura que nunca lhes foi demonstrado através de gesto algum, diga-se de passagem.

Enfim, se fôssemos francos, reconheceríamos que damos pouquíssima atenção para eles, ao mesmo tempo em que exigimos que a sociedade lhes dê aquilo que recusamo-nos regalar àqueles que dizemos amar.

Sem mais delongas, executemos duma vez esse lebrão: o que fazemos em nossos momentos de ócio? Bem aquilo que nossos filhos vêem. Atividades que fazemos com gosto e alegria descontrolada e que pouco tem haver com educação. E, por essas e outras, não me empolgo nem um pouquinho com todo esse amor pela educação que é apresentado, publicitariamente ou não, em nossa sociedade que, infelizmente, hoje, mais do que nunca, faz do fingimento a instituição cívica número um, reduzindo o amor ao conhecimento a uma esquisitice digna de internação. Fazer o quê?

Por:  DARTAGNAN DA SILVA ZANELA  http://zanela.blogspot.com

DIVIDIR E CONQUISTAR

Por que Vladimir Putin iria, propositalmente, soar o alarme enquanto posa de defensor dos valores “conservadores” e “tradicionais”? A ingenuidade dessa fraude deveria ser óbvia. Todos estão desorientados ao mesmo tempo.


Pedi recentemente a um amigo jornalista polonês que expusesse suas ideias sobre a atual crise que ocorre na Ucrânia. A resposta dele pode ser dividida em cinco partes:

(1) Os ucranianos estão lutando contra a versão corrupta do dito capitalismo russo; 

(2) A Rússia está tentando fazer parecer que a Ucrânia não é um Estado;

(3) Putin está reconstruindo o império da União Soviética e estendendo a influência de Moscou sobre setores econômicos específicos;

(4) O derradeiro objetivo de Moscou é expulsar completamente os Estados Unidos do território europeu usando uma nova ideologia antiamericana;

5) Enquanto isso, Moscou conta fortemente com a prontidão do Ocidente em se comprometer totalmente com o objetivo de preservar o acesso que possui ao mercado russo.

Há verdade no que diz meu colega polonês. O principal ponto dentre esses é a intenção de expulsar os Estados Unidos para fora da Europa. Esse era um objetivo soviético de antes de 1991 e continua imutável nos dias de hoje. Em parte, a ameaça de guerra na Ucrânia está sendo usada para produzir um racha na Europa; falar de sanções econômicas também tem o mesmo efeito. Enquanto alguns políticos priorizam o apoio à soberania ucraniana, como é o caso dos EUA e Grã-Bretanha, que estão obrigados pelo Memorando de Budapeste, outros políticos vêem como algo ridículo ter de sacrificar seus próprios interesses econômicos constituídos em prol de um país que esteve sob a guarda russa por séculos. Além disso, muitos estão chegando à conclusão que Washington é responsável por tumultuar as coisas na Ucrânia, e que os interesses europeus estão mais intimamente ligados aos da Rússia. Indiscutivelmente, esse é o objetivo imediato da tomada da Crimeia: dividir a Europa, dividir a OTAN, isolar a América da Europa, e demonstrar a necessidade que a Europa tem por aquilo que os oficiais russos chamam de “uma nova arquitetura de seguridade”.

Talvez o incidente mais danoso em se tratando das tentativas de Moscou de separar a América da Europa deu-se na publicação de uma conversação telefônica entre a secretária de Estado adjunta, Victoria Nuland, e o embaixador americano na Ucrânia, Geoffrey Pyatt, que ocorreu antes da queda do presidente ucraniano Yanukovych. Do ponto de vista moscovita, essa conversa entre Nuland e Pyatt caiu como uma luva. Ela dá a impressão que os oficiais americanos estão orquestrando a oposição ucraniana por debaixo dos panos. A seguir, um excerto da conversação entre Nuland e Pyatt:

Nuland: O que você tem em mente?

Pyatt: Penso que estamos na jogada. O caso de Klitschko é obviamente o que há de complicado aqui, especialmente após o anúncio dele como vice-primeiro-ministro. Além disso, você viu algumas das minhas observações sobre questões de uniões que existem agora, então estamos tentando fazer uma leitura rápida sobre onde ele está nessa coisa toda. Mas penso que a argumentação que usará na conversa com ele na próxima ligação telefônica que você fizer, terá de ser a mesma que você usou com Yats [Arseniy Yatseniuk] e estou grato que você colocou-o exatamente no lugar ao qual ele mais se adequa nessa situação. E também estou satisfeito com o que ele disse em resposta.

