domingo, 27 de maio de 2012

Brasil poderia crescer de 5% a 6%, diz Armínio Fraga

Para o ex-presidente do Banco Central, é preciso mudar o foco do consumo para a produtividade para acelerar a economia Fernando dantas, de O Estado de S. Paulo RIO - O economista Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central (BC), acha que não há barreiras insuperáveis para o Brasil crescer de 5% a 6% ao ano. Para chegar lá, porém, o foco da política econômica tem de sair do estímulo à demanda para o aprimoramento da oferta, com medidas – como investimentos em infraestrutura e educação, e redução de custos tributários e de energia – que revertam o fraco desempenho da produtividade brasileira. A seguir, a entrevista com Fraga, que é sócio-fundador da gestora de recursos Gávea Investimentos. Como o sr. vê a dificuldade de a economia brasileira retomar o crescimento? Tem fatores externos, fatores cíclicos e fatores de natureza mais estrutural. Os externos estão aí, um clima mais de medo, um clima de crise centrado na Europa mas também com uma componente chinesa, dado que a China neste início de ano está crescendo abaixo do que era projetado. Há também um elemento estatístico. O fato de o ano passado ter sido também de crescimento moderado ou baixo carrega isso um pouco para este ano. Cresceremos pouco de novo, como em 2011? Mesmo que a economia cresça a uma taxa de 1% ao trimestre no segundo semestre, a taxa anualizada vai ser baixa. A minha expectativa, sujeita a chuvas e trovoadas da Europa, principalmente, é que no segundo semestre a economia responda aos estímulos que já foram feitos: o juro mais baixo, o governo pressionando também na área do crédito, além do próprio câmbio, que se depreciou. Quais são os componentes cíclicos que atrapalham o crescimento? Há um natural arrefecimento no crescimento do crédito. Ele vinha crescendo numa taxa que não era sustentável, e desacelerou. Nada dramático, mas desacelerou. Não adianta querer forçar a demanda além de um certo ponto. E o governo vai ficar de olho nisso. Vejo a inflação caindo este ano em relação ao ano passado, mas existe uma questão a respeito do que vai acontecer em 2013. Mas acho que aí o sistema tende a funcionar, não é minha preocupação. Estou preocupado com o lado da oferta. Neste lado estrutural, há diversas barreiras. Quais? A infraestrutura, a baixa taxa de investimento e até sinais preliminares de que a produtividade talvez não esteja evoluindo muito favoravelmente. São desafios para o Brasil. Já há muito tempo tem sido difícil para o País investir mais que 20% do PIB. Há dez, 15 anos, também não estávamos investindo muito, mas a infraestrutura quebrava o galho. Agora, depois de alguns anos crescendo a uma taxa de quase 4%, a infraestrutura simplesmente não aguenta mais. Por que estamos tendo problemas com a produtividade e os investimentos? São temas mais de natureza mais microeconômica. Entendo as posições a favor do aumento do protecionismo no Brasil, mas acho que isso tem um custo, que não é tão visível. Há escassez de mão de obra qualificada. E existem várias questões ligadas ao governo que também chamam a atenção: o custo de se operar no Brasil, a estrutura tributária, o custo da energia. Como o sr. vê a atuação do governo para acelerar a economia? O governo, quando fala de crescimento, parece estar mais focado no lado da demanda do que no lado da oferta. É claro que nenhuma economia cresce sem demanda, não é esse o problema. Mas no momento em que a economia internacional não nos ajuda, a demanda interna não consegue ir tão longe, as questões de oferta começam a aparecer com mais força. Aliás, acho que esses problemas da oferta são temas que o governo está começando a debater também, há a sensação de maior consciência sobre a urgência de aumentar os investimentos e de prestar mais atenção nas questões ligadas à produtividade. Não tenho uma visão negativa das nossas possibilidades, tudo isso pode ser contornado, pode ser corrigido com o tempo. Mas o momento global hoje é muito ruim, atrapalha. Qual o crescimento potencial do Brasil? O uso dessa expressão no contexto do Copom (Comitê de Política Monetária) diz respeito ao quão rápido a economia pode andar sem pressionar a inflação. Então é uma definição de muito curto prazo. É um número que não se consegue medir com precisão, e que depende de várias circunstâncias e elementos. Hoje imagina-se, ou imaginava-se, que ficava em torno de 4%, para alguns um pouco menos. Já o crescimento potencial que a gente discute numa roda de amigos, não especialistas, é bem mais alto. Como assim? Acho que se o Brasil investir mais, investir na educação, acertar algumas das coisas que comentamos, poderia crescer de forma sustentada um pouco mais, por um bom tempo – quem sabe 5%, 6%. Não vejo nenhuma barreira insuperável para isso, mas não vai acontecer sem o País investir mais, e melhor, e educar melhor. Qual a sua visão sobre a crise do euro? A Grécia é um país absolutamente diferenciado até dos outros que estão tendo problemas. É um caso extremo. É difícil dizer se ela vai ou não sair do euro, mas é pouco provável que consiga honrar sua dívida. A Grécia tem dificuldade de se ajustar mesmo depois de a dívida já ter sido reduzida. Não descarto a possibilidade de a Grécia sair eventualmente. Poderia ser uma crise tão grande quanto a do colapso do Lehman Brothers em 2008? Poder, pode. Teria de ser uma coisa bem orquestrada para evitar isso, e ainda assim é difícil ter certeza. Porque as pessoas nos outros países vão olhar o que está acontecendo na Grécia e podem entrar em pânico, achar que isso vai acontecer nos seus países também, o que pode deslanchar um pânico mais generalizado. É um momento muito difícil, não há como negar.