sábado, 4 de agosto de 2012

VEM AÍ O PAC DA PRIVATIZAÇÃO


Pode parecer provocação, mas, acreditem, é só um comentário: a presidente Dilma lança a partir da próxima semana uma agenda liberal-ortodoxa. Começa com o que se chama, nos gabinetes oficiais, de PAC das concessões. Trata- se de transferir para a iniciativa privada mais de dez mil quilômetros de rodovias e ferrovias, um tipo de política que, na oposição, o PT chamava de privatização.

E é isso mesmo. Nesse processo, a concessionária não se torna dona da estrada, por exemplo, mas é como se fosse, pois a administra, explora e obtém lucros conforme a lógica da empresa privada. A estrada é efetivamente dela por todo o tempo da concessão. Logo, pode-se dizer que vem aí o PAC das privatizações — no bom sentido.

Depois, vem o PAC das desonerações. Trata-se de redução de impostos para diversos setores. Finalmente, um PAC especial para a energia elétrica, programa para retirar e/ou reduzir taxas e impostos que tornam a conta de luz brasileira uma das mais caras do mundo.

Essa agenda vem sendo proposta há muitos anos, antes mesmo de o então presidente Lula inventar os PACs. A base era e é a seguinte: o Brasil precisa de uma nova onda de investimentos, sobretudo em infraestrutura, e que só podem ser privados. Isso porque o Estado já gasta demais (pelo que é obrigado a cobrar carga pesada de impostos) e gasta mal, muito em custeio e pouco em investimento. E mais: quando se mete a investir, revela uma enorme ineficiência.

Já o setor privado tem competência (empresas brasileiras fazem obras importantes pelo mundo afora) e capacidade de mobilizar capital.

Em 2007, quando se discutia o que fazer depois do apagão aéreo, uma CPI no Senado chegou a propor a privatização, perdão, concessão dos 11 maiores aeroportos brasileiros. Ministros do governo Lula contaram que essa medida estava, de fato, em estudos.

Mas não prosperou. Em 19 de julho de 2007, escrevíamos aqui mesmo: “As privatizações (sob forte ataque político) pararam no segundo mandato de FHC e foram banidas pelo governo Lula. Desde então, o que se fez de significativo para a infraestrutura nacional? Pode procurar. Agora, tem o PAC, para recuperar o investimento público. Prevê R$ 3 bilhões, até 2011, para todos os aeroportos nacionais. Não dá nem para uma guaribada.”

Se Dilma pode fazer hoje, por que Lula e Dilma, que estavam no governo, não poderiam ter feito lá atrás?

Tanto não funcionou que a presidente Dilma, cinco anos depois, iniciou a privatização de três aeroportos e, parece, colocará outros na nova agenda. Se Dilma pode fazer hoje, por que Lula e Dilma, que estavam no governo, não poderiam ter feito lá atrás?

Ideologias atrasadas custam caro. A mesma agenda, digamos, ortodoxa dizia ainda que o investimento privado dependia de um ambiente de negócios mais favorável. Isso, de sua vez, exigia uma sequência de medidas microeconômicas de modo a facilitar a vida de quem pretende empreender e ganhar dinheiro honestamente. No topo dessa prioridade, a redução estrutural de carga tributária — não o quebra-galho de desonerar um setor aqui, outro ali, compensando com aumento de impostos em outras áreas, tudo resultando em aumento líquido da arrecadação, como tem acontecido.

Parece que o próximo movimento da presidente Dilma vai na direção de uma redução horizontal de impostos. Mas convém ficar de olho.

As burocracias, a ideologia estatizante do PT e a fisiologia dos partidos governistas, ávidos por cargos, obras e verbas, continuam formando um poderoso obstáculo. No caso das concessões, por exemplo, existe a tendência de se colocar restrições e exigências exageradas às empresas privadas, nacionais e estrangeiras. Isso reduz a rentabilidade do negócio — e parece que o objetivo oculto é esse mesmo — e afasta as principais companhias do setor, como aconteceu com a recente concessão de aeroportos.

Além disso, parece que o governo foi para essa agenda na base do desespero, diante da fraca reação da economia a estímulos ao consumo. E falta a outra perna desse programa: políticas de eficiência para o gasto público, assim como a contenção de despesas de custeio. E, o leitor sabe, coisas feitas sem convicção, e pela metade, não funcionam. Por: Carlos Alberto Sardemberg

Fonte: O Globo, 02/08/2012

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