Nuland: Que bom. Então... penso que Klitsch não deveria aceitar o cargo no governo. É desnecessário. Não é uma boa ideia.

Pyatt: Sim, também acho, digo... em termos de ele não aceitar entrar no jogo governamental. Deixe-o ficar de fora e fazer sua lição de casa política e coisas do tipo. Estou apenas pensado em termos do tipo de processo que vem por aí e como nós queremos manter os democratas moderados unidos. O problema será Tyahnybok e seus comparsas, e eu estou certo de que isso é parte do que Yanukovych tem calculado nisso tudo.

Dado o poder e influência das estruturas da KGB na ex-República Soviética da Ucrânia, é improvável que esses inocentes diplomatas americanos tenham alguma ideia do que estão fazendo. Eles certamente não consideraram que seus telefones estavam grampeados. Na verdade, seus próprios sussurros são de conhecimentos do alto escalão em Moscou. Criaturas desamparadas a esse ponto não orquestram a derrubada de presidentes. Os oficiais da inteligência ucraniana declararam publicamente a conclusão de que o presidente Yanukovych não fugiu voluntariamente para a Rússia; Ele foi, na verdade, raptado pela GRU (Serviço de inteligência militar russo) e levado à Rússia como prisioneiro/boneco de ventríloquo.

Se isso parecer absurdo, será apenas porque o leitor não está familiarizado com o método político russo, isto é, provocação. Se a Revolução Ucraniana for uma provocação russa empreendida com o objetivo de rachar a OTAN, então podemos esperar encontrar evidências de que os russos criaram eles mesmos a Revolução Ucraniana. Devemos então esperar por um racha na OTAN, pois os russos jamais empreenderiam uma provocação a menos que eles a considerassem como algo muito provável de ser bem sucedido. Então não deveria nos surpreender quando a secretária de Estado adjunta Nuland conversa com o embaixador Pyatt (na conversa gravada) sobre correr por fora da União Europeia com a ONU. Ao mencionar isso, Nuland diz: “Então seria muito bom – penso eu – juntar isso e ter a ONU para ajudar e, sabe, foda-se a UE.”

Eu me desculparia por repetir a obscenidade de Nuland, mas estamos falando da declaração de uma oficial do alto escalão do Departamento de Estado dos EUA; como exemplo, isso evidencia uma crescente divergência de opiniões entre oficiais americanos e europeus em relação à crise ucraniana. Nuland estava obviamente irritada com os oficiais da UE, pois usar esse tipo de linguagem, mesmo que em particular, não pode significar que estamos falando de uma relação saudável. Os oficiais da inteligência russa que (muito provavelmente) gravaram as falas de Nuland estão parabenizando uns aos outros.

Retornando aos pensamentos do meu amigo polonês, ele ofereceu um aviso geral contra os auto-nomeadosexperts em assuntos russos. Esse aviso naturalmente diria respeito também a mim, embora eu não posso reivindicar ser expert no assunto. Segundo meu amigo, qualquer um que fale sobre um confronto militar com a Rússia está jogando o jogo russo. “Esses experts são provocadores”, disse meu amigo. “O clamor deles passa a ser o maná do céu para a propaganda russa, que faz todos os esforços para retratar o Ocidente como um lugar cheio de belicistas e cowboys irresponsáveis”. Esses provocadores podem estar tentando vender livros ou tentando escrever um blog – como eu estou tentando agora. No fim, eles estão no jogo da propaganda russa. É o que o Kremlin quer, pois se o Ocidente começar a demonizar a Rússia como país, o povo russo se alinhará aos chefões do Kremlin. Nesse caso, a ditadura na Rússia será reforçada em vez de enfraquecida.

