sexta-feira, 13 de abril de 2018

O ALTO PREÇO DA NAVEGAÇÃO

Já estão admitindo o que salta aos olhos dos europeus comuns, pode ser a admissão de que as coisas chegaram a tal ponto de deterioração, evidente a todos, que até a Chanceler Merkel e o The New York Timesnão conseguem mais ignorá-las.


Se este for o caso, vem necessariamente o seguinte raciocínio: imagine o que poderia ter sido resolvido se as negações nunca tivessem acontecido?

Será que os políticos mais influentes e que a grande mídia estão finalmente reconhecendo o que o público europeu está vendo com seus próprios olhos? Dois recentes acontecimentos sugerem que este pode ser o caso.
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O primeiro é o reconhecimento da chanceler alemã Angela Merkel que, quase meio ano após seu partido ter passado pelo constrangimento nas eleições gerais, ter finalmente conseguido formar um governo de coalizão. Setembro passado não só testemunhou o partido de Merkel e de seus antigos parceiros da coalizão sofrerem um abocanhamento histórico dos votos de seu eleitorado, como também a entrada no Parlamento do AfD (Alternativa para a Alemanha), partido anti-imigração formado apenas há de cinco anos, que já é tão importante que representa a oposição oficial no parlamento. Se a intenção dos eleitores alemães era dar um recado, não poderia ser mais claro.

Talvez o "presta atenção" tenha sido escutado. Na segunda-feira, 26 de fevereiro, Merkel concedeu uma entrevista à rede alemã N-TV. Nela, Merkel finalmente admitiu que existem "áreas proibidas" em seu país: "isto é, áreas onde ninguém se atreve entrar". Continuando ela salientou: "essas áreas existem e é preciso dar nome aos bois e tomar providências". A chanceler afirmou que ela era a favor de uma postura de "tolerância zero" em relação a esses lugares, mas não disse onde eles se encontravam. Dois dias depois, sua porta-voz, Steffen Seibert, enfatizou que "as palavras da chanceler falam por si só".



Chanceler da Alemanha, Angela Merkel. (Foto: Carsten Koall/Getty Images)

Embora a chanceler tenha optado por usar poucas palavras, o simples fato dela ter dito essas coisas já é significativo. Por anos a fio as autoridades alemãs, assim como seus pares em todo o continente europeu, negaram categoricamente que havia regiões em seus países onde não se aplicava o estado de direito. Negações proferidas por autoridades de outros países também causaram espécie na Suécia e na França. Em janeiro de 2015 a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, ameaçou processar a Fox News (canal de notícias de TV a cabo e via satélite) por ela ter divulgado que havia zonas proibidas na cidade dela. Hidalgo sustentou na época em uma entrevista à CNN, que "a honra de Paris" e a "imagem de Paris" haviam sido maculadas. Foi uma afirmação no mínimo curiosa, por não ter levado em conta que se a "imagem de Paris" ficou desgastada naquela época, poderia ter sido devido ao massacre de 12 jornalistas, cartunistas e policiais na redação da revista satírica Charlie Hebdo e ao massacre de quatro pessoas em um supermercado kasher dois dias depois. De modo que, reconhecimentos como os de Merkel, diferentemente dos acobertamentos de Hidalgo, devem ser aplaudidos, sem estardalhaço, sempre que ocorrerem.

Apenas uma semana depois, mais um marco interessante. A primeira página do New York Times de 6 de março retratava um caso, também agraciado com as únicas imagens na capa, que ninguém imaginava que o jornal pudesse publicar. Com a manchete "Armas antigas sacodem a Suécia", o jornal registrou a morte de um homem de 63 anos de idade no bairro Varby Gard, em Estocolmo. Conforme relata o jornal, Daniel Cuevas Zuniga tinha acabado de sair do turno da noite onde trabalhava como cuidador de adultos com necessidades especiais. Ele voltava para casa andando de bicicleta juntamente com sua esposa, quando, ao observar um objeto esférico no chão, parou e o pegou. Era uma granada de mão M-75, sua carga explosiva com 3000 bolinhas de aço mataram instantaneamente Zuniga, arremessando sua esposa para longe da bicicleta.

Conforme admite, contrariadamente o jornal, não se trata de uma ocorrência pontual e sim parte de um surto de violência, envolvendo particularmente granadas de mão, causado pelo influxo de gangues estrangeiras e armas estrangeiras (em grande parte das guerras dos Bálcãs na década de 1990) para o país escandinavo. O jornal citou um candidato a asilo libanês que já havia sido integrante da tropa de choque de milicianos libaneses. Paulus Borisho, no interior de sua loja de kebab, ouviu a explosão que matou Zuniga. Conforme registra o jornal:

"O fato de uma granada estar na calçada em frente a uma loja de kebabs (espetinhos de carne), a poucos metros de uma escola de ensino fundamental, foi difícil de digerir.

"Pensando no futuro, tenho medo", salientou ele. "Tenho medo do que irá acontecer na Europa".

É para ter medo mesmo. O jornal teve até a decência de citar amigos do falecido Zuniga, que relataram que ele se queixava das "recentes transformações em Varby Gard" e que "estavam frustrados pelo fato da polícia não ter as rédeas da situação". De novo: é para se estar com medo sim.

Como não podia deixar de ser, o surto de violência das gangues e, em especial, da violência com uso de granadas na Suécia, foi abordado por outros meios de comunicação nos últimos anos. Estes meios de comunicação apontavam as formas, muitas vezes ridículas, da polícia sueca abordar o problema. Por exemplo, a chefe de polícia sueca Linda Staaf tentou recentemente dissuadir gangues de usarem granadas de mão na Suécia, salientando que atirar granadas é perigoso porque a pessoa que puxa o pino pode "se expor a um enorme risco". Jornais como o New York Times demonstraram pouco interesse em problemas dessa natureza, problemas de tamanha gravidade que o primeiro-ministro Stefan Löfven chegou a ameaçar enviar o exército a determinados subúrbios suecos.

No entanto, jornais como o New York Times tendem, nos últimos anos, a adotar o mesmo tipo de negação abraçado por Angela Merkel no tocante aos problemas que a imigração em massa dos países em desenvolvimento estão causando na Europa. Eles tendem a glorificar a "coragem" da Suécia em levantar os costumeiros controles de fronteiras ao mesmo tempo em que acobertam ou ignoram as terríveis consequências da importação de milhões de pessoas cujas identidades são desconhecidas. E, é claro, assim como a prefeita Hidalgo de Paris, eles tendem a "matar os mensageiros" mais do que divulgar as notícias, descartando esses tipos de casos como "fake news", "alt-right" (movimento de extrema-direita que rejeita o conservadorismo tradicional, centrado na supremacia branca) ou "extrema direita" propriamente dita.

No ano passado, quando Donald Trump pronunciou a famosa frase "o que aconteceu ontem à noite na Suécia", a grande mídia sabia sobre o que ele estava falando. Ela sabia que ele estava vagamente se referindo a uma reportagem que havia assistido na Fox news na noite anterior sobre a contínua deterioração que estava ocorrendo naquele país. A mídia, no entanto, optou por não abordar esse problema. Ela optou priorizar debochar do presidente, ridicularizando a ideia de que havia algum problema no paraíso escandinavo.

Naquela ocasião o New York Times destacou em letras garrafais que os comentários do presidente Trump eram "desconcertantes", enquanto grande parte da mídia simplesmente fazia de conta que a Suécia era um país de paz infinita e da Ikea, que havia sido tremendamente difamada pelo presidente.

A surpresa de que em um espaço de poucos dias, tanto a Chanceler Merkel quanto o New York Times se dispuseram a admitir fatos que eles e seus defensores fizeram de conta, por muito tempo, serem imaginários, podem indicar um ligeiro progresso. Também não é motivo de otimismo. Não necessariamente sendo uma demonstração de que as coisas estão melhorando, o fato de que já estão admitindo o que salta aos olhos dos europeus comuns, pode ser a admissão de que as coisas chegaram a tal ponto de deterioração, evidente a todos, que até o The New York Times e a Mutti Merkel não conseguem mais ignorá-las. Se este for o caso, vem necessariamente o seguinte raciocínio: imagine o que poderia ter sido resolvido se as negações nunca tivessem acontecido?

Por: Douglas Murray, escritor, jornalista, comentarista e analista de relações públicas britânico, sediado em Londres, Inglaterra. Seu último livro, best seller internacional: "The Strange Death of Europe: Immigration, Identity, Islam".
Original em inglês: The High Price of Denial
Tradução: Joseph Skilnik
Do site: https://pt.gatestoneinstitute.org

domingo, 8 de abril de 2018

QUERO MEU BRASIL DE VOLTA


"Primeira Missa no Brasil", óleo de Vitor Meirelles (1861)

“Se vemos mais e mais adiante deles, não é por causa de nossos olhos límpidos e de nossos altos corpos, mas porque somos mantidos no alto pela gigantesca estatura dos antigos.” (Bernardo de Chartres) 


Inicio este artigo em lágrimas, emocionado após assistir ao quinto episódio da série Brasil – A Última Cruzada, produzida pela trupe incansável do Brasil Paralelo. Não só porque sou um dos entrevistados (risos), mas porque está belíssimo! Caso você ainda não conheça, caro leitor, Brasil Paralelo é uma produtora de conteúdo, independente, formada por um grupo de jovens de Porto Alegre, no Sul do Brasil, que vem desenvolvendo um trabalho audiovisual impressionante, tanto no debate político conturbado de nosso país quanto na revisão inovadora da historiografia nacional. A série Brasil – A Última Cruzada, que estreou em dezembro de 2017 e já foi vista por mais de 1,5 milhão de pessoas, tem renovado o nosso amor por nossa pátria, há muito sequestrada por oligarcas e ideólogos irresponsáveis, mais preocupados com seus próprios interesses do que com o bem comum. 


Eis o trailer:






Ao assistir a essa série, percebo a quantidade de informações que nos foi escamoteada por tantos anos, e como as interpretações ideológicas subverteram a verdade. Há séculos sofremos não só com a sanha daqueles que julgam lícito conquistar o poder e fazer fortuna à custa do sofrimento de milhões, mas também com aqueles que buscam, inconsequentemente, transformar o mundo em vez de compreendê-lo. 

