terça-feira, 24 de abril de 2012

Nenhum imposto é neutro;qualquer imposto sempre afetará os mais pobres



Em praticamente todos os países do mundo há um constante apelo para se tributar mais a renda dos mais ricos e utilizar essa receita adicional para fazer a "justiça social", promovendo uma ampla "distribuição de renda". O problema de se tributar os ricos, bem como todas as consequências econômicas negativas deste fato, já foram muito bem explicitadas neste artigo, de modo que o objetivo aqui será outro. O objetivo será explicar por que qualquer tipo de imposto, mesmo aquele voltado exclusivamente para as rendas mais altas, sempre acabará inevitavelmente sendo repassado aos mais pobres, de um jeito ou de outro. Em todo o debate ideológico acerca do capitalismo, há duas visões opostas que curiosamente partem do mesmo princípio: tanto os detratores do capitalismo quanto seus defensores dizem se tratar de um sistema puramente individualista, em que cada um age por conta própria, pensando exclusivamente no seu bem. Seus detratores condenam essa exortação à independência; já os defensores glorificam-na. Porém, nenhum dessas posições parece apreciar a verdadeira natureza do capitalismo, e o problema é que ambas essas concepções erradas estão hoje bastante difundidas. Há de fato um aspecto em que as pessoas realmente tentam ser as mais independentes possíveis: elas querem evitar pagar impostos. Todas as discussões a respeito de carga tributária e a respeito de quem — isto é, qual classe social — deve arcar com a maior parte do fardo tributário demonstram um total desconhecimento sobre como o mercado funciona. A esquerda sempre defendeu que os ricos sejam mais tributados, para que eles deem sua "contribuição justa" à sociedade. Já a direita costuma reagir dizendo que os mais ricos — tanto os indivíduos quanto as empresas — já respondem pela maior parte da receita tributária do governo, que a camada mais rica da população paga o mesmo volume de impostos que todo o restante da população combinada, e que boa parte da população não paga nada de imposto de renda. A esquerda então reage dizendo que a desigualdade permanece constante ou, em alguns casos, segue aumentando. Os ricos estão ficando mais ricos, e isso supostamente é ruim, pois precisamos de maior igualdade para atingir a justiça social. E por aí vai. Não irei aqui entrar na (i)moralidade de se defender a espoliação da propriedade alheia; o enfoque será puramente econômico. O problema em todo esse debate popular sobre impostos é que ele não leva em conta que os esforços para se evitar o pagamento de impostos vão muito além dessa pendenga sobre quais seriam as alíquotas de impostos "justas" e sobre quem deve pagar mais. Os esforços para se evitar o pagamento de impostos se estendem para todo o mercado. Se, por exemplo, a alíquota do imposto de renda que incide sobre as rendas mais altas fosse elevada em 20%, os trabalhadores de renda mais alta reagiriam a isso negociando um aumento salarial. (Dado que a esquerda quer muita gente pagando mais imposto, então creio ser correto dizer que ela defende maior imposto justamente sobre pessoas mais produtivas; caso contrário, seria na prática impossível elevar impostos permanentemente. Logo, por se tratar de pessoas produtivas, não é incorreto dizer que elas têm poder de barganha junto a seus empregadores). Se essas pessoas conseguirem um aumento salarial de, por exemplo, 10%, isso significa que praticamente metade do aumento de 20% da carga tributária foi repassada aos seus empregadores. Essa maior alíquota do imposto de renda reduziu os salários líquidos; o consequente aumento nos salários elevou os salários brutos. Neste ponto, a exata divisão do fardo tributário entre empregados e empregadores vai depender do relativo poder de barganha entre eles no mercado de trabalho. O que interessa é que os empregados de maior renda irão repassar uma parte, se não a maior parte, de qualquer aumento em seu imposto de renda para seus empregadores. Consequentemente, estes empregadores irão contratar menos empregados — ou tentarão contratar oferecendo salários bem menores, algo difícil —, e irão tentar repassar esse aumento havido nos custos trabalhistas para os consumidores, na forma de preços maiores. Esse aumento, no entanto, vai depender do relativo poder de barganha entre o vendedor e seus clientes, bem como do nível de concorrência no mercado. Os empresários irão repassar estes maiores custos aos consumidores até o ponto em que possam elevar preços sem sofrer uma relativamente grande perda no volume de vendas. Desta forma, os consumidores que ainda continuarem comprando a estes preços maiores estarão pagando parte do aumento na carga tributária que supostamente deveria afetar apenas os "ricos". Logo, vê-se que a direita está errada ao alegar que os mais pobres não pagam imposto de renda. Além de absolutamente toda a população pagar os impostos indiretos que estão embutidos nos preços dos bens e serviços, a classe média e os pobres também acabam pagando parte daquele aumento do imposto de renda que visava a atacar apenas os ricos. A esquerda, por sua vez, também está errada ao crer que todo o fardo de uma elevação de impostos pode ser confinada exclusivamente aos "ricos". A classe média e os pobres sempre acabarão pagando por um aumento de impostos sobre os ricos através dos maiores preços dos bens e serviços. Qualquer aumento no imposto de renda da camada mais rica da população — seja o 1% mais rico ou os 5% mais ricos — irá acabar por elevar os impostos que toda a população paga indiretamente. É possível contra-argumentar dizendo que o repasse para os preços desse aumento no imposto de renda seria muito pequeno. Talvez apenas uma pequena porcentagem da elevação do imposto de renda, o qual foi repassado aos empregadores, seria repassada aos consumidores na forma de preços maiores. No entanto, caso isso ocorra, o efeito de longo prazo será ainda pior. Se os empregadores tiverem de arcar com uma elevação marginal dos custos trabalhistas sem uma correspondente elevação marginal de sua receita, suas margens de lucro diminuirão. Redução nos lucros significa menos investimentos. E menos investimentos inibem um maior crescimento econômico. Um menor crescimento econômico significa menores aumentos nos salários e na renda de toda a população. Os efeitos dos impostos sobre o crescimento econômico, portanto, são bem mais indiretos do que se imagina. Economias de mercado são sistemas complexos nos quais os interesses de todos os indivíduos estão entrelaçados. Qualquer esforço para alterar os resultados gerados pela livre concorrência no mercado irá gerar consequências inesperadas e indesejadas. O conceito de justiça social é, por si só, algo indefinido e arbitrário. No entanto, mesmo se todos nós de alguma forma concordássemos com uma ideia de redistribuição "socialmente justa", simplesmente não haveria como estruturar a carga tributária (ou os gastos do governo) de maneira a alcançar este objetivo. A imposição de novos impostos altera preços e salários de maneiras impossíveis de serem previstas e difíceis de serem mensuradas mesmo após o fato já consumado. Esquerda e direita parecem ter definitivamente abraçado o mito de que o estado é perfeitamente capaz de restringir os efeitos da tributação a apenas uma determinada classe de pessoas. Embora não seja possível mensurar qual é realmente a verdadeira carga tributária que incide sobre cada pessoa, é perfeitamente possível entender que a real carga tributária é significativamente distinta daquela que havia sido planejada. Pessoas de alta renda não pagam tanto quanto as alíquotas oficiais sugerem. O mercado difunde o fardo tributário de uma maneira bem mais equitativa do que as pessoas imaginam. Tentativas de "fazer os ricos pagarem sua fatia justa" irá apenas aumentar o fardo tributário mutuamente compartilhado por todos, por meio de uma maior tributação indireta e oculta. Por outro lado, os benefícios de reduções de impostos são também mais amplamente compartilhados do que as pessoas imaginam. Há duas lições a serem tiradas disso tudo. A primeira é que nenhum de nós é realmente "independente" e está genuinamente "por conta própria", pois a economia de mercado é um sistema social. A segunda é que políticos não são capazes de utilizar impostos para alcançar objetivos específicos como uma "renda justa", pois a economia de mercado é extraordinariamente complexa e ajustável. E os políticos são qualquer coisa, menos oniscientes. Uma autoridade onisciente e onipotente até poderia impor alguma noção de justiça social; no entanto, a nossa realidade é que a justiça social é algo arbitrário e não exequível na prática. Estas duas lições possuem implicações profundas e extremamente importantes. Felizmente, há uma solução fácil para o problema da carga tributária. Dado que os benefícios do corte de impostos são também difundidos entre todos, qualquer corte no orçamento do governo que possibilite redução de impostos já seria um enorme "avanço social". Todos nós pagamos impostos desnecessariamente altos. Todos nós podemos pagar muito menos. Leia também: A carga tributária brasileira e os impostos sobre os mais pobres D.W. MacKenzie é professor assistente no Carroll College, em Montana, EUA. Tradução de Leandro Roque