“A imprensa ocidental nunca apoiou de verdade a verdadeira oposição russa”, observou meu amigo. Isso também é verdadeiro no caso da Ucrânia, onde os ativistas pela liberdade lutaram uma batalha solitária. Até mesmo Estados supostamente livres como a Polônia e a República Tcheca não estão totalmente livres das forças neocomunistas pró-Rússia (que estão em sua maioria no controle da economia, burocracia e do governo). Evidentemente, a mídia ocidental não dá a mínima para tudo isso. O Ocidente só exportou entretenimento estúpido e barato para a Polônia e para outras “ex” repúblicas soviéticas e ignorou o contínuo combate levado a cabo por Moscou a fim de manter existente um contingente controlado. Assim fomos enganados acerca da queda do comunismo. Não derrotamos o Império Soviético. Como afirmou meu amigo, “vale a pena lembrar que seja o que a Ucrânia tenha alcançado, foi contra a vontade política dos experts e políticos ocidentais”. Ele alerta também que “a Rússia não irá empreender uma guerra contra a Europa ou os Estados Unidos. Ela está apenas explorando a pobreza intelectual e a fraqueza estratégica... ou está contando com a inclinação do Ocidente em sempre ser transigente”.

Não estou certo do porquê ele diz que “a Rússia não irá empreender uma guerra...”. Tal guerra parece perfeitamente inevitável ao meu ver – e eu não sou nem um provocador e nem um belicista. Não obstante, é alarmante que, de repente, os idiotas úteis da Rússia no Ocidente estejam tomando uma posição mais beligerante contra a Rússia do que os conservadores. Sem dúvidas, em parte o que motiva a esquerda é a preocupação que eles têm com os direitos homossexuais. Ou será que somos cínicos o bastante para acreditar que todo o assunto homossexual é apenas uma falácia distrativa que serve como arma para dividir a direita em dois lados hostis um ao outro? Não é essa razão que faz com que conservadores econômicos e conservadores religiosos se digladiem e deixem de trabalhar juntos como fizeram outrora? E se considerarmos o quão vitoriosamente a esquerda faliu a América e como essa falência facilita o desarmamento americano, não deveríamos considerar todo o enfoque político da esquerda e da direita como vantajosos a Moscou?

Se alguém perceber o verdadeiro significado da campanha pelos direitos homossexuais ou a campanha para acabar com o aquecimento global ou a luta do feminismo como qualquer coisa além de um orquestrado ato de sabotagem contra o potencial de defesa do Ocidente, então esse alguém não entendeu nada e é um imbecil quando se trata de estratégia. Além do mais, a razão de toda essa sabotagem – que foi originalmente vislumbrada pelos comunistas – não é apenas enganação pela enganação. Quando o ato intermediário é enfraquecer a capacidade militar, significa que o fim é empreender uma guerra. E quando se empreende uma guerra, um lado quer que o outro seja culpado pela eclosão imediata de hostilidades. 

Anteriormente o Kremlin queria que todos os considerassem inofensivos. Por que Vladimir Putin iria, propositalmente, soar o alarme enquanto posa de defensor dos valores “conservadores” e “tradicionais”? A ingenuidade dessa fraude deveria ser óbvia. Todos estão desorientados ao mesmo tempo. Reiterando, é evidente que a estratégia russa é dividir a OTAN assim como o movimento conservador. O que importa se a esquerda de repente resolve demonizar Putin? Deixem que façam! Por favor! Ainda assim essa estratégia deve envolver um perigo muito real. Quando voltamos ao último outono e lembramos do desejo do presidente Obama em empenhar força militar na Síria e como isso foi evitado por meio da relutância dos nossos almirantes e legisladores, nós temos uma melhor noção do que a Rússia quer provocar agora. Eles querem que nós sejamos os agressores, para assim justificar um tipo de resposta armada. Novamente, isso sugere um desejo de empreender guerra.

Há uma lei de consequências não-intencionais operando na história que faz da guerra algo inevitável. De acordo com os sólidos princípios estratégicos, os estadistas deveriam empreender uma guerra apenas quando eles estivessem certos da vitória e que ela derramasse o mínimo possível de sangue. Ainda assim, a história nos oferece exemplos de guerras onde dezenas de milhões morreram em meio à ruína universal e o colapso econômico.

