quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

MISES E A FAMÍLIA


O escritor, poeta e filósofo G.K. Chesterton dizia que a família era uma instituição anarquista. Com isso, ele queria dizer que não é necessário nenhum decreto do estado para que ela venha a existir. Sua existência flui naturalmente de realidades constantes na natureza do homem, sua forma sendo aperfeiçoada pelo desenvolvimento de normas sexuais e pelo avanço da civilização.

Essa observação é consistente com a brilhante discussão sobre a família feita por Ludwig von Mises em sua magistral obraSocialism, publicada em 1922. Por que Mises abordou a família e o casamento em um livro de economia que refutava o socialismo? Ele entendeu — ao contrário de muitos economistas de hoje — que os oponentes da sociedade livre e voluntária têm um projeto amplo que geralmente começa com um ataque a essa instituição que é a mais crucial de qualquer sociedade.

"Propostas para transformar as relações entre os sexos há muito vêm de mãos dadas com planos para a socialização dos meios de produção", observa Mises. "O casamento deve desaparecer junto com a propriedade privada... O socialismo promete não apenas o bem-estar — riqueza para todos —, mas também a felicidade universal no amor."

Mises observou que o livro de August Bebel (alemão fundador do Partido da Social Democracia Alemã), Woman Under Socialism, um canto de glória ao amor livre publicado em 1892, foi o tratado esquerdista mais lido de sua época. Esse elo entre socialismo e promiscuidade tinha uma proposta tática. Se você não acreditasse no engodo de uma terra prometida onde a prosperidade surgiria magicamente, então você ao menos podia ter a esperança de que haveria uma libertação da maturidade e da responsabilidade sexual.

Os socialistas propunham um mundo no qual não haveria impedimentos sociais ao ilimitado prazer pessoal, com a família e a monogamia sendo os primeiros obstáculos a serem derrubados. Esse plano funcionaria? Sem chance, disse Mises: o programa socialista para o amor livre é tão impossível quanto o programa para a economia. Ambos vão contra as restrições inerentes ao mundo real.

A família, assim como a estrutura da economia de mercado, não é um produto de políticas; é um produto da associação voluntária, tornada necessária por realidades biológicas e sociais. O capitalismo reforçou o casamento e a família porque é um arranjo que depende do consentimento e do voluntarismo em todas as relações sociais.

Assim, tanto a família quanto o capitalismo compartilham as mesmas fundações institucionais e éticas. Ao tentar abolir essas fundações, os socialistas iriam substituir uma sociedade baseada nos contratos por uma baseada na violência. O resultado seria o total colapso social.

Quando os social-democratas Sidney e Beatrice Webb viajaram para a União Soviética, uma década após o lançamento do livro de Mises, eles relataram uma realidade diferente. Eles encontraram mulheres liberadas do jugo da família e do casamento, vivendo vidas felizes e realizadas. Era uma fantasia tão grande — na realidade, uma fantasia sangrenta — quanto suas alegações de que a sociedade soviética estava se tornando a mais próspera da história.

Atualmente, nenhum intelectual mentalmente são defende o total socialismo econômico; mas uma versão diluída do programa socialista para a família é a força-motriz de várias das políticas sociais mais afamadas mundo afora. Essa agenda anda de mãos dadas com a restrição da economia de mercado em outras áreas.

Não é coincidência alguma que a ascensão do amor livre tenha acompanhado a ascensão e o completo desenvolvimento do estado assistencialista. A ideia da emancipação da necessidade de trabalhar (e de poupar e de investir) e da emancipação de nossa natureza sexual tem origem em um mesmo impulso ideológico: superar as realidades estabelecidas da natureza. Como resultado, a família sofreu — exatamente como Mises previu que aconteceria.

Embora os defensores da família e os proponentes do capitalismo devessem estar unidos em um único programa político visando a esmagar o estado intervencionista, eles tipicamente não estão. Os defensores da família, mesmo os conservadores, frequentemente condenam o capitalismo financeiro como uma força alienadora, e defendem políticas irrefletidas como tarifas, monopólios sindicais e programas de renda mínima para pessoas casadas.

Ao mesmo tempo, os adeptos da livre iniciativa demonstram pouco interesse em relação às genuínas preocupações dos defensores da família. E ambos não parecem interessados nos ataques radicais à liberdade e à família que políticas governamentais como leis do trabalho infantil, escola pública, seguridade social, altos impostos e medicina socializada representam. Na visão de Mises, essa cisão é deletéria.

"Não é nenhum acidente que a proposta de se tratar homens e mulheres como sendo radicalmente iguais, de ter o estado regulando as relações sexuais, de colocar crianças em creches públicas e garantir que filhos e pais permaneçam quase que desconhecidos uns para os outros tenha se originado com Platão", que em nada se importava com a liberdade.

Também não é nenhum acidente que essas mesmas propostas hoje em dia sejam defendidas por pessoas que não têm a mínima consideração pela família e pelas leis econômicas.

Lew Rockwell é o presidente do Ludwig von Mises Institute, em Auburn, Alabama, editor do website LewRockwell.com, e autor dos livros Speaking of Liberty e The Left, the Right, and the State
Tradução de Leandro Roque

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