A utilidade marginal decrescente é uma lei

Por que os diamantes, que são quase que meras bugigangas decorativas, são muito mais valiosos do que a água, uma substância sem a qual todos nós morreríamos? A resposta para esta pergunta milenar é que o valor de um bem é determinado na margem. Isto significa que não valoramos a categoria "diamantes" em relação à categoria "água"; não fazemos uma comparação direta entre ambos os produtos, que são distintos não apenas em sua composição, como também em suas finalidades. O que realmente fazemos é valorar uma unidade a mais de diamante em relação a uma unidade a mais de água. Este é o conceito de margem. A água é um bem superabundante. Diamantes não. Este é um dos motivos por que um diamante é tão caro, ao passo que a água é financeiramente acessível a todos. Isso também ilustra um importante ponto acerca de tomadas de decisões: em vez de "estabelecer prioridades" e enxergar as coisas como se fossem decisões do tipo 'tudo ou nada', devemos analisar as opções e estabelecer prioridades. Um dos mais importantes princípios da economia é o de que as decisões são feitas na margem, e um dos principais problemas da economia clássica envolvia a origem do valor. A lei da utilidade marginal decrescente é um dogma fundamental da economia, além de ser uma lei tão científica quanto a lei da gravidade (talvez seja até mais científica do que a lei da gravidade, pois ela pode ser deduzida de um axioma — o homem age — que é autoevidente e verdadeiro). A utilidade marginal não é decrescente só porque assumimos ser; a lei da utilidade marginal é uma implicação do axioma da ação, e não meramente uma suposição ad hoc. A "utilidade" que uma pessoa obtém ao consumir um bem ou ao incorrer em uma determinada atividade é mais bem entendida quando se imagina um conjunto de desejos que podem ser satisfeitos ao se empregar determinados meios. (Utilidade não é um resultado matemático de uma função de consumo representada por um conjunto de números reais.) Seguindo esta definição, a "utilidade marginal" de se empregar uma unidade adicional de uma oferta homogênea de bens ou serviços deve ser entendida como o desejo adicional que pode ser satisfeito ao se empregar esta unidade marginal. Do axioma fundamental da praxeologia — que diz que a ação humana é o uso de meios para se chegar aos fins desejados — podemos ver que a utilidade marginal de se empregar a unidade n é preferível à utilidade marginal de se empregar a unidade n+1. Na linguagem da economia convencional, a utilidade marginal deve ser decrescente. Assim, imagine um indivíduo, João, que tem uma esposa, uma filha, um cachorro e a seguinte escala de valores: Alimentar sua família com um bolo Alimentar sua filha com um ovo Alimentar sua esposa com um ovo Alimentar a si próprio com um ovo Alimentar seu cachorro com um ovo Suponha que ele necessite de quatro ovos para fazer um bolo. Com seu primeiro ovo, ele irá alimentar sua filha, pois ele prefere isto a todos os outros conjuntos de desejos que podem ser satisfeitos com apenas um ovo. Com seu segundo ovo ele irá alimentar sua esposa, e com seu terceiro ovo ele irá alimentar a si próprio. Agora, suponha que João compre um quarto ovo. Isso nos leva a um possível falso juízo: o leitor mais desatento pode se sentir tentado a olhar para esta situação e exclamar, "Ahá! Com o quarto ovo, João pode alimentar toda a sua família com o bolo, arranjo este que ele claramente prefere a alimentá-la apenas com ovos mexidos! Portanto, é óbvio que a utilidade marginal do quarto ovo é maior que a utilidade marginal do terceiro ovo. Logo, a utilidade marginal está aumentando!" Mas esta linha de raciocínio ignora um ponto crucial: o quarto ovo só pode ser utilizado para fazer um bolo junto com os três primeiros ovos. Dado que a "utilidade marginal" é um conceito que pode ser aplicado somente a unidades homogêneas de uma dada oferta, "um ovo" deixa de ser a unidade relevante da análise. A homogeneidade das unidades é determinada pelo conjunto de desejos que podem ser satisfeitos com uma unidade de um bem; neste caso, a unidade relevante para a análise é "1 unidade = um arranjo de quatro ovos". Assim, a escala de valores de João passa a ser Alimentar sua família com um bolo Alimentar sua família com ovos mexidos Ele obviamente irá escolher alimentar sua família com um bolo. E, caso ele obtenha um segundo conjunto de quatro ovos, fará os ovos mexidos. O leitor astuto irá notar que a escala de valores listada acima foi elaborada de acordo com os desejos satisfeitos pela unidade marginal de um determinado bem, e não pelo bem em si. Nosso herói João não preferia intrinsecamente o primeiro ovo ao segundo; ele preferia alimentar sua filha a alimentar sua esposa. Se houvesse apenas um ovo disponível, ele teria de escolher entre fins concorrentes, e o fim que mais o satisfaz é alimentar sua filha. Já deve estar evidente que a lei da utilidade marginal é merecedora deste exato status epistemológico: uma lei. Como demonstrou Carl Menger, este teorema, que pode ser deduzido do axioma da ação, é mais do que apenas empiricamente demonstrável: ele é irrefutavelmente verdadeiro. Por: Art Carden, professor-assistente de economia e finanças no Rhode Island College em Memphis, Tenessee, além de ser membro adjunto do Independent Institute, localizado em Oakland, Califórnia. Seus papers podem ser encontrados na sua página no Social Science Research Network. Ele também escreve regularmente nos blogs Division of Labour e The Beacon.

Viagem aos Estados Unidos, de Alexis de Tocqueville

As notas de Tocqueville estariam fadadas ao esquecimento se não tivessem produzido A democracia na América. Alexis Charles Henri Clérel de Tocqueville pertence ao grupo de talentosos historiadores franceses – formado por François Guizot, Jacques Nicolas Augustin Thierry e Jules Michelet – que alcançou a maturidade intelectual no período da Revolução de 1830. O reinado que então teve início, depois de os liberais forçarem Carlos X a abdicar, durou até 1848, mas foi caracterizado por medidas contrárias às ideias que o novo rei, Luís Filipe de Orléans, ex-membro do Clube dos Jacobinos, dizia defender. Não bastou trocar, demagogicamente, a bandeira branca dos Bourbons pela tricolor da Revolução de 1789: sem conseguir a união de legitimistas, bonapartistas e liberais, Luís Felipe logo restringiria a liberdade para silenciar a oposição. Tocqueville, cuja família apoiava os Bourbons, aderiu ao novo governo “sem hesitação, mas sem ímpeto”, segundo seu amigo, Gustave de Beaumont, pois, apesar de jovem – tinha 25 anos –, já possuía “a faculdade [...] de ver mais rápido e mais longe do que os outros” e a sábia capacidade de manter distância dos acontecimentos políticos: “Essa exaltação moral que excita um grande movimento popular, o entusiasmo, o júbilo, as vivas esperanças que saúdam de hábito um novo regime, nada disso o tocava”. Magistrado desde 1827, Tocqueville parte, em 1831, com Gustave de Beaumont, para uma viagem oficial, a fim de estudar o sistema penitenciário dos EUA, desculpa utilizada para alcançar seu verdadeiro propósito: conhecer as experiências democráticas de um país nascente, afastar-se do direito, que o entediava, e dedicar-se ao estudo da política, sua paixão. Sabemos desses detalhes graças ao próprio Beaumont, autor da introdução do Viagem aos Estados Unidos, livrinho que reúne as anotações de Tocqueville, alguns lampejos, trechos de entrevistas – com políticos, diplomatas, juristas, religiosos, militares etc. – e parte diminuta das análises que serviriam à elaboração de um dos maiores clássicos da ciência política: A democracia na América. É também graças a Beaumont que conhecemos os lances heroicos da viagem, quando, nas proximidades de Pittsburg, os dois exploradores, que pretendiam “descer o Ohio e o Mississipi num barco a vapor até Nova Orleans”, são pegos desprevenidos pelo inverno, adiantado cerca de um mês. Sob o frio rigoroso e crescente, a dupla sofre grandes dificuldades – e Tocqueville chega a cair enfermo. O jovem, contudo, supera seus próprios limites e mostra ter uma personalidade obstinada, movida por “uma febre”, afirma seu amigo, que o “devorava sem trégua” – e o fazia tomar notas, de maneira incansável, em pequenas cadernetas, a fim de preservar suas primeiras impressões. Entre a decepção e a euforia Na introdução ao seu A democracia na América, Tocqueville afirma: “Na América, quis mais do que a América; busquei uma imagem da própria democracia, de suas tendências, de seu caráter, de seus preconceitos, de suas paixões; quis conhecê-la, nem que fosse para saber ao menos o que devemos dela esperar ou temer”. E parece ter alcançado seu objetivo, pois escreve, em sua anotações, o melhor elogio que a nação ainda jovem, ávida por superar a Europa, recebeu de um observador imparcial: [...] O mesmo homem pôde dar seu nome a um deserto que ninguém havia atravessado antes dele; ele pôde ver tombar a primeira árvore da floresta, construir no meio da solidão a casa do agricultor, em torno da qual se formou de início um povoado, e hoje transformado em vasta cidade. No curto intervalo que separa a morte do nascimento, assistiu a todas essas mudanças. Em sua juventude, habitou entre nações que já não existem; em sua vida, rios mudaram ou diminuíram seu curso; o próprio clima é outro em relação ao que viu outrora, e tudo isso não é em seu pensamento senão um primeiro passo numa carreira sem limites. Por mais poderoso e impetuoso que seja aqui o curso do tempo, a imaginação precede-o: o quadro não é assaz grande para ela; ela já se apodera de um novo universo. É um movimento intelectual que não pode se comparar àquele que fez nascer a descoberta do Novo Mundo há três séculos; e, com efeito, pode-se dizer que a América é descoberta uma segunda vez. E que não se creia que tais pensamentos só germinam na cabeça do filósofo; eles estão tão presentes no artesão quanto no especulador; no camponês bem como habitante das cidades. Incorporam-se em todos os objetos; fazem parte de todas as sensações; são palpáveis, visíveis, sentidos de certa forma. Nascido sob um outro céu, introduzido no meio de um quadro sempre movente, ele próprio movido pela torrente irresistível que arrasta tudo o que o avizinha, o americano não tem tempo para apegar-se a nada; ele só se acostuma à mudança, e acaba por vê-la como o estado natural do homem; sente a necessidade dela; bem mais, ama-a: pois a instabilidade, em vez de produzir-se para ele por desastres, parece engendrar em torno dele só prodígios... Mas suas primeiras notas, em 29 de maio de 1831, ainda em Nova York, deixam transparecer certa decepção: “Até agora, tudo o que vejo não me entusiasma em absoluto, porque estou mais agradecido à natureza das coisas do que à vontade do homem”. E completa: “Aqui a liberdade humana age em toda a plenitude de seu poder [...]; mas até o momento, esta febre parece só aumentar as forças sem alterar a razão”. Tudo vai bem, o país se desenvolve, mas “a agitação política parece-me muito acessória”. Ainda assim, percebe aquele que talvez tenha sido o principal motivo para o desenvolvimento dos EUA: “O fato é que essa sociedade caminha sozinha; e tem boa chance de não encontrar qualquer obstáculo: o governo parece-me aqui na infância da arte”. Característica, infelizmente, jamais encontrada no Brasil. Nosso viajante é absorvido por um povo “devorado pelo desejo de fazer fortuna”, mas não deixa de observar, com indignação, os índios que mendigam, derrotados: “[...] Belos homens; eles dançam diante de nós a war dance (dança de guerra), para ganhar um pouco de dinheiro; espetáculo horrível! Nós lhes damos um shilling...”. O surgimento de uma cultura não significa, contudo, a necessária destruição de outra. No dia seguinte ao desse espetáculo humilhante, 6 de agosto de 1831, ele nos descreve o encontro solene com um personagem que não se entregou à degradação: “Pequena aldeia indígena. Vestimenta do chefe: calças vermelhas, um cobertor; cabelos enrolados para cima da cabeça com duas penas enfiadas. Pergunto o que são essas penas: responde-me com um sorriso de orgulho que matou dois sioux [...]. Peço-lhe uma dessas penas dizendo-lhe que eu a levarei ao país dos grandes guerreiros, e que ela será admirada. Ele a retira de seus cabelos e entrega-me, em seguida, estende sua mão e cerra a minha”. Apesar do estilo telegráfico, compreensível no caso de alguém que viaja submetido à premência de tudo anotar, Tocqueville consegue ser lírico: “Ao pôr do sol, entramos num canal muito estreito. Vista admirável; instante delicioso. As águas do rio imóveis e transparentes; uma floresta extraordinária que se reflete nas águas. Ao longe, montanhas azuis e iluminadas pelos últimos raios do sol. Fogo dos indígenas que brilha por entre as árvores. Nosso barco avança majestosamente em meio a essa solidão, ao rumor dos cantos guerreiros que o eco dos bosques propaga de todos os lados”. Dias depois, num vilarejo iroquês, age como um explorador que é, ao mesmo tempo, um menino: “Vou caçar. Rio atravessado a nado. Ervas no fundo do rio. Perco-me por um momento na floresta. Retorno ao mesmo lugar sem perceber”. No Canadá, em Montreal, reclama da dominação inglesa e augura um tempo em que os franceses tenham “sozinhos um belo império no Novo Mundo”. Ao visitar Quebec, defende a sublevação dos franceses contra os ingleses – “Aquele que deve agitar a população francesa e levantá-la contra os ingleses ainda não nasceu” – e constata, movido pela repulsa à aparente submissão dos seus conterrâneos: “Nunca estive mais convicto [...] que a maior e mais irremediável infelicidade para um povo é ser conquistado”. Em Boston, constata a riqueza da cidade, faz elogios à vida cultural (em 1831, os bostonianos dispunham de, ao menos, quatro bibliotecas) e escreve, a 22 de setembro, uma inevitável comparação: ...O que mais nos incomoda na Europa são os homens que, nascidos numa condição social inferior, receberam uma educação que lhes dá vontade de sair dela sem fornecer-lhes os meios para isso. Na América, esse inconveniente da educação é quase insensível. A instrução fornece sempre os meios naturais para enriquecer-se, e não cria qualquer mal-estar social. Como defender a democracia? Na cidade de Baltimore, encontra-se com Charles Carroll, último sobrevivente dos signatários da Declaração da Independência, que lhe diz, sem meias palavras: “A mere democracy is but a mob” (“Uma democracia pura não é outra coisa senão um populacho”). Se, a princípio, Tocqueville mantém-se dúbio diante dessa afirmativa, ela certamente o instigou, contribuindo para as geniais conclusões de A democracia na América, entre elas, a de que governos centralizadores e democracias radicais, que oprimem as minorias discordantes, causam o mesmo tipo de mal: Não há [...] na terra autoridade tão respeitável por si mesma nem revestida de um direito tão sagrado que eu desejasse deixar agir sem controle e dominar sem obstáculos. Quando, portanto, vejo dar o direito e a faculdade de fazer tudo a uma potência qualquer, quer se chame povo ou rei, democracia ou aristocracia, quer se exerça numa monarquia, quer numa república, então digo: aí está o germe da tirania, e procuro ir viver sob outras leis. Apesar de fascinantes, por revelarem um país onde tudo podia ser experimentado, no qual a vida possui, até hoje, uma dinâmica inesgotável, as notas de Tocqueville estariam fadadas ao esquecimento se não tivessem produzido A democracia na América, principalmente os Capítulos 6 (“O despotismo nas nações democráticas”) e 7 (“De que maneira defender a liberdade ameaçada”) da Quarta Parte do Livro II, centrais em sua defesa da liberdade, primorosos ao apresentar as contradições que encontrou: “O que mais me repugna na América não é a extrema liberdade reinante; é o pouco de garantia aí encontrado contra a tirania”. Uma preocupação inexistente nos países em que a sociedade, governada por demagogos e populistas, se comporta de maneira servil ou apática. Publicado no site da revista Sibila. Rodrigo Gurgel é escritor, editor e crítico literário.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Como a democracia destrói riqueza e liberdade