Apenas se admitirmos que os homens erram nos cálculos e as situações saem facilmente de controle é que podemos explicar os fatos históricos. Nesse contexto, não são os suecos que estão intencionalmente provocando um racha na Europa ao alertar para as preparações bélicas russas contra a Suécia. Nessa conjuntura, todo aquele que der o alerta para as intenções militares russas não são provocadores. Relatórios oficiais das preparações russas para invadir a Suécia envolvem a válida observação de um fenômeno efetivamente real, pois os estrategistas russos estão sempre sonhando com a guerra, se preparando para ela e acreditando nela. A Rússia atacou e engoliu seus vizinhos várias vezes. Por qual outra forma a Rússia teria se tornado o maior país da Terra? Certamente isso não se deu por meio de um processo pacífico. Francamente, quem pensar assim é um ignorante em história. O perigo russo não é imaginário e a ênfase que os russos deram no passado na guerra de informações não significa que eles estejam negligenciando os armamentos cinéticos. O Kremlin ataca seus inimigos em todos os níveis, usando todos os meios possíveis: economia, informação, religião, sociologia, cultura e até mesmo a parapsicologia. Mas sempre, e acima de tudo, os russos acreditam que o poder militar é a fundação de tudo. Sem poder militar, a guerra de informação, tão cara a eles, não passa de uma série de travessuras infantis. Apenas quando apoiada pelo poder militar é que a guerra de informações pode ser verdadeiramente efetiva, pois não se pode usá-la como uma multiplicadora de forças a menos que você tenha forças aptas a se multiplicar.

Por: Jeffrey Nyquist http://jrnyquist.com
Tradução: Leonildo Trombela Junior

domingo, 11 de maio de 2014

A ESCRAVIDÃO DA MULHER

A maior vítima do mundo moderno – fruto das revoluções Industrial e Francesa – foi indubitavelmente a mulher. A nova sociedade burguesa, separando o local de trabalho do de moradia, não apenas forçou as mulheres a uma dupla jornada, como as tornou duplamente prisioneiras. A casa, não mais um local de produção como nas eras agrárias anteriores, tornou-se uma gaiola onde se condena as mulheres a passar a vida espanando, varrendo e cuidando de um espaço ínfimo e fechado. Ao mesmo tempo, as que foram forçadas ao trabalho externo – predominantemente nas classes baixas – passaram a ter de abandonar os filhos e o lar para ajudar o marido a levar pão para casa.


Esta situação insustentável durou da virada do século 19 a meados do século passado, gerando o feminismo, solução errada para um problema real. Mulheres de classe média, desinteressadas por homens ao ponto de adotar como lema “a mulher precisa de um homem tanto quanto um peixe de uma bicicleta”, as primeiras líderes feministas esforçaram-se não por reconstruir um espaço para o feminino no mundo, mas por masculinizar a mulher.

Sua tacanha visão burguesa, limitada ao exíguo lar de classe média, fê-las ver com inveja a dupla escravidão da mulher de classe baixa e instar suas seguidoras a lançar-se ao famigerado “mercado de trabalho”, adotando, elas também, a dupla jornada.

Conseguiram. Hoje não apenas se espera que a mulher pobre seja forçada a um emprego tão pouco recompensador quanto operar o caixa de um supermercado, como se faz o mesmo com a mulher de classe média. Desde cedo ela é incentivada a procurar uma profissão rentável, a tornar-se uma profissional independente.

Ora, é tão trágico que a mulher seja independente como que o homem o seja. Um depende do outro. A interdependência do matrimônio, já ferida pela sociedade burguesa ao arrancar o homem do lar para ir ganhar o seu pão longe dele, sofreu um golpe ainda mais feroz. E este golpe é ainda mais doloroso, por ir contra as lealdades naturais da mulher. Um homem suporta, a contragosto, separar-se da família por todo o dia. Para uma mulher, abandonar seus filhos é negar sua razão de ser.

Urge aproveitar as oportunidades geradas pela sociedade pós-industrial para recriar a forma natural de produção, em que cada lar é uma sociedade não apenas de vida, como de produção e comércio. Maridos e mulheres, trabalhando juntos e educando os filhos na sua profissão, formam uma microssociedade muito mais feliz e realmente independente que qualquer delírio feminista.
Por: Carlos Ramalhete é professor. Publicado no jornal Gazeta do Povo





O GRANDE TRIPÉ E O PEQUENO

O Brasil não vai bem, a julgar pelos indicadores macroeconômicos, ainda mais quando se considera o prometido, ou o potencial. O crescimento é medíocre (e não há crises para servir como álibi), a inflação está perigosamente próxima de uma região muito escorregadia onde atolaram e afundaram alguns países vizinhos, e as contas externas e fiscais permanecem flagrantemente fora do lugar. Há problemas setoriais talvez explosivos (como no setor de energia, petróleo e também na mobilidade urbana), a produtividade estagnou há anos e a confiança do investidor (nacional e estrangeiro) atingiu os piores níveis em muitos anos.