Tal distorção da realidade nos afetou profundamente, pois, impossibilitados de assumirmos a nossa vocação, passamos a viver das aparências e do famigerado jeitinho brasileiro, como constatou o filósofo Mário Vieira de Mello em seu estupendo Desenvolvimento e Cultura – O problema do estetismo no Brasil­, publicado em 1963: 

“Num país como o nosso, onde tudo se faz por amizade, seria com efeito absurdo, para quem quer prosperar, criar deliberadamente limites à manipulação de um tal sentimento, fazer distinções, estabelecer critérios de seleção na escolha de amigos. O mais sensato naturalmente seria desencadear um processo inflacionário da amizade que nos permitisse ter sempre à mão a moeda capaz de promover nosso interesse.” 

Mas antes ainda, em 1908, o grande Sílvio Romero diagnosticara um problema ainda mais profundo na alma brasileira, descrito em seu ensaio Nosso maior mal: 

“[…] a maior parte dos erros, dos embaraços, das decepções, das quedas, dos prejuízos, dos desastres e até da total ruína que cada um de nós comete, encontra ou sofre na vida provém pura e simplesmente, quase sempre, desta coisa tão simples, tão rudimentar, tão indesculpável — o desconhecimento de nós mesmos. […] A inconsciência em que a maior parte das pessoas vive das lacunas de sua inteligência, da insuficiência de seu saber, dos vícios de seu caráter, da fraqueza de sua vontade — é a origem da precipitação, da leviandade, da arrogância, dos falsos cálculos, dos passos errados, das loucuras praticadas.” 

Ou seja, a perda da nossa identidade. Não reconhecendo o que somos, queremos ser o que não somos. 

O Brasil, país jovem, nasceu sob os auspícios da modernidade. As nações mais antigas já tinham se estruturado culturalmente, alimentadas, durante longos séculos, pela Antiguidade clássica e pelo Cristianismo; por isso, desfrutavam de considerável estabilidade e uniformidade de pensamento quando os portugueses aportaram em solo brasileiro. Numa colônia, cujo processo civilizatório é sempre muito complexo, há o risco de as disputas políticas ocuparem todo o espaço de formação da sociedade, prejudicando sensivelmente seu desenvolvimento. Os desafios são enormes, e os elementos capazes de gerar uma Tradição – a língua, a religião e a alta cultura, nas palavras do filósofo Olavo de Carvalho – na qual a identidade nacional repousa e fortalece a sensação de pertencimento de cada cidadão, só podem ser desenvolvidos sob a severa responsabilidade (e notória competência) administrativa dos governantes, a consciência missionária da elite cultural (sacerdotes, educadores, intelectuais e artistas) e a liberdade individual dos cidadãos. 

Não foi à toa que, no século 19, dom Pedro II investiu tanto no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, na Academia Imperial de Belas-Artes e no Colégio Pedro II, financiando cientistas, artistas, exposições e assistindo a exames de muitos alunos. Seu amor pela educação, pelas artes e, sobretudo, pelo Brasil pode ser expresso em sua famosa frase, encontrada num de seus Diários: “Se não fosse imperador do Brasil, quisera ser mestre-escola”. Sua intenção era criar uma identidade nacional que revelasse a opulência de nosso país não só interna, mas externamente; e isso foi revelado em sua influência ativa e direta nesse processo: patrocinou, pessoalmente, a instrução de muitos estudantes no exterior – dentre eles, o notável pintor Pedro Américo; a primeira médica brasileira, Maria Augusta Generoso Estrela; e o compositor que colocou o Brasil no circuito musical internacional: Antônio Carlos Gomes. A estreia de O Guarani, em 19 de março de 1870, no Teatro Alla Scala, de Milão, foi um marco no reconhecimento do altíssimo nível da música brasileira. 

No entanto, tais aspectos de nossa história e da nossa cultura, que poderiam nos servir de referência, são pouquíssimo explorados por nossos professores, cujo empenho, ao tratarem do nosso passado, parece ter sempre um caráter crítico – quando não difamatório. Sem contar que, como tratei em artigo anterior, a cultura clássica foi quase totalmente substituída pela cultura popular; essa em detrimento daquela, chamada de elitista. Desse modo, perdemos as referências históricas e imaginativas capazes de nos orientar. 

Após o golpe militar de 1889, chamado pomposamente de Proclamação da República, nossa história foi recontada pelos positivistas, a fim de menosprezar o legado monárquico e dar ares de progresso à sua sanha revolucionária. Posteriormente, os comunistas a reescreveram novamente, sob o maniqueísmo socioeconômico dos exploradores versus explorados. Assim, a verdadeira história de nosso país segue praticamente desconhecida da população atual. E, com a substituição da matriz curricular clássica – que privilegiava o conteúdo, a informação, a ciência – pela moderna, através dos quatro pilares da educação – aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser –, sandice do ideólogo francês Jacques Delors, adotados pela Unesco, há pouquíssimas chances de revertermos esse quadro. Veja o que diz o Currículo de Ciências Humanas e Suas Tecnologias, do ensino fundamental e médio, do estado de São Paulo: 

“[…] fica claro que o primeiro objetivo geral do ensino fundamental é levar os alunos à compreensão da ‘cidadania como participação social e política. A partir dessa compreensão, espera-se despertar a consciência em relação ao exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais’, adotando, ‘no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito’. Assim, os estudantes devem desenvolver um posicionamento crítico frente aos problemas que afetam a vida social, reconhecendo o diálogo como ponto de partida fundamental para a tomada de decisões coletivas.” 

Ou seja, em vez de ensinar História, deve-se ensinar a criticar a História. Em vez dos fatos, as interpretações. Em vez da ciência, a opinião (a doxa, que Platão tanto criticou). Não que seja errado interpretar os fatos e emitir opiniões, mas tal método parte do princípio de que sempre há uma intenção por detrás do texto, que não há, jamais, isenção num fato narrado, e que cumpre ao historiador desmascarar a “farsa”, não sem antes “despertar a consciência em relação ao exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais”. E, embora nada disso seja ruim em si mesmo – pois não sou avesso à ideia de que a escola também educa, e que a educação para a cidadania seja algo louvável –, essa não é a função primordial do ambiente acadêmico. A função da escola é transmitir um conjunto básico de conhecimentos para formar intelectualmente o aluno. E, para que isso seja possível, a disciplina, a atenção, a dedicação e o foco, que são elementos de ordem – educativos, por assim dizer –, são essenciais. 

Por isso, iniciei o ano letivo fazendo aos meus alunos uma provocação: por que o Brasil se tornou uma nação tão estranha a nós, brasileiros? Por que, por exemplo, ao mesmo tempo em que não reconhecemos nossa classe política, considerando-a um grupo de bandidos inescrupulosos – salvo raríssimas exceções –, não percebemos que fomos nós que os elegemos? Não é curioso pensar que somos, paradoxalmente, vítimas e algozes de nosso destino? Que a solução pela qual sempre clamamos é aquela que, cada vez mais, nos aprisiona? E estamos lendo alguns textos clássicos a fim de analisarmos e compreendermos nossa situação atual. 

Tal contradição foi analisada com maestria ímpar por meu amigo e colega de Gazeta do Povo Bruno Garschagen, em seu best-seller Pare de Acreditar no Governo, através do questionamento que o levou a escrever o livro: “por qual razão nós, que tínhamos uma imagem tão compreensivelmente negativa sobre os políticos, achávamos que o governo deveria resolver os problemas do país”? 

Como percebemos, o problema é antigo, mas creio que tenha sido agravado, e muito, pelo golpe republicano de 1889. O jornalista e escritor Eduardo Prado, em Fastos da Ditadura Militar no Brasil, seu libelo contra aquele golpe, publicado em 1890, disse: “A fatalidade reservava, porém, à geração que viu extinguir-se a escravidão doméstica o espetáculo da escravidão política”. E, para completar, a sucessão de golpes de Estado que sofremos desde então, tornou nossa liberdade um anseio ainda mais distante. 

Mas Bruno oferece algumas dicas que creio serem utilíssimas: 

“O que fará a diferença para impedir, minimizar ou reduzir a mentalidade estatista e, por tabela, o intervencionismo como agenda política é mostrar às pessoas a natureza das ideologias que disputam espaço e como elas podem ser prejudicadas pelo governo. Isso fornece instrumentos que nos permitem reconhecer e rejeitar os projetos de poder baseados na ideia de que o Estado deve ser o principal agente da vida em sociedade”. 

E completa, citando o filósofo britânico Roger Scruton: 

“O nosso grande desafio é ‘menos político do que cultural — uma educação da compreensão, que nos exige virtudes (como a imaginação, a criatividade e o respeito pela alta cultura) que têm um espaço cada vez menor no mundo da política’. Se a armadilha não pode ser totalmente desarmada, podemos mostrar às pessoas que ela existe e como não cair na arapuca intervencionista.” 

E assim voltamos ao início deste artigo. A (re)criação de uma identidade nacional, que nos fornecerá perspectivas de um futuro se não glorioso, ao menos livre, passa pela reformação de nossa imaginação moral através da educação como Paidéia , que exigirá de pais, professores, intelectuais e artistas o comprometimento com aquilo que realmente importa. Platão explica, em sua República (401c-d, 402a): 

“Devemos […] procurar aqueles dentre os artistas cuja boa natureza habilitou a seguir os vestígios da natureza do belo e do perfeito, a fim de que os jovens, tal como os habitantes de um lugar saudável, tirem proveito de tudo, de onde quer que algo lhes impressione os olhos ou os ouvidos, procedente de obras belas, como uma brisa salutar de regiões sadias, que logo desde a infância, insensivelmente, os tenha levado a imitar, a apreciar e a estar de harmonia com a razão formosa. […] Ao passo que as coisas feias, com razão as censuraria e odiaria desde a infância, antes de ser capaz de raciocinar, e, quando chegasse à idade da razão, haveria de saudá-la e reconhecê-la pela sua afinidade com ela, sobretudo por ter sido assim educado”. 

Não há atalhos; levará tempo. Mas, nas palavras do célebre Antônio Pereira Rebouças – pai de André, o famoso engenheiro e abolicionista: “não é na rapidez, mas sim na segurança, que consiste a excelência dos progressos da liberdade”. 

Aceita o desafio?
Por Paulo Cruz  Publicado originalmente em www.gzetdopovo.com.br 


quarta-feira, 28 de março de 2018

A MENSAGEM ETERNA DE THOMAS JEFFERSON


Durante minha visita em Washington DC, cobrindo o CPAC 2018, fiz uma visita ao Jefferson Memorial, um dos principais pontos turísticos da cidade, para homenagear este que é um dos mais reverenciados e controversos pais fundadores da América.