Descrição: Assine o RSS de Artigos da Mises.org.br
A democracia cria uma discórdia que não existiria em uma sociedade livre.  Indivíduos não se importam se o sujeito que lhes vende uma xícara de café em uma padaria é judeu, católico, protestante, muçulmano, ateu, branco, preto, solteiro, casado, gay, hétero, velho, jovem, nativo, imigrante, alcoólatra, abstêmio ou qualquer outra coisa.  Nada disso importa no curso de sua interatividade diária com as pessoas.  Por meio do comércio e da cooperação, cada pessoa ajuda as outras a alcançar suas aspirações.  Se alguém diferente de você se muda para a sua vizinhança, você fará o seu melhor para lidar bem com ele.  Seja na igreja, no shopping, na academia ou até mesmo casualmente nas ruas, nós sempre nos esforçamos para encontrar maneiras de sermos civis e prestativos.
Agora, coloque estas mesmas pessoas na arena política e elas imediatamente se tornam inimigas.  Por quê?  A política não é cooperativa, como o mercado; ela é exploradora.  O sistema é configurado para ameaçar a identidade e as opções dos outros.  Todo mundo deve batalhar para impor as suas preferências.  Consequentemente, coalizões se formam, bem como alianças espúrias e momentâneas, que constantemente se alteram.  Este é o mundo imoral em que o estado — por meio da máquina eleitoral — nos joga.  Nele, torcemos para que o nosso cara vença e desejamos a morte política do oponente.
O jogo democrático confunde as pessoas em relação ao real inimigo.  O estado é a instituição que gera e vive à custa destas divisões.  No entanto, as pessoas são distraídas deste fato por causa do endeusamento do sistema.  Os negros culpam os brancos, os homens culpam as mulheres, os héteros culpam os gays, os pobres culpam os ricos e assim vai, em um infinito número de combinações possíveis.
Embora quase todos os países democráticos sofram com governos inchados, excesso de regulamentação, altos impostos e uma enorme dívida pública, poucas pessoas consegeum vislumbrar a relação causal entre estes problemas e o próprio sistema democrático.  Para a maioria, a solução para estes problemas é mais democracia, e não menos.
Muitos ainda acreditam que democracia corresponde a prosperidade, igualdade, justiça, união e liberdade. Mas não há nenhuma evidência de nada disso. A democracia se apóia em três princípios fundamentais: você tem o direito de votar, você tem o direito de concorrer a um cargo público, e a maioria decide.  E só.  Em nenhum lugar está escrito, por exemplo, que a democracia garante o direito à liberdade de expressão, um direito que muitas pessoas associam à democracia.  Nem há qualquer explicação lógica que mostre por que a democracia tende a gerar prosperidade.
As pessoas simplesmente aceitam como verdade absoluta o senso comum que diz que a democracia gera todas estas benesses.  A verdade, no entanto, é exatamente oposta a este senso comum.  Os próprios princípios da democracia dão origem a processos que conduzem a sociedade para o oposto da liberdade e da prosperidade.
Os processos mais importantes são os seguintes.
1) Comportamento imediatista
Como Hans-Hermann Hoppe explicou em seu livro Democracia, o deus que falhou — a democracia inevitavelmente gera uma preferência temporal alta — isto é, leva a um comportamento imediatista, míope, visando apenas ao curto prazo — tanto entre os governantes como entre os cidadãos.  Dado que os políticos democraticamente eleitos ficarão apenas temporariamente no cargo, e eles não são os proprietários dos recursos à sua disposição, eles serão acometidos de um irrefreável incentivo para gastar dinheiro público em projetos que os tornem populares, desconsiderando as consequências futuras de tal ato.  Os problemas que eles criam ao longo do caminho, como o forte aumento da dívida pública, serão deixados para que seus sucessores resolvam.  Uma sociedade democrática é como um carro alugado — ou pior: um carro que é não propriedade de ninguém e utilizado por todos.  Ela rapidamente se destrói.
2) Conflito social e parasitismo
Democracia é um sistema em que as pessoas votam naqueles políticos que elas creem que irão favorecê-las com benesses e privilégios, de modo que a conta seja entregue a outras pessoas.  A democracia, portanto, inerentemente faz com que haja um imediato conflito grupal: os agricultores contra os moradores urbanos, os idosos contra os jovens, os imigrantes contra os residentes, empregadores contra empregados etc.  Isso gera um comportamento parasitário e tensões sociais.  
Este é o resultado do princípio democrático que preconiza que todas as decisões importantes devem estar sujeitas à vontade da maioria, ou seja, devem ser decididas pelo estado, o que transforma todos os indivíduos em meras engrenagens de um sistema político coletivista.  Em uma sociedade livre, baseada em direitos individuais, indivíduos com diferentes visões e objetivos não se tornam potenciais inimigos mútuos.  Eles podem colaborar entre si, comercializar uns com os outros, ou simplesmente se isolar e não se intrometer na vida de ninguém — mas eles certamente não terão meios coercivos com os quais obrigar outros cidadãos a satisfazer seus próprios fins.
A democracia cria uma discórdia que não existiria em uma sociedade livre.  Indivíduos não se importam se o sujeito que lhes vende uma xícara de café em uma padaria é judeu, católico, protestante, muçulmano, ateu, branco, preto, solteiro, casado, gay, hétero, velho, jovem, nativo, imigrante, alcoólatra, abstêmio ou qualquer outra coisa.  Nada disso importa no curso de sua interatividade diária com as pessoas.  Por meio do comércio e da cooperação, cada pessoa ajuda as outras a alcançar suas aspirações.  Se alguém diferente de você se muda para a sua vizinhança, você fará o seu melhor para lidar bem com ele.  Seja na igreja, no shopping, na academia ou até mesmo casualmente nas ruas, nós sempre nos esforçamos para encontrar maneiras de sermos civis e prestativos.
Agora, coloque estas mesmas pessoas na arena política e elas imediatamente se tornam inimigas.  Por quê?  A política não é cooperativa, como o mercado; ela é exploradora.  O sistema é configurado para ameaçar a identidade e as opções dos outros.  Todo mundo deve batalhar para impor as suas preferências.  Consequentemente, coalizões se formam, bem como alianças espúrias e momentâneas, que constantemente se alteram.  Este é o mundo imoral em que o estado — por meio da máquina eleitoral — nos joga.  Nele, torcemos para que o nosso cara vença e desejamos a morte política do oponente.
O jogo democrático confunde as pessoas em relação ao real inimigo.  O estado é a instituição que gera e vive à custa destas divisões.  No entanto, as pessoas são distraídas deste fato por causa do endeusamento do sistema.  Os negros culpam os brancos, os homens culpam as mulheres, os héteros culpam os gays, os pobres culpam os ricos e assim vai, em um infinito número de combinações possíveis.
O resultado final é a destruição dos cidadãos, e uma vida próspera para a elite política.
3) Intromissão
Embora muitas pessoas associem democracia a liberdade, o fato é que nenhuma liberdade está segura em uma democracia.  Se a maioria (ou, muitas vezes, alguns pequenos grupos influentes) quiser, ela poderá intervir em qualquer tipo de ação, transação ou relacionamento voluntários — e é isso que ela faz.  Ela proíbe as pessoas de beber álcool em determinadas circunstâncias, de queimar bandeiras, de se manifestar contra as guerras, de assistir a determinados filmes, de "discriminar" e assim por diante.  Os governos democráticos continuamente intervêm em transações voluntárias entre vendedores e compradores, empregadores e empregados, professores e alunos, médicos e pacientes, inquilinos e proprietários, prestadores de serviços e clientes etc.  Eles também se intrometem nas escolhas pessoais: a sua escolha de fumar, de usar drogas, de se envolver em profissões específicas (para as quais você não possui uma "licença"), de "discriminar" (isto é, de escolher com quem você quer se associar), de criar produtos específicos (para os quais existe uma 'patente', isto é, um monopólio do governo) etc.  Não há limites para esta intromissão.  A pouca liberdade que ainda temos nas sociedades ocidentais não se deve à democracia, mas sim à nossa tradição de amor à liberdade.
4) Coletivismo e passividade
Nos tempos pré-democráticos, a tendência era a de os governados não confiarem nos governantes, e cada novo imposto criado era visto como uma violação à liberdade.  Porém, atualmente, as decisões democráticas são vistas como fundamentalmente legítimas, pois, de acordo com o senso comum, tais decisões foram supostamente tomadas pelas próprias pessoas.  
Durante as eras monárquicas, poucos nutriam a esperança de chegar ao poder; consequentemente, a maioria suspeitava de todos aqueles que estavam no poder.  Já a democracia, por outro lado, permite, ao menos na teoria, que todos possam chegar ao poder.  Isto faz com que as pessoas acreditem que elas devam se submeter à regra da maioria. Elas podem não concordar com leis e regulamentos específicos, mas elas sentem que devem cumpri-los.  Mas, naturalmente, elas tentarão eleger um partido específico que crie leis que as beneficiem e que faça com que o dinheiro distribuído pela máquina estatal flua na direção delas.  Foi assim os gastos estatais cresceram, na maioria dos países democráticos, de cerca de 10% do PIB antes da Primeira Guerra Mundial para os quase 50% atuais.  É também por isso que temos tantas leis atualmente, de modo que podemos dizer com total segurança que há uma lei específica para absolutamente tudo que existe.
Gasto público, % PIB [veja o gráfico para o Brasil no final do artigo]

