quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

NOVO DICIONÁRIO REVOLUCIONÁRIO - 1

O envenenamento da língua produziu não apenas mentes distorcidas, mas também distorções morais e afetivas, pois atingiu a vida pública e a privada, a política, a justiça, a economia, a arte e atinge escolas elementares e até jardins da infância.

“A língua conduz o meu sentimento, dirige a minha mente de forma tão mais natural quanto mais inconscientemente eu me entregar a ela.O que acontece se a língua culta tiver sido constituída ou for portadora de elementos venenosos? Palavras podem ser como minúsculas doses de arsênico: são engolidas de maneira despercebida e aparentam ser inofensivas. Passado um tempo, o efeito do veneno se faz notar.”
Victor Klemperer - Lingua Tertii Imperii (LTI) – A Linguagem do III Reich

Klemperer era um filólogo judeu convertido ao luteranismo que, casado com uma ‘ariana’ escapou do Holocausto. Viveu em Dresden e escreveu um extenso diário dos dias de guerra. No pós-guerra permaneceu na zona de ocupação soviética, lecionando na Universidade de Dresden. Seu livro ‘LTI: Notizbuch eines Philologen ‘[[i]] é precioso para todos quantos se interessam pelas perversões revolucionárias de qualquer ideologia.


Sobre a linguagem, dizia:

Se puder se expressar com liberdade, qualquer língua consegue dar conta de todos os anseios humanos. As palavras se prestam à razão e ao sentimento, são comunicação, diálogo e monólogo, oração e súplica, ordem e invocação. A linguagem do III Reich só se prestava à invocação. (...) Nela tudo é discurso, arenga, alocução, invocação, incitamento à ação. O estilo é vociferante: quem berra mais alto, ganha. Era o estilo do Ministro da Propaganda (e do próprio Führer).

Desde os últimos estertores do ciclo de governos militares contra-revolucionários iniciou-se no Brasil um novo ciclo revolucionário que visa estabelecer aqui um estado totalitário onipotente e onipresente. Uma das principais áreas de ação foi envenenar lentamente a linguagem, a moral e os costumes da juventude. Deram por perdido os de meia idade e mais velhos. O período que vai de 1985 a 1994, escassos nova anos, pode ser comparado, modus in rebus, com a República de Weimar sem a I Guerra Mundial, mas após um período de intensas ações revolucionárias no campo e nas cidades. Com certa licença pode-se repetir a afirmação de Klemperer de que a República (democrática) liberou de forma suicida a palavra escrita e falada.

Os revolucionários apareceram em todo esplendor de seu cinismo, hipocrisia e despudor. Diziam que queriam a democracia e respeitavam a Constituição, enquanto atacavam as instituições e se lançaram furiosamente contra tudo que não coubesse em sua ideologia pseudo-democrática, satirizando tudo em sermões onde imperava o ‘você não está pensando direito, junte-se a nós para conhecer a verdade’. Não vou comentar a já tão discutida novilíngua de Orwell, ou o politicamente correto. Abordarei a perversão de expressões já usadas classicamente. O envenenamento da língua produziu não apenas mentes distorcidas, mas também distorções morais e afetivas, pois atingiu a vida pública e a privada, a política, a justiça, a economia, a arte e atinge escolas elementares e até jardins da infância.

1. Primeiramente vejamos a palavra ditadura. Quando a expressão é usada, as pessoas, tal qual cães de Pavlov, começam a salivar ódio puro! E isto uma maioria que nem era nascida em 1964 e não tem nenhuma idéia do que realmente se passou. Ela funciona como um mero desencadeador de emoções e age subliminarmente: todos sabem, emocionalmente, o que ela quer dizer, mas racionalmente não são capazes de elaborar um conceito minimamente razoável e muito menos o conhecimento da história. Imediatamente relembram o que lhes foi implantado como um chip mental que a liga com outras palavras como militar, tortura, torturadores, opressão, censura, etc.

2. Fanático, fanatismo: expressões unicamente utilizadas para se referir a cristãos, principalmente católicos, geralmente acompanhada de “intolerante” ou “intolerância”. Algumas vezes também usadas como sinônimo de fundamentalismo. Se uma pessoa vai à missa ou ao culto e rege sua vida pelos preceitos dos Evangelhos, não aceitando o aborto nem a eutanásia e/ou a união gay nem a adoção de crianças pelos ‘casais’ gays, é intolerante, fanático, fundamentalista e extremista.

3. Extremista: termo antes importante para diferenciar de moderados de qualquer ideologia, passou a ser usado unicamente para quem defende o conservadorismo moral e o liberalismo econômico. É geralmente usado com o adjetivo de direita, ou direitista, jamais um comunista que apoiou os crimes de Stalin é considerado extremista.

4. Histórico: esta é uma palavra que sofreu as maiores distorções! Qualquer insignificância ou besteira que sirva aos propósitos revolucionários, qualquer discurso dos poderosos é histórico. Qualquer encontro de Lula ou Dilma com Chávez ou Kirchner é histórico, mesmo que apenas tomem umas e outras. A distorção foi tão longe que até mesmo para os democratas de verdade, conservadores e liberais, o julgamento do Mensalão foi “histórico”. Ora, para Calígula, qualquer defecada de Incitatus, seu cavalo nomeado senador, era histórica! Aliás, no nosso Senado, haja Incitatus!
(Continua)

Nota:
Publicado em português pela editora Contraponto, 2009:Rio, em Tradução de Miriam Bettina Paulina Oelsner, do Laboratório de Estudos sobre a Intolerância – Módulo Holocausto, USP
Por: ESCRITO POR HEITOR DE PAOLA  Para o jornal Inconfidência, de Belo Horizonte.

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