Thomas Jefferson (1743-1826), terceiro presidente do país, não é meu pai fundador preferido. Sua simpatia pela revolução francesa, mesmo que “condenando os excessos”, é suficiente para colocar John Adams e George Washington num patamar muito superior, mas nem por isso é possível diminuir sua grandeza como político e intelectual.

Ele é o principal autor da Declaração da Independência (1776) e do trecho mais inspirado já escrito num texto político oficial, gravado para sempre nas paredes do Jefferson Memorial:

“Consideramos estas verdades como autoevidentes, que todos os homens são criados iguais, que são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes são vida, liberdade e busca da felicidade.”

Nesse parágrafo, quase tudo que você precisa saber sobre política e como construir uma nação livre e democrática:

– Seus direitos fundamentais são “auto-evidentes”, “inalienáveis” e não foram dados a você pelo estado, pelos governantes e detentores do poder e que por isso mesmo eles não podem tirar de você. O estado não dá a você estes direitos, ele existe apenas e tão somente para proteger os direitos que você já possui.

– Seus diretos mais básicos são o direito à vida, à liberdade e a BUSCA da felicidade. A sociedade não deve a você a sua felicidade, ela é uma busca pessoal e intransferível. Seu país, seu governo e as leis devem garantir que você tenha as condições para correr atrás dos seus sonhos, mas a busca é sua e de mais ninguém.

Aprendendo isso, aceitando isso, o resto é conseqüência. A partir dessas idéias, os EUA criaram a sociedade mais próspera e livre da história da humanidade em menos de três séculos.


Por:  Alexandre Borges  
Do site: http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/alexandre-borges/2018/02/26

domingo, 25 de março de 2018

WIKILEAKS: PAPA CONSERVADOR FOI FORÇADO A RENUNCIAR PELO “DEEP STATE”

George Soros, Barack Obama e Hillary Clinton orquestraram um golpe no Vaticano para derrubar o Papa Conservador Bento XVI1 em Fevereiro de 2013, de acordo com e-mails do Wikileaks. 


Papa Bento se tornou o primeiro papa a renunciar desde o Papa Gregório XII em 1415 e o primeiro a fazê-lo por iniciativa própria desde o Papa Celestino V em 1294. 

O grupo de líderes Católicos cita novas evidências descobertas em e-mails publicados pelo Wikileaks para “afirmar” que o Papa Conservador Bento não renunciou por iniciativa própria, mas foi removido do Vaticano por um golpe de estado que o grupo de pesquisadores está chamando de “Primavera Católica”. 

Soros, Obama e Clinton usaram a máquina diplomática Americana, força política e poder financeiro para coagir, corromper e chantagear uma “mudança de regime” na Igreja Católica Romana para substituir o Conservador Bento pelo atual Papa Francisco – que tornou-se desde então um inesperado porta-voz da esquerda internacional, chocando os Católicos ao redor do mundo.2 

Agora, o grupo de líderes Católicos enviou uma carta para o Presidente Trump insistindo que ele inicie uma investigação oficial nas atividades de Soros, Obama e Clinton (e outros) que o grupo alega terem se envolvido em orquestrar a Primavera Católica que resultou no seu objetivo de “mudança de regime” no Vaticano. Os líderes Católicos citam 8 perguntas específicas que eles desejam obter respostas em relação aos eventos suspeitos que levaram à renúncia de Papa Bento, a primeira renúncia papal em 700 anos. 

“Especificamente, nós temos razões para acreditar que a ‘mudança de regime’ no Vaticano foi arquitetada pela administração Obama,” dizem os solicitantes, em sua carta de 20 de Janeiro para o Presidente Trump.1 

“Surpreendemo-nos ao descobrir,” a carta destaca, “que, durante o terceiro ano do primeiro termo da administração Obama a sua antes oponente, Secretária de Estado Hillary Clinton, e outros oficiais do governo com quem ela se associou propuseram uma ‘revolução’ Católica na qual o fim do que restou da Igreja Católica na América chegaria.” 

A carta inclui links para documentos e notícias destacando as afirmações do grupo. Inicialmente a carta destaca os notórios e-mails de Soros-Clinton-Podesta divulgados no final do ano passado pela Wikileaks, onde Podesta e outros progressistas discutem uma mudança de regime para remover o que eles chamam de “ditadura da idade média” na Igreja Católica. 

Quanto aos e-mails de Podesta em questão, o New American informou em outubro passado: 

“Podesta, um antigo conselheiro/confidente de Clinton e ativista escolhido a dedo pelo financiador de esquerda George Soros, revelou em um e-mail de 2011 que ele e outros ativistas estavam trabalhando para efetuar uma revolução chamada “Primavera Católica” dentro da Igreja Católica, uma óbvia referência aos golpes de estado desastrosos da “Primavera Árabe”, organizados no mesmo ano pela equipe Obama-Clinton-Soros, que desestabilizou o Oriente Médio e trouxe regimes islâmicos radicais e grupos terroristas para o poder na região. O e-mail de Podesta é uma resposta a outro radical financiado por Soros – Sandy Newman, fundador do grupo progressista “Vozes Progressivas. Newman escreveu a Podesta buscando conselhos sobre a melhor maneira de “plantar as sementes da revolução” na Igreja Católica, que ele descreveu como uma “ditadura da Idade Média”. 

Em sua carta ao presidente Trump, o grupo de líderes Católicos escreve: 

“Aproximadamente um ano após esta discussão por e-mail, que nunca se pensou seria um dia publicada, achamos que o Papa Bento XVI abdicou em circunstâncias altamente incomuns e foi substituído por um Papa cuja missão aparente é fornecer um componente espiritual à agenda ideológica radical da esquerda internacional. O Pontificado do Papa Francisco, posteriormente, questionou sua própria legitimidade em inúmeras ocasiões”. 

“Continuamos intrigados com o comportamento desse Papa com bagagem ideológica, cuja missão parece ser avançar as agendas seculares da esquerda, em vez de orientar a Igreja Católica em Sua missão sagrada”, dizem eles, expressando os pensamentos de milhões de Católicos ao redor do mundo, chocados pela ideologia de esquerda do Papa Francisco. “Não é simplesmente o papel apropriado de um papa ser envolvido na política, a ponto de ser considerado o líder da esquerda internacional”. 

Eles continuam: 

“Com tudo isso em mente, e desejando o melhor para o nosso país e para os Católicos em todo o mundo, acreditamos que seja responsabilidade de Católicos leais e informados dos Estados Unidos solicitarem que você autorize uma investigação sobre as seguintes questões: 

– Para que fim a Agência Nacional de Segurança estava monitorando o conclave que elegeu o Papa Francisco? 

– Que outras operações secretas relacionadas com a renúncia do Papa Bento XVI ou com o conclave que elegeu o Papa Francisco foram realizadas por oficiais do governo dos EUA sobre? 

– Agentes do governo dos EUA entraram em contato com o “Cardeal Danneels Mafia”? 

– As transações monetárias internacionais com o Vaticano foram suspensas nos últimos dias antes da renúncia do Papa Bento XVI. Alguma agência governamental dos EUA esteve envolvida nisso? 

– Por que as transações monetárias internacionais foram retomadas em 12 de fevereiro de 2013, um dia depois de Bento XVI ter anunciado sua renúncia? Foi pura coincidência? 

– Quais ações, se houveram, foram realmente tomadas por John Podesta, Hillary Clinton e outros ligados ao governo Obama que participaram da discussão propondo o fomento de uma “Primavera Católica”? 

– Qual foi o propósito e a natureza do encontro secreto entre o vice-presidente Joseph Biden e o Papa Bento XVI no Vaticano em 3 de junho de 2011? 

– Quais os papéis desempenhados por George Soros e outros financiadores internacionais que podem estar atualmente residindo em território dos Estados Unidos?” 

A investigação que o grupo de líderes Católicos está solicitando ao presidente Trump deve ser de interesse para mais do que apenas Católicos. A capacidade de George Soros de cooptar figuras líderes políticos para auxiliar seus planos radicais em estados-nação é bem conhecida; mas a sua capacidade de forçar a “mudança de regime” na Igreja Católica, uma instituição que parecia ser impenetrável do exterior, levanta sérias questões sobre o seu potencial para o caos global.1 A investigação – e punição – deve começar imediatamente. 

Por: Allan Dos Santos  Tradução livre de Eduardo Baldoino: para ver o artigo original aqui


segunda-feira, 12 de março de 2018

PAPO DE ADULTO - RESENHA DO NOVO LIVRO DE JORDAN PETERSON

O psicólogo canadense Jordan Peterson alcançou fama internacional após uma entrevista na televisão britânica em que, hostilizado por uma militante feminista disfarçada de entrevistadora, conseguiu manter a calma, o foco nos argumentos, e expôs o viés ideológico e os preconceitos daquela que tentava colar no entrevistado a imagem de conservador preconceituoso machista.

O motivo da entrevista era o lançamento do seu novo livro, 12 Rules for Life, um “antídoto contra o caos”. Trata-se de um livro que merece ser lido com certa urgência, pois sua mensagem nunca fez tanta falta ao mundo, dominado pelo relativismo pós-moderno, pela ditadura do politicamente correto e pela marcha das “minorias oprimidas”. É um papo de adulto, para quem quer falar a sério sobre a vida, não para quem busca fugas e ilusões nos “locais seguros” protegidos contra as “microagressões” e qualquer tipo de ofensa.

Os vídeos de Peterson têm feito tanto sucesso justamente porque tocam na ferida, falam aos jovens em busca de algum sentido para suas vidas, de uma estrutura mais ordenada em meio ao caos produzido pelo vale-tudo atual. Essa libertinagem hedonista mascarada de liberdade gera angústia e vazio, e Peterson tenta colocar um pouco de ordem no caos. A busca por um equilíbrio entre ordem e caos é, inclusive, um dos grandes temas do livro.