5) Corrupção e abuso
Embora a governança da maioria seja suficientemente ruim por si só, a realidade de uma democracia é muito mais sórdida.  Dado que o governo eleito tem poder virtualmente ilimitado e controla praticamente todos os recursos da sociedade, todos os tipos de grupos de interesses e lobistas irão trabalhar nos bastidores para influenciar o governo a criar e modificar leis para seu proveito próprio.  Um exemplo óbvio são os bancos e os interesses financeiros que, em conjunto com o governo, criaram um sistema de papel-moeda o qual eles controlam e manipulam para seu próprio benefício.  
Mas há também vários outros interesses poderosos que utilizam o sistema para proveito próprio e em detrimento do resto do povo: sindicatos, ONGs, empresas farmacêuticas, produtores rurais, empresas telefônicas, aéreas, de comunicação etc.  Os cidadãos comuns não podem fazer quase nada à respeito.  Eles geralmente não têm os meios ou o tempo para descobrir e entender o que está acontecendo.  Tudo o que podem fazer é votar de vez em quando, mas eles não têm como responsabilizar seus governantes ??por suas ações.
Portanto, as nossas mazelas econômicas e sociais não decorrem do manjado fato que "os políticos errados estão no poder".  É o próprio sistema democrático quem causa os problemas.  O que realmente deve ser feito é mudar o sistema para que ele se torne menos democrático, e não mais.  E a forma mais importante e eficaz de fazer isso é retirando poderes do governo e descentralizando ao máximo todos os processos de tomada de decisão.


Gastos das três esferas do estado brasileiro em porcentagem do PIB.  Note a disparada a partir de 1985, justamente quando a democracia se consolidou (Fontes: IBGE e Heritage Foundation).
  Tradução de Victor Maia

Por: Frank Karsten é o fundador da More Freedom Foundation na Holanda.

domingo, 22 de abril de 2012

Baixeza na Corte

Nunca foi tão apropriado um chamamento quanto o feito pelo ministro Carlos Ayres Britto em seu discurso de posse na presidência do Supremo Tribunal Federal: "Mais que impor respeito, o Judiciário tem que se impor o respeito".
Os desaforos distribuídos pelo antecessor Cezar Peluso em suas entrevistas de despedida do posto, bem como o revide de um de seus alvos, o ministro Joaquim Barbosa, acusando-o de manipular resultados de julgamentos, evidenciam a carência do atributo invocado pelo novo presidente da Corte.
As brigas ao molde de ambientes desatinados não são novidade no Supremo. Vira e mexe um ministro se indispõe publicamente com o outro. Não quer dizer que sejam condutas aceitáveis. A repetição as torna mais condenáveis.
Mas agora a ausência de cerimônia chegou ao ápice, levando a credibilidade da Corte ao rumo do declínio.
O ministro Peluso disse o que quis sobre a presidente Dilma Rousseff, sobre um senador da República, sobre a corregedora do Conselho Nacional de Justiça, sobre a independência jurisdicional do Supremo.
Acabou ouvindo o que não deve ter gostado de ouvir de um de seus pares a quem chamou temperamental, complexado e permeável a pressões da opinião pública por insegurança.
Em entrevista ao jornal O Globo, Joaquim Barbosa deu o troco com juros e, como se dizia antigamente, correção monetária.
Nos trechos amenos chamou Peluso de "ridículo", "brega", "caipira", qualificou sua passagem pela presidência do STF como "desastrosa" e o acusou de ter "incendiado o Judiciário inteiro com sua obsessão corporativista".
Alguns adjetivos nem precisavam ser ditos por outrem, pois o próprio Cezar Peluso tratou, recente e anteriormente, de expô-los ao escrutínio público em posições assumidas nos votos ou declarações.
Joaquim Barbosa, contudo, foi muito além: acusou Peluso de manipular resultados de votações, usar das prerrogativas do cargo para fazer valer sua vontade, criar "falsas questões processuais" e na imputação mais grave de todas referiu-se a roubo e prevaricação.
Ou há outra interpretação possível para o trecho em que o ministro diz que o então presidente aproveitou a ausência dele do STF para lhe "surrupiar" processo em que era relator a fim de "ceder facilmente" a pressões?
Se os ministros do Supremo não estivessem fora da jurisdição do Conselho Nacional de Justiça seria um caso de se proceder a averiguações. DORA KRAMER - O Estado de S.Paulo

Corrupção e sistemas econômicos

Da mesma forma que existe uma relação direta entre democracia e economia de mercado, existe, também, uma relação direta entre economias planificadas e totalitarismos.

Omitirei o nome da publicação e dos autores do artigo que vou criticar. Não me parece sensato divulgar fontes de equívocos. Direi apenas que se trata de uma publicação "católica" e que o artigo abordava o tema da corrupção, definindo a ética do "ganhar sempre mais", que seria própria do capitalismo, como determinante da corrupção.
Tal tese é um disparate sob quaisquer ângulos de observação e os autores devem saber. Mas estão se lixando. O que pretendem é levar os leitores a extrair conclusão errada de premissa falsa: se o capitalismo causa corrupção, então, na vigência de seu antônimo - o socialismo - a sociedade se conduziria por elevadíssimos valores morais. Um verdadeiro paraíso reconstruído. Ora, o desejo de ganhar mais não é uma especificidade da economia de mercado, ou livre, ou de empresa (prefiro designar o sistema econômico com esses nomes que lhe atribuiu João Paulo II). É um anseio da pessoa humana, em todos os tempos e em qualquer sistema. Resumamos o assunto, então, em alguns tópicos.
Duvido que os redatores dessa fraude intelectual recusem um aumento de salário, um bom negócio ou uma oportunidade de comprar por menos ou vender por mais.
Como consequência de um sistema de economia livre, de empresa, os agentes econômicos dedicam-se com maior empenho ao que fazem, a criatividade aumenta, a produtividade cresce, os custos decrescem. Beneficiam-se produtores e consumidores.
Gera-se uma saudável conseqüência ética pois a competência é premiada com resultados positivos e a incompetência punida com prejuízos.
Há uma relação histórica, ademais, entre economia de mercado e democracia pois o grande senhor da economia de mercado é ele mesmo, o mercado, formado por milhões e milhões de pessoas, com suas expectativas, anseios, etc..
Contudo, estava certo o papa João Paulo II quando, escrevendo sobre o tema, ensinava que se o núcleo da liberdade for apenas econômico – e não ético e religioso (papel das instituições políticas e jurídicas) – ocorrem situações de opressão econômica, formam-se monopólios, cartéis, mecanismos de corrupção, e outras enfermidades sistêmicas. Com efeito, absolutamente livre, o mercado padece dos mesmos males que acometem a liberdade individual na ausência de toda restrição.
Nas economias planificadas, socialistas, o anseio de “ganhar mais” é tolhido pela centralização estatal. Como conseqüência – e a história o demonstrou com muita clareza – a produtividade diminui, a iniciativa acaba, a economia fica estagnada, a pobreza se multiplica de modo irremediável, o muro cai, os governos tombam, os intelectuais do socialismo se escondem.
O fracasso socialista é tão óbvio que Leão XIII o previu três décadas antes de esse sistema ter sido tentado na Rússia. E João Paulo II, tendo vivido sob tal realidade, proclamou-o “falido”.
Da mesma forma que existe uma relação direta entre democracia e economia de mercado, existe, também, uma relação direta entre economias planificadas e totalitarismos. E a razão é simples: para coibir aquele desejo natural de “ganhar mais”, torna-se necessário criar uma estrutura estatal opressiva. Quando se concentram no Estado tanto o poder político quanto o econômico, nenhum poder resta à sociedade e à pessoa na sociedade.
Ademais, com a queda do Muro, foi possível conhecer o nível de corrupção instalado nas repúblicas socialistas, corrupção que também se espraia pela sociedade como defesa perante a escassez e a miséria geral. Quem quiser conhecer isso de perto, ainda hoje, vá a Cuba (onde fui três vezes), ou à Coréia do Norte (onde não tenho coragem de ir).
Bastariam estas poucas evidências para desmascarar a malícia do texto a que me refiro. Mas há nele um erro ainda muito mais grave: como pode um cristão afirmar que o capitalismo corrompe (e levar o leitor a presumir que o socialismo purifica), como se nele se extinguisse o pecado original?
Corrupção existe em qualquer sistema político ou econômico, embora alguns a favoreçam mais do que outros. E, nesse caso, o socialismo e os totalitarismos são imbatíveis. Mas em quaisquer regimes ou sistemas existe o pecado, os que a ele se entregam, e os justos que se empenham em serem bons. Se tudo fosse questão de sistema, Cristo teria proposto um, em vez de perder seu tempo propondo-se a si mesmo, ao custo em que o fez.
 POR PERCIVAL PUGGINA