Quem duvida que o governo perdeu a mão em matéria de macroeconomia?

A ideia que existe uma “matriz econômica alternativa”, como a crença na vida em outros planetas, costuma enclausurar-se num pequeno círculo de crentes e muito raramente é transportada para o terreno prático, onde invariavelmente fracassa. Muitos presidentes, por excesso de malícia ou ingenuidade, caíram nessa conversa, e aqui não foi diferente. A administração Dilma Rousseff experimentou o seu choque heterodoxo, mas não inovou em matéria macroeconômica, nem mesmo em contabilidade pública: os erros são todos velhos, assim como os efeitos especiais. Não há “nova matriz macroeconômica”, e a convicção das autoridades ao proclamá-la cria apenas uma ilusão de legitimidade. Como o juiz de futebol que marca pênalti inexistente, e antecipando-se às vaias, pune o defensor com cartão amarelo ou vermelho, fingindo uma certeza que todos sabem que ele não tem.

Mas por que tanta insistência em desafiar os consensos internacionais em macroeconomia?

Não me parece que esta ousadia tenha nascido das autoridades econômicas, cujas inclinações heterodoxas são bem conhecidas, exatamente como suas limitações. Os grandes pensadores heterodoxos exalam independência e descompromisso, atributos louváveis, mas que os afastam do encargo de formular soluções e de assumir responsabilidades. Talvez por isso mesmo a inflação brasileira nunca tenha tido um rosto, um defensor, alguém para responder perguntas simples sobre por que os preços sobem.

A “Nova Matriz” não pode ser vista senão como uma criatura do Planalto, e seus áulicos não escondem o intuito de antagonizar os “economistas do mercado financeiro”, e também todos os outros (ressalvadas as espécies ameaçadas), e também o FMI, as agências de risco, os especuladores em geral e, de lambuja, os conselhos do ex-presidente Lula, que conhece os economistas alternativos de outros carnavais.

É muito perigosa a ideia de uma política econômica, ainda mais uma “Nova Matriz”, cujo proprietário é o Palácio. Os riscos envolvidos são os costumeiramente discutidos no debate sobre independência do Banco Central. É ótimo quando o presidente pode atribuir à Autoridade Monetária certas políticas antipáticas das quais ele gostaria de se afastar. É péssimo quando o presidente se torna o dono das políticas, sobretudo quando elas não funcionam, e isso vale também para a política fiscal. Por isso mesmo, os presidentes costumam escalar simultaneamente ministros ortodoxos e outros nem tanto para delegar responsabilidades e ônus. Quanto mais centralização, mais a liderança se arrisca, e mais amarrada permanece a determinado curso.

Mas a boa notícia é que as instituições são robustas, o que limita os estragos e facilita sua reversão. Não há maiores dificuldades para o país retornar à racionalidade macroeconômica, normalmente identificada com o “tripé”: superávit primário, metas de inflação e câmbio flutuante. Não será necessária nenhuma emenda constitucional, nem mobilizações nacionais, apenas decisões administrativas do presidente e das autoridades competentes. Nada remotamente comparável com o que tínhamos em 1993.

É claro, todavia, que o país deve ambicionar muito mais. Não vamos esquecer que o “tripé” era uma versão simplificada para um trio de posturas filosóficas de maior alcance para a economia: responsabilidade fiscal, moeda sadia e cidadania global.

Este é o “grande tripé” do qual a versão mais conhecida é apenas uma simplificação tática e de fácil execução. Há muito mais em responsabilidade fiscal que simplesmente um número para o superávit primário, que pode ser facilmente manipulado. A sustentabilidade fiscal e financeira do governo envolve múltiplas questões atinentes ao equilíbrio entre obrigações do Estado, a capacidade de tributar e o endividamento público. O governo escapa de discutir transparentemente esses temas ao fingir que não existem problemas, e não há um pingo de dúvida que o Estado está onerado demais, que o sistema tributário precisa ser reformado e que contribuintes e consumidores estão insatisfeitos. É preciso retomar essas agendas.