O vácuo será logo preenchido, e ninguém pode viver sem uma bússola moral. Até mesmo os relativistas acabam usando uma, ainda que inconsistente. Por trás do discurso de tolerância e de não julgamento, muitos mascaram seu próprio ódio, seus preconceitos, enquanto posam de virtuosos nas redes sociais em busca de curtidas e aprovação. Na prática, flertam com o destrutivo niilismo, com o desespero do vazio, aderindo a ideologias radicais que supostamente tampam o buraco.
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Já com Freud entendemos que viver em sociedade, ao menos numa civilizada, significa criar freios para nossos apetites, criando regras morais que restringem nossa “liberdade” plena. Os pós-modernistas querem abolir esses freios, quebrar todos os tabus, gritar que “é proibido proibir”. O resultado dessa libertinagem, que vem num crescendo desde a década de 1960, tem sido preocupante, para dizer o mínimo. Tem sido caótico, para ser mais preciso.

Peterson bebe muito de fontes míticas, usando seus arquétipos para transmitir mensagens importantes incutidas na sabedoria dos antigos, enraizadas nas tradições que serviam, como ritos de passagem, para o amadurecimento. As normas sociais, as histórias de heróis, os mitos, tudo isso contribuía para a transformação de jovens em adultos, de meninos em homens, de meninas em mulheres. Havia uma estrutura social, um território mais familiar, que hoje se tornou uma grande mancha.

Onde os “progressistas” enxergam utopias e ilusões acerca da natureza humana, que seria infinitamente elástica e uma tábula rasa, Peterson vê, com mais realismo, bestas humanas que precisam justificar sua existência miserável, o que impõe a necessidade de rotina e tradição, de ordem. Vida é também sofrimento, especialmente para seres humanos com consciência da morte, das doenças, do fardo da existência. Fingir que isso não existe só agrava o problema.

Por outro lado, compreender melhor de onde o animal homem vem pode nos ajudar a suportar melhor o desafio. O livro foge do academicismo e traz exemplos curiosos do reino animal ou do cotidiano do próprio autor. Explicar a tendência natural de busca por status ou hierarquia, especialmente nos homens, com base nas lagostas é um típico exemplo dessa abordagem, que torna a leitura mais leve e divertida, apesar da seriedade do assunto.

Numa época de vitimização em que a maioria tenta colocar a culpa dos males em terceiros ou em abstrações, tais como o sistema ou a sociedade, Peterson nos lembra que o mal está em cada um de nós, sempre à espreita. Se somos monstros em potencial, e reconhecemos isso, então temos mais ferramentas para realmente lidar com tiranias opressoras. Se, por outro lado, vemos o homem como uma santa vítima de forças externas, um cordeirinho inocente, não teremos condições de resistir ao avanço dos lobos.

A fraqueza humana, sua fragilidade, já está representada no mito de Adão e Eva. Quando eles se dão conta de que estão nus, após se tornarem autoconscientes, ficam com vergonha, percebem o quão desprotegidos estão na natureza. Ao ver as diferenças, alimentamos o ressentimento também: a beleza ofusca o feio, a força envergonha o fraco. Isso pode levar ao medo, à inveja, com consequências trágicas, como a história de Caim e Abel nos revela. Eis aí o “pecado original” que está tão fora de moda nos círculos modernos, uma lembrança saudável do que somos capazes de fazer quando movidos por certas paixões ou instintos.

Daí a importância de se ter uma visão construtiva, uma direção, uma vida com propósito. Não é o vício que precisa de explicação, mas a virtude. Para fracassar na vida, basta cultivar alguns hábitos ruins. É o sucesso que exige explicação, sacrifício constante, determinação, força de vontade. E nesse processo haverá todo tipo de tentação, especialmente do que Peterson chama de “Trindade do submundo”: arrogância, engano e ressentimento.

Muitos de nós estamos constantemente em busca da felicidade, como algum ideal a ser atingido. Peterson não considera isso uma boa receita. Ao perseguir tanto a felicidade, ela acaba sempre nos escapando, gerando seu oposto: mais angústia e frustração. Em vez disso, Peterson recomenda buscar a virtude, uma vida boa, sempre com a gratidão pela própria existência e com a noção de que a dor e o sofrimento estarão ali na esquina, pois são parte inexorável de nossas vidas.

E quanto aos nossos filhos, Peterson recomenda que os eduquemos de verdade, transmitindo responsabilidade, ajudando-os a se tornarem adultos, em vez de tentar protegê-los para sempre dos riscos da vida. Impor limites, saber lidar com sua agressão inata, criar regras claras, estimular o sacrifício presente para ganhos futuros, procurar manter um ambiente familiar saudável em casa, eis algumas dicas óbvias.

Há muito mais no livro, e recomendo a leitura na íntegra. Em tempos de infantilização geral, com tantos “adultescentes” por aí, e com a perversa ideologia de gênero repetindo que homem e mulher são construções sociais, é um bálsamo travar uma conversa com um pensador sério e adulto.
Por: Rodrigo Constantino  Artigo originalmente publicado pela Gazeta impressa.
Do site: http://www.gazetadopovo.com.br/rodrigo-constantino/

terça-feira, 6 de março de 2018

O BEM E O MAL SEGUNDO OLÍVIO DUTRA

Um empresário é um sujeito que ganha a vida organizando a atividade econômica. Ele acumula um capital, investe, ganha, paga suas dívidas para com os fornecedores, os empregados e o Estado, e no fim, se todo dá certo, tem um lucro. A quase totalidade do lucro é reinvestida no mesmo ou em outros negócios. Uma parte ínfima ele pode gastar em benefício próprio e da família. Se seu negócio é muito, muito próspero, mesmo essa parte ínfima basta para que ele compre mansões, iates, jatinhos e jatões, carros de luxo, cavalos de raça, e tenha, se é do seu gosto, múltiplas amantes. Em geral ele se contenta com muito menos.

Um político de esquerda é um sujeito que ganha a vida tentando jogar os empregados contra os empregadores. Ele mostra aos operários os aviões, os cavalos de raça e os carros de luxo do patrão e grita: “É roubo!” No começo ele faz isso de graça. É um investimento. Assim como o empresário investe dinheiro, ele investe insultos, gestos, caretas de indignação, apelos à guilhotina. Em troca, dão-lhe dinheiro. Ele vive disso. Quando alcança o sucesso, pode dispor de mansões, iates, jatinhos e jatões, carros de luxo, cavalos de raça e amantes em quantidade não inferior às do mais próspero capitalista.

Tanto a atividade do empresário quanto a do político de esquerda pode ser exercida de maneira honesta ou desonesta. O empresário pode dar golpes em seus fornecedores, vender produtos fraudados, sonegar o pagamento devido aos operários, ou então pode pagar tudo direitinho e vender produtos bons. Do mesmo modo, o político de esquerda pode desviar dinheiro público, utilizar-se indevidamente de imóveis do Estado, possuir sob ameaça aterrorizadas empregadinhas domésticas como o fazia Mao-tsé-tung. Ou então pode fazer tudo dentro da lei que ele próprio instaurou e ser incorruptível como Robespierre.

A diferença é a seguinte: da atividade do empresário, mesmo o mais desonesto, resultam sempre uma ativação da economia, uma elevação da produtividade, a expansão dos empregos. Esses resultados podem vir em quantidade grande ou pequena, mas têm de vir necessariamente, pela simples razão de que “empresa” consiste em produzi-los e em nada mais.

Da atividade do político de esquerda, mesmo o mais honesto, resultam sempre um aumento do ódio entre as classes, o crescimento do aparato estatal que terá de ser sustentado pelos padrões com dinheiro extraído aos empregados e consumidores, a politização geral da linguagem que transformará todos os debates em confrontos de força e, em última instância, desembocará num morticínio redentor. Esses resultados também podem vir em quantidades grandes ou pequenas, mas virão necessariamente, pois “política de esquerda” consiste em produzi-los e em nada mais.

Um empresário, honesto ou desonesto, está no auge do sucesso quando pode, sem prejuízo de seus investimentos, comprar mansões, iates, carros de luxo, jatinhos, jatões etc. Ele alcança isso quando se torna um mega-empresário. Para chegar a esse ponto, ele tem de deixar em seu rastro fábricas, bancos, plantações, jornais, canais de TV e mil e um outros negócios dos quais vivem e prosperam milhares de pessoas.

Em político de esquerda, honesto ou desonesto, está no auge do sucesso quando destruiu toda oposição às suas idéias e comanda uma sociedade fielmente disposta a realizá-las. Ele alcança isso quando se torna o chefe de uma revolução vitoriosa. Para chegar a esse ponto, ele tem de deixar em seu rastro milhares ou milhões de cadáveres, edifícios destruídos, plantações queimadas, órfãos e viúvas vagando pelas ruas, fome, miséria e desespero.

O governador Olívio Dutra acha que é imoral ser empresário e que é lindo ser um político de esquerda.

Ele não tem maturidade intelectual suficiente para perceber que o sucesso final de um empresário, mesmo desonesto, traz sempre mais bem do que mal, e que o sucesso final de um político de esquerda, mesmo inflexivelmente honesto como ele, produz uma quantidade de mal acima do que qualquer bem poderá jamais reparar.

O governador Olívio Dutra, como qualquer outro político de esquerda, tem uma consciência moral deformada por um uso falso da linguagem. Ele ouviu dizer na infância: “Lucro egoísta”, “justiça social”, e impregnou-se de tal modo desses símbolos verbais do mal e do bem, que pôs sua vida a serviço do que lhe parece uma nobre causa: combater as coisas que têm nomes feios e louvar as que têm nomes bonitos. Uma coisa que criou as nações mais prósperas e livres da Terra deve ser muito má, pois tem o nome hediondo de “lucro egoísta”. Uma coisa que matou cem milhões de bodes expiatórios e reduziu à escravidão e à miséria um bilhão e meio de outros inocentes deve ser ótima, pois leva o belo nome de “justiça social”.

Romper a unidade mágica de nomes e coisas é uma operação dolorosa. Custa vergonhas e humilhações à mente altiva. Mas é o preço da maturidade. No julgamento são do homem maduro – o “spoudaios” –, via Aristóteles a única esperança de um governo justo, do predomínio, ainda que relativo e precário, do bem sobre o mal. Não existe bem onde não existe amor à verdade, e não existe amor à verdade onde uma mente obstinada se apega ao instinto pueril de julgar as coisas pelos nomes que ostentam.