A Guerra da Togas

A Guerra das Togas informa que o Judiciário não escapou da Era da Mediocridade Precipitada pelas declarações de Cezar Peluso à revista Consultor Jurídico, consumou-se nesta sexta-feira, com a entrevista de Joaquim Barbosa ao Globo, a abertura da mais selvagem das frentes de combate que compõem a Guerra das Togas. Somada às batalhas paralelas, a troca de chumbo entre o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e o relator do processo do mensalão comprova que o que foi historicamente o corpo de elite do Judiciário vai sucumbindo aos estragos causados pela Era da Mediocridade na Praça dos Três Poderes. Está cada vez mais parecido com o Executivo e o Legislativo. Enquanto os ministros foram escolhidos entre os melhores e os mais brilhantes, enquanto o preeenchimento das vagas no STF esteve subordinado à meritocracia e às exigências constitucionais que cobram dos indicados notável saber jurídico e reputação ilibada, nem o mais delirante ficcionista ousou conceber um bate-boca semelhante ao protagonizado por Peluso e Barbosa. Ao queixar-se do “temperamento difícil” de Barbosa e qualificá-lo de “inseguro”, Peluso fez o papel do aluno brigão que provoca o colega no fim das aulas. O revide do provocado transferiu da porta do colégio para o botequim essa molecagem de gente supostamente adulta. Na réplica ao desafeto, Barbosa temperou acusações de alta voltagem, incluindo a “manipulação de resultados de julgamentos”, com adjetivos insolentes ─ “ridículo”, “brega”, “caipira”, “tirano” e “pequeno”, por exemplo. Peluso não respondeu de imediato, mas a tréplica está em gestação. O Brasil em que os juízes só falavam nos autos parece tão remoto que bate a sensação de que existiu antes do Descobrimento. Agora os doutores falam em qualquer lugar. Falam tanto que lhes falta tempo para falar nos autos. Se discursassem menos e julgassem mais, já teriam liquidado há anos o caso do mensalão, que segue estimulando barulhos em outras frentes da Guerra das Togas. Ao longo desta semana, todas registraram tiroteios retóricos. Numa das áreas conflagradas, ao repetir que o STF precisa definir o destino dos mensaleiros ainda neste semestre, Gilmar Mendes expôs-se ao contra-ataque de Marco Aurélio de Mello, para quem não faz sentido “julgar a toque de caixa” um escândalo descoberto há sete anos. Sem ficar ruborizado, Marco Aurélio garantiu que há na fila de espera pelo menos 700 processos tão relevantes quanto a roubalheira de dimensões siderais. Vizinho de trincheira, Dias Toffoli murmurou que ainda não sabe se deve participar do julgamento que envolve velhos companheiros ou declarar-se sob suspeição. Como se a dúvida pudesse existir. Antes de virar ministro, Toffoli foi advogado do PT e, no governo Lula, chefiou a Advocacia Geral da União. Depois de ganhar a toga, sua namorada advogou em defesa de alguns mensaleiros. “Ele não tem o direito de ficar fora”, cobrou Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo. O parecer de Marinho atesta que, neste estranho Brasil, os companheiros é que decidem o que deve fazer um juiz do Supremo. Instado por outros ministros a apressar a entrega do serviço, Ricardo Lewandowski retrucou que ninguém o fará acelerar o ritmo de obra do PAC. Ele ainda não revelou quando vai concluir a revisão do processo ─ informação que, na avaliação mais recente, vale 1 milhão de dólares. “Japona não é toga”, lembrou o senador Auro Moura Andrade aos chefes do regime militar que insistiam em violentar a Constituição. Com a frase tão curta quanto pedagógica, o paulista que presidia o Senado ensinou que cabe ao Supremo Tribunal Federal lidar com assuntos constitucionais e, simultaneamente, reiterou a confiança dos brasileiros democratas na sensatez dos juízes togados. Passados 50 anos, os focos de turbulência não envolvem cidadãos fardados. E os mais perturbadores se localizam na Praça dos Três Poderes. A frase de Auro perdeu o sentido num Brasil sobressaltado por juízes sem juízo. Se os ministros do STF agissem nos quartéis, haveria uma crise político-militar de meia em meia hora. Ainda bem que toga não é japona.

sábado, 21 de abril de 2012

Geração Concurso Público

“Aqueles que desistiriam da liberdade essencial para comprar um pouco de segurança temporária não merecem nem liberdade nem segurança.” (Benjamin Franklin)
 Uma parcela cada vez maior dos brasileiros, especialmente da classe média, sonha com uma vaga no setor público. São milhares e milhares de pessoas estudando duro e fazendo cursinhos para disputar as vagas nos concursos para empregos em órgãos estatais. Pretendo expor basicamente dois pontos de vista sobre este fenômeno: 1) a decisão no âmbito individual parece perfeitamente racional; 2) quando afastamos a lupa e obtemos um campo de visão mais amplo, esta tendência parece altamente preocupante. Sobre o primeiro aspecto, a escolha parece racional porque, de fato, o setor público tem oferecido as melhores vantagens no mercado de trabalho, de forma geral. Há a tão sonhada estabilidade no emprego, algo que muitos valorizam mais até do que o prazer naquilo que toma boa parte do dia, que é seu trabalho. E os salários, na média, são maiores do que no setor privado. Isso sem falar dos vários privilégios, como aposentadorias maiores e diversos auxílios, dependendo da profissão. Vamos dedicar um pouco mais de tempo ao aspecto da adorada estabilidade no cargo. É fato que nem todos nasceram para uma vida mais arriscada, ousada, com aventuras e desafios em busca de sonhos e desejos. Muitos, de perfil mais acanhado, tímido e com forte aversão ao risco, acabam preferindo a segurança na rotina, na certeza de que o amanhã será a repetição do hoje, com seu emprego garantido sem muitas novidades. Para estas pessoas, a obediência estreita às regras definidas a priori é o que mais conforto traz. Pessoas com este perfil se encaixam perfeitamente na burocracia estatal. Os trabalhos burocráticos demandam execução semi-automática, ou seja, valoriza mais a obediência que a inovação. Não há muito espaço para a criatividade. Por isso mesmo, os trabalhos burocráticos acabam sendo também medíocres, por não incentivarem a ousadia e a paixão pelo novo. Claro que nem todos os serviços públicos são desta natureza, mas é evidente que muitos – talvez a grande maioria – o são. O outro aspecto que atrai muitos candidatos é o salário. De fato, para os poucos que se sobressaem na iniciativa privada, a recompensa costuma ser bem maior. Mas, na média, o salário público, especialmente se acrescido das inúmeras vantagens, tende a ser maior. A estatística nacional colocava, da última vez que vi, o salário médio do setor público como mais de duas vezes acima daquele do setor privado. Este sofre, não custa lembrar, justamente pelo excesso de obstáculos criados pelo governo, tais como altos tributos, encargos trabalhistas e a própria burocracia, além da baixa produtividade fruto da péssima educação. Tendo conhecimento dos fatos acima, fica mais fácil compreender porque tantos brasileiros querem uma disputada vaga de concurso público. Os cursos preparatórios se espalharam como vírus, e estudantes determinados, com notas excelentes, dedicam-se horas diárias à leitura de vários livros. A principal habilidade que diferencia os vencedores dos demais não é necessariamente a inteligência, muito menos a capacidade criativa e inovadora, mas sim a memória. Aquele que decorar calhamaços de dados com mais facilidade tem maiores chances de passar. Um robô levaria todas em primeiro lugar! Ora, mas qual o problema disso? Eis que chegamos no segundo ponto: a visão holística da coisa. O leitor provavelmente já entendeu que, para a sociedade como um todo, quanto maior for a parcela de trabalhos burocráticos, pior será o resultado geral. O motivo é evidente: a burocracia excessiva asfixia a criação, força-motora essencial à prosperidade. Claro que algumas funções terão que ser executadas pela burocracia estatal. Quase ninguém defenderia uma polícia privada com foco no lucro, por exemplo, ou então um sistema de justiça totalmente privado (câmaras de arbitragem, porém, fazem todo sentido). Logo, certas tarefas cabem naturalmente ao estado, e o método será burocrático, ou seja, sem um mecanismo de precificação do resultado (i.e., o lucro). Mas o ideal para a sociedade como um todo é que tais tarefas sejam bastante restritas ao básico necessário. Mais que isso começa a prejudicar o dinamismo da economia, sem falar da perda das liberdades individuais (a tendência do burocrata é expandir seus tentáculos e poder, para garantir mais verbas ao seu gabinete). No setor privado, por outro lado, a meritocracia representará o melhor incentivo à eficiência. Os piores são punidos no mercado, e os melhores recolhem as recompensas do bom serviço prestado. O processo dinâmico de tentativa e erro permite que os mais inovadores e criativos conquistem espaço vis-à-vis os mais obsoletos. A “destruição criadora” de que falava Schumpeter pode então funcionar com liberdade para garantir o progresso. Alguém consegue pensar em uma repartição pública entregando ao mundo um iPad? Quando compreendemos isso tudo, salta aos olhos a preocupação com a crescente tendência dos jovens em buscar a estabilidade no setor público. Um país com inchaço estatal é um país engessado, sem dinamismo econômico, e com as liberdades ameaçadas. Posted by Rodrigo Constantino