A ideia de “moeda sadia” transcende a meta de inflação, pois o papel do Banco Central vai bem além das decisões sobre taxas de juros: inclui o Estado e o custo do crédito, a solidez do sistema bancário e a atuação de bancos públicos. Tampouco as relações do Brasil com o resto do mundo são definidas unicamente pela política cambial que, como já deve ter ficado claro, não tapa buracos nas estradas nem resolve as mazelas da competitividade nacional. As políticas industrial e de comércio exterior, assim como a diplomacia econômica, interagem com a regulamentação e atuação do Banco Central no mercado de câmbio a fim de definir os modos de inserção do Brasil no mundo globalizado. Infelizmente, retrocedemos na direção de ideias velhas sobre autossuficiência e nos afastamos das oportunidades oferecidas pela economia global.

Esse “tripé ampliado” traz consigo, naturalmente, muitas agendas positivas que permanecem engavetadas há muitos anos. Já faz mais de uma década sem reformas e sem imaginação, e a colocação do país nas comparações internacionais de competitividade e de qualidade do ambiente de negócios permanece em níveis sofríveis. Em vez de enfrentar os problemas, as autoridades desprezam essas métricas e se afastam do debate sobre a qualidade da gestão pública e sobre a meritocracia em geral.

Como esperar que o crescimento brasileiro fosse se acelerar sem nenhum esforço de reforma, e com uma administração macroeconômica incapaz de executar nem a versão pequena do “tripé”?
Por: Gustavo Franco Economista e ex-presidente do Banco Central Publicado no Jornal O Globo



O BRASIL ESTÁ SE ISOLANDO DO MUNDO


Não teremos crescimento nas exportações compatível com o crescimento da Ásia.


Se você estava pensando em prestar o vestibular em Relações Internacionais, leia este artigo.

Se você está pensando em trabalhar com Comércio Exterior, importar ou exportar produtos, leia também.

O centro geopolítico do mundo mudou.

O centro do mundo não será mais Londres e Inglaterra, o novo mapa mundi é este que ilustra o artigo.

O novo centro geopolítico serão a China e Ásia. China, inclusive, significa centro.

Agora notem a proximidade da China com a Índia, Japão, Coreia, Austrália, Rússia e Europa.

No círculo amarelo reside 50% da população do mundo. Isto mesmo.

A densidade populacional desta área é de 200 hab. por km quadrado. A do Brasil é de 17 hab.

Agora veja a distância entre o Brasil e 50% da população do mundo.

Hoje estamos longe, muito longe do mundo.

Estamos onde está a Nova Zelândia nos mapas de hoje. Você já foi para a Nova Zelândia? Estava nos seus planos ir para lá algum dia?

Alguém do Brasil faz comércio internacional com a Nova Zelândia?

Estes 50% do mundo está crescendo 7% ao ano per capita, e o Brasil está crescendo 1% ao ano per capita, ou menos.

Estaremos geograficamente muito longe de onde ocorrerá 80% do crescimento do mundo nos próximos 30 anos.

Nesta nova configuração geoeconômica, nossa indústria teria que ter a melhor qualidade total do mundo, porque trocar produtos defeituosos a 15.000 km de distância seria caríssimo e inviável.

Pense também no problema causado pela nossa política pública cultural que é contra falar inglês e mandarim.

Nossa política pública é ensinar francês e espanhol.

Enquanto o Brasil continuar a buscar intercâmbio tecnológico e científico com Uruguai, Paraguai, Venezuela e Argentina, ficaremos ainda mais isolados tecnologicamente, dependendo das pesquisas científicas internas feitas pela USP, Kroton, Uniban, Anhanguera e das Universidades do Mercosul.

Nos próximos anos:

Não teremos crescimento nas exportações compatível com o crescimento da Ásia.

Nosso avanço tecnológico e científico dependerá dos nossos cientistas e da Academia Brasileira de Ciência, que é muito menos atuante no Brasil do que a Academia Brasileira de Letras.

Nosso avanço em técnicas administrativas, gerenciais, controle e auditoria, cibernética, dependerá das pesquisas e financiamento da FAPESP, IPEA e Ministérios da Ciência e Tecnologia na área de Administração e gestão, que hoje é praticamente zero.

Nosso comércio com a China dependerá de avanços em Refrigeração, Logística, Rapidez de Transporte, Telecomunicação com a Ásia, e intercâmbio de estudantes, hoje quase que inexistentes.

Algo para se pensar.

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