O problema do governador Olívio Dutra, assim como de milhares que pensam como ele, já foi diagnosticado por Jesus Cristo dois milênios atrás: “Na verdade, amais o que devíeis odiar e odiais o que devíeis amar.” Eles pecaram contra o Espírito, protegendo-se por trás da belas palavras contra a visão das realidades feias, e receberam como castigo exatamente aquilo que pediam: a cegueira forçada tornou-se espontânea, e hoje a sua moralidade invertida lhes parece a atitude mais natural do mundo, a única maneira possível de julgar as coisas — o caminho do bem, fora do qual tudo é perdição e “lucro egoísta”.

Não creio sequer que valha a pena rezar para que despertem. Eles não despertarão enquanto não enviarem milhões de seres humanos para o sono eterno.
Por: Olavo de Carvalho   7 de abril de 2000  Do site: http://www.olavodecarvalho.org

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

O QUE É UMA SOCIEDADE JUSTA?

Quando se pergunta qual o conceito que fazemos de uma sociedade justa, a palavra “conceito” entra aí com um sentido antes americano – pragmatista – do que greco-latino: em vez de designar apenas a fórmula verbal de uma essência ou ente, significa o esquema mental de um plano a ser realizado. Nesse sentido, evidentemente, não tenho conceito nenhum de sociedade justa, pois, persuadido de que não cabe a mim trazer ao mundo tão maravilhosa coisa, também não me parece ocupação proveitosa ficar inventando planos que não tenciono realizar.

O que está ao meu alcance, em vez disso, é analisar a ideia mesma de “sociedade justa” – o seu conceito no sentido greco-latino do termo – para ver se faz sentido e se tem alguma serventia.

Desde logo, os atributos de justiça e injustiça só se aplicam aos entes reais capazes de agir. Um ser humano pode agir, uma empresa pode agir, um grupo político pode agir, mas “a sociedade”, como um todo, não pode. Toda ação subentende a unidade da intenção que a determina, e nenhuma sociedade chega a ter jamais uma unidade de intenções que justifique apontá-la como sujeito concreto de uma ação determinada. A sociedade, como tal, não é um agente: é o terreno, a moldura onde as ações de milhares de agentes, movidos por intenções diversas, produzem resultados que não correspondem integralmente nem mesmo aos seus propósitos originais, quanto mais aos de um ente genérico chamado “a sociedade”!

“Sociedade justa” não é portanto um conceito descritivo. É uma figura de linguagem, uma metonímia. Por isso mesmo, tem necessariamente uma multiplicidade de sentidos que se superpõem e se mesclam numa confusão indeslindável. Isso basta para explicar por que os maiores crimes e injustiças do mundo foram praticados, precisamente, em nome da “sociedade justa”. Quando você adota como meta das suas ações uma figura de linguagem imaginando que é um conceito, isto é, quando você se propõe realizar uma coisa que não consegue nem mesmo definir, é fatal que acabe realizando algo de totalmente diverso do que esperava. Quando isso acontece há choro e ranger de dentes, mas quase sempre o autor da encrenca se esquiva de arcar com suas culpas, apegando-se com tenacidade de caranguejo a uma alegação de boas intenções que, justamente por não corresponderem a nenhuma realidade identificável, são o melhor analgésico para as consciências pouco exigentes.

Se a sociedade, em si, não pode ser justa ou injusta, toda sociedade abrange uma variedade de agentes conscientes que, estes sim, podem praticar ações justas ou injustas. Se algum significado substantivo pode ter a expressão “sociedade justa”, é o de uma sociedade onde os diversos agentes têm meios e disposição para ajudar uns aos outros a evitar atos injustos ou a repará-los quando não puderem ser evitados. Sociedade justa, no fim das contas, significa apenas uma sociedade onde a luta pela justiça é possível. Quando digo “meios”, isso quer dizer: poder. Poder legal, decerto, mas não só isso: se você não tem meios econômicos, políticos e culturais de fazer valer a justiça, pouco adianta a lei estar do seu lado. Para haver aquele mínimo de justiça sem o qual a expressão “sociedade justa” é apenas um belo adorno de crimes nefandos, é preciso que haja uma certa variedade e abundância de meios de poder espalhados pela população em vez de concentrados nas mãos de uma elite iluminada ou sortuda. Porém, se a população mesma não é capaz de criar esses meios e, em vez disso, confia num grupo revolucionário que promete tomá-los de seus atuais detentores e distribuí-los democraticamente, aí é que o reino da injustiça se instala de uma vez por todas. Para distribuir poderes, é preciso primeiro possuí-los: o futuro distribuidor de poderes tem de tornar-se, antes, o detentor monopolístico de todo o poder. E mesmo que depois venha a tentar cumprir sua promessa, a mera condição de distribuidor de poderes continuará fazendo dele, cada vez mais, o senhor absoluto do poder supremo.

Poderes, meios de agir, não podem ser tomados, nem dados, nem emprestados: têm de ser criados. Caso contrário, não são poderes: são símbolos de poder, usados para mascarar a falta de poder efetivo. Quem não tem o poder de criar meios de poder será sempre, na melhor das hipóteses, o escravo do doador ou distribuidor.

Na medida em que a expressão “sociedade justa” pode se transmutar de figura de linguagem em conceito descritivo razoável, torna-se claro que uma realidade correspondente a esse conceito só pode existir como obra de um povo dotado de iniciativa e criatividade – um povo cujos atos e empreendimentos sejam variados, inéditos e criativos o bastante para que não possam ser controlados por nenhuma elite, seja de oligarcas acomodados, seja de revolucionários ambiciosos.

A justiça não é um padrão abstrato, fixo, aplicável uniformemente a uma infinidade de situações padronizadas. É um equilíbrio sutil e precário, a ser descoberto de novo e de novo entre as mil e uma ambiguidades de cada situação particular e concreta. No filme de Sidney Lumet, “The Verdict” (1982), o advogado falido Frank Galvin, esplendidamente interpretado por Paul Newman, chega a uma conclusão óbvia após ter alcançado uma tardia e improvável vitória judicial: “Os tribunais não existem para fazer justiça, mas para nos dar uma oportunidade de lutar pela justiça”. Nunca me esqueci dessa lição de realismo. A única sociedade justa que pode existir na realidade, e não em sonhos, é aquela que, reconhecendo sua incapacidade de “fazer justiça” – sobretudo a de fazê-la de uma vez para sempre, perfeita e uniforme para todos –, não tira de cada cidadão a oportunidade de lutar pela modesta dose de justiça de que precisa a cada momento da vida.
Por: Olavo de Carvalho  OrdemLivre.org, 1 de junho de 2011
Do site: http://www.olavodecarvalho.org/

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

O CONSERVADOR BRASILEIRO DO SÉCULO 21


Há muito ruído, para não dizer inconsistências, sobre o termo “Conservador” nos dias de hoje. Antes de generalizarmos sobre a origem e definição de conservadorismo, sobre um renascimento dos partidos conservadores e liberais e sua situação no Brasil, é importante que se faça um curto resumo sobre o que seria razoável um conservador representar considerando os aprendizados das revoluções liberais do século 19, as armadilhas das revoluções socialistas do século 20 e os novos desafios políticos, econômicos e sociais que se apresentam nesse início de século 21.

Em resumo, há valores exclusivamente conservadores e outros valores que são comungados com liberais.

Dentre os valores vistos como exclusivamente como conservadores estão:
Soberania: o conceito de nação estado, em oposição a um mundo sem fronteiras, é o conceito de maior eficácia na proteção ao cidadão e sociedade. A nação deve ser soberana, livre e independente tanto em território, quanto em autonomia para determinar suas próprias regras. Nenhum governo ou organização internacional deve ter poder ou ger sobre as políticas internas de uma nação soberana.
Segurança Nacional: As forças armadas e de segurança pública devem, em critério de prioridade e exclusividade, proteger o cidadão brasileiro, e não o governo e burocracia, ou interesses de organizações estrangeiras. Essas forças de segurança devem estar sempre modernas e prontas para defender a cidadania e integridade territorial, assim como interesses nacionais em campo internacional.
Cidadania: o cidadão tem direitos e obrigações distintos e superiores ao do não-cidadão. A cidadania é, portanto, um privilégio que deve ser observado como tal, pois denota comprometimentocom a sociedade civil que defende aquela nação. O cidadão é o mestre e isso tem valor.
Moralidade, tradição e valores de base: toda nação desenvolve valores desde sua fundação. São valores religiosos, sociais, comportamentais e éticos. Cabe a sociedade defender seus valores e ao Estado garantir que as escolhas da sociedade sejarespeitadas. Não cabe ao Estado determinar valores, e nem permitir que governos e burocracias tenham qualquer tipo de gerência sobre esses valores. Essa última afirmação é essencial para a evolução do conservadorismo no Brasil, já que hoje o Estado tem e exerce o poder de moralizar e criar valores, destruindo de forma ativa os valores da sociedade brasileira. Precisamos de líderes dignos que respeitem esses valores? Certamente. Mas o Estado não permitir que governos tenham o poder moralizante é o melhor seguro contra o risco que uma eleição fraudulenta eleja corruptos e imorais.
Família: a integridade da família é inviolável e essencial para a sobrevida da cidadania e da nação-estado. Tudo que se propõe a redefinir, relativizar ou limitar o conceito de família tradicional é um risco para a sociedade e para a segurança nacional. A tolerância para com as famílias não-tradicionais deve ser sempre observada, mas o Estado, em proteção a si próprio, não deve permitir ações de qualquer governo que atentem contra organização da família tradicional, ou deixar de criminalizar práticas como a pedofilia, por exemplo.
Restrição ao aborto: ao atentar contra a vida e a ordem natural, o aborto como princípio não deveria ser discutido. Deve ser proibido. A proteção da vida da mãe ou da vida gerada por violência sexual são condições a serem revistas caso a caso, mas não numa discussão de princípio, mas sim como uma medida de proteção à vida e ordem natural.
Restrição às Drogas: a proibição de drogas é um ato de intervenção de Estado em proteção. Para aqueles que acham que o caminho é a liberalização, devemos lembrar a eles que antes daproibição não havia restrições. A limitação e proibição de uso de algumas drogas foi um processo gradual, em decorrência das experiências nocivas das drogas mais letais e suas consequências.
O princípio da subsidiariedade por Galvão de Souza