sexta-feira, 20 de abril de 2012

O pântano político

Em tempos de CPI e às vésperas do julgamento do mensalão, o clima político em Brasília, como não poderia deixar de ser, é efervescente, e as posses dos ministros Ayres Britto, como presidente do Supremo Tribunal Federal, e Cármen Lúcia, a primeira mulher a presidir o Tribunal Superior Eleitoral, serviram de pano de fundo para manifestações de cunho político nos discursos, mas, sobretudo, para conversas de bastidores. Depois desses dois dias de conversas, fiquei com a sensação de que o processo do mensalão deve entrar mesmo em pauta ainda no primeiro semestre, e que a CPI do Cachoeira ainda está causando perplexidade na classe política, especialmente em setores petistas que não estão envolvidos diretamente na disputa congressual. Os governadores petistas, por exemplo, não entendem o que está acontecendo. O de Sergipe, Marcelo Déda, analisa a questão do ponto de vista político, sem entrar no mérito das acusações: "CPI é um instrumento da oposição, da minoria. Nenhum governo gosta de CPI pelo simples fato de que o ambiente político fica descontrolado e o Congresso paralisado". O governador da Bahia, Jaques Wagner, que já foi ministro das Relações Institucionais no governo Lula, me disse que não compreendia a estratégia de provocar uma CPI: "Se tivessem me consultado eu diria que não é uma boa estratégia. Governo precisa de calmaria". Com relação ao mensalão, tudo parece caminhar para que o processo entre em pauta ainda no primeiro semestre, como quer o novo presidente do STF. O ministro revisor, Ricardo Lewandowsky, já está trabalhando no seu voto, agora liberado das tarefas do TSE que presidia, e segundo relato de familiares tem varado a noite consultando o processo e o Código Penal. Os demais ministros também já estão trabalhando em cima do processo que foi disponibilizado depois que o presidente anterior, Cezar Peluso, deu ordens para apressar os procedimentos. Nos discursos dos dois novos presidentes, o papel da liberdade de informação para fortalecer a democracia foi enfatizado. O ministro Ayres Britto salientou que "o mais refinado toque de sapiência da nossa última Assembleia Constituinte" foi eleger a democracia como a sua maior força. "Democracia que mantém com a liberdade de informação jornalística uma relação de unha e carne, olho e pálpebra, veias e sangue". Na noite anterior, a ministra Cármen Lúcia, ao assumir a presidência do TSE, mandou um recado direto aos meios de comunicação, pedindo sua colaboração: "A imprensa livre é inseparável da democracia. É parceira do Judiciário na concretização da Justiça". Essa presença é ainda maior na Justiça Eleitoral, disse ela, para quem "os jornalistas não só acompanham os feitos. Participam do processo, ajudando a promover o interesse público na divulgação dos fatos, na fiscalização permanente do processo e da atuação da Justiça Eleitoral". Para a nova presidente do TSE, "não há eleições seguras e honestas sem a ação livre, presente e vigilante da imprensa, a cumprir papel determinante em benefício do poder político". Cármen Lúcia pediu, ressaltando "o respeito absoluto à liberdade de opinião", que a imprensa livre "ajude este Tribunal a exercer plenamente a sua missão. Afirmo-lhes que ele será transparente em seus atos, pelo que rogo aos profissionais de comunicação que sejam atentos a tudo que possa causar dano ao processo eleitoral, informando, com clareza, à opinião pública os fatos a serem conhecidos". O novo presidente do STF não fez referências, nem mesmo indiretas, ao processo do mensalão, que ele já classificou em entrevistas como o mais importante processo político a ser julgado. Mas deixou claro que, na sua visão, os juízes devem promover "a abertura da janela dos autos para o mundo circundante, a fim de conhecer a realidade dos jurisdicionados e a expectativa social sobre a decisão". Ayres Britto, que abusou no seu discurso da veia poética e de imagens de retórica - ele é autor de vários livros de poesia -, disse que "Juiz não é traça de processo, não é ácaro de gabinete, por isso, sem fugir dos autos nem se tornar refém da opinião pública, tem que levar ao cumprimento das leis e conciliar a macrofunção de combinar o direito com a vida". Quem tratou diretamente da questão foi o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, que falou sobre o processo do mensalão em seu discurso. Referindo-se ao período de sete meses que Ayres Britto terá na presidência, pois se aposenta em novembro por atingir a idade limite de 70 anos, afirmou: "O tempo não será curto para levar adiante processos sobre casos de corrupção que marcaram a nossa História recente. E digo ao novo presidente da Suprema Corte brasileira que a sociedade espera que esse tema não seja mais postergado, e que haja a punição exemplar dos culpados pelos crimes que cometeram contra o patrimônio público". Para ele, somente eliminando qualquer ideia de impunidade "podemos combater a corrupção, uma das maiores mazelas do nosso país". Referindo-se ao mais recente escândalo envolvendo as relações promíscuas do bicheiro Carlinhos Cachoeira com políticos e empresários, Ophir Cavalcante disse que é digno de reflexão o fato de que "na origem de todos os casos de corrupção, está o modelo de financiamento privado da política, que permite o caixa 2, ou entre outras palavras, o relacionamento promíscuo entre os interesses privados e a coisa pública". Para definir os estragos que essa relação espúria provoca na política brasileira, Cavalcante descreveu: "quando um cai, arrasta junto de si bicheiros, falsificadores, policiais, governadores, parlamentares, projetos, obras e, o que é pior, a própria credibilidade das instituições". Viveu-se nesses dias em Brasília um ambiente no Judiciário claramente favorável ao reforço da moralidade e da impessoalidade no serviço público, e uma clara rejeição ao patrimonialismo que ainda impera nas nossas relações políticas, enquanto no Congresso as escaramuças partidárias continuavam dentro dos mesmos parâmetros que nos levaram ao "pântano", como definiu o presidente da OAB nosso ambiente político.Por: Merval Pereira

Método Paulo Freire ou Método Laubach?