Liberais não estão em desacordo com muitos dos pontos acima, mas talvez divirjam sobre como defende-los. Liberais e conservadores compartilham valores muito importantes de forma integral. Esses são:
Subsidiariedade: em termos de organização esse termo significa descentralização. Esse princípio dita que a instância de governo acima da família e da comunidade (ou seja, bairros, cidades e estados) só poderá exercer funções com a permissão dessas comunidades, e apenas quando elas não puderem fazê-lo por conta própria. Ou seja, a prefeitura, o estado e a União só devem ter jurisdição sobre aquilo que o cidadão e as comunidades permitirem, ou para mediar conflitos entre elas. Em teoria, regras impostas por prefeitos, governadores e presidentes não valem sem a permissão das famílias e comunidade.
Representatividade: Países de sucesso têm Estados capazes de proteger suas comunidades de governantes e burocratas mal-intencionados, ao passo que países fracassados têm Estados que protegem governantes e burocratas contra a vontade das comunidades. Para que o Estado efetivamente represente suas comunidades tem de haver representatividade, e até agora o sistema eleitoral distrital é o único modelo eleitoral capaz de fazer isso.
Transparência: tudo que é público deve ser transparente, sobretudo impostos, sua origem e sua aplicação.
Autodeterminação: autonomia para que estados e municípios se organizem para atender aos desafios locais, e determinem sua realidade jurídica e tributária, e assumirem ao máximo competências que hoje estão nas mãos da União.
Direito à propriedade: terra, poupança, imóveis, ideias, herança, maquinas, estoque ou qualquer espécie de capital ou patrimônio (móvel ou imóvel) dos cidadãos são invioláveis, não cabendo a qualquer instância de governo ou burocracia a autoridade para relativizar esse direito. Cabe ao Estado apenas a proteção desse direito absoluto do cidadão, não deixando que governos relativizem o conceito em prol de qualquer causa.
Livre iniciativa “laissez-faire”: todo cidadão deve ser livre para trabalhar, gerar e acumular riquezas. O Estado não deve coibir nenhum tipo de atividade, desde que ela não constitua crime ou um prejuízo à saúde e segurança pública. O Estado não deve nunca regular ou legislar sobre qualquer atividade, nem permitir que governos e burocracias criem regulamentações limitadoras.
Ordem natural: respeito ao misterioso processo de formação natural da cultura e do histórico de nossa sociedade. É o respeito às forças da natureza e à condição humana, além da compreensão racional. É a negação de artificialismos e coletivismos progressistas construídos pelo ser humano. É um compromisso com a energia vital e inexorável de uma sociedade livre no comando de suas escolhas. A defesa da ordem natural significa o respeito à continuidade mística, e de que nossa integridade social prevalecerá sem termos a burocracia como guia.
Defesa pessoal e patrimonial: todo cidadão deve ter o direito inalienável de zelar por sua proteção, de sua família e de seu patrimônio. As forças de segurança do Estado não são capazes de zelar pela integridade física e patrimonial de todos, não de forma perfeita e infalível. O desarmamento é uma legislação intervencionista que atenta contra a proteção à vida, contra a subsidiariedade e ordem natural. Desarmar o cidadão de sua capacidade de defesa, deixando-o indefeso às incertezas e ao acaso da violência, é uma tirania.
A Aplicação do Valores Conservadores

Os pontos acima definem, a grosso modo, um conservador e como ele julga a política, economia e sociedade. Mas há um item essencial que faz parte do conservadorismo que precisa ser isolado: organização de Estado. Facilita entender o conservador quando se entende como tudo isso se organiza. Nesse quesito o ponto de partida é a obrigatoriedade da separação entre Estado e governo. O Estado, ou seja, a constituição da União, deve ser responsável apenas pela segurança, justiça e ordem institucional. Nada além disso.

Essa percepção, assim como muitas postuladas acima, adveio da incorporação das revoluções liberais no pensamento conservador. A partir desse novo formato liberal, a Constituição deve ser vista como uma força protetora dos indivíduos e das famílias contra a ação de governos e burocracias locais que violem a subsidiariedade e se tornem poderes tirânicos. Esse arranjo se provou estabilizador, o que é do agrado do conservador. Em deixar livre a organização dos governos locais, esse arranjo liberal blinda o poder central de intempéries politicas geradas nas comunidades. Na outra ponta, os governos locais por sua vez ficam responsáveis pela política de governo, política econômica e política social.

Como aplicar essa percepção? Um governo eleito pode ter um viés conservador ou progressista, cada um com suas ideias de como o país deve ser conduzido e o que precisa ser melhorado. Isso passa por políticas e medidas temporárias, pertencentes àquele poder executivo e legislativo eleito. Essas políticas variam, e podem ser mantidas ou substituídas por um novo governo eleito, mas nunca devem se tornar parte do Estado, fixadas na constituição federal. Quanto mais o Estado Liberal adota politicas permanentes, mais ele se transforma em um Estado Social (mais sobre isso adiante).
Welfare State vs Liberal State

Os conservadores, assim como alguns liberais, não são contrários a programas assistenciais, por exemplo. Eles apenas defendem que políticas sociais sejam medidas temporárias e locais, executadas pela entidade pública local (prefeitura ou governo estadual), ou por uma associação não governamental. Essas políticas não devem nunca se tornar uma Política de Estado. Um conservador entende que qualquer programa de governo deve ser revogável pelas famílias locais. Esses são os conceitos e valores básicos de um conservador. Se você concorda com todos eles, então você é um conservador.

Tendo isso em mente, é necessário estabelecer que não existe algo como um Estado Conservador ou Progressista. Um Estado, como arranjo de poderes, é apenas Liberal ou Social, conforme você entenderá mais além neste artigo. Desta forma, sendo Estados apenas liberais ou sociais, restam aos governos serem conservadores ou progressistas. Um Estado pode ser liberal e ter um governo progressista, por exemplo. Isso acontece frequentemente, já que governos são transitórios e frequentemente eleitos para resolver problemas pontuais.

O quadro abaixo é um breve resumo dos valores conservadores organizados por instância:
Instância Visão Conservadora
1- Organização de Estado Comando central da soberania e proteção da cidadania, comando local em subsidiariedade às famílias e autodeterminação das comunidades.
2- Politica Econômica Livre Iniciativa e propriedade privada.
3- Politica de Governo Segurança, representatividade e transparência.
4- Politica Social Ordem natural e família.


Agora que resumimos e organizamos os preceitos básicos do pode vir a ser um conservador brasileiro no século 21, vamos em frente com seu surgimento, as distensões dos partidos conservadores e liberais, o conservadorismo no Brasil e também o que são Estados liberais e Estados Sociais.
A origem do conservadorismo

Somente a análise desde a origem permite o real entendimento de um assunto. Quando falamos sobre o termo “Conservador” e o que ele representa, precisamos de perspectiva e observação de contexto. O conservadorismo surge no final do século 17, quando as Revoluções Liberais mudam o mundo, em um processo que durou até o final do século 19. Essas revoluções liberais foram responsáveis pelo fim do modelo de Estado Absolutista, ou absolutismo europeu, a reintrodução da democracia e também pelo adeus à tirania de Estado. A grosso modo, essas revoluções liberais eram a favor da limitação de poderes públicos, da ordem natural, da autodeterminação dos povos e, é claro, de uma constituição que protegesse tudo isso, e muito mais.

Mais do que uma ruptura exclusivamente política, as revoluções liberais foram também econômicas. O liberalismo econômico trouxe outras contraposições importantes, como o combate ao mercantilismo e o patrimonialismo na forma da adoção do “laissez-faire” e da proteção da propriedade privada. Claro que Estados Absolutistas da época variavam em grau de absolutismo, mas o liberalismo ampliou o escopo muito além da zona de conforto dos reis, clero e aristocratas mais liberais.
O que é o laissez-faire e seu surgimento
O que é “laissez-faire”

Essa expressão francesa é o símbolo do liberalismo econômico, e nasceu a partir da expressão francesa “Laissez-faire, laissez-aller, laissez-passer”, que significa em português deixe fazer, deixe ir, deixe passar. O laissez-faire é a mais pura expressão do capitalismo e como ele deve ser livre para funcionar. No laissez-faire, o Estado deve deixar as pessoas fazerem, irem e passarem como desejarem. Atribui-se essa expressão ao comerciante francês Le Gendre que, ao ser perguntado por Jean-Baptiste Colbert, ministro de Estado e das Finanças do Rei Luís XIV, da França, sobre como o Estado poderia ajudá-lo (Que faut-il faire pour vous aider?), respondeu de forma simples “laisser nous faire”. Deixe nos fazer. Ou seja, o Estado é a exemplificação do ditado: muito ajuda quando não atrapalha.

Essas contraposições foram todas contrarias à centralização de poderes e a favor da descentralização e subsidiariedade. Foram lutas contra os privilégios e abusos de governantes, e a favor da igualdade perante as leis e proteção de direitos individuais naturais. As reformas liberais resgataram o voto e o governo distrital, a real democracia.
O que é o Estado Liberal

Um novo modelo ocidental de organização política nacional nasceu das revoluções liberais: o Estado Liberal. Para melhor compreender esta definição, entenda por “Estado” a Constituição que define o território, o cidadão, as instituições públicas, os princípios, as leis, as normas, os direitos e obrigações e as competências dos poderes públicos eleitos ou nomeados, que exercerão poder em nome do Estado.

Graças à Revolução Norte Americana e mais tarde à Francesa, além de outras revoluções liberais ocorridas na Europa, países que antes não tinham constituição passaram a ter uma, e aqueles que já tinham carta magna passaram a adotar uma visão de que primava pela limitação de poderes de governo e pelo “laissez-faire” econômico. Cabe aqui um detalhe interessante. Berço do regime soviético e do comunismo que ainda hoje desola economias e populações, a Rússia só teve sua primeira constituição em 1906, criada como forma de amenizar a rejeição dos russos à imagem do governo do czarista. Isso não funcionou, visto que pouco mais de dez anos depois a revolução russa alijou o Czar do poder. Ou seja, ao manter-se absolutista e antidemocrático, o governo do Czar fomentou o crescimento dos movimentos de esquerda. Outra curiosidade é que a primeira eleição democrática na Rússia aconteceu apenas em 1991, com o fim do regime soviético. Fica claro que o socialismo, tido pela esquerda como a forma mais democrática de governo, não é tão democrático assim.

É óbvio que o grau de limitação imposto ao Estado entre as nações europeias variava tremendamente, assim como o grau de “laissez-faire”, mas já detectamos nos séculos 18 e 19 uma ruptura com o absolutismo e mercantilismo, típicos do “Antigo Regime”.
Quando surgiu o conservadorismo?

Somente após a criação dos Estados Liberais europeus e americanos, já no século 19, é que surgiu o que convencionou-se chamar de conservadorismo. Por ter pecado nos excessos do liberalismo, a Revolução Francesa foi talvez a que mais contribuiu com o surgimento do conservadorismo. Fundou-se nessa época os primeiros partidos conservadores, que passaram a reagir contra os partidos liberais e a limitar o movimento liberal.

A grosso modo, os partidos conservadores de então defendiam maior centralização política, mais controles e limites políticos, um exército permanente e intervenção política, social e econômica ocasionais, desde que visando a proteção do bem comum. A premissa dos conservadores do século 19 era que o povo não tinha capacidade para autodeterminação. O maior receio desses conservadores era a perda do controle interno, o que poderia colocar a nação-estado à mercê de alguma força estrangeira.

Os partidos liberais, por outro lado, defendiam a descentralização política, maior amplitude para o voto, autodeterminação das comunidades e nenhuma intervenção do Estado na economia e sociedade. As tradicionais forças de defesa do poder central eram vistas como uma ameaça aos preceitos liberais, já que do ponto de vista desses liberais a soberania se tornava mais fragilizada exatamente por ter um comando central, capaz de negociar a rendição nacional a uma força estrangeira invasora.

Vemos assim que enquanto os Conservadores temiam a perda do controle, os Liberais temiam a tirania de Estado.

Os países europeus absolutistas que testemunharam a Revolução Francesa sucumbiram mais tarde com a ascensão de Napoleão, que invadiu e promoveu reformas liberais nos países invadidos. Napoleão passou, mas as reformas ficaram.

Cabe aqui algumas ressalvas. Embora inicialmente divergentes nas questões acima, Conservadores e Liberais acabaram por concordar com a necessidade do que depois se denominou por Estado Liberal. Os poderes agora não eram mais arbitrários, mas sim constitucionais e limitados. Introduziu-se a defesa dos direitos individuais, do direito à propriedade, da igualdade perante a lei e da aplicação do princípio da subsidiariedade como modelo organizacional. Ao final do século 19 Liberais e conservadores se tornaram, portanto, vertentes da mesma corrente política: defensores do novo Estado Liberal, apenas discordantes sobre como e quem deveria defende-lo.
Thomas Jefferson e Alexander Hamilton

O exemplo mais claro dessa divisão são os Estados Unidos, onde esse debate foi muito marcante entre fundadores daquele país, conhecidos como os “Founding Fathers”. Conservadores como Alexander Hamilton defendiam a criação de um poder central com exército permanente, visto como uma questão de segurança e soberania nacional. Thomas Jefferson, um liberal, pregava exatamente o oposto, e defendia que “todo cidadão deve ser um soldado”, pois assim os Estados Unidos não dependeriam de um exército comandado por burocratas. Essa é a origem do artigo constitucional que garante aos americanos a posse de armas. Séculos depois vemos que ambos tinham razão e como as duas vertentes se tornaram viáveis ao longo do tempo. Ambos eram favoráveis à proteção da independência dos EUA, apenas propunham formas diferentes de fazê-lo. Era esse tipo de debate que predominava no jogo partidário de então.

Quase todos os países do ocidente adotaram o Estado Liberal como modelo ao final do século 19. Mas dentro do bem há a semente do mal, e foi nessa mesma época que surgiram os primeiros partidos socialistas e socialdemocratas na Alemanha. Pouco tempo depois surge outra quebra de modelo: a Revolução Russa financiada pelos alemães. Ao final da Primeira Guerra Mundial, em 1918, a Alemanha derrotada entra em caos político. Seu Kaiser (termo alemão para Imperador) Wilhelm II (Guilherme II, em português), um dos causadores da Primeira Guerra Mundial, fugiu para exilio na Holanda. Com isso soldados alemães fizeram um levante nos moldes da revolução Russa e os partidos socialdemocratas, que dominavam o movimento socialista da Alemanha, convocaram uma assembleia constituinte.
O que é o Estado Social

Foi em decorrência desse levante e articulação socialista que a Alemanha proclamou uma República, conhecida como “A República de Weimar”, e adotou uma novidade: uma nova constituição que introduzia o Estado Social no ocidente. Foi o primeiro país desenvolvido a adotar esse modelo, que centralizava ainda mais o poder, substituía direitos individuais por direitos coletivos, além de nacionalizar tanto a propriedade como a atividade econômica. O modelo político era na forma de um semipresidencialismo autoritário, e o modelo econômico era baseado no modelo comunista Soviético.

O resultado se provou um desastre sem precedentes: instabilidade política, hiperinflação e a criação da base jurídica perfeita para o populismo nazista. Diga-se de passagem, de 1933 a 1945, quando Hitler assume o poder na Alemanha, os nazistas pouco alteraram a constituição socialdemocrata da República de Weimar.
Criança brinca de empilhar dinheiro na época da hiperinflação da República de Weimar

Em muitos aspectos o Estado Social da República de Weimar se tornou em uma versão atualizada do absolutismo e do mercantilismo, um representante moderno do Antigo Regime (em francês Ancien Regime), o modelo absolutista francês que precedeu a Revolução Francesa. Uma diferença é que nessa versão o poder absoluto seria comandado pela a burocracia, e não mais pela a Coroa, o Clero e a aristocracia.

A República de Weimar validou a revolução Russa e a internacionalização do movimento socialista na Europa. Ao adotar a narrativa da liberdade, igualdade e justiça social, os proponentes do Estado Social avançaram internamente dentro de todos os países do ocidente. A consequência disso foi devastadora, e os diversos países que há pouco tempo haviam adotado um modelo de Estado Liberal foram compelidos a criar programas sociais e burocracias centrais. Alguns desses países chegaram até a modificar suas constituições. Os Estados Liberais não estavam preparados para essa nova onda revolucionária, e os mais fracos institucionalmente resolveram adotar constituições novas. Esse foi o caso do Brasil.
O Estado Social no Brasil

De 1824 até 1930 as constituições do Império e da Primeira República eram liberais. Mas uma figura admirada por quase todos os políticos brasileiros, o ditador fascista Getúlio Vargas, foi um dos expoentes responsáveis pela introdução do Estado Social (em inglês welfare state) no Brasil. Estamos atualmente em nosso quinto Estado Social, fato definido por 5 constituições socialistas desde 1934. Pontuo esses detalhes em meu livro.

Se reduzirmos ao máximo os conceitos, no Estado Social o governo é o todo poderoso, e age de acordo com os interesses de classes sociais em detrimento dos direitos individuais. Por definição, o Estado Social coletiviza os interesses da sociedade e cria burocracia para atender esses interesses. A verdade é que somos considerados um Estado Social, onde tudo funciona a partir de hierarquia e burocracia.
Getúlio Vargas à época da Constituição de 1934

Embora dotado de uma narrativa “social”, a aplicação termina sempre sendo muito diferente quando colocado em prática. O Estado Social se torna paternalista, interventor, centralista e violador do princípio da subsidiariedade e da ordem natural. Os pilares do Estado Social parecem benéficos e de fácil aceitação, mas na verdade dependem da alta regulamentação e tributação de todas as atividades humanas. São seus pilares: o sistema de saúde, o sistema de previdência, o assistencialismo, as leis trabalhistas, a justiça do trabalho, a estatização de setores da economia e da educação. Tudo isso é controlado pela burocracia de Estado e pago obrigatoriamente pelos cidadãos, através de impostos individuais diretos, e pelos empreendedores através dos tributos sobre atividades empresariais. Soma-se o custo alto à incompetência gerada pelo populismo e pela burocracia, e a consequência é um cidadão que, além de ficar com menos poupança pelos impostos altos, fica sem os benefícios.

Por permitir a criação de um Estado gigante e com capilaridade, o Estado Social se tornou notoriamente a base jurídica sobre a qual, com frequência, nasceram governos populistas e oligarquias perpétuas. Políticos mal-intencionados utilizam as boas intenções sociais para tomar o poder, e frequentemente Estados Sociais deterioram para sistemas totalitários fascistas, socialistas ou comunistas. Nesses cenários não há nem o bem-estar social, nem a liberdade e muito menos a democracia.
O Fim do Conservadorismo no Brasil

O que aconteceu com os conservadores e liberais brasileiros quando surgiu o Estado Social? Desde 1934 e a Constituição de Vargas, as ideias liberais praticamente desapareceram do debate e deixaram de ser uma força política efetiva, mas as ideias conservadoras, por outro lado, se modificaram e passaram a ser representadas por alguns aspectos do Estado Social. Mas para efeito de coerência na definição, tanto conservadores como liberais tiveram seu fim de jura em 1934, com Getúlio Vargas e sua Constituição socialista.
A fraqueza ideológica

A falta de resistência à criação de um Estado Social denota a fraqueza e a falta de coesão ideológica por parte de conservadores e liberais brasileiros no final da Primeira República. No mesmo período que sucumbíamos ao ditador Getúlio, os conservadores nos Estados Unidos foram uma força de resistência contra a criação de um Estado Social. O mesmo aconteceu na Inglaterra. Isso não quer dizer que esses países não adotaram programas sociais mais intensos entre 1930 e 1945, apenas que eles resistiram à adoção de uma nova constituição, e restringiram ao máximo a criação de um Estado Social. Até os conservadores na Alemanha arrasada do pós-Segunda Guerra tiveram mais coesão ideológica. Em 1949 os conservadores alemães reintroduziram um Estado Liberal naquele país, e ocuparam a chefia de Estado nos 47 dos 69 anos desde então.

Nos dias de hoje, do ponto de vista da política comparativa, vemos que somente 20 dos 200 países no mundo são organizados constitucionalmente como um Estado Liberal. Os outros 180 são estruturados como alguma variante de Estado Social. Essa sustentação do Estado Liberal se deve à força da sociedade e dos líderes políticos conservadores e liberais nesses poucos países. As demais nações caíram ante a tirania do Estado Social. Um conservador coerente e ciente do significado e suas consequências defenderá sempre um arranjo de Estado Liberal, nunca um Social.
O Estado Liberal

Um Estado Liberal garante os direitos individuais, mantendo-os acima de qualquer classe social. Ele protege as escolhas das famílias ao limitar a criação de burocracia, e tenta aplicar o princípio da subsidiariedade. O Estado Liberal teme a corrupção do sistema representativo, e por isso limita ao máximo os poderes dados aos representantes, dando assim a chance da sociedade se defender fisicamente contra a tirania de Estado.