Mais do que uma mera ferramenta de manipulação comunista disfarçada de pedagogia, o “método Paulo Freire de alfabetização”, é também um plágio vergonhoso. Comentário de Klauber Cristofen Pires: Nesta semana está sendo realizada em Brasília a 1ª Bienal do Livro. Longe de ser um inocente evento literário, é totalmente temático em favor da ideologia marxista (leia o artigo A Bienal Socialista de Brasília), e ali está sendo apresentada a Exposição "Sonhando com Paulo Freire, a educação que queremos", na Biblioteca Nacional de Brasília. Para o enriquecimento do evento, lembrei-me deste artigo do historiador David Gueiros Vieira, publicado originalmente no Mídia sem Máscara, em 9 de março de 2004, intitulado “Método Paulo Freire ou Método Laubach?”, e que vale muito a pena ser relido, especialmente pelos pedagogos e estudantes de hoje. Método Paulo Freire ou Método Laubach? David Gueiros Vieira O Método Laubach de alfabetização de adultos foi criado pelo missionário protestante norte-americano Frank Charles Laubach (1884 – 1970). Desenvolvido por Laubach nas Filipinas, em 1915, subseqüentemente foi utilizado com grande sucesso em toda a Ásia e em várias partes da América Latina, durante quase todo o século XX. Em 1915, Frank Laubach fora enviado por uma missão religiosa à ilha de Mindanao, nas Filipinas, então sob o domínio norte-americano, desde o final da guerra EUA/Espanha. A dominação espanhola deixara à população filipina uma herança de analfabetismo total, bem como de ódio aos estrangeiros. A população moura filipina era analfabeta, exceto os sacerdotes islamitas, que sabiam ler árabe e podiam ler o Alcorão. A língua maranao (falada pelos mouros) nunca fora escrita. Laubach enfrentava, nessa sua missão, um problema duplo: como criar uma língua escrita, e como ensinar essa escrita aos filipinos, para que esses pudessem ler a Bíblia. A existência de 17 dialetos distintos, naquele arquipélago, dificultava ainda mais a tarefa em meta. Com o auxílio de um educador filipino, Donato Gália, Laubach adaptou o alfabeto inglês ao dialeto mouro. Em seguida adaptou um antigo método de ensino norte-americano, de reconhecimento das palavras escritas por meio de retratos de objetos familiares do dia-a-dia da vida do aluno, para ensinar a leitura da nova língua escrita. A letra inicial do nome do objeto recebia uma ênfase especial, de modo que aluno passava a reconhecê-la em outras situações, passando então a juntar as letras e a formar palavras. Utilizando essa metodologia, Laubach trabalhou por 30 anos nas Filipinas e em todo o sul da Ásia. Conseguiu alfabetizar 60% da população filipina, utilizando essa mesma metodologia. Nas Filipinas, e em toda a Ásia, um grupo de educadores, comandado pelo próprio Laubach, criou grafias para 225 línguas, até então não escritas. A leitura dessas línguas era lecionada pelo método de aprendizagem acima descrito. Nesse período de tempo, esse mesmo trabalho foi levado do sul da Ásia para a China, Egito, Síria, Turquia, África e até mesmo União Soviética. Maiores detalhes da vida e trabalho de Laubach podem ser lidos na Internet, no site Frank Laubach. Na América Latina, o método Laubach foi primeiro introduzido no período da 2ª Guerra Mundial, quando o criador do mesmo se viu proibido de retornar à Ásia, por causa da guerra no Pacífico. No Brasil, este foi introduzido pelo próprio Laubach, em 1943, a pedido do governo brasileiro. Naquele ano, esse educador veio ao Brasil a fim de explicar sua metodologia, como já fizera em vários outros países latino-americanos. Lembro-me bem dessa visita, pois, ainda que fosse muito jovem, cursando o terceiro ano Ginasial, todos nós estudantes sabíamos que o analfabetismo no Brasil ainda beirava a casa dos 76% – o que muito nos envergonhava – e que este era o maior empecilho ao desenvolvimento do país. A visita de Laubach a Pernambuco causou grande repercussão nos meios estudantis. Ele ministrou inúmeras palestras nas escolas e faculdades — não havia ainda uma universidade em Pernambuco — e conduziu debates no Teatro Santa Isabel. Refiro-me apenas a Pernambuco e ao Recife, pois meus conhecimentos dos eventos naquela época não iam muito além do local onde residia. Houve também farta distribuição de cartilhas do Método Laubach, em espanhol, pois a versão portuguesa ainda não estava pronta. Nessa época, a revista Seleções do Readers Digest publicou um artigo sobre Laubach e seu método — muito lido e comentado por todos os brasileiros de então, que, em virtude da guerra, tinham aquela revista como único contato literário com o mundo exterior. Naquele ano, de 1943, o Sr. Paulo Freire já era diretor do Sesi, de Pernambuco — assim ele afirma em sua autobiografia — encarregado dos programas de educação daquela entidade. No entanto, nessa mesma autobiografia, ele jamais confessa ter tomado conhecimento da visita do educador Laubach a Pernambuco. Ora, ignorar tal visita seria uma impossibilidade, considerando-se o tratamento VIP que fora dado àquele educador norte-americano, pelas autoridades brasileiras, bem como pela imprensa e pelo rádio, não havendo ainda televisão. Concomitante e subitamente, começaram a aparecer em Pernambuco cartilhas semelhantes às de Laubach, porém com teor filosófico totalmente diferente. As de Laubach, de cunho cristão, davam ênfase à cidadania, à paz social, à ética pessoal, ao cristianismo e à existência de Deus. As novas cartilhas, utilizando idêntica metodologia, davam ênfase à luta de classes, à propaganda da teoria marxista, ao ateísmo e a conscientização das massas à sua “condição de oprimidas”. O autor dessas outras cartilhas era o genial Sr. Paulo Freire, diretor do Sesi, que emprestou seu nome à essa “nova metodologia” — da utilização de retratos e palavras na alfabetização de adultos — como se a mesma fosse da sua autoria. Tais cartilhas foram de imediato adotadas pelo movimento estudantil marxista, para a promulgação da revolução entre as massas analfabetas. A artimanha do Sr. Paulo Freire “pegou”, e esse método é hoje chamado Método Paulo Freire, tendo o mesmo sido apadrinhado por toda a esquerda, nacional e internacional, inclusive pela ONU. No entanto, o método Laubach — o autêntico — fora de início utilizado com grande sucesso em Pernambuco, na alfabetização de 30.000 pessoas da favela chamada “Brasília Teimosa”, bem como em outras favelas do Recife, em um programa educacional conduzido pelo Colégio Presbiteriano Agnes Erskine, daquela cidade. Os professores eram todos voluntários. Essa foi a famosa Cruzada ABC, que empolgou muita gente, não apenas nas favelas, mas também na cidade do Recife, e em todo o Estado. Esse esforço educacional é descrito em seus menores detalhes por Jules Spach, no seu recente livro, intitulado, Todos os Caminhos Conduzem ao Lar (2000). O Método Laubach foi também introduzido em Cuba, em 1960, em uma escola normal em Bágamos. Essa escola pretendia preparar professores para a alfabetização de adultos. No entanto, logo que Fidel Castro assumiu o controle total do poder em Cuba, naquele mesmo ano, todas as escolas foram nacionalizadas, inclusive a escola normal de Bágamos. Seus professores foram acusados de “subversão”, e tiveram de fugir, indo refugiar-se em Costa Rica, onde continuaram seu trabalho, na propagação do Método Laubach, criando então um programa de alfabetização de adultos, chamado Alfalit. A organização Alfalit foi introduzida no Brasil, e reconhecida pelo governo brasileiro como programa válido de alfabetização de adultos. Encontra-se hoje na maioria dos Estados: Santa Catarina (1994), Alagoas, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Sergipe, São Paulo, Paraná, Paraíba e Rondônia (1997); Maranhão, Pará, Piauí e Roraima (1998); Pernambuco e Bahia (1999). A oposição ao Método Laubach ocorreu desde a introdução do mesmo, em Pernambuco, no final da década de 1950. Houve tremenda oposição da esquerda ao mencionado programa da Cruzada ABC, em Pernambuco, especialmente porque o mesmo não conduzia à luta de classes, como ocorria nas cartilhas plagiadas do Sr. Paulo Freire. Mais ainda, dizia-se que o programa ABC estava “cooptando” o povo, comprando seu apoio com comida, e que era apenas mais um programa “imperialista”, que tinha em meta unicamente “dominar o povo brasileiro”. Como a fome era muito grande na Brasília Teimosa, os dirigentes da Cruzada ABC, como maneira de atrair um maior número de alunos para o mesmo, se propuseram criar uma espécie de “bolsa-escola” de mantimentos. Era uma cesta básica, doada a todos aqueles que se mantivessem na escola, sem nenhuma falta durante todo o mês. Essa bolsa-escola tornou-se famosa no Recife, e muitos tentavam se candidatar a ela, sem serem analfabetos ou mesmo pertencentes à comunidade da Brasília Teimosa. Bolsa-escola fora algo proposto desde os dias do Império, conforme pode-se conferir no livro de um educador do século XIX, Antônio Almeida, intitulado O Ensino Público, reeditado em 2003 pelo Senado Federal, com uma introdução escrita por este Autor. No entanto, a idéia da bolsa-escola foi ressuscitada pelo senhor Cristovam Buarque, quando governador de Brasília. Este senhor, que é pernambucano, fora estudante no Recife nos dias da Cruzada ABC, tão atacada pelos seus correligionários de esquerda. Para a esquerda recifense, doar bolsa-escola de mantimentos era equivalente a “cooptar” o povo. Em Brasília, como “idéia genial do Sr. Cristovam Buarque”, esta é hoje abençoada pela Unesco, espalhada por todo o mundo e não deixa de ser o conceito por trás do programa Fome Zero, do ilustre Presidente Lula. O sucesso da campanha ABC — que incluía o Método Laubach e a bolsa-escola — foi extraordinário, sendo mais tarde encampado pelo governo militar, sob o nome de Mobral. Sua filosofia, no entanto, foi modificada pelos militares: os professores eram pagos e não mais voluntários, e a bolsa-escola de alimentos não mais adotada. Este novo programa, por razões óbvias, não foi tão bem-sucedido quanto a antiga Cruzada ABC, que utilizava o Método Laubach. A maior acusação à Cruzada ABC, que se ouvia da parte da esquerda pernambucana, era que o Método Laubach era “amigo da ignorância” — ou seja, não estava ligado à teoria marxista, falhavam em esclarecer seus detratores — e que conduzia a “um analfabetismo maior”, ou seja, ignorava a promoção da luta de classes, e defendia a harmonia social. Recentemente, foi-me relatado que o auxílio doado pelo MEC a pelo menos um programa de alfabetização no Rio de Janeiro — que utiliza o Método Laubach, em vez do chamado “Método Paulo Freire” — foi cortado, sob a mesma alegação: que o Método Laubach estaria “produzindo o analfabetismo” no Rio de Janeiro. Em face da recusa dos diretores do programa carioca, de modificarem o método utilizado, o auxílio financeiro do MEC foi simplesmente cortado. Não há dúvida que a luta contra o analfabetismo, em todo o mundo, encontrou seu instrumento mais efetivo no Método Laubach. Ainda que esse método hoje tenha sido encampado sob o nome do Sr. Paulo Freire. Os que assim procederam não apenas mudaram o seu nome, mas também o desvirtuaram, modificando inclusive sua orientação filosófica. Concluindo: o método de alfabetização de adultos, criado por Frank Laubach, em 1915, passou a ser chamado de “Método Paulo Freire”, em terras tupiniquins. De tal maneira foi bem-sucedido esse embuste, que hoje será quase que impossível desfazê-lo.Por:ESCRITO POR DAVID GUEIROS VIEIRA Referências: AYRES, Antônio Tadeu. Como tornar o ensino eficaz. Casa Publicadora das Assembléias de Deus, Rio de Janeiro, 1994. BRINER, Bob. Os métodos de administração de Jesus. Ed. Mundo Cristão, SP, 1997. CAMPOLO, Anthony. Você pode fazer a diferença. Ed. Mundo Cristão, SP, 1985. GONZALES, Justo e COOK, Eulália. Hombres y Ángeles. Ed. Alfalit, Miami, 1999. GONZALES, Justo. História de un milagro. Ed. Caribe, Miami (s.d.). GONZALES, Luiza Garcia de. Manual para preparação de alfabetizadores voluntários. 3ª ed., Alfalit Brasil, Rio de Janeiro, 1994. GREGORY, John Milton. As sete leis do ensino. 7ª ed., Rio de Janeiro, JUERP, 1994. HENDRICKS, Howard. Ensinando para transformar vidas. Ed. Betânia, Belo Horizonte, 1999. LAUBACH, Frank C.. Os milhões silenciosos falam. s. l., s.e., s.d. MALDONADO, Maria Cereza. História da vida inteira. Ed. Vozes, 4ª ed., SP, 1998. SMITH, Josie de. Luiza. Ed. la Estrella, Alajuela, Costa Rica, s.d. SPACH, Jules. Todos os Caminhos Conduzem ao Lar. Recife, PE, 2000.