Por que o Estado Liberal não pode ser responsável por tudo? Porque ele não quer e não precisa fazer nada que as famílias por si próprias não possam fazer. Isso evita o custo do imposto alto, reduz ao máximo a burocracia e impede a proliferação da corrupção e do desperdício do dinheiro público. Isso também impede que o populismo sequestre o Estado. É por isso que ao invés de criar programas sociais, um Estado Liberal fomenta doações para o terceiro setor e iniciativas locais. Programas assistencialistas existem, mas tendem a ser locais, temporários, objetivos e são revogáveis, nunca firmados em constituição.

Um Estado Liberal permite à sociedade poder se autodeterminar localmente, removendo assim todo e qualquer representante público desnecessário. A função prioritária de um Estado Liberal sempre foi e sempre será a segurança, a justiça e ordem institucional.

Em termos gerais, partidos conservadores e liberais mundo afora, historicamente defenderam o conceito de Estado Liberal de forma ativa. A alternância no poder entre conservadores e liberais era comum no século 19, já que suas diferenças eram meramente sobre políticas de governo e sociais, e raramente sobre a organização do Estado ou quanto a política econômica propriamente dita.

Com o surgimento do Estado Social no século 20 tudo mudou, e a maioria dos países da América Latina e Europa alteraram suas constituições para refletir a nova moda. Ao final do século 20, quando o modelo de Estado Social provou ser massacrante para a economia nacional, a maioria dos países europeus aproveitaram a oportunidade para remover princípios do Estado Social de suas constituições; mesmo que alguns resquícios persistissem.

A situação do continente sul-americano foi diferente, já que a maioria dos países mantiveram suas constituições inalteradas, e alguns até as reforçaram seu Estado Social, como foi o caso do Brasil.

Por estarem ainda em desenvolvimento, essas nações e suas populações querem que o Estado lhes garanta tudo, para que assim elas atinjam o desenvolvimento econômico. O que elas não entendem é que o Estado Social é, na verdade, um grande freio de mão: ao ser acionado não permite ao carro sair do lugar, e se ele sair mesmo assim, não vai conseguir andar tão rápido nem ir tão longe antes de uma falha mecânica do automóvel.

Para quem sobra a conta do conserto? O dono. Neste caso, o cidadão contribuinte. Um país só se desenvolve economicamente com sustentabilidade através do Estado Liberal, pois o governo deixa de gastar e apenas garante um ambiente seguro para que a população prospere.

A grande diferença entre o Estado Liberal e o Estado Social é que no Estado Liberal o governo sobrevive das riquezas de sua população, enquanto no Estado Social as pessoas sobrevivem das dívidas do governo, já que um governo não gera riquezas, apenas arrecada impostos. Quanto antes as pessoas entenderem isso, melhor.
O real peso do Estado Social (welfare state) sobre a economia

Isso tudo parece estar mudando. Observo no mundo ocidental uma ressurgência tanto do conservadorismo moral, quanto do liberalismo político e econômico. O Brasil está nessa mesma onda, embora alguns conservadores e liberais brasileiros apoiem o atual Estado Social, ou partes dele. Algumas pessoas que se dizem conservadores defendem o sistema público de previdência, as leis trabalhistas e as estatais, algo extremamente contraditório. Explico.
O sistema previdenciário deve ser livre, cabendo às pessoas escolher como (e se) querem poupar para a aposentadoria. Cabe ao Estado apenas garantir que as opções privadas sejam legais, e coibir abusos ou esquemas ilegais. Sistema previdenciário estatal é monopólio estatal, e como bem sabemos, isso não funciona.
A Consolidação das Leis Trabalhistas foi um dos instrumentos que feriu de morte o Estado brasileiro. Ele onera o cidadão e o empresário, tirando dinheiro do bolso dos dois para sustentar duas entidades que não produzem riqueza, e que vivem às custas do trabalho alheio: o Estado e sua burocracia, e as entidades sindicais. Cabe aos cidadãos e empresários escolherem como querem trabalhar juntos. O Estado deve garantir apenas que nenhuma lei seja violada, e que não haja exploração de nenhuma das duas partes. Leia mais aqui.
Dizem eles que as estatais são estratégicas ao país, e que cabe ao Estado defende-las. Errado. Um conservador não defende que o Estado defenda estatais estratégicas, mas que ela defenda o funcionamento pleno e justo de suas empresas privadas, que geram riquezas e prosperidade, sejam elas estratégicas ou não. Estatais devem ser evitadas pois fogem à função do Estado.

Outro equívoco comum é a questão religiosa. Muitos pensam, inclusive conservadores, que a profissão do catolicismo é requisito obrigatório para o conservadorismo. Na verdade, conservadorismo não se limita a uma fé ou igreja específica. Há conservadores em Israel, Alemanha, Estados Unidos ou Inglaterra, por exemplo, países em que o catolicismo é minoria. O conservador defende a manutenção da tradição da sociedade e suas instituições, o que frequentemente contempla valores, mas não uma fé ou religião em específico. Isso dito, afirmar que o Estado Liberal possa funcionar sem uma sociedade cristã, ou que no mínimo aceite os valores cristãos, é um erro crasso.

Não são só alguns conservadores que estão desalinhados, mas liberais também. Vejo frequentemente liberais defendendo a tutela do Estado sobre programas de educação e saúde. Se você leu este texto até aqui não preciso explicar novamente porque isso é ruim. Repetindo, a função de um Estado Liberal é a segurança, justiça e ordem institucional, que contempla as relações internacionais.

O meu ponto é sobre Constituição e competência. A defesa e um ou outro programa assistencialista, sendo ele no nível de governo de estado ou municipal, não é um problema, pois uma cidade ou unidade federativa tem a capacidade de criar e monitorar esses planos de maneira muito mais eficiente que o poder central da União. Isso é subsidiariedade, pois o eleitor do estado e da cidade tem a chance de cobrar por essa eficiência, ou até mesmo cobrar por sua interrupção de maneira mais direta. O problema está em perpetuar esses planos, colocando-os como uma obrigação permanente do Estado na letra da constituição, tornando o assistencialismo em uma competência da União. Essa é a primeira saída em direção ao populismo, como bem vimos no Brasil atual.Espectro político baseado na auto-declaração dos presidentes dos partidos. Fonte: Veja

Os Partidos de Hoje

Considerando que vivemos num contexto de Estado Social há quase 100 anos, fica mais fácil de se imaginar que não existam partidos conservadores e liberais de fato no Brasil. Todos os partidos que compõe o congresso nacional de hoje defendem um Estado Social, variando apenas no grau da intervenção, e defendem em seus estatutos, sem exceção, os pilares e princípios que sustentam o arranjo de um Estado Social.

A ressurgência do conservadorismo e do liberalismo no século 21 torna o atual Estado Social mais instável do que ele já é por natureza. O Brasil vive um caso grave de anomia política, já que nossos políticos se veem como representantes legítimos da população através do voto, mas nossa população não enxerga nesses mesmos políticos nenhuma representação real. Se esse movimento conservador crescer na linha que aponto nesse artigo, o que tudo indica que deve acontecer, o atual Estado se tornará ainda menos capaz de proteger e representar as aspirações de nossa sociedade, o que fará com que a anomia fique ainda mais grave do que já está. Caso isso ocorra uma ruptura com o atual modelo Social se torna possível.

Partidos socialistas e socialdemocratas de toda espécie perceberam isso e já discutem uma nova constituinte, assinalando para um modelo semipresidencialista similar ao da Alemanha pré-República de Weimar. É saudável para os novos conservadores e liberais resistir a esse intento e, por assim o fazer, sustentar o atual modelo de Estado Social só para evitar que esse piore? Claro que não. Conservadores e liberais tem de unir forças e assumir liderança na discussão de uma nova constituinte. Só que isso depende do foco no objetivo de uma nova constituição: a criação de um Estado Liberal no Brasil.

Como eu já mencionei em minhas postagens, quanto mais rápido conservadores e liberais abondarem os partidos socialdemocratas, teremos maiores avanços. Temos novos partidos liberais que podem adotar pautas conservadoras, assim como partidos conservadores que podem adotar temas liberais. Ambos canais são válidos e muito benvindos. Compactuo com o cientista político, historiador e autor Bruno Garschagen quando ele aponta que o debate político no Brasil nunca foi tão enriquecedor e condizente com a visão de uma grande nação, assim como nos debates entre liberais e conservadores do século 19.

Pois bem, acho que esse debate vai recomeçar, mas com o acréscimo dos socialistas que lutarão pela sobrevivência política após a implosão de mais um modelo de Estado criado por eles.
O Finalmente

A última vez que falei sobre essa visão de Estado Liberal para a grande mídia fui taxado de “ultraliberal”. Alguns conservadores já achavam a mesma coisa, mas talvez por razões erradas. Para alguns liberais, libertários e anarco-capitalistas, sou considerado conservador demais, talvez pelas razões certas. Não me parece que nenhum desses grupos compreenda, não de forma plena, que a maior importância da nossa geração não é eleger um conservador ou um liberal por um mandato ou dois, mas sim alterar nossa base jurídica constitucional para sempre.

Tentar ser fiel a esse objetivo e redirecionar o debate político ao fio evolutivo da nossa política, retirando-a das percepções limitadas e do discurso raso, tem seu preço. Mas a formação de uma minoria bem orientada tem força e efetividade, o que faz todo esforço valer a pena.

Fica aqui a sugestão para uma autoanálise do leitor antes de se conclamar um conservador ou um liberal. Todos somos livres para nos identificarmos da forma que quisermos, mas sem o benefício dessa reflexão o efeito prático na política e no voto será, mais uma vez, o da escolha perpétua de candidatos com a mesma falta de coerência.

A criação de um Estado Liberal, e a obtenção de todos os seus benefícios, dependem tanto de uma boa revisão constitucional quanto de uma sociedade pronta para ser a comandante de suas escolhas. Esse novo contexto político e social já é possível, mas ainda não é uma realidade. Para que isso se materialize precisamos de uma massa crítica de eleitores, brasileiros que restabeleçam a coerência e percebam que já vivemos uma nova realidade.

“Estive certo quando tive todos contra mim“ Roberto Campos
17 de abril de 1917 – 09 de outubro de 2001 
Do site: http://lpbraganca.com.br