Peluso x Barbosa

Peluso e Barbosa devem desculpas ao povo, que lhes paga um belo salário para que zelem pela constituição, não para se comportar como arruaceiros de botequim! O site Consultor Jurídico publicou anteontem uma entrevista com o ministro Cezar Peluso, que deixa o Supremo Tribunal Federal em setembro, quando faz 70 anos. É uma pena que, em uma circunstância ao menos, ele tenha metido os pés pelas mãos. Já chego lá. Fez críticas pertinentes ao autoritarismo do governo federal e apontou, no que está corretíssimo, certo flerte do Supremo com o populismo. Tudo isso passou batido. O que fez mesmo barulho foram as suas considerações sobre o ministro Joaquim Barbosa, a saber: ConJur - Com as oscilações de saúde, o ministro Joaquim Barbosa assume após o ministro Ayres Brito? Cezar Peluso - O Joaquim assume, sim. Viram como ele está comparecendo ao Plenário? Teve uma melhora grande, antes quase não aparecia. Agora, comparece a todas as sessões. Ele não recusará essa Presidência em circunstância alguma, pode ficar tranquilo. Tem um temperamento difícil, não sei como irá conviver, primeiro com os colegas. Não sei como irá reagir com os advogados, pois tem um histórico desde o episódio com o Maurício Correia [ministro aposentado do Supremo. Em 2006, Joaquim Barbosa, no Plenário, sugeriu que o então presidente do STF fazia tráfico de influência]. Também não sei como irá se relacionar com a magistratura como um todo. Isso já é especular. Ele é uma pessoa insegura, se defende pela insegurança. Dá a impressão que de tudo aquilo que é absolutamente normal em relação a outras pessoas, para ele, parece ser uma tentativa de agressão. E aí ele reage violentamente. ConJur - A insegurança para o debate o faz resistir aos advogados? Cezar Peluso - A impressão que tenho é de que ele tem medo de ser qualificado como arrogante. Tem receio de ser qualificado como alguém que foi para o Supremo não pelos méritos, que ele tem, mas pela cor. ConJur - Mas ele tem problema com a coluna? Cezar Peluso - A coluna dele é perfeita, não tem nada de errado, ele tem problema nos quadris. O especialista Paulo Niemeyer no Rio diz que ele não tem problema na coluna, tem problema no quadril. Mas o certo é que alguma coisa ele tem, mesmo. Ter de ficar de pé, ficar tanto tempo de licença… Voltei Eu mesmo, não é segredo pra ninguém, já cheguei a sugerir, dadas as muitas ausências de Barbosa, que ele se aposentasse. Escrevi, então, que lamentava seus problemas de saúde, mas que os brasileiros não podiam arcar com as consequências. Num tribunal com 11 pessoas — durante muito tempo, funcionou com 10 —, um ministro impedido de trabalhar representa 10% da Casa, não é? Vamos lá. Eu posso — e, em muitos sentidos, até devo — fazer essa crítica. Mas não Peluso. É evidente que foi além de suas sandálias, ainda que apontasse uma outra questão real: o temperamento mercurial de Barbosa, muito pouco tolerante com quem discorda dele. Já as considerações sobre a cor da pele do colega são de uma absoluta impertinência. É claro que ninguém mais prestaria atenção ao resto da entrevista. Peluso avançou o sinal? É evidente!. Não seria de Joaquim Barbosa que se esperaria ponderação. Ele já exagerou antes por muito menos. Os sites noticiosos já traziam ontem uma resposta sua, afirmando que o outro estava “se achando e não sabe perder” etc e tal. Na entrevista publicada hoje em O Globo, o tom subiu. Se o ex-presidente do Supremo tinha sido deselegante com seu colega, Barbosa rebaixou o confronto ao bate-boca de boteco. Chamou Peluiso de “ridículo”, “brega”, “caipira”, “corporativista”, “desleal”, “tirano” e “pequeno”. É pouco? Ah, para Barbosa, é. Afirmou ainda que “Peluso, inúmeras vezes, manipulou ou tentou manipular resultados de julgamentos, criando falsas questões processuais ou simplesmente para tumultuar e não proclamar o resultado que era contrário ao seu pensamento”. A acusação seria gravíssima se Barbosa estivesse falando como ministro do Supremo. Mas ele estava??? Mais: “As pessoas guardarão a imagem de um presidente conservador e tirânico, que não hesitava em violar as normas quando se tratava de impor à força a sua vontade”. O novo vice-presidente da corte também afirmou que, durante sua gestão, Peluso “incendiou o Judicário com a sua obsessão corporativista”. Quanto às considerações sobre sua saúde, Barbosa disse que Peluso pratica “supreme bullying”. Bullying contra o povo Um confronto nesses termos é expressão de um rebaixamento da vida institucional brasileira. Não atinge só o Judiciário, não! Também se verifica no Executivo, no Legislativo, na imprensa… Uma baixaria como essa seria impossível em democracias como os EUA, a Alemanha, a França… E também seria impossível em ditaduras como o Irã ou a Arábia Saudita. Isso aponta para o fato de que estamos vivendo num regime de democracia rebaixada. As instituições estão aí, saudáveis na letra da lei, mas submetidas a especulações e ataques constantes — inclusive por parte dos agentes públicos que têm a função de preservá-las. Peluso jamais deveria ter dito o que disse do colega — não, ao menos, enquanto estiver no tribunal. Está há poucos meses, se for o caso, de dizer tudo o que lhe der na telha. Seu papel institucional o impede de fazê-lo hoje. O que praticou nada tem a ver com sinceridade ou transparência. É só depredação do necessário decoro. A resposta de Barbosa é, então, um descalabro total. Está pautada pelo mau espírito que consiste no seguinte: “Ah é? Já que ele me deu um chute na canela, então avanço com a navalha na sua jugular; quem mandou começar?” É isso o que a sociedade brasileira espera de seus ministros do Supremo? Que se comportem como moleques de rua? Contentes estão os mensaleiros. Contenstes estão os vagabundos. Contentes estão os criminosos. Nessa via em que o debate transitou, os meliantes são especialistas. É evidente que o Supremo não passaria incólume à decadência mais geral. Eu só não contava que pudesse mergulhar tão fundo. E algo que me diz que a coisa não vai parar por aí. Vem pela frente o julgamento do mensalão. Vários venenos de efeito retardado foram inoculados na corte. Todos os países que involuíram para regimes de força ou autoritários assistiram antes à decadência do Judiciário. Peçam desculpas aos brasileiros, senhores! Eles lhes pagam um belíssimo salário para que zelem pela Constituição, não para que se comportem como arruaceiros de botequim. Por Reinaldo Azevedo

O fascismo argentino

A Argentina caminha cada vez com maior velocidade rumo ao caos. A última das medidas obtusas da presidente Kirchner foi a expropriação da Repsol, empresa espanhola que controlava a YPF. Como o WSJ e a The Economist chamaram o ato, sem eufemismo, representa o velho e simples roubo. O governo argentino é uma quadrilha de gatunos, e preocupa o silêncio diplomático do Brasil sobre o caso. Já o companheiro Chávez, outro larápio, aplaudiu a medida, como era de se esperar. Miriam Leitão, em sua coluna de hoje no Globo, revela um fato estarrecedor. A presidente Kirchner teria visitado uma empresa brasileira na Argentina e questionado porque certo produto não estava sendo vendido no mercado doméstico. O empresário, então, explicou que o produto não era do gosto argentino, e por isso era apenas exportado. Ela relata o resto: “No dia seguinte, o empresário recebe um telefonema de Moreno, que o manda pôr no mercado o tal produto e informa a que preço deve ser vendido. O empresário avisa que aquele preço dá apenas para cobrir o custo da embalagem. Moreno liga então para a empresa fornecedora e dita o preço que ele vai fornecer a embalagem. A empresa pede desconto no custo da energia. E recebe.” Moreno é o manda-chuva do governo, que costumava despachar com u revólver em cima da mesa. A desgraça argentina serve para duas coisas ao menos: 1) mostrar como a esquerda radical, no fundo, aproxima-se do fascismo, que ainda é tido como “direita” por muita gente (a propriedade privada existe de jure mas não existe de facto, pois o governo controla tudo na economia, assim como faz no socialismo); 2) alertar aos brasileiros que o perigo mora ao lado, pois muitos petistas sonham em seguir nesta mesma trajetória (vale lembrar que o CEO da maior empresa privada do país foi demitido porque o governo assim quis).Por: Rodrigo Constantino

Joaquim Barbosa critica Puluso

Vice-presidente do STF acusa presidente anterior de agir de forma “inconstitucional” e “ilegal” O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa atacou duramente o ex-presidente da Corte Cezar Peluso. Joaquim Barbosa chamou Peluso de “ridículo”, “brega”, “caipira”, “corporativo”, “desleal”, “tirano” e “pequeno” em entrevista à jornalista Carolina Brígido, disponível para assinantes do jornal “O Globo”. Mas para além dos ataques mais pessoais, o mais relevante foi uma acusação feita por Joaquim Barbosa: “Peluso inúmeras vezes manipulou ou tentou manipular resultados de julgamentos, criando falsas questões processuais simplesmente para tumultuar e não proclamar o resultado que era contrário ao seu pensamento”. Trata-se de acusação gravíssima. Se o ex-presidente do STF de fato cometeu tal manipulação, é necessário investigar. Abre-se uma crise institucional. O “Globo” explica que Joaquim dá como exemplo do que seria a manipulação de Peluso julgamentos de políticos por causa da Lei da Ficha Limpa. Eis o que diz o ministro Joaquim Barbosa: “Lembre-se do impasse nos primeiros julgamentos da Ficha Limpa, que levou o tribunal a horas de discussões inúteis; [Peluso] não hesitou em votar duas vezes num mesmo caso, o que é absolutamente inconstitucional, ilegal, inaceitável”. Esse caso seria o do julgamento de 14.dez.2011 no qual o STF livrou Jader Barbalho da Lei da Ficha Limpa e assim deu ao político do Pará o direito de voltar ao Senado. Esse julgamento estava empatado em 5 a 5 (o tribunal tem 11 integrantes). À época, o STF divulgou uma nota a respeito: “Diante do impasse, a defesa de Jader ingressou com o requerimento [para que fosse usado o voto de qualidade], que foi apresentado ao Plenário pelo presidente Cezar Peluso. ‘Consulto o plenário se está de acordo com a proposta?’, questionou o presidente. A decisão pela aplicação do dispositivo foi unânime. O relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, não participou da decisão porque está de licença médica”. Joaquim considerou a atitude de Peluso errada: “[Peluso] cometeu a barbaridade e a deslealdade de, numa curta viagem que fiz aos Estados Unidos para consulta médica, ‘invadir’ a minha seara (eu era relator do caso), surrupiar-me o processo para poder ceder facilmente a pressões…”. Joaquim Barbosa dá a entender que se considera vítima de preconceito de cor dentro do STF, ele que é o primeiro ministro negro da Corte. “Alguns brasileiros não negros se acham no direito de tomar certas liberdades com negros”, declarou na entrevista. E mais: “Ao chegar ao STF, eu tinha uma escolaridade jurídica que pouquíssimos na história do tribunal tiveram o privilégio de ter. As pessoas racistas, em geral, fazem questão de esquecer esse detalhezinho do meu currículo. Insistem a todo momento na cor da minha pele. Peluso não seria uma exceção, não é mesmo?”. As declarações de Joaquim Barbosa foram dadas, em parte, como resposta a uma entrevista concedida por Cezar Peluso ao site “Consultor Jurídico” em 18.abr.2012. Peluso nessa entrevista chama Barbosa de “inseguro”. Ao ser indagado o que achava de ter sido chamado de “inseguro”, Barbosa respondeu: “Permita-me relatar um episódio recente, que é bem ilustrativo da pequenez do Peluso: uma universidade francesa me convidou a participar de uma banca de doutorado em que se defenderia uma excelente tese sobre o Supremo Tribunal Federal e o seu papel na democracia brasileira. Peluso vetou que me fossem pagas diárias durante os três dias de afastamento, ao passo que me parecia evidente o interesse da Corte em se projetar internacionalmente, pois, afinal, era a sua obra que estava em discussão. Inseguro, eu?”.Por: Fernando Rodrigues